ELES DERAM SUAS VIDAS PELA LIBERDADE NO BRASIL
MANOEL LISBOA
MANOEL ALEIXO
AMARO LUIZ
AMARO FÉLIX
ELES MERECEM JUSTIÇA! PELO DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE
EMMANUEL BEZERRA
Partido Comunista Revolucionário
Um jornal dos trabalhadores na luta pelo socialismo www.averdade.org.br
Brasil, setembro de 2014 - Ano 14 - Nº 165
R$ 2,00
Luciana Genro “Com o dinheiro que vai para os bancos podemos garantir moradia e saúde” PSOL
Com uma trajetória de vida comprometida com os interesses dos trabalhadores e defendendo um novo modelo econômico para o País, que priorize as necessidades do povo e não os lucros dos bancos e de grandes empresários, Luciana Genro, candidata a presidente pelo PSOL, é entrevistada pelo jornal A Verdade. Nesta entrevista, Luciana diz como criou seu filho, trabalhou e encontrou tempo para ser uma militante. Afirma que “com o dinheiro que vai para o bolso dos banqueiros é possível tirar o Brasil da situação de calamidade social”, defende a redução da jornada de trabalho sem redução de salário e diz que, em seu governo, as Forças Armadas vão pedir desculpas pelos crimes que cometeram durante a Ditadura Militar. Sem medo de enfrentar os candidatos favoritos pelos institutos de pesquisa e que recebem milhões de reais das empreiteiras, dos bancos e das multinacionais, Luciana faz sua campanha na rua, junto ao povo e com o apoio dos movimentos sociais. Página 3
Luciana Genro faz campanha nas ruas de Porto Alegre
O massacre do povo paraguaio
Haitianos merecem respeito Público
Batalha do Avaí – Quadro de Pedro Américo
Para atender aos interesses imperialistas da Inglaterra, os governos do Brasil e da Argentina se uniram para realizar um dos maiores genocídio da história do século XIX: a Guerra do Paraguai. Nessa guerra, o Paraguai perdeu 140 mil km2 do seu território, o que corresponde a Pernambuco e Alagoas juntos. Página 12
Haitianos são impedidos de entrar em galpão em Brasileia, no Acre
Tratados como objetos pelos governos brasileiros, ao chegar em nosso País, haitianos vivem em condições análogas às da escravidão. Página 4
Epidemia de ebola cresce na África
Luta e unidade no 4º Congresso do MLB
Cientistas que pesquisam vacina contra ebola são boicotadas pela indústria farmacêutica capitalista. Página 9
Cerca de 350 delegados, de 11 estados, participaram do 4º Congresso Nacional do MLB, em São Bernardo do Campo, e aprovaram jornada de lutas do movimento. Página 8
2 Setembro de 2014
BRASIL
FRASE DO MÊS “Tal como sucedeu com a Aids, o ebola terá de matar gente rica, dos bairros luxuosos das cidades, para que se ponha o conhecimento científico existente ao serviço de quem sofre. Até lá, o ebola – como o terrorismo ou a perda de biodiversidade – será um pretexto para o mundo rico intensificar a contenção dos pobres no seu gueto global”. José Manuel Pureza, pesquisador do Centro de Estudos Sociais e professor de Relações Internacionais na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Portugal
Os 35 anos da anistia
Pinheiro Salles
Arquivo
Mesmo às vésperas das eleições, quando se ampliam os espaços para a divulgação das mentiras dos protagonistas desse processo, cresce uma campanha em defesa da verdade e da justiça. É que, com a criação e o funcionamento da Comissão Nacional da Verdade, estruturou-se em cada estado a Rede Brasil, reunindo familiares dos mortos e desaparecidos durante a ditadura militar (1964-1985), expresos políticos e demais pessoas que não aceitam a violações dos direitos humanos em nosso país. Neste ano de 2014, com relativa visibilidade, muitas foram as manifestações de repúdio aos 50 anos do golpe que implantou o nazifascismo no Brasil. E em todas elas se sobressaiu o fato de aqui, ao contrário de outros países da América Latina, não haver nenhuma medida que levasse à punição dos agentes que atuaram nos porões da ditadura. Agora, neste 28 de agosto, quando deveríamos estar comemorando os 35 anos da anistia, nossas ações têm outro objetivo. Mesmo reconhecendo que ela resultou da mobilização do povo brasileiro, continuamos lutando para que essa conquista possa assegurar a justiça de transição, consubstanciando uma ruptura com o tempo do terror. Devemos lembrar que, principalmente a partir de maio de 1978, quando foi fundado o Comitê Brasileiro pela Anistia de São Paulo, tomou as ruas o movimento em defesa de uma anistia ampla, geral e irrestrita, envolvendo vários setores sociais. Então, o ditador de plantão, general João Batista Figueiredo, decidiu elaborar e apresentar um projeto que pudesse conter as pressões recebidas. A Lei da Anistia (nº 6.683) foi sancionada no dia 28 de agosto de 1979, tendo a preocupação de beneficiar os generais, coronéis, almirantes, brigadeiros e todos os agentes militares e civis que praticaram indescritíveis ignomínias durante os anos de tirania. Mesmo excluindo 186 presos políticos condenados pelas ações de combate à ditadura, o projeto foi aprovado pelo Congresso Nacional, sob as ameaças dos fuzis e da truculência do governo militar. Ainda assim, a vitória foi apertadíssima: a situação teve 206 contra 201 da oposição. Desse jeito, ao longo dos anos, não cessou a luta pelo triunfo da justiça. Aliás, o presidente da Câmara Nacional de Apelações no Tribunal Criminal de Buenos Aires, Eduardo Freiler, procura encorajar os brasileiros, observando que os avanços na Argentina foram possíveis “depois de muitas idas e vindas na legislação”. E a procuradora da República Eugênia Fávero até ironiza. Diz ela temer que juízes argentinos julguem criminosos brasileiros ou que o Brasil passe a receber torturadores argentinos, porque aqui há refúgio para eles.
Inúmeras “idas e vindas” aconteceram nesse período, incluindo a sentenças de uma Corte Internacional. Mas nenhum governo teve autonomia política para enfrentar o problema. A criação da Comissão Nacional da Verdade representou um inequívoco avanço. Todavia, são imensas as suas limitações, deparando-se até com a recente decisão do general Enzo Peri, comandante do Exército, proibindo seus subordinados de passar qualquer informação sobre violências praticadas, em suas unidades, durante a ditadura. E onde está a presidente Dilma, que não exonera esse defensor de quem praticou tortura, homicídio, esquartejamento, desaparecimento forçado, abuso de autoridade, lesões corporais, estupro, atentado violento ao pudor, enfim, crimes de lesa-humanidade? Onde está a presidente Dilma Rousseff? E não venha ela falar de respeito a “pactos políticos que nos levaram à redemocratização”. Onde está a bancada governista na Câmara Federal que não julga (e aprova) o projeto da deputada Luíza Erundina, que propõe no art. nº1: “Não se incluem entre os crimes conexos, definidos no art. 1º, § 1º, da Lei nº 6.683/79, os crimes cometidos por agentes públicos, militares ou civis, contra pessoas que, de modo efetivo ou suposto, praticaram crimes políticos”? Por quê? E a bancada governista no Senado, que também não vota (e aprova) o projeto do senador Randolfe Rodrigues? A proposta foi colocada em pauta a pedido dos integrantes da Subcomissão da Memória, Verdade e Justiça, que apoiam a campanha da Anistia Internacional pela punição dos crimes da ditadura militar. Por quê? Francisco Celso Calmon, coordenador nacional da Rede Brasil, teme o caminho da “revisão” ou da “reinterepretação” da Lei da Anistia, pelo Congresso Nacional, que, na sua opinião, pode se constituir uma armadilha, porque “corre o risco de parar no STF, sob a arguição de que sendo uma revisão não retroage e não alcançará os criminosos de lesa-humanidade”. Opina: “O caminho último é uma nova arguição ao STF (patrocinada pela OAB), cuja composição é diferente da de 2010, quando sustentou a tese do pacto”. Estou convencido de que todos os caminhos devem ser percorridos, porque 35 anos são passados, e o Brasil exige providências urgentes, para que a ditadura não continue ameaçando a vida da maioria dos brasileiros. E a impunidade não mais estimule a hedionda prática dos atuais criminosos, como está acontecendo hoje em Goiânia. (Pinheiro Salles é presidente da Comissão da Verdade, Memória e Justiça do Sindicato dos Jornalistas e coordenador da Rede Brasil do Centro-Oeste)
Faltam remédios nos postos de saúde e sobra repressão nas ruas Segundo dados de 2013 do IBGE, Alagoas tem uma população estimada em 3.300.935 habitantes, e é o segundo estado com a maior concentração de renda no Brasil, porém, com os piores indicadores sociais. Para os turistas e os membros da burguesia, Maceió é um paraíso, mas os mais pobres sofrem diversos tipos de repressão. O prefeito Rui Palmeira (PSDB), que se apresentou como o “novo” e a “solução” com sua gestão inútil e ditatorial faz perpetuar velhos problemas e – o que é pior – ainda os agrava. A edição do Bom Dia Brasil, da Rede Globo, de 17 de julho, mostrou que, na Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF), onde ficam armazenados os medicamentos distribuídos pela prefeitura a 68 postos de saúde na capital, foram encontradas dezenas de remédios com validade vencida até depois de dois meses. Entre os medicamentos perdidos, suplementos alimentares, produtos para portadores de diabetes e substâncias de uso controlado para pacientes psiquiátricos. O mais curioso é que os medicamentos que perderam a validade no depósito por falta de uso são os mesmos que estão em falta nas unidades de saúde, vitimando, assim, a população mais pobre, que depende da distribuição desses remédios para o tratamento de suas enfermidades. Repressão do Estado Enquanto isso, as ruas fervem quando o assunto é repressão. Trabalhadores do comércio popular são removidos à força bruta pela guarda civil, que se tornou presença constante nas ruas do Centro de Maceió, sendo que, em sua maioria, as lojas do Centro vendem móveis, eletroeletrônicos, roupas e sapatos, enquanto os “vendedores ambulantes” vendem DVDs, canetas, raquetes para matar insetos, lanternas, etc. Quando alguém lhes pergunta, os donos de lojas respondem que os ambulantes tiram a visibilidade de suas lojas, embora mais de 80% deles vendam suas mercadorias no chão ou penduradas nas paredes. Ora, como poderiam tirar a visibilidade de uma loja que ostenta uma placa enorme, a três, quatro ou mais metros do chão, anunciando que está ali (e que ainda tem propaganda no rádio, na televisão e nos jornais)? Os pescadores da Vila do Jaraguá, que existe no mesmo local há mais de 415 anos, estão prestes a serem expulsos do seu lugar de origem porque a Prefeitura quer o terreno para construir uma marina (1), já que os ricos e pode-
rosos do Estado pretendem atracar suas lanchas e iates mais perto do Centro. Para atender aos interesses do grande capital, a gestão do prefeito Rui Palmeira (PSDB) promove uma feroz perseguição aos moradores da vila, na tentativa de realizar o que a coordenadora do Cepa Quilombo e do Museu da Cultura Periférica, Sirlene Gomes, chamou de “faxina social”. A vila é uma comunidade tradicional e, segundo a Constituição brasileira, comunidades deste tipo não podem ser removidas do seu lugar de origem. E outros mais. A Organização das Nações Unidas (ONU), em sua Declaração Universal dos Direitos Humanos, garante que todo ser humano tem direito à moradia digna. Porém, em nome do lucro máximo, a Prefeitura quer passar por cima da ONU e da Constituição da República Federativa do Brasil. Isso porque, durante a campanha eleitoral, o slogan do atual prefeito era “O cara é bom”. E se o “cara” fosse mau? Nem quero imaginar o que poderia ter acontecido. E a vila de pescadores ainda tem sua imagem vinculada na mídia como se os que moram lá fossem traficantes de drogas. Se existe algum tráfico na vila de pescadores, esse tráfico só pode ser o tráfico de frutos do mar para a mesa dos alagoanos; o tráfico de cultura popular, a exemplo do maracatu, da capoeira, do artesanato... É o tráfico de uma luta incansável que contagia toda a cidade, seja entre os pescadores, seja entre os trabalhadores do comércio popular, os estudantes, as mulheres... Resumindo: todos os que lutam, e, parafraseando Olga Benário, unidos pelo justo e pelo melhor do Brasil e do mundo. Só resta lutar até o fim por esta causa legítima, já que agora os olhos do abutre do grande capital estão voltados para a Vila em Jaraguá. Se nada for feito agora, amanhã os expulsos podem ser os moradores do Jacintinho, Feitosa, Benedito Bentes (2), entre outros. Unidos, venceremos essa guerra. Talvanes Faustino, Maceió ¹Marina é um pequeno centro portuário de recreação usado primariamente por iates privados e botes recreacionais. As marinas normalmente possuem corredores primários e secundários, permitindo acesso a todos os barcos atracados. Muitas vezes, oferecem serviços como lavagem, venda de combustível e manutenção. ²Os nomes citados são de bairros da periferia de Maceió.
