Macroprocessos em Gestão de Pessoas - Aula 06

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MACROPROCESSOS EM GESTÃO DE PESSOAS AULA 06 GESTÃO DA MUDANÇA

AULA 06 - GESTÃO DA MUDANÇA

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CRIATIVIDADE, INOVAÇÃO E MUDANÇA Ainda que conceitos interligados, cada um deles tem um significado diferente e, frequentemente, estão dissociados. É clássico o caso da relojoaria suíça, em que a criação do relógio a quartz pelos próprios suíços, somente foi introduzida no mercado por americanos e japoneses. De um lado, a resistência a novas ideias, de outro, a resistência a ter de passar pela mudança. Explico, muitas empresas conseguem inovar ao lançar produtos novos no mercado. Contudo, não conseguem proceder a mudanças na própria organização, as alterações no seu modo de ser. Vemos, então, 2 tipos de resistência à mudança, aquela que recusa o novo, pura e simplesmente, e a que recusa ser “mudada”, transformar-se em uma instituição diferente ou com sistemas ou processos de trabalho novos. Assim, falar em mudança é diferente de falar em criatividade ou inovação. Estamos abordando, aqui, a transformação organizacional pela qual instituições passam e que modificam o seu modo de atuar. Pode ser uma nova estrutura organizacional, com novas atribuições para determinados cargos e pessoas, nova distribuição de poder e prestígio e um novo sistema de remuneração, baseado em desempenho efetivamente comprovado, como a remuneração variável, ou outro qualquer. As modificações intra-organizacionais são as que nos interessam e que tem maior dificuldade de serem implantadas. Alguns estudos apontam que a maioria das iniciativas visando à introdução de mudanças nas organizações fracassa, no todo ou em parte. Alguns projetos sequer saem das prateleiras, outros são implantados somente em parte. E, ainda, há os que são implantados de maneira diferente daquela como foram concebidos. De um ou outro modo, vemos a maioria dos projetos deixando de acontecer, pelo menos da maneira programada. A transformação organizacional se dá quando um novo comportamento é praticado por todos aqueles envolvidos com o projeto de mudança. Ela pode ocorrer de diferentes maneiras: •

De modo natural;

Por meio do uso do poder;

Planejada.

A mudança natural ocorre quando a transformação tem lugar sem que haja uma percepção do que ocorreu ou sem intervenção planejada da organização em que ela teve lugar. É o caso de padarias e mercearias que, aos poucos, vão crescendo e se transformando em mercados e supermercados, bancas de revistas que vão ampliando seus negócios e passam a trabalhar com produtos alimentícios e outros.

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Um exemplo de maior expressão é o caso do Hospital de Clínicas, em um estado

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do sul do país, em que a sua missão mudou, sem que seus dirigentes percebessem. Criado inicialmente como um hospital escola, para que os residentes, alunos adiantados, pudessem iniciar a pratica da medicina, ele atende hoje a maior parte da população carente e, inclusive, pacientes de todos os níveis sócio-econômicos, devido à alta competência de diversas de suas equipes. A mudança da missão e de clientela, passando a ter maior importância o seu papel como hospital para atendimento à população carente que como hospital-escola, sequer foi percebido pelos seus dirigentes maiores, a Reitoria e o Conselho Universitário, ao qual o Hospital é subordinado. E, mais ainda, quando confrontados com essa nova realidade, recusaram-se a admitir que a mudança havia ocorrido, insistindo que o papel, a missão, do hospital era formar médico. A mudança imposta, com o uso do poder, acontece quando a direção de uma organização determina qual a nova forma de atuar da instituição. Às vezes, projetos dessa natureza funcionam, sendo implantados sem dificuldade. Isso ocorre, na maioria das vezes, quando a cultura é de obediência à hierarquia e às determinações emanadas daqueles que detém o poder. Curiosamente, ocorre em culturas conservadoras, em que a subordinação às determinações, às regras e à burocracia é seguida à risca. O poder advindo das autoridades dele investidas não é contestado. Contudo, isso não é sempre verdadeiro. Ocorreu, a alguns anos, de um projeto de reorganização administrativa ser implantado, de modo impositivo, em um estado do país conhecido por seu conservadorismo. O estabelecimento ocorreu da melhor maneira possível, tendo sido verificado que houve uma mudança de comportamento exatamente na direção desejada, com os funcionários públicos passando a trabalhar dentro da nova estrutura, sem a menor dificuldade. Esse mesmo modelo e abordagem de reorganização administrativa, com a condução do mesmo consultor, foi aplicado em um outro estado do país, já consagrado, inclusive, pelo êxito da implantação anterior. Contudo, para surpresa geral, o projeto não chegou a ser enraizado, apesar de ter passado na Assembleia Legislativa do Estado. A cultura, nesse local estava acostumada a questionar e a participar de decisões, mesmo quando não tivesse maior influência sobre o rumo tomado. A condução do projeto a ser implantado não levou esse fato em consideração. A mudança planejada se caracteriza pelo exame e mapeamento do cenário organizacional, dos fatores operacionais, logísticos e psicológicos, definindo ações geradoras das competências necessárias, da sua aceitação, da predisposição e à implementação da mudança e sua perpetuação.

