Jornal A Verdade N°164

Page 1

ELES DERAM SUAS VIDAS PELA LIBERDADE NO BRASIL

MANOEL LISBOA

MANOEL ALEIXO

AMARO LUIZ

AMARO FÉLIX

ELES MERECEM JUSTIÇA! PELO DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE

EMMANUEL BEZERRA

Um jornal dos trabalhadores na luta pelo socialismo

Partido Comunista Revolucionário

Brasil, agosto de 2014 - Ano 14 - Nº 164

www.averdade.org.br

R$ 2,00

Israel promove banho de sangue na Faixa de Gaza ATF

Criança palestina ferida em escola da ONU atingida por míssil israelense

Nada é mais vergonhoso que atacar crianças dormindo”, declarou o secretário geral da Organização das Nações Unidas Ban Ki-moon sobre os covardes bombardeios de Israel às escolas da ONU que abrigam civis na Faixa de Gaza. Mas, apesar das palavras, a ONU segue omissa e sem adotar nenhuma medida concreta para pôr fim ao banho de sangue que Israel promove na Palestina. Por que essa cumplicidade com Israel e tanta crueldade contra um povo que cedeu suas terras para os judeus terem um Estado? Por que um povo é tão humilhado, tem suas crianças torturadas e assassinadas, suas escolas destruídas, e os governos do mundo inteiro silenciam e nada fazem para deter o genocídio do povo palestino? Página 3

Adriano Diogo “A luta pela memória é uma luta contra a repressão” Douglas Mansur

Em entrevista exclusiva ao jornal A Verdade, o deputado Adriano Diogo defende a importância da luta pela memória, verdade e justiça como uma luta contra a repressão e contra a Página 5 tortura.

PL nº 4.330 é retrocesso para os trabalhadores

Flora Tristán pioneira do feminismo socialista

Arquivo

O Projeto de Lei nº 4.330 pretende legalizar a prática das terceirizações em todas as atividades econômicas de todos os setores, sejam públicos ou privados, para diminuir os salários dos trabalhadores e aumentar os lucros dos patrões. Página 4

Flora Tristán nasceu em Paris, no ano de 1803. Dedicou sua vida a organizar as mulheres e os trabalhadores para lutarem pela transformação da sociedade e pelo socialismo. Durante sua vida, defendeu várias reivindicações em favor das mulheres, como o direito pleno à educação, o direito de escolha do marido e o direito ao divórcio. Página 12


2 Agosto de 2014

BRASIL

FRASE DO MÊS “Em 1964, os bandidos assumiram o poder, rasgaram a lei, desrespeitaram todos os trâmites legais. Mataram pessoas inocentes, idealistas. Fui preso com Gregório Bezerra, que foi posto numa espécie de casa de cachorro. Ele não podia sequer sentar, tinha que ficar acocorado. No terceiro dia, retiraram ele de lá, amarraram seu pescoço num carro de combate e o arrastaram de uma área perto do CPOR (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Recife) até a Praça de Casa Forte, diversas vezes. O próximo ia ser eu. Abelardo da Hora, escultor, pintor, desenhista, gravurista e ceramista, ao completar 90 anos em Recife

Poluição e pobreza matam sete milhões de pessoas por ano

D

ois anos depois da realização da Rio+20 (Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que ocorreu na cidade do Rio de Janeiro de 13 a 22 de junho de 2012, da qual participaram líderes dos 193 países que fazem parte da ONU), o mundo ainda sofre com os graves problemas ambientais oriundos da ganância dos capitalistas por mais lucros. À época, a grande imprensa burguesa utilizou seus jornais, rádios, TVs e internet para passar a falsa ideia de que a conferência da ONU resolveria o problema ambiental e os Estados chegariam a um consenso sobre a importância e os processos da Economia Verde, garantiriam o desenvolvimento sustentável do planeta e buscariam formas de eliminar a pobreza, entre outros pontos. Mais uma vez, como de esperar, a Conferência não chegou a um consenso, e um dos motivos para tal situação foi o boicote realizado pelas grandes potências capitalistas (Estados Unidos, China e Alemanha). De fato, a Rio+20 ocorreu num período de forte crise econômica na Europa, e os capitalistas não desejavam frear suas metas de exploração da natureza em prol do bem-estar da humanidade. Como muito bem disse Frei Betto, ao avaliar o encontro, “A Rio +20 propôs aos governos, via G-77 [grupo dos países menos desenvolvidos], criarem um fundo de US$ 30 bilhões para financiar iniciativas de sustentabilidade em seus países. A proposta não foi aprovada. Ninguém mexeu no bolso. Isso uma semana depois de o G-20, no México, destinar US$ 456 bilhões para tentar sanar a crise na Zona do Euro. Não falta dinheiro para salvar bancos. Para salvar a humanidade e a

querendo enxergar o problema pela sua raiz, ou seja, pela grande concentração da riqueza gerada por uma classe, a burguesia, em detrimento classe trabalhadora, gerando uma profunda desigualdade social, os números são factuais. Desses óbitos, 88% ocorreram em países de baixa e média renda, que representam 82% da população mundial. Já nos lares, a poluição interna é oriunda principalmente da combustão na hora de cozinhar com lenha e ATF carvão. Na África Subsaariana, uma das regiões mais pobres do mundo, entre 70% e 90% da energia provém da lenha. Na Ásia, esse número está na faixa de 80% para as populações rurais e 20% em áreas urbanas. No mundo, cerca de 2,4 bilhões de pessoas utilizam a biomassa (energia extraída da lenha). Neste caso, as prinIndústria automobilística é uma das principais responsáveis pela poluição cipais complicações de Segundo a agência sanitária da saúde oriundas dessa poluição são os ONU, a poluição do ar tornou-se agoderrames, que representam 34% das ra o maior risco para a saúde dos seres mortes, e os ataques cardíacos (26%). humanos, causado por pequenas parAté mesmo a Nasa (a Agência tículas que se infiltram nos pulmões, Nacional do Espaço e da Aeronáutica, resultando em irritações, doenças cardos EUA), que responde pela pesquidiovasculares, problemas crônicos e sa, desenvolvimento de tecnologias e câncer. Em 2008, o mesmo estudo da programas de exploração espacial, OMS apontava 3,5 milhões de morapontou, em estudo publicado em tes, o que significa que, em seis anos, março de 2014 no jornal científico o número de mortes dobrou. norte-americano Elsevier Ecological Os estudos revelaram que dos se- Economics, que as civilizações, tais te milhões de mortes, 3,7 milhões são como as conhecemos hoje, poderiam resultantes da poluição externa, caudesaparecer nas próximas décadas sadas principalmente por ataques carem virtude da má gestão de recursos díacos (40%) e derrames (40%). Mais naturais e de uma má repartição das riuma vez, os pobres são as vítimas. quezas, isto é, do alto índice de desiMesmo com muitos ecologistas não gualdade econômica mundial. natureza, nem um tostão”. Agora, no primeiro semestre de 2014, mais um dado veio comprovar que a humanidade caminha a passos largos para um situação de barbárie. A Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgou que cerca de sete milhões de pessoas morrem por ano, no mundo, em virtude da poluição. Conforme essas estatísticas, uma em cada oito mortes ao redor do planeta está relacionada à contaminação do ar, seja dentro ou fora de casa.

Mobilização popular conquista novo Plano Diretor em SP Centenas de famílias sem-teto passaram dias acampadas em frente à Câmara Municipal de São Paulo para pressionar a votação do novo Plano Diretor da cidade. Em jogo estavam os rumos do crescimento da cidade para os próximos 16 anos. O Plano Diretor é uma lei municipal existente em cidades com mais de 20 mil habitantes e que deve ser elaborada com a participação de toda a sociedade. Ele é responsável por organizar o crescimento e o funcionamento do município, definindo qual a melhor forma de ocupação do espaço urbano. Em São Paulo, a disputa pelo Plano Diretor estava entre os grandes proprietários de terras a serviço da especulação imobiliária e as milhares de famílias que sofrem com os altos custos do aluguel e com a falta de moradia digna na maior cidade do Brasil. Movimentos populares, como o MTST e a CMP, assumiram a briga e foram às ruas exigir que o novo Plano Diretor de São Paulo tivesse como objetivo uma cidade mais organizada, onde as pessoas vivam mais próximas de seus trabalhos e mais perto do transporte público, que tenha mais áreas verdes e uma maior quantidade de moradias populares destinadas aos que não conseguem pagar os aluguéis cada vez mais

caros cobrados na capital paulista. Para Guilherme Boullos, do MTST, “é preciso uma política que não seja excludente. É disso que se trata quebrar os muros sociais. Temos os bairros centrais que são providos de infraestrutura e os periféricos, onde os trabalhadores são jogados, os serviços são precários e a estrutura é precária”. De fato, sabemos que uma reforma urbana é extremamente necessária no país, que tem cidades que foram crescendo de maneira totalmente desordenada e voltadas apenas aos interesses do mercado. Resultado de toda essa mobilização, o novo Plano Diretor de São Paulo foi aprovado com a inclusão de novas áreas destinadas à moradia popular e fortalece a luta contra a especulação do solo urbano. “Mostramos aos que desacreditavam, que, quando o povo se une e se organiza, a vitória vem. É importante que essa lição de mobilização popular, com acampamentos e marchas, continue, porque, se não estivermos de olhos abertos, essa lei vai virar letra morta e vai para a gaveta”, afirmou Boullos. Carolina Mendonça, São Paulo

Hospital da Mulher ameaçado em Fortaleza O jornal A Verdade é bem lido e aceito em toda a nação brasileira. Temos o jornal, mas ainda não acabamos com as desigualdades sociais. Queremos saúde, educação e moradia digna! E também remédio nos postos de saúde! Nosso Estado do Ceará pede socorro: as obras estão em atraso, os pacientes estão morrendo nas filas dos hospitais para fazerem simples consultas, e isso para nós, população cearense, é uma tortura. Para reformar os estádios foram gastos 28 bilhões de reais; isso não é brincadeira! São nossos impostos que vão para

www.averdade.org.br Redação End.: Rua Carneiro Vilela, nº 138/1º andar, Espinheiro, Recife, Pernambuco, Brasil, CEP: 52.050-030 Telefones: (81) 3427-9367 e 3031-6445 E-mail: redacao@averdade.org.br Jornalista: Rafael Freire (MTE-PB: 2.570) Diretor de Redação: Luiz A. Falcão Projeto gráfico: Guita Kozmhinsky São Paulo: (11) 98956-0317 e 98671-3990 Rio de Janeiro: (21) 8083-4999 e 9162-7167

Segundo os pesquisadores, há uma necessidade urgente de “reduzir as desigualdades econômicas a fim de garantir uma distribuição mais justa dos recursos, apoiando-se sobre fontes renováveis menos agressivas e diminuindo o crescimento populacional”. O debate sobre a degradação ambiental promovida pelo sistema capitalista ganha cada vez mais espaço na sociedade. Em setembro de 2013, o filme Elysium, escrito e dirigido por Neill Blomkamp, retratou o mundo no ano de 2159, quando os pobres habitavam a Terra, vivendo em condições desumanas e cercados de doenças, e os ricos morariam em Elysium, desfrutando de uma vida luxuosa, com inúmeras tecnologias ao seu alcance, inclusive para prevenir-se e curar-se de enfermidades. Esse mundo fictício criado no filme para o ano de 2159, infelizmente já existe. Os ricos vivem em verdadeiros castelos, numa vida confortável, tendo os melhores médicos, hospitais e cientistas à sua disposição, enquanto os pobres morrem nas filas dos hospitais à espera de consultas médicas, sem remédios, vivendo na miséria e reprimidos pelo Estado quando buscam os seus direitos. Logo, diante dos fatos expostos, a classe operária, os jovens, camponeses e todos aqueles que estão sob o jugo da exploração capitalista têm uma tarefa histórica: salvar o mundo da barbárie e da destruição. Para isso, nosso dever é a defesa do meio ambiente e da natureza, proibindo a destruição de florestas e ecossistemas e estabelecendo o controle e apropriação popular dos meios de produção (terras, máquinas, ferramentas, transportes etc.). Esta é a via revolucionária, da verdadeira transformação. Redação CE

essas construções; os trabalhadores sofrem e, enquanto isso, escolas não são entregues. O Governo quer acabar com uma das maiores conquistas que os movimentos de luta das mulheres conseguiram com muita garra: o Hospital da Mulher. Não podemos deixar isso acontecer! Presidenta Dilma, faça uma visita ao hospital e comprove a verdade, e a ignorância do atual prefeito. Ele não se incomoda com a população feminina de Fortaleza, mas nós, movimentos de mulheres, não vamos deixar isso acontecer! Lutar e organizar as mulheres para defender o Hospital Especializado das Mulheres é a nossa tarefa! Anatilde Freire, coordenadora estadual do MLB-CE Minas Gerais: (31) 9331-4477 e 9133-0983 Espírito Santo: (27) 9993-6692 Bahia: (71) 9194-1800 e (75) 9198-2901 Alagoas: (82) 8852-8688 e 8875-0330 Paraíba:(83) 8736-0001 e 8772-8249 Rio Grande do Norte: (84) 9675-6973 e 9121-3093 Ceará: (85) 8549-9667 e 9759-2295 Piauí: (86) 9835-0285 Pará: (91) 8154-0530 e 8822-5586 Amazonas: (92) 8222-3265 Santa Catarina: (49) 9940-3958 Rio Grande do Sul: (51) 8131-4693 e 8172-4826 Paraná: (41) 9233-3111 Goiás: (62) 8257-3427 Brasília: (61) 8262-9047