A Verdade nas bancas do Rio de Janeiro Em 15 anos de existência, o jornal A Verdade vem conquistando espaço nos mais diversos setores da sociedade e tornou-se um dos mais influentes jornais de esquerda do nosso país. No Rio de Janeiro, uma marca de A Verdade é a grande divulgação que possui nas bancas de jornal. De fato, hoje estamos presentes em grandes bancas no Centro do Rio de Janeiro, Niterói e Duque de Caxias. É pela exposição feita nessas bancas que nosso jornal se torna mais conhecido e conquista mais leitores.
www.averdade.org.br Redação End.: Rua Carneiro Vilela, nº 138/1º andar, Espinheiro, Recife, Pernambuco, Brasil, CEP: 52.050-030 Telefones: (81) 3427-9367 e 3031-6445 E-mail: redacao@averdade.org.br Jornalista: Rafael Freire (MTE-PB: 2.570) Diretor de Redação: Luiz A. Falcão Projeto gráfico: Guita Kozmhinsky São Paulo: (11) 98956-0317 e 98671-3990 Rio de Janeiro: (21) 98083-4999 e 99162-7167
Nas bancas, dividindo espaço com os jornais da grande mídia burguesa, fica clara a diferença entre o nosso jornal e os jornais tradicionais da burguesia, que defendem o ponto de vista dos ricos e poderosos. Logo, divulgar o jornal em mais bancas, conversar com os jornaleiros para garantir uma boa exposição dele e realizar brigadas e agitações próximas aos locais das bancas fazem parte do trabalho de garantir que a opinião do povo chegue, através do jornal, a cada vez mais lugares e pessoas. Minas Gerais: (31) 9331-4477 e 9133-0983 Espírito Santo: (27) 9993-6692 Bahia: (71) 9194-1800 e (75) 9198-2901 Alagoas: (82) 8852-8688 e 8875-0330 Paraíba:(83) 8736-0001 e 8772-8249 Rio Grande do Norte: (84) 9688-4375 e 9679-1174 Ceará: (85) 8549-9667 e 9759-2295 Piauí: (86) 9835-0285 Pará: (91) 8154-0530 e 8822-5586 Amazonas: (92) 8222-3265 Santa Catarina: (49) 9940-3958 Rio Grande do Sul: (51) 8131-4693 e 8172-4826 Paraná: (41) 9233-3111 Goiás: (62) 8257-3427 Brasília: (61) 8262-9047
BRASIL
Luciana Genro: “O transporte público é um direito e não deve ser tratado como mercadoria” Arquivo
Luciana Genro
JAV - Você tem um filho. Como é ser mãe e ter uma atuação política tão intensa, num país em que as mulheres são ainda muito discriminadas? Luciana Genro - Foi muito difícil. Diversas vezes perdi reuniões e atividades pelo fato de ser mãe e não existirem creches noturnas. Meus pais tiveram condições de me ajudar e, mesmo assim, precisei começar a trabalhar aos 17 anos, quando meu filho nasceu. Trabalhar, estudar, cuidar de um filho e fazer política foi um desafio enorme. Como pretende fazer sua campanha, sabendo que três candidatos (PT, PSDB e PSB) vão gastar cerca de R$ 700 milhões na campanha eleitoral, enquanto o PSOL e os partidos que a apoiam não têm nem recebem nenhum centavo dos grandes capitalistas? Nossa campanha é centrada na mobilização da militância do PSOL, do PCR, de correntes políticas, movimentos e no engajamento individual de milhares de pessoas que apoiam nossa candidatura. O poder econômico ainda tem a capacidade de desequilibrar o resultado do pleito, mas esta eleição, em especial, está marcada pelo aumento do voto crítico e consciente em relação às maracutaias dos partidos do sistema e das grandes empresas. A aposta nas redes sociais é necessária para diminuir a diferença do tempo de TV e da cobertura desigual da mídia. Acessem nosso site: www.lucianagenro.com.br. O Brasil, segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, gasta R$ 3,4 bilhões por dia com juros da dívida pública, e, ao ano, 40% do orçamento do Governo vai para pagar esses juros. Eleita presidente, o que faria com esse dinheiro público que hoje vai para os bancos e o capital financeiro internacional? De imediato, valorização do saláriomínimo e das aposentadorias, bem como aplicaria o valor correspondente a 10% do PIB na saúde e mais 10% do PIB na educação. Destinaria boa parte dos recursos para a seguridade social, fortalecendo o Bol-
A Verdade entrevistou Luciana Genro, gaúcha, 43 anos, candidata à Presidência da República pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Duas vezes deputada federal, em 2006, quando foi reeleita pelo Rio Grande do Sul (desta vez, concorrendo pelo PSOL), obteve 185 mil votos, sendo a deputada mais votada em Porto Alegre. Comprometida com a luta de familiares de ex-presos, mortos e desaparecidos políticos, apresentou o Projeto de Lei nº 7.430/2010, no qual propõe que a Lei da Anistia deixe de proteger agentes públicos civis e militares envolvidos na repressão e na prática de crimes de lesa-humanidade, como a tortura, durante a Ditadura Militar. Nesta entrevista Luciana fala do desafio de enfrentar uma das eleições mais caras e dominadas pelo poder financeiro já vistas no País e defende um programa de esquerda e a importância de unificar todos os setores populares para combater as candidaturas da grande burguesia e construir uma alternativa verdadeiramente popular em nosso País. Redação São Paulo
sa Família. Faria também investimentos nas políticas de moradia e na implementação de um sistema nacional de transporte público, com tarifa zero. Com o dinheiro que vai para o bolso dos banqueiros podemos tirar o Brasil da situação de calamidade social em que se encontra. Os empresários brasileiros estão unidos para aprovar, no Congresso Nacional, o Projeto de Lei nº 4.330, que legaliza a prática das terceirizações em todas as atividades econômicas, de todos os setores, sejam públicos ou privados, seja na atividade-fim ou na atividade-meio. Qual a sua posição em relação a esse projeto? Sou contra esse projeto. Todas as medidas que levam à precarização do trabalho e à flexibilização das leis trabalhistas terão sempre minha resistência. Foi justamente o fato de eu votar contra um projeto de precarização das aposentadorias, a Reforma da Previdência, que tirava direitos dos trabalhadores, que levou a direção do PT a me expulsar do partido, em 2003. Os trabalhadores também lutam para reduzir a jornada de trabalho para 40 horas semanais. Essa medida, de acordo com o Dieese, criaria três milhões de empregos no País. O que pensa dessa reivindicação dos trabalhadores? Concordo, e faz parte da minha plataforma de governo. Nossas medidas no campo da economia visam à melhoria das condições para o mundo do trabalho e, sem dúvida, a redução da jornada semanal, sem redução de salário, é uma medida fundamental. O transporte público no Brasil é fonte de grande corrupção no País, e, além de prestar um péssimo serviço à população, é caro e permite enormes lucros aos empresários. Quais as suas propostas para o transporte? A primeira medida é a mudança de mentalidade: para nós, o transporte público é um direito e não deve ser tratado como mercadoria, em busca do lucro. Vamos criar um sistema nacional de transporte público, com forte financiamento do Governo Federal, para resolver esse grande
problema de nossas cidades, em parceria com sindicatos de trabalhadores, movimentos urbanos, governos estaduais e prefeituras. Esse sistema será baseado em sistemas sobre trilhos, ou o que for mais adequado a cada cidade, além de contar com integração entre modais. O problema do transporte público tem soluções óbvias e passa por duas frentes: investimento do Governo Federal e controle público, com participação da sociedade, para que a pressão pelo lucro promovida pelos empresários não seja o objetivo principal, abrindo caminho para que possamos instaurar a tarifa zero no transporte público. Sete milhões de famílias vivem em áreas de risco ou não têm casa para morar. Qual é sua proposta para resolver o déficit habitacional? Nossa proposta é trabalhar em parceria com os movimentos de luta pela moradia, em especial o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, que dão uma demonstração de organização e competência em São Paulo. Vamos destinar 100% dos recursos do Minha Casa, Minha Vida para gestão das entidades populares de luta pela moradia. Dilma destina somente 2% para as entidades e 98% para as empreiteiras. O resultado é que as entidades constroem casas com o dobro do tamanho, pelo mesmo preço. Assim, basta uma mudança de gestão para dobrar a oferta de
3 Setembro de 2014
“Nossa campanha é centrada na mobilização da militância do PSOL, do PCR, de correntes políticas, movimentos e o engajamento de milhares de pessoas que apoiam nossa candidatura. O poder econômico ainda tem a capacidade de desequilibrar o resultado do pleito, mas esta eleição está marcada pelo aumento da voto crítico e consciente.”
unidades do Minha Casa, Minha Vida. É necessário também enfrentar a especulação imobiliária com uma nova Lei do Inquilinato e o controle do preço dos aluguéis. Os Governo dos EUA e dos principais países imperialistas mantêm, há mais de 50 anos, um desumano bloqueio econômico a Cuba. Qual a posição que o seu governo tomará sobre essa questão? Repudio o bloqueio econômico dos EUA a Cuba. Nosso governo terá relações diplomáticas e comerciais com Cuba, à revelia da pressão de quem quer que seja.
Apesar de receber grande apoio dos movimento populares, os institutos de pesquisa registram 1% para sua candidatura. Não é algo novo, pois também esses institutos não previram as manifestações de junho. O que pensa a esse respeito? Os institutos de pesquisa não são neutros, não fazem apenas medição da opinião pública. Os institutos têm um histórico de erros nas pesquisas que entendemos como tentativas de influenciar o eleitorado. O mais grave é quando servem de parâmetro para a cobertura da mídia. Aí o pacto das elites para tornar invisíveis as candidaturas contra o sistema é mais notório. Defendemos que se adotem leis, como na Grécia, que impeçam a divulgação de pesquisas nos 15 dias anteriores à eleição, o que deixa o eleitor mais livre para votar em quem de fato representa suas ideias e não como hoje, quando se influencia o eleitor a votar em quem tem mais chances, segundo os próprios institutos e a grande mídia. Em 2012, na disputa pela Prefeitura do Rio, Marcelo Freixo, do PSOL, teve, no máximo, cerca de 20% das intenções de voto e, nas urnas, obteve quase 30%. Certamente, se as pesquisas não fossem manipuladas e Freixo aparecesse com 30% nas pesquisas, teria ido ao segundo turno.
Leia e divulgue
www.averdade.org.br
4 Setembro de 2014
BRASIL
A presença de haitianos na Amazônia
Jamilly Lopes* ecentemente, tem-se registrado na Amazônia brasileira a imigração de um considerável número de haitianos. O Censo Demográfico Brasileiro realizado pelo IBGE, em 2001, demonstra que a presença de haitianos era praticamente inexistente. Porém, já com a contagem da população após 2007, essa realidade vem sendo alterada. O que se pode concluir é que o recente golpe militar, em 2004, e o terremoto que assolou o Haiti, em 2010, contribuíram significativamente para o fluxo migratório de haitianos em direção ao Brasil, com entrada pela Amazônia. Os haitianos vêm em busca de condições de vida melhores que as que tinham no país de origem. A realidade, entretanto, não se apresenta tão promissora como se esperava. A falta de estrutura para acolher essa população, o processo burocrático para regularizar sua entrada e permanência aqui e a escassez de oportunidades de trabalho, além do choque cultural, da dificuldade da língua e do rompimento de suas relações sociais, têm gerado verdadeiros corredores de pobreza na Amazônia. O principal problema é que não existe uma lei específica para mantêlos em solo brasileiro. Os haitianos chegam geralmente pela fronteira com o Acre. Segundo o Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH), o principal trajeto seguido pelos haitianos acompanha um deslocamento, por via aérea, da República Dominicana com destino ao Equador ou ao Peru. Como esses países não exigiam visto para haitianos (o Peru introduziu a exigência do visto em janeiro de 2012), eles não encontravam dificuldades na entrada. Depois de chegarem a um desses países, atingem a fronteira do Brasil em diferentes pontos, por via terrestre ou fluvial. Tabatinga, Assis Brasil e Brasileia são os mais frequentes. Em alguns casos, em lugar de se deslocarem à fronteira com a região Norte (o menor trajeto), chegam pela região Centro-Oeste, entrando por Corumbá, por exemplo. Ao chegarem em solo brasileiro, esbarram com um processo burocrático. Os haitianos são dirigidos à Poli-
ATS
R
mica da República do Haiti, pois esse país vive em uma imensa pobreza. Ao invés de enviar tropas do Exército para intervir naquele país, como fez o Governo brasileiro, este deveria enviar ajuda humanitária para que nossos irmãos de continente possam viver dignamente em seu próprio país. *(Jamilly Lopes é geógrafa)
Entenda um pouco mais sobre o Haiti
Haitianos em albergue na cidade de Brasileia, Acre
cia Federal para solicitarem vistos como “refugiados”, o qual, porém, só é concedido a pessoas perseguidas politicamente e que têm sua vida ameaçada, exigindo, assim, ajuda internacional. Logo, o haitiano que está fugindo de uma situação caótica de pobreza e de catástrofes naturais não pode ser enquadrado como refugiado. O Governo brasileiro, com base na Resolução nº 27/98, que trata dos casos omissos e especiais, adotou uma posição: “Na aplicação da RN nº 27/98, o CNIg tem considerado as políticas migratórias estabelecidas para considerar os haitianos como casos ‘especiais’, ‘humanitários’, isto é, aqueles em que a saída compulsória do migrante do território nacional possa implicar claros prejuízos à proteção de seus direitos humanos e sociais fundamentais”. Desta forma, pode parecer que a história dos haitianos na Amazônia acaba com um final feliz, mas a situação não é esta. O Brasil os recebe, porém sem condições dignas. Como não existem residências construídas para receber esses imigrantes, eles são dirigidos a acomodações improvisadas, como em Brasileia, no Acre, onde um ginásio de esportes com capacidade para 800 pessoas servia de abrigo para quase 1.200 haitianos. O senador Aníbal Diniz, do PT do Acre, afirma que o Governo Estadual gasta de R$ 12 mil a R$ 15 mil por dia para manter os imigrantes. O dinheiro é usado nos alojamentos, nas
2.500 refeições fornecidas diariamente e em atendimentos médicos aos estrangeiros, que já somam quase 10% da população urbana do município. Em uma “solução” desesperada e sem fundamento, o Governo do Estado, no início do mês de abril, fechou o alojamento que abrigava os haitianos na cidade de Brasileia, e transferiu parte deles para a capital, Rio Branco, de onde 400 deles foram levados, de ônibus, para São Paulo, sob o argumento de que lá é o centro do emprego no Brasil. Com isso, os estados brasileiros entraram em uma briga sobre quem receberá esses haitianos, como se esses seres humanos fossem objetos que podem ser transportados de um lugar para outro sem que se peça sua opinião. A imigração de haitianos para o Brasil é contínua. Apesar de países como Peru e Venezuela, que fazem fronteira com o Brasil, passarem a exigir vistos de entrada para pessoas egressas do Haiti, o fluxo migratório é intenso. Agora, com a exigência de vistos de imigração, passam a atuar nesse processo os chamados “coiotes”, pessoas que cobram para atravessar outras de forma clandestina, agravando o quadro. A situação dos haitianos no Brasil não pode ser resolvida com uma Medida Provisória ou apenas com uma política mais específica de imigração. É necessário voltar as atenções para a situação política e econô-
O Haiti é um país localizado na América Central e ocupa a porção ocidental da ilha Hispaniola. Sua extensão territorial é de 27.750 km2, onde vivem mais de 10 milhões de habitantes. Antiga colônia francesa, tornou-se a primeira república negra do mundo, fundada em 1804 por antigos escravos. Marcada por uma série de governos ditatoriais e golpes de Estado (o mais recente, em 2004), a população haitiana presencia uma guerra civil e muitos problemas socioeconômicos. O Haiti é o país economicamente mais pobre da América: seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é de apenas 0,404; aproximadamente 60% da população é subnutrida e, mais da metade vive abaixo da linha de pobreza, ou seja, com renda menor que 1,25 dólar por dia. Além de todos esses fatores, o país passou por outra tragédia, dessa vez, de ordem natural. No dia 12 de janeiro de 2010, um terremoto de magnitude 7 na Escala Richter atingiu o país, provocando uma série de feridos, desabrigados e mortos. Diversos edifícios desabaram, inclusive o palácio presidencial da capital, Porto Príncipe. Em decorrência do terremoto, cerca de 220 mil pessoas morreram e 1,5 milhão delas ficaram desabrigadas. Ainda hoje, há cerca de 360 mil pessoas abrigadas em alojamentos improvisados e em busca de alternativas no exterior, como Brasil, EUA e República Dominicana, país que ocupa a porção oriental da mesma ilha.
