Onco& Ano V - Ed. 28

Page 1

www.revistaonco.com.br

Nacional

Oncologia para todas as especialidades

julho/agosto 2015 º !NO s N

realização:

Entrevista O oncologista clínico Carlos Gil chama a atenção para o debate em torno dos custos das novas terapias apresentadas na ASCO, tema considerado por ele especialmente importante no caso brasileiro, com pacientes dependentes do SUS

Políticas de Saúde Projeto de lei tenta destravar a pesquisa clínica no país

Gestão Uso do conceito lean avança na área hospitalar

ASCO amplia abrangência da imunoterapia do bem | pulmão | especiais EHA e AUA


sumário entrevista

06

Carlos Gil fala sobre os tratamentos imunoterápicos, que devem se confirmar como novo padrão da oncologia e sobre acesso aos novos tratamentos ainda é intensa

capa

11

O 51º ASCO inovou ao destacar a multidisciplinaridade em sua principal sessão e ao apresentar novidades promissoras em imunoterápicos

ASCO 2015

19

Comentários de médicos da Oncologia D’Or sobre as novidades trazidas na reunião anual da ASCO

imunoterapia

29

Imunoterapia no tratamento do melanoma – avanços terapêuticos Andréia Melo

gastrointestinal

32

Metástases hepáticas de câncer colorretal que desaparecem durante a quimioterapia Maria de Lourdes Lopes de Oliveira

gestão

37

Aplicando lean na saúde Carlos Frederico Pinto e Flávio Battaglia

cabeça e pescoço

42

Cuidados orais no paciente irradiado Célia Maria Pais Viégas e Carlos Manoel Mendonça de Araújo

curtas D’Or

48

As últimas notícias sobre o Grupo Oncologia D’Or

palavra do gestor

49

O tripé do cuidado

mundo virtual

50

Sites e aplicativos que ajudam médicos a se manter sempre atualizados para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes

curtas

51

Novidades sobre pesquisas, parcerias e eventos: um giro pelo mundo da oncologia

IDOR

52

Por um tratamento mais específico

políticas de saúde

53

Tentativa de senadores é criar um marco regulatório que torne menos burocrático e mais transparente inclusão de pacientes estudos globais

especial EHA

56

O 20º Congresso da European Hematology Association contou com a participação de 10 mil médicos hematologistas

especial AUA

58

Preservação da função erétil no centro do debate

acontece

59

Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização e outros tantos eventos da área

do bem

60

Grupos de apoio ao paciente e hospitais investem na disseminação de informações como forma de ajudar na prevenção, diagnóstico e cuidados das doenças oncológicas

campanhas

62

Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e nas redes sociais

calendário

66

Programe-se: eventos e congressos que estão por vir


Conselho editorial*

I – Cancerologia clínica Oncologia clínica: Aline A. Porto Rocha Lima (SP) Ana Carolina Leite (CE) Antonio Carlos Barcellos Bassani (SP) Antonio Evandro de Araújo Jr. (TO) Bruno Carvalho Oliveira (DF) Bruno de Araújo L. França (RJ) Bruno Pinheiro Costa (RJ) Carlos Eduardo Sampaio dos Santos (RJ) Claudio Calazan do Carmo (RJ) Cristiane Amaral dos Reis (TO) Daniel Herchenhorn (RJ) Davimar M M Borducchi (SP) Duilio Rocha Filho (CE) Eduardo Cronemberger (CE) Eduardo Jorge Medeiros (RJ) Fabiane Kellem O. S. Cesário (SP) Fernando Correia Cruz (RJ) Gilberto Luiz da Silva Amorim (RJ) Glauber Leitão (PE) Leonardo Atem (CE) Markus Gifoni (CE) Henrique Zanoni (SP) Jacques Bines (RJ) Jayme José Gouveia (PE) Jose Eduardo de Almeida Lamarca (RJ) Luiz Alberto Mattos (PE) Maria de Lourdes Lopes de Oliveira (RJ) Martha Tatiane M. dos Santos (DF) Múcio de Alcantara Leister (RJ) Patricia Maira C. A. de Sousa (DF) Rogerio Pastore Bassit (SP) Valeska Marques de Menezes Machado (DF)

*Em reformulação

Editores clínicos nacionais André Moll Anderson Silvestrini Carlos Gil Ferreira Daniel Herchenhorn Juliane Musacchio Paulo Sérgio Perelson Rodrigo Abreu e Lima

Editores clínicos regionais Onco& Brasília Lucianno Henrique P. dos Santos Onco& Rio de Janeiro Andréia Melo Onco& Nordeste Markus Gifoni Onco& São Paulo Caetano da Silva Cardial Carlos Frederico Pinto

Revisão Médica Ana Carolina Nobre de Mello

Gustavo Bettarello (DF) Joana Curi (PE) João Glasberg (SP) José Lucas Pereira Junior (DF) Renata Lyrio Rafael Baptista (RJ) Paulo Henrique A. Soares (DF) Roberto Penello (SP) Vitor César da Silva Sforni (DF)

III – Patologia Alessandra F. Nascimento (RJ)

IV – Cuidados paliativos e dor Lisiana Wachholz Szeneszi (RJ)

V– Radioterapia Carlos Manoel M. Araújo (RJ) Celia Maria Paes Viegas (RJ) Denise Magalhães (RJ) Felipe Erlich (RJ) Maria Feijóo (RJ) Robson Ferrigno (SP)

VI – Qualidade Adriana Crespo (RJ) Edivaldo Bazilio (DF) Stela Maris (SP)

VII – Gestão Carlos Loures (DF) Flavio José Reis (DF) Helio Calabria (RJ) Leonardo Nunes (RJ) Sergio Cortes (RJ)

II - Onco-hematologia: Adriana Alves de Souza Scheliga (RJ) Andrea Farag Lago Martinez (RJ) Andresa Lima Melo (DF)

Ano 5 • número 28 julho/agosto 2015 Publisher Simone Simon simone@revistaonco.com.br

Impressão: Ipsis Gráfica Tiragem: 25 mil exemplares (Nacional – 3.570, Rio de Janeiro – 10.940,

Editorial Jiane Carvalho jianecarvalho@revistaonco.com.br

ISSN: 2179-0930

São Paulo – 6.800, Brasília – 2.150, Nordeste – 1.540)

Subeditor Gabriel Ferreira gabriel@revistaonco.com.br Direção de arte/Prepress Ione Franco ionefranco@revistaonco.com.br Comercial Bruno Lima bruno@revistaonco.com.br Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva

4

julho/agosto 2015 Onco&

Jornalista responsável: Jiane Carvalho (MTb 23.428/SP) Colaboraram nesta edição: Adenalva Sousa Beck, Ana Carolina Nobre de Mello, Anderson Silvestrine, Andréia Melo, Carlos Frederico Pinto, Carlos Gil Ferreira, Carlos Manoel Mendonça de Araújo, Célia Maria Viégas, Daniel Herchenhorn, Daniela Barros, Fabiola Vasconcelos Alves, Flávio Battaglia, Flávio Brito Filho, Juliane Musacchio, Liane Pinto, Maria de Lourdes Lopes de Oliveira, Maria Stefania, Martha San Juan França, Mauro Pinheiro, Rodrigo Abreu e Lima, Simone Rosa, Thais dos Santos R. Abreu, Wagner Diniz de Paula Acompanhe a Onco& no Facebook e no Twitter

A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, a partir de 2015 é uma realização da Oncologia D’Or. Traz informações sobre oncologia a profissionais de todas as especialidades médicas. De circulação Trimestral, tem distribuição nacional e gratuita por todo o território nacional. A reprodução do conteúdo da revista é permitida desde que citada a fonte. A opinião dos colaboradores não reflete necessariamente a posição da revista.