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Criatividade, inovação e mudança são diferentes. A capacidade de criação manifestada por algumas organizações não significa a capacidade de inovar e de introduzir a criação no mercado ou na própria instituição. Por outro lado, essa capacidade quanto ao produto da criação não significa que a empresa seja capaz de perpetuar um novo comportamento no mercado. Finalmente, a própria capacidade de inovar e provocar mudança nos hábitos de clientes ou da população não significa que a organização seja capaz de sofrer mudança. Ou seja, pode ser que ela seja ótima agente de mudança sem que ser facilmente “mutável”.

O caso mais dramático é o da introdução e perpetuação do relógio a quartz, como nova tecnologia para marcar o tempo. Por mais surpreendente que possa parecer, os próprios suíços foram os seus inventores e criadores. Contudo, eles somente o exibiram como uma curiosidade, jamais explorando suas reais possibilidades de produção e comercialização. Mas os japoneses e americanos, com maior capacidade para perceber as possibilidades dessa nova tecnologia, cuidaram de patentear a descoberta. Inovaram, lançando o produto no mercado e mudaram o comportamento dos consumidores, que deixaram de ver nos relógios suíços os melhores e mais versáteis ou os mais sofisticados marcadores de tempo. A rigor, a reação a mudar foi dos próprios fabricantes, que não se dispuseram a modificar todo o seu sistema de produção apostando e investindo no novo. O que quase quebrou a relojoaria suíça, que hoje usa, em muitos de seus relógios suíços, motores produzidos, “powered by Honda”. Muitas empresas, preferem pagar a outras por descobertas e fazer doações para universidades que desenvolvam pesquisas em linhas de produtos que lhes interessam, a ter seus departamentos de pesquisa.

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O PROJETO DA MUDANÇA 1.

Avaliação do Projeto, quanto ao conteúdo a ser implantado;

2.

Avaliação da condução do Projeto, em seu conteúdo;

3.

Depuração do Projeto;

4.

Aperfeiçoamento do Projeto.

Avaliação do projeto e de sua condução e possíveis razões de fracasso:

• Falta de avaliação do ambiente, quanto a sua estrutura, cultura, objetivos reais desejados, etc.: A falta dessa avaliação pode levar a equívocos que tragam consequências desastrosas para a tentativa de mudança. O desconhecimento estrutural pode fazer com que as alterações propostas deixem de ser implantadas por impossibilidades reais. Por exemplo, tentar se estabelecer um sistema de remuneração variável, orientado para metas em uma estrutura excessivamente burocratizada por causa do excesso de normas e procedimentos restritivos à iniciativa, e uma cultura voltada para a própria burocracia, criará resistência a essa perspectiva. Finalmente, os objetivos declarados podem ser diferentes dos efetivamente desejados. Ocorre, eventualmente, de uma organização contratar um projeto para implantar uma mudança, mas desejar algo diferente do especificado. As expectativas são diferentes das especificações. É o caso de empresas que contratam a própria remuneração variável mencionada, mas que desejam efetivamente o aumento de salário. •