A privatização e os constantes aumentos na conta de luz Em 16 anos de privatização, a tarifa de energia elétrica aumentou em mais de 400% no Pará, enquanto a inflação ficou em torno de 176%. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) autorizou o reajuste médio de 34,96% nas tarifas cobradas pela Celpa Equatorial, distribuidora de energia em todo o Estado do Pará. A decisão foi tomada em reunião realizada no dia 5 de agosto. O aumento entrou em vigor logo em seguida, no dia 7. Para os consumidores de baixa tensão o reajuste médio será de 34,34%, bem acima da inflação, estimada em torno de 6,5% para os últimos 12 meses. Já para os grandes consumidores (alta tensão – consumidores comerciais e industriais de médio e grande porte) o reajuste autorizado foi, em média, de 36,41%. Segundo cálculos do Dieese Pará, este é o maior percentual de reajuste concedido à distribuidora desde a privatização da Celpa, em 1998. De lá para cá, os reajustes acumulados chegam a 417%, enquanto a inflação medida pelo INPC/IBGE e
ICV/Dieese no período fica em torno de 176%. São justamente estes os dois índices usados como base para os reajustes dos salários. Em declaração ao jornal A Verdade, o presidente do Sindicato dos Urbanitários do Pará, Ronaldo Romeiro, denunciou: “Pelos números apresentados pelo Dieese dá para ver o tamanho do absurdo desse reajuste concedido pela Aneel à Celpa. Um reajuste pra lá de abusivo para uma população que na sua maioria sobrevive com renda de salário mínimo”. O dirigente sindical diz que os números apresentados pelo Dieese demonstram a relação inequívoca entre a privatização e o aumento da tarifa. “As empresas privadas vivem em função do lucro. Essa é a lógica do capital. Entregar serviço público, essencial para a qualidade de vida das pessoas, à iniciativa privada, dá nisso”, reitera Romeiro. Ele lembra que, à época da privatização, o Sindicato fez esse alerta à sociedade, mas, com uma manobra política, o governo conseguiu a aprovação da venda da Celpa em votação na Assembleia Legislativa do
Estado. “O governo que privatizou a empresa estatal era do Almir Gabriel, do qual fazia parte o atual governador do Pará. Agora ele entra com ação na Justiça querendo barrar o reajuste. Parece ironia, mas é jogo político. A justificativa do governo tucano da época era que a tarifa iria diminuir, e o serviço, melhorar, mas a realidade é inversa”, alfineta Romeiro. Ele acrescenta que, além dos aumentos abusivos da tarifa, a privatização da Celpa levou à demissão de trabalhadores, terceirização de serviços, aumento de acidentes de trabalho e piora dos serviços. O presidente do Sindicato dos Urbanitários também critica a atuação da Aneel, que, para ele, tem uma lógica inversa, incompreensível, pois a população paraense é penalizada por aumentos abusivos e absurdos da tarifa, mesmo sendo o Pará um grande produtor de energia elétrica. “Já a Celpa privatizada, por sua vez, ganha o direito a esses reajustes, mesmo prestando um serviço de péssima qualidade, tendo o patrimônio – que era
público – dilapidado por gestões questionáveis do Grupo Rede e agora da Equatorial. A má gestão é premiada e a população do Estado produtor e exportador de energia é obrigada a pagar a tarifa mais cara do País”, finaliza Romeiro. Jeniffer Galvão, jornalista
www.averdade.org.br
Compre nas principais bancas do país
Terceirização e corrupção Ileana Neiva Mousinho Procuradora Regional do Trabalho
Arquivo
A
terceirização de serviços na administração pública tem sido apresentada à sociedade como uma forma de o Estado brasileiro obter mais eficiência na prestação de serviços públicos. Por essa propaganda, se a administração pública contratasse empresas prestadoras de serviços para executar atividades que não são tipicamente estatais, e concentrasse seus esforços nas atividades estatais típicas (saúde, educação, segurança pública), o Estado maximizaria sua capacidade de realizar essas atividades essenciais. Por outro lado, ao remeter as atividades não estatais a empresas especializadas, o Estado aumentaria o grau de satisfação da sociedade, uma vez que, com a sua especialização, essas empresas prestariam um serviço muito melhor. Do discurso à prática, verifica-se, hoje, a terceirização da saúde e da educação, e não apenas das atividades-meio; e casos e casos de corrupção, em que a terceirização tem sido utilizada para o enriquecimento ilícito. O modo como esse mecanismo de corrupção opera inicia-se, em geral, com a contratação emergencial, com dispensa de licitação, de empresas prestadoras de serviços terceirizados ou de falsas organizações sem fins lucrativos, que superfaturam os preços dos contratos de prestação de serviços e servem, ainda, aos interesses econômicos e eleitorais do político que engendra a sua contratação. Além do valor contratual superfaturado ser rateado entre as empresas e o(s) administrador (es) público(s) e político(s) – ganhos financeiros – há ainda o ganho eleitoral, pois cabos eleitorais são contratados como empregados da empresa terceirizada, em burla ao concurso público e ao princípio da impessoalidade da administração pública.
Governos terceirizam a saúde porque pensam que é mercadoria
“Essas organizações sociais e congêneres vendem, tão somente, a terceirização, e, como demonstram os processos judiciais, na grande maioria dos casos, no bojo dessa terceirização encontra-se a corrupção”
Um outro (falso) argumento pró-terceirização é o de que a terceirização de serviços de saúde gera mais eficiência. Os valores repassados às empresas prestadoras de serviços e para pseudoorganizações sociais, se fossem empregados nos serviços públicos, também gerariam eficiência. Há, portanto, uma propaganda levada a efeito, há muitos anos, para o cidadão achar que a terceirização é boa para o Estado brasileiro. No entanto, o que o cidadão atento pode observar é o contrário, pois terceirizar tem saído muito caro ao Estado brasileiro: ou há superfaturamento de preços; ou empresas “somem”, deixando os seus empregados sem o pagamento de verbas salariais e rescisórias, e o Estado arca com a responsabilidade subsidiária por tais débitos trabalhistas; ou a organização social cobra taxa de administração e ainda superfatura valores de insumos e aumenta o número de atendimentos e consultas realmente efetuados. A verdade é que, ao es-
colher terceirizar serviços, os administradores públicos, no caso específico da saúde e educação, passaram a não investir em tais serviços. Hospitais desaparelhados e anos sem fazer concurso público, ou seja, sucateamento do sistema público de saúde, para que, quando a “solução” da terceirização fosse dada, a população, desencantada com os problemas da saúde pública, ficasse satisfeita com os hospitais terceirizados. No caso das organizações sem fins lucrativos, a justificativa estatal é que se trata de o Terceiro Setor contribuir com o Estado para a realização de suas atividades essenciais. Um exame do que ocorre na realidade destrói esse argumento. Basta verificar-se que, se há alegação de carência de recursos estatais para a prestação de serviços de saúde e educação, só haveria real ajuda dessas organizações sem fins lucrativos se elas trouxessem recursos financeiros adicionais para o Estado, de modo a suplementar a capacidade financeira estatal, e, assim, juntos prestarem os serviços de educação e saúde. O que se observa, porém, é que essas pseudoentidades sem fins lucrativos recebem recursos do Estado e não entregam bens ou recursos financeiros para suplementar a capacidade estatal de prestar serviços públicos. São contratadas, apenas, com a alegação de que têm
Chega de culpar São Pedro Heitor Scalambrini Costa - Professor da Universidade Federal de Pernambuco Contra fatos não há argumentos. O que acontece atualmente em relação ao desabastecimento de água em São Paulo se enquadra na retórica de que uma mentira repetida mil vezes vira verdade. O Governo paulista insiste em negar que, se as obras necessárias tivessem sido realizadas, poderia ser menos dramática a atual situação. E insiste ainda em responsabilizar São Pedro pelo caos evidente. A culpa não é da seca! A seca é parte do problema, pois, desde sempre, se soube que ela poderia vir. Os gestores públicos também negam que existe racionamento, afirmando que o abastecimento de água está garanti-
do até março de 2015, apesar de, na prática, o racionamento existir oficialmente em dezenas de municípios. Em visita ao interior de São Paulo, no início de agosto, pude constatar uma situação de que ainda não tinha me dado conta. A gravidade da crise hídrica atinge não apenas a região metropolitana da capital, como a imprensa dá a entender ao enfatizar o colapso do Sistema Cantareira, mas atinge todo o Estado mais rico da União. Dos 645 municípios paulistas, a Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp) é responsável por fornecer água a 364, que somam um total de 27,7 milhões de
pessoas. Nos outros 281 municípios (não abastecidos pela companhia), o abastecimento de água para 16 milhões de pessoas fica a cargo das próprias prefeituras ou de empresas por elas contratadas. Se, por um lado, a companhia estadual de abastecimento nega haver adotado rodízio de água em qualquer um dos municípios atendidos por ela, inclusive na capital, tal afirmação é logo desmentida pelos usuários que relatam interrupções no abastecimento, principalmente à noite. Nos municípios não atendidos pela Sabesp, medidas restritivas estão sendo tomadas por centenas de empresas e gestores locais devido à cri-
BRASIL
5 Setembro de 2014
Máquinas inadequadas causam 55 mil acidentes de trabalho Os dados das Comunicações de Acidentes de Trabalho ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) são impressionantes. Apenas 11 tipos de máquinas e equipamentos utilizados sem as medidas de segurança adequadas foram responsáveis por 55.118 acidentes que levaram à morte ou incapacitaram trabalhadores no Brasil. Esses números mais parecem estatística de guerra! De fato, não são apenas acidentes, mas sim um descaso homicida provocado pela ânsia de lucro dos grandes empresários que desrespeitam a legislação e não cumprem a Norma Reguladora Nº 12, a NR-12, que determina as medidas de segurança a serem implementadas. Mas não apenas não cumprem, como também têm atacado a NR-12 com o objetivo de eliminá-la. Em artigo publicado no site Repórter Brasil, o juiz do Trabalho em Santa Catarina Alessandro da Silva e o auditor fiscal do Trabalho Vítor Araújo Filgueiras afirmam: A redação atual da NR-12 já está em vigor há quase quatro anos, e muito antes vigiam normas técnicas da ABNT e instruções normativas do MTE
que incorporavam as exigências constantes na atual NR-12. Ou seja, além de ter sido negociada com a participação do patronato por anos, a redação de 2010 da NR-12 não traz novidades ao que já era tecnicamente previsto e aplicado pelas instituições regulatórias. Depois de tantos anos de amputações e mortes, qualquer adiamento ao cumprimento da NR12, qualquer que seja o eufemismo adotado para designálo, efetivamente implicará a assinatura da permissão de acidentes, perda de entes queridos e sofrimentos de milhares de famílias dos setores mais vulneráveis da nossa sociedade”. Fica claro, portanto, como se comporta a burguesia em sua sede desenfreada de lucro. Promove a morte e mutila dezenas de milhares de seres humanos para manter suas mansões, iates e todo seu luxo. Não se importa com que famílias fiquem sem seus entes queridos e ainda usa hipocritamente o argumento de que, com o fim da regulamentação, seriam criados mais postos de trabalho. Para quê? Mais mortes e mais lucros! Fonte: reporterbrasil.org.br
especialização naquela área, que sabem administrar muito bem, que arregimentarão empregados sem as amarras do setor público (leia-se concurso público) e que despedirão, com facilidade (sem necessidade de processo administrativo prévio, com ampla defesa), os empregados ineptos ou desinteressados. Em suma, essas organizações sociais e congêneres vendem, tão somente, a terceirização, e, como demonstram os processos judiciais, na grande maioria dos casos, no bojo dessa terceirização encontra-se a corrupção. Essa realidade deve ser muito bem analisada pelo cidadão, para que seja crítico em relação ao discurso da ter-
ceirização. É urgente, portanto, que a sociedade se manifeste contra a terceirização nas atividades estatais típicas e exija maior transparência nos contratos de prestação de serviços terceirizados nas atividades-meio, exigindo-se, por exemplo, que nas páginas de transparência sejam publicadas as planilhas de custos e formação de preços dos contratos; as datas em que foram efetuados os pagamentos das faturas; os nomes e CPFs dos empregados terceirizados lotados em cada posto de trabalho, de modo a evitar-se empregados fantasmas e a utilização do nome e CPF de um mesmo empregado em vários contratos.
se. Em Guarulhos, na Grande São Paulo, o abastecimento de 1,3 milhão de moradores é atendido por um serviço municipal, o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), e seus moradores passam sem água um em cada dois dias. Em 18 municípios, cerca de 2,1 milhões de pessoas estão submetidas ao racionamento oficial no Estado de São Paulo, correspondendo a 5% da população total, segundo levantamento do jornal Folha de S.Paulo (11/ago). Além do racionamento, medidas de incentivo à economia de água têm sido adotadas, indo desde multas para reprimir o desperdício a campanhas com rifas de carro e TV para quem poupar e reduzir o consumo voluntariamente. O que chama a atenção de todos, além da dimensão
estadual da crise hídrica em São Paulo, é a insistência dos gestores em negar a existência do racionamento na área de atuação da Sabesp – mesmo contestados pelos moradores, que sofrem na prática com o rodízio provocado pela companhia, com cortes crescentes no fornecimento de água. A contrapartida do poder é a ação responsável. E o Governo paulista tem se mostrado irresponsável com o seu povo, além de incompetente e medíocre para resolver questões básicas para a sua população. É hora de assumir a gravidade da situação e dos erros cometidos, e, naturalmente, fazer as obras urgentes e necessárias para garantir o fornecimento seguro desse bem fundamental à vida. Chega de hipocrisia, chega de culpar São Pedro – que não pode se defender.
