Revista PRANTO DA TERRA #04

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LIVRO DAS SOMBRAS (CONT.):

Editorial

Líquido vulnerário para lavar e desinfetar feridas, favorecendo a cicatrização: - Macerar em 200 gs de álcool de cereais: 10 gs de flor de alfazema, 10 gs de alecrim, 10 gs de hortelã, 10 gs de sálvia e 10 gs de losna. Após 2 dias, adicionar 1/2 litro de água fria e filtrar com filtro de papel. Para lavar e desinfetar feridas.

FLAUTA DE Pã Reflexões da Erva-Mate “Quando pego na cuia de chimarrão, calmamente e bem contemplativo, acaricio, sinto as suas formas com curvas. Algumas como se fossem a cintura de uma mulher. Passo a mão bem devagar, sensualmente. É um corpo feminino, e aquilo começa a dar tensão erógena crescente... A cuia está quente devido à água fervida... Vou esfregando a mão me entregando às sensações, começando a ter ereções. Até o falo acordar totalmente... a água quente na Erva-Mate é um ato alquímico. Há uma transformação que resulta em muito sabor! Com muito vigor! Onde jogamos a água, como uma ejaculação, é escuro, quente, úmido, místico e transformador como um útero... E colocando a 'bomba'... como se aparenta a uma introdução sexual! A Erva-Mate também é indiscutivelmente uma planta-professora, pois ela nos deixa alerta e ativos como um guerreiro é e deve continuar a ser. Um relaxamento que desenvolve a atenção plena! Um ato meditativo. Que ensina ao homem, ao sensual, ao 'meditarii' (para todo contemplador meditativo), ao guerreiro das fileiras verdes... Em silêncio contemplativamente vou sentindo o tesão, ereto, deslizando a mão nas formas curvas aquecidas, sentindo o líquido, água mágica do seu útero fervente; a erva gostosa levemente amarga, e algo mais, que faz nascer um ser disposto e másculo...”

Mogly Hekura, Inverno 2004 E.C.

Nestes tempos de toras descendo rios, de ar sujo e de vegetais transgênicos, o PRANTO DA TERRA traz à baila as plantas e seu potencial sagrado e vital. Vital porque há milhares de anos elas colonizaram terras duras e sulfurosas e prepararam um vigoroso e fértil terreno para que nós, animais de sangue vermelho, pudéssemos nos alimentar e procriar; sagrado porque mesmo sendo agredidas por desmatamentos e manipulações genéticas, as plantas, o corpo verde do planeta, foram usadas (e ainda o são) para a cura do nosso corpo e a ablução do nosso espírito. Em tempos onde vemos florestas e dizemos “mato” e “mosquito” e sulcamos a terra de nosso plantio, colheita de nosso alimento, com máquinas e veículos, esquecemos como é o toque da terra, e as mãos do lavrador e do jardineiro parecem sujas aos nossos olhos. A visão humana é capaz de distinguir centenas de diferentes tons de verde, para reconhecermos a riqueza e multiplicidade de nossas matas... Neste número, nós lembramos disso. No poder dos enteógenos, na pluralidade da natureza, na magia das ervas, dos chás, na nostalgia da canção. Elas estão em todo lugar, em todo vasinho, canteiro, no seu prato, na sua roupa, até no papel deste informativo. A Árvore do Mundo sustenta o Universo: deixaremos que seja cortada?

Tamoio

PRANTO da

terra Wicca e Ecologia

Kushë ha! Aerute y Coletivo Editorial

BONNY PORTMORE Loreena McKennitt O bonny Portmore, I am sorry to see Such a woeful destruction of your ornament tree For it stood on your shore for many's the long day Till the long boats from Antrim came to float it away.

Oh, bela Portmore, estou triste em ver Tal pesarosa destruição de tua árvore ornamental Erguida em tua costa por muitos longos dias até os grandes barcos de Antrim chegarem para levá-la embora

Oh bela Portmore, você brilha ao se erguer E quanto mais eu penso em ti, mais vai além de meu pensar Se eu ainda a tivesse, como o foras no passado Todos os Lordes da velha Inglaterra não poderiam comprar Portmore Agora os pássaros da floresta All the birds in the forest choram amargamente dizendo: they bitterly weep "onde iremos nos abrigar, Saying, "Where will we shelter onde iremos dormir? or where will we sleep?" pois o carvalho e o freixo foram For the Oak and the Ash, cortados they are all cutten down And the walls of bonny Portmore e os paredões da bela Portmore jazem todos ao chão. are all down to the ground. O bonny Portmore, you shine where you stand And the more I think on you the more I think long If I had you now as I had once before All the Lords in Old England would not purchase Portmore.

