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Editorial

Boas Práticas de Fabricação (BPF) Como Estratégia Empresarial O olhar atento às Boas Práticas de Fabricação (BPF) é uma tendência mundial nos mais diversos setores industriais, não obstante na área farmacêutica, em que os produtos, apesar de industrializados, devem ter asseguradas sua qualidade, segurança e eficácia, uma vez que isto determina para milhões de pessoas as respostas a doenças ou estados de saúde. A contribuição da legislação neste setor é padronizar preceitos, formalizar requisitos e propiciar ferramentas de fiscalização. Nesta revista Fármacos & Medicamentos número 55 trazemos à capa, como destaque, a seção Legislação, abordando a RDC nº 59/2000 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que define as Boas Práticas de Fabricação de Produtos Médicos, visando métodos e controles utilizados em projeto, compras, fabricação, embalagem, rotulagem, armazenamento, instalação e assistência técnica, garantindo que possuam qualidade e sejam seguros e eficazes e determinando seu cumprimento a todos os fornecedores destes produtos. O artigo traça uma importante visão prática sobre esta norma e mais, alia a questão estratégica, aspecto fundamental para um setor extremamente competitivo como o farmacêutico, demonstrando que uma RDC pode e deve ser absorvida não como mais uma obrigação a ser simplesmente seguida, mas sim como, também, uma diretriz para o desenvolvimento de um Sistema de Gestão Empresarial. Ainda nesta edição 55 trazemos, na seção Manufatura, um trabalho que realiza a comparação entre filtros com agentes antimicrobianos e convencionais no pré-tratamento de ar, demonstrando as vantagens e as desvantagens das duas opções, na seção Gestão, um artigo sobre a questão do ambiente de trabalho e o papel das lideranças, expondo um histórico sobre o comportamento das pessoas no ambiente de trabalho, além de uma tabela com os estereótipos de liderança e um valioso glossário de termos relacionados, e na seção Supply Chain, um importante guia para o recebimento e a estocagem e um roteiro para a inspeção de Boas Práticas de Estocagem de Medicamentos, com um questionário repleto de questões a serem respondidas como exemplo da visita de uma empresa que se baseia na auto-inspeção de seus produtos. Em Leia no Portal Racine (www.racine.com.br), publicamos um trabalho que abrange a aplicação de Process Analitical Technologies (PAT) na indústria farmacêutica, pontuando as vantagens da implementação da técnica de Near Infrared (NIR), permitindo relevantes ganhos nos processos produtivos. Na seção Navegue, indicando sites para se saber mais sobre salas limpas, a colaboração é do consultor Miguel Ferreirós, docente do Instituto Racine e especialista com grande experiência acerca do assunto. Mas quem abre este número da revista é Ricardo Oliva, superintendente da Fundação para o Remédio Popular (FURP), que em uma Entrevista exclusiva fala sobre seus planos para transformar a FURP em um dos maiores produtores de medicamentos do País.

Boa Leitura!

Nilce Barbosa

Presidente do Grupo Racine e Coordenadora Técnica da Revista Fármacos & Medicamentos

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Fármacos & Medicamentos

55 Ano IX

Novembro/ Dezembro de 2008 Envie seu trabalho para publicação na Revista Fármacos & Medicamentos A Revista Fármacos & Medicamentos traz bimestralmente, aos profissionais que atuam nas indústrias química, farmacêutica e farmoquímica, conteúdo de atualização técnica, científica, mercadológica e de gestão, entre diversas outras de seu interesse, na busca constante da integração do conhecimento à prática profissional. Envie seu trabalho para o e-mail revista@racine.com. br. Ele será avaliado pela coordenação editorial e pode ser publicado.