Redacão RN
6 Setembro de 2014
TRABALHADOR UNIDO
Congresso da FUP aprova luta contra precarização
C
om o tema "FUP, 21 anos de lutas: sem retrocesso, pelo Brasil e pelos trabalhadores", realizou-se, em Natal, de 14 a 17 de agosto, o 16º Confup (Congresso Nacional da Federação Única dos Petroleiros). O evento, que reuniu cerca de 400 trabalhadores da categoria, teve como finalidade a discussão da atual conjuntura política e econômica do País, das reivindicações para campanha salarial da categoria, agendas de luta – e também elegeu a nova direção colegiada da FUP para o período 2014-2017. Estiveram presentes várias delegações internacionais como as do Equador, Peru, Noruega e Palestina. Na abertura, houve um ato de solidariedade à Palestina com o companheiro petroleiro Jadallah, que trouxe uma saudação de seu povo aos trabalhadores brasileiros. Relatando os ataques sofridos e o número de pessoas atingidas com o bombardeio de Israel, ele disse: “Nós queremos a paz, a retirada dos territórios ocupados, a criação do Estado Palestino, a liberdade dos presos políticos e a solução para os refugiados. A recusa do Governo de Israel de desocupar as terras palestinas é o que determina hoje o fracasso da paz”, afirmou. Jadallah reafirmou que o povo palestino, seus agricultores e intelectuais estão seriamente comprometidos com o processo de paz. A defesa da vida e a garantia de um ambiente seguro de trabalho para todos os petroleiros deram o tom do Congresso. No sábado (16), data que marcou os 30 anos do acidente na Plataforma de Enchova, na Bacia de Campos, onde 37 trabalhadores
A Verdade
Participantes do CONFUP se solidarizaram com o povo palestino
morreram, a delegação do Sindipetro-NF realizou na plenária do Confup um ato por segurança, com participação dos delegados, observadores e convidados. Vários companheiros falaram e denunciaram a forma como a empresa está vendo a política de segurança e manutenção nas refinarias e plataformas, deixando a vida em segundo plano. O Movimento Luta de Classes (MLC) se fez presente com as delegações do Amazonas, Ceará e Pernambuco. Emanuel Menezes, diretor do Sindipetro-CE/PI, defendeu a tese do MLC, começando por uma apresentação do movimento, a análise da conjuntura internacional e nacional, em defesa de uma Petrobras 100% estatal e contra os leilões, pela Palestina livre e pelo socialismo. Também foi reforçada a luta pela unidade dos trabalhadores. Numa estreia muito boa e aplaudida pelos delegados presentes, apresentamos à categoria uma nova opção de organização para o movimento sindical petroleiro. Houve participação do MLC em grupos de discussão e realizamos plenárias de apresentação do movimento. No último dia, ocorreu a eleição da nova diretoria da FUP para o triênio 2014-2017. O coordenador do Sindipetro-NF,
José Maria Rangel, foi eleito o novo coordenador-geral, em uma chapa unitária, na qual o companheiro Emanuel Menezes entrou como suplente na diretoria, representando o MLC. Foram aprovadas várias moções. Uma delas em repúdio à agressão sionista promovida pelo Governo de Israel e em solidariedade à luta do povo palestino por um Estado livre e soberano. Outra importante resolução aprovada foi a realização de uma plenária estatuinte da FUP, em 2015, para deliberar sobre a criação das Secretarias da Mulher Petroleira e de Aposentados e Pensionistas. Em relação às lutas da categoria e às campanhas reivindicatórias, os petroleiros aprovaram ganho real de 5,5%; construção de um anteprojeto de lei para regulamentação das atividades e regime de trabalho no setor petróleo (reformulação da Lei nº 5.811, de 1972); intensificação da luta contra a precarização provocada pela terceirização, com a FUP assumindo o protagonismo nas esferas legislativa e judiciária; recomposição dos efetivos próprios do Sistema Petrobrás; garantia de condições seguras de trabalho em todo o setor petroleiro. Movimento Luta de Classes (MLC)
Governo de Minas ataca trabalhadores
Em 2003, no primeiro mandato do então governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), a Empresa Pública Minas Gerais Administração e Serviços (MGS) iniciou uma série de concursos públicos, aumentando gradativamente, ano pós ano, o número de funcionários. Aécio ainda converteu a empresa – que antes era de capital misto – para 100% pública e expandiu suas áreas de atuação, deixando, assim, de contratar servidores públicos efetivos. O fato é que os trabalhadores da MGS realizam tarefas de servidores estaduais, mas recebem um salário menor, possuem menos direitos e são regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e não pelo Estatuto do Servidor Público. O Governo do PSDB fortaleceu uma empresa que antes concentrava suas atividades no setor de asseio e conservação e agora presta serviços em todas as áreas da administração pública. Atualmente, ela possui mais de 20 mil empregados que são auxiliares administrativos em todas as secretarias do Esta-
do, garçons, vigias, mecânicos, teleatendentes, motoristas, trabalhadores em limpeza, entre outras dezenas de categorias espalhadas em mais de 800 municípios de Minas Gerais. Mesmo não sendo servidores, estes trabalhadores possuem uma série de direitos, como não serem demitidos sem processo administrativo e com direito a defesa, ter estabilidade no período eleitoral, entre outros. Mas nenhum desses direitos têm sido respeitados pelo Governo Estadual e pela diretoria da empresa. No ano passado, ou seja, um ano antes das eleições presidenciais, centenas de trabalhadores foram demitidos com a justificativa de corte de gastos, em uma média de 300 por mês, recebendo cartas em casa, informando da demissão. Enquanto isso sobra assédio moral, desvio de função e salários diferentes para o mesmo cargo. Além disso, a MGS serve como fonte de dinheiro para o PSDB de Minas Gerais, fechando negócios que são verdadeiras caixas pretas. Os dire-
tores da empresa são os únicos que não precisam de concurso para trabalhar, são indicados pelo governador, e vários deles estão “licenciados” para dirigir as campanhas eleitorais. Em pleno período eleitoral, a MGS está demitindo empregados públicos, ao passo que promove concurso para a mesma área. A contradição é clara quando, ao fechar acordos com bancos, a empresa trata os trabalhadores como empregados públicos, incentivando a pegar empréstimos facilitados, mas, quando demite, trata como trabalhador da iniciativa privada. Por isso, ao longo de um ano, os trabalhadores da MGS, realizaram 16 paralisações em 11 municípios diferentes, audiências públicas, dezenas de reuniões e assembleias e, por fim, fundaram uma Associação dos Empregados Públicos Estaduais que representarão todos mais de 20 mil trabalhadores da empresa. O desafio é fazer a empresa cumprir todas as leis trabalhistas, e deixar de ser quintal do PSDB de Minas Gerais. Redação MG
Incêndio e morte na Reman Na manhã do dia 20 de agosto, faleceu o companheiro Antonio Rafael Santana, 26 anos, vítima de uma explosão ocorrida Refinaria de Manaus (Reman). A explosão aconteceu às 22h50, quando Rafael fazia uma ronda na Estação de Tratamento de Despejo Industrial, próxima ao sistema de tocha da refinaria. Rafael teve 75% do corpo queimado e, devido ao estado grave de saúde em que se encontrava, não pôde ser transferido para o Hospital da Força Aérea, no Rio de Janeiro. O motivo da explosão foi o vazamento de gás inflamável na área proveniente do sistema de tocha. Nos últimos quatro anos, os acidentes na Reman provocaram duas mortes e cinco afastamentos. Em dezembro do ano passado, foram três companheiros queimados e, por pouco, uma companheira não perdeu a visão no sistema de soda. Na Reman os trabalha-
dores vivem em ambientes que cada vez mais inseguros devido à falta de uma gestão com compromisso na refinaria. Como consequência, ela passa por um momento precário, em que falta manutenção, treinamento para operadores, etc. Na verdade, o que está acontecendo é a lógica da produção acima de tudo, pondo as vidas em segundo plano. A cada ano, aumenta a quantidade de trabalhadores vítimas de acidentes na Petrobras. Os petroleiros não irão deixar passar em crime impune. Estamos trabalhando para mudar essa situação e vai ser somente com a unidade de todos os companheiros que iremos reverter. Marcus Ribeiro, Manaus
Teleatendentes adoecem, e empresários lucram cada vez mais No fim dos anos 1980, a profissão de telefonista mudou de perfil, aumentou enormemente e passou a ser chamada de operador de telemarketing ou teleoperador. Mais recentemente, entre 2010 a 2013, a categoria cresceu 235% conforme dados do Portal Educação (portaleducacao.com.br) e hoje já passa de 1,4 milhão de trabalhadores no Brasil, sendo que 70% são mulheres e 80%, jovens. Multinacionais, bancos e, com a privatização da telefonia, várias outros tipos de empresas passaram a contratar terceirizadas para vender seus produtos, fazer pesquisas ou cobranças e dar suporte técnico. Resultado: recordes de lucros e péssimas condições de trabalho. Com a terceirização, foi possível contratar milhares de trabalhadores que não estão ainda enquadrados numa categoria regulamentada (há um projeto em tramitação no Congresso Nacional), e, portanto, sem direitos específicos, regidos apenas pelo um anexo II da Norma Reguladora 17 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Os operadores de telemarketing exercem, na maioria das vezes, as mesmas funções de profissionais específicos, por exemplo, de um bancário, que tem piso salarial e várias conquistas trabalhistas, mas não recebem como tal e não têm os mesmos direitos, diminuindo significativamente os custos de mão de obra. Sem uma legislação que imponha e sancione as empresas, não há limites para exigências de produção, metas e condições adequadas de trabalho.
Em contrapartida, as doenças ocupacionais prevalecem no cotidiano dos trabalhadores, trazendo como consequência o elevado número de casos de Lesão por Esforço Repetitivo (LER) e Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (Dort). É comum os teleatendentes apresentarem dores nos dedos, perda de força motora, redução dos movimentos, dores nos ombros, dores nas costas, inchaços, formigamento nas mãos e pernas, inchaços dos membros inferiores, fadiga visual, perda auditiva, labirintite, acúmulo de gordura no abdômen, refluxo alimentar. Os operadores de call center executam tarefas muito repetitivas, são submetidos à forte pressão e vivem sob a constante ameaça de perder o emprego, já que a rotatividade de funcionários no setor costuma ser em larga escala. O resultado da exploração de vários trabalhadores é o alto lucro das empresas do setor. Segundo dados da Comissão de Valores Imobiliários, em 2013, a Contax registrou lucro líquido de R$ 75,3 milhões e, segundo o Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, esta mesma empresa liderou o ranking de ações trabalhistas, com 1.935 processos. Uma pesquisa feita pela E-Consulting, com 813 empresas de contact center do país, revela que o mercado brasileiro de call center movimentou R$ 40,4 bilhões em 2013, incluindo operações terceirizadas e internalizadas, o que representa um crescimento de 14,13% em relação a 2012. Camila Áurea, Recife
JUVENTUDE
7 Setembro de 2014
24º Eijaa reafirma unidade internacional da juventude Evrensel
Aos jovens do mundo Declaração final do 24º Eijaa
Jovens do mundo reunidos na Turquia
O
24º Encontro Internacional da Juventude Antifascista e Antiimperialista foi realizado entre os dias 2 e 9 de agosto em Izmir, terceira maior cidade da Turquia. Na abertura oficial, houve uma saudação de cada delegação internacional e um discurso da presidente do Partido do Trabalho da Turquia (Emep), Selma Gurkan. O evento foi organizado num grande acampamento à beira-mar, na praia de Dikili. Participaram mais de 2.200 jovens residentes na Turquia, entre turcos e curdos. Ainda estiveram presentes delegações do Equador, República Dominicana, Brasil, México, Tunísia, Índia, Paquistão, Síria, Líbano, Curdistão (nação ainda sem Estado), Inglaterra, Alemanha, França, Grécia, Dinamarca e Áustria. A questão da libertação e autodeterminação do povo curdo é muito importante para o Partido do Trabalho, e, não à toa, participaram do acampamento muitos jovens curdos. Em cada manhã, aconteceram as oficinas. Foram abordados temas como teatro, música, economia política, filosofia, artesanato, feminismo e meio ambiente. Muitas dessas oficinas produziram material próprio, que foi exposto nos últimos dias do encontro. No turno da tarde, realizaram-se os painéis. A tradução foi feita simultaneamente para o inglês e o turco. Os temas foram “A juventude no trabalho”, “A resistência dos povos e da juventude”, “A história do conflito entre a religião e a ciência”, “Movimento estudantil secundarista”, “Movimento estudantil universitário”, “Vinte anos de solidariedade da Conferência Internacional de Partidos e Organizações Marxista-Leninistas” e “Aprovação da declaração final”. As noites ficaram a cargo dos grupos musicais, que promoveram verdadeiros concertos artísticos de grande qualidade. A delegação latino-americana se envolveu na construção de uma noite cultural, cantando músicas e dançando, a exemplo da canção El pueblo unido jamás será vencido, da banda Quilapayún,
e de uma ciranda pernambucana. Em cada debate e painel a juventude turca gritava palavras de ordem e demonstrava muita combatividade depois de cada intervenção. Nas filas para as refeições dançavam e cantavam músicas típicas. As marchas de junho no Brasil foram alvo de muita curiosidade no encontro. Também a resistência do Parque Gezi por parte da juventude turca e o levante popular na Tunísia foram temas marcantes. No painel sobre os “Vinte anos de solidariedade internacional da CIPOML” os companheiros do Brasil ressaltaram a importância de acumular forças pelo fortalecimento da luta anti-imperialista e revolucionária, e a necessidade de uma maior organicidade do Comitê Preparatório Internacional do Eijaa. Paralelamente à programação oficial, foram realizadas várias reuniões bilaterais entre os países, além de rodas de debate. Especialmente com a delegação latino-americana ocorreram duas rodas de debate com estudantes turcos e duas reuniões com o Partido do Trabalho da Turquia. O Eijaa serviu para aumentar a certeza do caminho que trilhamos, porque praticamente em todos os países as reivindicações da juventude são as mesmas. Com muita combatividade e energia, a juventude se levanta e se organiza em todo o mundo. Viva a luta antifascista e anti-imperialista! Viva a autodeterminação dos povos! Viva o socialismo! Bruno Abreu de Melo, militante da UJR
Estudantes barram aumento das passagens em Petrolina A União dos Estudantes Secundaristas de Petrolina (Uesp) e a União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco (Uespe), junto com os estudantes, conseguiram impedir, no dia 18 de agosto, um grande aumento da tarifa de ônibus nessa cidade do Sertão pernambucano. A proposta dos empresários, apresentada por seu sindicato, o Setranvasf, era de R$ 2,84. A ta-
rifa atual é de R$ 2,35 – a mais alta do Estado. Para Rubem Severino, diretor da Uespe, “o aumento de passagem proposto era abusivo e representava uma afronta aos estudantes e ao povo petrolinense”. O aumento foi rejeitado graças à luta travada pelos estudantes em toda a cidade. Evandro José, militante da UJR