Ouvir ou confiar demais nas informações do cliente:

Ocorre de os responsáveis por um projeto se basearem somente nas afirmações ou opiniões de uma pessoa dentro da organização. Isso é muito perigoso, porque ela pode passar as suas impressões e essas não corresponderem à realidade. •

Não ouvir o cliente:

Inverso ao caso anterior, ocorre com algumas consultorias que acreditam ser “donos da verdade”. São organizações bem-sucedidas e que creem ter a resposta para toda situação e em qualquer empresa. O que pode levar ao fracasso, tanto pelo desconhecimento de fatos que podem ser relevantes, como pela antipatia que pode provocar e a resistência, então, decorrente. •

Excesso de inovação:

Novas tecnologias ou métodos que demandarão competências fora do alcance. Ou, desnecessárias, às vezes, o consultor se sente tentado a experimentar uma tecnologia

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de ponta ou um método ou abordagem que ainda se encontra no estado da arte. E, ainda, que está em uma realidade muito diferente daquela da organização, sendo impossível dar esse passo, o qual pode ser grande demais para a organização. Um triste exemplo é o de empresas que faliram tentando se preparar para competir pelo Prêmio Nacional da Qualidade, nos Estados Unidos. O investimento para tal teve de ser imenso, devido ao distanciamento do seu estágio de desenvolvimento e o qual almejavam. •

Falta de inovação suficiente para apresentar ganhos significativos:

Ocorre quando não há ganhos aparentes a serem obtidos pela implantação da mudança. •

Projeto mal delineado, mal desenvolvido:

Por alguma razão, o consultor ou a equipe responsável não foi feliz no projeto gerado, seja por falhas no modelo escolhido ou por falhas na elaboração do projeto detalhado. •

Expectativas exageradas de resultados:

Quando ocorre de a equipe responsável estimar equivocadamente os ganhos de um projeto. A avaliação exagerada pode gerar descrença dos profissionais da empresa quanto à honestidade ou competência da equipe. •

Resultados prováveis muito abaixo das expectativas:

Desânimo e descrédito na capacidade da equipe de gerar bons projetos ou de os implantar. •

Relacionamento disfuncional ou de desconfiança:

Ocorre, eventualmente, de ser criado um clima desfavorável entre a consultoria, seja ela interna ou externa, ainda que mais facilmente com a externa, o que pode gerar dificuldades enormes tanto na condução do projeto quanto na sua implantação.

Para que se possa ter boas probabilidades de sucesso na implantação de uma mudança, é fator da maior relevância a qualidade real e percebida do projeto. De modo a assegurar esse padrão, deve-se procurar eliminar todas as falhas do processo, desde a sua concepção até o seu detalhamento. E, também, atentar para a condução do processo, a fim de evitar a falta de cooperação ou a resistência ao produto gerado. Por fim, deve-se proceder à melhoria do projeto a partir das críticas e recomendações da organização e das novas proposições dos próprios técnicos.

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Uma organização do terceiro setor e de grande porte, tentou introduzir normas e procedimento-padrão otimizados, para a gestão de seus processos AMP, Análise e Melhoria de Processos. Durante o desenvolvimento do trabalho, aconteceu todo tipo de problema: •

Falta de avaliação do ambiente

A equipe não teve tempo ou condições de realizar um trabalho de mapeamento, uma vez que a organização contratante optou por remover essa etapa, em função dos custos envolvidos. Isso fez com que a equipe de consultoria fosse “descobrindo” ou mapeando a organização enquanto já estava realizando o trabalho, gerando diversos equívocos e, inclusive, o encaminhamento de alguns processos em uma direção indevida, que contrariava a cultura da instituição. •

Ouvir o cliente, unicamente, ou deixar de ouvi-lo

No início, a organização, por dificuldades de agenda de seus executivos, deixou que todas as informações fossem passadas para a equipe de consultoria por intermédio de uma pessoa. Ela procurou influenciar os trabalhos no sentido de privilegiar sua posição e os processos em que estava envolvida. Criou-se, assim, um problema quando os outros executivos foram chamados para validar o novo processo. Inversamente, parte da equipe deixou de ouvir essa fonte, ao perceber a intenção daquele interlocutor da instituição. Afastando, com isso, essas pessoas da realidade da organização, o que também prejudicou o trabalho e foi detectado pela avaliação feita posteriormente. •

Excesso de inovação.

