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Painéis solares também

ESPAÇO DBO de olho em novas tecnologias

PECUÁRIA 4.0 Painéis solares de duplo propósito

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Além de gerar energia elétrica, eles também promovem conforto térmico para os animais, uma exigência atual do consumidor.

Pesquisa está sendo conduzida, atualmente com bovinos cruzados Nelore-Angus. Ovelhas e gado Holandês já aprovaram as placas solares como fonte de sombreamento.

Bianca Bosso

Um dos grandes desafios da Pecuária 4.0 será aliar produtividade com demandas de bem- -estar dos bovinos, incluindo o conforto térmico, que, além de ser desejável, também favorece o melhor desempenho tanto produtivo quanto reprodutivo desses animais. Considerando-se que dois terços do território nacional estão situados na faixa tropical, é fundamental adotar estratégias que permitam reduzir a exposição do rebanho ao calor excessivo e à radiação solar, sem perder de vista os conceitos de sustentabilidade ambiental e econômica. Ciente disso, um grupo de pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), de Jaboticabal, SP, em parceria com as Universidades de Cornell (EUA) e Witwatersrand (África do Sul), decidiu investigar a viabilidade de uso dos painéis fotovoltaicos como “sombreadores” para a criação de bovinos. A grande sacada da equipe liderada pelo pesquisador Alex Sandro Campos Maia, pós-graduado em zootecnia, foi aliar geração de energia com conforto térmico. “Em geral, o sombreamento artificial é fornecido por meio de sombrites, mas essas estruturas geram gastos com manutenção ao longo do tempo e, do ponto de vista financeiro, não dão retorno direto ao produtor. A ideia que nasceu aqui no laboratório foi fornecer não somente sombra aos animais, mas garantir uma fonte

de receita extra ao fazendeiro, por meio da geração de energia”, explica o pesquisador. Na primeira etapa do estudo, que está sendo conduzido no Laboratório de Biometeorologia da Unesp, foram analisados aspectos comportamentais de uma criação de ovelhas Corriedale. Constatou-se que, ao serem oferecidas áreas sombreadas por sombrites tradicionais e espaços sob painéis solares – independentemente do nível de radiação solar – os animais preferiam se proteger sob os painéis.

“Observamos que as placas filtram melhor a radiação, concedendo ao animal maior conforto térmico”, explica Hugo Fernando Milan, doutor em engenharia biológica que faz parte do grupo de pesquisa. Resultados semelhantes foram encontrados em outros estudos. “Fizemos uma pesquisa com novilhas da raça Holandesa e o comportamento dos animais foi idêntico”, acrescenta Alex Maia. Nesta etapa da pesquisa, estão sendo usadas 20 placas solares para fornecimento de sombra a 12 bovinos cruzados Nelore-Angus. “A avaliação segue a mesma linha do trabalho anterior, mas agora vamos avaliar também respostas fisiológicas. Colocaremos sensores de temperatura e frequência respiratória nos animais para avaliar esses parâmetros”, salienta Maia.

Próximas etapas

O plano para as próximas etapas consiste em ampliar a amostragem e a natureza das análises. “Na

terceira fase da pesquisa, pretendemos avaliar a performance de um grande número de animais. Instalaremos sistemas de alimentação automática para monitorar a ingestão de água e comida, fazendo pesagens diárias para analisar possíveis diferenças quanto ao ganho de peso”, explica Maia. Além disso, a equipe pretende expandir a capacidade de geração de energia através da instalação de mais 10 painéis solares no laboratório, totalizando 30, o que possibilitará que toda a demanda energética do local seja suprida por essas estruturas.

Uma das vantagens da substituição das sombrites tradicionais pelos painéis fotovoltaicos é o ganho na qualidade da energia elétrica usada para o abastecimento da propriedade. “Geralmente, nas áreas afastadas, a qualidade da energia é um pouco inferior. Então, se conseguirmos criar microusinas nesses lugares, o fazendeiro passará a ter uma energia de melhor qualidade, melhorando, também, as condições de vida de todas as pessoas que dela usufruem”, diz Milan. Ele acrescenta que o equipamento também reduz os custos associados ao uso de energia: “Em cinco anos, o produtor consegue recuperar o investimento feito na instalação”, garante, explicando que excedentes de energia podem ser direcionados à rede elétrica, gerando renda.

