Jovens e Adolescentes centrados em Cristo

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CENTRADO EM CRISTO

Rio de Janeiro, RJ

Ministério de jovens e adolescentes centrado em Cristo

Traduzido do original em inglês: Gospel-Centered Youth Ministry

Copyright © 2016 Cameron Cole, Jon Nielson

Publicado originalmente por Crossway

1300 Crescent Street Wheaton, Illinois 60187

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por PRO NOBIS EDITORA

Rua Professor Saldanha 110, Lagoa, Rio de Janeiro-RJ, 22.461-220

1ª edição: 2024

ISBN: 978-65-81489-60-1

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo citações breves, com indicação da fonte.

Gerência editorial

Judiclay Silva Santos

Conselho editorial

Judiclay Santos

David Bledsoe

Paulo Valle

Gilson Santos

Leandro Peixoto

Supervisão editorial: Cesare Turazzi

Tradução: Renan Lima

Preparação de texto: Pedro Marchi

Revisão de provas: Thalles de Araujo

Capa: Luis de Paula Diagramação: Marcos Jundurian

Nesta obra, as citações bíblicas foram extraídas da Bíblia Almeida Revista e Atualizada (ARA), salvo informação em contrário.

As opiniões representadas nesta obra são de inteira responsabilidade do autor e não necessariamente representam as opiniões e os posicionamentos da Pro Nobis Editora ou de sua equipe editorial.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Ministério de jovens e adolescentes centrado em Cristo/Cameron Cole, Jon Nielson (organizadores); tradução Renan Lima. – Rio de Janeiro: Pro Nobis Editora, 2024. Título original: Gospel centered youth ministry.

ISBN 978-65-81489-60-1

1. Jesus Cristo – Ensinamentos 2. Jovens – Aspectos religiosos – Cristianismo 3. Ministério cristão 4. Teologia I. Cole, Cameron. II. Nielson, Jon.

24-215733

Índices para catálogo sistemático: 1. Ministério com jovens: Cristianismo 259.23 Eliane de Freitas Leite - Bibliotecária – CRB 8/8415

Tel.: (21) 2527-5184

contato@pronobiseditora.com.br www.pronobiseditora.com.br

CDD-259.23

Eu já estive dos dois lados. No primeiro caso, fui líder de um ministério de jovens que era baseado no pragmatismo metodológico, onde a maior ênfase era criar atrações para despertar o interesse dos envolvidos. Neste cenário, o sucesso era a quantidade de jovens que poderíamos reunir nesses “cultos” (eventos). No segundo, já como pastor, preguei em diversas reuniões de igrejas mais tradicionais, e minha percepção era que a ênfase recaía somente naquilo que estava sendo dito, como uma repetição do culto dominical. O “sucesso”, nesses casos, se resumia em informar teologicamente os jovens. Esses são os extremos mais comuns. Neste livro, somos apresentados a uma terceira via: theology drives methodology (teologia direciona metodologia). Isso significa que tanto teologia quanto método são extremamente importantes. Aqui, somos lembrados de que o problema dos jovens atuais são os mesmos dos nossos antepassados: a queda (Gn 3). Sendo assim, precisamos atacar os inimigos certos e usar a arma correta. O começo da obra, por exemplo, demonstra alguns desses antigos inimigos: falta da verdade, falsa percepção de si mesmo e de Deus. Também, de nada adianta usar armas (atrações) pós-modernas para atrair pós-modernos, pois eles já estão saturados disso em outros ambientes. Precisamos, porém, resgatar a boa doutrina cristã histórica e aplicá-la com sabedoria ao contexto atual. Por isso não devemos menosprezar o método. Devemos exemplificar, na prática do ministério de jovens e adolescentes, a centralidade de Cristo, a realidade do discipulado cristão e o amor pela igreja local. Métodos são importantes e eles não somente formam, mas também informam nossas crenças. Este livro ajudará o leitor a ser intencional com uma metodologia que respeite a boa teologia. Temos pouquíssimas obras que apresentam este equilíbrio entre teologia e método. Por isso, leia-o com atenção.

Thiago Guerra, pastor da Igreja da Trindade, São José dos Campos (SP); diretor executivo da Coalizão pelo Evangelho; capelão no Glow School; professor no Instituto Bíblico Betel Brasileiro

Vemos as estatísticas lamentáveis sobre os jovens se afastando da igreja, apesar de todas as tentativas nas últimas gerações de sermos mais “maneiros” ou lutarmos contra as guerras culturais — ou ambas as coisas. Os autores deste livro apontam para um caminho melhor. Eles testaram sua abordagem centrada no evangelho, a aprimoraram e refinaram ao longo do caminho. Este livro não é apenas um alerta, é um guia prático para o ministério de nossos irmãos e irmãs mais jovens. Recomendarei este livro em toda parte.

Michael Horton, professor de teologia sistemática e apologética no J. Gresham Machen, Westminster Seminary, Califórnia

Poucos de nós fazem viajam sem um dispositivo GPS. Precisamos de ajuda para seguir na rota, no tráfego e nas condições atuais da estrada: tudo para chegarmos ao nosso destino final. De maneira humilde, autêntica e verdadeiramente testada, Ministério de jovens e adolescentes centrado em Cristo fornece esse nível de clareza para aqueles que são apaixonados por envolver, conectar e disciplinar os jovens ao alcance de sua vocação. Com conselhos ancorados na verdade atemporal da Palavra de Deus, Ministério de jovens e adolescentes centrado em Cristo ilumina as estradas escuras do trabalho com os jovens. Ele ressalta a prioridade dessa missão, enquanto amplia o impacto que um ministério estudantil eficaz pode ter dentro de uma comunidade da igreja. Cheios de sabedoria, luz, esperança e orientação, os colaboradores apontam para um objetivo claro: fazer seguidores de Jesus Cristo ao longo da vida.

Dan Wolgemuth, presidente/CEO da Youth for Christ

Este livro é teologicamente perspicaz e prático, e um livro sobre o ministério de jovens e adolescentes deve ser ambas as coisas. Este é um recurso louvável para jovens, voluntários, estudantes em treinamento e equipes que procuram um pastor de adolescentes.

Jay S. Thomas, pastor na Chapel Hill Bible Church, Chapel Hill, Carolina do Norte

Você tem em suas mãos um exame muito útil e direto do como agir no ministério de jovens e adolescentes. Esta obra aborda as principais áreas de liderança cristã bem-sucedida. Amplo em escopo, mas nítido em foco, este livro certamente ajudará todo aquele que luta para que seu ministério seja construído sobre ouro e não sobre a palha.

Ken Moser, professor assistente de ministério de jovens e adolescentes no Briercrest College and Seminary; autor de Changing the World through Effective Youth Ministry

Os colaboradores deste livro refletiram profundamente sobre a natureza e o poder do evangelho. Com base em seus anos de experiência, nos deram reflexões teológicas ricas e práticas sobre o ministério de jovens e adolescentes que busca exaltar a Cristo, fortalecer toda a igreja e equipar os adolescentes para o ministério.

Mary Willson, diretora associada do Women’s Initiatives, The Gospel Coalition

Um ministério de jovens e adolescentes centrado no evangelho é o que precisamos agora. É raro encontrar um livro que reúna experiência em tudo, desde evangelismo a pequenos grupos, de viagens missionárias a justiça social, mas Cameron Cole e Jon Nielson nos deram a cartilha perfeita. Sou grato por esse livro e estou ansioso para colocá-lo na frente dos meus alunos!