www.oncologiador.com.br www.revistaonco.com.br (21) 2126 0150


O paciente sob um olhar multidisciplinar

A

Onco& CHEGA À SUA 27ª EDIÇÃO – A PRIMEIRA SOB A REALIZAÇÃO DA ONCOLOGIA D’OR – CHAMANDO A ATENÇÃO PARA A NECESSIDADE DE UM

acompanhamento multidisciplinar do paciente oncológico. Os novos paradigmas incluem, ao lado das abordagens tradicionais cirúrgicas e farmacológicas, iniciativas como acompanhamento psicológico, nutricional, fisioterapêutico e até procedimentos considerados alternativos, como ioga. E não é apenas nas clínicas particulares – o próprio Sistema Único de Saúde (SUS) tenta equipar melhor os Centros de Alta Complexidade em Oncologia para esse atendimento multidisciplinar. A Onco& traz, na reportagem de capa, um panorama abrangente dessas iniciativas e seus efeitos na qualidade de vida do paciente. No câncer de próstata, por exemplo, 15 minutos diários de exercícios programados, segundo um estudo que apresentamos na reportagem, foram suficientes para reduzir a taxa de mortalidade em pacientes com a doença. Também nesta edição, a Onco& entrevista Gilberto Amorim, coordenador do Grupo de Oncologia Mamária da Oncologia D’Or. O especialista destaca estudos apresentados no Simpósio de San Antonio, nos Estados Unidos, que já alteram a forma de abordagem do câncer de mama. “Os resultados positivos do bloqueio da função ovariana como aliado na terapia hormonal jogaram luz sobre o que pode ser um novo caminho para o tratamento de pacientes com câncer de mama”, chama a atenção Amorim. Outros dois eventos globais têm espaço nesta edição da Onco&. A hematologista Juliane Musacchio apresenta as novidades do 56º Congresso da Sociedade Ameri-

cana de Hematologia ASH, principalmente voltadas para o tratamento dos pacientes portadores de linfoma e mieloma múltiplo. Já o coordenador científico da Oncologia D’Or, Daniel Herchenhorn, apresenta dois estudos relevantes divulgados no maior evento para especialistas em tumores geniturinários, o ASCO GU. Lidar com o arsenal de informação ao qual o paciente tem acesso – muitas vezes sem qualquer filtro crítico – é desafio cada vez mais premente no dia a dia do médico. A seção Do Bem usa como gancho um estudo de especialistas da Johns Hopkins, publicado na revista Science, para discutir o tema. O estudo causou polêmica quando os autores optaram por chamar de “má sorte” (bad luck, no original em inglês) um item considerado fundamental para explicar a maior incidência da doença. Especialistas apontam, sim, a existência de cânceres atribuídos ao acaso, mas são enfáticos ao apontar fatores comportamentais que colaboram com essa bad luck. Nos artigos, espaço para novas opções em radioterapia para pacientes com tumores tanto primários quanto metastáticos, tema apresentado por Lilian Faroni e Aluísio Castro. Os avanços da oncogenética na compreensão das chamadas síndromes de predisposição hereditária ao câncer (SPHC) são o foco do artigo de Ana Carolina Leite, da Clínica Fujiday. Fechamos a edição com o artigo sobre a utilização de estudos imuno-histoquímico em patologia clínica, de autoria de Alessandra F. Nascimento. Boa leitura!

Simone Simon Publisher Contato: simone@iasoeditora.com.br

Onco& setembro/outubro Onco& abril/maio 2012 2015

55


entrevista

Avanços e preocupação com os custos na ASCO 2015 Tratamentos imunoterápicos devem se confirmar como novo padrão da oncologia, mas discussão sobre acesso aos novos tratamentos ainda é intensa na visão de Carlos Gil Ferreira

Divulgação

Por Gabriel Ferreira

O

ONCOLOGISTA CLÍNICO E PESQUISADOR CARLOS

GIL É UMA REFERÊNCIA NACIONAL E INTERNACIONAL QUANDO O ASSUNTO SÃO OS TUMORES

Carlos Gil Ferreira * Membro efetivo da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), com Ph.D. em câncer de pulmão e desenvolvimento de novas drogas antineoplásicas pela Vrije Universiteit, de Amsterdã

Contato: carlosgil.ferreira@oncologiador.com.br

6

julho/agosto 2015 Onco&

torácicos, sua especialidade. Membro efetivo da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO) e de outras entidades internacionais, como a Associação Internacional para o Estudo do Câncer de Pulmão (IASLC) e a Associação Americana de Pesquisa sobre Câncer (AACR), Gil tem Ph.D. em câncer de pulmão e desenvolvimento de novas drogas antineoplásicas pela Vrije Universiteit, de Amsterdã. Seu lado pesquisador o levou à chefia do Serviço de Pesquisa Clínica do Inca, cargo que ocupa desde 2002. Além disso, Gil é o idealizador e investigador principal do Projeto Banco Nacional de Tumores (BNT), proponente e coordenador da Rede Nacional de Pesquisa Clínica em Câncer (RNPCC) e da Rede Nacional de Desenvolvimento e Inovação de Fármacos Anticâncer (REDEFAC). Desde março

deste ano, o oncologista faz parte do time de especialistas do Grupo Oncologia D’Or, onde atua tanto na área clínica como na de pesquisa, através do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR). Com o olhar de quem tem a experiência tanto do dia a dia dos consultórios como dos laboratórios de pesquisa, Gil viu com animação muitas das novidades trazidas ao longo da reunião anual da ASCO em 2015. O especialista destacou a consolidação da imunoterapia como uma nova era para o tratamento dos pacientes oncológicos. “É uma vertente que se consolida como uma nova era nos tratamentos”, afirma. “Tivemos uma série de estudos que serviram para ressaltar a importância que esse tipo de terapia deve ter daqui para a frente em diversos campos da oncologia.” Apesar dos bons olhos com que vê os avanços apresentados na ASCO, Gil destaca o desafio que se impõe aos médicos brasileiros: por aqui há pou-


cas chances de aplicação imediata da maioria das descobertas. Isso acontece porque o tempo que os novos tratamentos demoram para ser aprovados pelos órgãos reguladores brasileiros é muito maior do que o registrado em outros países, sobretudo nos Estados Unidos. “E esse ‘gap’ só vem aumentando, ao invés de diminuir”, diz ele. Com isso, apesar das ótimas perspectivas trazidas pela reunião anual da sociedade americana, poucas serão as mudanças práticas no dia a dia dos especialistas brasileiros. Na área de especialidade de Gil – o câncer de pulmão –, por exemplo, não há nenhuma alteração significativa para ser feita na prática clínica dos médicos brasileiros. A maior mudança é em relação ao diagnóstico, com os resultados do estudo que apontou que pacientes com câncer de pulmão mutação no exon 14 do gene met respondem positivamente ao uso de crizotinibe. Além dos aspectos mais científicos, um ponto destacado por Gil ao longo das apresentações da ASCO é a maior preocupação com os custos das novas terapias por parte dos pesquisadores. Segundo ele, esse é um aspecto que vem ganhando força ao longo dos últimos anos e que, neste ano, entrou de vez para os debates. “Os novos tratamentos tendem a ser muito mais modernos e caros, o que impacta nos sistemas de saúde de todo o mundo.” A preocupação é especialmente válida no caso de países como o Brasil, em que parcelas significativas da população têm dependência total do sistema público de saúde para realizar seus tratamentos – e, por causa dos altos custos de incorporação das novas drogas ao rol de medicamentos, tendem a demorar a ter acesso às abordagens mais modernas.

Onco& – Qual a importância para um médico brasileiro de participar de um evento como a ASCO? Carlos Gil – A ASCO é uma reunião muito importante para quem quer se inteirar do que vem sendo pesquisado e conhecer o rumo que a oncologia vai pesquisar. Por mais que muitos estudos demorem a afetar nossa prática clínica no Brasil, é importante saber a forma como a oncologia vai raciocinar daqui para a frente. E isso a ASCO nos mostra com

clareza. Não apenas em termos de medicamentos, mas também para entender até mesmo questões mais práticas como, por exemplo, a forma como têm se comportado as fontes de financiamento – afinal essas questões também têm impacto direto na nossa prática.

Onco& – Quais seriam os principais pontos que o senhor destacaria da edição deste ano da ASCO? Carlos Gil – São dois os aspectos que merecem maior destaque. Na verdade, são questões que já vinham apontando nos últimos anos como elementos de destaque, mas que agora entram de vez para o centro do debate e dos tratamentos. Uma dessas questões tem aspecto totalmente científico e foi muito debatida ao longo dos cinco dias de evento. São os tratamentos imunoterápicos, que se consolidaram como uma nova era nos tratamentos. Tivemos uma série de estudos que serviram para ressaltar a importância que esse tipo de terapia deve ter daqui para a frente, em diversos campos da oncologia.