Cogitou-se a aquisição de um software para utilização pela empresa, o qual, além de ter custo muito alto exigia equipamento, hardware, com especificações que extrapolavam o que a empresa dispunha. Decidiu-se por tecnologia menos sofisticada. •

Falta de inovação.

Houve situações em que as inovações oferecidas não apresentavam praticamente nenhum ganho em relação aos processos e procedimentos anteriores. Foram abandonadas, permanecendo-se com os meios já existentes. •

Projeto “ruim”.

Em determinados momentos, foi necessário rever alguns processos, porque alguns haviam ficado muito complexos e outros muitos extensos, sendo necessário desdobrá-los.

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Todos eles foram submetidos ao estudo de um grupo de colaboradores da organização, onde eles apontaram os pontos fracos e que foram corrigidos . •

Expectativas exageradas de resultados, ou muito baixas

A organização já havia passado por um processo semelhante e as expectativas eram baixas, na realidade, uma vez que a experiência tinha sido negativa. As consequências são 2, a primeira é que as perspectivas tendem a ser baixas e, em tese, qualquer projeto apenas razoável é bem aceito. A outra consequência, contudo, é o descrédito nessa nova iniciativa, o que gera resistência inercial , passividade ao invés de cooperação. •

Relacionamento disfuncional ou de desconfiança

Um dos problemas ocorridos no desenvolvimento desse projeto foi que a pessoa, que exercia uma coordenação ligada à uma área que era objeto de intervenção mais expressiva, estava sob indícios de desligamento da organização. Ela passou a ver como ameaça um dos técnicos da consultoria, o qual tinha algumas competências exatamente na área em que trabalhava o funcionário que estava com desligamento iminente. Com isso, o empregado passou a “trabalhar contra”, buscando desqualificar aquele técnico da consultoria e, por extensão, a própria consultoria. Infelizmente, o técnico teve de ser afastado daquele projeto, para se evitar um conflito maior. A depuração do projeto se fará com a colaboração dos seus críticos e daqueles que querem participar da construção de um novo. Ela consiste em identificar os pontos fracos e os eliminar. Nesse caso, o processo foi conduzido pela participação dos executivos e pessoas envolvidas na avaliação do projeto. O aperfeiçoamento se fez pela inclusão de sugestões do grupo, assim como pelos estudos e propostas dos próprios técnicos, aceitas pela organização.

A GESTÃO E O PROCESSO DA MUDANÇA 1.

Levantamento de cenário interno;

2.

Definição da estratégia e ações de preparação da mudança;

3.

Condução da preparação;

4.

Implantação da Mudança.

LEVANTAMENTO DE CENÁRIO INTERNO Para efeito do levantamento de cenário devem ser examinados os componentes do processo da mudança organizacional. Eles são:

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A Peça: O conteúdo ou o projeto da Mudança propriamente dito;

O Palco e o Cenário;

Dinâmica: situação atual, situação prevista, a transição;

Atores e papéis.

A PEÇA: Anteriormente, foi examinado o conteúdo da mudança. Como dito, com um projeto de qualidade fica mais fácil à gestão da mudança, a medida em que as eventuais resistências àquilo que se está tentando introduzir na organização não deverão existir. A modificação se faz com maior naturalidade e facilidade. Assim, todo o empenho deve ter lugar para fazer com que o projeto seja da maior qualidade. Podemos dizer, ainda, que alguns passos devem ser seguidos, para a análise da “peça”: • Exposição do projeto a um grupo de pessoas que possam o analisar de diferentes ângulos, aos stakeholders; •

Simulação do funcionamento do modelo, em condições “de laboratório”;

Exposição ao grupo crítico;

Introdução dos aprimoramentos recomendáveis;

Teste piloto, em uma loja, etc.;

Implantação gradativa, em um setor, departamento, etc.