Legislação Circular para

RDC nº 59/2000 Resumo sob uma Óptica Prática e Visão Estratégica na Gestão Empresarial Leila de Mendonça Garcia e Luiz Eduardo Costa

A

s leis nº 5.991/1973 e nº 6.360/1976 e o decreto nº 79.094/77 definem correlatos da mesma forma: “substância, produto, aparelho ou acessório não enquadrado nos conceitos anteriores, cujo uso ou aplicação esteja ligado à defesa e proteção da saúde individual ou coletiva, à higiene pessoal ou de ambientes, ou a fins diagnósticos e analíticos, os cosméticos e perfumes, e, ainda, os produtos dietéticos, óticos, de acústica médica, odontológicos e veterinários”. A RDC nº 59/2000 - Boas Práticas de Fabricação de Produtos Médicos, foi complementada pela RDC nº 185/2001, que equipara correlatos a produto médico definindo-o como produto para saúde para fins de registro (excetuando os reagentes para diagnóstico de uso in vitro, contemplados pela Portaria nº 686, de 27 de agosto de 1998 - Boas Práticas de Fabricação e Controle em Estabelecimentos de Produtos para Diagnóstico de Uso In Vitro.

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Aplicabilidade

Esta norma estabelece requisitos aplicáveis à fabricação de produtos médicos. Estes requisitos descrevem as Boas Práticas de Fabricação (BPF) para métodos e controles utilizados no projeto, compras, fabricação, embalagem, rotulagem, armazenamento, instalação e assistência técnica de todos os produtos médicos. Os requisitos desta norma se destinam a assegurar que os produtos médicos sejam seguros e eficazes e determinando a todos fornecedores de produtos médicos o cumprimento dos requisitos esta-


belecidos pelas Boas Práticas de Fabricação de Produtos Médicos, portanto não somente os fabricantes como também os importadores e os distribuidores devem ser certificados, com base na RDC nº 59/2000 para distribuição. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), por meio das vigilâncias sanitárias locais, efetua as auditorias conforme o roteiro de inspeção, incluso na RDC, porém, apesar da obrigatoriedade do cumprimento das BPF, é o mercado consumidor que mais tem exigido a certificação.

dente de setor, atividade ou hierarquia; • A conscientização de cada colaborador/funcionário como forma vital de assegurar um sistema da qualidade eficaz, contribuindo de forma individual no esforço de todos para conseguir produtos com qualidade que sejam eficazes e eficientes; • Como ferramenta de manutenção das BPF os treinamentos são registrados, atualizados e contínuos. O Certificado de Boas Práticas de Produção e Controle (CBPFC), instituído pela RDC nº 95/2000 tem validade de doze meses, podendo ser revalidado por mais doze meses. O certificado e suas subseqüentes certificações somente serão emitidos pela ANVISA quando requeridos pelo interessado.

O que surge com a RDC nº 59/2000

• A qualidade vista como um sistema, com responsabilidade e autoridade definidas e demonstradas em organograma e matriz de responsabilidades e comunicadas por toda a empresa, por meio do Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ); • Implementação do registro das atividades que envolvam o produto e dos procedimentos operacionais padrões; • Com a organização veio a autonomia aos responsáveis na identificação de problemas de qualidade para dar inicio a ações preventivas e corretivas, controlando o processamento posterior de produto não conforme até que a condição insatisfatória tenha sido corrigida; • A implantação de ferramentas para monitorização da qualidade como a análise critica dos projetos, processos, auditorias internas e externas, registro dos treinamentos e técnicas estatísticas, entre outros; • A auto-inspeção como instrumento de avaliação do cumprimento das BPF; • A comunicação dos índices de qualidade deverá se estender a todos os colaboradores, indepenFármacos & Medicamentos 55

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Legislação Para concessão da prorrogação as condições estão descritas na RDC nº 331/2002 e para nova certificação os critérios estão descritos na RDC nº 66/2007. Em ambas as situações a ANVISA avaliará se a empresa possui ocorrência no mercado que tenha exigido medidas sanitárias nos últimos 12 meses. A tecnovigilância da ANVISA, através dos Hospitais Sentinelas, dos profissionais de saúde ou dos consumidores, poderá receber notificação de desvio da qualidade dos produtos para saúde oferecidos. Surge então a avaliação pós-mercado como outra ferramenta de controle das BPF, para que todas as reclamações sejam analisadas e respondidas aos notificadores e se as mesmas forem comprovadas deverão ser registradas as ações corretivas implantadas, como também sua eficiência para evitar a recorrência da não-conformidade relatada. Correlatos envolvem inúmeras tecnologias e aplicações, sendo que aplicar as determinações da RDC nº 59/2000 de modo específico seria inviável. Porém, tornando os correlatos em produtos para saúde ou produtos médicos (medical device) e subdividindo-os em novas classes, de acordo com seus riscos e aplicações, se torna possível atender a requisitos específicos, seja por classe de risco do produto, por etapa de fabricação ou por atividade comercial. Com as BPF a empresa garante requisitos do sistema de qualidade, controle de projeto, controle de documentos e registro, controle de compras, identificação e rastreabilidade, controles de processo e produção, inspeção e testes, componentes e produtos não-conformes, ação corretiva, manuseio, armazenamento, distribuição e instalação, controle de embalagem, rotulagem e arquivos de reclamação.