Somos jovens lutando por nosso futuro em todo o mundo; na Ásia, Europa, América Latina, Oriente Médio e África. Somos 2.200 trabalhadores, do ensino médio e estudantes universitários de 16 países diferentes que se reuniram em Dikili, Turquia, no 24º Encontro Internacional da Juventude Antifascista e Anti-imperialista (Eijaa), que é parte desta luta. Ao longo de nove dias, compartilhamos nossas experiências organizacionais e as lutas que realizamos em nossos países. Mais uma vez, vimos que, apesar de vivermos em diferentes países, nossos problemas e exigências são comuns na maioria dos aspectos. Isso mostra que temos de reforçar a luta comum e a solidariedade internacional. O desemprego, a privatização da educação, a pobreza crescente e a exploração, a destruição da natureza e do meio ambiente, as políticas e os massacres das guerras imperialistas escurecem o nosso mundo e o futuro. Especialmente no Oriente Médio, mas também em todo o mundo, os Estados imperialistas e seus colaboradores estão provocando políticas racistas, sectárias e discriminatórias. Por causa dessas políticas, dezenas de milhares de jovens perdem a vida. O que está acontecendo na Ucrânia mostra o lado real da democracia europeia, que havia sido declarada como a esperança da juventude mundial. Na América Latina, as políticas dos governos que foram eleitos sob a bandeira da democracia não atendem às demandas e desejos da juventude. Hoje, esses governos trabalham em conjunto com as potências imperialistas. É impossível que esta situação mude em um mundo dominado pelos imperialistas, FMI, Banco Mundial e seus colaboradores. Especialmente no Brasil, na Tunísia, no Egito e na Turquia jovens participaram na resistência dos povos, demonstrando que eles não querem viver em um mundo
como este. Essas resistências mostram que entramos num novo período de luta da juventude. As mulheres jovens tomaram seus lugares na vanguarda das lutas e isso não é uma coincidência. As mulheres são a camada da sociedade que mais sofre com as guerras, a exploração e a opressão. E sua força é a segurança da luta. Estamos na vanguarda das lutas em nossos países. Nosso 24º encontro internacional tem contribuído para essa luta. Contra aqueles que provocam divisões entre raça, religião, castas e linguagem; nosso acampamento tem sido um exemplo capaz de mostrar que é possível viver em um mundo de paz, fraternidade, democracia, igualdade e liberdade. Nosso acampamento apoia a resistência dos povos e sua juventude, especialmente na Palestina. Centenas de jovens palestinos foram mortos como resultado do ataque, principalmente pelos imperialistas e sionistas de Israel. Nosso acampamento condenou esse massacre com um anúncio público e apoiou os curdos de Rojava que estão se organizando em conjunto com povos de diferentes nacionalidades em sua luta pelo direito à autodeterminação. Estamos solidários com todos os jovens a lutar contra as políticas racistas e fascistas. Estamos ao lado de todos os presos políticos jovens presos nesta luta, em todo o mundo, especialmente na América Latina e no Oriente Médio, e exigimos a sua libertação. Lutamos pela democracia, paz, igualdade e liberdade. Nós queremos salvar o nosso futuro. Convidamos todos os jovens a aprofundar a luta e defender o nosso futuro juntos. Saudamos os nossos amigos de diferentes países com o nosso desejo e a crença de um mundo sem classes, livre da exploração. Vamos aumentar a luta e a unidade antifascista e antiimperia-sta dos jovens do mundo! Viva a solidariedade internacional da juventude! Turquia, 9 de agosto de 2014
Aesc realiza congresso No dia 19 de agosto foi realizado o 6º Congresso da Associação dos Estudantes Secundaristas do Carpina (Aesc), completando 18 anos de muita luta em defesa de um país democrático e por uma educação de qualidade. O Congresso foi realizado com grande entusiasmo, contando com a presença de mais de 150 estudantes de sete escolas das redes municipal e estadual. Na mesa de abertura estavam presentes a secretária de Juventude, Emanuela Lapa, a secretária de Educação, Mônica Guerra, e o secretário adjunto de Assistência Social, Eliton Lopes, além de João Paulo, diretor de grêmios da Fenet, Natália Freitas (representado o Movimen-
to Olga Benário), Manoel Pedro (representando o Movimento Luta de Classes (MLC), Cledimilson Júnior, da Uespe, Juana Tayná, do Grêmio da Etemerb e, conduzindo todo o processo de diálogo, Angelo Muccio, presidente da Aesc. Durante o Congresso foram organizados grupos de debate com os seguintes temas: o papel do movimento estudantil e o grêmio; a escola que queremos; e a importância da atuação das mulheres no movimento estudantil. Ao final, foram aprovadas as propostas apresentadas pelos grupos e foi eleita a nova diretoria da Aesc, tendo à frente o estudante Angelo Muccio, presidente. Redação Carpina
8 Setembro de 2014
LUTA POPULAR 4º Congresso do MLB
Unidade popular pela reforma urbana
E
ntre os dias 22 e 24 de agosto, aconteceu, na Universidade Federal do ABC (UFABC), em São Bernardo do CampoSP, o 4º Congresso Nacional do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB). Durante três dias, delegados de 11 estados do país discutiram as propostas do MLB para a reforma urbana, os desafios da luta pelo direito à moradia digna e celebraram os 15 anos do movimento. “Estar neste congresso e poder celebrar junto com companheiros do Brasil inteiro a luta do MLB é um motivo de grande alegria pra mim e pra todos que estão aqui. Tenho certeza que os próximos anos serão ainda melhores”, disse Jhenifer Raul, militante do MLB na favela de Acari, no Rio de Janeiro. Na tarde do dia 22, os cerca de 350 delegados presentes estudaram e debateram o documento “As propostas do MLB para a Reforma Urbana”, onde estão expostas as principais ideias defendidas pelo movimento para a realização de uma profunda reforma urbana no Brasil. Depois dessa leitura, foi realizada a abertura oficial do congresso, que contou com a presença de diversas entidades do movimento popular, como a Central de Movimentos Populares (CMP), o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MST), a Pastoral Operária, o Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU) e a Unidade Popular pelo Socialismo (UP). Também participaram da abertura a Prefeitura de São Bernardo do Campo, a Caixa Econômi-
Pedro Gutman
ca Federal e o Ministério das Cidades. Lutar e ocupar Em sua saudação, Marcelo Buzetto, da coordenação nacional do MST, lembrou o exemplo de luta e resistência do povo palestino e afirmou que a união dos trabalhadores do campo e da cidade é muito importante: “quando o MST derruba uma cerca no campo é a mesma coisa de uma ocupação do MLB em um latifúndio urbano”, disse. Já Wanderson Pinheiro, da UP, empolgou o plenário ao defender que “o MLB é o germe da construção do poder popular, concretizado nas ocupações e na luta de cada dia”. O segundo dia do congresso começou com um importante debate sobre os desafios da luta pela reforma urbana no Brasil, do qual participaram Leonardo Péricles (MLB), Wanderson Pinheiro (UP), Josué Rocha (MTST) e Marcelo Edmundo (FNRU). Vários companheiros e companheiras se inscreveram para defender as propostas do movimento, falar de sua relação com o MLB e reafirmar a luta e a unidade do povo pobre como caminho para se derrotar a especulação imobiliária e conquistar a reforma urbana. “Para avançar na luta pelo direito à cidade e por uma sociedade mais justa e democrática é preciso unir todos os movimentos urbanos combativos numa grande unidade popular pela reforma urbana”, defendeu Leonardo Péricles durante o debate. Na parte da tarde, após a animada apresentação do grupo de percussão de mulheres
“Batuque Abayomi”, os participantes do congresso se dividiram em grupos para discutir o programa Minha Casa, Minha Vida, a criminalização dos movimentos populares, as experiências em educação popular e alfabetização nas ocupações do MLB, os desafios da luta por uma saúde pública de qualidade, o trabalho comunitário nos bairros pobres e favelas, o papel da mulher na luta pela reforma urbana e a questão da luta contra o racismo. Após os debates, foram elaboradas propostas e planos de luta a serem defendidos pelo movimento. Chamou a atenção nos grupos a grande participação dos delegados nos debates, resultado do esforço feito nos últimos meses para avançar na formação política da base do movimento e que deve prosseguir. Nova Coordenação é eleita O último dia teve início com um debate sobre as experiências do MLB na luta por moradia e na organização de ocupações. Nesse debate participaram companheiros do Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Ceará e Pernambuco, que expuseram os métodos e estratégias de luta construídas pelo MLB ao longo de 15 anos e convocaram os presentes a realizar uma grande jornada nacional de ocupações em defesa do direito humano de morar dignamente. Em seguida, foi eleita a nova Coordenação Nacional do MLB, que terá a importante tarefa de consolidar o crescimento do movimento e levar o MLB para mais cidades e estados do país, além de orga-
Delegados participaram dos debates e elegeram a nova Coordenação
nizar centenas de ocupações em defesa do direito à moradia digna para o povo pobre. Em seu discurso de encerramento, Wellington Bernardo, representando a Coordenação, disse que “o 4º Congresso Nacional do MLB é um marco na história da luta do povo pobre no Brasil. Aqui reafirmamos nosso compromisso com a luta pela reforma urbana e pelo socialismo e renovamos nossas energias para as grandes batalhas que se aproximam. Cada compa-
nheiro e companheira aqui presente tem a responsabilidade de levar a nossa palavra a cada família sem-teto deste país, a fim de fazer um grande movimento em defesa do direito humano de morar dignamente”. Nos próximos meses, novas ocupações do MLB acontecerão para pressionar a realização da reforma urbana que queremos e que o povo brasileiro tanto precisa. Thainá Siuda e Redação
O descaso com as comunidades pobres em Porto Alegre Assim como outras cidades brasileiras, Porto Alegre apresenta-se como um cenário de forte segregação social, marcada pela desigualdade econômica. Este panorama pode ser percebido, tanto nos centros urbanos como nas periferias, quando vemos diversas comunidades em condições precárias e quase sempre em locais sem regularização fundiária. Assim, a disputa pelo solo urbano é desigual. Nos últimos anos, e principalmente devido às obras da Copa, muitas comunidades pobres brasileiras que residiam no centro foram removidas para as periferias. Esta matéria traz o caso da Vila Chocolatão, uma comunidade pobre que se formou no centro administrativo de Porto Alegre em meados dos anos 1980 e que tinha, entre seus fundadores, um fator em comum: a falta de moradia. Durante os 25 anos em que esteve no centro de Porto Alegre, a Vila Chocolatão refletiu o descaso do poder público em assegurar condições habitacionais e sanitárias à população pobre. Na Vila faltava encanamento de esgoto e de água. A luz era garantida por “gatos”, que tiveram como consequência vários incêndios. Porém ao invés de a Prefeitura de Porto Alegre fornecer o direito dos
habitantes da Vila Chocolatão de ter uma moradia digna, com luz, água e esgoto, optou por removê-la do centro da cidade para que os ricos e os turistas não vissem o desdém que a Prefeitura tem com as comunidades pobres da capital. Muitos moradores não queriam sair do centro, pois lá tinham sua fonte de renda. Eram catadores de resíduos, recicladores, e encontravam muito material reciclável na área, que, inclusive, possui oito galpões de reciclagem. Mas após 11 anos de processo judicial, ocorreu o despejo da comunidade, em maio de 2011. Além da indignação dos moradores, órgãos como a Associação de Geógrafos de Porto Alegre e o Serviço de Assessoria Jurídica da UFRGS escreveram relatórios para a Prefeitura demonstrando como o despejo seria um retrocesso social para aquelas famílias, que minimamente tinham acesso aos bons hospitais e escolas do centro da cidade e ao trabalho. A transferência da Vila Chocolatão foi feita para um bairro periférico, distante do centro, o bairro Mário Quintana. Chegando lá, as famílias encontraram muitos problemas: disputa de território pelo tráfico de drogas, falta de vagas nas escolas, falta de médicos nos postos de saúde, altos preços
cobrados pela luz, cobrança indevida das casas, entre outros. Além disso, foram construídas 181 casas, para 225 famílias. Essas casas, em 2014, depois de três anos de remoção, já apresentam rachaduras, goteiras, problemas de fiação e de esgoto, demonstrando, mais uma vez, a falta de planejamento e a indiferença da Prefeitura com as comunidades pobres da cidade. A prática de remover comunidades pobres para a periferia revela as contradições do sistema capitalista, em que as “políticas públicas” são voltadas à valorização do capital, do dinheiro, esquecendo-se da importância da vida humana, da organização de quem constrói suas moradias e faz parte de uma comunidade. Assim, a cidade dá-se como mercadoria a ser comprada e vendida, e a própria moradia torna-se também uma mercadoria, quando é, na verdade, um direito. Desigualdade Materializam-se na cidade as relações da sociedade, vistas pela divisão de bairros pobres e ricos em Porto Alegre. Nos bairros ricos tem tudo: hospital, clínica, farmácia, creche, escola boa, várias linhas de ônibus. Nos bairros pobres, o posto não abre
todos os dias, e, à noite, nunca estão abertos. Faltam vagas nas escolas, o ônibus passa de hora em hora e, se chove muito, a água inunda a rua e a casa. Diante deste cenário, questionamos: Até quando os governantes acham que o povo vai se conformar com esta desigualdade? Com a falta de moradia? Com o descaso com quem mais necessita? A mudança deste cenário virá com uma profunda reforma nas cidades brasileiras, uma reforma urbana, para que todos tenham acesso aos serviços que a cidade oferece, independentemente de sua classe econômica. O povo precisa se organizar e lutar por seus direitos e por moradias dignas! Esta luta pode ser feita através de movimentos populares (como o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas – MLB), por associações e cooperativas de bairros, por pessoas dispostas a combater as injustiças impostas pelo sistema capitalista! Só através da luta relembraremos a Prefeitura de Porto Alegre – assim como o Estado e o Governo Federal – de que moradia digna é um direito, não uma mercadoria! Nanashara Sanches, mestranda em Geografia na UFRGS e membro da Coordenação Nacional do MLB
INTERNACIONAL
9 Setembro de 2014
Epidemia do vírus ebola mostra lado desumano do capitalismo Ludmila Outtes, Recife
A