Alvin L. Reid, professor de evangelismo e ministério estudantil, Southeastern Baptist Theological Seminary; autor de As You Go: Creating a Missional Culture of Gospel-Centered Students

Aqui estão quatorze capítulos escritos por quatorze praticantes, cada um com sua própria personalidade, estilo de escrita e percepção. No entanto, há um foco: Jesus. Para esses escritores, o atuar com jovens não é apenas ensinar os ensinamentos de Jesus, embora isso seja importante. O ministério de jovens e adolescentes é sobre fazer discípulos: aprendizes por toda a vida, seguindo pessoalmente e crescendo em Jesus. Esses capítulos são sinceros e sensíveis aos adolescentes, com um profundo respeito pelo evangelho. Isso, além de muita percepção prática, faz desse livro algo que vale a pena ter na biblioteca do ministério de jovens e adolescentes.

Terry Dittmer, diretor nacional do Youth Ministry for the Lutheran Church do Sínodo de Missouri

Ministério de jovens e adolescentes centrado em Cristo é um passo substancial na direção certa para o discipulado fiel dos alunos. Não apenas obreiros em tempo integral, meio período ou ministério voluntário de adolescentes devem comprar este livro, mas pastores e pais também precisam de uma cópia. Sua igreja será abençoada por esta obra.

John Perrit, líder de adolescentes na Pear Orchard Presbyterian Church, Ridgeland, Mississippi

Cameron Cole e Jon Nielson fornecem uma visão clara do ministério como um todo, encorajando e desafiando os leitores a integrar o evangelho como o centro de seu ministério com os jovens.

Brian H. Cosby, pastor na Wayside Presbyterian Church, Chattanooga, Tennessee; autor de Gimmicks: Reclaiming Youth Ministry from an Entertainment Culture

Jon Nielson:

Para a minha filha Emilie.

Que você conheça as riquezas do glorioso evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo!

Cameron Cole:

Para os meus heróis evangélicos, Frank Limehouse, John Harper, Mark Upton, Gil Kracke.

Obrigado por me levarem ao verdadeiro evangelho da graça.

Sumário

Prefácio à edição em português — Allen Porto ............................................................................................ 17

Prefácio original — Collin Hansen ....................................................................................... 21

Introdução Cameron Cole ....................................................................................... 23

Primeira parte

Fundamentos para um ministério de jovens e adolescentes centrado no evangelho

1. O evangelho no coração de todas as coisas: O ministério de jovens e adolescentes fundamentado em Cristo — Cameron Cole ............................................................... 29

O capítulo de abertura articula o coração deste livro: a convicção de que o evangelho de Jesus Cristo deve estar no centro de tudo o que fazemos no ministério de jovens e adolescentes.

2. Fazendo discípulos que fazem discípulos: Discipulado no ministério de jovens e adolescentes — Darren DePaul ................ 45 Este capítulo defende a centralidade do discipulado intencional no ministério de jovens e adolescentes, e considera Jesus o modelo definitivo a ser seguido pelos discipuladores.

3. O impacto da exposição da Palavra de Deus: Ensino expositivo no ministério de jovens e adolescentes — Eric McKiddie ................................................................................ 59

A pregação expositiva que aplica o evangelho na vida diária é o método de ensino que causará o maior e mais duradouro impacto sobre os jovens.

4. Imitando o coração de Deus: Construindo relacionamentos no ministério de jovens e adolescentes — Liz Edrington .................. 71 Nós, pastores, somos formados e moldados pelo nosso relacionamento com Deus. Conforme somos inseridos no amor dinâmico da Trindade, convidamos alegremente nossos discípulos a nos acompanhar. O relacionamento é o lugar do ministério, o onde da encarnação. Ao considerar nosso relacionamento com Jesus, com nós mesmos e com os outros, entenderemos melhor como Deus nos preparou para nos envolvermos com a juventude.

5. Comunidade baseada no evangelho: Construindo uma comunidade no ministério de jovens e adolescentes — Mark Howard ........................................................... 83

Pastores e líderes de jovens e adolescentes devem se preocupar, em primeiro lugar, em promover a unidade em Cristo, inserindo-os na família diversificada de Deus, e não em criar bons frequentadores do grupo de jovens e adolescentes.

6. Construindo um fundamento com os pais: Uma parceria com os pais no ministério de adolescentes — Mike McGarry.................. 93 Um ministério de adolescentes efetivo envolve construir uma ponte entre as famílias e a igreja, para que ambos os lados caminhem juntos no discipulado dos jovens.

7. Reunindo o povo de Deus: Integração geracional no ministério de jovens e adolescentes — Dave Wright ........................................... 105 Embora o ministério de jovens e adolescentes tenha um lugar

importante e de valor na vida da igreja local, o ministro de adolescentes centrado no evangelho deve, intencionalmente, se comprometer a conectar seus liderados com crentes de todos os tipos — e de todas as gerações — dentro da igreja.

Segunda parte

Aplicações práticas para um ministério de jovens e adolescentes centrado no evangelho

8. Ajudando os jovens e adolescentes a envolverem-se com a Bíblia: Estudo bíblico em pequenos grupos no ministério de jovens e adolescentes — Jon Nielson ............................................. 119 Um aspecto importante do discipulado, treinamento e crescimento espiritual no ministério de jovens e adolescentes são os estudos bíblicos em grupos pequenos. Este capítulo explica o porquê, e oferece dicas práticas sobre como conduzir os jovens e adolescentes a estudar a Palavra de Deus com seriedade.

9. Aperfeiçoando os jovens para o ministério evangélico: Treinamento de liderança no ministério de jovens e adolescentes — Jon Nielson ............................................................. 131

A função dos pastores e líderes de jovens e adolescentes não se resume a designar tarefas aos seus liderados. Eles devem, por outro lado, se comprometer com a capacitação desses jovens para o verdadeiro ministério evangélico da Palavra.

10. Cântico que flui do evangelho: Música no ministério de jovens e adolescentes — Tom Olson ................................................................ 141

Adoração musical no ministério de jovens e adolescentes pode e deve ser feita de modo intencional, teológica e bíblica, já que é parte do nosso chamado ensinar e discipular os nossos jovens de maneira centrada no evangelho. Este capítulo também oferece dicas práticas para crescer na adoração musical significativa, profunda e centrada no evangelho no ministério de jovens e adolescentes.

11. Quebrando a rotina: Retiros e eventos no ministério de jovens e adolescentes — Jason Draper.............................................................. 153

Em se tratando de ministério de jovens e adolescentes, eventos especiais e retiros não rivalizam com o foco mais amplo e com a centralidade do evangelho. Em vez disso, podem ser momentos estratégicos para que eles sejam confrontados com o evangelho de Jesus Cristo, encorajados na fé e desafiados a servir e obedecer a Deus com mais adoração e devoção.

Terceira parte

O fruto de um ministério de jovens e adolescentes centrado no evangelho

12. Fé pública: Evangelismo no ministério de jovens e adolescentes — David Plant ............................................................ 165

O evangelismo no contexto do ministério de jovens e adolescentes é essencial. Tristemente, muitos pastores de jovens e adolescentes falham ao não se envolverem de maneira atrativa, amável e verdadeira com a cultura jovem enquanto compartilham a mensagem vivificante do evangelho de Jesus Cristo. Este capítulo sugere ideias claras e instruções para alcançar e envolver jovens de maneira vibrante, encontrando-os onde estão, com as boas-novas da graça de Deus em Jesus Cristo.

13. Frutificando no evangelho entre os pobres: Servindo aos pobres no ministério de jovens e adolescentes — Phillip Walkley e Drew Haltom ........................................................ 177 O serviço aos pobres, no contexto do ministério de jovens e adolescentes, pode ser um tópico confuso, que leva muitos pastores da área a posições extremas. Há, porém, uma maneira centrada no evangelho de ajudar de verdade e intencionalmente os pobres, no nome de Jesus Cristo, que edificará, desafiará e amadurecerá

os nossos jovens como seguidores amáveis e generosos do seu Salvador neste mundo.