Onco& – E qual é o outro aspecto que o senhor destaca como grande ponto da reunião anual deste ano? Carlos Gil – É uma questão que tem a ver com a pesquisa científica, mas não só com ela. É a questão dos custos das pesquisas e dos medicamentos. Esse é um tema que vem gerando preocupação já há algum tempo e que vem a cada reunião com mais força. De certa forma, o avanço dos tratamentos imunoterápicos tem relação com a necessidade de debater e pensar melhor essa questão de custos, já que esses são tratamentos muito mais modernos e caros, que vão impactar diretamente no orçamento dos sistemas de saúde de todo o mundo. Até pouco tempo atrás, na hora de fazer uma pesquisa ou de anunciar algum avanço, a preocupação era unicamente técnica. O que se pensava era nos ganhos que essa nova droga poderia trazer para o paciente. Agora, o debate sobre o quanto vai custar esse tratamento também é importante. Hoje em dia se pensa muito mais em como o poder público vai poder bancar tantas novidades.

A maior mudança é em relação ao diagnóstico, com os resultados do estudo que apontou que pacientes com câncer de pulmão mutação no exon 14 do gene met respondem positivamente ao uso de crizotinibe

Onco& julho/agosto 2015

7


Onco& – Os avanços em imunoterapia e essa

O grande destaque na ASCO ficou com os avanços registrados nas pesquisas relativas ao melanoma. Esse é um segmento que teve grandes ganhos por causa das descobertas relacionadas à imunoterapia, que devem ter reflexos significativos no trabalho dos médicos que atuam nessa área

maior preocupação com os custos dos tratamentos fizeram com que essa edição da ASCO fosse diferente das outras de que o senhor já participou? Carlos Gil – Frequento a ASCO continuamente há 15 anos. E posso dizer que essa foi uma reunião diferente. Acho que o congresso amadureceu muito. Antigamente, era apenas um espaço para apresentação de estudos, para mostrar o que tinha de novidade em termos de tratamento. Agora é um espaço de discussão mesmo, em que podem acontecer debates como esse sobre o custo dos medicamentos. Essa preocupação com o acesso é muito genuína. E é uma tendência mundial. Antes se falava muito no custo como um impeditivo para o acesso aos tratamentos nos países em desenvolvimento, mas agora essa questão está chegando também aos desenvolvidos. É muito saudável que se faça esse debate.

Onco& – Pensando em como se organiza o sistema de saúde brasileiro, a questão dos custos é uma discussão importante para os médicos que atuam no país, não? Carlos Gil – Em países como o Brasil, esse debate se faz ainda mais importante. Por aqui temos um número muito grande de pacientes que dependem integralmente do sistema público de saúde para se tratarem, e a inclusão de novos tratamentos, muitas vezes com altos preços, acaba acarretando em custos bastante elevados para os cofres públicos. Sem dúvida esse é um debate bastante atual e que precisa continuar sendo feito em todo o mundo.

Onco& – Entre as diversas inovações e mudanças trazidas pela ASCO, alguma deve impactar sua prática clínica imediatamente? Carlos Gil – Na minha área de atuação especificamente, não há nenhuma grande mudança que já pudemos introduzir no consultório assim que voltamos do evento. Temos tido muitas descobertas relacionadas à imunoterapia que devem trazer impactos significativos para a prática clínica, mas ainda não há nada disponível no Brasil nessa linha

8

julho/agosto 2015 Onco&

e acredito que ainda irá demorar um bom tempo até que possamos sentir alguma mudança de fato. O que tivemos de avanço mais prático e que pode ser aplicado desde já está mais relacionado à área de diagnóstico molecular. Um dos estudos apresentados na ASCO mostrou que pacientes de câncer de pulmão que apresentam uma mutação no exon 14 do gene met respondem bem a um tipo de medicação que já utilizávamos no dia a dia da nossa prática. Isso é bom porque temos uma nova abordagem para tratar esses casos sem ter a necessidade de aguardar o surgimento ou a aprovação de uma nova droga. Então podemos começar a aplicar isso desde já. A partir de agora, ao receber um caso no consultório, teremos que passar a estudar essa mutação, que antes não era olhada pelos médicos na hora da realização do diagnóstico.

Onco& – E para as outras especialidades? O senhor notou alguma mudança significativa? Carlos Gil – O grande destaque ficou com os avanços registrados nas pesquisas relativas ao melanoma. Esse é um segmento que teve grandes ganhos por causa das descobertas relacionadas à imunoterapia. Foi um ponto muito importante da reunião, com excelentes resultados de pesquisas, que devem ter reflexos significativos no trabalho dos médicos que atuam nessa área. Onco& – O senhor teria algum comentário específico para fazer sobre os estudos envolvendo o nivolumabe? Carlos Gil – Tanto o nivolumabe como os outros imunoterápicos já são uma realidade na oncologia. Agora o que todos os especialistas precisam é aprender a lidar com essa nova classe de medicamentos. Precisamos, por exemplo, investigar os grupos de pacientes que se beneficiam mais desse tipo de medicamento, para saber ao certo a quem devemos indicar esse tratamento. No caso específico dos médicos brasileiros, temos também que trabalhar para que o maior número possível de pacientes tenha acesso a essas drogas o mais rápido possível, afinal esse é o padrão que começa a se estabelecer e é importante que ele esteja disponível.


Onco& – O senhor comentou que os novos tratamentos mais significativos devem demorar a chegar ao Brasil. O problema da demora para a aprovação de novas drogas ainda é um dos maiores desafios enfrentados pelos oncologistas no país ou temos tido avanços? Carlos Gil – Na verdade, eu não vejo sinal algum de melhora. Tenho a impressão de que o problema é uma questão ideológica. Ao invés de termos indicativos de que a situação vai ficar mais tranquila daqui para a frente, temos sinais contrários. A aprovação de novas drogas e tratamentos é um problema crônico do Brasil, e temos que lidar com uma grande defasagem em relação ao que existe em outros países, onde os processos caminham mais rapidamente. Esse “gap” só vem aumentando, ao invés de diminuir.

Onco& – Entre as novidades trazidas pela ASCO, há destaque em ganho de qualidade de vida para os pacientes? Essa é uma preocupação que tem se mostrado crescente? Carlos Gil – Essa é uma preocupação que temos notado, sim. As novas drogas tendem a ser menos tóxicas do que as mais tradicionais e isso tem um impacto direto na questão da qualidade de vida dos pacientes. Com os tratamentos imunológicos, mais uma vez essa tendência se reforça. Essas drogas também têm resultados bem mais interessantes quando analisamos esse aspecto dos efeitos que apresentam durante o tratamento, gerando menores impactos à qualidade de vida dos pacientes. Onco& – Isso se aplica também aos pacientes mais idosos? O cuidado com esse público tem recebido maior atenção? Carlos Gil – A preocupação com as pessoas acima dos 70 anos é genuína. No mundo de hoje, as pessoas vivem cada vez mais. Na Europa, já é comum encontrar pessoas com mais de 80 anos, então temos, sim, que pensar nesse grupo da população. É um tipo de paciente que faz

10

julho/agosto 2015 Onco&

parte da nossa realidade, que encontramos todos os dias no nosso consultório, então temos que ter a preocupação de oferecer aos idosos e aos muito idosos os tratamentos que causem menos impacto em sua qualidade de vida.

Onco& – E os ganhos de sobrevida? Eles continuam sendo significativos?

Carlos Gil – Essa questão da sobrevida já vem tendo ganhos bastante consideráveis ao longo dos últimos anos. Desde que se começou a pesquisar com mais intensidade as chamadas terapias alvo, aquele tipo de tratamento que usa drogas para identificar e atacar especificamente as células cancerígenas e provocar pouco dano às células normais, essa é uma questão que tem evoluído muito. E, mais uma vez, as imunoterapias devem ter um papel muito importante nesse sentido daqui para a frente. Especialmente na minha área, que é o câncer de pulmão, sempre temos muitas expectativas sobre os resultados envolvendo ganhos de sobrevida. Como esse é um tipo de tumor que mata muito, qualquer ganho, mesmo que seja de poucos meses, já costuma representar uma grande vitória.

