Gazeta de Alagoas
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| QUINTA-FEIRA, 28 DE JANEIRO DE 2010 |
Eu sou jovem, pô! Divulgada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) no último dia 19, a pesquisa Juventude e Políticas Sociais traz uma análise sobre o papel do Estado na elaboração de planos que possam garantir o bemestar e o desenvolvimento da população juvenil no Brasil. Até aí, nada de tão inédito assim. O diferencial, dessa vez, é a atenção dispensada pelos pesquisadores ao segmento cultural: com dados precisos sobre a produção e o consumo de bens culturais por parte dos adolescentes e jovens adultos, o estudo pode ajudar a desenhar ações mais efetivas junto a esse contingente de mais de 50 milhões de brasileiros | RAMIRO RIBEIRO Repórter
O Brasil possui uma população de mais de 50 milhões de jovens. Algo em torno de 26% dos 190 milhões de brasileiros encontrase na faixa etária entre 15 e 29 anos, um contingente que por si só poderia dar origem a um pequeno país. Diante desse número – e levando em conta as idiossincrasias que nos caracterizam –, que tipo de recorte seria possível fazer acerca desse conjunto específico de indivíduos? Para conhecer os anseios, objetivos e carências desse segmento da população, no último dia 19 o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) lançou o livro Juventude e Políticas Sociais, publicação que apresenta os resultados de uma pesquisa realizada durante dois anos e que traz informações palpáveis sobre a juventude brasileira a partir de diferentes aspectos: emprego, educação, segurança pública, sexo e cultura, entre outros pontos relevantes. Intitulado Juventude e Cultura, no capítulo que analisa o ‘panorama cultural’ da juventude brasileira os pesquisadores Frederico Barbosa e Herton Araújo contextualizam o cenário do estudo atual a partir da comparação com pesquisas realizadas em meados do século passado no País. Assim, apontam as ações desenvolvidas pelo poder público ao longo da última década e – o mais interessante – fornecem dados precisos sobre a produção e o consumo de bens culturais por parte dos adolescentes e jovens adultos. Apesar dos avanços, os números são insatisfatórios: envoltos numa nuvem de previsibilidade, acabam por evidenciar as deficiências dos mecanismos públicos
de disseminação do acesso à cultura, bem como os entraves do setor. Apesar disso, e por mais que não seja novidade, assusta saber que apenas 4,2% dos jovens brasileiros vão ao teatro – a informação consta da última Pesquisa de Orçamentos familiares do IBGE, de 2003. Ou ainda que somente 1,7% compraram (e leram) livros que não os didáticos e/ou escolares, ou que o gasto médio per capita com cinema não costuma ultrapassar a cifra de R$ 11,70. Os dados são mais alarmantes quando comparados com outros que incidem sobre os jovens com 12 anos ou mais de escolaridade, os universitários: eles expõem graves desigualdades, a exemplo da dicotomia entre consumo e frequência de visitação a equipamentos e bens culturais e níveis de escolaridade e renda. Assim, a pergunta é: o que fazer para reverter esse quadro, aumentando a demanda e garantindo, de fato, o acesso à cultura? Entre as ‘soluções’ apontadas no estudo, o programa Cultura Viva, do governo federal, tem se mostrado uma alternativa razoável. Criado em 2004, seu principal instrumento de ação são os Pontos de Cultura, um conjunto de iniciativas que visa envolver comunidades em atividades ligadas a segmentos como arte, cultura, cidadania e economia solidária. O programa atua na lacuna deixada pelo sistema de educação, que há muito se ausentou do cotidiano dos jovens – a instituição escolar parece ter perdido a capacidade de operar conteúdos culturais. Para se ter uma ideia, cerca de 67,7% do público preferencial nos 742 Pontos de Cultura instalados hoje no País é formado por adolescentes e jovens adultos. A maioria dos agentes (64,2%) que
trabalha nessas entidades também pertence a essa faixa etária. Em compensação, são os adultos os responsáveis pela gestão efetiva desses núcleos – os jovens são apenas 22% na função. Os Pontos de Cultura representam a tentativa do poder público federal de mudar o viés histórico das políticas públicas de cultura e mesmo das pesquisas realizadas na área no País. Entre as décadas de 60 e 80, por exemplo, os estudos eram feitos por meio da análise cultural legitimista, que somente reconhecia as formas de arte tradicionalmente estabelecidas: arquitetura, cinema, música, literatura, teatro e artes plásticas. Houve então o movimento consciente de adotar uma análise pluralista da cultura, que não se utilizasse apenas de conceitos universais e irredutíveis, mas que desse conta das diversas manifestações culturais existentes no Brasil. A intenção é fazer com que as ações desenvolvidas pelas comunidades sejam devidamente reconhecidas, o que lhes habilitaria a receber recursos públicos. Mas o programa enfrenta dificuldades práticas. Aqui em Alagoas, por exemplo, muitos dos pontos estão inadimplentes com a prestação de contas das primeiras parcelas dos recursos alocados. O segmento sofre com a centralização de informações e com a ausência de um monitoramento mais detalhado dos trabalhos realizados. Os entraves burocráticos também atrapalham o desenvolvimento das atividades, do mesmo modo que as constantes discussões teóricas acerca da “propriedade” das ações. A conclusão é cristalina: é necessário instrumentalizar – de fato, e não apenas simbolicamente – os espaços e os agentes envolvidos nesse mecanismo.
PERFIL DO CONSUMO CULTURAL DE JOVENS E ADULTOS (15 A 29 ANOS)
Tipo de consumo
Cinema Vídeo
Teatro
Música Livros didáticos Livros Periódicos (jornal, revistas etc.) Outras saídas
Escolaridade
Total 12 anos ou mais
Percentual de jovens que consumiram bens culturais
Gastos entre jovens que consumiram bens culturais*
Gastos per capita dos jovens brasileiros*
6,3
186
11,7
29,8
227
67,5
JOVENS E NÚMEROS
50 milhões É a quantidade de jovens (na faixa etária entre 15 e 29 anos) no País, ou seja: 26% da população total
13% É o índice de jovens com acesso ao ensino superior na faixa etária dos 18 aos 24 anos
18%
6,5
190
12,4
20,6
246
50,7
Total
2,8
403
11,5
12 anos ou mais
7,1
458
32,5
Total
4,4
237
10,6
15,1
309
46,6
Total
4,2
94
3,9
12 anos ou mais
3,0
131
4,0
Total 12 anos ou mais
1,7
157
2,7
8,1
237
19,3
7,1 28,1
235 306
16,6 86,1
R$
8,4
400
33,5
18,6
679
126,4
É o patamar de consumo cultural atingido pelas famílias brasileiras, segundo pesquisa realizada pelo IBGE em 2003
Total 12 anos ou mais
12 anos ou mais
Total 12 anos ou mais Total 12 anos ou mais
* Valores em reais Fonte: Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2003/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
É o número de jovens que estão fora da escola
67,7% É o percentual de jovens entre 15 e 24 anos que estão entre as vítimas de mortes violentas no País
31 bilhões X R$ 2 bilhões É o montante de recursos públicos investidos no setor