Onde instalar

Milan explica que não há recomendação des distâncias mínima e máxima em relação ao local que usufruirá da energia. “Quanto maior mais longe os painéis ficarem do conversor de frequência, maior será a perda. Mas isso pode ser resolvido por meiode adaptações técnicas, como modificações na espessura e no número de cabos”. A geração de energia solar também é benéfica em termos de sustentabilidade, já que se trata de uma fonte de energia limpa que contribui para a redução da emissão de dióxido de carbono na atmosfera (resultante de outras fontes energéticas), e também é favorável à proteção dos animais em campos abertos, uma vez que o equipamento pode funcionar como pára-raios, captando e dissipando descargas elétricas que porventura atinjam o pasto.

Propiciar conforto térmico apropriado responde ainda às diretrizes estabelecidas por organizações que concedem certificação para quem trata bem os animais. “O consumidor cada vez mais busca saber se o produto que está comprando é proveniente de criações que garantem o bem-estar. O conforto térmico é um dos parâmetro exigidos”, explica Maia. O pesquisador da Unesp destaca que o projeto ainda está em andamento, portanto, não se tem respostas categóricas, mas os resultados indicam viabilidade de uso das estruturas em grande escala. “Não há dúvida de que os animais são beneficiados e obtém-se geração de energia”, salienta.

Parâmetros de instalação, como a altura das placas e a resistência da estrutura, devem ser determinados de acordo com a raça utilizada. “A altura deve ser suficiente para que os animais se sintam confortáveis. Quanto maior ela for, mais resistente deverá ser a estrutura de suporte dos painéis”, destaca Milan. Maia acrescenta que “no caso da pesquisa com bovinos, o pé direito usado foi de 2,8 a 3 metros”.

Regulamentação

Além do investimento inicial, outro empecilho para a implementação da proposta em larga escala são as leis de regulamentação para o setor. “Tivemos, no começo do ano, um movimento que sugeria a imposição de taxas sobre a produção de energia solar”, relata o pesquisador. “Ao que tudo indica, a discussão se encaminha de maneira favorável, pois o mercado espera que haja a implementação de leis que possibilitem a isenção de impostos sobre a produção”, diz.

Alex Maia destaca que, apesar dessa incerteza, as vantagens fornecidas pelo sistema de painéis solares traz perspectivas promissoras: “Temos um sistema integrado capaz de gerar energia limpa, que contribui para a redução da emissão de dióxido de carbono, garante receita extra para a propriedade, possibilita o cumprimento de exigências relativas ao bem-estar animal e ainda traz vantagens em relação à percepção do consumidor. Quando somamos todos esses pontos positivos, os painéis se tornam uma opção interessante”. n

Como a luz solar vira energia elétrica

Os painéis fotovoltaicos ou painéis solares são equipamentos usados para captar e converter energia solar em elétrica. O funcionamento desse dispositivo se baseia na transferência de energia que ocorre quando os fótons, partículas que compõem a luz, incidem sobre superfícies semicondutoras, como as placas que formam os painéis. A energia recebida flui e forma uma corrente elétrica. “Os painéis são conectados em cabos, que levam a corrente até um equipamento chamado conversor de frequência, usado para transformar essa energia no tipo de corrente adequado. A partir daí, a energia gerada pode ser usada para fazer funcionar dispositivos

elétricos ou eletrônicos”, explica o doutor em engenharia biológica, Hugo Fernando Milan, integrande da equipe da Unesp. Sombrite não gera receita extra para o produtor como os painéis”

Alex Maia, líder da equipe que conduz experimentos na UnespJaboticabal

ESPECIAL Genética e Reprodução

Ciclo virtuoso na IATF

Prenhez “do cedo” garante mais quilos de bezerro por vaca exposta. Veja como conseguir isso associando nutrição, genética, manejo e sanidade.