MUNDO

3 Agosto de 2014

Por que Israel massacra o povo palestino? Luiz Falcão

A

escalada terrorista do governo de Israel não tem limite. Nas últimas quatro semanas, centenas de ataques marítimos, terrestres e aéreos com bombas de fósforo e de fragmentação foram realizados na Faixa de Gaza, matando mais de 1.600 palestinos, em sua imensa maioria civis, até porque rigorosamente os palestinos não possuem um Exército. Já o Estado de Israel tem um dos 10 exércitos mais poderosos do mundo, com mais de 160 mil soldados, submarinos, tanques modernos, bombas de todos os tipos e cerca de 400 armas nucleares. O resultado desses covardes bombardeios israelenses são centenas de crianças mortas e milhares com pernas e braços amputados. Um desses ataques foi à escola Abu Hussein da Organização das Nações Unidas (ONU), na madrugada do dia 30 de julho, quando 21 crianças que estavam dormindo morreram. A escola foi bombardeada mesmo a ONU tendo avisado 17 vezes a Israel que suas 83 escolas na Faixa de Gaza abrigam somente civis. Pierre Krähenbühl, comissário-geral da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), afirmou após as mortes: "Ontem à noite, crianças foram mortas enquanto dormiam ao lado de seus pais no chão de uma sala de aula em um abrigo da ONU em Gaza. Crianças mortas enquanto dormiam; isso é uma afronta para todos nós, uma fonte de vergonha". Nesse mesmo dia, novos mísseis israelenses atingiram outra escola da ONU e o mercado público de Shayaia. Apenas algumas horas depois desse massacre, Os Estados Unidos confirmaram a entrega de artilharia pesada como lança-granadas e peças de morteiro de 120 milímetros para Israel. Até o inicio de agosto, mais de 400 crianças palestinas foram assasssinadas e 9.000 estão gravemente feridas. Mas, a cada dia, novos cadáveres são encontrados em meios aos escombros dos prédios e casas, escolas e hospitais destruídos por Israel. Mas por que Israel promove esse banho de sangue na estreita Faixa de Gaza, onde vivem 1,6 milhão de palestinos? Não há dúvida de que o Estado de Israel odeia os povos árabes, e, em particular, os palestinos. Sabe que tem um poder militar infinitamente superior ao dos palestinos e conta com o apoio dos países imperialistas, em particular, dos EUA, que lhe fornecem armas e bilhões de dólares para promover a matança de palestinos no Oriente Médio. De 2009 a 2018, os EUA doarão US$ 30 bilhões de dólares em ajuda militar a Israel. Israel segue à risca a ideologia nazista de que uma mentira repetida mil vezes torna-se uma “verdade”. Para isso, conta com a cumplicidade dos grandes meios de comunicação da burguesia no mundo, que repetem à exaustão as mentiras israelenses como se fossem fatos. Quem são os terroristas? Quem não se lembra de que Israel dizia que enquanto Yasser Arafat fosse vivo não existiria paz entre israelenses e palestinos, pois Arafat era um terrorista? Pois bem, como provou a exumação do seu corpo em 2012, Arafat morreu envenenado. Em janeiro de 2013, Shimon Peres, na época presidente de Israel, confirmou que foram os agentes sionistas que assassinaram o líder palestino. Hoje, Israel diz que enquanto o Hamas existir e continuar governando

ATF

a Faixa de Gaza não haverá ração desses recursos e o povo paz, porque o Hamas é terropalestino, verdadeiro dono da rista. Mas quem bombardeia riqueza, tem sido ignorado. escolas, mercados, e mata criAlém da BG, outros monopóanças enquanto dormem em lios já manifestaram intenção escolas da ONU é o quê? em explorar o gás palestino. Quem ocupar a Faixa de Gaza Israel também ataca o controlará o gás e poderá gapovo palestino na Cisjordânhar bilhões de dólares. Em nia, onde o governo é chefia2007, o governo de Israel admido pelo moderado Mahmoud tiu pagar pela exploração do Abbas, da Autoridade Naciogás aos palestinos, mas mudou nal da Palestina e constrói ali de ideia e agora quer se apodecada vez mais colônias. Corar de uma terra e de uma rimo mostram estatísticas do Criança palestina ferida após bombardeio de Israel à escola na Faixa de Gaza queza que não lhe pertencem; governo de Israel, a construquanto armas dos EUA para Israel napor isso, massacra o povo palestino. ção de colônias israelenses na Cisjorvegam livremente nos oceanos, navios Conta para esse crime com as armas e o dânia cresceu 120% em 2013. com alimentos e remédios para a Faixa financiamento dos EUA, da União EuroDepois, Israel nunca cumpriu nede Gaza são atacados. peia e o apoio incondicional das televinhum dos acordos de paz que assinou. No ano passado, em junho, o Cosões e dos grandes jornais do mundo. Pelo contrário, todos foram rasgados e mitê da ONU sobre os Direitos da CriEm resumo, Israel não quer conjogados na lata do lixo por sucessivos ança acusou as forças israelenses de viver pacificamente com o povo palesgovernos sionistas. Em 1993, assinou maltratarem e torturarem crianças patino; quer roubar suas terras e assassinar os acordos de Oslo, se comprometendo lestinas, além de usá-las como escudo aqueles que não aceitam sua dominaa retirar suas forças armadas da Faixa humano. Segundo o órgão da ONU, ção; quer se apoderar do gás e superexde Gaza e da Cisjordânia e respeitar o “Crianças palestinas detidas por miliplorar a mão de obra palestina. direito à soberania do povo palestino, tares e policiais são sistematicamente mas em vez de se retirar dos territórios Como uma muralha sujeitas a tratamento degradante e muipalestinos, construiu mais e mais colôNa verdade, para a burguesia que nias nas terras palestinas e continua a ig- tas vezes a atos de tortura”. O órgão hoje governa Israel e as principais poafirmou ainda que em dez anos, cerca norar o Direito Internacional e os peditências imperialistas, o que importa é aude 7.000 crianças palestinas com idade dos para uma paz permanente na região mentar suas riquezas; as guerras contra de nove a 17 anos, foram presas, interde dezenas de povos. Apresenta-se coo povo palestino, contra o povo sírio rogadas e muitas foram levadas para trimo vítima de foguetes do Hamas para, (mais de 179 mil pessoas mortas), conbunais militares de Israel acorrentadas sem nenhuma piedade, promover o getra o Iraque (mais de um milhão de pesnos tornozelos e algemadas. A maioria nocídio do povo palestino. soas mortas), contra a Líbia e a Ucrânia, das crianças presas foi acusada de joA hipocrisia de Israel é tão grande entre outras, são um dos principais gar pedra. De acordo com a legislação que propõe para pôr fim aos bombarmeios da classe capitalista elevar seus israelense, criança palestina que atirar deios, a desmilitarização da Faixa de lucros, principalmente num momento pedra em soldado de Israel, pode ser puGaza, mas quer aumentar seu exército em que o sistema capitalista atravessa e continuar fabricando e importando ar- nida com pena de até 20 anos de prisão. uma profunda crise econômica. Não imObjetivo é roubar as terras mas. Ora, se com os palestinos possuporta, pois, para os senhores da guerra, e o gás dos palestinos indo apenas foguetes e pedras, Israel que são exatamente os donos dos meios Mas somente o ódio ao povo pafaz o que faz, imagine o que faria se a de produção e dos bancos, quantas crilestino não justifica tanta crueldade. O Faixa de Gaza fosse desmilitarizada! anças palestinas vão ter que assassinaEstado sionista de Israel é governado Há décadas que Israel, além de rerem dormindo nem quantas guerras tepor políticos e partidos que além de dealizar covardes bombardeios e ações rão de realizar. fenderem abertamente o sionismo e militares constantes, impõe um desuO governo sionista de Israel e seus pregarem o ódio ao povo palestino, remano bloqueio aos palestinos, obrigancumplices, os países imperialistas, quepresentam a grande burguesia do país, do-os a viver com racionamento de rem impedir a qualquer custo a existênisto é, grandes empresas de construção água potável, de energia, de remédios e cia do Estado Palestino para poderem civil com interesse em construir colôde alimentos. O objetivo é expulsar o roubar suas riquezas e escravizar os sonias nas terras palestinas, e as indústripovo palestino de Gaza e de suas terras, breviventes desse genocídio; estes são as bélicas israelenses e norte-americaé mostrar para os palestinos que ou eles os verdadeiros motivos para Israel e os nas com relações íntimas com o capital saem da Faixa de Gaza ou vão ser diziEUA promoverem esse banho de sanfinanceiro internacional. mados por suas bombas e tanques, cogue e não os túneis ou foguetes do HaComo Israel tem poucos recursos mo fica claro nas palavras do líder namas. naturais e 85% de suas terras são desérzista de Israel Benjamin Netanyahu: Mas o heróico povo palestino já ticas, roubar as terras palestinas é es“O Estado judeu deve estar preparado mostrou que não aceita ser escravizado; sencial para expandir a construção de para uma longa campanha na faixa de prefere a morte a viver sem liberdade. colônias e aumentar os lucros da indúsGaza até concluir a missão.” Um povo que luta por sua liberdade potria da construção e das imobiliárias de E qual é a missão? Expulsar o pode perder algumas batalhas, mas venceIsrael. vo palestino de Gaza ou torná-lo escrará a guerra. E, como diz os versos do Também as empresas armamenvo dos sionistas. A substituição de Shipoeta comunista palestino Tawfiq Aztistas de Israel - Aerospace Industries, mon Peres por Reuven Rivlin na presiZayad, os palestinos não irão embora, Elbit Systems e Elta - que produzem vedência de Israel em 24 de julho é mais lutarão: ículos lançadores de satélites, aviões uma prova nesse sentido. O sr. Rivlin não tripulados, caças, radares avançafaz parte da ala mais radical do Likud, Aqui dos etc, e as dos Estados Unidos (Boerejeita a criação de um Estado palestino ing, Lockeed, Northrop, General DynaSobre vossos peitos e apoia a política de colônias nos terrimics, Raytheon), embora vendam suas Persistimos tórios palestinos ocupados. Segundo o armas para outros países (inclusive o jornal israelense Haaretz, “Rivlin não como uma muralha Brasil), têm no exército israelense um será o presidente do Estado de Israel, e em vossas goelas ... dos seus maiores compradores. A guersim do 'Grande Israel'. Aproveitará o Quando tivermos sede ra permanente contra o povo palestino cargo de presidente para fazer avançar permite lucros gigantescos para os proespremeremos as pedras a colonização na Cisjordânia”. prietários da indústria armamentista. e comeremos terra quando estivermos Israel tortura crianças palestinas Por outro lado, Israel se orgulha famintos Em 2008 e 2009, Israel realizou a de ter uma indústria moderna e uma Mas não iremos embora operação “Chumbo Fundido”, na qual grande tecnologia, mas é dependente assassinou mais de 1.300 palestinos e se Aqui está nosso futuro de importação de grãos, carnes e petróapossou de novas terras na Cisjordânia leo. Para superar isso, quer ocupar as e em Gaza. Durante esse massacre, os terras palestinas. (Tawfiq Az-Zayad) EUA enviaram 325 conteiners de seis Mas a Faixa de Gaza não só tem metros cada, com armas para abastecer crianças palestinas. Tem também im(Lula Falcão é membro Israel; a carga saiu do porto grego de portantes reservas de gás natural. Em do Comitê Central do Partido Astakos para o porto israelense Ashdod, 2000, foram descobertas extensas reque fica a 38 km da Faixa de Gaza. Comunista Revolucionário) servas de gás nessa região. Essas reserEm maio de 2010, Israel atacou vas foram estimadas pela multinacioos navios da flotilha da liberdade, que nal Bristish Gás (BG Group) em 40 biLeia e divulgue tentavam levar ajuda humanitária ao po- lhões de metros cúbicos, mas tudo indivo palestino e matou nove pessoas que ca que são muito maiores. A BG tem neestavam nas embarcações. Ou seja, engociado com o governo Israel a explo-


4 Agosto de 2014

BRASIL

Terceirização aumenta exploração dos trabalhadores Rafael Freire, João Pessoa

A

terceirização é um fenômeno típico do estágio monopolista do sistema capitalista de produção, em que o capital alcançou altíssimo grau de concentração nas mãos de grupos econômicos cada vez mais reduzidos. Os monopólios dominam toda a produção fundamental de bens de consumo e necessitam, por vezes, de uma grande variedade de empresas auxiliares ou filiais, prolongamentos da matriz, para desenvolver determinadas funções. A indústria automobilística, símbolo do “progresso capitalista”, representa bem este perfil. Hoje, as marcas se identificam como montadoras (Ford, Fiat, GM, Volkswagen, Toyota etc.), já que, por exemplo, não fabricam um carro do começo ao fim. Recebem os pneus já prontos de outra indústria, os vidros de uma terceira, o estofado de uma quarta, os itens eletrônicos de uma quinta empresa e assim por diante. Do ponto de vista da administração capitalista, este é um fator importante para reduzir os custos da matriz, já que a desobriga do controle dos recursos humanos do conjunto dos operários envolvidos no processo de produção. Vale ressaltar também que a fábrica que produz o pneu ou o componente eletrônico geralmente está situada numa região ou país diferente do da montagem, sempre na perspectiva da facilidade de acesso das matériasprimas e da busca por mão de obra barata. A terceirização brota, portanto, da produção industrial e se reflete em todos os setores da economia. No setor de serviços isto já se encontra plenamente instituído, como também no setor de pesquisa científica e de produção tecnológica. Neste último, vemos as universidades públicas e os institutos estatais abrirem suas portas e se renderem à “iniciativa privada”. No discurso oficial dos governos isso se chama captação de recursos, modernização, dinamismo, inovação, desburocratização, sempre sob o pretexto de mais investimentos, haja vista o descaso do Estado com o financiamento da educação e o desenvolvimento tecnológico do país. É cada vez mais forte a influência de empresas capitalistas e “fundações de apoio” nos rumos das pesquisas desenvolvidas por organismos públicos. Empresas de celulares como a Nokia, recentemente comprada pela Microsoft, do bilionário Bill Gates, equipam laboratórios, fornecem bolsas de estudos, pagam passagens e hospedagens a professores e estudantes para participar de cursos e congressos, a fim de que estes desenvolvam novos programas, aplicativos, designs, para serem implantados em seus aparelhos. A patente destas inovações, logicamente, fica com a Nokia, que vai lucrar milhares de vezes mais com a comercialização de seus produtos em relação ao valor inicial que usou para financiar as pesquisas e justificar este tipo de pirataria. No setor de serviços, os exemplos são inúmeros, tanto entre empresas privadas quanto na administração pública, especialmente em áreas que deveriam ser exclusivas e prioritárias do Estado, como saúde, segurança, abastecimento de água e saneamento. Aqui, toda terceirização é sinônimo de privatização e, em geral, acontece de forma premeditada, a partir da falta de investimentos e do crescente sucateamento de um determinado ente públi-