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Qualidade da normatização e prática do dia-a-dia

Com a implantação dos requisitos de BPF, surgiu um maior campo de atuação para o farmacêutico nas empresas. Colocou-se em prática conhecimentos, unindo informações da área medicamentos com as tecnologias de fabricação. Hoje se atua desde projeto de novos produtos, passando pela qualificação da matéria-prima a ser utilizada, pela validação dos processos de fabricação, dos procedimentos diversos e nos treinamentos e conscientização do sistema como um todo. Sem deixar o Controle da Qualidade se atua efetivamente no Sistema da Qualidade, sabendo aplicar o princípio da qualidade do ponto de vista sanitário, ou seja, segurança, eficácia e

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rastreabilidade. O crescimento de atribuições fez o Conselho Federal de Farmácia (CFF) regulamentar as atividades do profissional no setor, conforme descritas na Resolução nº 448/2006. Para garantir a qualidade é necessário o comprometimento de todos, incluindo, além dos colaboradores diretos, os representantes, os fornecedores e os clientes.

RDC nº 59/2000 como diferencial estratégico na gestão empresarial

Com base no 21 Code of Federal Regulations (CFR), parte 820, da Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos da América (EUA), a RDC nº 59/2000 foi adotada no Brasil pela ANVISA em 27 de junho de 2000, determi-


nando obrigatoriamente a todos os fornecedores de produtos médicos o cumprimento dos requisitos estabelecidos pelas Boas Práticas de Fabricação de Produtos Médicos. Deve-se ressaltar que, conforme estabelecido no 1º parágrafo do artigo 1º da própria RDC, ficam igualmente obrigados os estabelecimentos que armazenem, distribuam ou comercializem produtos médicos a cumprir o previsto no anexo I da resolução, no que couber. Assim, desde então, muito se tem discutido sobre as BPF e sua aplicação efetiva, dado que o mundo dos produtos para a saúde é caracterizado por inúmeras tecnologias, que vão desde um simples preservativo masculino até um tomógrafo, passando por toda a miríade de produtos tais como kits de diagnóstico de uso in vitro, materiais e instrumentais ortopédicos, cirúrgicos, odontológicos, materiais descartáveis e inúmeros outros que surgem quase diariamente no cenário tecnológico mundial. Estima-se que existam mais de 5.000 diferentes tecnologias relacionadas ao mundo dos correlatos. Ora, com toda esta gama de produtos e tecnologias distintas, aplicar as determinações da RDC nº 59/2000 de modo específico a cada uma delas, seja na fabricação, no armazenamento ou na distribuição, transforma-se em um trabalho enorme e digno de poucos especialistas, já que se torna necessário conhecer os produtos, entender suas aplicações, a forma de operação, os riscos sanitários intrínsecos associados aos mesmos e, sobretudo, como aplicar o princípio da qualidade do ponto de vista sanitário, ou seja, segurança, eficácia e rastreabilidade. É inegável a importância da Certificação das BPF, instituída pela Resolução RDC nº 95, de 08 de novembro de 2000, destacando-

se que, de acordo com artigo 2º, a ANVISA somente emitirá o Certificado de BPF&C quando solicitado pela empresa fabricante, importadora ou distribuidora de produtos para a saúde. Além de atender as exigências legais, a certificação de BPF transmite aos serviços de saúde a confiança de estar comprando um produto fabricado, armazenado e distribuído sob rígido controle de qualidade, o que tem levado várias instituições a exigirem a respectiva certificação de seus fornecedores. A comprovação desta afirmativa está no fato de que inúmeros hospitais públicos colocam tal exigência em seus editais licitatórios e até mesmo hospitais ou grupos de privados promovem a qualificação de seus fornecedores com base na RDC nº 59/2000. Contudo, nestes quase nove anos de existência, o cumprimento da