Árvore, deserto de Nazca, Peru

“A seiva que percorre o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho.” – Chefe Seattle


Filhos da Deusa: o cânhamo e o culto da Grande Mãe Na perspectiva da espiritualidade mística, a história da religião humana é regressiva, não progressiva. A história religiosa – tal como representada pela ascensão do cristianismo e do judaísmo modernos – se afasta da harmonia com a natureza, como se afasta da iluminação pessoal de dos meios para se atingi-la. O que se perde no processo é a valorização dos poderes do feminino, representados nas religiões antigas na forma do princípio da Grande Mãe ou da Deusa. E não é por coincidência que as religiões, quando começaram a reprimir as mulheres, no céu e na terra, começam também a proibir o uso para fins religiosos dos Enteógenos, as plantas-professoras, conexões com a mente vegetal do planeta. Os antigos celebravam o feminino. Reconhecia a imagem da Mãe na terra que gera vida e sustento. A terra produziu também uma classe especial de plantas, que alimentava tanto o espírito quando o corpo e abria os portões para os grandes mistérios da criação. Também estes eram associados pelos antigos ao feminino, ou pelo menos à androginia. Podemos ver essas relações com maior clareza no hinduísmo, em que a cannabis é identificada tanto com Shiva quanto com sua consorte fêmea, que é freqüentemente representada em união sexual. De outras vezes Shiva é mostrado como um andrógino, com um físico masculino e seios e traços faciais femininos. Mais tarde, o budismo e o cristianismo gnóstico estiveram entre as religiões que adotaram esses conceitos, e também – pelo menos no caso do budismo e, é provável, igualmente no dos gnósticos - o uso de enteógenos como a cannabis. Mas os gnósticos foram relegados à clandestinidade na Idade Média, quando a Igreja Católica Romana organizada baniu o culto à Deusa e os rituais enteogênicos como a queima de incenso. Do ponto de vista místico, as trevas ainda não se haviam dissipado. De maneira mais convincente que qualquer outro escritor, Terence McKenna se vale desses temas antigos para construir sua visão de um futuro mais harmonioso: Nossa presente crise global é mais profunda que quaisquer crises históricas anteriores, por isso nossa solução deve ser igualmente drástica. Proponho que adotemos a planta como o modelo organizacional para ávida no século XXI,assim como o computador parece ser o modelo mental/social dominante do final do século XX, e a máquina de costura foi a imagem norteadora no final do século XIX. Isso significa retornar no tempo a modelos que foram bem-sucedidos 15, 20 mil anos atrás. Fazendo-se isso torna-se possível ver as plantas como alimento, abrigo, vestuário e fonte de educação e religião. McKenna chama de Ressurgimento arcaico essa sua visão, que incorpora: O renascimento da Deusa e o fim da história profana... agendas que contém implicitamente em si a noção de nosso reenvolvimento com a Mente Vegetal e a emergência desta... Retornar ao seio da parceria planetária significa trocar o ponto de vista do eu historicamente criado por um estilo mais maternal e intuitivo. Tal reenvolvimento deve, é claro, ser guiado pelos mestres-gurus do reino vegetal, os Enteógenos. Rowan Robinson - O Grande Livro da Cannabis