Onco& – Além de todos os avanços em imunoterapia, houve algum estudo que apontou novo uso para alguma droga que já fizesse parte da sua prática clínica? Carlos Gil – Naquele estudo que apontou o papel da mutação exon 14 do gene met, tivemos certo impacto desse tipo, sim. Isso porque o crizotinibe, que era uma droga que já utilizávamos para pacientes que tinham outros tipos de mutação, também pode ser recomendado nesse caso. Com as pesquisas moleculares, esse é um tipo de avanço que esperamos ver cada vez mais. Isso é muito importante, pois, uma vez que o tratamento já existe, só nos resta passar a adotá-lo para um grupo maior de pacientes.


capa

ASCO 2015: Transformando dados em aprendizado Com o tema central “Illumination & innovation – transforming data into learning”, o 51º congresso da ASCO inovou ao destacar a multidisciplinaridade em sua principal sessão e ao apresentar novidades promissoras em imunoterápicos

Por Daniela Barros

M M

AIS DE 37e MIL PESSOAS PARTICIPARAM Sessão plenária as suas surpresas

DO

51ºDEDO37CONGRESSO DA SOCIEDADE AIS MIL PESSOAS ANUAL PARTICIPARAM DO 51º MERICANA A DENUAL ONCOLOGIA CLÍNICA (AME CAONGRESSO DA SOCIEDADE AMERI -rican Society of Clinical Oncology – ASCO), CANA DE ONCOLOGIA CLÍNICA (AMERICAN SOCIETY que OF neste ano teve um–recorde quase mil teve abstracts Clinical Oncology ASCO),de que neste6ano um submetidos para 6revisão. Quase submetidos a metade dopara púrecorde de quase mil abstracts blico presente de fora dos Estados Unidos revisão. Quase aveio metade do público presente veio e cerca dedos 3 mil resu- mos foram enviados de fora Estados Unidos e cerca de 3 de milmais resu-de 80 países. mos foram enviados de mais de 80 países. Durante a cerimônia de abertura, o presidente da ASCO, Dr. Peter Paul Yu, sintetizou o teor desse grandioso evento para a comunidade científica: “Hoje, como oncologistas, nós estamos no topo de uma grande oportunidade. Nos próximos 50 anos trabalharemos juntos para acumularmos conhecimento e aprendizado em benefício do indivíduo com câncer, para que assim mais pacientes – a maioria deles, talvez todos – possam ser curados”. A ASCO de 2015 se diferenciou por colocar em pauta os valores e os custos do tratamento oncológico. Pela primeira vez em sua história a sessão plenária, que reuniu mais de 20 mil expectadores, incluiu uma discussão específica sobre esse tema, ministrada pelo Dr. Leonard Saltz, médico do Memorial Sloan Kettering Cancer Center.

Mas o que realmente motiva os presentes nessa sessão tão aguardada são os resultados de estudos criteriosamente selecionados pela ASCO e que prometem mudar a prática médica. Neste ano, de maneira inédita, foram eleitos temas que surpreenderam os presentes: respostas conclusivas sobre o impacto de tratamentos menos agressivos em sobreviventes de câncer na infância; o momento ideal da cirurgia no câncer oral; o uso da radiação em pacientes com metástases cerebrais e novas opções em imunoterápicos para pacientes com melanoma. Conforme pontuou o Dr. Yu, a ASCO deseja manter uma abordagem multidisciplinar da doença, tratando e se preocupando com todas as suas fases. Por isso a inclusão de aspectos que extrapolam a prática clínica. Imunoterapia no tratamento do melanoma

Um estudo1 randomizado fase III indicou que o tratamento inicial apenas com o nivolumabe ou associado ao ipilimumabe é significativamente mais eficaz do que o ipilimumabe isoladamente no tratamento do melanoma. O nivolumabe e o ipilimumabe são anticorpos monoclonais que bloqueiam o PD-1 e o CTLA-4, Onco& julho/agosto 2015

11


Muitos pacientes que interromperam a imunoterapia precocemente continuam com bons resultados. Esse benefício prolongado é explicado pelo fato de a imunoterapia agir ativando o sistema imune ao invés de atingir o tumor diretamente

respectivamente. Ambos os tratamentos, comumente chamados de inibidores de checkpoints imunológicos, basicamente aumentam a capacidade do sistema imune em combater o câncer. O uso apenas do nivolumabe mais do que dobrou o tempo médio da progressão da doença, comparado ao ipilimumabe (6,9 meses versus 2,9 meses), e o benefício foi ainda maior quando o ipilimumabe e o nivolumabe foram combinados (11,5 meses). As taxas de resposta também foram substancialmente superiores nos pacientes que receberam o tratamento combinado (57,6%) e o nivolumabe (43,7%) apenas, quando comparado ao ipilimumabe (19%). “Nós estamos muito entusiasmados com as observações iniciais sobre a eficácia desta combinação feitas neste grande estudo fase III”, comentou o autor principal do estudo, Jedd Wolchock, chefe do Serviço de Melanoma e Imunoterapêuticos do Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York. “O nosso estudo também sugere que pacientes com um marcador tumoral específico parecem se beneficiar deste tratamento combinado, enquanto outros indivíduos podem responder tão bem quanto apenas com o nivolumabe. Isso ajudará os médicos a definir qual o melhor tratamento para os seus pacientes”, complementa. Como esperado, a taxa de efeitos adversos graves relacionados às drogas foi maior entre os indivíduos tratados com a combinação dos dois agentes (55%). Trinta e seis por cento dos pacientes nesse grupo tiveram que parar o tratamento em função desses efeitos. O Dr. Wolchok ressaltou que estudos prévios demonstraram que muitos pacientes que interromperam a imunoterapia precocemente continuam com bons resultados. Esse benefício prolongado é explicado pelo fato de a imunoterapia agir ativando o sistema imune ao invés de atingir o tumor diretamente. Ainda não se sabe por quanto tempo os pacientes precisam ser tratados para ativarem completamente o sistema imune, e a duração mínima da terapia provavelmente varia de paciente para paciente. Para mais informações, leia o artigo do Dr. Daniel Herchenhorn na página 19. Redução na mortalidade tardia entre sobreviventes de câncer na infância

Durante as últimas quatro décadas, o trata-

12

julho/agosto 2015 Onco&

mento de muitos casos de câncer pediátrico tem sido modificado com o objetivo de obter taxas de sobrevida maiores e também de reduzir o risco de efeitos adversos tardios graves. A mortalidade tardia foi avaliada em 34.033 sobreviventes por cinco anos (diagnosticados < 21 anos de idade, de 1970 a 1999, acompanhamento mediano de 21 anos, variação de 5-38 anos) utilizando modelos de incidência cumulativa e regressão de Poisson ajustados para fatores demográficos e de doença para calcular o risco relativo (RR) e os intervalos de confiança de 95%. Os pesquisadores concluíram que a amostra desse estudo oferece evidências de que a estratégia de modificar o tratamento para reduzir a incidência de efeitos adversos tardios e a promoção de um diagnóstico precoce estão se traduzindo com sucesso em uma redução significativa na mortalidade tardia observada2. “Há 50 anos, somente uma em cinco crianças sobreviveria ao câncer, mas atualmente mais de 80% estão vivas cinco anos após o diagnóstico. Esses sobreviventes ainda crescem com um risco aumentado de morrerem de efeitos tardios, como doença cardiovascular e cânceres secundários”, explicou o autor do estudo, Gregory T. oncologista pediátrico do St. Jude Children’s Research Hospital. “Agora nós não somente ajudamos mais crianças a sobreviver ao câncer primário como também aumentamos sua expectativa de vida global ao reduzirmos a toxicidade do tratamento”, finaliza. Dissecção do pescoço eletiva versus terapêutica no câncer de cavidade oral com linfonodo clinicamente negativo

Um estudo3 randomizado fase III respondeu a questões há muito tempo pendentes sobre o momento ideal para se fazer a cirurgia do linfonodo do pescoço em pacientes com câncer de cavidade oral inicial. Seus dados apontam que uma abordagem preventiva, conhecida como dissecção do pescoço eletiva, tanto melhora a sobrevida como reduz as taxas de recidiva se comparada à dissecção de pescoço terapêutica, realizada no momento da ocorrência do linfonodo. “Nosso estudo é o primeiro a comprovar conclusivamente que mais vidas podem ser salvas por meio da dissecção de pescoço eletiva. Isso responde a uma questão que os médicos têm feito nos últimos 50 anos para o tratamento de milhares de pa-


cientes”, comentou Anil D’Cruz, o autor principal do estudo, professor e chefe do Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Tata Memorial Centre, em Mumbai, na Índia. “Munidos dos resultados desse estudo, os médicos serão capazes de aconselhar os pacientes sobre incluir a cirurgia de pescoço ao seu tratamento inicial, pois vale a pena”, continua. De acordo com os pesquisadores, o único inconveniente da dissecção de pescoço – um procedimento que envolve a remoção dos linfonodos dessa região – é que ela pode estar associada com algum grau de lesão no ombro, que afeta de 5% a 40% dos pacientes. Isso ocorre porque o nervo que atende aos músculos associados com o movimento do ombro atravessa o campo de dissecção cirúrgica. Pesquisas futuras devem focar em técnicas que possam minimizar essa complicação. Radioterapia cerebral aliada a radiocirurgia em pacientes com 1 a 3 metástases cerebrais