14. Indo e dando frutos: Viagens missionárias internacionais de curta duração no ministério de jovens e adolescentes

— Elisabeth Elliott............................................................................... 189

Embora as viagens missionárias de curta duração tenham uma má reputação em alguns círculos cristãos (muitas vezes merecidamente), é possível se engajar nessas viagens para a glória de Jesus Cristo, a fim de avançar seu reino, discipular nossos jovens e genuinamente encorajar crentes em outras partes do mundo. Este capítulo nos mostra um caminho para fazer com que viagens de curta duração agreguem aos nossos ministérios.

Colaboradores ....................................................................................... 201

Prefácio à edição em português

Todos queremos ser jovens (“We all want to be Young”): esse foi o título de um filme de 2010, produzido pela BOX1824, empresa de pesquisa especializada em tendências de comportamento e consumo. Cinco anos de pesquisa resumidos em dez minutos bastante esclarecedores sobre a geração Y, ou os millenials (aqueles nascidos entre 1980 e a primeira metade da década de 1990).

Sendo um filme de 2010, a obra não contemplou a geração Z (Nascidos a partir da segunda metade da década de 1990 até 2010), nem a geração alfa (nascidos a partir de 2010).

A premissa do filme é a de que a geração Y possui características próprias, que a diferenciam das demais. Mas vai além: a sugestão, afirmada em dois momentos, é a de que os jovens estão no topo da pirâmide social e de que, se desejamos entender o mundo de hoje, precisamos entendê-los.

Suspenda o juízo por um minuto. Podemos concordar ou discordar da posição que os jovens ocupam na cultura contemporânea, mas, antes de aplaudirmos ou vaiarmos, é importante considerar o que está sendo dito.

O protagonismo jovem

Se nem todos queremos ser jovens, pelo menos muito de nós queremos. Falamos em ter um “espírito jovem” e na “jovialidade” como características essencialmente positivas. O mercado verdadeiramente coloca os jovens como o centro das atenções e, a partir disso, lança tendências que moldarão as demais gerações.

Consumo, moda, entretenimento, linguagem: como o filme descreve, a geração Y dominou o mundo.

E influenciou a igreja.

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

à edição em português

As respostas da igreja

Há diversos efeitos dessa cultura jovem sobre a igreja; e podemos descrever, de modo genérico, duas grandes respostas oferecidas à cultura jovem: capitulação e resistência.

A postura de capitulação tornou-se predominante. Enquanto a cultura jovem varria a sociedade, igrejas inteiras passaram a buscar as maneiras de se adequar a esse contexto.

“O que poderia ser uma igreja atraente aos jovens?” — pareceu ser a pergunta ministerial mais importante de uma liderança. E então as propostas começaram a surgir.

Talvez tudo tenha começado com a organização de eventos voltados exclusivamente para jovens. “Louvorzões”, “culto de jovens”, “encontro de jovens” e coisas semelhantes a essas passaram a fazer parte do repertório eclesiástico. Se os jovens não tinham o poder de mudar o estilo da igreja, pelo menos no sábado à noite eles tinham uma programação só deles, para fazer do jeito que entendessem melhor. Em alguns casos, não havia apenas alguma diferença entre o culto de jovens do sábado e o culto público do domingo: havia contradição direta.

Era necessário mais do que reuniões separadas. Toda a estética jovem precisava ser instalada e moldar a experiência dos jovens na igreja. Por isso, a música também precisava ser transformada. Os antigos hinos foram substituídos por cânticos moldados, em grande medida, pela estética da cultura de massa. O canto na igreja seguiu, de sua maneira, as tendências da música pop.

O ambiente da igreja também precisava de transformação. Muitas igrejas foram ajustando a iluminação, a cor das paredes, e o que mais fosse necessário para estar em harmonia com o espírito predominante.

O púlpito precisa ser mais jovial. Tanto o púlpito literal, que foi remodelado em seu formato e seus materiais (vidro e acrílico passaram a ser usados mais do que nunca), quanto a vestimenta e a linguagem do ministro passaram pelo mesmo processo de “recauchutagem”, de modo a se adaptar aos novos tempos.

Uma nova figura ministerial surgiu: o pastor de jovens. Se antes o pastor ou o colegiado de presbíteros era responsável por toda a igreja, agora ficou interessante ter um ministro dedicado a essa faixa etária, normalmente mais jovem e com uma cabeça “mais aberta”.

Não tardo u até que essas mudanças transbordassem do ambiente mais exclusivo dos cultos jovens e passassem a ditar toda a vida da igreja. A dominação foi completa.

Mas alguns decidiram resistir.

A postura de resistência buscou se contrapor ao espírito do tempo. Se tudo era moldado segundo a cultura jovem, a igreja seria o oposto disso: um ambiente, em grande medida, velho.

Nesses espaços não havia abertura para os jovens. As músicas permaneceriam os velhos hinos, a estética da igreja não seria modificada em nada, e os jovens seriam tratados apenas como imaturos e vistos com suspeita.

Muitas igrejas que capitularam ficaram cheias, mas deram aos jovens a noção de que são o centro do mundo. Ajustaram a mensagem para se dobrar às expectativas juvenis. Ficaram cheias, porém vazias.

Muitas igrejas que resistiram se esvaziaram e foram morrendo aos poucos, incapazes de ouvir e considerar os jovens, bem como de desenvolver dinâmicas de discipulado que os envolvessem, os estimulassem e os encorajassem na fé. Buscaram ser fiéis, porém foram insensíveis.

A nossa postura

Nós não precisamos escolher entre as posturas de capitulação ou resistência. Não precisamos nos render e nos moldar, ou suspeitar de tudo o que possui uma aparência jovem.

Somos chamados a ministrar e servir às pessoas que Deus coloca diante de nós, considerando-as como são e aplicando as verdades eternas ao seu momento.

A igreja é a comunidade dos santos, a família da fé, composta de idosos e bebês, ricos e pobres, educados e analfabetos. Nessa pluralidade, cada parte do corpo é considerada, amada e cuidada.

Por isso, em vez de capitular ou resistir, podemos primeiramente buscar a compreensão daqueles jovens que Deus tem colocado diante de nós, e assim considerar maneiras de servi-los tendo como centro o evangelho, e não a idade.

É isso que nos oferecem Cameron Cole e Jon Nielson nesse precioso livro agora publicado em português.

Como deveria ser um ministério jovem centrado no evangelho? Os diversos capítulos dessa obra nos ajudam a entender os fundamentos do evangelho e como ele molda discipulado, ensino, relacionamentos e comunidade.

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

Prefácio à edição em português

Também nos oferecem modelos práticos para discipular as gerações mais jovens e lidar com aspectos como estudo bíblico, treinamento de líderes, música e acampamentos.

Tudo isso apontando para os frutos que desejamos ver nos jovens e em toda a igreja: evangelização, serviço e missões.

A minha oração é que esta obra seja uma poderosa ferramenta nas mãos de pastores, professores, líderes de jovens e pais, para que, mais do que seguir tendências, possamos oferecer aquilo que nunca fica desatualizado: as “velhas boas-novas” da salvação em Cristo Jesus.

Prefácio original

Durante a minha infância a igreja não era uma prioridade para minha família. Ainda assim, completei dois anos de classe para novos membros e me juntei ao grupo de adolescentes como um calouro no ensino médio. Eu não me lembro de muito que foi ensinado, e se lembrasse, é provável que discordaria com boa parte do conteúdo. Sei que, em um encontro, assistimos ao filme A sétima profecia, com Demi Moore, mas ainda não entendo como esse filme poderia de alguma forma promover crescimento espiritual.

Mas uma coisa que vi no grupo de adolescentes começou uma mudança permanente em minha vida. Pela primeira vez interagi com colegas que amavam a Jesus. Eu não sabia que isso era possível, porque até então havia apenas conhecido a religião como um ritual vazio. Esses amigos me apresentaram ao Jesus crucificado e ressurreto. E eu confiei nele para o perdão dos meus pecados, abrindo caminho para a vida eterna no poder do Espírito Santo e no poder do meu Pai celestial.