Rafael Freire

co, a ponto de “justificar” sua entrega a uma empresa capitalista. O Governo da Paraíba, por exemplo, terceirizou, desde 2011, toda a gestão e a execução de serviços do Hospital de Emergência e Trauma de João Pessoa por meio da “organização social” gaúcha Cruz Vermelha. Segundo o Tribunal de Contas do Estado, só em 2013 foram mais de R$ 8 milhões desviados no superfatura- Terceirização: trabalha mais e recebe menos ta dificuldade de se reconhecerem comento ou fraude em compras, prestamo categoria e de se organizarem polição de serviços e pagamento de ticamente, dificultando a ação dos sinpessoal, num grande esquema que endicatos representativos. volve empresas de fachada e relações Há ainda o fenômeno da “pejotifamiliares. zação”, em que o contratante obriga o Para o procurador-chefe do Mitrabalhador a se constituir como pesnistério Público do Trabalho, Eduardo soa jurídica, ou seja, como microemVarandas, “a terceirização da saúde presa, e, em vez de assinar sua carteiaplicada no Hospital gerou uma série ra, pagar um salário determinado e arde irregularidades administrativas e car com todos os direitos trabalhistas, trabalhistas que levaram o MPT a pefaz-lhe um pagamento por serviço dir a condenação do Estado, da Cruz prestado, desobrigando-se com o recoVermelha, do secretário de Saúde e da lhimento do FGTS e do INSS, com o secretária de Administração ao pagapagamento do 13º salário, da licençamento de R$ 20 milhões, por danos à maternidade, da multa rescisória, das população”. férias etc. Consequências diretas Mas o dado mais alarmente diz para os trabalhadores respeito aos acidentes de trabalho. SeUma massa imensa de trabalhagundo a Organização Internacional do dores sofre diretamente as consequênTrabalho (OIT), o Brasil é o quarto cias da terceirização. Eles ganham mepaís do mundo em número de acidennos, trabalham, adoecem e morrem tes e mortes, com mais de 1,3 milhão e mais e pulam de emprego em empre2,5 mil, por ano, respectivamente. Cergo, segundo levantamento do Deparca de 70% dos acidentes acontecem tamento Intersindical de Estatísticas e com terceirizados e, entre os acidentes Estudos Socioeconômicos (Dieese). A que levam à morte, 80% das vítimas terceirização é, portanto, uma tática são trabalhadores subcontratados. Sedos capitalistas para explorar mais a tores fundamentais da nossa econoclasse trabalhadora, extrair dela uma mia, como construção civil, energia e maior taxa de mais-valia e, consepetróleo, lideram as estatísticas. quentemente, aumentar seus lucros. Todos esses homens e mulheres incapacitados para o trabalho, mutilaMais de 25% dos contratos com dos, mortos, são o resultado das extecarteira assinada no Brasil (cerca de 13 milhões) são terceirizados. Só no se- nuantes jornadas de trabalho (sempre prolongadas pelas horas extras), dos tor de telemarketing e teleatendimensalários achatados e da falta de treinato, são estimados 1,5 milhão de trabamento e de equipamentos de proteção lhadores, quase todos terceirizados, que prestam serviços a monopólios na- individual. Trabalho escravo no setor têxtil cionais e estrangeiros de áreas como telefonia, TV por assinatura e bancos. Como a ânsia de mais lucros não Estes trabalhadores recebem, em métem limites para os capitalistas, até tradia, salários 27% menores que os conbalho escravo é usado por grandes tratados diretamente, quase todos no marcas de roupas e lojas varejistas, patamar do piso salarial. por meio de empresas terceirizadas de produção têxtil. Está em curso na No caso do serviço público, a disAssembleia Legislativa de São Paulo tância entre os salários é ainda maior. uma Comissão Parlamentar de InquéOs diversos governos, ao invés de serito (CPI) que investiga empresas coguir o que determina a Constituição, contratando servidores efetivos via con- mo Marisa, Pernambucanas, C&A, Zara, Collins, Gregory e M.Officer, curso, empregam milhares de pessoas acusadas de promover tal prática em em todo o país na condição de prestasua cadeia produtiva. doras de serviços, precarizando ainda No caso da espanhola Zara, que mais o atendimento à população e possui lojas em mais de 80 países, um rebaixando o valor da força de trabalho de seus executivos já admitiu na CPI de diversas categorias profissionais. saber que a empresa terceirizada Aha A média da jornada de trabalho (de quem a Zara Brasil compra 90% dos terceirizados ultrapassa as 44 hodas roupas que revende) mantinha, em ras semanais, com tempo de permapequenas oficinas subcontratadas, tranência no emprego estimado em dois balhadores em situação análoga à esanos e meio, enquanto a jornada dos cravidão. contratados diretamente é de cerca de O Ministério Público do Traba40 horas semanais, com aproximadamente seis anos no mesmo posto de tra- lho em São Paulo (MPT-SP) também pediu à Justiça o banimento do mercabalho. do brasileiro da empresa M5 Indústria Assim, trabalhadores de uma e Comércio, detentora de filiais da mesma categoria ou até de uma mesmarca M.Officer em todo o País. Em ma empresa possuem direitos trabaduas fiscalizações recentes, foram enlhistas diferentes. Por tudo isso e pela contrados trabalhadores (na maioria, alta rotatividade nos postos de trabaimigrantes) submetidos a condições lho, os terceirizados têm também mui-

desumanas em pequenas oficinas clandestinas, sem qualquer direito trabalhista. Os locais eram insalubres, com fiação exposta das máquinas, botijões de gás, banheiros coletivos com forte odor de urina, excesso de poeira, iluminação precária, ausência de equipamento de proteção individual e de extintores de incêndio. Além disso, os operários moravam no próprio local e recebiam de R$ 3 a R$ 6 por peça produzida, cumprindo jornadas médias de 14 horas diárias. PL nº 4.330 visa aprofundar a terceirização Para aprofundar este cenário de superexploração e desrespeito à legislação trabalhista, os empresários brasileiros estão unidos em torno de um de seus representantes no Congresso Nacional, o deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), dono da indústria de alimentos Mabel. Para defender os interesses de sua classe, ele propôs o Projeto de Lei nº 4.330, que legaliza a prática das terceirizações em todas as atividades econômicas, de todos os setores, sejam públicos ou privados, seja na atividade-fim ou na atividade-meio. Atualmente, uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST) proíbe a terceirização da atividade-fim, que é aquela que define, por exemplo, se uma indústria fabrica alimentos ou bicicletas. Mas isto já é largamente desrespeitado hoje. Segundo a resolução do TST, no caso do Hospital de Emergência e Trauma de João Pessoa, exposto no início deste texto, seria legal terceirizar os serviços administrativos, de limpeza, cozinha e segurança (atividades-meio), mas não seria permitido terceirizar o atendimento de saúde (atividade-fim), como os serviços executados por médicos, enfermeiros, dentistas, nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas e técnicos de enfermagem. Muitas lutas já foram desenvolvidas pelas entidades sindicais para combater a terceirização no seio das categorias, como também contra a aprovação do PL nº 4.330. Contudo, por ser um processo característico da dinâmica capitalista, a terceirização deve ser atacada da maneira mais global possível, avançando para reestatizar antigas empresas públicas privatizadas; para proibir a contratação de prestadores de serviços e realizar concursos; para parar de pagar as dívidas públicas e reverter ao povo todo o montante de recursos que hoje vai para as contas dos especuladores financeiros; para enterrar de vez o PL nº 4.330 e proibir também a terceirização nas atividades-meio; para reduzir a jornada de trabalho e acabar com a farra das horas extras; para assegurar o pagamento do salário mínimo estipulado pelo Dieese; para garantir um fiel cumprimento das normas de segurança no trabalho; para expropriar todas as empresas que mutilam, assassinam ou escravizam operários. Esta é uma tarefa para o conjunto da classe trabalhadora e que só poderá ser alcançada com uma grande mobilização dos trabalhadores e de seus sindicatos, de todos os setores revolucionários e progressistas do País. (Rafael Freire é presidente do Sindicato dos Jornalistas da Paraíba)


BRASIL

Adriano Diogo: “O Congresso Nacional precisa de mais gente de esquerda” Adriano Diogo era militante estudantil na resistência à Ditadura Militar. Fez movimento secundarista e universitário. Estudava Geologia na USP quando foi preso e torturado, em 1973, no DOI-Codi de São Paulo, comandado, na época, por Carlos Alberto Brilhante Ustra, hoje coronel reformado do Exército. Foi no dia de sua prisão que testemunhou o assassinato de Alexandre Vannuchi Leme, seu companheiro de militância e amigo de turma da universidade. Desde então, sempre se dedicou às causas ligadas à justiça social e desenvolveu uma longa luta por moradia, saúde, direitos humanos e meio ambiente. Atualmente é deputado estadual na Assembleia Legislativa de São Paulo e presidente da Comissão de Direitos Humanos e da Comissão Estadual da Verdade, que investiga as mortes e torturas durante a Ditadura. Recentemente, Adriano combateu as prisões de militantes nas manifestações contra o aumento das tarifas na Capital paulista. É um importante lutador contra a violência policial na periferia e um grande apoiador da luta dos petroleiros em defesa da Petrobrás e do petróleo brasileiro. Vivian Mendes, São Paulo Douglas Mansur

A Verdade – A Comissão da Verisso não vira agenda política no país, repercute na sociedade, princidade de São Paulo termina seus trabalhos em dezembro deste palmente entre as pessoas que não ano. Já é possível fazer um balanaceitam o atual sistema político, ço do trabalho realizado até no campo da cultura, da arte, gente aqui? que tem uma sensibilidade grande para esse tema, mas não entra na Adriano Diogo – Eu acho que a agenda política, no dia a dia dos comissão cumpriu um papel imgrandes partidos políticos. portantíssimo, que foi, primeiro, Esse ano eleitoral mexe com de emular a Comissão Nacional e nosso trabalho, porque se eu não incentivar a criação de outras cofor eleito, por exemplo, nossa tese missões estaduais, municipais, será derrotada, vai reforçar a ideia universitárias e outras. de que quem trata de Comissão da Depois, a nossa comissão é Verdade, Ditadura, direitos humauma comissão militante. E eu acho que nós fomos bem porque Ivan Seixas, Adriano Diogo e Amelinha em ato contra o golpe militar nos deve ficar no gueto, no limbo, então imagine a responsabilidade. admitimos isso e depois porque nós nizando o leilão do pré-sal. Igual quannão ficamos atrás do “sucesso”, “das lu- do o Paulo Malhães foi depor na Cozes”, o que eu considero um verdadeiro Existe um grande debate sobre a revimissão Nacional, e os caras o mataram são da Lei da Anistia e a punição dos câncer da política. no outro dia, Ditadura em tempo real. A nossa estrutura é mínima, nós Eu acho que essa Comissão da Ver- agentes do Estado responsáveis pelas torturas e assassinatos. Como você não fomos aprovados nem na forma da dade do passado deve servir de espelho analisa essa questão? lei, foi um projeto de resolução que não para uma comissão do presente, porque A punição está na agenda, a postem status nem de CPI, é quase uma coas estruturas da Ditadura estão aí. Agora sibilidade existe e, com ela, aparece missão de estudos, e na Assembleia Leestá aparecendo a repressão política, também a reação, os caras também esgislativa de São Paulo, que é um lugar mas a repressão social é livre e maior. tão se armando, vindo pra cima. Antes de direita, é difícil. Então eu acho que ninguém tocava no assunto, agora a nós, e não sou eu, somos nós mesmos, Você acha que a discussão que as cogente diz que tem que ter, eles dizem fizemos uma coisa importante. Eu missões trouxeram ajudou o debate poque não tem. acho que é um balanço extremamente lítico da sociedade de forma geral? favorável. Eu acho que vamos chegar numa Olha, eu sou um cara do ramo da hora no Brasil em que a punição será alpolítica, mas eu também estava perdigo natural, o problema é que o lapso Que questões você destacaria como sen- do, porque fica essa despolitização de temporal é tão grande que a gente corre PT versus PSDB, vira competição: “eu do as mais importantes do trabalho da o risco de não ter ninguém pra punir. vou fazer 5 km de asfalto” e o outro “eu Comissão? Mas a revisão do período histórico, nisvou fazer 10”, e aí? Você não muda naNossa grande contribuição é que so a gente avança, esse discurso de que da! Vai fazer com que conceito, qual vium capítulo que era banido – dos mora Ditadura foi uma revolução acabou, são? Eu não vou ficar criticando o PT tos e desaparecidos, que eram tidos cotorturador virou facínora. Há uma policomo se eu não fizesse parte, mas essa mo “terroristas” –, será bem tratado. E tização gradativa, mas é lenta. Como cultura nós tínhamos perdido. Esse nese nós não fizermos os casos de todos houve 400 anos de tortura dos escravos xo do fim da Ditadura com a redemoos mortos e desaparecidos brasileiros, no país, existe uma permissividade muicratização se perdeu. O conceito de esa Comissão Nacional não fará. Outra to grande, mas estamos encarando isso. querda voltou e voltou bem. Não acho coisa que temos a condição de contrique é impossível que implementem um buir mais é na relação dos americanos e plano neoliberal superagressivo no pró- Em dezembro, a Comissão Nacional dos franceses com a repressão, que era ximo período, mas acho que nós estada Verdade apresentará o relatório fium outro assunto quase que proibido. mos vivos. nal de suas atividades. Quais os desafiEu me transformei nesse procesA Comissão não é, claro, a única os que estão colocados para a luta por so, e olha que eu sou um cara velho poliresponsável por isso, mas acho que ajumemória, verdade e justiça hoje no ticamente falando. Isso me deu digniBrasil? dou. Eu acho que a rua é muito impordade e a possibilidade de conviver tantante. Um exemplo é o genocídio que Eu acho que a primeira coisa é to com a geração que viveu, quanto está acontecendo contra os palestinos, que temos que influenciar esse relatócom as novas gerações que encararam em Gaza, ninguém podia falar disso, bem o trabalho. mas a rua entrou em cena, e a presidenOutra coisa é que o assunto to“21 anos de lutas: sem te foi e falou do massacre, se posiciomou outra proporção. Eu concordo nou. Eu acho que a rua sempre ensina e retrocesso, pelo Brasil com uma coisa que o Paulo Vanucchi ensina coisa boa, coisa progressista. Eu diz que é que, quando começou a Coe pelos Trabalhadores” acho que o Brasil voltou a ter uma cara missão da Verdade, não havia mais de de esquerda, pode estar batendo um é o tema do 16º três mil pessoas no Brasil falando sopouco de cabeça, mas tem um discurso bre isso, agora somos mais de 30 miCongresso Nacional da de esquerda no Brasil, e eu acho que a lhões [pesquisa recente do Datafolha Comissão da Verdade ajudou a colocar afirma que a maioria da população deFUP uma pimenta nisso. fende, hoje, a punição aos torturadores, Entre os dias 14 e 17 de agosto de Por mais polêmica que seja a quesdiferente de 2010]. Eu acho que o que é 2014, a Federação Única dos Petroleitão da Copa, apareceu uma realidade importante é que as novas gerações se ros (FUP) realizará seu 16º Congresso impossível de esconder, apareceu o paempolgaram, assimilaram e assumiNacional, que marcará os 21 anos de pel do José Maria Marin, da CBF, da ram essa bandeira, talvez não da meexistência da entidade. O evento será lhor forma, mas eu acho que valeu. Fifa. em Natal, no Rio Grande do Norte, e Claro que também apareceu uma Eu acho que está caindo a ficha deverá reunir cerca de 400 trabalhadonova direita, ou melhor, uma direita da Ditadura em tempo real, que não é res, entre delegados, observadores, que ninguém sabia que existia, que estasó aquela do passado, é essa que dita a convidados e assessorias. Com o tema va no armário, mas é um país mais bem ideologia da direita hoje, está viva, os "21 anos de lutas: sem retrocesso, pedefinido, rompendo com a hipocrisia caras continuam mandando. O presilo Brasil e pelos trabalhadores", o dente da Petrobras de 1984, quando de que convivemos todos juntos, tortuCongresso debaterá temas da conjunaconteceu o incêndio da Vila Socó, em rados e torturadores, eu acho que isso tura política e econômica do país, reiCubatão, que matou mais de 500 pesestá se dirimindo e eu acho importante vindicações que permearão a campasoas, e que os dados oficiais dão conta isso pro Brasil. nha salarial da categoria, agendas de lude apenas 93, continua na ativa, orgaO que eu não me conformo é que