Carolina Rodrigues carol@revistadbo.com.br

Anecessidade de se elevar a produtividade da cria, aproveitando, inclusive, a atual onda de valorização do bezerro (ágios de até 45% em relação à @ de boi), tem estimulado o uso de tecnologias como a inseminação artificial em tempo fixo (IATF). Mais de 16,3 milhões de protocolos foram comercializados em 2019, ante 13,2 milhões em 2018. O objetivo do produtor com essa tecnologia é obter mais quilos de bezerro por vaca exposta. Segundo especialistas ouvidos por DBO, o segredo está na primeira IATF, que deve garantir mais de 50% de prenhez logo no início da estação de monta. Isso cria um ciclo virtuoso no sistema produtivo da fazenda: mais animais nascem em época de boa oferta forrageira (o que ajuda a mãe a produzir leite), sendo desmamados mais pesados; a recria se torna mais eficiente; antecipa-se a idade ao abate; reduz- -se a lotação na seca, as vacas chegam mais gordas à próxima estação de monta e voltam a emprenhar mais rapidamente (veja figura abaixo). Inseminar cedo gera também um ciclo virtuoso financeiro: com mais vacas prenhes no início da estação, o custo cai; a parição ocorre no melhor momento, gastando-se menos; a qualidade dos bezerros melhora; há maior possibilidade de trabalhar com precocinhas, o que eleva o número de matrizes em produção; produz- -se mais bezerros, com melhor desempenho, obtendo- -se mais lucro. Desencadear esse efeito “cascata” não é tarefa fácil, mas várias fazendas já conseguiram acertar seus processos, registrando índices de até 70% no primeiro protocolo. Segundo Izaias Claro Júnior, coordenador do Grupo Especializado em Reprodução Aplicada ao Rebanho (Gerar), quem alcança esses resultados faz planejamento; tem protocolos reprodutivo, nutricional e sanitário ajustados a sua realidade; usa genética de qualidade, pratica manejo racional e tem equipe bem treinada.

De 2007 a 2019, os técnicos filiados ao Gerar realizaram 6,7 milhões de protocolos de IATFs. Somente no passado, foram 1,393 milhão, com taxa média de prenhez à primeira IATF de 40% nas fazendas Terc 1 (desempenho inferior) e de 65% nas Terc 3 (desempenho superior), uma diferença de 25 pontos percentuais. O grupo das propriedades eficientes, ao concentrar a prenhez no início da estação de monta, obteve um prêmio extra: mais quilos por bezerro desmamado. Análise realizada pelo Gerar em 11.000 crias de fazendas goianas mostrou que até as fêmeas nascidas “no cedo” superam machos “do tarde”. Elas desmamam 36 kg mais pesadas do que eles (veja gráfico à pág. 44). Já a diferença dentro da categoria machos (animais do cedo x do tarde) é de 62 kg. Outro estudo apontou que 100% dos animais nascidos em setembro, por exemplo, chegam ao abate com até 2,5 anos de idade, enquanto os nascidos em dezembro morrem com 3 anos ou mais.

Importância da condição corporal

Segundo o professor José Luiz Moraes Vasconcelos (o Zequinha), da Unesp de Botucatu/SP, a IATF funciona, hoje, como balizadora da eficiência gerencial. “Se o produtor obtém baixos índices reprodutivos, algo está errado em um ou mais pacotes tecnológicos. É preciso avaliar isso, pois o momento da prenhez determina uma série de eventos em cascata, que vai do diagnóstico de gestação ao abate”. Zequinha explica que bons índices na primeira IATF e, consequentemente, maior produção de bezerros do cedo dependem do manejo da vaca. Quanto mais “refinada” a genética introduzida via IATF, maior a exigência nutricional dos animais produzidos. É fundamental que a matriz tenha bom escore

Quem tem protocolos ajustados à realidade da fazenda obtém melhores resultados”

Izaias Júnior,

Coordenador do Gerar

E.M. curta Ciclo virtuoso

DG cedo Desmama cedo Calendário reprodutivo enxuto tira maior proveito do pasto

Vacas gordas

Baixo custo Suplemento

Reduz taxa Lotação na seca

Baixa manutenção pastagens Venda rápida

Recria boa

Período de nascimento curto Estação de monta curta

DG Desmama

E.M. curta

agosto setembro outubro novembro dezembro janeiro fevereiro março abril maio junho

ESPECIAL Genética e Reprodução

Boas práticas de manejo ajudam a reduzir o estresse das fêmeas no curral e aumentam os índices de prenhez

Foco na nutrição e calendário bem planejado são fundamentais”

Rogério Peres, especialista em reprodução animal de condição corporal (ECC) no início da estação de monta e por ocasião do parto, pois isso influi muito no índice de prenhez.