O último trabalho apresentado na sessão plenária foi um estudo4 fase III que trouxe informações importantes sobre uma discussão que já dura bastante tempo acerca do impacto da radioterapia cerebral total adjuvante (whole brain radiation therapy; WBRT) sob a função cognitiva. Os pacientes com uma a três metástases cerebrais que foram submetidos a radiocirurgia seguida de WBRT tiveram uma probabilidade maior de experimentar declínio cognitivo do que aqueles tratados somente com radiocirurgia. Além disso, a WBRT não aumentou significativamente a sobrevida do paciente, embora tenha ajudado no controle do crescimento das metástases cerebrais. “Nós costumávamos oferecer a WBRT no início do tratamento, mas agora sabemos que as toxicidades dessa terapia são piores para o paciente do que o crescimento do câncer ou as recidivas no cérebro”, alerta o autor sênior do estudo, Jan C. Buckner, que também é professor de oncologia na Mayo Clinic, em Rochester. “Esperamos que a prática mude no sentido de reservar o uso da WBRT somente como tratamento de resgate e nos cuidados paliativos”, conclui.

Promessas da imunoterapia Quatro estudos clínicos apresentados na ASCO indicaram um novo e instigante papel para a imunoterapia em pacientes com tumores sólidos. Os resultados demonstram a eficácia dos imunoterápicos que visam a proteína PD-1 nos cânceres avançados de fígado, cabeça e pescoço, pulmão e colorretal. Alguns dos estudos também identificaram marcadores genômicos que podem ser utilizados para determinar quais pacientes tendem a se beneficiar dessas novas terapias. Nova população de pacientes poderá se beneficiar do imunoterápico PD-1

Um estudo5 fase II identificou o primeiro marcador genômico, o mismatch repair (MMR), capaz de predizer a resposta ao anticorpo anti-PD-1 pembrolizumabe. Esse marcador indica respostas dentre

uma variedade de cânceres. Entre os pacientes com câncer colorretal, em 62% daqueles com tumores que apresentavam presença do defeito de reparo de DNA (o MMR) foi observada uma redução do tumor, enquanto não foram detectadas respostas entre aqueles sem essa anormalidade (“MMR-proficientes”). A taxa de resposta entre os pacientes com outros casos de MMR-deficiente foi semelhante, 60%. “Este estudo é realmente sobre a união da imunoterapia e da genômica em benefício dos pacientes, e possui implicações para uma ampla gama de cânceres”, afirmou o investigador chefe, Dung T. Le, professor assistente de oncologia no Johns Hopkins Kimmel Cancer Center, em Baltimore. “Abrir as portas para esse novo tratamento seria um grande avanço para este subgrupo de pacientes com câncer de cólon metastático, assim como para outros cânceres de difícil tratamento”. Leia os comentários do Dr. Daniel Herchenhorn e cols. sobre esse estudo na página 20. Aproximadamente um em cada cinco pacientes responderam ao nivolumabe

Achados de um estudo6 fases I/II sugerem que o nivolumabe é seguro e eficaz no tratamento do carcinoma hepatocelular avançado. Baseado nos resultados da fase I desse estudo, oito (19%) dos 42 pacientes avaliáveis responderam ao anticorpo anti-PD-1 com redução tumoral acima de 30%. Mais importante, as respostas têm sido duradouras e ultrapassaram 12 meses em quatro pacientes. A taxa de sobrevida global com 12 meses foi de 62%. “Estamos entusiasmados em observar que o nivolumabe foi seguro, de modo geral, e que as taxas de resposta e os dados preliminares de sobrevida parecem promissores”, relata Anthony B. El-Khoueiry, professor associado de clínica médica na University of Southern California Norris Comprehensive Cancer Center, em Los Angeles. “Enquanto ainda precisamos verificar esse sinal em estudos maiores, este é um dos primeiros indícios de que a imunoterapia com inibidores de checkpoint imunológico terá um papel no tratamento do adenocarcinoma hepático”, complementa. Um em cada quatro pacientes com câncer de cabeça e pescoço respondeu ao pembrolizumabe, independentemente do status do biomarcador PD-L1

Um estudo7 que incluiu 132 pacientes indicou que o pembrolizumabe é eficaz para pacientes com câncer de cabeça e pescoço metastático ou recidivante. Tais achados podem preencher uma lacuna em relação à necessidade de melhores tratamentos para essa doença. No geral, 57% dos pacientes apresentaram encolhimento do tumor e 24,8% tiveram uma significativa diminuição no seu tamanho, conhecida como resposta parcial ou completa. O pembrolizumabe foi ativo em uma ampla variedade de subgrupos de pacientes, incluindo aqueles com câncer de cabeça e pescoço portadores de HPV-positivo e HPVnegativo. A droga foi bem tolerada e os efeitos adversos sérios ocorreram somente em menos de 10% dos indivíduos. Os mais comumente observados foram fadiga, erupção cutânea e coceira. Aqueles mais gra-

Onco& julho/agosto 2015

13


Há cinco anos, um imunoterápico eficaz para o tratamento de adenocarcinoma pulmonar era considerado impossível. Hoje, ele não somente existe como superou a terapia padrão tanto em termos de eficácia como de qualidade de vida para o paciente

16

julho/agosto 2015 Onco&

ves relacionados ao sistema imune, como a pneumonite e a colite, foram registrados somente em uma pequena amostra de pacientes. O autor principal do estudo, Dr. Tanguy Seiwert, professor assistente de medicina na Universidade de Chicago, explicou que a eficácia observada foi notável. Segundo ele, o pembrolizumabe parece ser aproximadamente duas vezes mais eficaz quando avaliado pela resposta, comparado à única terapiaalvo disponível nesse caso, o cetuximabe. “Diferentemente dos inibidores de EGFR, cujos dados apresentados aqui na ASCO sugerem potencialmente menor eficácia nos tumores HPV-positivos, o pembrolizumabe demonstrou níveis semelhantes de atividade tanto nos tumores HPV-positivos como nos negativos.” Ele ainda comentou: “Temos muita expectativa de que a imunoterapia irá mudar a forma como tratamos o câncer de cabeça e pescoço”. Estudo CheckMate 057

Há cinco anos, um imunoterápico eficaz para o tratamento de adenocarcinoma pulmonar era considerado impossível. Hoje, ele não somente existe como superou a terapia padrão tanto em termos de eficácia como de qualidade de vida para o paciente. Achados de um estudo8 randomizado fase III indicaram que o imunoterápico PD-1 é uma opção terapêutica eficaz para pacientes com câncer de pulmão não pequenas células (non-squamous, non-small cell lung cancer; NSCLC). Entre os pacientes com a doença avançada e que apresentaram piora após uso da quimioterapia baseada em platina, aqueles tratados com o nivolumabe tiveram uma sobrevida em média três meses maior do que os tratados com o docetaxel. Esse é o primeiro estudo fase III a demonstrar que a imunoterapia é eficaz contra o NSCLC não escamoso e parece ser particularmente ativo nos pacientes com tumores PD-L1 positivos. De acordo com Luis Paz-Ares, professor de medicina do Hospital Universitário 12 de Octubre, em Madri, e autor principal do estudo, “enquanto o nivolumabe parece ser mais potente contra o tipo mais comum de adenocarcinoma de pulmão, é importante notar que ele também é melhor para os pacientes se comparado ao tratamento padrão de segunda linha, o docetaxel”. O estudo selecionou aleatoriamente 582 pa-

cientes com NSCLC não escamoso para o tratamento com nivolumabe ou docetaxel. As taxas de resposta foram superiores no grupo nivolumabe se comparadas ao grupo docetaxel (19,2% vs. 12,4%). As respostas também duraram significativamente mais no grupo nivolumabe (17,1 meses vs. 5,6 meses, em média). Os pesquisadores ressaltaram que os pacientes com maiores níveis do biomarcador PD-L1 se beneficiaram mais do nivolumabe.