5 Agosto de 2014

rio, porque ele está em disputa. Depois eu penso que nós temos que produzir o nosso próprio relatório, com um conteúdo político sólido. Agora essa luta pela memória, verdade e justiça não é uma luta isolada, essa é uma luta da humanidade, a luta contra a repressão, contra a tortura, contra o extermínio. A tortura é encarada no país como um instrumento normal. Eu vejo o golpe militar como uma exacerbação da luta de classes, do domínio, do lucro, do uso da força. A Comissão da Verdade tem que servir pra enfrentar a face bárbara do capital, que é o fascismo, o golpe, a repressão, o assassinato, que eles consideram uma coisa normal, como conquista de território e tal. Esse processo “civilizatório” no Brasil é recente, aconteceu nos últimos 20 anos, mais ou menos, o que, comparado com os 400 anos de escravidão, é muito pouco. Por que o Congresso Nacional não teve um papel mais destacado na investigação dos crimes da Ditadura Militar? Por que quem trata desse tema é visto como radical ou problemático, e os que trataram foi de forma precária. Acho que o Congresso precisa de mais gente de esquerda, porque essa é uma pauta de esquerda, e no Brasil esse conceito de esquerda no âmbito parlamentar desapareceu. Hoje, dentro do PT, quem pratica isso tem uma enorme dificuldade de sobrevivência. Mas eu estou animado. Não acho que todo mundo que está indo pra rua é marxista, ou tem noção de luta de classes, mas acho que está sendo reivindicado que tem que ter pensamentos de esquerda, visão de esquerda, arte, música de esquerda, nunca se discutiu tanto o papel de direita, golpista, dos meios de comunicação, por exemplo. Eu tenho pensado em Cuba, porque um país que exporta médicos, exporta dignidade. Eles construíram uma sociedade evoluída, socialista. Você vê um país como o nosso, que tem universidades fantásticas, e que grande parte da população não tem acesso a médico nenhum. O problema que eu acho que tem no Brasil é que ele se mirou num processo civilizatório sem consciência política, sem consciência de classe. As pessoas dizem que é bom que no Brasil, nos últimos anos, milhões de pessoas saíram da miserabilidade, mas eu pergunto: a consciência política, a mobilização, tem o mesmo nível dessa ascensão? Todo mundo pode ser recrutado pra um outro projeto político sem consciência. Com consciência a pessoa não precisa concordar com tudo, mas tem noção do monstro da estrutura de classes, porque o desenvolvimento econômico sozinho não garante nada, o que garante é a consciência política.

ta e também elegerá a nova direção colegiada da FUP para o período 2014/2017. Além disso, serão debatidas questões relacionadas à terceirização e condições de trabalho, democratização da comunicação, lei de mídia e net-ativismo, política energética e a experiência da Plataforma Operária e Camponesa para Energia, relançamento de livro clandestino resgatando atrocidades da Ditadura Militar, questões de gênero das trabalhadoras da Petrobrás.


6 Agosto de 2014

TRABALHADOR UNIDO

Petroleiros defendem punição para torturadores da Ditadura

A

Sindipetro CE/PI

o som do hino mundial dos trabalhadores, A Internacional, foi aberto, em Fortaleza, no dia 11 de julho, o 29º Congresso Estadual dos Petroleiros do Ceará e do Piauí. Movimentos sociais, estudantes, trabalhadores das mais diversas categorias e parlamentares lotaram o auditório do Sindicato dos Petroleiros (Sindipetro) e participaram de um emocionante ato com o tema “Petroleiros exigem punição aos assassinos da Ditadura”. À mesa de abertura estavam presentes Oriá Fernandes (presidente do Sindipetro), Francisco Sobrinho (Central Única dos Trabalhadores-CUT), João Moraes (Federação Única dos Petroleiros-FUP), Josivaldo Oliveira (Movimento dos Atingidos por Barragens-MAB), Marcos Vinícius (Movimento Luta de Classes-MLC), Katerine Oliveira (União Nacional dos Estudantes-UNE), Luane Mota (Federação Nacional dos Estudantes do Ensino Técnico-Fenet); Sílvio Mota (ex-guerrilheiro da ALN e juiz aposentado) e Edival Nunes Cajá (expreso político e membro do Comitê Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco).

Em sua fala, Oriá Fernandes, presidente do sindicato, ressaltou a importância dos petroleiros para o Brasil e afirmou que “esta categoria sempre foi de luta e tem uma forte identificação com o povo brasileiro”. Moraes, coordenador da FUP, afirmou que “o petróleo esteve no centro do golpe militar porque o último decreto assinado por João Goulart nacionalizava as refinarias e desapropriava 60% das ações das refinarias privadas que existiam no país. Já o primeiro decreto assinado pelo general Castelo Branco foi a devolução dessas ações. Não foi à toa, portanto, que os sindicatos dos petroleiros foram alvo de muita perseguição”. Luta contra o PL 4.340 O Congresso continuou no dia 12 de julho, com a eleição da mesa diretora e, em seguida, com a palestra do representante da CUT, Anísio Melo, sobre o Projeto de Lei nº 4.330, que tramita na Câmara do Deputados e prevê a contratação de terceirizados em todas as atividades, inclusive na atividade-fim das empresas. A Petrobras conta hoje com quase 300 mil terceirizados. A terceirização é uma forma que os capitalistas encontram para au-

Professores conquistam nova vitória no Rio Em mais uma ação visando a intimidar os trabalhadores em Educação do Rio de Janeiro, a Prefeitura e o Governo do Estado tentam por todos os meios atacar os direitos básicos da categoria. Desde o início da greve iniciada em 12 de maio, o ministro Luiz Fux, do STF, autorizou os governos a cortar o ponto dos profissionais pelo fato de o sindicato não ter comparecido à audiência convocada por ele. Apesar de o movimento ter se encerrado desde o dia 27 de junho, os governos do Rio cortaram salários e ameaçam os servidores, principalmente aqueles que estavam em estágio probatório. Todos esses ataques são tentativas de impedir que os educadores denunciassem os problemas da Educação durante o período da Copa da Fifa, temendo a repercussão negativa na mídia internacional. Na rede estadual, apesar de terem conquistado 9% de reajuste, muitos profissionais sofreram processo administrativo por abandono de cargo e vários perderam sua lotação na escola em que trabalhavam. Alguns relatos impressionam: educadores que trabalhavam há mais de 20 anos na mesma escola foram retirados; professores humilhados por diretores, e outros que tiveram que ficar em quatro escolas diferentes. Um professor relatou que a Coordenação Regional deixou um recado em sua casa, com sua mãe, de 94 anos, dizendo que ele poderia perder o emprego. A senhora passou mal e teve que ser levada ao hospital. A Prefeitura do Rio cortou o ponto dos grevistas, muitos tiveram descontos, e outros, o salário zerado, colocando em risco a subsistência desses profissionais, que em sua maioria têm filhos. O Sindicato Estadual

dos Profissionais da Educação (Sepe) realizou um ato público em defesa do direito de greve, para denunciar essas ações dos governos. O ato contou com a presença de movimentos populares, centrais sindicais, partidos políticos e entidades que lutam pela defesa dos direitos humanos, todas demonstrando sua solidariedade à categoria. O sindicato foi à luta e conseguiu uma audiência com o governador, arrancando dele um decreto que abona todas as faltas por greve. Conquista importante, mas que não resolveu ainda a questão da perda das escolas. No dia 21 de julho, o Tribunal de Justiça do Rio concedeu liminar obrigando o município a devolver o valor descontado dos salários, pois a greve não tinha sido julgada, e afirmando ainda que, até que chegue ao final do processo, nenhum profissional poderá ser considerado inapto para o exercício do cargo público que ocupa. O direito de greve, descrito no artigo 9º da Constituição e na Lei nº 7.783/89, está ameaçado. Podemos ver várias greves sendo decretadas ilegais ou abusivas, e, mesmo quando isso não acontece, os trabalhadores são punidos. Além dos educadores, os garis do Rio também foram penalizados, e 42 metroviários de São Paulo foram demitidos por fazerem greve. Assim como outros trabalhadores, os educadores do Rio não se intimidaram e continuam na luta por uma educação pública, gratuita e de qualidade e pela garantia do direito de greve de todos os trabalhadores. Gabriela Gonçalves, Rio de Janeiro

mentar lucros e arrancar direitos da classe trabalhadora. Os delegados presentes, em suas intervenções, rechaçaram o PL 4.340 e todas as formas de terceirização. Logo após, foi apresentada ao plenário a tese política construída pela direção do Sindipetro, que contava com uma rica análise da Congresso do Sindipetro pediu fim das privatizações no país conjuntura nacional gresso foi a proposta apresentada pelo e internacional, com textos sobre sindiretor financeiro do Sindipetro, Emadicalismo e organização dos trabalhanuel Menezes, de desfiliação do sindidores, mulher trabalhadora, entre oucato da Central dos Trabalhadores do tros, sendo aprovada pelos delegados Brasil (CTB) e filiação à Central Únipresentes. ca dos Trabalhadores (CUT). Posteriormente, foram lidas as Na avaliação de Emanuel, “este propostas formuladas pelos grupos de foi, por sinal, um dos maiores congrestrabalho. Destaque para a campanha sos da história do Sindipetro, com delecontra o PL da Terceirização; contra o gados eleitos de forma democrática e assédio moral e a perseguição às lideparticipativa nas bases de trabalho e ranças sindicais; e a luta contra as pricom um debate bastante qualitativo durante todo o evento”. vatizações do petróleo e em defesa da soberania nacional. Um dos pontos altos do ConRedação Ceará

Metroviários convocam caminhada contra demissões arbitrárias

PauloLannone afirmar que a atuação Todas as demisdos grevistas foi semsões dos metroviários pre pacífica e de conde São Paulo tiveram vencimento para adeo objetivo de persesão à greve. guir as lideranças da greve e criminalizar A direção do quem luta por direiMetrô, não satisfeita tos. Para Geraldo com as demissões, Alckmin, governador aplica assédio moral de São Paulo, os greno pós-greve. Ameavistas são vândalos e ça com lista de dedepredaram as estamissões e implemenções e, portanto, deveta aumento de jornariam ser demitidos. da, dupla função e incentiva a desfiliação Trata-se, sem ao sindicato. dúvida, de uma política para reprimir e Ato pela readmissão dos metroviários, na Faculdade de Direito da USP Porém, existe criminalizar o moviuma grande indignamento sindical que denunci- por meio do esquema conheção nos trabalhadores, que esou o caos no transporte, a su- cido como “Trensalação Tuperam e se preparam para dar perlotação, a precariedade e a cano”. o troco. Muitas ações já foram corrupção no Metrô. A greve realizadas para readmitir os Na pressa de demitir, o exigia melhorias de condi- Governo selecionou os nometroviários e, no dia 12 de ções de trabalho, plano de car- mes e se enganou em dois caagosto, às 16 horas, será realireira e equiparação salarial, sos por terem nomes parecizada uma caminhada do mas nada disso é possível dos. Na dúvida, demitiu os Masp até Assembleia Legisquando o objetivo do Gover- dois. Todos os demitidos inlativa de São Paulo, onde ocorno é economizar com os tra- gressaram com recursos admi- rerá audiência pública, em debalhadores para repassar às nistrativos com a mesma argu- fesa desta causa. grandes empresas do setor mentação que consistia em Redação São Paulo

Servidores ganham novo sindicato no Sertão Pernambucano No último dia 5 de julho, diversos servidores do Alto Pajeú, no Sertão Pernambucano, realizaram uma assembleia para ampliar a base do Sindicato dos Servidores Municipais de Afogados da Ingazeira (Sismai). A entidade, que tem oito anos de luta, agora vai representar mais 12 municípios vizinhos, em uma das mais importantes regiões do Estado, marcada pelas dificuldades da seca, pelo coronelismo e pela histórica disposição de luta e organização do povo trabalhador. Estiveram presentes diversas autoridades, como o presidente da CUT-PE, Car-

los Veras, que destacou a importância da atividade por representar um histórico passo na organização dos servidores municipais no Sertão. Teobaldo Filho, da Coordenação Estadual do Movimento Luta de Classes, reafirmou que “o MLC esteve presente na região desde a fundação deste sindicato, e agora iremos fazer uma luta ainda maior para mudar a realidade dos servidores de todo o Pajeú”. A repercussão da assembleia já pode ser vista, como na cidade de Iguaraci, onde, antes, os servidores não podiam ter sequer acesso à Lei Orgânica do Município

ou ao Estatuto do Servidor, e agora já realizam suas reuniões juntamente com o sindicato, visitam outros servidores nos diversos setores e já preparam uma pauta de reivindicações, provando que só a união dos trabalhadores é que possibilita a conquista de seus direitos.

Acesse

www.averdade.org.br


JUVENTUDE

7 Agosto de 2014

“Vamos às ruas por um ensino de qualidade e pelo passe-livre” A Verdade

A Federação Nacional dos Estudantes do Ensino Técnico (Fenet) realizou em Brasília-DF, no último mês de abril, seu 3º Encontro Nacional, o maior evento deste setor já realizado no Brasil. Na ocasião, a estudante de Meio Ambiente do Cefet-MG, Bia Martins, de 21 anos, foi eleita coordenadora-geral da entidade. Em entrevista a A Verdade, Bia fala sobre os desafios e as lutas da nova diretoria da Fenet. Da Redação

Bia Martins: “Lutamos por nossos direitos”

A Verdade - Nós últimos anos, houve uma expansão do ensino técnico no Brasil. Qual a posição da Fenet sobre este crescimento? Bia Martins - A expansão na educação é um processo muito positivo, sobretudo por que vivemos em um país que investe menos de 4% do seu orçamento na área. Acontece que o Governo Federal utiliza a expansão apenas para fazer propaganda e não tem garantido educação de qualidade. Após três projetos de expansão da rede e a criação do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego), o Brasil tem hoje quase oito milhões de estudantes nos cursos téc-

nicos federais. Mas várias escolas criadas ainda no primeiro projeto não foram concluídas, outras estão sem bandejão, com laboratórios em péssimas condições ou falta de professores. Já o Pronatec está formando técnicos profissionais em três meses, entregando dinheiro público para a iniciativa privada e acabando com o pouco investimento em pesquisa e extensão. Nós, da Fenet, lutamos por uma expansão com investimento na educação de qualidade e que possibilite uma boa formação. Quais são as principais reivindicações dos estudantes técnicos? Defendemos a construção de um plano nacional de assistência estudantil para o ensino técnico, pois hoje há diversas instituições que não garantem o bandejão, bolsas de auxílio e outras assistências aos estudantes carentes. A defesa do piso salarial dos técnicos, assegurando valorização e reconhecimento da nossa profissão, a questão da melhoria da nossa escola e a garantia de uma expansão de qualidade também estão entre as reivindicações da entidade. Outro ponto muito importante é a luta contra a restri-