Conforme pesquisa realizada pelo veterinário Rafael Silveira Carvalho, como parte de sua tese de mestrado, sob orientação do professor Zequinha, quanto melhor a condição corporal da vaca ao parto, melhor é o resultado da IATF, independentemente da categoria. Após avaliar dados de quase 2.000 matrizes, o estudo indicou como desejável um ECC de 3,5 ao parto, pois (já se considerando que as fêmeas vão perder peso pós- -parto), elas chegariam com escore 3 à inseminação, o que garante bons índices de prenhez. Deve-se ter cuidado especial com as primíperas. Se, quando novilhas, elas forem inseminadas em boa condição corporal e depois parirem bem (ECC 3 ou mais) terão mais chances de reconceber no começo da estação de monta (1ª IATF), apresentando taxa de prenhez de 20 a 30 pontos percentuais acima da registrada pelas primíparas com ECC baixo ao parto (2,75 ou menos).

Dados do Gerar corroboram a tese de Carvalho. O grupo avaliou o efeito do escore corporal sobre a pre

Efeito do mês de nascimento sobre o peso à desmama

Machos Fêmeas 34 Kg 36 Kg

225

199 190

180 180 164 165

149

10 11 12

*Dados do Gerar, referentes a 11.000 bezerros desmamados em GO

1

163 145 2

Higiene, sêmen de qualidade, registros de dados e equipe treinada pesam bastante nos resultados

nhez por IATF de novilhas induzidas (precocinhas), novilhas comuns, primíparas, secundíparas e multíparas, separadas conforme seu ECC (abaixo de 2,75 e acima de 3). A maior diferença de desempenho foi observada justamente nas primíparas: as mais magras apresentaram 42,7% de prenhez, ante 52,8% daquelas com condição desejável. Na tabela da página ao lado, pode-se ver que mais de 50,1% das primíparas apresentou escore baixo (igual ou inferior a 2,75). “Ou seja, se o produtor melhorar a condição nutricional dessas fêmeas, elas responderão melhor à IATF, com um incremento de fertilidade gigantesco”, salienta Izaias Júnior, coordenador do Gerar. Nas demais categorias avaliadas, mais de 55% tinham escore ideal, com destaque para as novilhas (80,1% delas apresentaram ECC acima de 3).

Suplementação e manejo de curral

Se a condição corporal das fêmeas tem grande impacto no resultado da IATF, o manejo nutricional das futuras mães é fundamental. “Isso deve ser planejado pelo menos seis meses antes da estação de monta, por ocasião do desmame, quando já se faz também a análise de ECC”, recomenda o veterinário Rogério Peres, especialista em reprodução animal e diretor de pecuária da Fazenda Paranã, em Iaciara, GO. Com as fêmeas divididas por categoria, define-se quantas serão inseminadas, qual material genético será usado em cada grupo e elabora-se um calendário reprodutivo. “A partir daí, são definidos protocolos nutricionais para cada categoria, mês a mês. O ideal é que cada fazenda crie os seus, adequados à sua realidade”, salienta Peres.

No caso das precocinhas, segundo ele, é possível trabalhar na recria (maio a outubro) com sequestro, pastos de integração lavoura-pecuária ou suplementação na proporção de 1% do peso vivo, para que as fêmeas cheguem à estação de monta com 290-300 kg, aos 13- 14 meses de idade. Depois, elas devem continuar sendo suplementadas (3 g/kg de PV) para se garantir um bom desenvolvimento corporal e parição em condições

adequadas. Na opinião de Flávio Dutra, pesquisador da Apta-Colina, o cuidado nutricional com as precocinhas deve prosseguir até que elas se tornem secundíparas.

Nas demais categorias de fêmeas (principalmente primíparas), o veterinário Luiz Carlos Louzada Ferreira (o Caio), da Cia Assessoria, de Campo Grande, MS, que acompanha 10 fazendas no Estado, preconiza uma suplementação proteico-energética de 0,1% a 0,3% do peso vivo. “Costumo dizer para os peões que o cio entra pela boca. Essa é uma regra da qual não se foge”, salienta. A maioria das fazendas brasileiras fornece apenas sal mineral nas águas e mineral ureado na seca para as multíparas. Como nem sempre isso é suficiente (dependendendo da situação das pastagens), alguns produtores já estão fazendo “sequestro” dessa categoria na seca, ou reforçando a dieta dos lotes mais sentidos no pré e pós-parto, para melhorar sua condição corporal.