Novos tratamentos-alvo para câncer hematológico indicam bons resultados Quatro estudos clínicos com dados positivos ajudam a atender necessidades críticas dos pacientes com leucemia linfocítica crônica, mielofibrose, linfoma Hodgkin não indolente e mieloma múltiplo. Destaque para o estudo fase III (Sirius9), que sugere que o anticorpo anti-CD38 daratumumabe é eficaz como tratamento único no mieloma múltiplo que já foi fortemente tratado. Em um grupo de 106 pacientes cuja doença piorou após os últimos três ciclos de tratamento, praticamente um em três pacientes respondeu ao daratumumabe, e a progressão da doença foi atrasada em 3,7 meses, em média. A taxa de sobrevida global em um ano foi de 65%. Após um período de seguimento mediano de 9,4 meses, 29,2% dos pacientes responderam ao daratumumabe, sendo que três deles tiveram remissão completa. As respostas foram duráveis, se estendendo a 7,4 meses, em média. O principal efeito adverso do daratumumabe foi a reação à infusão, que ocorreu tipicamente no início do curso do tratamento e na maioria dos casos foi bem administrada. Outros eventos incluíram fadiga, dor nas costas e tosse. Para conhecer os outros estudos em câncer hematológico, leia o artigo assinado pela Juliane Musacchio (Página xxx).

Estudos apresentam tratamentos aprimorados para diversos tipos de câncer As mulheres com carcinoma ductal in situ (CDIS) já possuem diversas opções de tratamento e agora podem dispor de mais uma. Os inibidores da aromatase oferecem importantes vantagens, mas as pacientes e seus médicos devem ainda considerar toda a gama de opções, incluindo o tamoxifeno


ou mesmo o tratamento adjuvante exposto, já que cada abordagem possui seus próprios riscos e benefícios. Um estudo10 fase III sugere que mulheres pósmenopausadas com CDIS podem lançar mão de uma opção a mais na prevenção do câncer de mama. O presente trabalho comparou o tratamento padrão de cinco anos com o tamoxifeno com o uso do inibidor da aromatase anastrozol pelo mesmo período em mais de 3 mil sobreviventes ao CDIS. As taxas de sobrevida livre de câncer por dez anos foram maiores no grupo anastrozol do que no grupo tamoxifeno (93,5% vs. 89,2%). “A boa notícia é que tanto o tamoxifeno como o anastrozol são muito eficazes, mas parece que as mulheres têm melhores chances de ficar bem com o anastrozol”, relatou o autor principal do estudo, Richard G. Margolese, professor de cirurgia oncológica no Jewish General Hospital, McGill University, em Montreal, no Canadá. Ele falou também que as mulheres devem considerar as diferenças entre os efeitos adversos quando discutirem as opções de tratamento com seus médicos. O estudo britânico STAMPEDE11 descobriu que adicionar o quimioterápico docetaxel ao tratamento hormonal padrão melhora substancialmente a sobrevida dos homens com câncer de próstata avançado recém-diagnosticado sem tratamento prévio (virgens de tratamento hormonal). Aqueles que receberam o docetaxel mais o tratamento padrão viveram, em média, dez meses a mais do que aqueles tratados somente com a terapia padrão. Em contraste, a adição do ácido zoledrônico à terapia padrão não afetou a sobrevida, e a inclusão da combinação de ácido zoledrônico e docetaxel não foi mais eficaz do que somente adicionar o docetaxel. Dois estudos prévios, porém menores, divulgaram resultados sobre o uso do docetaxel em homens virgens de tratamento hormonal no cenário metastático. Esses trabalhos tiveram resultados conflitantes. O CHAARTED12, um estudo americano apresentado na sessão plenária da ASCO de 2014, demonstrou uma vantagem na sobrevida; já o GETUG-AFU 1513, um estudo francês, não. O STAMPEDE se desdobra para esclarecer o papel do docetaxel nos homens com câncer de próstata de alto risco recém-diagnosticados. O estudo STAMPEDE também teve uma população de pacientes

mais ampla se comparado aos outros dois, que incluíram homens com câncer de próstata metastático e 600 indivíduos com doença localmente avançada não metastática.

Cicatriz genômica é capaz de indicar a atividade do rucaparibe no câncer ovariano Resultados do estudo fase II Ariel214 significam um avanço na identificação de um grupo mais amplo de pacientes com câncer de ovário e que tendem a se beneficiar dos inibidores que visam a poli (ADP-ribose) polimerase (PARP), família de proteínas envolvida no reparo do DNA. O estudo foi bem-sucedido ao alcançar além da doença BRCAmutante, encontrando outros tumores com falhas no reparo do DNA que responderam ao rucaparibe, um inibidor de PARP ainda sob pesquisas que recentemente recebeu o título de “tratamento revelação” pelo FDA. “Este é o primeiro estudo clínico a demonstrar prospectivamente que uma assinatura de cicatriz genômica (recombinação homóloga deficiente; homologous recombination deficiency [HRD]) é capaz de identificar os tipos mais complicados de tumores BRCA que se beneficiarão do rucaparibe”, afirmou Iain A. McNeish, do Institute of Cancer Sciences, da Universidade de Glasgow, que apresentou os resultados desse trabalho durante a sessão oral de abstracts em câncer ginecológico. A Dra. Liane Pinto se aprofundou sobre o rucaparibe, que segundo ela é o “best-in-class” da família dos inibidores de PARP (Página 21).

Destaques ASCO 2015 no câncer de mama

O estudo britânico STAMPEDE11 descobriu que adicionar o quimioterápico docetaxel ao tratamento hormonal padrão melhora substancialmente a sobrevida dos homens com câncer de próstata avançado recémdiagnosticado sem tratamento prévio (virgens de tratamento hormonal)

Como não poderia faltar, a ASCO sempre traz novidades ou revisões de trabalhos já apresentados nos anos anteriores sobre o câncer de mama, malignidade de grande interesse aos médicos do mundo todo. Neste ano, divulgou-se que o tratamento com o T-DM1 resultou em sobrevida livre de progressão não inferior, mas também não superior, se comparado com trastuzumabe mais um taxano em pacientes com câncer de mama HER-2 positivo metastático ou localmente avançado. Além disso, com base nos resultados do estudo randomizado fase III MARIANNE15, a inclusão do pertuzumabe ao T-DM1 não demonstrou nenhum benefício.

Onco& julho/agosto 2015

17


“Nem o TDM1 nem o T-DM1 mais o pertuzumabe provaram ser superiores ao antigo padrão de tratamento, que consiste em taxano mais trastuzumabe”, comentou Shanu Modi, do Memorial Sloan Kettering Cancer Center. Ela se referiu ao MARIANNE como “um estudo muito importante para a sua área, com implicações de longo alcance”. Uma nova droga-alvo denominada palbociclibe demonstrou ser eficaz ao reduzir a progressão do câncer de mama receptor hormonal positivo. O palbocicline é uma droga oral que bloqueia as quinases dependentes de ciclina (CDK) 4 e 6. Pesquisas prévias demonstraram que o CDK4 e o CDK6 estão entre as principais proteínas que “alimentam” o crescimento dos tumores de mama receptor hormonal positivo. Resultados do estudo16 fase III PALOMA-3 apontaram que a adição do agente-alvo palbociclibe ao tratamento hormonal padrão com o fulvestrante mais do que dobrou a duração do controle da doença, atrasando a progressão da mesma por aproximadamente cinco meses em mulheres com câncer de mama avançado receptor hormonal positivo, HER2 negativo. Esse estudo foi interrompido precocemente com base na eficácia observada na análise interina. O seu autor principal, Ni-

cholas C. Turner, oncologista do Royal Marsden e chefe de equipe do Institute of Cancer Research, em Londres, foi o responsável pela apresentação dos resultados na ASCO. No geral, a combinação entre palbociclibe e fulvestrante foi bem tolerada. Os eventos adversos mais comumente relatados foram os hematológicos, com neutropenia ocorrendo em 79% dos pacientes no braço do palbociclibe versus 3% no braço placebo, e leucopenia ocorrendo em 46% versus 4%. A incidência de neutropenia febril foi extremamente rara em ambos os grupos. E, por fim, o ensaio17 de fase III (CALGB 40503 [Alliance]) avaliou a adição de bevacizumabe ao letrozol como terapia endócrina de primeira linha para o tratamento de câncer de mama avançado com receptor hormonal positivo. Concluiu-se que incluir o letrozol melhora a sobrevida livre de progressão no câncer de mama avançado receptor hormonal positivo com maior toxicidade relacionada ao bevacizumabe. Estudos correlatos estão a caminho para identificar potenciais biomarcadores de resposta ou de resistência ao tratamento. Para obter mais detalhes sobre os trabalhos em câncer de mama, leia os artigos assinados pelo Dr. Anderson Silvestrini.