crescente epidemia do vírus ebola no continente africano, mais do que demonstrar a fragilidade do sistema de saúde mundial, reforça as diferenças de classe existentes no mundo. Basta responder a uma simples questão: por que o vírus que causa a febre hemorrágica ebola, conhecido desde 1976 pelos cientistas, ainda permanece matando milhares de pessoas, em surtos recorrentes na África? O vírus foi descoberto em 27 de junho de 1976, durante a primeira epidemia da doença, com dois focos simultâneos: um em Nzara, no Sudão, e outro no norte do Congo. Com uma mortalidade de 90%, o vírus também contamina e mata macacos, principal suspeito de ser o transmissor para os humanos, através do consumo de sua carne pela população da região. Na primeira epidemia, foram registrados 284 casos, com uma mortalidade de 50%. Em todos esses anos, o ebola já fez mais de 3.000 vítimas (incluindo os números atuais) em 15 surtos epidêmicos, sempre restritos ao continente africano. O último surto havia acontecido em 2012, na República Democrática do Congo e em Uganda. O mais novo surto, em curso, teria sido notificado à Organização Mundial de Saúde (OMS) no início no mês de março, a partir da Guiné. Acredita-se que o caso fonte (primeiro caso da epidemia, ou caso zero) tenha sido o de um menino de dois anos, morador de um vilarejo, cuja morte foi registra-
da no dia 6 de dezembro de 2013. Os dados mais recentes dão conta de mais de 1.200 pessoas mortas (sendo a maior epidemia já registrada) e outros milhares de pessoas contaminadas, incluindo um médico americano, Kent Brantly, que prestava assistência voluntária aos doentes, e uma missionária inglesa, Nancy Writebol. Estes últimos receberam assistência em seus países, tendo feito uso de uma medicação experimental, ZMapp, evoluindo com melhora do quadro e remissão da doença. No mesmo período, foi realizado um abaixo-assinado para que dois missionários africanos fossem transportados à Inglaterra para receberem a mesma droga experimental. A solicitação, porém, foi negada pelo Governo inglês, e um dos missionários, uma freira do Congo, veio a falecer alguns dias depois. Pesquisadores americanos têm tentado desenvolver vacinas contra o ebola, mas carecem de financiamento das indústrias farmacêuticas. Segundo Peter Walsh, cientista que desenvolveu uma vacina testada em macacos, apesar de haver a certeza da eficácia também em humanos, as pesquisas só não avançaram porque os testes são caros e não há quem os financie. “As indústrias farmacêuticas não vão querer financiar um medicamento para os africanos, pois é um público que não dá lucro”, afirmou em entrevista ao site DW (www.dw.de). Na prática, significa que as pessoas estão morrendo por
não terem dinheiro para gerar lucros à indústria de medicamentos. “O Governo dos EUA pagará pela pesquisa de vacinas, especialmente naquelas contra ameaças terroristas – e o ebola é uma ameaça de bioterrorismo”, afirmou Walsh. Enquanto isso, os governos africanos montaram uma enorme força-tarefa para garantir a quarentena em regiões onde o vírus foi registrado. A tentativa de conter a transmissão do vírus é mais preocupante do que o tratamento das vítimas. Uma reportagem recente veiculada nas emissoras de televisão mostrou pessoas que vivem nessas áreas em quarentena sem assistência médica e sem possibilidade de buscar auxílio em outro lugar. Os policiais e soldados
de prontidão utilizam armas e bombas de efeito moral para conter o fluxo dos moradores para outras regiões, mesmo os que não apresentam sintomas da doença. Em resumo: os governos farão de tudo para evitar a transmissão da doença aos países desenvolvidos, mesmo que isso custe o extermínio da população africana, e não gastará um centavo para financiar medicamentos para tratar os doentes, a menos que a epidemia atinja a população da Europa e dos EUA. Mais uma vez, a população pobre e marginalizada sofre com a ganância e a falta de compaixão capitalista. (Ludmila Outtes é especialista em Saúde Coletiva) ATS
Indústria farmacêutica impede vacina contra o ebola
Trabalhamos para que as ideias revolucionárias abram caminho Em meio a um grande alegria e entusiasmo, encerrou-se a 18ª edição do Seminário Problemas da Revolução na América Latina, em Quito, capital do Equador. O evento contou com a participação de 28 organizações, de 15 países. Representaram o Brasil a companheira Indira Xavier e os companheiros Thiago Santos e Gregório Gould. A seguir, a declaração final do Seminário. que se estendem à Espanha, Grécia, PorCom um ar de aparente tranquilitugal, Itália, Alemanha... enfim, praticadade e otimismo, os analistas econômimente a todo o Velho Continente. Nesse cos da burguesia internacional anunciaexercício de luta de massas, as organizaram ao mundo que a crise econômica ções revolucionárias redobram esforços que eclodiu em 2008 havia chegado ao para dar rumo correto a esses combates, fim e se vislumbrava um período de redisputando com forças de direita e oporcuperação do capitalismo. Efetivamentunistas que veem nessas circunstâncias te, manifestações de pequena recuperaa oportunidade de dar soluções políticas ção se evidenciam em alguns países coà crise sem afetar o marco da instituciomo Estados Unidos e Alemanha, mas, nalidade burguesa. ao mesmo tempo, outras economias soFrente aos selvagens mecanismos frem recaídas. Em todos esses anos. o e níveis de exploração capitalista na centro da crise tem sido lançado de uma Ásia e na África, a resposta dos trabaregião a outra e seus efeitos econômicos lhadores é a greve. Dezenas de milhares ainda estão presentes em todo o mundo, de operários e operárias, de mineiros, acompanhado do aprofundamento de trabalhadores agrícolas paralisam seu conflitos econômicos e sociais. trabalho em empresas que, em sua maioO mundo é cenário de uma aguda ria, são subsidiárias de transnacionais confrontação político-social entre poimperialistas. vos e classes dominantes, entre países O continente americano, que a hisdependentes e Estados capitalistas, e entória em um momento lhe solicitou altre potências imperialistas entre si, que çar-se em armas para derrotar a dominadisputam ferozmente o controle de zoção colonial, também é cenário de pronas de influência, mercados, recursos testos populares, agudas confrontações naturais dos países dependentes, etc. políticas, disputas imperialistas. Assim se explicam os conflitos políticoO ciclo dos denominados govermilitares que se produzem em vários nos progressistas apresenta graves propontos do planeta como Ucrânia, Síria blemas. A obra pública e social que pudeou o Oriente Médio. ram desenvolver nos anos anteriores, Neste agitado mundo, os trabalhagraças aos inusitados ingressos econôdores, a juventude, os povos em geral micos pela venda de suas matériasabrem caminho com suas lutas, buscanprimas no mercado internacional, agora do afirmar o protagonismo histórico tem dificuldades em dar continuidade: que lhes corresponde. os problemas econômicos provocam esA arremetida do capital para destragos. carregar a crise sobre as costas dos traEm sua busca de recursos têm optabalhadores se choca com a resposta combativa dos povos na Europa. Do outro la- do pelo que tradicionalmente aplica à burguesia no poder: curvar-se ante o cado do oceano, os povos latinopital financeiro internacional e meter a americanos têm observado com alegria mão no bolso dos trabalhadores. e otimismo as greves gerais, as mobiliCapitais chineses, russos, canazações de rua, as jornadas combativas
denses, norte-americanos fluem a esta região para empreender projetos minerais, petroleiros, energéticos... ou por meio de empréstimos que, em um e outro caso, afirmam uma dependência econômica já existente. Vários desses governos “progressistas” em nome de uma suposta atitude antiestadunidense, na realidade, levam adiante uma renegociação da dependência, de maneira particular com a China. Em muitos aspectos do exercício econômico e político não existe grande diferença entre os governos “progressistas” e os abertamente de direita. Em ambos se aplicam políticas e leis para restringir e até eliminar direitos dos trabalhadores e dos povos; com diferentes denominações – porém com idênticos propósitos – aprovam-se leis “antiterroristas” que buscam impedir a luta popular através da sua criminalização; coincidem no impulso de projetos extrativistas e agroenergéticos que saqueiam nossas riquezas e provocam funestas e irreversíveis consequências na natureza. Todavia, existem mais exemplos da aplicação de políticas antipopulares e antinacionais e, por isso, o descontentamento e a luta dos trabalhadores, da juventude e dos povos cresce... e a repressão também. Na América, como em outras partes do planeta, o reacionarismo do Estado é um fato que, não obstante, confronta a luta dos povos nas mais diversas formas. Diante dessa realidade, e tendo em conta que a razão de ser das forças revolucionárias é organizar o protagonismo das massas na revolução, nós participantes deste Seminário Internacional nos comprometemos com a luta pela defesa dos interesses imediatos e estratégicos dos trabalhadores e dos povos, e à defesa da nossa soberania nacional sob a marca da independência de classe. Nos afirmamos no princípio da unidade dos trabalhadores e dos povos como base fundamental para derrotar os
inimigos comuns destes, unidade antiimperialista para levar nossa luta a um porto seguro. Trabalhamos para que as ideias revolucionárias abram caminho e se afirmem na consciência dos povos; para isso, é fundamental confrontar e derrotar as classes dominantes e o imperialismo no terreno ideológico. Não basta combater as posições abertamente reacionárias e de direita; é fundamental desmascarar as teses e as posições pseudoesquerdistas e oportunistas que atuam no movimento popular para passar por funcionais os projetos pró-capitalistas em nome de supostas revoluções do século XXI. As lutas dos trabalhadores e dos povos que se desenvolvem em qualquer parte do planeta, sentimos como nossas; por isso nos solidarizamos com todas elas. De maneira particular, levantamos nossa voz e nosso punho de indignação frente ao genocídio impulsionado pelo Estado sionista de Israel com o apoio ianque contra o povo palestino: nossa solidariedade com a heróica luta do povo palestino para recuperar o seu território e com o seu direito à autodeterminação. Nossa voz de alento ao povo venezuelano, que luta por defender as conquistas democráticas obtidas nesses anos, e condenamos a ação intervencionista e desestabilizadora do imperialismo norteamericano e da burguesia desse país. Nos solidarizamos com o povo da Ucrânia, vítima das ambições de grupos corruptos e reacionários internos e das disputas entre potências estrangeiras. Exigimos a liberdade dos lutadores populares, dos presos políticos e prisioneiros políticos de guerra e de todas as vítimas da repressão processadas por suas convicções em diferentes partes do planeta. Nosso objetivo é a revolução social e nacional, a libertação de toda a humanidade do jugo do capital: nesse propósito empenhamos nossos melhores esforços. Quito, Equador
10
MULHER
Setembro de 2014
Gravidez na adolescência, um problema social
N
o Brasil, a cada ano, cerca de 20% das crianças que nascem são filhas de adolescentes. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 1,1 milhão de adolescentes engravidam por ano, e meninas de 10 a 20 anos respondem por 25% dos partos feitos no país. Esses números só confirmam que a gravidez na adolescência é um problema social grave. Com poucas informações e uma vida sexual ativa cada vez mais precoce, muitas adolescentes estão
Jovens grávidas reivindicam melhoria na saúde
engravidando numa fase da vida em que se encontram despreparadas para assumir as responsabilidades de ser mãe com todas suas implicações que a maternidade provocam. Ao se tornarem mães, estas adolescentes acabam deixando de lado uma importante fase de suas vidas; algumas abandonam os estudos, outras buscam o aborto clandestino, colocando em risco sua existência, outras fogem de casa por rejeição de sua família, enfim, a gravidez na adolescência, em geral, é causa de muito sofriArquivo mento, em especial para as adolescentes. No nosso país o povo vive à mingua, sem apoio do Estado, e a juventude é uma das parcelas que mais sofre, em especial os adolescentes das classes desfavorecidas da sociedade, que enfrentam com mais intensidade o preconceito, o machismo, a
O Sete de Setembro e a liberdade no Brasil Há mais de 500 anos as terras do Brasil são vítimas de enorme espoliação. Após a chegada dos europeus, o país serve para enriquecer os maiores impérios do mundo. O suor dos trabalhadores se transforma em lucro para multimilionários da França, da Itália, da Inglaterra e principalmente dos EUA. Ainda assim, as Forças Armadas insistem em comemorar a dita independência do Brasil. O Sete de Setembro de 1822 propagado pela imprensa dos ricos, na verdade, é uma farsa, pois, a título de independência política e econômica pouca coisa mudou. Do fim da primeira metade do século XVI até o fim do século XVII, o Brasil foi palco da maior exploração de açúcar do mundo. Com a exploração da mão de obra escrava, Portugal arrancou das terras brasileiras enormes riquezas por pouco mais de um século, fruto da empresa agrícola instalada no Brasil que tinha apoio fundamental nas refinarias holandesas. Em virtude das disputas territoriais entre Portugal e Espanha e da saída dos holandeses do esquema comercial feito com o açúcar luso-americano, o Estado português sofreu uma profunda debilidade econômica, política e militar – é aí que o ouro brasileiro e a Inglaterra vêm tirar a Coroa lusitana do fundo do poço. Mas o preço foi muito alto. Em troca da sobrevivência da economia portuguesa, o ouro brasileiro foi todo para o bolso dos ingleses, fruto de um tratado conhecido como Tratado de Methuen. “Segundo as fontes britânicas, a entrada de ouro brasileiro alcançava 50 mil libras por semana em alguns períodos. Sem esta tremenda acumulação de reservas metálicas, a Inglaterra não teria podido enfrentar, posteriormente, Napoleão”. (Eduardo Galeano, As veias abertas da América Latina). Em 1807, tendo o conquistador francês Napoleão Bonaparte invadido Portugal, a família real por-
tuguesa se muda para o Brasil sob a proteção da Inglaterra, transferindo para a colônia os poderes de decisão sobre o comércio e a economia. É assim que, em 1810, são assinados tratados que entregavam o comércio brasileiro aos ingleses. O capitalismo inglês passa a gozar de privilégios comerciais e taxas alfandegárias no Brasil até 1842, o que prova que, mesmo após a dita independência, em 1822, a economia do País continuou subordinada ao estrangeiro. A própria Inglaterra só reconhece a “independência” do Brasil mediante a renovação dos tratados de 1810. Após o fim do tratado com os ingleses, nosso país passa a ter relações com os EUA (em virtude do fortalecimento da produção do café). Até hoje, os EUA atuam como um verdadeiro colonizador. Das 500 maiores empresas estadunidenses, 405 estão presentes no Brasil. A verdade é que a falsa visão de independência expressa nas comemorações do Sete de Setembro visam a esconder que ainda hoje a nação brasileira sofre imensa espoliação. Entre 2002 e 2012, foram remetidos ao exterior, em forma de lucro e dividendos, mais de US$ 240 bilhões; só em 2012, foram US$ 27 bilhões! O objetivo dos festejos do dia 7 de setembro não é senão uma tentativa dos opressores de inculcar nas pessoas uma sensação de liberdade, quando, na verdade, estamos sendo explorados. Compreender a história da pilhagem que sofreu e sofre o povo brasileiro é fundamental para todas as pessoas, para identificarmos no imperialismo a causa dos males mais cotidianos que sofremos. Mais do que isso, devemos apontar a solidariedade entre os povos e o governo revolucionário dos trabalhadores como contraponto às guerras de rapina e ao controle a que as potências imperialistas submetem os países pobres do mundo. Daniel Victor Ferreira, Recife