Seja qual for o protocolo nutricional adotado pela propriedade, é fundamental cuidar também do manejo, já que o estresse interfere bastante no resultado da IATF. Um estudo realizado pelo professor Reinaldo Cooke, da Universidade Texas A&M, nos Estados Unidos, envolvendo 953 vacas com 50 dias pós-parto, mostrou que fêmeas que saem correndo (estressadas) do tronco de contenção após a inseminação têm taxa de prenhez 6% menor do que as que saem calmas. Trabalho realizado no Brasil, pela consultoria Criafértil, de GO, também confirma isso [veja reportagem à pág. 50]. “O estresse também tem impacto na quantidade de quilos de bezerro desmamado na propriedade”, diz o pesquisador. A diferença observada nas crias de vacas reativas e calmas foi de 16 kg. Um manejo cuidadoso é fundamental, principalmente com novilhas. Rogério Peres, em seu trabalho de mestrado, observou índice de prenhez bem menor nessa categoria quando estressada (maior concentração de cortisol no sangue), em comparação com vacas calmas (41% ante 59%).

Escolha de protocolos e sanidade

Com um calendário reprodutivo organizado, nutrição ajustada, manejo calmo no curral, deve-se garantir que cada etapa da IATF seja realizada criteriosamente, conforme as recomendações técnicas. A escolha da estratégia depende do sistema produtivo da fazenda e da categoria animal. Segundo Rogério Peres, normalmente no grupo de novilhas precoces se trabalha com 2 IATFs + repasse; nas convencionais, 1 protocolo + repasse; nas primíparas, 2 ou 3 IATFs + repasse; nas secundíparas e multíparas “do cedo”, 1 IATF + repasse; nas secundíparas e multíparas “do tarde”, 2 IATFs e, se der tempo, repasse. Evidentemente, a fazenda pode optar por não usar touros, como é o caso da Santa Tereza, de Camapuã, MS, que apresentamos nesta reportagem. Alguns cuidados, como fazer check-list operacional diário (para garantir que nada está sendo feito errado ou ficando para trás); manter um inventário das palhetas

Referências de Escore de Condição Corporal (ECC)

ECC – 2,0 ECC – 2,5 ECC – 2,75

ECC – 3,0 ECC – 3,5 ECC – 3,75

Nutrição influi decisivamente na prenhez por IATF

Categorias de fêmeas

Novilhas Induzidas Novilhas Primíparas Secundíparas Multíparas

Proporção c/ ECC ≤ 2,75

19,9% 26,0% 50,1% 42,0% 44,5%

Taxa de Prenhez à IATF

46,9% 47,1% 42,7% 52,3% 52,5%

Proporção c/ ECC ≥ 3,0

80,1% 74,0% 49,9% 58,0% 55,5%

Taxa de Prenhez à IATF

49,7% 50,6% 52,8% 56,6% 56,9%

Diferença de Prenhez

2,8% 3,5% 10,1% 4,3% 4,4%

de sêmen para que possam ser localizadas facilmente no botijão, não expô-las excessivamente à temperatura ambiente; usar apenas sêmen de qualidade (testado); iniciar o trabalho de IATF sempre no mesmo horário; caprichar nos registros; verificar se houve perda de dispositivo intravaginal e manter boas práticas de higiene também ajudam a garantir melhores resultados.

Outro cuidado é adotar um protocolo sanitário específico para cada rebanho (os desafios mudam de uma região para outra). Deve-se monitorar as perdas gestacionais, para estabelecer medidas preventivas, como a aplicação de vacinas reprodutivas. “Pelo ultrassom, dá para saber quantas fêmeas estão perdendo a gestação e quais as categorias mais atingidas (novilhas, primíparas, multíparas), para se tomar decisões. Se a perda é de 1%, por exemplo, não precisa vacinar, mas, se é de 5%, vale a pena”, diz Edmundo Villela, da Lageado Consultoria, com sede em Mineiros, GO. Márcio Marques, da Geraembryo, PR, recomenda o uso da vacina reprodutiva preventivamente, pelo menos em novilhas e primíparas (categorias mais atingidas). “A perda gestacional é multifatorial, pode ser causada por vírus ou má nutrição, por exemplo, mas, quando ocorre entre 30 e 60 dias de gestação, normalmente está ligada às doenças IBR e BVD”, explica o técnico. Nas multíparas, ele também adota 5% como parâmetro para a vacinação, praticada em 90% das 32 fazendas que a empresa atende.