Referências bibliográficas: 1. Wolchok JD, Chiarion-Sileni V, Gonzalez R, Rutkowski P, Grob JJ, Cowey CL, et al. Efficacy and safety results from a phase III trial of nivolumab (NIVO) alone or combined with ipilimumab (IPI) versus IPI alone in treatment-naive patients (pts) with advanced melanoma (MEL) (CheckMate 067). J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA1). 2. Armstrong GT, Yasui Y, Chen Y, Leisenring WM, Gibson TM, Mertens A, et al. Reduction in late mortality among 5-year survivors of childhood cancer: A report from the Childhood Cancer Survivor Study (CCSS). J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA2). 3. D'Cruz A, Dandekar M, Vaish R, Arya S, Pantvaidya G, Chaturvedi P, et al. Elective versus therapeutic neck dissection in the clinically node negative early oral cancer: A randomised control trial (RCT). J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA3). 4. Brown PD, Asher AL, Ballman KV, Farace E, Cerhan JH, Anderson SK, et al. NCCTG N0574 (Alliance): A phase III randomized trial of whole brain radiation therapy (WBRT) in addition to radiosurgery (SRS) in patients with 1 to 3 brain metastases.. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA4). 5. Le DT, Uram JN, Wang H, Bartlett B, Kemberling H, Eyring A, et al. PD-1 blockade in tumors with mismatch repair deficiency. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA100). 6. El-Khoueiry AB, Melero I, Crocenzi TS, Welling TH, Yau TC, Yeo W, et al. Phase I/II safety and antitumor activity of nivolumab in patients with advanced hepatocellular carcinoma (HCC): CA209-040. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA101). 7. Seiwert TY, Haddad RI, Gupta S, Mehra R, Tahara M, Berger M, et al. Antitumor activity and safety of pembrolizumab in patients (pts) with advanced squamous cell carcinoma of the head and neck (SCCHN): Preliminary results from KEYNOTE-012 expansion cohort. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA6008). 8. Paz-Ares L, Horn L, Borghaei H, Spigel DR, Steins M, Ready N, et al. Phase III, randomized trial (CheckMate 057) of nivolumab (NIVO) versus docetaxel (DOC) in advanced non-squamous cell (non-SQ) non-small cell lung cancer (NSCLC). J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA109). 9. Lonial S, Weiss BM, Usmani SZ, Singhal S, Chari A, Bahlis NJ, et al. Phase II study of daratumumab (DARA) monotherapy in patients with 3 lines of prior therapy or double refractory multiple myeloma (MM): 54767414MMY2002 (Sirius). J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA8512). 10. Margolese RG, Cecchini RS, Julian TB, Ganz PA, Costantino JP, Vallow L, et al. Primary results, NRG Oncology/NSABP B-35: A clinical trial of anastrozole (A) versus tamoxifen (tam) in postmenopausal patients with DCIS undergoing lumpectomy plus radiotherapy. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA500). 11. James ND, Sydes MR, Mason MD, Clarke NW, Dearnaley DP, Spears MR, et al.Docetaxel and/or zoledronic acid for hormone-naïve prostate cancer: First overall survival results from STAMPEDE (NCT00268476).J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr 5001). 12. Sweeney C, Chen Y-H, Carducci MA, et al: Impact on overall survival with chemohormonal therapy versus hormonal therapy for hormone-sensitive newly metastatic prostate cancer: An ECOG-led phase III randomized trial. ASCO Annual Meeting. Abstract LBA2. Presented June 1, 2014. 13. Gravis G, Boher JM, Joly F, et al: Androgen deprivation therapy plus docetaxel versus ADT alone for hormone-naive metastatic prostate cancer: Long-term analysis of the GETUGAFU 15 phase III trial. 2015 Genitourinary Cancers Symposium. Abstract 140. Presented February 26, 2015. 14. McNeish IA, Oza AM, Coleman RL, Scott CL, Konecny GE, Tinker A, et al. Results of ARIEL2: A Phase 2 trial to prospectively identify ovarian cancer patients likely to respond to rucaparib using tumor genetic analysis. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr 5508). 15. Ellis PA, Barrios CH, Eiermann W, Toi M, Im Y, Conte PF, et al. Phase III, randomized study of trastuzumab emtansine (T-DM1) ± pertuzumab (P) vs trastuzumab + taxane (HT) for first-line treatment of HER2-positive MBC: Primary results from the MARIANNE study. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr 507). 16. Turner NC, Ro J, Andre F, Loi S, Verma S, Iwata H, et al. PALOMA3: A double-blind, phase III trial of fulvestrant with or without palbociclib in pre- and post-menopausal women with hormone receptor-positive, HER2-negative metastatic breast cancer that progressed on prior endocrine therapy. J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr LBA502). 17. Dickler MN, Barry WT, Cirrincione CT, Ellis MJ, Moynahan ME, Innocenti F, et al. Phase III trial evaluating the addition of bevacizumab to letrozole as first-line endocrine therapy for treatment of hormone-receptor positive advanced breast cancer: CALGB 40503 (Alliance). J Clin Oncol 33, 2015 (suppl; abstr 501).

18

julho/agosto 2015 Onco&


ASCO 2015 – imunoterapia

Por

Daniel Herchenhorn, Thais dos Santos R. Abreu, Fabiola Vasconcelos Alves

Tema no centro das atenções

T

ODOS OS ANOS, NO CONGRESSO ANUAL DA SOCIEDADE AMERICANA DE ONCOLOGIA CLÍNICA (ASCO), MILHARES DE ONCOLOgistas de todas as partes do mundo se reúnem para conhecer o estado da arte no tratamento dos diversos tipos de câncer e se atualizar nas novas pesquisas que ditarão o futuro da oncologia clínica nos próximos anos. No final do século XIX, Stephen Paget publicou a “Seed and Soil Hyphotesis”, teoria que relacionava o crescimento tumoral à relação entre sementes e solo, justificando a preferência de determinados tumores apresentarem metástases em órgãos específicos. Durante décadas, o tratamento sistêmico dos tumores se baseou em drogas quimioterápicas ou mais recentemente em terapias alvo direcionadas que focaram no ataque às células tumorais (as sementes). A observação frequente do surgimento de resistência, aliada ao maior conhecimento acerca da biologia, consolidou o conceito da heterogeneidade tumoral entre pacientes e no mesmo paciente, o que demonstrou a necessidade de outras linhas de ataque às células neoplásicas. O conceito de imunoterapia não é novo. Na verdade, terapias imunoterápicas foram aprovadas na década de 80 e 90, quando estudos mostraram que interferon e interleucina eram capazes de levar a respostas duradouras

em pequena parcela de pacientes com melanoma avançado, sem que, contudo, fôssemos capazes de entender os mecanismos de interação entre as células tumorais e o sistema de defesa do organismo composto por linfócitos T (o solo). Recentemente, os mecanismos de interação entre células tumorais, células dendríticas e linfócitos T começou a ser elucidado, o que permitiu o desenvolvimento de moléculas capazes de bloquear a interação negativa causada pelo tumor no sistema de defesa (denominados check point inhibitors). A primeira droga aprovada, o ipilimumabe, um inibidor de CTLA4, foi inicialmente aprovada para melanomas avançados e, recentemente, uma nova classe de imunoterápicos, os inibidores de PD1/PDL1, se mostraram muito ativos, sendo aprovados nos EUA para melanoma e câncer de pulmão e com potencial interesse em diversas outras neoplasias, como câncer de rim, bexiga e com estudos em pelo menos 20 tipos diferentes de tumor. Na ASCO deste ano, cerca de um terço de todas as pesquisas apresentadas e de todas as sessões educacionais discutiu temas relacionados a imunoterapia, seus conceitos, combinações, toxicidades e indicações. Entre os principais estudos, alguns mereceram especial destaque. O estudo compa-

Onco& julho/agosto 2015

19


rando nivolumabe (anti-PD1) associado a ipilimumabe versus nivolumabe ou ipilimumabe isolados em primeira linha de tratamento de pacientes com melanoma avançado (CheckMate 067) demonstrou a superioridade da combinação, em termos de resposta (57% da combinação versus 43% de nivo e 19% de ipi) e sobrevida livre de progressão (11,5 meses combinação, 6,9 nivo e 2,9 ipi). Quando analisados os resultados de acordo com a expressão (imuno-histoquímica) de PDL1, verificou-se que a combinação na verdade se mostrou superior apenas no grupo com baixa expressão de PDL1, uma vez que os resultados foram iguais no grupo PDL1 expresso para a combinação versus nivolumabe isolado. Tal fato decorre do provável efeito do ipilimumabe em recrutar linfócitos e gerar maior expressão tumoral de PDL1, facilitando a ação do nivolumabe em tumores sem expressão do receptor. Outro estudo em destaque confirmou o papel do nivolumabe em pacientes com adenocarcinoma de pulmão (CheckMate 057); 582 pacientes foram analisados após falhar a quimioterapia de primeira linha baseada em platina. Nesse estudo, assim como recém-publicado em carcinomas epidermoides, a imunoterapia foi mais eficaz e apresentou melhor tolerância do que a quimioterapia padrão com docetaxel, além de ter demonstrado um ganho proporcional de 40% na sobrevida global e ganho absoluto de três meses – o que provavelmente levará à aprovação do medicamento também para esse grupo de pacientes.