ção da meia-entrada cultural, garantindo que o direito de todos os estudantes de pagar a metade para entrar em eventos culturais e esportivas não seja reduzido para 40% dos ingressos disponíveis. Qual a posição da Fenet sobre a redução da maioridade penal? Somos contra a redução da maioridade penal. Nós achamos que é precisa libertar a juventude com uma educação de qualidade, com acesso à cultura, esporte e lazer, ao invés de colocá-la atrás das grades. Quantas vezes já ouvimos falar de jovens que, por terem uma vida sem nenhuma perspectiva, entraram nos mundo do crime ou das drogas mas que, quando ingressam num grupo de teatro ou praticam alguma modalidade esportiva, tomam um novo rumo em suas vidas. Em Minas Gerais o governo do PSDB abriu mais vagas em penitenciárias do que em escolas e universidades, mostrando que sua prioridade é repressão, e não educação. O Congresso Nacional deveria se preocupar em fazer alguma coisa para prender aqueles que torturaram e assassinaram milhares brasileiros durante a

Estudantes lutam contra aumento das passagens em João Pessoa No dia 23 de julho, a juventude foi às ruas de João Pessoa lutar contra o aumento das passagens no transporte coletivo. A tarifa foi reajustada de R$ 2,20 para R$ 2,35. A manifestação reuniu mais de 500 estudantes numa passeata animada por palavras de ordem sobre o passe-livre e a redução da tarifa. O ato recebeu incentivo de várias pessoas que estavam nas paradas de ônibus do Centro da cidade. A passeata se dirigiu à sede da Prefeitura Municipal, e os estudantes tomaram as escadarias do prédio. A gestão municipal foi obrigada a dialogar com o movimento, sendo eleita uma comissão e a seguinte pauta de reivindicações: 1) Revogação do aumento da passagem; 2) 100% de circulação da frota de ônibus; 3) Auditoria da planilha de custos apresentada pelos empresários; 4) Aumento da frota para acabar com a superlotação e o elevado tempo de

espera; 5) Passe-livre para estudantes e desempregados; 6) Pelo fim da dupla função do motorista e preservação do emprego dos cobradores; 7) Estatização do transporte coletivo; 8) Reformulação do Conselho de Mobilidade Urbana. De concreto, avanços apenas quanto à promessa de análise da planilha que “justificou” o aumento e à circulação de toda a frota de ônibus. Depois da reunião, os manifestantes entraram no Terminal de Integração do Varadouro e fizeram um “catracaço”, convidando também os trabalhadores para entrar sem pagar a passagem. Muitos, revoltados com o preço da passagem, aderiram ao ato. Já no dia 29, o movimento retomou a ação e ocupou o prédio da Prefeitura no final da manhã, só saindo de lá após ser recebido pelo próprio prefeito Luciano Cartaxo (PT), no final da tarde. Após vencer a insistência para que deixassem o local, os

estudantes conversaram diretamente com o gestor, que agendou a reunião das lideranças estudantis com os técnicos da Secretaria de Mobilidade Urbana para analisar a planilha de custo, mas só se comprometeu em recuar o preço da passagem caso se verificasse alguma irregularidade. Além do alto preço da passagem, a população pessoense sofre com a péssima qualidade do serviço, ônibus lotados, sucateados e engarrafamentos diários. Para Athamir Araújo, presidente da Associação Paraibana dos Estudantes Secundaristas (Apes), principal entidade que organizou os estudantes para a passeata, “a mobilização mostra a indignação de nossa população com este aumento abusivo, que não condiz com a qualidade do serviço oferecido. Vamos continuar nas ruas em defesa dos nossos direitos”. Enquanto os empresários conti-

Ditadura Militar, e não crianças e jovens. O 3º Enet, em abril, foi uma grande atividade política, reunindo cerca de 1.500 estudantes. Quais são as próximas atividades da entidade? A entidade tem uma agenda intensa no segundo semestre. A construção do Encontro Nacional de Educação, que ocorrerá entre os dia 8 e 10 de agosto, no Rio de Janeiro, e o Seminário Nacional da Fenet sobre Assistência Estudantil e Expansão, nos dias 5, 6 e 7 de setembro, em Ouro Preto, Minas Gerais, são duas grandes atividades em que a Federação está envolvida. Além disso, realizaremos o Encontro de Grêmios do CentroOeste, em Goiás, no mês de outubro, e o Encontro Sul dos Estudantes do Ensino Técnico, em Santa Catarina, no mês de novembro. A Fenet também convocará uma grande Jornada Nacional de Luta que tem como bandeira principal barrar a restrição da meiaentrada cultural, que é um verdadeiro ataque aos direitos dos estudantes, defendendo também o passe-livre para todos os estudantes nos transportes coletivos. Suzane Freitas

Passeata defende estatização do transporte público

nuarem sucateando o transporte coletivo, enquanto o usuário continuar sendo tratado com descaso, enquanto não funcionar verdadeiramente a integração temporal. os estudantes permanecerão em luta. Edivânia Souza, João Pessoa

Belém realiza atos em solidariedade ao povo palestino Pelo imediato fim aos ataques do governo fascista israelense à Faixa de Gaza e em solidariedade ao povo palestino, diversas entidades do movimento sindical-popularestudantil e partidos políticos – a exemplo do MLC, CSP-Conlutas, DCE-UFPA, Uesb, UJR, Anel, MLB, Movimento de Mulheres Olga Benario, PCR, PSOL e PSTU –, juntamente com o Consulado da Venezuela e o Centro Islâmico Cultural do Pará, realizaram, no dia 22 de julho, dois atos políticos na cidade de Belém. O primeiro ocorreu pela manhã na Praça do Operário, em São Brás, com a presença de dezenas de mani-

festantes denunciando o genocídio que o povo palestino vem sofrendo por parte do Exército israelense (que conta com apoio das grandes potências imperialistas, em especial dos EUA). Também foi cobrada do Governo Dilma a ruptura imediata das relações com Israel, somandose a milhares de vozes que se solidarizam e exigem o cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza. O segundo ato teve início às 18h, na Praça da Trindade, em frente ao Consulado da Venezuela, onde foi realizado um debate e entregue ao cônsul Alonso Pacheco um documento, que deve ser encaminhado à Embaixada Palestina, demonstran-

do a solidariedade àquele povo e exigindo o cessar-fogo. Em declaração ao jornal A Verdade, Alonso Pacheco afirmou: “A posição do Governo da Venezuela tem sido bem clara, desde os anos 2001 e 2002, quando o presidente Chávez condenou o uso do terrorismo de Estado contra os povos indefesos, como o bombardeio organizado dos Estados Unidos e o bombardeio sistemático do sionismo do Governo de Israel contra Gaza e a Cisjordânia. A Venezuela vem sendo consequente e firme nessa condenação aos ataques aos povos desarmados e aos povos que só lutam por independência e sobera-

nia. Então, mais uma vez, o povo da Venezuela eleva sua voz e pede que cesse o fogo contra o povo palestino e que haja paz no Oriente Médio, sabendo-se que os interesses que se tem são do imperialismo; que estão por trás das mortes e do massacre que aquele povo está sofrendo. Então, a postura da Venezuela se mantém mais forte do que nunca”. No final do ato, ficou acertada entre as entidades presentes a criação do Comitê Paraense de Solidariedade à Palestina, que irá desenvolver atos, campanhas e debates pelo fim dos ataques do Exército israelense e por uma Palestina livre. Brenda Martins, Belém


8 Agosto de 2014

LUTA POPULAR

Polícia Militar tortura trabalhadores em MG

U

DN

m dos legados da Copa do Mundo é, sem dúvida, o aumento da repressão, em especial aos movimentos populares. Em todo o país, há um aumento significativo de prisões arbitrarias, tortura e muita repressão, feito por Dinei Delfino um aparato militar de fazer inveja aos generais ditadores do período militar. Em Minas Gerais, a Polícia Militar, que já era extremamente autoritária e violenta, vem abusando no uso da força e no emprego de técnicas de guerra contra o povo que realiza manifestações por seus direitos. Entre os dias 2 e 4 de julho, as ocupações urbanas de Belo Horizonte realizaram uma jornada de lutas, ocupando o prédio da Prefeitura, da Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel) e da Advocacia Geral do Estado (AGE). A ação foi organizada pelo MLB, Brigadas Populares e CPT, e tinha como pautas a ameaça de despejo das ocupações da região do Isidoro, a ligação de água, luz e esgoto nos assentamentos. Em uma ação truculenta, a PM impediu a entrada de alimentos no local, e diabéticos, crianças, idosos, mulheres grávidas e demais ocupantes foram impedidos de comer por mais de 20h. Além disso, os apoiadores do movimento que tentaram atirar pães, bolos e chocolates para as famílias que ocupavam os prédios, foram fortemente reprimidos. Uma moradora da ocupação Guarani Kaiowa teve o braço quebrado por um golpe de cassetete de um PM e um outro apoiador foi preso, puxado pelo cabelo, espancado e torturado pelos policiais. (Veja vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=WX pfHkmabew) No dia 24 de julho, dando continuidade às lutas, cerca de duas mil famílias marcharam até a Cidade Administrativa (sede do Governo de Minas Gerais). A PM novamente abusou da violência e, desta vez, com uso da Cavalaria, passou por cima das famílias que realizavam a manifestação. O morador da ocupação Eliana Silva, Dinei Delfino, soldador, 32 anos, levou um golpe de espada no rosto desferido por um policial a cavalo e ficou desacordado por mais de duas horas. Encaminhado para o hospital, levou 16 pontos no rosto e carregará uma cicatriz permanente. “Essa foi uma verdadeira tentativa de assassinato. Se essa espadada tivesse sido no pescoço dele, estaríamos agora no velório deste companheiro”, afirmou Poliana Souza, da Coordenação do MLB. Dois outros moradores foram presos na manifestação e liberados horas depois. “Tamanhas barbaridades não podem ser aceitas como normais. Os mandantes precisam ser punidos. E o pior é que tudo isso ocorreu com total permissão do Governo do Estado, do PP e PSDB, que, apesar de se dizer democrático, parece ter saudades da Ditadura Militar e pelo jeito concorda com a repressão e com a tortura”, completou Poliana. O movimento encaminhou denúncias à Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, à Promotoria do Ministério Público e prepara um dossiê para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, com sede em San José, Costa Rica. As denúncias exigem punição para os autores dessas ações fascistas e dos que autorizam ou permitem que elas aconteçam. Leonardo Pericles, Coordenação Nacional do MLB

Prisões de militantes são arbitrárias e um golpe na democracia Desde a prisão arbitrária de 23 militantes contrários à Copa do Mundo no último dia 12 de julho, véspera da final do mundial, inúmeros juristas, políticos, acadêmicos e defensores dos direitos humanos têm se mobilizado para denunciar o crescente processo de criminalização dos movimentos e das lutas sociais. De fato, desde o fim da Ditadura Militar, em 1985, nunca se viu tanta repressão contra manifestações de protesto como a que temos visto hoje. Esse processo se expressa não apenas nas prisões ocorridas antes e durante a Copa do Mundo, mas também no aumento dos investimentos nas forças policiais e militares, na aprovação de leis que diminuem a democracia, na impunidade de policiais envolvidos em crimes contra os cidadãos e na campanha difamatória promovida pelos grandes meios de comunicação da burguesia contra todo e qualquer manifestante, que frequentemente são chamados de “vândalos” ou até mesmo “terroristas”, tal como na época da Ditadura. O objetivo não é outro senão colocar na defensiva as lutas dos trabalhadores e da juventude, que, nos últimos anos, retomaram às ruas. Para tanto, as classes dominantes não hesitam em atentar contra as liberdades democráticas tão duramente conquistadas e criar meios legais para impor ao povo a “lei e a ordem” do capital. Aliás, essa é uma das características do fascismo, forma mais terrorista da ditadura burguesa, que surge e se desenvolve exatamente em momentos de crise do capitalismo e quando a classe operária e as massas em geral tomam a iniciativa para defender seus direitos e interesses. O caso dos 23 militantes presos chama a atenção pela quantidade de irregularidades cometidas pelo judiciário, tais como investigações correndo em segredo de justiça, dificuldade de acesso ao processo por parte dos advogados de defesa, prisões arbitrárias, escutas telefônicas ilegais, inclusive de advogados ligados aos direitos humanos. O Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH), um dos grupos citados no inquérito, lançou nota criticando a ação da polícia, onde afirma que “é preciso mencionar que o aludido inquérito tem como um dos alvos da investigação o Instituto de Defensores de Direitos Humanos, sendo este qualificado como “nave-mãe” de uma rede de outras 71 organizações da sociedade civil que militam sobretudo em questões de direitos humanos no Rio de Janeiro. A investigação levou à quebra do sigi-

lo telefônico da entidade, inclusive dos celulares de dois diretores, constituindo afronta gravíssima à defesa dos direitos humanos e à democracia. Vale ressaltar que as escutas telefônicas foram autorizadas pelo Judiciário sem nenhum indício de cometimento de crime, mas tão somente pelo fato de a entidade prestar assistência jurídica gratuita aos manifestantes presos durante os protestos, muitos dos quais eram vítimas de arbitrariedades estatais”. Outra organização de direitos humanos, a Justiça Global, também se manifestou afirmando “que este inquérito visa tão só à desmobilização, deslegitimação, intimidação e criminalização de defensores de direitos humanos, representando grave violação por parte do Estado do Rio de Janeiro, principalmente ao tratá-los enquanto associação criminosa”. Todo o processo contra os manifestantes presos é um conjunto de irregularidades e deixa clara a sede de vingança de quem está por trás das acusações. O juiz Flávio Itabaiana, responsável pelo processo, emitiu os mandatos de prisão, segundo ele, “em virtude da periculosidade dos acusados, evidenciada por terem forte atuação na organização e prática de atos de violência nas manifestações populares”. Ora, todos sabem que a violência nas manifestações é sempre resultado da ação da Polícia e de seus infiltrados, que atuam no sentido de gerar tumulto e dispersar os atos. Ainda de acordo com a investigação policial, há escutas telefônicas que comprovariam a compra de fogos de artifício por um dos manifestantes e que seriam usados em manifestações. Mais uma vez: onde está o crime? Usar fogos de artifício em manifestações populares é uma tradição brasileira, vide os jogos de futebol, as festas juninas, carnaval, casamentos, aniversários, etc. Está claro que há um exagero

deliberado em manter essas pessoas presas preventivamente, já que não há provas de que representem risco à sociedade. Para o desembargador Siro Darlan, que concedeu o habeas corpus aos manifestantes presos, “no caso concreto da denúncia do Ministério Público, embora as mídias interessadas em enganar seus leitores tenham noticiado incêndios, lesões corporais, danos ao patrimônio público, porte de explosivos, dentre outros, é exclusivamente o delito de quadrilha armada – artigo 288, parágrafo único do Código Penal, cuja pena pode variar entre um e três anos de reclusão, podendo ser dobrada. Ainda que os acusados venham a ser condenados, na pior das hipóteses, a pena não ultrapassará dois anos por serem réus primários e de bons antecedentes. Sabe-se que pela nossa legislação a condenação até quatro anos pode e deve ser substituída por penas alternativas em liberdade”. Logo, a grande repercussão dada pela imprensa burguesa às prisões não se deve à gravidade dos crimes supostamente cometidos pelos manifestantes, mas simplesmente ao interesse de criminalizar as lutas sociais. Em resposta, uma série de atos e manifestos já foram organizados em todo o país para denunciar mais essa tentativa de desviar a opinião pública da verdadeira violência cometida hoje no país em nome de uma ordem que somente privilegia os ricos e poderosos, enquanto milhões de jovens estão desempregados, famílias não têm onde morar e grande parte da população sobrevive com menos de dois salários por mês. Impedir a criminalização do movimento popular é fundamental e depende, antes de tudo, da atitude engajada de todos os defensores da liberdade e da democracia. Heron Barroso, Rio de Janeiro ATF