Essa experiência me deixou simultaneamente agradecido pelos grupos de adolescentes e também preocupado: eu temia que eles se perdessem pelo caminho. Quando estamos tão ocupados em manter os jovens entretidos ou em promover um estilo de vida moral, podemos facilmente esquecer a mensagem mais importante. O apóstolo Paulo explica: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2.8-9).

Em nosso trabalho na The Gospel Coalition, “comprometemo-nos a revigorar as igrejas com nova esperança e alegria convincente com base nas promessas recebidas pela graça somente através da fé em Cristo”. É por isso

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

Prefácio original

que eu recomendo com tamanha ansiedade Ministério de jovens e adolescentes centrado em Cristo. Ao longo de anos publicando as obras desses escritores e observando os ministérios de suas igrejas locais, tenho visto a esperança e a alegria em seus alunos ao receberem a graça por meio da fé em Cristo. Que diferença eterna faria se igrejas e grupos de adolescentes em todo o mundo captassem essa visão e colocassem o evangelho no centro de seus ensinamentos, estudos bíblicos, retiros, pequenos grupos, viagens missionárias e projetos de serviço.

Seguir essa visão é simples, mas não é fácil. Existem muitas tentações e distrações. Os que trabalham com jovens são muitas vezes jovens também e sem experiência em ministério, e normalmente recebem mais feedback do que aconselhamento. Este guia, então, oferece um excelente começo para qualquer jovem obreiro ansioso em levar Jesus a sério e ver os alunos cheios de esperança e alegria eterna.

Collin Hansen, diretor editorial, The Gospel Coalition

Introdução

Muitos diriam que o ministério de jovens e adolescentes, um campo relativamente novo, concluiu sua primeira geração perto da virada do século 21. Especialistas investiram muita atenção e energia ao examinar a eficácia do ministério de jovens e adolescentes em formar jovens discípulos com fé duradoura. Uma taxa de evasão perturbadora sugere que as igrejas falharam de modo lamentável em sua missão com os jovens.

A segunda onda de pesquisas focou nas razões pelas quais a taxa de abandono entre os jovens disparou tanto. Os especialistas identificaram problemas incluindo a falta de envolvimento da família e a segregação dos jovens das várias gerações da igreja. Nenhum fator pareceu mais influente, no entanto, do que o conteúdo da teologia do ministério juvenil, que Christian Smith chamou de deísmo terapêutico moralista.

Smith definiu o deísmo terapêutico moralista desta forma:

O Deísmo Terapêutico Moralista é sobre inculcar uma abordagem moralista da vida. Ensina que o fundamental para viver uma vida boa e feliz é ser uma pessoa de boa moral. Isso significa ser simpático, gentil, agradável, respeitoso, responsável, trabalhar o autoaperfeiçoamento, cuidar da própria saúde e fazer o seu melhor para ter sucesso.1

Será um desafio encontrar uma antítese mais direta e uma resposta mais poderosa a essa tendência teológica do que o evangelho de Jesus Cristo.

1 Christian Smith; Melinda Lundquist Denton, Soul Searching: The Religious and Spiritual Lives of American Teenagers (Oxford: Oxford University Press, 2009), p. 163.

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

Introdução

O evangelho proclama o que Deus fez pelos pecadores à parte do desempenho moral dos pecadores. O evangelho oferece um chamado inspirador para viver para o reino de Deus, em oposição a uma vida superficial focada na autoafirmação e egocentrismo. O evangelho não fala de Deus como um plano alternativo, mas de um Senhor vivo e soberano envolvido ativamente com seu povo.

Este livro defende o evangelho como o núcleo do ministério eficaz de jovens e adolescentes. Argumenta que a mensagem e a realidade da vitória de Cristo sobre o pecado e a morte devem permear todas as facetas do ministério para os jovens.

A teologia soa como uma ideia maravilhosa, mas no final das contas, os jovens vão aparecer para o estudo bíblico e retiros, e precisamos estar preparados para praticá-la. Os autores deste livro acreditam que o evangelho tem implicações práticas na maneira como conduzimos cada área do ministério de jovens e adolescentes.

Este livro expõe como o evangelho se relaciona com as principais categorias desse ministério. A primeira seção de cada capítulo fornece fundamentos filosóficos e teológicos sobre como o evangelho informa uma categoria específica de ministério. Em seguida, cada autor explica como implementar, na prática, a teologia do evangelho na área do ministério em questão, ajudando você a trabalhar o poder da cruz e também explicar aos jovens o propósito do evangelho por trás das atividades.

Começamos este livro com o que consideramos ser os principais fundamentos de um ministério de jovens e adolescentes. Os sete fundamentos incluem:

1. Centralidade do evangelho

2. Discipulado

3. Ensino expositivo

4. Relacionamentos

5. Comunidade

6. Parceria com os pais

7. Integração geracional

Em seguida, oferecemos orientação sobre quatro elementos práticos do ministério:

1. Estudo bíblico em pequenos grupos

2. Treinamentos de voluntários

3. Música

4. Retiros e eventos

Finalmente, enquanto as primeiras seções se concentram em nossa formação espiritual dos alunos, os últimos capítulos discutem o papel dos jovens na missão redentora da igreja. Oferecemos orientação sobre como liderar os alunos em:

1. Evangelismo

2. Serviço aos pobres

3. Missões de curto prazo

Coragem: o trabalho que você está fazendo é importante! Deus colocou você em uma posição central em sua igreja. Esperamos que estas páginas o ajudem a liderar um ministério que promova mudanças duradouras na vida de seus liderados e traga luz a este mundo sombrio.

Cameron Cole

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

PRIMEIRA PARTE

Fundamentos para um ministério de jovens e adolescentes centrado no evangelho

1O evangelho no coração de todas as coisas

O ministério de jovens e adolescentes fundamentado em Cristo

Cameron Cole

Por alguém teria vontade de atuar no ministério de jovens e adolescentes? Por que se envolver nesse ministério? Seriam os enormes salários? É provável que não. Seria a certeza de poderem se gabar de sua carreira nas reuniões de família e quando palestrarem em escolas? Improvável. Seriam a pequena carga horária de trabalho e o limite claro entre trabalho e vida pessoal? Sem chance.

O ministério de jovens e adolescentes pode ser um emprego frustrante ou um trabalho voluntário desafiador. De acordo com vários estudos, um ministro de adolescentes em uma igreja fica no cargo por volta de apenas dezoito meses.2 O ministério de jovens e adolescentes atrai diversos tipos de pessoas em termos de personalidade e históricos pessoais, mas a motivação por trás da entrada nesse ministério é quase universal. Certamente não é pelo dinheiro, status ou pela comodidade. É comum que ministros de adolescentes trabalhem muitas horas por um pequeno salário, além de muitas vezes serem tratados como adolescentes “crescidinhos”. É rara a noite em que não recebam uma mensagem de algum adolescente com problemas. Assim, após trabalhar quase até à exaustão durante o dia todo, ouvem perguntas dos membros da igreja como: “O que você quer fazer da vida quando crescer?”.

2 Não existe nenhuma pesquisa nacional abrangente, mas numerosos estudos regionais ou denominacionais revelam um período médio entre 12–18 ou 18–24 meses.

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

O evangelho no coração de todas as coisas

Visto que o ministério de jovens e adolescentes é um trabalho inglório e exaustivo tanto fisicamente como emocionalmente, alguém que persevera nessa área — como contratado ou voluntário — deve ter uma motivação extraordinária, capaz de superar toda e qualquer dificuldade. Dois são os motores da nossa missão e paixão no ministério de jovens e adolescentes: Desejamos ver Deus curando, redimindo e libertando os jovens enquanto confiam em Jesus; queremos ver Deus dar à luz algo lindo e libertador neste mundo caído através da vida desses jovens à medida que dão testemunho de seu Salvador.