A IATF é, hoje, uma balizadora gerencial da propriedade”

José Luiz Moraes de Vasconcelos (Zequinha), da Unesp

ESPECIAL

Genética e Reprodução Protocolo ajustado à fazenda

Vacas Brangus da Fazenda Santa Tereza, MS, com bezerros de 30 dias ao pé.

Em 2010, o pecuarista Amaury Bernardes Filho decidiu tirar os “touros” de seu sistema de produção e trabalhar apenas com IATF (dois ou mais protocolos na mesma estação de monta), para aumentar a quantidade de bezerros provenientes de inseminação, além de reduzir custos, em sua fazenda de cria, a Santa Teresa, no município de Camapuã, MS (sua outra propriedade, a Santa Maria, em Sidrolândia, é de recria/ engorda). “Percebi que, com duas IATFs, sobravam poucas prenhezes de monta natural. Naquele momento, eu pensei: vale a pena manter touro para emprenhar meia dúzia de vacas? A resposta foi não”, lembra o produtor. Ele decidiu, então, aplicar o capital antes investido na compra de reprodutores na contratação de uma consultoria técnica especializada, para definir um bom protocolo reprodutivo e fazer uma escolha mais criteriosa de material genético, direcionado à produção de animais superprecoces da raça Brangus, para terminação em confinamento.

Com o auxílio da MS Reprodução de Bovinos, de Campo Grande (MS), Amaury fez uma análise detalhada do perfil genético de seu rebanho e passou a investir em sêmen de alta produtividade para características maternas, como precocidade sexual e fertilidade, sem esquecer das paternas, ligadas principalmente ao desempenho e qualidade de carcaça. Wendell Oliveira, médico veterinário e diretor da MS Reprodução, diz que as DEPs de acabamento e peso de carcaça têm hoje peso fundamental na escolha do sêmen, já que animais jovens, terminados em confinamento, podem apresentar problema de deposição de gordura subcutânia. “Nosso objetivo final é garantir que a fazenda continue obtendo as bonificações por qualidade de carcaça hoje existentes”, explica o veterinário.

A fazenda usa sêmen de seis a oito touros por estação de monta, escolhidos pela avaliação intrarebanho das matrizes. A maioria desses touros são bem classificados no Concept Plus, programa da Alta Genetics que avalia reprodutores pela taxa prenhez à IATF de suas filhas. Amaury também usada sêmen de touros Brangus bem avaliados nas provas argentinas, genética que tem ocupado cada vez mais espaço na Santa Tereza por garantir um biotipo funcional, ou seja, animais de menor “bitola” (frame) e maior resposta à precocidade.

Protocolo ligeiro e funcional

Para acelerar a produtividade, a Santa Tereza tem usado manejo nutricional capaz de garantir ganhos contínuos. Na fase de amamentação, os animais recebem suplemento em creep feeding, para potencializar o peso à desmama (a média dos machos, hoje, é de 280 kg). A recria é feita a pasto, entre os meses de maio e junho, com suplementação na proporção de 0,1%- 0,3% do peso vivo em proteico-energético, dependendo do regime de chuvas. Esse protocolo nutricional permite que os machos cheguem rápido à terminação (novilhos precoces) e as fêmeas fiquem aptas à inseminação com 13-14 meses. O índice de prenhez final da fazenda gira em torno de 85%, o que a destaca entre as médias do Grupo Gerar, no MS.

Desde 2013, a fazenda faz ressincronização precoce, manejo reprodutivo que permite elevar a taxa de inseminação em curto espaço de tempo. O implante é colocado em 100% das fêmeas, antes mesmo do diagnóstico de gestação. Isso permite à Santa Tereza realizar três inseminações em 68 dias, uma antecipação de 14 dias, em comparação com o protocolo convencional, que dura, em média, 82 dias. “Se considerarmos o efeito acumulativo de 14 dias por safra ao longo dos anos, conseguimos puxar significativamente os nasci

mentos para mais cedo”, observa o diretor da MS Reprodução.

A fazenda tem um plantel de cerca de 1.000 matrizes, produzindo, anualmente, uma média de 400 machos. Destes, 65% nascem entre julho e agosto, número que deve crescer nos próximos anos. “Os bezerros do cedo chegam a pesar 40 kg a mais do que os do tarde”, calcula Bernardes. Além de terem desempenho superior na recria (o que os coloca na posição de “cabeceira”), esses animais também apresentam maior capacidade de ganho de peso na fase de terminação em confinamento. Os machos nascidos no cedo são abatidos aos 13-14 meses, com média de 511 kg, enquanto os que nascem tarde são terminados somente no ano seguinte, aos 18-20 meses, com 580 kg, em média.