RDC nº 59/2000 tem sido encarado, na maioria das vezes, como um mal necessário ou mais uma mera exigência cartorial, o que se traduz em uma visão míope e de pouco futuro. Claro que existem problemas relacionados à interpretação e à aplicação dos quesitos regulatórios inerentes a cada uma das empresas, aos prazos de solicitação e à execução das auditorias oficiais, as próprias auditorias em si e outras dificuldades. Certamente avanços significativos já foram feitos e vários outros desafios deverão ser enfrentados e resolvidos. A visão míope e de pouco futuro, mencionada anteriormente, podese atribuir ao fato de que, em sua maioria, as empresas não conseguem enxergar e observar muito mais além do que está determinado na RDC. Em outras palavras, uma

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Legislação vez que a mesma é compulsória, não conseguem entender e fazer da RDC um pilar para o desenvolvimento de um Sistema de Gestão Empresarial, ganhando com isto uma visão sistêmica de todo o negócio e de toda a cadeia de relações de autoridades, responsabilidades, objetivos estratégicos, resultados esperados e alcançados na qual está inserido. Entender a intenção por trás da regulamentação de um sistema da qualidade como, por exemplo, o estabelecido pela RDC nº 59/2000, bem como a complexidade dos produtos para a saúde e seus processos empresariais, o tamanho da empresa, os riscos associados aos produtos e a cultura da empresa, permitirá o desenvolvimento de um sistema efetivo de gestão da qualidade. A base do entendimento para a regulamentação do sistema da qualidade fornece um valioso ponto de vista para a interpretação de muitos dos requisitos regulatórios estabelecidos pela ANVISA. A integração do Sistema de Gestão da Qualidade (SGQ) com os objetivos estratégicos do negócio é um desafio para muitas empresas. Muitas companhias freqüentemente vêem o sistema da qualidade como responsabilidade única e exclusiva do departamento da qualidade. Para que o SGQ seja eficiente é importante modificar a cultura e o ambiente da empresa para assegurar que todos os colaboradores reconheçam suas responsabilidades e contribuições para com o mesmo. O apoio da alta direção é essencial para o sucesso do SGQ. Para atingir este objetivo é necessário alcançar um equilíbrio entre os objetivos estratégicos do negócio e os da qualidade. Empresas cujo SGQ funciona separadamente do negócio empresarial correm maior risco de falhas e prejuízos, já que a organização como um todo percebe os conflitos de ob-

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jetivo ou as constantes mudanças de prioridades, trabalhando de um modo no qual a qualidade está concorrendo sempre por recursos, já que seus objetivos não estão alinhados com os da empresa como um todo. A capacidade de reconhecer o que e em que alinhar os objetivos do negócio aos objetivos da qualidade permite alocar recursos adequadamente e reduzir a percepção de conflito de prioridades. Por exemplo, recursos para a área de engenharia de projetos sendo alocados para cumprir o prazo de lançamento de um novo produto, enquanto estes mesmos recursos centralizam-se nas únicas pessoas com conhecimento técnico necessário para investigar a ocorrência de eventos adversos com um dos produtos da empresa que já

está no mercado. Entende-se que a função prioritária da área de engenharia de projetos é o desenvolvimento e o lançamento de novos produtos e, como resultado, esta não possui tempo para investigar a ocorrência de eventos adversos. Se a companhia receber uma notificação da Unidade de Tecnovigilância (UTVIG) da ANVISA e não atendêla de forma adequada, poderá, conseqüentemente, colocar em risco o próprio negócio em si. Clientes potenciais tanto quanto concorrentes poderão ter acesso a esta informação, por exemplo, na forma de alertas sanitários, e o resultado poderá ser traduzido em alguma perda de mercado. A fundamentação do SGQ pode ser baseada em três elementos, a

“Entender a intenção por trás da regulamentação de um sistema da qualidade como, por exemplo, o estabelecido pela RDC nº 59/2000, bem como a complexidade dos produtos para a saúde e seus processos empresariais, o tamanho da empresa, os riscos associados aos produtos e a cultura da empresa, permitirá o desenvolvimento de um sistema efetivo de gestão da qualidade.”