Qualquer pessoa que se relacione com adolescentes sente a dor de vê-los passar pelos sofrimentos comuns dessa fase e os traumas que têm de suportar. Vê-los enfrentar essas fases desafiadoras, as inseguranças e espinhas do Ensino Fundamental, a pressão por estar sempre na moda no ensino médio, me deixa encabulado. Ver garotos clamando por atenção em tweets provocativos e em mensagens de Facebook machuca meu coração. Conhecer a solidão e alienação que vêm desses anos de dúvidas, questionamentos religiosos e conflitos parentais me faz lamentar. Ainda assim, essas são experiências comuns de quase todo adolescente.

Quando eu considero a exposição ao divórcio, pornografia, drogas, álcool, morte, suicídio e violência, anseio ainda mais pela volta de Jesus Cristo. Quando vejo o mundo em que esses garotos vivem, digo a mim mesmo: são apenas crianças; isso é demais pra eles. Quando testemunho o sofrimento de adolescentes, minha paixão pelo ministério de jovens e adolescentes explode em meu peito, porque quero ver curados os corações desses moços e moças. Quero que tenham esperança. Meu comprometimento com o ministério de jovens e adolescentes se inflama porque sei que as boas-novas sobre o que Jesus fez em sua vida, morte e ressurreição contêm o poder para libertá-los.

Sei que Deus pode fazê-los viver pela fé em seu Filho.

Além disso, quando vejo o mundo que enfrentarão, anseio pela redenção. Lamento pelo vício, sexualidade caída, corrupção pervasiva, individualismo normatizado, injustiça flagrante, materialismo desavergonhado, depressão crônica e desespero profundo. Ainda que a tentação de chafurdar na desesperança e aceitar o status quo exista, sei que Deus deseja trazer esperança ao mundo pela ação do Espírito Santo na vida de seus seguidores. Os garotos a quem ministro podem ser testemunhas da redenção de Deus, fontes de luz

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo e agentes da justiça em um mundo caído, tenebroso, desesperado e torto. Quero que sejam cidadãos do reino quando estão sob minha supervisão na programação ministério de jovens e adolescentes e também todos os dias depois, no mundo. Quando me lembro de que, enquanto pastor de adolescentes, me encontro na posição mais estratégica e influente na promoção desse movimento global, sinto-me inspirado. É animador pensar em tudo o que Deus pode fazer na vida de alguém que vive para Cristo e para o reino, do ensino médio à faculdade, casamento, família e carreira.

Quero que essa obra de cura no coração dos jovens e essa paixão pela redenção de Deus em Cristo perdure pelo resto de suas vidas. Não quero que essa seja a “fase de Jesus”, que eles consideram “fofa” ou “divertida” quando chegam aos trinta anos. Que perda de tempo! Embora eu saiba que nem todos os garotos em meu ministério entregarão sua vida a Cristo, meu anseio é que as correntes da obra de Deus continuem a fluir em seus corações aos 18, 28 e 78 anos.

Já que o ministério de jovens e adolescentes foca em uma redenção duradoura, o que causa a transformação na vida dos adolescentes? São as amizades mais próximas, jogos divertidos, treinamento moral, bons modelos de vida, serviço à comunidade ou música transcendente? Nada disso, na verdade. Talvez a coisa mais importante que um pastor de adolescentes possa ter é uma avaliação precisa do problema mais fundamental tanto nas pessoas quanto no mundo, e um claro entendimento do modo pelo qual Deus restaura ambos.

O problema e a solução

Meu mentor mais influente em meus primeiros anos de serviço no ministério de jovens e adolescentes me marcou com a seguinte máxima: “A teologia dirige a metodologia”. Essa é uma maneira de dizer que o que você faz no ministério reflete aquilo em que crê.

Talvez os críticos do ministério de jovens e adolescentes tenham usado muitas hipérboles e generalizações ao caracterizar a prática desse ministério. De acordo com o estereótipo, a prática do ministério de jovens e adolescentes se resume a eventos divertidos, lições sobre comportamento moral, ênfase em bons hábitos espirituais e esforços para inspirar os jovens a um maior comprometimento com Deus no contexto de seu grupo de amigos. Ou seja, é como se o ministério de jovens e adolescentes fosse um misto de jogo de queimada, abstinência e reuniões com os amigos em nome de Deus. Embora

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essa descrição seja um exagero, algumas verdades se escondem por debaixo do estereótipo (se você está começando a revirar os olhos, dizendo “de novo, não!”, continue comigo mais um pouquinho. Há notícias muito boas adiante).

Antigamente, a metodologia do ministério de jovens e adolescentes era caracterizada por uma interpretação teológica específica sobre o que seria o maior problema dos jovens. Ela sugeria que os jovens não possuem nem o conhecimento necessário sobre a vida cristã e a sua moralidade nem a motivação suficiente para aderir a esses padrões. Os jovens estariam bem se soubessem como obedecer a Deus e fossem constantemente encorajados a serem “bons cristãos”. Assim, os ministérios de adolescentes atuavam para educá-los no comportamento cristão e exortá-los a viver para Deus. Essa crença se manifesta em mensagens frequentes sobre comportamento, adoração com fins a produzir respostas emocionais e exortações para um maior esforço na busca por uma vida cristã moral.

Hoje em dia, penso que os ministérios de adolescentes estão se afastando desses métodos. Devido ao grande volume de pesquisas que sugerem que a abordagem moralista, emocional e de entretenimento ao ministério de jovens e adolescentes obteve pouco ou nenhum sucesso na criação de seguidores de Jesus, muitos pastores da área guardaram a máquina de gelo seco no sótão da igreja e começaram a falar menos sobre o consumo de bebida alcoólica por menores de idade. Ainda assim, não estou seguro de que o ministério de jovens e adolescentes como um todo ainda não entendeu a essência do que Deus faz para mudar vidas.

Os jovens de hoje têm os mesmos problemas que os seus primeiros pais, Adão e Eva. A humanidade não mudou desde os dias do Jardim do Éden. Qualquer pessoa que ministre aos jovens pode entender as três questões fundamentais que causam todos os problemas que um adolescente pode ter ao investigar o texto de Gênesis 3. Ali, encontramos o registro de Adão e Eva comendo do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, em desobediência à ordem de Deus. Reflitamos juntos sobre esse registro por alguns momentos.

Primeiro problema: A fonte da verdade

Aos adolescentes falta um entendimento preciso sobre a fonte da verdade. O engano da serpente em Gênesis 3.1 veio quando perguntou: “É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do jardim?”. Deus foi muito

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claro com Adão e Eva em Gênesis 2.17 quando lhes disse que morreriam se comessem do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal. Até mesmo Eva reconhece isso. A queda começa, contudo, com essa afirmação em Gênesis 3.6: “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos [...]” Eva deixa de se submeter à autoridade do que Deus lhe havia revelado verbalmente e passa, então, a usar seus próprios critérios e conceitos para moldar sua visão de moralidade, de si mesma, e de Deus.

Muitas vezes, adolescentes demonstram ter certo receio sobre Deus por causa do sofrimento que veem no mundo. É comum que questionem a bondade de Deus baseados em frustrações que experimentaram em sua vida.

Muitas vezes, falam sobre convicções morais com “eu acho que” e “eu sinto que”. Como todo outro ser humano, é natural que suas visões sobre a verdade sejam fundamentadas nas experiências e observações pessoais. Dificilmente alguém consideraria Deus bom e justo tendo como base sua própria experiência, dado os sofrimentos frequentes e os males no mundo. Deixado à sua própria razão, algum adolescente se absteria de sexo antes do casamento?

A primeira parte da solução a esse problema fundamental envolve apontar os alunos a fontes autoritativas, isso é, Jesus e a Bíblia, que, com precisão, representam a Deus, o homem e a verdade. O ministério de jovens e adolescentes que tenha a intenção de produzir uma mudança duradoura precisa sempre afirmar Jesus como “a imagem do Deus invisível” (Cl 1.15).