O PALCO E O CENÁRIO: O Palco – O Perfil da Organização A estrutura organizacional e normativa é representada pelo seu organograma, por seu modelo de gestão, seus indicadores de desempenho e por sua estrutura normativa. A maior ou menor rigidez da estrutura, mais burocrática ou que facilite a busca de resultados, mais ou menos horizontal, com responsabilidades concentradas ou difusas, são pontos a serem avaliados. A Filosofia Organizacional: a eventual partição e isolamento de funções organizacionais, com claras divisões políticas e psicológicas entre as áreas, unidades ou níveis, dificultando processos de mobilização mais amplos. As Políticas: as parcerias e a influência dos stakeholders .E, a Filosofia Gerencial: a orientação para resultados ou a preocupação com o seguimento estrito de normas e procedimentos.

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O Cenário: Cultura e Clima A cultura da organização se refere a características mais estabilizadas, quase que permanentes, enquanto o clima ao momento em que a organização se encontra. Eventualmente, instituições que tem uma cultura “mutante” se encontram em uma situação de clima desfavorável, por circunstâncias especiais. Nesse caso, basta aguardar a passagem dessa condição a fim de se proceder a uma mudança que esteja para ser implantada. Em outros, a questão é mais complexa, quando envolve uma cultura resistente à mudança. São organizações que tiveram experiências negativas, no passado e criaram anticorpos, defendendo-se de ameaças de iniciativas que possam ser prejudiciais a elas. • Histórico: experiências passadas com mudanças, visivelmente da mesma natureza, como ceticismo, repulsa, naturalidade e resiliência . • Cultura: Sintonia com o modelo novo, alinhamento, cultura vitoriosa versus cultura derrotada, reengenharia, qualidade, etc. •

Sinergia: inexistência de castelinhos, comunicação fluente e visão compartilhada.

• Pressão: avaliação dos níveis de estresse a que os colaboradores da organização estão submetidos. A DINÂMICA: SITUAÇÃO ATUAL, SITUAÇÃO PREVISTA, A TRANSIÇÃO Para o estudo da dinâmica, “o olho do furacão”, é necessário avaliar cuidadosamente os seus 3 momentos: o agora, que é a situação atual, o depois, a situação futura, e o momento de transição, referente ao durante. Essas três etapas têm de ser estudadas quanto aos aspectos substantivos, o que ocorre, e quanto aos adjetivos, a percepção que as pessoas tem deles. As metodologias para uso desse modelo trabalham com o conceito da crise, de Michel Crozier e outros, e com os princípios behavioristas da mudança de comportamento, recompensa e reforço. Eventualmente, inclusive, os princípios pavlovianos de punição, para extinção de comportamentos, também são utilizados, ainda que com grande relutância das organizações.

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O quadro representativo desse modelo se encontra a seguir:

Observamos os 3 momentos: existente ou presente, de transição ou do “durante” e projetada ou futura. Além dos níveis de desconforto, desejado, de esforço, não desejado, e de atratividade, desejado. As setas verdes indicam uma situação ideal, em que as pessoas estão extremamente insatisfeitas com a situação presente e acreditam que passar para a situação nova será facílimo e que ela será excelente. Os sinais de PARE, por outro lado, indicam ser uma temeridade tentar uma mudança, naquelas condições. Esse quadro é válido para cada um dos atores, como veremos a seguir, assim como para o conteúdo, a PEÇA, o PALCO e o CENÁRIO. Nessas condições, com relação à situação presente o quanto pior é melhor. A aversão pronunciada ao que se passa na organização é um ótimo começo para se querer mudar. Por outro lado, caso o projeto de inovação, seja quanto ao seu conteúdo real ou quanto à percepção que as pessoas têm dele, não for atraente, as pessoas tenderão a se contentar com o existente. Mudar, para quê? Se não há melhora aparente. Por fim, quando o esforço para a implantação de um novo projeto, sistema ou método de trabalho é muito grande, há uma tendência para a fuga dele. O medo do insucesso em um processo de desenvolvimento de competências necessárias para se operar nesse novo sistema, o receio de que as horas a serem despendidas sejam excessivas são, entre outras, razões para se evitar a mudança. A organização deverá usar os recursos de que dispuser para fazer com que as condições sejam as mais favoráveis à sua aceitação.