Legado da Copa foi o aumento da repressão

Plínio de Arruda Sampaio: uma vida em defesa do povo

Plínio de Arruda Sampaio, promotor público aposentado e militante político, morreu no dia 8 de julho, aos 83 anos, em

São Paulo, deixando um legado de defesa do povo trabalhador frente e da justiça social. Formado em Direito pela Universidade de São Paulo, integrou a Juventude Universitária Católica, da qual foi presidente. Anos mais tarde, ingressou na Ação Popular, organização de esquerda surgida dos movimentos de leigos da Ação Católica Brasileira. Natural de São Paulo, Plínio foi eleito, pela

primeira vez, à Câmara dos Deputados em 1962, pelo Partido Democrata Cristão (PDC). Ao longo da carreira política, exerceu três mandatos de deputado federal, dois deles pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Após sair do PT, filiou-se ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), pelo qual concorreu à Presidência da República em 2010, quando obteve 886 mil votos. Com o golpe militar de 1964, foi cassado pelo

Ato Institucional nº 1 e teve de se exilar no exterior, até 1976, quando regressou ao Brasil. Plínio viveu no Chile e nos Estados Unidos. Plínio Sampaio, histórica figura política da esquerda, encontrava-se internado para tratar de um câncer ósseo. Era casado havia quase 60 anos com Marietta Ribeiro de Azevedo e tinha seis filhos. Redação São Paulo


INTERNACIONAL

9 Agosto de 2014

Empresa militar israelense tem contrato com universidade brasileira Durante a ocupação da Reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), os estudantes elegeram como uma das reivindicações o cancelamento do contrato da universidade com a empresa israelense Elbit/AEL. Para entender o motivo desta luta, A Verdade publica o depoimento dado ao jornal por Maren Mantovani, militante internacionalista pelos direitos humanos e contra o massacre do povo palestino. Maren está no Brasil, entre outras coisas, para denunciar os crimes da empresa Elbit. Felipe Aiub e Queops Damasceno, militantes da UJR, Porto Alegre A Verdade

“Meu nome é Maren Montovani, trabalho pela campanha contra o muro na Palestina. Somos uma organização, na Palestina, que reúne os comitês populares dos locais afetados pelo muro que Israel está construindo. E, para quem não sabe, desde 2002, Israel constrói um muro alto de cimento em torno das cidades palestinas, dos campos de refugiados, para roubar toda terra e recursos naturais dos palestinos e deixá-los em guetos, sem possibilidade de ter uma vida digna; é uma espécie de apartheid. Então a gente está se mobilizando e lutando, a cada dia, contra esse muro, contra a ocupação e contra o apartheid israelense, não só para que acabe esta ocupação, mas também para que a maior parte dos refugiados palestinos possam voltar a suas casas e para que se acabe com este racismo e colonialismo que Israel é e representa. Sou responsável pelas relações internacionais dessa organização. Procuramos a solidariedade dos povos do hemisfério sul. Todos estão sofrendo e lutando contra o colonialismo e o imperialismo. Minha presença aqui no Brasil e na parte sul do mundo é porque, hoje, este hemisfério – a América Latina e o Brasil, em particular – está se tornando o motivo de vida de Israel, no sentido de que Israel olha o Brasil como um mercado central capaz de financiar suas políticas criminosas. De fato, o Brasil é o 5º maior importador de armas israelenses, um dos mercados mais importantes para as multinacionais de lá.

Esta luta que estamos fazendo junto com os estudantes da UFRGS não é para nada periférico no enfrentamento a esse projeto colonial israelense que está matando o povo palestino. A América Latina tem uma luta em comum com a Palestina, porque Israel, há décadas, está armando a repressão e as ditaduras. Não tem ditadura da América Latina que não tenha sido apoiada por Israel, não há governo repressor que não tenha sido armado por Israel. As relações militares entre Brasil e Israel são relações contra os direitos e os interesses do povo brasileiro. Não é casual que as técnicas repressivas israelenses estejam sendo exportadas agora para os policiais brasileiros desde o golpe de 64. Mas este contrato do qual quero falar, esta campanha contra a Elbit, já tem uma história. Em 2007, iniciou-se a campanha contra a Elbit, uma empresa israelense de tecnologia militar. É essa empresa que está construindo o muro na Palestina. Quem está produzindo as armas e bombas israelenses que estão matando os palestinos em Gaza e que também são exportadas? Essa tecnologia militar de repressão, de racismo e exclusão, em todo o mundo; o muro que os EUA estão construindo no México, quem está executando? A Elbit. Então vamos adiante. Aqui, está construindo um satélite militar junto com as universidades do Rio Grande do Sul e o Governo do Estado. Esse acordo está sendo denunciado desde o início, por toda a

sociedade e todos os partidos palestinos, como algo que diretamente financia a repressão do povo palestino. Este é apenas um dos contratos; o mais importante é perceber que esta é a primeira vez que uma empresa israelense está liderando um projeto estratégico militar no Brasil. Façam uma análise dessas relações militares Maren Mantovani Israel quem pode decidir soentre Brasil e Israel e vocês vão ver que, de todo gasto mili- bre essas questões estratégicas de defesa do Brasil. tar que o Brasil faz agora com O que estamos pedindo rearmamento, quase nenhum é aqui não é nada revolucionápara projeto militar que não terio. É uma pauta que basicanha tecnologia israelense. Sigmente pede cumprimento do nifica que vocês não têm mais que é lei internacional. A soberania nacional, em nível Constituição do Brasil diz clade defesa. ramente que os direitos humaQuem quer defender um nos devem prevalecer nas relaBrasil forte e armado tem também que se dar conta de que es- ções internacionais – e a lei internacional é bastante clara, te país é completamente desobretudo no caso do muro e pendente de Israel. Se Israel sobre quem o está construinnão der mais sua tecnologia ou do. Temos a decisão da Corte mesmo manutenção, vocês Internacional de Justiça, a não terão mais aviões militaqual, desde 2004, diz que não res, não terão mais os radares somente o muro é ilegal, mas da marinha, etc. Então vocês que todos os Estados têm obrinão têm mais uma indepengação de não ajudar na sua dência, nesse sentido. O Braconstrução e na manutenção sil, por exemplo, não pode mais vender suas armas à Vene- da situação criada por ele. Ora, se eu financio a emzuela e à Bolívia, pois a tecnopresa que está construindo o logia dessas armas são da muro, estou ajudando a consElbit, e Israel proíbe o Brasil truí-lo, e essa é uma lógica bade vendê-las. Ao mesmo temsilar. Em 2007, por exemplo, po, o Brasil quer desenvolver o Governo da Noruega retirou estratégias em conjunto com o todos os seus investimentos e Conselho Sul-Americano de acordos com a Elbit, e dez ouDefesa. É fantástico, mas eu tros países fizeram a mesma quero ver como fará isso, se não está desenvolvendo sua de- coisa. Então, o que estamos pedindo, na verdade, não é a refesa autonomamente, e hoje é

Crise leva idosas a se prostituírem na Coreia do Sul Mais de 400 mulheres entre 50 e 70 anos de idade circulam diariamente no parque Jongmyo, no coração de Seul, capital da Coreia do Sul, vendendo o corpo para sobreviver. Muitas não conseguem e, sem outra opção, cometem suicídio. Os dados e relatos deste texto foram extraídos do jornal New York Times e da BBC News, em Seul. O parque Jongmyo foi construído em torno de um templo que homenageia o filósofo chinês Confúcio, cujas ideias sobre a veneração aos idosos foram centrais à cultura oriental durante séculos. Os coreanos viviam na certeza de que, um dia, quando chegassem à velhice, seriam cuidados por seus filhos. Hoje, os tempos são outros. As novas gerações não têm condições de cuidar dos seus idosos, e o Governo não atende às necessidades mínimas da população. Não existe seguro desemprego ou previdenciário e nem de saúde. Então, os homens e mulheres se veem sem poupança, sem uma aposentadoria que garanta o básico e sem uma família em que se apoiar. A taxa de pobreza na terceira idade, na Coreia do Sul, é de

quase 50%, já que 70% dos aposentados recebem apenas 5% do salário médio. Kim Eun-ja é uma entre as várias idosas coreanas que ganham a vida vendendo pequenas garrafas que contêm uma bebida chamada Bacchus, um energético muito comum entre os coreanos. Ela, aos 71 anos, usa batom vermelho e casaco da mesma cor. Segura uma sacola grande com a bebida que vende, além de se prostituir. Com frequência, essas senhoras também oferecem aos fregueses uma injeção especial que, supostamente, ajuda os clientes a conseguirem uma ereção. As agulhas usadas para essas injeções chegam a ser reutilizadas até 20 vezes. Como resultado, 40% dos homens que frequentam o parque estão infectados por várias doenças. “Tenho 60 anos e não tenho dinheiro. Não posso contar com meus filhos. Eles também estão em apuros. Praticamente todas as pessoas idosas aqui neste parque estão na mesma situação”, afirma Kim. Outra senhora sentada no parque se desespera: “Estou com fome; não preciso de respeito, não

preciso de honra, só quero fazer três refeições ao dia”. Muitas idosas que não admitem vender o corpo para sobreviver cometem suicídio. Foi o caso de uma viúva, de 78 anos, que chocou a população: em vez de tirar a própria vida em casa, silenciosamente, como muitos sulcoreanos o fazem, a mulher fez de sua morte um ato final de protesto público contra uma sociedade que a abandonou. Ela bebeu pesticida durante a noite em frente à Prefeitura de Seul, após ter suspensos seus benefícios de assistência social, afirmando que não precisavam mais sustentá-la, agora que seu genro havia encontrado emprego. “Como podem fazer isso comigo?”, perguntava no bilhete de suicídio encontrado pela Polícia. “Uma lei deveria servir ao povo, mas ela não me protegeu”, dizia o bilhete. As taxas de suicídio entre pessoas com mais de 65 anos subiram para 4.378, em 2010, contra 1.161 em 2000. Mais uma cruel consequência do capitalismo A situação da população da Coreia do Sul se agravou a partir de 1997 com a

volução, e sim que não se violem os direitos humanos que vocês já conquistaram. Portanto, tudo o que precisamos é que alguém tenha a coragem de dizer “não queremos contrato”. Assim, retiraremos estas universidades deste negócio sujo. É evidente que este contrato não visa a um avanço tecnológico, e sim a uma política de morte, de repressão e de apartheid. Não se trata só de uma privatização da pesquisa universitária, mas da dependência de uma das empresas mais sujas que existem neste país. Se existe um governo que também não é revolucionário, mas é um pessoal social-democrático, que diz não querer trabalhar com esta empresa, eu espero que uma instituição como a UFRGS possa tomar pelo menos a mesma decisão, o mesmo posicionamento das Nações Unidas e do Governo da Noruega. Para concluir, queremos agradecer toda a solidariedade que estamos recebendo. É muito lindo estarmos juntos nesta ocupação da Reitoria, porque se vê como as lutas se unem. Que a luta por uma universidade mais transparente e mais democrática, por uma universidade que seja dos estudantes e não das multinacionais, está conectada e encaixada perfeitamente com a luta do povo palestino. Juntos, vamos vencer, e obrigada novamente pela solidariedade!”

Denise Maia, RJ grave crise do capitalismo que abalou o Leste da Ásia, atingindo principalmente Coreia do Sul, Tailândia, Malásia e Indonésia. Porém, o período crucial foi depois do programa de ajustamento imposto pelo FMI em troca de um financiamento de 54 bilhões de dólares. O país, então, empreendeu um conjunto de reformas. A maioria das empresas públicas foi privatizada, e as empresas privadas foram liberadas para despedir os trabalhadores em função da conjuntura de crise. Milhares de trabalhadores ficaram desempregados, o que levou a não poderem mais arcar com o sustento de seus pais. Então, num parque onde essas senhoras deveriam passear, sentar nos bancos rodeados de árvores para ler um livro, conversar com as amigas, ou simplesmente sentir o calor do sol no corpo ou o pinicar da neve no rosto, elas são obrigadas a se despir da sua dignidade, do acalento espiritual que a idade propicia, para uma realidade que as leva a viver uma vida desregrada, agressiva, devastadora, um estupro físico e social na dura escolha entre a prostituição ou a morte.