A COR DO VERDE A Natureza não tem apenas árvores, a Amazônia, tigres-de-bengala e bromélias. Ela é composta de muito mais do que isso. Falo das ervas e plantas que nascem em nossos canteiros e não damos atenção; falo dos arbustivos que escapam ao nosso olhar quando passeamos pela mata, boquiabertos com a grandiosidade das árvores. A variedade de ervas medicinais e de limpeza que encontramos em nossos canteiros de roseiras normalmente surpreende o pagão que vive na cidade. O Brasil é especialmente abençoado quando falamos de ervas “mágicas”. E não estamos falando das populares arruda, louro ou das “lendárias” (e digo isso por que nunca vi nenhuma!) sangue-de-dragão e mandrágora; falo de plantas nativas. Muitas delas até mesmo trazidas pelos negros da África durante a escravidão, e que são usadas pelas nossas avós e bisavós para curar luxações, verminoses e cólicas menstruais. Para se ter uma idéia da riqueza que normalmente definimos como “mato”, nos encantados bosques europeus é encontrada cerca de 30 espécies diferentes de plantas por hectare. Na nossa tão reduzida Mata Atlântica, a conta chega a 300. Há livros e mais livros de herbalismo, para os bibliófilos, mas nenhum deles trata de maneira profunda ou concentrada as ervas nativas do nosso país. Certa vez ouvi de uma vendedora de colares de miçangas: “Se você quer aprender artesanato, sente-se ao lado de um artesão na calçada; a vida é a melhor escola”. Para conhecer as ervas mágicas que temos aqui, nada melhor do que um bom período de aprendizado com um índio, um umbandista, erveiros, rezadeiras ou, mais acessível, nossas avós. Mesmo não sendo versadas nos mistérios da Terra, elas podem ser de grande valia se você quiser conhecer as aplicações praticas do assapeixe, barbatimão, da aroeira-brava ou do cabelo de milho. A Dra. Henriqueta Tereza do Sacramento dá dez conselhos que ela considera fundamentais para aqueles que querem usufruir os benefícios da Fitoterapia. Devemos 1) saber identificar as plantas, 2) estar informados de sua procedência, 3) sobre o modo de coletá-las (plantas são sensíveis), 4) da época certa para colhê-las, 5) como conservar e secá-las, 6) conhecer a parte da planta a ser utilizada, 7) como prepará-las, 8) como usar, 9) do tempo de tratamento, e 10) ter certo conhecimento científico sobre as plantas, pois muitas delas são tóxicas se ingeridas e/ou preparadas de maneira inadequada. Para isso um livro de botânica pode ser um bom ponto de partida, e uma visita ao horto de sua cidade um modo de adquirir intimidade com as plantas. O conhecimento é importante; irresponsavelmente, algumas ervas, associadas à determinadas influências, entraram na “moda” e na lista das extintas por usuários irresponsáveis, mais de uma vez. Do Corpo Vegetal da Terra surgiram os animais de sangue vermelho. A energia deste é perfeita quando aplicada para restaurar o nosso próprio corpo sutil. As plantas curam há milênios, e atualmente o uso delas como medicamento não é mais coisa de feiticeiros, no sentido pejorativo da palavra. A medicina homeopática e naturalista tem cada vez mais espaço. São tratamentos menos tóxicos e prejudiciais, e os índios, com suas plantas professoras, os hebreus, os judeus, com seu profundo conhecimento representado na Árvore da Vida, e os seguidores do Umbanda e do Candomblé, são exemplos a serem seguidos, pelo seu íntimo relacionamento com a Mente Verde do planeta. Vivemos encurralados nas cidades, mas a natureza pode ainda assim existir à nossa volta. E dentro de nós. Aerute, Inverno de 2004 E.C.

LIVRO DAS SOMBRAS Pão Mágico Ingredientes: ½ kg de farinha de trigo, ½ kg de farinha de trigo integral, 1 pacote de fermento biológico em pó, 3 colheres de óleo ou azeite, 2 colheres de sopa de ervas a sua escolha, uma colher de sal e água quente (até ganhar consistência). Modo de preparar: Misture os ingredientes no sentido anti-horário até que fique homogêneo. Adicione 3 colheres de óleo, visualizando as três faces da Mãe enquanto adiciona. Adicionar fermento e sal e misturar novamente. Abençoe as ervas e adicione aos poucos, misturando-as e proferindo palavras que sejam mágicas pra você. Esquentar a água até que sua temperatura seja quase que insuportável ao tato. Vá adicionando a água aos poucos enquanto vai amassando o pão em leve estado de transe, até que atinja consistência de massinha de modelar. Enquanto vai amassando e sovando, vá proferindo palavras mágicas como a "runa das feiticeiras" ou a benção dos alimentos (no final de qualquer de nossos sabás você encontrará as palavras de benção). Coloque no formato que desejar (eu sugiro redondo). Cubra com um pano preto e diga solenemente: "Que os poderosos elementais dos fungos façam essa massa crescer assim como a força e a magia no interior do meu ser". Asse em forno pré-aquecido. Observação: No uso das ervas aconselho erva-doce, alecrim, orégano ou sementes de sua preferência. Pé-de-Planta

Banho para descarregar fluidos pesados: A Acácia-jurema (Acácia-jurema-martius) é conhecida por seus efeitos mágicos. Usada em banho, é de grande proteção. No Candomblé, é planta de Oxóssi, rei de Keto e dono das florestas, protetor das caçadas. Da casca da planta os índios faziam o Cauim, bebida ritualística. No Catimbó nordestino, ainda se bebe nas sessões das quais participam Mestre Carlos, Zé Pilintra e as Meninas da Saia Verde. Na medicina popular do Rio Grande do Norte a Acácia é aplicada em compressas sobre úlceras e tumefações. Na Bruxaria, podemos usar do banho de Acácia como purificação antes dos rituais, depois de uma limpeza espiritual da nossa casa ou periodicamente, para proteção e limpeza do nosso próprio corpo áurico. Aquecer ½ litro de água até o ponto de fervura, adicionar dois punhados de sal grosso e as folhas ou sementes da Acácia-jurema. Completar o balde com água do chuveiro e, depois de um banho de sabão de coco, jogar sobre o corpo do pescoço para baixo. Não enxaguar nem secar com toalha. Deposite as ervas usadas em um lugar de mata virgem, de preferência. Adaptado de Maria Helena Farelli, Plantas que curam e cortam feitiços


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