Definição da estratégia e ações de preparação da mudança:

São estratégias para se manipular as condições dessa dinâmica e desse quadro de

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forças, que devem ser trabalhados para se conseguir uma transição tranquila: •

Ações que aumentam a adesão ao novo;

Ações que reduzem a ansiedade com relação à transição;

Ações que provocam desconforto com a permanência do modelo ou sistema atual;

Esclarecimento sobre os pontos fracos, as ameaças à organização e à manutenção do emprego, do sistema existente e dos pontos fortes, as oportunidades, do novo. Esclarecimentos para remoção do desconforto quanto à novidade, à mudança e à geração de desconforto quanto ao sistema atual; O sistema de consequências, envolvendo políticas e diretrizes, bem como práticas de RH a ser elaborado, devem privilegiar o novo, em detrimento do atual. O sistema de gestão da organização, com seus indicadores de desempenho, também; Carreira, “enriquecimento do cargo” , job enrichment, remunerações variáveis são possibilidades de atração para o novo modelo, prêmios e conquistas; Paralisação na empresa ou desligamento são medidas punitivas a serem associadas com o atual, sem desconforto e crise, é mais difícil mudar. OS ATORES São basicamente 4 os atores que atuam: •

O patrocinador ou patrocinadores;

Os líderes;

Os agentes;

Os alvos.

O patrocinador é aquele que comanda a compra, a introdução do novo na organização. É o dono, o Presidente, o dirigente a determinar que uma intervenção terá lugar. Conforme ele seja fraco, sem prestígio ou credibilidade, ele pode fazer com que um projeto possa nascer com dificuldades. Nesse caso, convém buscar um outro patrocinador para o projeto, internamente. Pior que essa situação é quando o ele não quer a mudança. Ou seja, ele contrata uma consultoria ou cria um comitê para desenvolver um projeto, apenas para dar a impressão de que está tomando providências a respeito de um determinado assunto. Isso pode ser para cumprir uma promessa aos seus empregados ou a um parceiro, para dar a impressão de modernidade e, assim, impressionar a terceiros, ou outra razão igualmente

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mediana. O líder ou líderes do projeto devem ser pessoas com perfil adequado, com determinação, empenho e que tenham tempo disponibilizado para o projeto, por determinação do patrocinador. Tem de liderar equipes, propagar ideias e motivar pessoas. Devem ser escolhidos com muito cuidado. Os agentes da mudança são aquelas pessoas que estarão envolvidas com as operações, ações e tarefas necessárias para a implantação do novo. Devem ter um grau mínimo de motivação, que pode ser, inclusive, um bônus pelo resultado, e o treinamento necessário. Os alvos da mudança são todos os atingidos por ela na organização. Inclusive, o patrocinador. Todos devem estar informados, no momento certo e prévio, de que terá lugar uma mudança, conhecendo as características e benefícios dela por meio do patrocinador ou dos líderes, de modo a se evitar versões equivocadas ou mal-intencionadas do que seja o projeto. Um outro ponto a ser mencionado, igualmente importante, é quanto a certos fatores que influenciam sensivelmente a postura das pessoas quanto às mudanças. Tratase de algumas medidas que fazem com que as pessoas tendam a resistir ou colaborar mais com mudanças. Esses traços são fatores essenciais para a predisposição, ou não, ao projeto da mudança: Fatores essenciais: •

PRESTÍGIO,

PODER,

ESTABILIDADE/SEGURANÇA.

Esses aspectos, identificados por Crozier como sendo cruciais para a decisão de apoio ou resistência à mudança, devem ser considerados com atenção, para se estabelecer, eventualmente, bases à negociação. Ou seja, para perdas em algum dessas características, deve-se buscar oferecer alguma compensação.