10 Agosto de 2014

Olga Benario realiza protesto contra mortes de bebês em maternidade da Paraíba Clodoaldo Gomes e Jozivan Antero

A

Jozivan Antero

s dores do parto não são o único sofrimento reservado às mulheres gestantes na Paraíba. A recompensa de sair da maternidade com seu filho nas mãos após nove meses de sonhos e expectativas nem sempre se concretiza. É alarmante o número de casos de mortes de bebês recém-nascidos no Estado. Em Patos, principal município do Sertão paraibano, por exemplo, de acordo com dados oficiais as mortes che- Vigília pede fim das mortes nas maternidades da Paraíba garam a 37 em 2013 e já somam 23 até o Público (MPPB) e o Conselho Regional mês de junho deste ano. Campina Grande Medicina (CRM-PB) denunciaram o de, segundo maior munícipio paraibaInstituto de Saúde Elpídio de Almeida no, virou notícia nacional há quatro (Isea), maternidade de Campina Grande meses pelos altos índices de mortalidaque registrou, em apenas três meses, 45 de de recém-nascidos – o dobro da mortes de recém-nascidos, número conmédia nacional. De acordo com Gerlúsiderado alarmante pelas autoridades de zia Vieira, do Movimento de Mulheres Saúde. Enquanto a média nacional de Olga Benario, os casos mais gritantes mortes de crianças recém-nascidas é de vieram à tona após denúncias feitas na 15,8 para cada 1.000 bebês nascidos imprensa, mas outros acontecem sem vivos, no Isea esse índice é quase o que a sociedade tome conhecimento. dobro: 31,4 mortes. Diante dos vários casos de mortes Uma estudante de enfermagem da de bebês e da violência obstétrica ocorriUniversidade Federal da Paraíba, que da na Maternidade Dr. Peregrino Filho, preferiu não se identificar, registrou que chocaram a população de Patos, o para A Verdade as experiências de vioMovimento de Mulheres Olga Benario lência obstétrica que vivenciou em seu convocou o ato público “Vigília pela estágio na maternidade. “Em um dos Vida: Basta de Negligência!”. Dezenas plantões pude assistir ao rompimento de pessoas atenderam ao convite e partiartificial e prematuro da bolsa, o que ciparam da manifestação na noite do dia acarretou um parto demorado, com difi11 de julho na Maternidade Dr. Peregriculdades. Para acelerar o parto, começano Filho. Em determinado momento da ram a pressionar a barriga da moça com vigília, os presentes colocaram as velas e tanta força que praticamente 'subiram' os cartazes na calçada da maternidade e nela, para fazer que a criança saísse.” rezaram pelos bebês vítimas da violênAbortos clandestinos em João Pessoa cia obstétrica. A dona de casa Fabiana Mas se o descaso com as mulheres Torres pediu o fim das mortes na materque têm direito a assistência médica nidade: “A gente lamenta pelas pessoas pública nas maternidades paraibanas é que vêm ter seu filho, esperam e não alarmante, a situação das mulheres podem sair com ele. A gente lamenta pobres marginalizadas por uma legislamuito. Tem que ter um basta sobre isso, ção hipócrita que proíbe o aborto chega porque não de é hoje; há muito tempo a ser desesperadora. que tem isso aqui”. No dia 15 de julho, a Polícia Civil Morte em Campina Grande prendeu, em João Pessoa, Marlene da Silva Alves, de 75 anos, suspeita de mané o dobro da média nacional ter uma clínica clandestina para a realiEm abril, o descaso com a saúde zação de abortos. A “clínica” era a sua das mulheres na Paraíba ganhou destaprópria residência, uma casinha sem que nacional depois que o Ministério

AGITAÇÃO E PROPAGANDA

Matheus: o brigadista

nem sequer reboco nas paredes, onde as mulheres se submetiam, sem nenhuma segurança, a procedimentos abortivos ao custo de R$ 400 cada. De acordo com informações da delegada Emília Ferraz, da Delegacia de Crimes contra a Pessoa, as investigações começaram a partir da morte de uma suposta paciente. Segundo ficou apurado, no dia 6 de maio a mulher passou por um procedimento abortivo na casa de Marlene Alves e contraiu uma septicemia, ou seja, uma infecção generalizada. Levada para uma maternidade de João Pessoa, onde ficou internada por dois dias em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), passou por procedimentos cirúrgicos, inclusive para retirada do útero, mas não resistiu à infecção e morreu, no dia 8. Ainda de acordo com a delegada, o útero da paciente encontrava-se todo perfurado. A policial destacou a falta de estrutura da “clínica”, dizendo: “O que chama atenção é a falta de higiene e de trato desse local. Os materiais não eram esterilizados e alguns estão totalmente enferrujados". De acordo com o jornal Correio da Paraíba, a Secretaria Estadual de Saúde registrou, em 2013, mais de 3.800 curetagens, uma média de 10,6 procedimentos por dia. As curetagens são procedimentos médicos utilizados para a raspagem da cavidade uterina, normalmente realizados para retirar resíduos de um aborto. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), de cada dez mulheres grávidas, três abortam de forma espontânea ou induzida. No caso específico dos abortos provocados, hoje, em nosso país, ele é seguro apenas para as mulheres ricas que podem pagar clínicas modernas, embora ilegais. Para Edivânia Souza, da Coordenação Estadual do Movimento de Mulheres Olga Benario. “O debate sobre o tema aborto tem que ir além de simples concepções religiosas; o assunto em questão é social e um tema grave de saúde pública.”

MULHER Vagão Rosa torna a vítima de assédio culpada Izabella Sales, Belo Horizonte O chamado “Vagão Rosa”, aprovado em São Paulo no último dia 4 de julho, tem sido motivo de polêmica entre os usuários do transporte público de todo o Brasil. A discussão não é nova, mas foi reacendida depois que a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo se posicionou a favor da medida. Os constantes abusos sofridos pelas mulheres dentro de ônibus e vagões do metrô são a principal justificativa para que haja um vagão de uso exclusivo feminino, o “Vagão Rosa”. Mas a ideia, ao contrário do que se vende, é um retrocesso na luta por direitos iguais, pois reafirma diversos estereótipos de gênero existentes na sociedade. O “Vagão Rosa” é uma forma explícita de segregação da mulher, de retirá-la dos espaços comuns. Reforça o discurso de que elas e eles não podem ocupar o mesmo espaço na sociedade, fortalecendo o conceito de que o ambiente público não foi feito para as mulheres, mas somente o espaço privado, dentro de suas casas, realizando os serviços que a elas caberia fazer. Colocar a mulher em um delimitado espaço físico para, supostamente, protegê-la do seu agressor é o mesmo que dizer que ela é o perigo, que ela é a culpada principal pela violência sofrida e não quem a ataca. Por isso, o sexo feminino, sempre culpado, tem de ser separado para o bem geral. Condena-se a vítima e deixa-se impune o criminoso. Reservar um vagão, ônibus, ou o que seja para que as mulheres não reclamem mais do assédio sofrido no dia a dia, trata-se, na verdade, de um atentado contra o direito de ir e vir e não é, nem de perto, solução para o problema vivido, que é muito mais extenso. Realizar campanhas de conscientização, principalmente no sentido de se quebrar o modelo da mulher objeto de consumo, assim como capacitar melhor os seguranças, seria uma alternativa bem mais eficiente e humana do que simplesmente separar homens e mulheres, reforçando o imaginário da desigualdade e inferioridade feminina perante o ser masculino.

Militante da UJR, Matheus Portela tem se destacado no trabalho com o jornal A Verdade no Rio Grande do Sul. Com muita disposição, vende mais de 100 jornais por mês, principalmente em brigadas individuais dentro dos ônibus da Capital gaúcha. A seguir, a entrevista de Matheus contando como realiza essas ações e o que pensa do nosso jornal.

A Verdade

A Verdade – Como são as brigadas do jornal nos ônibus? Matheus Portela – É simples. Eu tenho uma cota mensal a ser vendida e, ao mesmo tempo, passo cerca de duas horas diárias dentro de um ônibus, devido às más condições do transporte público na cidade. O que eu faço é deixar o ônibus um pouco mais animado. Vendo e divulgo o jornal, e ele custa apenas dois reais. A ideia das brigadas nos ônibus eu aprendi com os camaradas da União Juventude Rebelião do Ceará; apenas a adaptei ao Rio Grande do Sul. A tática de venda varia para cada tipo de ônibus. Quando ele não está lotado por completo, ou seja, quando as pessoas não estão totalmente apertadas, por exemplo, eu distribuo o jornal para cada pessoa, destaco um jornal para mim, vou para frente da roleta e começo a apresentar o jor-

nal, mostrando-o a todos. “Olá, pessoal, meu nome é Matheus, sou estudante de Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e estou aqui para fazer a venda e a divulgação de um jornal popular, um jornal alternativo. Enquanto o Zero Hora e o Correio do Povo mentem para a população, eu venho aqui para falar dos problemas de vocês que estão neste ônibus, a verdade da classe trabalhadora”. Muitas vezes “brinco sério”, que o jornal A Verdade vem pra falar dos problemas da população e não de quanto sobe ou desce a Bolsa de Valores. Não existe uma regra ou um script pronto. Tento prestar atenção e sentir seus olhares; só assim saberei o que está lhes chamando mais atenção. Minha maior venda até agora foi uma apresentação de cerca de cinco minutos. Aplaudiram e até mesmo participaram do debate: acenando com a cabeça, gritando “viva a imprensa alternativa” e resmungando frente aos roubos da Copa. Nessa brincadeira, foram 26 jornais, e infelizmente não vendi mais porque acabou. Por que é importante a venda do jornal?

Acho que a pergunta que devíamos nos fazer é por que não achamos importante vender o jornal ou por que não nos esforçamos para vendê-lo mais. O jornal é uma das principais tarefas para a revolução, pois com ele podemos trazer uma nova opinião aos trabalhadores. Foi por causa dele que me afirmei ideologicamente. E é por causa dele, também, que sigo na luta pelo socialismo. Quando chega o jornal na minha cidade, a primeira coisa que faço é lê-lo por inteiro e, quando não consigo, faço no ônibus e sempre vou conversando com quem vendi o jornal. Todos sempre gostam muito e hoje tenho até clientela. Pena que são poucos jornais ou poucas pessoas para vendê-lo. Durante nossa militância nos deparamos com contatos que não dispõem de tempo devido às inúmeras atividades, e assim nós reclamamos: “Não pudemos conversar, ele estava sem tempo”. Porém, se não conseguimos ter uma conversa séria sobre o futuro da sociedade e da nossa vida, deixemos que o jornal converse com ele. Após a leitura do jornal eu me sinto eufórico, pois amo rir e chorar com as esperanças que aqueles que escrevem me dão. Essa euforia também se trans-

forma em vontade de fazer com que outras pessoas sintam o mesmo que eu. Não consigo acreditar que alguém não queira mostrar o nosso jornal a outra pessoa – ele é excelente. Qual a sua mensagem para os leitores e brigadistas de A Verdade? Gostaria de agradecer a todos pela paciência e pedir desculpas pelas vezes que eu os acordei no ônibus. Também quero convidá-los a divulgar esta imprensa popular e, principalmente, para mandarem matérias ao jornal, pois sem o trabalho de vocês não posso fazer o meu. Não existe matéria ruim ou de pouca qualidade teórica. Existem apenas as matérias escritas e as não escritas; então ajude! Este jornal também é seu; cabe a você cuidar dele, valorize o enorme esforço dos trabalhadores do jornal, que se esforçam voluntariamente para que esta impressão saia em nível nacional. Ajude com que esse jornal passe a ser quinzenal. Só assim, trilharemos uma nova agitação e propaganda revolucionária, que poderá modificar a concepção das massas mais atrasadas, e assim derrubaremos o capitalismo e forjaremos uma nova sociedade igualitária. A sociedade socialista. Redação RS


CULTURA

Encontro de Cursinhos Populares em São Paulo

F

A violência do Estado contra a juventude negra Eloá Nascimento, RJ

AH

oi realizado, em São Paulo, o 1º Encontro de Cursinhos Populares, no dia 5 de julho, no Núcleo de Consciência Negra (NCN), coletivo que ocupa um barracão na Universidade de São Paulo (USP) há quase 30 anos, mesmo sem reconhecimento da instituição. O encontro visou à articulação e integração entre diversos cursinhos populares, reunindo 11 cursinhos populares/co- 1º Encontro dos Cursinhos Populares de São Paulo munitários para discutir políticas do marcadores de gênero, raça e afirmativas de acesso ao ensino supe- classe. Buscou-se também debater rior público e de qualidade no Braos desafios de suas atuações como sil, bem como para debater sua atuaprojeto de educação popular, inquição como movimento social e suas etudes e meios de ação para dissolupráticas políticas e pedagógicas. ção de problemas comuns. No fim do encontro, foi realiNa abertura houve as falas inizada uma plenária em que os cursiciais de Jupiara de Castro, fundadonhos puderam pautar ações conjunra do NCN, Lilian Sankofa, educatas de modo a melhorar sua articuladora do NCN, e Douglas Belchior, ção, proporcionando a criação de educador na Uneafro. Todos contauma agenda comum e tirando indiram um pouco de sua história de recativos para o próximo encontro e sistência e luta, assim como suas expara um ato em defesa das cotas periências relacionadas ao ensino raciais e sociais, no fim de agosto, em projetos de educação popular e na cidade de São Paulo. Foram tiraatuação como lideranças do movidos ainda encaminhamentos para a mento negro. Após uma rodada de criação de um fórum de articulação apresentações feitas pelos reprevirtual, elaboração e compartilhasentantes dos coletivos presentes, mento de material didático e criana qual todos contaram sua trajetóção de uma comissão intercursiria, procurou-se identificar caractenhos para facilitar a articulação de rísticas que os aproximam, pautan-

projetos comuns, além da realização de um mapeamento de cursinhos populares na cidade de São Paulo e região. Depois da plenária, o encontro prosseguiu com o Sarau-Arraial Milgrau, com apresentações da arte do jongo com acompanhamento de gaita de foles, dança do ventre, rodas de samba, improvisação da guitarra e rimas dos Desafetos do Sistema. O 1° Encontro de Cursinhos Populares foi organizado pelo Núcleo de Consciência Negra, Uneafro, Cursinho Popular Mafalda, Cursinho Griot, Cursinho da Psico, Prestes Vestibulares, Rede Emancipa, Cursinho Popular dos Alunos da PUC-SP, Cursinho Popular da Acepusp e Cursinho do Movimento de Urbanização e Legalização do Jardim Pantanal (Mulp), Prévia. Contou ainda com o apoio dos coletivos Amorcrusp, Guima (RI-USP), Caell (Letras-USP), Cahis (História-USP), Cege (Geografia-USP), Calc (ECA-USP), Ceupes (Ciências Sociais-USP), Cefisma (IF-USP), CAF (FilosofiaUSP), Alunos da Poli-USP Amanda Hatzyrah, estudante de Letras na Universidade de São Paulo, militante da UJR e organizadora do Cursinho Popular Mafalda

“Che, na lembrança de Fidel”

Ele enfrentou o futuro com firmeza, determinação e o t i m i s m o . Ti n h a uma fé inquebrantável, tanto nas coisas como nos seres humanos. No diário que escreveu durante o tempo na Bolívia, colocou seus erros, suas análises, a ponto de sempre aprender, avaliar, reavaliar quantas vezes necessárias fossem suas próprias posições. Che foi, além de tudo, um ser autocrítico. O imperialismo, num lampejo de sorte, arrancou Che Guevara do mundo. Pensou erroneamente que se matassem o Che matariam suas ideias. O medo dessa corja de animais foi tão grande que sumiram com seu corpo. Temeram Che Guevara mesmo depois de terem tirado sua vida. Porém, não conseguiram sumir com as ideias revolucionárias de Che, não arrancaram o exemplo que o Che nos deixou, e nem poderiam. Acham que quando matam as pessoas matam também suas ideias; infelizes são eles. Che dedicou sua vida ao povo, derramaria seu sangue em qualquer país, em qualquer continente, se fosse para lutar pelo socialismo. Por isso, Che vive até hoje dentro dos corações dos cubanos e dos revolucionários do mundo todo. Vive nas diversas contribuições teóricas que deixou. Tiraram-nos Che fisicamente, mas, sua presença continua firme na vida e no trabalho cotidiano dos comunistas. Sua presença é profundamente gigante. O Comandante Ernesto Che Guevara nos deixou o exemplo do que é mais sagrado em uma pessoa, legou-nos sua própria vida. Che na Lembrança de Fidel trata-se de um livro emocionante, que todos devemos ler! Luane Mote, Fortaleza

Ernesto Guevara é, até hoje, um grande exemplo de comunista revolucionário para os povos da América Latina e do mundo. Sua dedicação e abnegação pela libertação do povo pobre sempre foi e será um modelo de como deve ser um ser humano formado na ideologia proletária. Fidel Castro, um de seus maiores companheiros, falou, por diversas vezes, sobre a personalidade de Che, seu caráter, sua capacidade, sobre os motivos que levaram Che a deixar Cuba e partir para organizar a luta guerrilheira na Bolívia, sobre seus escritos e o tempo que viveram juntos. A editora Casa Jorge Editorial prestou-nos um imenso favor em traduzir do austríaco para o português o livro Che na Lembrança de Fidel, lançado originalmente pela editora Ocean Press, que publicou dezenas de livros sobre a vida de Guevara. Em sua expedição por Cuba, Che foi médico e soldado ao mesmo tempo. Um jovem que se dispôs a ajudar numa luta de um país que não era o seu, por natureza. Fidel diz que uma das principais características de Che era a disposição de apresentarse sempre como voluntário para qualquer tarefa. Numa das primeiras batalhas mais difíceis em que se tinham deixado vários rifles para trás, Fidel lembra que Che pediu três a quatro homens para, junto com ele, irem buscar as armas, e, no meio de um bombardeio, ele foi heroico, recuperando os rifles e ainda sendo médico dos companheiros guerrilheiros e dos soldados da tropa inimiga. Apesar das constantes crises de asma, Che não se queixou delas em nenhum momento. Daí em diante, Fidel percebeu o grande homem que ele seria. Che foi um elemento extremamente consciente. Leitor, estudioso, e tinha sede de saber sempre mais.