ditadura da beleza e as cobranças de submissão a modelos e padrões preconcebidos, além de todas as injustiças sociais. A falta de políticas públicas, aliada à exposição exagerada do sexo na mídia, fazem com que essa maioria dos jovens tenha o sexo como única alternativa de lazer, esporte, divertimento e prazer. Os resultados então são catastróficos em especial para as meninas. Tendo em conta essa realidade, e procurando assumir o papel de conscientização da necessidade da luta para as mulheres, que, desde muito novas, sentem as consequências dessa sociedade opressora, desigual e machista, o Movimento de Mulheres Olga Benário de Pernambuco, vem, juntamente com a União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco (Uespe), organizando debates sobre essa temática nas escolas públicas na Região Metropolitana do Recife. A experiência tem sido muito rica e os debates intensos, já que es-
sa realidade é tão presente na vida de todos. A Escola Pública, enquanto instituição, com todas suas deficiências e carências, não tem condições de responder nem dar suporte às suas alunas grávidas, tão pouco os postos de saúde. E a gravidez não pode ser visto como um questão individual pois na verdade já se tornou-se um problema social. O debate deixa a nu o Estado capitalista que não investe em sua população, não apoia sua juventude, não dá guarida aos desamparados, que só tem que contar com sua organização para cobrar, das autoridades constituídas seus direitos constitucionais e sua luta para mudar sua realidade, pondo no lugar deste Estado capitalista que tanto maltrata as mulheres e o nosso povo, um Estado que se baseie nas reais necessidades do povo pobre e trabalhador, que sustenta uma minoria rica e deixa ao relento a grande maioria de sua população. Alais Santos e Guita Marli – Coordenadoras do Movimento de Mulheres Olga Benário
Comunidade Universitária enfrenta tropa de choque em Curitiba Fasubra
“Bala de borracha, gás de pimenta, gás lacrimogênio, bombas de efeito moral, seguranças terceirizados da UFPR, Polícia Militar, pelotão de choque da Polícia Federal e da Rone (Rondas Ostensivas de Natureza Especial) e um celular. Foram esses os artifícios que o reitor Zaki Akel Sobrinho utilizou pa- Trabalhadores e estudantes da UFPR protestam contra Ebserh ra dar um golpe e aprovar a 31 dos 63 conselheiros, não sendo conEbserh no Conselho Universitário”. sultados, ou permitidos de entrar no É assim que o Sindicato dos Trabaprédio, a maioria dos que são contra a lhadores em Educação do Terceiro Ebserh. Grau Público do Paraná (SindO HC é o maior hospital público test/PR) descreve, em seu site, o apado Paraná e atende, anualmente, mais rato repressivo mobilizado pela de um milhão de pessoas. Atualmente, Reitoria da Universidade Federal do conforme a UFPR, a unidade possui Paraná, no último dia 28 de agosto, um déficit de 600 funcionários. Devipara garantir a privatização da gestão do a decisões judiciais, a universidade de seus hospitais-escolas. só pode realizar novas contratações se Enquanto do lado de fora da reu- fizer concursos públicos. nião do Conselho Universitário, órEste combate campal foi mais gão máximo de decisão da UFPR, uma batalha da campanha de resistênocorria essa verdadeira batalha camcia da comunidade universitária, lidepal contra os manifestantes que exirada pela base da Federação de Sindigiam a convocação de um plebiscito catos de Trabalhadores Técnicodemocrático, do lado de dentro, o Administrativos em Instituições de reitor da UFPR, desesperado, utiliEnsino Superior Público do Brasil zava todo tipo de manobra para (Fasubra), pelo movimento estudantil “aprovar” a entrega da gestão do Hos- combativo e pelo movimento docente, pital das Clínicas de Curitiba e da Ma- contra a implantação da Ebserh. ternidade Victor Ferreira do Amaral A Lei 12.550/2011 prevê que à Ebserh, empresa estatal de direito cada universidade tem “autonomia” privado autorizada pela Lei para decidir se vai aderir ou não à ges12.550/2011 no primeiro ano do tão da empresa em seus hospitais. No Governo Dilma para precarizar as reentanto, o Ministério da Educação lações de trabalho e abrir as portas pa- pressiona os reitores para efetivarem a ra a privatização dos hospitais uniadesão de qualquer jeito, sob o risco de versitários federais (HUFs). fechar serviços por falta de pessoal, já que o Governo se recusa a repor o quaA sessão do Conselho acontedro de servidores técnico administraticeu sem quórum. Inicialmente, o vos das universidades que atua nos hosreitor tentou votar a adesão por videpitais universitários, extremamente deoconferência, diante da ausência da ficitário devido à décadas sem concurmaioria dos conselheiros. Como não so público. conseguiu, devido à queda de energia A assessoria jurídica do Sindielétrica no campus universitário, pastest/PR vai entrar na justiça para tentar sou a tomar o “voto” dos conselheianular a sessão do Conselho Universiros por telefone. Ainda assim, a aprotário pelas diversas irregularidades revação da adesão à empresa se deu gistradas. sem o “voto” da maioria dos conseClodoaldo Gomes, Coordenação lheiros, pois, mesmo valendo-se desNacional do MLC se expediente, obteve o “aceite” de
ECONOMIA
11 Setembro de 2014
A economia política e o marxismo hoje Jorge Batista, São Paulo mais recente livro do economista francês Tomas Piketty, O capital no século XXI, que será lançado no Brasil em novembro, foi objeto de polêmica entre os principais especialistas em economia em muitos países. Formado em matemática e economia, Piketty é diretor da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris, prestou assessoria nas campanhas do Partido Socialista Francês – hoje na presidência da França – e teve seu livro atacado de forma veemente por porta-vozes da extrema direita estadunidense e europeia, enquanto o economista Paul Krugman, ganhador do prêmio Nobel em 2008, defendeu-o. O livro de Piketty se propõe a analisar o desenvolvimento do sistema capitalista desde o início do século 19 sob dois aspectos principais: a relação entre a taxa de lucro e a taxa de crescimento das economias nacionais; e a relação entre o fluxo total de renda e o estoque de renda acumulado dentro de um determinado país. A quantidade de dados que o autor pôde analisar, principalmente acerca dos países imperialistas (França, Inglaterra e EUA) é impressionante. O marxismo hoje Talvez o grande êxito da obra de Piketty seja o de comprovar as mesmas teses que já havia provado Marx na metade do século 19, agora com a possibilidade de utilizar muito mais dados estatísticos, sem chegar, contudo, à mesma profundidade nas conclusões. Piketty procura evitar os conceitos formulados por Marx e, quando fala de capital, não se refere ao processo descrito nas obras marxistas, mas estritamente a uma quantidade de riqueza acumulada. A análise da obra O capital no século XXI deixa ainda mais clara a genialidade de Karl Marx, que pôde explicar com tanta profundidade os processos do capitalismo sem ter acesso, em sua épo-
O
ca, a tal quantidade de dados estatísticos que apenas hoje podemos manejar. O que Piketty prova, principalmente, é que, a longo período, a taxa de lucro do capital (chamada de 'r') será sempre maior que a taxa de crescimento da economia (chamada de 'g'). Isso é exatamente o que Marx havia dito com outras palavras em O capital, ou seja, que no processo da produção a ação da força de trabalho do operário gera uma maisvalia que é apropriada pelo dono do capital. O autor chega à conclusão de que o livre desenvolvimento dessa força de concentração de riqueza (r>g) levará ao colapso da produção social, estabelecendo uma sociedade de rentistas que solapam o que ele considera como sistema democrático. O capitalismo e seus períodos Os dados apresentados levam à conclusão da divisão do capitalismo, pelo menos no que diz respeito aos países ricos, em três fases distintas. A primeira cobre toda a segunda metade do século 19 e vai até o fim da Primeira Guerra Mundial (1919); a segunda compreende os choques que foram fruto da Primeira e Segunda Guerras e vai até meados da década de 1970; a terceira vai do fim da década de 1970 até os dias de hoje. Piketty caracteriza a primeira fase como de altíssima concentração de riqueza nas mãos de muito poucas pessoas e de enfraquecimento do poder público, e aponta esses problemas como os causadores dos dois conflitos mundiais. A segunda fase é a de maior igualdade de rendimentos até hoje vivida nos países estudados, quando foi criado o Estado de Bem-estar Social e havia a sensação de que o capitalismo seria capaz de dar cobro dos problemas sociais. Já na terceira, 1980 em diante, o autor identifica a volta da situação de profunda injustiça social existente antes da Primeira Guerra. ATS Durante o século 19, a taxa de lucro oscilou na casa de 4 a 5% nos países ricos, enquanto a taxa de crescimento não foi maior do que 1,5%. No final do século 20 e início do século 21, vivemos situação semelhante, com a taxa de lucro se fixando nos mesmos 4 ou 5%, e a taxa de crescimento não superando 1%. Essa situação é a responsável pelo extremo acúTomas Piketty e seu livro O capital no século XXI,
mulo de riqueza nas mãos dos mais ricos do mundo. Na pesquisa do banco Crédit Suisse ficou comprovado que 0,7% da população mundial é dona de 41% da riqueza acumulada, 99 trilhões de dólares (o PIB dos Estados Unidos é de 14 trilhões, o PIB mundial da ordem de 80 trilhões), enquanto mais de um bilhão de pessoas passam fome. Piketty procura se distanciar das posições do marxismo e, por isso, desconsidera quase completamente o papel cumprido pela luta de classe dos trabalhadores na conquista das posições de igualdade no período que compreende a segunda fase, período de existência da União Soviética e em que esta nação exercia posição de retaguarda dos movimentos de trabalhadores da Europa e do mundo. Desconsidera também as contribuições dadas por Lênin e outros teóricos sobre a nova fase imperialista do capitalismo no início do século 20, representando a nova repartição do mundo uma questão fundamental para o advento das guerras. Rentistas, 'managers' e capitalismo patrimonial A obra de Piketty analisa de maneira aprofundada a origem das desigualdades sociais em seus diferentes aspectos, no que diz respeito à divisão capital-trabalho, mas também no que diz respeito à divisão entre as diferentes remunerações no trabalho. Ele demonstra que os novos 'managers' das instituições financeiras e monopólios passaram a receber, a partir da década de 1980, um salário 300 vezes maior que a média de sua empresa. Os supersalários se somaram ao afrouxamento do imposto sobre a herança, que, no caso dos países ricos, caiu de 70% para menos de 35%. Dessa maneira, os grandes ricos do período atual são exatamente os que herdaram essa riqueza e a renda advinda do trabalho de nenhuma maneira é capaz de distribuir a riqueza como pareceu possível durante o segundo período analisado pela obra. Para Piketty, vivemos em um capitalismo patrimonialista, no qual os executivos do mercado financeiro se tornaram rentistas que não atuam sobre a produção; e a tendência natural desse sistema é a de agravar ainda mais a desigualdade, caso nada mude. A utopia é salvar o capitalismo A solução que Piketty defende pretende evitar o que ele chama de insucessos do socialismo e está em taxar o patrimônio, a herança e o rendimento do capital de maneira progressiva – ou
seja, quanto mais rico, maior a alíquota, e os mais pobres pagam menos ou não pagam. Uma taxação desse tipo tornaria possível dar transparência à dimensão da riqueza e à forma como ela é distribuída, além de fornecer aos Estados nacionais as condições de superar seu atual endividamento e financiar melhores políticas públicas. Evidentemente, uma política de taxação deste tipo precisa ser aplicada em todos os países ao mesmo tempo, pois, do contrário, bastaria aos capitalistas transferir seus rendimentos para outros países para evitar a taxação, como aliás já acontece bastante nos paraísos fiscais onde está depositada grande parte dos capitais do mundo. A verdade é que uma política desse tipo não pode ser aplicada enquanto o poder político e econômico se mantiver nas mãos de um punhado de pessoas que, como a própria história demonstra, exercem uma resistência desesperada, inclusive recorrendo à guerra e ao terrorismo para manter seus privilégios. Uma taxa de imposto progressiva não salvará o capitalismo, mas apenas colocará a luta de classes pelo poder político em outro patamar. Marx voltou Para o Brasil, os temas levantados na obra de Thomas Piketty são de grande atualidade. Chegamos à condição de ser a sexta maior economia do mundo, mas, ao contrário do que diz a propaganda oficial, o povo continua pobre. Se o atual Produto Interno Bruto (PIB) nacional fosse igualmente dividido, ele seria suficiente para garantir uma renda de R$ 8 mil por mês para cada família de até quatro pessoas, o suficiente para garantir condições dignas de vida para todos. Mas não apenas pelo volume de dados avaliados a obra é importante. Também é importante a postura do autor em colocar a atual ciência econômica em seu verdadeiro lugar, ou seja, no lugar da economia política, como uma ciência social irmã da sociologia, da antropologia, etc. Os modelos matemáticos criados pela atual economia não são uma lei natural, e o mercado tampouco tem uma tal mão invisível que tudo regula. São contingências de decisões políticas e de estruturas formadas ao longo da História e que, portanto, podem e devem ser mudadas para o futuro. A obra já pode ser baixada em inglês na internet pelo sítio: http://dowbor.org/blog/wp-content/ uploads/2014/06/14Thomas-Piketty. pdf.
A rebelião dos tapuias
se, e assim fez.” A rebelião tapuia teve como estopim a morte de um líder da tribo da região de Açu. Como resposta, os índios tomaram armas e gado e derrotaram os opressores. Quase em sua totalidade os tapuias se uniram e, em pouco tempo, dominaram as ribeiras do Açu e Apodi, chegando a cinco léguas de Natal. O capitão-mor Pascoal Gonçalves pede socorro a Pernambuco, Bahia e Paraíba. Pernambuco enviou cinco companhias, chefiadas pelo mestre de campo Jorge Luís Soares, com reforços da Paraíba. Entretanto, a rebelião era intensa e muitos começavam a fugir de Natal mesmo com a ameaça de cadeia o e confisco dos bens de quem fugisse. Por essa altura, foi nomeado novo capitãomor Agostinho César de Andrade. Este concede perdão aos criminosos que aceitassem combater os índios. Consegue uma vitória na Serra de Acauã, mas a rebelião prossegue. Com o passar do tempo, mesmo com um poder formidável quando unidas as tribos, a superioridade bélica dos invasores se impôs. Algumas tribos foram praticamente dizimadas, e os que restavam eram “aldeados” sob o comando das missões jesuítas.