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saber: controle gerencial, auditorias e programa de ações preventivas e corretivas. Estes elementos podem ser considerados o pulso da organização, fornecendo uma indicação global tanto da saúde dos negócios da empresa bem como do sistema da qualidade em si.

Controle gerencial

Este elemento do SGQ determina a obrigação regulatória para: • Documentação da Política da Qualidade, traduzindo a visão da alta gestão da empresa para a qualidade; • Definição dos objetivos da qualidade, estabelecidos em termos mensuráveis e necessários para se alcançar o determinado pela Política da Qualidade; • Avaliação periódica da adequação e da efetividade do SGQ, por meio do gerenciamento das revisões de processos.

processo utilizado para projetar e desenvolver, produzir e distribuir produtos para a saúde esteja operando de forma totalmente controlada. O propósito das auditorias internas é identificar as não-conformidades com o SGQ e alertar o responsável pelo gerenciamento para tais nãoconformidades, de modo que as causas possam ser investigadas e as ações corretivas necessárias possam ser tomadas. Uma das maiores deficiências quando das auditorias oficiais da autoridade sanitária é a empresa não ter parte dos procedimentos regulamentares definidos, documentados e implementados. Se a empresa afirma que realiza auditorias internas e porventura durante uma inspeção oficial percebe-se a falta de um determinado procedimento regulamentar, certamente a empresa será questionada quanto à

“Muitas empresas programam um conjunto de ações preventivas e corretivas, as quais, com o tempo, evoluem para processos complexos e incômodos, que, em sua maioria, tornam-se difíceis de seguir e com resultados obsoletos. Neste caso, recomendase proceder uma nova análise de todos os procedimentos envolvidos de modo a torná-los mais ágeis e efetivos.”

A oportunidade para alinhar as estratégias de negócio e os objetivos da qualidade e monitorar a habilidade de alcançar estes resultados pode ser obtida pelo engajamento da alta direção no sentido de dar o tom e dispor o SGQ de uma maneira que permita à empresa alcançar os objetivos da qualidade e dos negócios. Durante a revisão gerencial formal a saúde de toda a organização é apresentada em termos de conformidades e não-conformidades, reclamações de clientes, recursos alocados, notificações sanitárias etc. Conseqüentemente, a alta gestão deve estar engajada e receptiva para autorizar ajustes necessários para assegurar a adequação e a melhoria continua de todo o SGQ.

Auditorias internas

Auditorias internas fecham o circuito para os demais elementos do SGQ, assegurando que o Fármacos & Medicamentos 55

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Legislação adequação do programa de auditorias internas, com que freqüência é realizado, por quem e como etc. Certamente os auditores chegarão às mesmas conclusões se eventualmente encontrarem processos operacionais não validados, quando necessário, ou se estiverem sendo efetuadas mudanças e as mesmas não estejam sendo documentadas ou controladas. A evidência objetiva desta última hipótese pode ser verificada por intermédio de procedimentos operacionais sem revisão, aprovação ou validação antes da respectiva implementação. As auditorias são conduzidas de modo a satisfazer aspectos regulatórios e, sob uma perspectiva de negócios, promover o gerenciamento com informação factual, não filtrada, que permite gerir o SGQ. O programa de auditoria da qualidade

fornece informações que permitem saber se o SGQ está sendo implementado e se está sendo cumprido. Os resultados das auditorias internas ajudam a identificar áreas em que há recorrência de problemas. Problemas recorrentes podem ser detectados pela comparação dos resultados de auditorias de múltiplas funções ou departamentos, identificando onde existem repetidas não-conformidades. Indicadores, tais como recorrência de não-conformidades ou repetição de mesma ação corretiva, devem ser analisados e tratados dentro do programa de ações preventivas e corretivas.