11 Agosto de 2014

Encontrou no marxismo-leninismo a ciência que guiou seus passos até sua última hora de vida. Fidel fala assim sobre Che no livro: “Para ele não havia dias de descanso; para ele, não havia horas de repouso. Se olhássemos pelas janelas de seu escritório, as luzes estariam acessas; todas as horas da noite, o encontraríamos estudando, ou melhor, trabalhando ou estudando. Porque ele analisava todos os problemas; era um leitor incansável, e as horas que roubou do sono dedicou ao estudo”. A teoria e a prática eram a solução que ele encontrou para resolver os problemas existentes. Com isso, todas as tarefas que lhe eram atribuídas, ele cumpriu com a mais alta responsabilidade que um homem pode ter. Em Cuba, foi presidente do Banco Central, Ministro da Indústria, comandante das regiões militares e chefe de delegações políticas ou econômicas em viagens ao exterior. Sua inteligência fez com que ele cumprisse trabalhos de qualquer tipo, com toda segurança. Não havia nada que Che não fizesse com amor, dedicação e seriedade. Um de seus maiores legados a Cuba foi o trabalho voluntário. Che, como homem de diversas atividades, ainda assim não hesitou em fazer mais pela revolução. No campo cortando cana, na cidade construindo casa para o povo junto com os operários da construção civil, com os têxteis, como professor educando as pessoas, ele iniciou o trabalho voluntário. Dias e mais dias, trabalhando incansavelmente para construir o socialismo. Che era um ser consciente. Por isso, foi capaz de deixar Cuba para ir lutar na experiência da Revolução Cubana o caminho para a libertação dos oprimidos na Bolívia.

A cada dia são mais noticiados os atos violentos e assassinatos cometidos contra a população pobre de nosso país. O caso mais recente foi o dos adolescentes fuzilados à queima-roupa por policiais no Rio de Janeiro. Na ocasião, Mateus Alves, de 14 anos, morreu na hora, e o outro jovem só sobreviveu porque se fingiu de morto. Outros casos também chamaram atenção, como o da auxiliar de serviços gerais Cláudia Silva, arrastada pela roupa numa viatura da PM após ser baleada por policiais; o do pedreiro Amarildo Souza, desaparecido após ser sequestrado por policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP); o do dançarino DG, morto durante uma ação policial há poucos meses; e o de Nelson França, que, após um infarto, agonizou até a morte em frente a um hospital diante dos olhos de enfermeiros que lhe negaram socorro. Para entender essa realidade, temos que compreender o papel do Estado e da violência em nossa sociedade. Numa sociedade capitalista, como a que vivemos, o que prevalece é o poder e a vontade do dinheiro, do capital. Logo, a população pobre, por não ter dinheiro, não tem direitos, a não ser o de ser explorada e receber em troca baixos salários. Nessa sociedade, a polícia tem o papel de manter a “ordem”, e faz uso da violência para isso. A violência de Estado ocorre quando representantes desse Estado oprimem violentamente a população pobre em nome de uma pequena e rica classe dominante. Porém, em nosso país, desde a chegada dos portugueses, em 1500, e durante quase 400 anos, a grande maioria da população pobre trabalhadora era negra: negros vindos da África ou filhos de africanos obrigados a trabalhar através da tortura física (as famosas chibatadas), sem salários nem direitos, até o dia de sua morte. O Estado dizia que tudo isso era normal, pois os africanos e seus filhos eram uma raça inferior, que não tinham alma e que deveriam aceitar a exploração como um “castigo divino”, justificativa racista para a superexploração dos escravos que está presente em nossa cultura até hoje. Desde 1500, os negros que tentavam ser livres da escravidão eram castigados nas praças públicas, nos pelourinhos, para quem quisesse ver. Milhares de pessoas, entre idosos, crianças, mulheres e homens paravam para “assistir” negros levar 100, 200, 300 chibatadas. A maioria apanhava até a morte, e a população assistia àquilo com normalidade, pois aquele era o destino “natural” dos pretos em nosso país. Não existem registros de brancos criminosos que foram punidos com castigos físicos no Brasil até a Era Vargas. Portanto, no Brasil, a Polícia e o Estado, desde os séculos passados, são formados com uma mentalidade racista e elitista: negros são discriminados e pobres têm menos direitos; se a pessoa for negra e pobre é pior ainda! As evidências mostram que resquícios dessa mentalidade racista continuam até hoje. Muitos sociólogos estudam a existência de um genocídio da juventude negra em nosso país, onde a polícia corrupta facilita o acesso dos jovens das favelas ao crime e às armas de fogo e depois mata esses mesmos jovens. Os casos relatados acima confirmam os estudos recentes que mostram que as vítimas da violência de Estado têm um perfil específico: são geralmente negros, pobres e em sua maioria jovens. Estatísticas denunciam a importância da discriminação racial no mapa da violência do país. Segundo o IBGE, a taxa de homicídios (que representa o número de óbitos por agressões ocorridas), em 2009, era de 26,8%. Ao dividir a população entre negros e brancos, a população negra apresenta uma taxa de homicídios de 34,2%, enquanto a população branca apresenta 16,1%. De 2002 a 2009, a taxa de homicídios diminuiu de 28,6 para 26,8%, porém essa redução ocorreu para a população branca em 4 pontos percentuais, enquanto a população negra teve um aumento de 0,5%. Entre os jovens, os dados são ainda piores: em 2009, a taxa de homicídios entre jovens de 16 e 29 anos era de 55,7%. Entre jovens brancos, a taxa é de 30,4% e para os jovens negros a taxa é de 72,4%. Essa situação nos mostra que, por sofrer com a violência e o racismo presentes em nossa sociedade, não faltam motivos para a população negra lutar por uma sociedade melhor, por seus direitos e por outro tipo de sociedade, o socialismo, pois, no Brasil, nascer negro já é motivo suficiente para lutar!


12

MULHERES REVOLUCIONÁRIAS

Agostoo de 2014

Flora Tristán e a organização das mulheres Arquivo

“A ignorância das mulheres do povo tem consequências funestas. Sustento que a emancipação dos operários é impossível se as mulheres permanecerem neste estado de embrutecimento” (Flora Tristán). Ludmila Outtes, Recife

F

lora Célestine Thérèse Henriette Tristán Moscoso nasceu em Paris, em 7 de abril de 1803, durante o período napoleônico. Filha de um matrimônio não reconhecido entre um aristocrata peruano e uma burguesa francesa, escreveu romances sociais e proletários. Socialista e formuladora de planos para a organização da classe operária, Flora pode ser considerada uma pensadora da fase de transição entre o socialismo utópico e o socialismo científico, e pioneira do feminismo socialista que inspirou Marx na defesa da mulher. Precursora das lutas pela emancipação da mulher e uma das personalidades feministas mais importantes do século 19, antes mesmo de Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895), ela compreendeu a íntima relação existente entre a emancipação das mulheres e a emancipação dos trabalhadores. Via no proletariado o principal agente de transformação social e, por isso, dedicou boa parte da sua vida tentando organizar os trabalhadores. A vida ensina Após a morte de seu pai, em 1808, sua família se mudou para a zona rural, onde passou a viver na miséria. Aos 17 anos, começa a trabalhar no atelier de um jovem pintor chamado André Chazal, com quem viria a casar-se em 1821. O matrimônio conturbado duraria cinco anos. Vítima de violência física, decide abandonar o lar e o casamento que lhe rendeu três filhos. Como o divórcio não era reconhecido legalmente na época, Flora sofre perseguição de seu exmarido, que chega ao extremo de tentar assassiná-la, em 1838. A partir do seu sofrimento, desenvolve o pensamento em defesa da mulher e do divórcio. Em 1833, inicia uma viagem ao Peru em busca da família de seu pai. Apesar do fracasso na aproximação com sua família, a viagem serve para reafirmar suas convicções iniciadas em 1825 com a leitura de socialistas utópicos como Saint-Simon, Owen e Fourier, além de Aurora Dupin e Considerant. Seu trabalho com os operários começou após o retorno do Peru, quando conheceu a realidade dos trabalhadores e trabalhadoras da Inglaterra. Após o contato com os escravos peruanos, vê nos operários londrinos outro universo de exploração e de misérias, chamando sua atenção a prostituição. Apesar da Revolução Industrial, os proletários da Inglaterra amargavam uma profunda exploração, com jornadas exaustivas, ambiente insalubre e exploração da mão de obra infantil. A verdade é que o desenvolvimento das máquinas não trouxe

melhoria nas condições de vida e de trabalho. Organizar as operárias para a emancipação da mulher Flora utilizava a literatura para divulgar seus pensamentos e teorias socialistas. Em sua primeira publicação, Nécessité de faire un bon accueil aux femmes étrangères (Necessidade de dar uma boa acolhida às mulheres estrangeiras), de 1835, abordou a situação das mulheres estrangeiras pobres na França. Passou a defender a união das mulheres para ajuda mútua e começou a ter contato com escritores socialistas da época. Em 1837, publica seu segundo folheto, em que defendia o divórcio, bandeira que carregou por toda sua vida como resultado do sofrimento pessoal que enfrentava. Neste mesmo ano, teve a oportunidade de conhecer Robert Owen, grande socialista utópico inglês, a quem dedicaria um capítulo de sua obra Lettres à un architecte anglais (Cartas a um arquiteto inglês), uma reportagem sobre Londres e a vida naquela cidade, que foi publicada na revista Revue de Paris. Em 1838, publica o diário da sua viagem à América, sob o título de Pérégrinations d'une paria (Peregrinações de uma pária). Esta obra trouxe grande repercussão para a vida de Flora, colocando-a entre os principais nomes da literatura parisiense. Publica então seu trabalho mais conhecido, o romance Méphis, também conhecido como Le prolétaire (O proletário). Em 1939, publica uma seleção de cartas do libertador Simón Bolívar (amigo de seu pai), traduzidas para o francês. Essas cartas representam a luta contra a opressão de um povo, mas também são um ataque aos bonapartistas, cuja influência representava a opressão social das mulheres. Em 1840, é publicada sua obra Promenades dans Londres (Passeios por Londres), onde descreve a situação dos trabalhadores e defende o divórcio e direitos iguais para homens e mulheres. Conclamou: “Trabalhadores, em 1791, vossos pais proclamaram a imortal Declaração dos Direitos do Homem, e, graças àquela solene declaração, sois homens livres e iguais perante a lei (...). O que vos toca fazer agora é libertar os últimos escravos que existem na França. Proclamai os Direitos da Mulher e, empregando os mesmos termos que empregaram vossos pais, dizei: 'Nós, o proletariado da França (...), decidimos incluir em nossa Carta os direitos sagrados e inalienáveis da mulher'”. Em 1843, Flora publicou sua mais importante obra, União Operária, que defendia a formação de uma poderosa organização de tra-

balhadores que deveria congregar, indistintamente, homens e mulheres para servir à luta por melhores condições de vida e pela transformação revolucionária da sociedade. Neste livro expõe a situação de miséria vivida pelo proletariado sob o capitalismo, em especial a questão da mulher operária como ser humano diminuído na sociedade. Com seu livro em mãos, peregrinou por toda a França divulgando suas ideias e buscando organizar comitês locais. Chegou a declarar uma vez: “Tenho quase todo mundo contra mim. Os homens porque peço a emancipação da mulher; os proprietários porque reclamo a emancipação dos assalariados”. Durante uma de suas viagens, em 1844, aos 41 anos, Flora veio a falecer, deixando uma obra inédita, A Emancipação da Mulher, que foi publicada em 1846. Durante sua vida, levantou várias bandeiras, entre elas o direito pleno à educação, direito de escolha do marido, direito ao divórcio e igualdade para mães solteiras e fi-

Flora Tristán

lhos ilegítimos diante das leis. Foi uma das primeiras feministas a buscar a verdadeira causa da desigualdade entre homens e mulheres. Em uma das suas obras descreveu: “Mesmo o homem mais oprimido pode oprimir outro ser, que é sua própria mulher. A mulher é a proletária do homem”. Acreditava que o operário só poderia se libertar se as mulheres também estivessem livres: “A ignorância das mulheres do povo”, escreveu, “tem consequências funestas. Sustento que a emancipação dos operários é impossível se as mulheres permanecerem neste estado de embrutecimento”.

Peregrinações de uma pária Mas se a escravidão existe na sociedade, [...] se as leis não são iguais para todos, se os preconceitos religiosos ou outros reconhecem uma classe de PÁRIAS, oh! então, a mesma dedicação que nos leva a assinalar o desprezo pelo opressor deve nos fazer lançar um véu sobre a conduta do oprimido que tenta escapar do jugo. [...] A servidão foi abolida, dirão alguns, na Europa civilizada. Não temos mais, é verdade, mercado de escravos em praça pública; mas entre os países mais avançados, não há um onde as classes numerosas de indivíduos não sofram uma opressão legal. Os camponeses na Rússia, os judeus em Roma, os marinheiros na Inglaterra, as mu-

Novo lançamento Edições Manoel Lisboa www.averdade.org.br

R$ 20,00

lheres em todo lugar; sim, em todo lugar onde a cessação do consentimento mútuo, necessário à formação do casamento, não é suficiente para rompê-lo, a mulher está em servidão. Dava pena ver o pátio deste hospital! (...) Não há uma única enfermeira para cuidar dos doentes, e são índios velhos os encarregados disto. Esses homens vendem seus serviços e não se pode esperar deles nenhum zelo (...). Os feridos transportados ao hospital eram colocados no chão sem nenhum cuidado (...). O Exército não tinha organizados serviços de ambulância, e os médicos da cidade eram insuficientes para este aumento de trabalho. (Escritos de Flora Tristán sobre sua visita ao Peru, durante a “Revolução de Lima”, em 1834.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.