Além das matrizes ⅜ Brangus, o produtor também insemina algumas vacas Nelore com Angus, para produzir fêmeas F1. Segundo o pecuarista, o resultado da engorda não deixa dúvidas quanto ao melhor desempenho dos bezerros do “cedo”, que na safra passada tiveram ganho médio diário de 1,450 kg/cab/dia em 140 dias, e obtiveram bonificação de 5% sobre o valor da arroba. Já os machos nascidos em setembro/outubro ganharam 600g/cab/dia e demoraram mais meses para ser abatidos. “A grande vantagem desse sistema de produção é que 95% dos animais do cedo vão sair da fazenda na mesmo ano em que desmamaram (ciclo curto). Isso significa antecipar a boiada e dar giro à fazenda”, resume Oliveira. No caso das fêmeas, o processo é inverso. A cabeceira é mantida na fazenda para reposição, enquanto o fundo é destinado à recria e confinamento.

Equipe ajustada

De acordo com o veterinário da MS Reprodução há várias medidas que, combinadas, têm aumentado o número de bezerros nascidos com os carimbos sete (julho) e oito (agosto) na Fazenda Santa Tereza. Há vários anos, Amaury Bernardes investe no treinamento da equipe para potencializar os resultados na IATF. Tudo é anotado, desde o começo até o términio do protocolo. Um dos grandes diferenciais da equipe é a eficiência na aplicação dos fármacos, muitos deles de dosagem mínima. “Alguns têm apenas 0,3 ml em sua composição. Se o funcionário perde 0,1 ml por má aplicação, o que em tese não é nada, se perde 33% da dose. E isso é muito para um protocolo de IATF”, alerta o técnico. Na Santa Tereza, a baixa concepção por erros como esse já não acontecem mais. “Os funcionários seguem rigorosamente o que preconizamos e isso faz muita diferença ao final do processo”.

Toda equipe é treinada visando o manejo racional dos bovinos. Para organizar a inseminação, a fazenda trabalha com lotes pequenos, processando uma média de 60 vacas por hora. As fêmeas chegam no curral, no dia da inseminação, por ordem específica e com tempo cronometrado para cada serviço, processo chamado de

fluxo de inseminação. “Meu inseminador sabe quanto tempo tem para aquele lote”, diz Oliveira. O manejo racional também preconiza que as fêmeas não fiquem muito tempo na seringa do curral. O ideal é que aguardem em uma remanda e sejam conduzidas de duas em duas ou de três em três para o tronco de contenção, o que facilita a vida do inseminador.

Oliveira assegura que a maior dificuldade na execução de um protocolo reprodutivo é fazer com que os funcionários envolvidos entendam sua importância no processo. Para treinar (e motivar) os peões que dão apoio aos inseminadores da MS Reprodução nas fazendas, o consultor organiza há 10 anos um evento anual de apresentação de resultados, que conta com uma programação técnica voltada exclusivamente para eles. “A minha equipe executa o trabalho da IATF, mas a rotina quem faz são eles. Por isso, é importante capacitá-los. Eu posso contratar o melhor inseminador do Brasil, mas, se o manejo de pasto e a aplicação dos medicamentos não estiverem corretos, eu perco a possibilidade de obter o melhor resultado”, salienta. Nos últimos quatro anos, a Santa Tereza conquistou o prêmio Ouro dentre as 30 propriedades assistidas pelas MS Reprodução Bovina no Estado.

Animais de recria são suplementados na proporção de 0,1% a 0,3% do PV

Moisés Júnior e Wendell Oliveira, da MS Reprodução Bovina, com Amaury Bernardes (de chapéu): parceria eficiente.

ESPECIAL

Genética e Reprodução Alto desempenho na 1ª IATF

Animais no pasto irrigado: produção de 80@ de bezerro/ha/ano

A IATF organiza tudo de forma sistêmica na cria”

Júnior Athaýde, Fazenda Rio Verde

AFazenda Rio Verde, localizada no município de São João da Ponte, no norte mineiro, trilhou um caminho diferente para atingir eficiência reprodutiva em uma região desafiadora: fazer apenas uma inseminação em tempo fixo, seguida por observação de cio (prática excluída das fazendas que fazem IATF) e repasse com touros. Com isso, tem obtido média final de prenhez em torno dos 86%, nos últimos anos. O modelo funciona, segundo ele, porque sua propriedade não é muito grande (980 ha) e sua equipe muito experiente na condução das 500 matrizes em produção. “Tenho funcionários que trabalham comigo há mais de 20 anos. O olho é bem treinado”, brinca Junior que não abre mão da IATF porque ela lhe permite manter uma estação de monta definida (de 90 dias), e também concentrar os nascimentos.