O ministério de jovens e adolescentes centrado no evangelho leva seus membros a receber a bondade e santidade de Deus. Além disso, um ministério efetivo baseia suas lições e ensinamentos na Escritura, e conduz os jovens a uma cosmovisão fundamentada na verdade que Deus revelou na Bíblia.

Segundo problema: A visão de si mesmo

O segundo problema que afeta todos os adolescentes é uma falsa visão de si mesmo. A serpente contou a Adão e Eva a mentira de que poderiam ser “como Deus” (Gn 3.5). Após comer do fruto, o primeiro casal praticou essa crença distorcida em suas ações, gritando por independência. Primeiro, quando perceberam que haviam pecado e causado estrago, o casal envergonhado toma para si as rédeas da situação e confecciona vestes de folhas para cobrir a nudez (Gn 3.7). Eles acham que não precisam mais de Deus e que podem cuidar desse problema sozinhos. Assim, quando Deus os confrontou sobre os seus atos, Adão e Eva culparam a out ros. Adão disse:

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“Foi essa mulher que me fez agir assim”. Eva: “É tudo culpa da serpente” (veja Gn 3.11-13). Eles reagiram como se não precisassem prestar contas ou responder a Deus.

A visão da condição humana demonstrada pela Escritura não é bonitinha. O próprio Senhor Jesus referiu-se aos seus discípulos — a nata do cristianismo — como sendo “maus” em Mateus 7.1. Ele disse a Nicodemos em João 3.19 que as “pessoas amam mais as trevas do que a luz, porque as suas obras são más”. Em Romanos, Paulo disse que “todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Rm 3.23). O profeta Jeremias foi mais longe ao dizer que “enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jr 17.9). Eis a verdade nua e crua!

Antes que as coisas fiquem muito depressivas, precisamos nos lembrar que a depravação humana, embora profunda, tem algo simples em sua raiz: o homem pensa que pode ser Deus. É natural para os adolescentes, assim como para todas as pessoas, acreditar que podem viver a vida à parte de Deus e sem sua ajuda. Um ministério de jovens e adolescentes efetivo não precisa ficar batendo na cabeça da garotada por causa da sua “iniquidade”. É necessário ensiná-los e lembrá-los de que foram feitos para viver em uma relação dependente com Deus e que sua natureza luta contra essa necessidade. O ministério precisa ajudá-los a entender que todo o pecado é fruto da tentativa de ser o senhor de sua vida, em vez de permitir que Jesus seja o sei Rei. Sejamos sinceros: adoçar a realidade do pecado humano é um desserviço a esses garotos. É como dizer a alguém com câncer que ele está apenas resfriado.

Terceiro problema: Visão de Deus

Em último lugar, o terceiro problema compartilhado por todo adolescente é uma falsa visão de Deus. A serpente criou sementes de dúvidas em Adão e Eva quando disse que Deus estava mentindo: que, na verdade, eles não morreriam ao comer do fruto (Gn 3.4). Então, ela levou o casal a crer que Deus estava escondendo algo deles porque sabia que se tornariam “como deuses” se comessem o fruto (Gn 3.5). A serpente apresentou Deus como um mentiroso que retém a bondade de seus filhos. Adão e Eva morderam a isca e comeram o fruto. Depois desse erro fatal, demonstraram a sua teologia pública no modo como reagiram à entrada de Deus no jardim. O que eles fizeram? Correram e se esconderam, e então mentiram. A maneira como se

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comportaram demonstrou o que de fato criam: que Deus não era perdoador e alguém em quem não poderiam confiar. Deus era mal de acordo com essa nova “teologia”.

Talvez o elemento mais importante de um ministério de jovens e adolescentes efetivo, então, seja proclamar a bondade e o amor de Deus. Nenhum adolescente confiará sua vida a alguém em quem não possam confiar. Contudo, quem terá dificuldades em confiar e se envolver com o verdadeiro Deus da Bíblia? Ele é “longânimo e grande em misericórdia” (Nm 14.18). Ele “espera, para ter misericórdia [...] porque o Senhor é Deus de justiça” (Is 30.18). Suas obras são perfeitas e ele não tem defeito (Dt 32.4). Deus é aquele em quem os adolescentes podem lançar seus temores porque ele se importa com cada um deles (1Pe 5.7). Conhecer o verdadeiro caráter de Deus cura o coração adolescente à medida que os jovens veem o seu amor derramado na cruz de Jesus.

O problema de cada adolescente é muito profundo. As falsas crenças que subjazem seu pecado e sofrimento estão profundamente encrustadas em seus corações desde o nascimento. Achar que discursos moralistas e motivacionais corrigirão esse problema é como crer que um band-aid irá curar uma perna quebrada ou que uma aspirina tratará um câncer. Adolescentes precisam reformular completamente seu sistema de crença. Acima de tudo, como todas as outras pessoas, precisam de Deus para resgatá-los, revivê-los e fazê-los nascer de novo enquanto se arrependem do pecado e confiam sua vida a Jesus como Senhor e Salvador.

O agente da mudança

O ministério de jovens e adolescentes que busca mudanças duradouras deve fluir da teologia da cruz. A cruz apresenta a figura de um Deus justo, amoroso e conhecido. Jesus Cristo, Deus em carne humana, toma para si o castigo pelos pecados do povo de Deus em seu lugar, a fim de trazer a salvação. Deus não permanece oculto. Ele se expõe plenamente no Cristo crucificado, a quem conhecemos através de sua Palavra, a Bíblia. Ele se revela como um Deus que ama o seu povo em sua encarnação e por meio da santa Palavra inspirada.

A cruz fala com honestidade sobre a profundidade do problema do homem com o pecado. A questão do pecado do homem é tão profunda que o próprio Deus teve de deixar o céu, suportar a tortura em uma cruz e

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experimentar o julgamento eterno para corrigi-lo. Isso não é um problema do nível de um joelho machucado, mas de proporções épicas. É um problema que pode ser solucionado apenas pelo poder de Deus, não pelos melhores esforços das pessoas.

Finalmente, a cruz canta a canção do amor imensurável de Deus. O seu amor pelo homem é tão grande e ardente que ele, de fato, deixou o paraíso para suportar tamanho sofrimento pelo povo eleito. Jesus enfrentou o inferno para resgatar o seu povo de lá. A cruz é a história de amor mais verdadeira e decisiva de todos os tempos.

Essa teologia da cruz capta o que os cristãos chamam de evangelho. Em grego, evangelho significa “boas novas” e, no contexto cultural original, muitas vezes se referia a um anúncio reconfortante de vitória em uma batalha ou na política. Embora muitas pessoas definam o evangelho de várias maneiras, essas definições em geral giram em torno da vitória de Deus sobre o pecado e a morte em virtude da vida, morte e ressurreição de Jesus. Essa vitória não apenas redime pecadores que depositam sua fé em Jesus, mas também se estende à obra mais ampla de Deus de restaurar o mundo caído através do Espírito Santo: uma restauração que um dia será concluída na criação de Deus de um novo céu e nova terra.

A razão pela qual os autores deste livro consideram a centralidade do evangelho algo tão fundamental ao ministério de jovens e adolescentes é que ela aborda diretamente o coração de seus membros, seus verdadeiros problemas e seu grande e eterno potencial. Regras, mensagens motivacionais, jogos e amigos não têm poder para curar corações e reviver vidas como as boas-novas da obra de Cristo. Quando levamos o ministério de volta ao evangelho, estamos conectando os jovens ao poder da cruz e ressurreição de Jesus. Deus pode cumprir o propósito do ministério de jovens e adolescentes (mudança duradoura) através do evangelho à medida que creem em Jesus e o seguem para sempre.

Já que esse livro se concentra em conectar todas as facetas do ministério de jovens e adolescentes ao evangelho, quero concluir este capítulo compartilhando histórias pessoais que esclarecem as implicações práticas do evangelho e expressam parte da paixão que alimenta essas páginas. Muitas vezes, “evangélicos” (inclusive eu) usam o termo de modo leviano, sem descrever suas aplicações concretas na vida e no ministério. Além disso, deixamos de definir quais aspectos do evangelho estamos nos referindo ao discuti-lo.