Os oficiais da Câmara de Natal enviaram uma carta ao rei relatando a guerra dos tapuias e a paz iniciada pelo capitão-mor Agostinho César e continuada pelo capitão-mor Bernardo Vieira. Fica evidente que a História da colonização do Brasil pelo invasor português não é de heroísmo da parte deste nem muito menos de bondade da Igreja, haja vista o pedido do bispo de Pernambuco. A ação de assassinos como Domingos Jorge Velho, que veio a entrar para a História como o que derrotou o Quilombo dos Palmares, patenteia a prática genocida no roubar das riquezas, das terras e da escravização de seres humanos. Se há algo a se reverenciar é a heroica resistência dos povos que habitavam este País muito antes de o europeu chegar. Ainda hoje estes povos padecem da perseguição e do extermínio de grandes latifundiários, que mantêm a prática, de séculos atrás, de roubar o que restou das terras indígenas. Alex Feitosa, Natal
“A primeira luta do povo brasileiro foi a do índio contra o invasor europeu. A visão tradicionalista passa a conhecer o Brasil a partir da chegada do colonizador. É com os olhos do que chega para saquear e escravizar um povo livre, portanto, que a História oficial começa a explicar o Brasil.” (Berta Ribeiro, em O índio e a História do Brasil.) A rebelião teve início em 1687 na então capitania do Rio Grande do Norte. Mas a sua proporção foi imensa e se espalhou por quase toda a região Nordeste. Sem dúvida, um dos maiores levantes indígenas do País foi o dos tapuias. Mais conhecida como “a guerra dos bárbaros”, a resistência aos invasores por mais de 20 anos atingiu as áreas das capitanias do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas. O levante alcançou uma envergadura imensa e reuniu as tribos Aucurus, Paiacus, Icós, Icopinhos, Bulbis, Arius, Pegas, Caracás, Canindés, Coremas, Caracarás e Bruxarás. Foram quase 30 anos de reforços vindos do Ceará e da Paraíba e que de nada adiantaram diante da rebelião indígena. Só com a chegada dos assassinos,
conhecidos na História como bandeirantes, os tapuias foram derrotados. A proibição, em lei, da escravização do índio – a não ser em “guerra justa” – não passava de uma regulamentação da própria escravidão. Com o objetivo de obter escravos, o colonizador incitava a guerra contra uma determinada tribo. Assim, a morte e a escravização estavam legalizadas. Com a expansão da criação de gado para o interior, o invasor expulsava os índios, roubando-lhes suas terras e escravizando os que resistiam. Esse processo se deu com muita violência e crueldade, e não tardou a eclodir a rebelião. A violência com que os invasores tratavam os índios é testemunhada em uma carta do padre Antônio Vieira ao rei de Portugal, em que afirma: “As causas de até agora se ter feito tão pouco fruto com estas gentes são principalmente as tiranias que com eles temos usado, havendo capitão que obrigou a atar dez morrões [pavios] acesos nos dez dedos das mãos de um principal [chefe indígena] de uma aldeia para que lhe desse escravos, dizendo que o havia de deixar arder, enquanto não lhes des-
Fontes: Luiz Eduardo Brandão Suassuna, Marlene da Silva Mariz. História do Rio Grande do Norte, 2005, Júlio José Chiavenato. As lutas do povo brasileiro. Do “descobrimento” a Canudos, 1996.
12 Setembro de 2014
HISTÓRIA
Guerra do Paraguai: o massacre de um povo soberano José Levino nação paraguaia libertou-se do domínio espanhol em 1811, tendo assumido o governo José Gaspar Rodriguez Francia, que estabeleceu uma ditadura em favor do povo. Realizou a primeira grande reforma agrária da América do Sul, organizando cooperativas de camponeses sob controle do Estado e adotando o regime de trabalho comunitário baseado na experiência dos guaranis. A elite colonial foi despojada dos seus bens e duramente reprimida, inclusive a Igreja Católica, que teve suas propriedades confiscadas. O Paraguai não tinha saída para o mar. Foi fácil ao capitalismo internacional, comandado então pela maior potência, a Inglaterra, isolar o país, impedindo desenvolvimento de sua economia, pois não havia como exportar o excedente agrícola que abarrotava os paióis por todo o país. Quando Francia morreu, em 1840, o Paraguai era o único país sulamericano que não tinha um só analfabeto. Amado pelo povo do seu país, era conhecido no resto do mundo como bárbaro, assassino, terrorista, exatamente porque desapropriou a classe dominante colonialista e não colocou seu país sob o tacão do imperialismo inglês. Um passo à frente O sucessor de Francia foi Carlos Antônio Lopez, um dos ricos que fugira para o interior devido à perseguição de Francia e se convenceu de que o caminho melhor para a nação era o adotado por seu perseguidor. Primeiro presidente constitucional da República, seguiu e aprofundou o modelo de desenvolvimento autônomo. Negociou com o Uruguai uma saída para o mar, comprometendo-se a defender aquele pequeno e frágil país contra qualquer invasão estrangeira. Viabilizando a exportação do excedente produzido, foi possível ao Estado investir na indústria e na infraestrutura. O Governo contratou técnicos europeus e enviou seus jovens para estudar nos países centrais. Com isso, foi possível a criação de tecnologia, o desenvolvimento industrial, a implantação de ferrovias. Em pouco tempo, enquanto Brasil e Argentina importavam de alfinete a botão, o Paraguai tinha uma siderúrgica funcionando 24 horas por dia, tudo isso sem dever a ninguém, com o esforço coletivo de um povo engajado. Naturalmente, despertou a cobiça dos vizinhos e o temor da Inglaterra de que o exemplo se alastrasse e ela perdesse todo um continente que garantia seu crescimento econômico, fornecendo matéria-prima barata, consumindo seus supérfluos e se endividando cada vez mais. As classes dominantes de Brasil e Argentina se formaram como sócias menores do capital inglês, de quem já dependiam inteiramente. Portanto, sua visão da realidade não tem como fundamento os interesses nacionais e sim os da metrópole, que são os seus também. Elas também eram atingidas pela autonomia paraguaia e se prestaram, sem vacilar, ao papel sujo de invadir o país vizinho. Quando morre, em 1862, Carlos Antônio Lopez deixa o Paraguai na seguinte situação: “É o único país da América do Sul que não tem dívida externa nem interna; o único que não tem analfabetos; o mais bem dotado de melhoramentos como telégrafo, ferrovias, linhas de navios para a Europa. Possui o mais moderno sistema de moedas. Está livre da ingerência de bancos estrangeiros em sua economia. Todo esse progresso é a sua sentença de morte!”. Arma-se a ofensiva militar O Congresso paraguaio elege para suceder Carlos Antônio seu filho, Francisco Solano López. Não por ser fi-
A
Arquivo
lho, mas por demonstrar, desde os 18 anos, sua capacidade de organizar o Exército e sua qualidade de negociador, posto que, em 1859, conseguiu pacificar as províncias argentinas em conflito. Poderia tê-las ocupado, aproveitando o divisionismo e a fraqueza da confederação argentina. Mas o Paraguai nunca teve pretensões expansionistas, ao contrário do que querem fazer crer certos historiadores, não só os do império, mas até mesmo da época atual. O que queriam os paraguaios era apenas manter a paz Na Batalha de Tuyuti morreram 10.000 paraguaios e a estabilidade na bacia do Rio Prata. do, porque a comissão não pretendia Quanto à economia, Solano conciliação alguma, apenas utilizar sua López não tinha muito o que fazer, exce- impossibilidade para justificar uma into dar continuidade a um modelo de sutervenção. Entre os pontos em discuscesso, haja vista que o pequeno Parasão, colocavam algo que nada tinha a guai já era conhecido no mundo inteiro. ver com o problema dos camponeses Hábil diplomata, ele vai à Europa e artibrasileiros; apenas dizia respeito à polícula apoios, contrata profissionais para tica interna uruguaia. ajudar na modernização dos meios de Frustrada a negociação, seguem produção, vai de vento em popa. para Buenos Aires e assinam o acordo, Negocia tratados com Brasil e cujo conteúdo já havia sido traçado Argentina para garantir a paz entre as na- anos antes, que une Brasil e Argentina ções que têm interesse comum na repara invadir o Uruguai, fato ocorrido no gião. Acredita que está tudo bem. Não dia 20 de fevereiro de 1865. O que isso percebe Solano, como não haviam pertem a ver com o Paraguai? Tudo. Com o cebido os governos anteriores, que não vizinho ocupado, os paraguaios ficam bastava negociar pequenas querelas de novamente sem saída para o mar, o que vizinhos, que a razão maior do conflito iria asfixiar sua economia e, por isso, o estava bem longe, na sede do império Paraguai se comprometera a defender o britânico. Uruguai diante de qualquer ataque. A ofensiva começa no aspecto ideA guerra ológico, buscando formar uma opinião O Paraguai não tinha outra saída. pública, restrita às elites, aos que liam Rompeu relações diplomáticas com jornais, de que no Paraguai havia um reBrasil e Argentina e partiu para a ofengime ditatorial, contrário à civilização. siva, ocupando o Mato Grosso. Era o Um diplomata inglês, Edward Thornque bastava para a tríplice aliança, pois ton, afirma: “...Insignificante em si mes- Venâncio Flores, o títere imposto ao mo, o Paraguai pode impedir o desenUruguai, juntara-se aos invasores. volvimento e o progresso de todos os seA guerra, que esperavam breve, us vizinhos. Sua existência é nociva e durou cinco anos. O Paraguai tinha um sua extinção como nacionalidade deve Exército de defesa de 50 mil homens, ser proveitosa para seu próprio povo e bem preparado, e toda uma população para todo o mundo”. mobilizada para a luta. Juan Batista Os vizinhos engolem a corda. Bar- Alberdi, em correspondência a Sarmitolomeu Mitre, presidente da Confedeento, Buenos Aires, 1967, testemunha: ração Argentina, deixa escapar em seu “O Exército paraguaio é numeroso relajornal La Nación: “A República argentivamente ao seu povo porque não se tina está no imprescindível dever de fordistingue do povo. Cada soldado demar aliança com o Brasil a fim de derrufende seu próprio interesse e o bembar essa abominável ditadura de López estar de sua família, na defesa que faz e abrir ao comércio do mundo essa esdo seu país”. plêndida e magnífica região que possui, Já o Exército brasileiro, compostalvez, os mais variados e preciosos pro- to, em sua maioria, por escravos opridutos dos trópicos e rios navegáveis pamidos no seu país, não tinha motivação ra serem explorados”. para a luta. Nem o argentino, composto A guerra seria para libertar o povo de mercenários. As derrotas e a desmoparaguaio do ditador. Seria rápida. ralização se sucedem até que é nomeaQuando atacaram e ficou claro que o po- do para o Comando da expedição o exvo lutaria até o último homem, o discurperiente e temido Duque de Caxias so do diplomata norte-americano Char(Luís Alves de Lima e Silva), que imles Washburn tem o tom de um celerapõe a disciplina e reverte os resultados, do: “Por sua torpeza e cegueira, junto embora a custo de muitas perdas. com outros pecados, o povo paraguaio O Exército invasor cometeu abomerece o completo extermínio que o mináveis crimes de guerra, entre os quaaguarda. O mundo terá justo motivo pais se destacam: obrigar prisioneiros para congratular-se quando não houver raguaios a lutar contra a sua pátria, conuma só pessoa que fale o endiabrado idi- taminar as águas do Rio Paraná com caoma guarani”. dáveres de pessoas acometidas pelo cólera para contaminar a população ribeiA trama rinha (crime assumido por Caxias em Como armar um pretexto para o carta a D. Pedro II); venda de prisioneiataque? Simples. Havia na fronteira do ros como escravos (crime confessado Uruguai com o Rio Grande do Sul 40 por Bartolomeu Mitre, comandante do mil camponeses brasileiros do lado uruExército argentino, em carta ao viceguaio, que já dominavam 30% das terpresidente Marcos Paz); assassinato de ras do país. O Governo do Uruguai, pamilhares de crianças na batalha de Acosra controlar essa ocupação econômica ta Ñu (crime ordenado pelo conde externa, desordenada, estabelece limiD'eu, que assumiu o Comando das trotes severos, aumenta impostos e proíbe pas em substituição a Caxias). o trabalho escravo. Os gaúchos cobram O genocídio um posicionamento do imperador. Este O Duque de Caxias deu por encerenvia um diplomata, Antônio Saraiva, para negociar. As conversas resultam in- rada a guerra no dia 5 de janeiro de 1868, quando o Exército Imperial chefrutíferas. O embaixador britânico gou a Assunção e estabeleceu um goThornton propõe uma comissão trípliverno títere. Mas a ordem foi continuar. ce: ele próprio, Saraiva, pelo Brasil, e Em carta ao imperador Pedro II, datada Elizalde, pela Argentina. São recebidos de 18 de novembro de 1867, ele pediu pelo presidente Berro, mas não há acor-
demissão. Depois de referir-se à bravura do soldado paraguaio, que via como “simples cidadãos, homens, mulheres e crianças”, questionou: “Quanto tempo, quantos homens, quantas vidas para terminar a guerra, é dizer, para converter em fumo e pó toda a população paraguaia, para matar até o feto do ventre da mulher?”. Caxias desistiu de ser o coveiro do povo paraguaio, mas o Império, atendendo à vontade maior da metrópole britânica, não arredou pé. Pedro II nomeou para o Comando seu genro, o conde D'eu. Este superou qualquer tipo de violência até então conhecido, a exemplo do episódio de Peribebuy, quando o sádico mandou fechar e incendiar um hospital onde só havia velhos e crianças doentes. Outro crime foi a batalha de Acosta Ñu, no dia 16 de agosto de 1869. Havia se formado um batalhão de 3.500 crianças, a partir de seis anos, para fazer frente aos invasores, possibilitando a fuga de Solano López com 500 homens, o que restava para defender o país. Cercadas por 20 mil soldados, as crianças foram derrotadas, naturalmente. Muitos, chorando, abraçavam- se nas pernas dos soldados pedindo para não serem mortas, mas não havia contemplação. Eram degoladas sem dó. No final, as mães correram para a mata para resgatar corpos e procurar sobreviventes, mas não parou por aí: o conde foi capaz de ordenar o incêndio da mata, queimando as crianças e suas mães. O 16 de agosto foi estabelecido, posteriormente, como o Dia das Crianças no Paraguai. Solano e seus últimos companheiros, cem soldados, foram encontrados e derrotados no dia 1º março de 1870. Instado a se render, ele pronunciou suas últimas palavras: “Morro com minha pátria”. O povo paraguaio foi praticamente exterminado: mais de 75% de sua população foi morta. Dos 800 mil habitantes no início da guerra, restaram 194.000. A população masculina adulta foi dizimada em quase 100%. Sobraram 14 mil homens, em sua grande maioria, crianças com menos de 10 anos e velhos. Sarmiento, argentino, escreve: “A Guerra do Paraguai conclui-se pela simples razão de que matamos a todos os paraguaios maiores de dez anos”. 2 O Paraguai perdeu 140 mil km do seu território, o que corresponde a Pernambuco e Alagoas juntos. As terras, como todas as riquezas saqueadas, foram repartidas entre brasileiros e argentinos. Um só ganhador Mas o único ganhador, mesmo, foi o imperialismo britânico. Incitou Brasil e Argentina à guerra. Estes, com a economia debilitada, dependiam de mais empréstimos para dar conta da tarefa. Nos anos seguintes, este endividamento só fez aumentar. Entre 1871 e 1889, a soma da dívida externa brasileira atinge 45.500.000 libras, e da Argentina, 18.747.000. Das conseqüências do endividamento crescente sobre a realidade econômico-social dos dois países, não é preciso falar. Derrotada, a nação paraguaia teve aniquilada sua experiência vitoriosa de desenvolvimento econômico soberano, independente e autônomo, a partir de próprias forças. Atualmente, o Paraguai ocupa o 111º lugar em Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), entre 187 países listados pela ONU (dados de 2013). José Levino é historiador Fonte: Genocídio Americano, A Guerra do Paraguai. Júlio José Chiavenatto, Brasiliense, 12ª edição, São Paulo, 1980, de onde, inclusive, foram extraídas as citações.