Programa de ações preventivas e corretivas

Este elemento é um dos mais importantes dentro do SGQ. Esperase do SGQ que estes operem de

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forma perfeita, contudo, em uma eventualidade, um desvio do SGQ, estes devem ser capazes de detectar e corrigir tais não-conformidades. É importante entender a terminologia e reconhecer que analisando múltiplas fontes de dados pode-se aumentar a capacidade de alcançar ambos os objetivos, da qualidade e dos negócios. Muitas empresas programam um conjunto de ações preventivas e corretivas, as quais, com o tempo, evoluem para processos complexos e incômodos, que, em sua maioria, tornam-se difíceis de seguir e com resultados obsoletos. Neste caso, recomenda-se proceder uma nova análise de todos os procedimentos envolvidos de modo a torná-los mais ágeis e efetivos. Risco, freqüência de ocorrência, alinhamento dos objetivos dos


negócios e da qualidade devem ser considerados quando da definição das ações preventivas e corretivas limites. Nem todas as ações devem ter o mesmo peso quando do estabelecimento dos limites. Os riscos devem ser utilizados para priorizar as ações, determinando quão rápido e de que forma serão realizadas as investigações e implementadas as ações, para prevenir ou corrigir as não-conformidades. Geralmente programas simplistas de ações preventivas e corretivas tendem a falhar no fornecimento de visibilidade por meio de muitas fontes de informações, que podem detectar o mesmo problema ou problemas similares (inspeções de entrada, inspeções durante o processo, aceitação final, instalação, serviço e reclamações de clientes), limitando a capacidade de reconhecer quando as

ações limites já foram alcançadas. Muitas empresas iniciam esforços contínuos de melhorias por fora do programa de ações preventivas e corretivas como uma forma rápida de melhorar o negócio ou a eficiência produtiva em que segurança, usuário ou risco sanitário, muitas vezes, não são levados como fator de consideração. Contudo, se todas as ações forem traçadas considerando o uso do programa de ações preventivas e corretivas para obter recursos, estas alinharão os objetivos de negócios da empresa com os da qualidade, enviando uma mensagem a toda a organização e minimizando a percepção de constantes alterações de prioridades.

Para refletir

Entender a interdependência entre o núcleo de processos do SGQ,

“Geralmente programas simplistas de ações preventivas e corretivas tendem a falhar no fornecimento de visibilidade por meio de muitas fontes de informações, que podem detectar o mesmo problema ou problemas similares (inspeções de entrada, inspeções durante o processo, aceitação final, instalação, serviço e reclamações de clientes), limitando a capacidade de reconhecer quando as ações limites já foram alcançadas.”

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Legislação o controle gerencial, as auditorias da qualidade e o programa de ações preventivas e corretivas é de grande importância. Destaque deve ser dado ao iniciar e manter um ambiente no qual os objetivos do negócio e da qualidade estejam integrados, reconhecendo que os colaboradores serão motivados em direção às metas e aos objetivos da empresa quanto mais a percepção dos conflitos esteja minimizada. O regulamento do SGQ indica o resultado final necessário em vez de prescrever especificamente a maneira como um fabricante deve agir em conformidade com este regulamento. É responsabilidade do fabricante ou importador usar de bom senso ao desenvolver um sistema da qualidade que aplique corretamente os regulamentos do SGQ a seus produtos e operações específicas. É o fabricante ou o importador e não a ANVISA que assume a responsabilidade pela fabricação, importação, armazenamento e distribuição de produtos para a saúde de alta qualidade. Contudo, vale dizer que as empresas podem se beneficiar com as diretrizes e os modelos de procedimentos e formulários desenvolvidos ou adotados em outros modelos de SGQ, em um esforço para estar em conformidade com o objetivo do regulamento. Adotar os regulamentos do SGQ para dispositivos médicos é, sem dúvida, uma atitude sensata e de bom senso, atendendo também aos objetivos da saúde pública - ótimas razões para que a ANVISA incentive a conformidade aos requisitos. Entretanto, um pré-requisito implícito para a conformidade a um regulamento é o claro entendimento de seu conteúdo e sua perfeita aplicação prática sintonizada, alinhada aos objetivos estratégicos da empresa. O regulamento do SGQ define os elementos mínimos de um sistema para projetar, desenvolver, fabricar,

“O regulamento do SGQ indica o resultado final necessário em vez de prescrever especificamente a maneira como um fabricante deve agir em conformidade com este regulamento. É responsabilidade do fabricante ou importador usar de bom senso ao desenvolver um sistema da qualidade que aplique corretamente os regulamentos do SGQ a seus produtos e operações específicas.”