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Nas três seções finais deste capítulo, descrevo três aspectos relacionados ao evangelho: 1. o evangelho e a salvação; 2. o evangelho e a graça e 3. o evangelho e a redenção. Tenho visto Deus salvar, curar, libertar, inspirar e confortar a minha vida através do evangelho. Ele trouxe vida e frutos ao meu ministério que nunca pensei serem possíveis. Espero que essas estórias e explicações encorajem e despertem os leitores às ricas possibilidades do que Deus pode fazer através do evangelho, resultando em esperança, fé e louvor a Jesus.

O evangelho e a salvação

Embora minha paixão por compartilhar o evangelho tenha começado em um fim de semana do Disciple Now na Primeira Igreja Batista de Birmingham em janeiro de 1993, ela atingiu o clímax em uma sala de ressuscitação de um hospital infantil em 11 de novembro de 2013. Naquela manhã, minha esposa, em pânico, me ligou para me contar que nosso filho de três anos, Cam, havia parado de respirar e não tinha pulso quando o verificou em sua cama naquela manhã. Corri de um acampamento de adolescentes para um hospital infantil a tempo de os médicos nos dizerem que haviam esgotado todos os esforços: nosso bebê estava morto.

Enquanto entrávamos na sala de ressuscitação para ver nosso filho pela última vez, minha esposa Lauren e eu lembramos da conversa que tivemos com Cam na tarde anterior. Cam nos disse que queria “visitar” Jesus e sugeriu que fôssemos logo para o carro. Explicamos a ele que Jesus estava conosco agora através do Espírito Santo e que o veríamos face-a-face quando Deus nos chamasse ao céu. Ele, com um brilho sobrenatural em seus olhos, perguntou: “Eu verei Adão e Eva no céu?” (algo impressionante para uma criança de três anos dizer). Lauren e eu conversamos um pouco e dissemos que, de fato, parecia que Deus havia perdoado o pecado de Adão e Eva em Gênesis 3. Cam respondeu: “Eu não vou comer aquela maçã. Eu não quero comer daquela árvore”. Eu tinha dito a ele que todos “comem da árvore” e desobedecem a Deus, e que é por isso que Jesus veio. Cam terminou a conversa quando disse: “Jesus morreu na cruz, Jesus morreu pelos meus pecados”. Na manhã seguinte, Cam foi para o reino de Deus.

Ainda que a dor da perda de um filho seja indescritível, que conforto maravilhoso nós temos por saber que nosso filho professou a fé em Jesus e em sua obra na cruz no dia anterior à sua morte.

O evangelho no coração de todas as coisas

Minha esposa e eu podemos viver com a firme esperança do nosso reencontro com Cam no paraíso. Embora tenha sido apaixonado pela pregação do evangelho da salvação desde a sétima série, nunca antes a sua beleza e poder foram tão reais ou palpáveis quanto no dia em que demos o nosso adeus a Cam.

Quando digo “evangelho da salvação”, me refiro à mensagem de que Deus enviou Jesus ao mundo para viver de modo perfeito e morrer numa cruz pelos pecadores, ressuscitando para a sua vida eterna, para que os que recebem a Cristo pela fé possam viver eternamente no céu com Deus. O evangelho da salvação aponta para a obra histórica, completa e expiatória de Jesus e a ordem para pregar as boas-novas.

A proclamação do evangelho da salvação é uma das funções mais importantes do ministério de jovens e adolescentes. É comum que, nesse ministério, nos encantemos com assuntos bons, mas não essenciais. A vida missional, justiça social e a comunidade cristã são tópicos maravilhoso, e quero que meus liderados se preocupem com estes assuntos. Ao mesmo tempo, entretanto, não podemos negligenciar o dever essencial e a oportunidade abençoada de fazer com que os jovens estejam conscientes de sua necessidade de salvação, assim como apresentar Jesus como o único conforto e solução para o principal problema da nossa vida: o que acontece com as pessoas quando elas morrem?

Quando abordamos o ministério de jovens e adolescentes com essa clareza bíblica, as apostas aumentam e nossa vocação assume um significado substancial. Nosso trabalho envolve a condição eterna das almas dos preciosos rapazes e moças que Deus nos confiou. O que a sociedade pensa sobre um pastor de adolescentes não importa: sabemos que nos envolvemos em negócios sérios todos os dias. Podemos visitar parques de diversões, jogar muito frisbee e enviar milhares de mensagens textos por mês, mas não se engane: quando um obreiro do ministério de jovens e adolescentes ou voluntário se concentra no evangelho da salvação, seu tempo está sendo gasto com o assunto mais crítico na vida de qualquer pessoa.

Ministrar aos jovens com o evangelho no centro significa que sempre aproveitamos a oportunidade de proclamar as boas-novas da salvação através de Cristo. Estamos sempre orando para que o Espírito Santo trabalhe no coração de nossos liderados. Equipamos líderes voluntários e membros para compartilharem o evangelho no mundo. Nós mesmos vamos ao mundo

Ministério de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo — que inclui tanto nossa cidade como terras estrangeiras — e proclamamos a Cristo pela pregação e testemunho.

O evangelho e a graça

Quando terminei o ensino médio, já tinha uma teologia desenvolvida do evangelho da salvação, mas nenhuma noção sobre o evangelho da graça. Minha teologia, em geral, se resumia a aceitar a Jesus para a salvação, compartilhar Cristo com outras pessoas, e viver da melhor maneira que podia para Deus, por minha própria força, tendo a Jesus como meu modelo. De fato, embora tenha começado a seguir a Jesus no terceiro ano, tive de procurar a definição de “graça” em um dicionário, enquanto escrevia um artigo em meu terceiro ano de faculdade em Wake Forest.3 Minha teologia pessoal era, na prática, uma vida de performance — uma opção bem cansativa. Como um veterano no ensino médio participei de cinco salas de preparação para a faculdade e mais um curso adicional, praticava natação oito vezes por semana, escrevia para a redação do jornal, servia no conselho estadual do Key Club, e tinha os cargos de vice-presidente do corpo estudantil e vice-presidente da Honor Society. Na faculdade não era diferente. Eu me graduei na Wake Forest (muitas vezes apelidada de “Work Forest” [Floresta do trabalho]) com dupla titulação em três anos, e comecei a trabalhar em pesquisas acadêmicas sem remuneração. No quarto ano obtive o meu mestrado.

Ninguém ficaria surpreso ao descobrir que esse ritmo exaustivo causou estragos em minha saúde mental. Enquanto ensinava no centro da cidade de Charlotte durante meu primeiro ano fora da pós-graduação, comecei a ter problemas com minha memória de curto prazo. Eu perdia minhas chaves todos os dias e muitas vezes me perdia em minha linha de pensamento no meio da frase. Passei a ter problemas para dormir. O problema aumentou quando um medo fóbico de voltar para a escola se instalou assim que eu deixava o campus todas as noites.

Marquei uma reunião com o meu pastor, Mark Upton, da Hope Community Church, para falar sobre esse tumulto em minha vida. Mark

3 Não poderia deixar de mencionar que meus pastores na juventude falaram muito sobre amor incondicional, mas as palavras simplesmente não entraram em meu coração até meus vinte e poucos anos.

O evangelho no coração de todas as coisas

me disse que eu tive dois grandes problemas. O primeiro, ele disse, era que os sintomas que estava experimentando pareciam precursores de uma crise nervosa. Ele disse que eu precisava consultar um médico e considerar com seriedade a possibilidade de deixar o meu trabalho.

O segundo sintoma era que eu não conhecia o evangelho da graça. Ele não duvidava da minha salvação ou sinceridade como um seguidor de Jesus.