Nos últimos anos, a Fazenda Rio Verde atingiu índice de 70% na primeira inseminação, percentual muito acima da média das fazendas do Gerar, que é de 51% Esse resultado lhe garante 50% de animais nascidos em setembro (início da estação de parição), 40% em outubro e apenas 10% em novembro (final da estação). “Com isso conseguimios concentrar os nascimentos na melhor época do ano e também concentrar a próxima IATF. Tudo se organiza de forma rotativa e positiva”, observa o veterinário Josefino Mendes Neto, da Produboi Consultoria Pecuária, empresa que presta assistência veterinária à fazenda.

A Rio Verde utiliza um protocolo de IATF com quatro manejos, em matrizes com condição corporal entre 3 e 4, considerando-se uma escala de 1 a 5. Hoje, todas as fêmeas nascidas na Rio Verde são desafiadas aos 14 meses, com taxa de prenhez em torno de 80%. Os machos são recriados até os 18 meses, quando passam por avaliações genéticas de sobreano, visando à produção de tourinhos. Junior Athayde faz seleção de Nelore há vios anos, tendo participado, inclusive, da criação da Cia de Melhoramento em 2014. Comercializa touros PO e Ceip (certificado especial de identificação e produção), buscando unir caracterização racial com altos índices de desempenho. Seus critérios de seleção são: precocidade sexual, habilidade materna, qualidade de acabamento, docilidade e temperamento, peso ao sobreano e fenótipo.

“Meu objetivo é fazer uma pecuária de ciclo curto”, resume o produtor, que escolhe para reposição do plantel apenas novilhas que emprenham cedo.

Irrigação é aliada

Parte dos bons resultados obtidos por Júnior na

IATF se devem à qualidade das pastagens. Há cerca de cinco anos, ele investe em irração, para enfrentar o clima difícil do norte mineiro. Em 2015, instalou um primeiro pivô, para irrigar 30 ha e teve de colocar nele 25 UA/ha, por causa da seca. “O plano, naquele momento, era tirar a fazenda do sufoco e, por isso, a lotação era altíssima. Colocávamos 300 vacas de manhã na área e tiravamos na hora do almoço, para colocar outras 300 à tarde, que comiam até o jantar”, conta o produtor. Com esse esquema, ele conseguiu suprir metade da exigência nutricional dos animais. Em 2016, ele instalou na fazenda um segundo pivô, para irrigar 40 ha. Hoje, a lotação na área irrigada é de 8 UA/ha e o produtor vem investindo na reforma de pastagens de sequeiro para ter uma lotação média geral de 1 UA/ha. “Estamos no semiárido; para nós, o pastejo intensivo ajuda muito nos resultados da IATF”. Nos 70 ha irrigados da Rio Verde (7% da área total), Júnior Athayde produziu 80 @ de bezerro/ha em 2019. Sua taxa de desmama é de 78%. Os bezerros são separados da mãe com 8,3@ e as bezerras, com 7,5, aos 7 meses de idade. Não é tão simples fazer cria, contudo, em área irrigada. Nos primeiros anos, Júnior chegou a amargar perdas de até 6% dos bezerros nascidos (30 de um total de 500), devido à diarreia neonatal, que é favorecida pela umidade nas áreas irrigadas.

O produtor se viu obrigado a investir em vacinação específica, o que reduziu a incidência do problema nos anos seguintes (menos de 1% em 2019), mas gerou custos. “Quando se intensifa a produção, tem-se também maiores desafios sanitários, nutricionais e genéticos”, salienta Júnior, que alerta para os prejuízos indiretos do problema: “Mesmo que o animal se recupere, ganhará menos peso e será abatido mais tarde”. Hoje, ele aplica uma dose da vacina contra diarreia neonatal nas vacas quatro semanas antes do parto; e duas doses nas novilhas (oito e quatro semanas pré-parto). “Prevenir sai mais barato”, sentencia. n

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