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armazenar e distribuir um produto para a saúde. Complementarmente, os fabricantes e importadores de produtos correlatos deveriam considerar que suas necessidades da qualidade deveriam ir além dos elementos básicos, em razão da necessidade adicional de atender às exigências de qualidade da companhia como um todo. Um número elevado de nãoconformidades internas ou de campo recorrentes demonstra um SGQ não consistente, determina a necessidade de rever e refazer os treinamentos e de verificar a eficiência das ferramentas de monitorização utilizadas e a eficácia da comunicação entre os setores. A satisfação do cliente é uma ferramenta de avaliação do SGQ. O verdadeiro conteúdo da gestão de qualidade introduzida pela RDC nº 59/2000 é a implementação de melhorias contínuas para a qualidade de formas concretas e completas nos produtos e serviços oferecidos e, conseqüentemente, a obtenção da Certificação de BPF&C. A visão da certificação determina um SGQ que agregue valor e conexão entre normas para melhor atender aos requisitos das empresas e a implantação da cultura de ações preventivas que assegurem a minimização das ações corretivas. O CBPF&C é uma ferramenta de consolidação da empresa perante seus clientes e sua obtenção agrega valor ao produto oferecido, permitindo segurança ao profissional da saúde e eficácia ao usuário. A obtenção do CBP&F é uma etapa do SGQ e sua manutenção ou renovação é um trabalho de equipe, em que todos se tornam ainda mais responsáveis a cada nova certificação, a cada nova etapa cumprida.

O futuro das BPF

Prioritariamente, deve ocorrer a continuidade de intercâmbio entre o

setor regulador e o setor regulado. A manutenção do sistema como um todo não depende apenas do setor regulado, cabe igualmente ao setor regulador em suas diferentes esferas manter auditores treinados, motivados e em crescente qualificação e, conforme a necessidade, também um crescente número de auditores. Com a crescente descentralização do setor regulador é cada vez mais necessária a coordenação da ANVISA no sentido de manter auditores qualificados de forma uniforme, independente do local de sua atuação. Conforme as normas vigentes, espera-se que a CBP&F seja mais que um instrumento compulsório para a obtenção e a revalidação dos registros de todos os produtos para a saúde oferecidos ao consumo, mas a garantia de que somente produtos seguros e eficazes sejam oferecidos aos consumidores, independentes da origem de sua fabricação e do fornecedor.

Leila de Mendonça Garcia é graduada em farmácia industrial pela Universidade Federal Fluminense (UFF), pós-graduada em controle de infecção hospitalar pela Universidade Gama Filho (UGF) e pósgraduanda em vigilância sanitária pela Universidade Estácio de Sá. Foi presidente da Associação Brasileira de Farmacêuticos (ABF) e atualmente é participante dos Comitês de Normas Técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)/ Associação dos Fabricantes de Produtos Médicos e Odontológicos (ABIMO) (CB 26 e CB 23), além de sócia e responsável técnica da Hartmann Indústria e Comércio de Produtos Médico-Hospitalares. Luiz Eduardo Costa é graduado em engenharia eletrônica pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro (CEFET/RJ), pós-graduado em administração hospitalar pelo Centro de Pós-Graduação São Camilo e em engenharia econômica pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), MBA em marketing estratégico pela Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV) e mestrado em engenharia biomédica pelo Programa de Engenharia Biomédica da Coordenação de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PEB/COPPE/UFRJ). Iniciou sua carreira em empresa multinacional alemã, de grande notoriedade pelo seu mix diversificado de produtos correlatos, na qual passou 15 anos, exercendo atividades em áreas fabris e comerciais, além de chefe da Unidade de Tecnovigilância (UTVIG) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), tendo atuado também como inspetor/auditor de empresas para fins de Certificação de Boas Práticas de Fabricação de Produtos Médicos, conforme a RDC nº 59, de 27 de junho de 2000, e participou como instrutor convidado pela ANVISA de diversos treinamentos sobre a RDC nº 59/2000. Atualmente é sócio da Sisqualy - Gestão Empresarial e Representação.

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