Essas foram as palavras que me mudaram para sempre:

Evangelho é descanso: significa que Jesus carrega o fardo da sua vida, que você nunca mais terá de provar a si mesmo, porque Jesus morreu em seu lugar.

Ele explicou que a mesma verdade dinâmica que fundamenta a minha salvação — minha necessidade de descansar na graça de Deus e em sua incrível generosidade — se estendia às outras facetas da minha vida. Crescer em Cristo significa crescer no entendimento da minha inabilidade como pecador, sempre buscando a ajuda de Deus para tudo.

Ao fim da reunião, oramos sobre minha decisão de sair ou não daquele cargo. Dois dias depois tive um ataque de pânico, que me deixou incapaz de falar por um mês e de ler por dois meses. Não preciso dizer que saí do trabalho. Caí em uma profunda depressão por seis meses, mas que, no final, se tornou algo maravilhoso, pois experimentei a liberdade do evangelho como nunca antes. Deus começou a cura em mim através da mensagem de sua graça e amor.

Neste livro, quando nos referimos ao evangelho da graça, estamos falando das boas-novas da morte de Jesus na cruz, que não apenas salva pecadores para a vida eterna no paraíso (embora, é claro, também faça isso para aqueles que confiam nele como Salvador e Senhor e se arrependem do seu pecado), mas também que se estende a todas as áreas da vida cristã. Como consequência, a santificação envolve a transformação à imagem de Cristo: não apenas através do arrependimento diário, mas, em última instância, através da obra do Espírito Santo e de uma dependência crescente da graça de Deus em cada aspecto da vida.

Talvez o erro mais grave e mais histórico no ministério de jovens e adolescentes seja a ausência do evangelho da graça. Têm-se pregado bastante sobre a salvação, contudo, após a conversão, é comum que a ênfase mude para o moralismo com o foco principal recaindo sobre pureza sexual, proibição

de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo de bebidas alcoólicas para menores e uma “bondade” genérica. É comum encontrar garotos esgotados, desigrejados, que abandonaram anos de ministério de jovens e adolescentes com um entendimento de que o cristianismo é apenas um outro caminho pelo qual se pode tentar ser uma boa pessoa. O fardo da performance foi demais para as suas costas, e causou danos em sua fé. Que tragédia!

Boas organizações seculares, como os escoteiros, equipes esportivas e escolas públicas, incentivam o desempenho moral e a construção de caráter. Os jovens cristãos precisam entender que o nosso único recurso para ver vidas transformadas é o evangelho da graça. Quando os adolescentes compreendem que Deus os ama perfeita e permanentemente, apesar de seus pecados, há grande esperança de transformação. Quando uma criança adota um ritmo de vida evangélico, por meio do qual vê a necessidade de Deus e depende de sua graça, Deus pode trazer cura, libertação e frutos imensuráveis. O evangelho da graça deve estar sempre presente em nosso ensino e discipulado dos jovens.

O evangelho e a redenção

Em 2006 levei alguns alunos a Nova Orleans logo após o furacão Katrina. Na primeira noite, dirigimos até Lower Ninth Ward, a área mais devastada pela tempestade. Houve silêncio e lágrimas na van enquanto percorríamos aquela vizinhança abandonada. Jovens e líderes não conseguiam compreender tamanha destruição e o desespero.

Na manhã seguinte, participei de uma reunião de pastores, na qual mais de sessenta líderes de todo o país receberam pedidos de socorro e oraram com fervor. Nosso grupo trabalhou ao lado de mais de mil e duzentos adultos e adolescentes que haviam desembarcado na cidade para ver Nova Orleans renascida após o furacão. Enquanto dirigíamos para nosso local de trabalho, onde demoliríamos o interior mofado da casa de uma viúva, chamamos a dona da casa. Ela foi transferida para uma casa de repouso do governo em Oklahoma depois da tempestade e esperou por voluntários para limpar o mofo de sua casa, que ficou sob mais de dois metros de água durante a tempestade. Sua alegria ao ouvir que a ajuda havia chegado inspirou nossos alunos.

Que adentramos a casa naquela manhã, eu e diversos jovens vomitamos devido ao cheiro horrível naquele lugar que ficou fechado por meses

Ministério

O evangelho no coração de todas as coisas

com mofo supurado. O pastor nos chamou para remover tudo que havia lá dentro até que ficasse apenas a laje de concreto, o telhado e as vigas. Todos os móveis, carpetes, gesso e isolamento tinham de ser jogados fora para podermos construir tudo de novo. Os rapazes e moças colocaram suas máscaras e óculos de proteção e trabalharam sem parar naquele calor sufocante de verão por três dias. A cada manhã e noite ligávamos para aquela doce senhora para mostrá-la o progresso da limpeza. A toda hora removíamos entulho, e aquele cheiro horrível diminuía, até que, no último dia de trabalho, sumiu completamente.

Esse projeto inspirador ampliou minha compreensão do evangelho. Em resposta ao seu apreço por Jesus, nossos liderados demonstraram amor por aquela mulher idosa com quem falavam ao telefone todos os dias. Junto com dezenas de outros grupos no bairro, nossos alunos mergulharam na escuridão e na decadência e trouxeram luz e vida. Eles testemunharam a redenção de Deus àquela casa, à vida da mulher e à cidade.

O cheiro resume muito bem a história. Quando chegamos, havia um cheiro de morte e decadência. Através dessa missão Deus fez daquele lar um lugar limpo mais uma vez. Foi um retrato tangível da obra transformadora que Deus realiza, não apenas no coração de seu povo, mas também no mundo. Esse serviço em si não é o evangelho, mas reflete a redenção mais ampla que Deus está realizando no mundo por meio de Cristo. A resposta dos alunos ao evangelho, ao servir essa mulher, deu testemunho da redenção eterna que seu Salvador traz a vidas perdidas e quebradas. A Escritura fala de um trabalho total e cósmico que flui da cruz. Em Efésios 1, Paulo fala da vontade e propósito de Deus de “fazer convergir nele [...] todas as coisas, tanto as do céu como as da terra” (Ef 1.10). Paulo escreve novamente em Colossenses 1 que Deus, pela paz através do sangue da cruz quis em Cristo “reconciliar consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus” (Cl 1.2).

Reduzir o evangelho apenas à salvação de almas diminui a magnitude e a largura da obra de Jesus. O plano de Deus para a salvação e a redenção engloba tanto a alma do povo quanto todo o universo. Um dia, Deus fará novas todas as coisas: povo glorificado, assim como novos céus e nova terra. O ministério de jovens e adolescentes com uma visão completa do evangelho tem a cruz como o fundamento de seus esforços missionais.

Os membros não fazem simplesmente viagens e prestam serviço aos pobres porque querem praticar as boas obras que a Escritura nos chama a praticar.

de Jovens e Adolescentes centrado em Cristo

É a resposta ao evangelho que os leva a fazer tudo isso. Pastores de jovens e adolescentes devem sempre lembrá-los de que a sua vida e serviço são parte da obra total de Deus na redenção de todo o mundo para a glória de Cristo.

Seguindo em frente

Este capítulo atinge o coração deste livro, pois argumenta que o evangelho serve como um catalizador para a prática de mudanças duradouras na vida dos adolescentes e na redenção do mundo. Encoraja os pastores e voluntários de adolescentes a ter o evangelho no centro de seu ministério. Mas o que isso significa? Como colocar tudo isso em prática no ministério? O restante do livro mostra o caminho para responder a essas perguntas em seu ministério.

Mais sobre o evangelho

D. A. Carson; Timothy Keller, The Gospel as Center (Crossway, 2012). [O evangelho no centro: Renovando nossa fé e reformando nossa prática ministerial (Fiel, 2016).]

Greg Gilbert, What Is the Gospel? (Crossway, 2010). [O que é o evangelho? (Fiel, 2015).]

John Piper, God Is the Gospel (Crossway, 2005). [Deus é o evangelho (Fiel, 2018).]

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