A esses 3 fatores podem ser acrescentados os seguintes:

FINANÇAS OU REMUNERAÇÃO;

RELACIONAMENTO COM TERCEIROS.

Deve-se observar que as organizações vêm buscando colaboradores com o quociente de adversidade elevado, high adversity quotient. São pessoas que têm uma maior capacidade de se adaptar a mudanças, um alto grau de resiliência, passando pelo processo de transformação com relativa facilidade e se adaptando ao novo sistema com

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naturalidade. Condução da preparação: O processo de preparação da mudança consiste em apontar os colaboradores que deverão desenvolver o processo de implantação, que tenham o perfil adequado a partir da estratégia e ações já definidas na fase anterior. Implantação da Mudança: A implantação da mudança deverá ser feita somente quando se tenha conseguido uma situação ideal no quadro de forças da organização. Deve-se buscar o momento próprio, de modo a se assegurar o máximo de certeza de sucesso da iniciativa, lembrando-se sempre que fracassos tendem a criar anticorpos.

O processo de mudança demanda um estudo profundo das variáveis que estão ligadas ao seu sucesso ou insucesso. Ele compreende desde o levantamento de cenários internos, com todas as variáveis organizacionais consideradas, até a implantação de estratégias, para assegurar o bom andamento da implantação. A dimensão principal e mais delicada do processo da mudança é a que trata do quadro de forças envolvido e que compreende 3 momentos, o que trata da situação atual, o do projeto e o da transição. O quadro favorável, ainda que não assegure sucesso, é fator determinante para tal.

Uma estatal, empresa de economia mista, há cerca de 6 anos procurou garantir sua sobrevivência, como organização ligada ao estado, tornando-se uma referência em qualidade. Buscava-se uma “blindagem” para escapar da privatização. Quanto ao projeto, ele foi desenvolvido com todos os cuidados, sendo examinado cada passo.

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O projeto de mudança: • Houve a avaliação do ambiente, com o conhecimento, inclusive, de fatores restritivos existentes, como a cultura de derrotas de uma organização em que “nada deu certo”. O projeto respeitava a estrutura e estava dentro dos objetivos reais desejados; • Foram ouvidos os representantes do cliente em diversas áreas e oportunidades, sendo confrontadas as informações com os dados obtidos por outros meios; • A metodologia para implantação de um sistema de gestão da qualidade foi dimensionada para respeitar as limitações da organização, ainda que trazendo expressivos ganhos em resultados, high concept, low tech; • O projeto foi concebido com todo o cuidado quanto aos aspectos técnicos e até acadêmicos, mesmo que voltado para a realidade da organização; • Os ganhos do projeto compreendiam ganhos incrementais, mais modestos, e quânticos, estruturais e de grande volume, quanto à melhoria da qualidade. Kaizen e Kairo ; • O relacionamento com os patrocinadores e os líderes foi estabelecido com todo o cuidado, tendo caminhado de forma harmoniosa durante todo o projeto. O único problema foi um dirigente sindical que se recusava a conversar com a consultoria, apesar de ter sido chamado, inclusive com divulgação para toda a organização, para fazer suas críticas e trazer suas contribuições. Sua recusa deixou sua posição enfraquecida de prejudicar o projeto ou desqualificá-lo. Para a mudança, propriamente dita, a evolução foi a seguinte: • Levantamento do cenário interno, quanto à introdução de mudanças e não mais quanto ao projeto. • Patrocinador: totalmente favorável, com uma liderança incontestável, tanto pelo poder como pelo relacionamento com o corpo gerencial; • Líderes: escolhidos com o maior cuidado, dentre aqueles que eram conhecidos como “tratores”; • Agentes: selecionados pelos líderes, com a competência necessária, devidamente treinados pela consultoria; • Alvos: assistiram a palestras do Presidente da empresa e da consultoria, nas mesmas oportunidades, para divulgação de características e benefícios da mudança, assim como da intenção de preservação da instituição, como estatal, e dos empregos de todos. Sem dificuldades aparentes ou resistências dignas de menção. O quadro de forças:

Havia um acomodamento em relação à situação presente, em que as pessoas não

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apresentavam desconforto quanto à baixa qualidade, tanto ao que se referia ao serviço prestado, água e esgoto, quanto ao atendimento, relações com os clientes/usuários. A estratégia desenvolvida foi a de associar a baixa qualidade com o possível desemprego futuro, decorrência provável de uma privatização, já que não havia garantia decorrente de ingresso pelo concurso público. A manutenção daquela situação significaria um possível desligamento porvir. A situação nova representava uma quantidade maior de trabalho real, em que os empregados da empresa teriam de buscar resultados efetivos, mediante o atingimento de metas de melhoria dos índices referentes ao serviço e ao atendimento. Em outras palavras, mais trabalho. A estratégia foi usar um mecanismo de compensação, além da perspectiva da manutenção do emprego. Foi criado um sistema de remuneração variável, com o pagamento por desempenho, performance pay, de importâncias que estavam ligadas ao alcance das metas. Ou seja, mais trabalho igual a melhor remuneração. Quanto à transição, não chegou a haver preocupação, devido ao fato de todos os empregados da empresa terem passado por um treinamento que os qualificou para o desempenho das tarefas, que seriam desenvolvidas depois com o novo sistema. Isso eliminou ou reduziu qualquer ansiedade quanto ao esforço a ser despendido ou as dificuldades para realizar esse trabalho. A maior dificuldade foi com relação à cultura “perdedora” e ao desânimo dos empregados. Foi estabelecido, como estratégia para implantação, que seria introduzindo o novo sistema aos poucos, buscando-se utilizar o sucesso que se obtivesse nas primeiras iniciativas como exemplo e motivação para as outras áreas. Escolheram-se, assim, as menos desmotivadas para começar a fixação e, também, as menos resistentes à mudança. Procurou-se garantir parcialmente o sucesso da inserção da mudança atuando dessa maneira. Outras medidas foram introduzidas, com um novo sistema de gestão de RH, orientado para um perfil de colaboradores voltado para a qualidade.

Pessoas (e organizações) não resistem à mudança, resistem a serem mudadas! Para a mudança, fica ainda pior quando se tem mau produto, ficando difícil fazer-se a venda do mesmo. Quanto melhor o projeto, mais fácil colocá-lo para o público que deverá absorvê-lo. Algumas

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vezes, contudo, o projeto é bom, mas o conteúdo desagrada. Isto é, o remédio é amargo, apesar de ter ótimo efeito. Nestes casos, a manipulação de variáveis comportamentais pode causar desconforto em um número grande de pessoas na organização. Este desconforto justifica-se, para alguns, na medida em que assegurará a continuidade, o desenvolvimento ou a saúde da organização, assegurando, por conseguinte, a manutenção dos empregos de seus cooperadores. Trecho da palestra sobre “Inovação e Mudança Organizacional, proferida no “Encontro de RH ”, congresso de R.H., em Brasília, por Paulo Peixoto.

É válida, ainda, a máxima do futebol que diz: “em time que está ganhando, não se mexe”? Ou faz mais sentido proceder como as equipes de Fórmula I, que estão sempre mudando porque acreditam que, se não o fizerem, a mudança os atropelará? Será que mudar significa meramente acompanhar o passo do meio-ambiente? Que o fato de o meio-ambiente não estar parado faz com que não se possa estar parado? Que a mudança, para as organizações em geral, é inercial e que ficar parado é que destoa? Escolha um projeto qualquer de mudança, possivelmente polêmico, e discuta as questões anteriores. Debata, por exemplo, o projeto da proibição da venda de armas, a proibição do uso de celulares na direção, ou outro. Alternativamente, procure verificar se a sua organização dispõe de mecanismos para gerar desconforto ou para incentivar o comportamento na direção e no sentido que a organização deseje. Analise e comente se os tem e, caso contrário, o que se poderia fazer nesse sentido.

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Gerenciando a Mudanテァa Organizacional. Apostila da GEO/SLB Consultoria.

CONNER, DARYL R. Managing at the speed of Change. Editora Villard Books.

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