20

julho/agosto 2015 Onco&

Por fim, um terceiro estudo merece destaque. Ele avalia pacientes com vários tipos tumorais que apresentavam em comum a presença do defeito de reparo de DNA denominado MMR (mismatch repair deficiency). Foi demonstrado que esses pacientes apresentaram benefícios com a utilização de imunoterapia (pembrolizumabe), mesmo após falha a diversas linhas de tratamento, sendo os resultados superiores aos de pacientes que não apresentavam a alteração genética. Esse estudo abre fronteiras para a utilização de imunoterapia em diversos tumores que possuem em comum essa alteração genética, como alguns tumores de cólon, próstata, ovário, entre outros. Como conclusão desses estudos, percebese claramente que a imunoterapia pode ser considerada hoje um novo pilar no tratamento do câncer, ao lado da quimioterapia, da terapia hormonal e das drogas alvo, com a vantagem de poder sobrepujar a heterogeneidade tumoral e com potencial de ação em tumores quimiorresistentes. As terapias têm ainda a seu favor um perfil de toxicidade favorável e, assim, são passíveis de combinações futuras com outras drogas, em fases mais precoces da doença. Como a hipótese da semente e do solo, o presente da oncologia e o futuro se concentrarão no ataque combinado às “sementes” tumorais e no enriquecimento do “solo” por meio da imunoterapia. Isso é apenas o começo de uma nova era de conhecimento sobre a biologia tumoral.


ASCO 2015 – ginecologia

Por Liane

Pinto

Rucaparib, o best-in-class da família dos inibidores de PARP

O

TRATAMENTO COM UM NOVO INIBIDOR

DA

PARP, RUCAPARIB, DEMONSTROU ATI-

VIDADE CLÍNICA ROBUSTA E UM PERFIL DE

segurança tolerável para mulheres com câncer de ovário recorrente definido por biomarcador, de acordo com os resultados do estudo de fase II ARIEL2, apresentado na reunião anual ASCO 2015. No estudo, a taxa de resposta objetiva pelo RECIST ou CA-125 foi de 82% em pacientes BRCAmut e 45% BRCA-like definido por um biomarcador distinto associado com a deficiência de recombinação homóloga (DRH). No braço negativo do biomarcador do estudo, a ORR foi 13% RECIST e 21% CA-125. Segundo o professor doutor McNeish, trata-se do primeiro estudo clínico que de-

22

julho/agosto 2015 Onco&

monstrou a hipótese de que a assinatura da cicatriz genômica pela DRH pode identificar tumores BRCA do tipo selvagem que se beneficiarão com rucaparib. Acredita-se que o rucaparib emergiu claramente como o único e best-in-class inibidor da PARP. Em 2015, o rucaparib foi apontado pelo FDA como um avanço na terapia do câncer de ovário avançado com mutação BRCA após progressão em pelo menos duas linhas anteriores de quimioterapia à base de platina. Em adição ao estudo fase II, o ARIEL3, um estudo fase III, randomizará pacientes com câncer de ovário de alto grau sensível à platina para a terapia de manutenção com rucaparib ou placebo.


ASCO 2015 – mama

Por Anderson

Silvestrine

Estudos sugerem novas abordagens terapêuticas

N

ESTE ANO, NÃO TIVEMOS NENHUM ES-

TUDO VOLTADO PARA O CÂNCER DE MAMA APRESENTADO NA PLENÁRIA, MAS NEM

por isso deixamos de ter trabalhos interessantes nessa área na ASCO. Nos tumores com receptores hormonais positivos, o estudo ALLIANCE comparou a adição de bevacizumabe ao letrozol em pacientes metastáticos em primeira linha de tratamento para doença avançada. 343 pacientes foram incluídos e a SLP foi de 20 meses para a combinação de bevacizumabe + letrozol versus 16 meses para letrozol isolado (HR 0,74 p 0,016). Não houve diferença significativa na SG, com 47 meses para a combinação versus 41 meses para letrozol isolado (p 0,27). Como toxicidade, apresentamos HAS (23 versus 2%) e proteinúria (11 versus 0%). Outro estudo interessante foi o PALOMA 3, que avaliou o acréscimo de palbociclibe ao tratamento com fulvestranto em mulheres com câncer de mama avançado pré e pós-menopausa, RH positivo, HER2 negativo que

24

julho/agosto 2015 Onco&

progrediram após uma linha de tratamento hormonal com inibidor de aromatase ou uma linha de quimioterapia. 521 pacientes foram avaliadas, sendo alcançada uma SLP de 9,2 meses para a combinação versus 3,8 meses (HR 0,42) e uma taxa de resposta de 10,4% versus 6%, para a combinação. Esse estudo foi publicado durante o congresso no New England Journal of Medicine. (http://www.nejm. org/doi/full/10.1056/NEJMoa1505270). Um estudo prospectivo avaliou o efeito da supressão ovariana associada a tamoxifeno ou inibidor de aromatase na qualidade de vida de mulheres jovens com câncer de mama. As pacientes que receberam quimioterapia além da supressão ovariana alcançaram pior qualidade de vida nas três escalas utilizadas para a avaliação (p 0,05). As pacientes tiveram mais sintomas vasomotores, piora cognitiva e pior qualidade de vida. Concluiu-se que essa piora da qualidade de vida deve ser levada em conta na tomada de decisão quanto ao tratamento.


Terapias para controle do HER-2

T

AMBÉM TIVEMOS IMPORTANTES ESTUDOS

ASCO EM CÂNCER DE MAMA HER-2 POSITIVO. O PRIMEIRO EStudo que vamos discutir é um estudo de fase II que avaliou TDM-1 neoadjuvante por 12 semanas com ou sem terapia endócrina em pacientes com câncer de mama inicial HER-2 positivo, receptor hormonal positivo. 380 pacientes receberam 12 semanas de tratamento neoadjuvante. Braço A/B: T-DM1 (3,6 mg/kg 3s) terapia endócrina (pré: tamoxifeno; pós-menopausa: inibidor de aromatase; braço C-controle): trastuzumabe a cada três semanas. Após cirurgia, as pacientes recebiam 4xEC – 12x paclitaxel semanal e completavam um ano de trastuzumabe. 55% das pacientes eram pré-menopausa; 40% tinham tumores cT1, 51% cT2; 68% tinham cN0, 27% cN1; 75% tinham G3. Como resultado, a taxa de pCR foi de 30,8%: A: 40,5%, B: 45,8%, C: 6,7%. A diferença entre os braços A ou B vs. C foi significante (p 0,001), mas não A vs. B. Análise exploratória sugere benefício da adição de terapia endócrina (TE) ao T-DM1 in pré menopausa (pCR: 28,6% para T-DM1 vs. 47,6% para TDM-1 + TE) mas não na pós-menopausa (pCR: 64,3% vs. 50%). Esse estudo demonstra que podemos alcançar altas taxas de resposta patológica completa com apenas 12 semanas de TDM-1 associada a terapia endócrina, sem exposição a quimioterapia. O estudo de fase II NeoSphere foi atualizado após cinco anos. Ele consiste na avaliação de terapia neoadjuvante com quatro ciclos de docetaxel (D) e/ou trastuzumabe (T) e/ou pertuzumabe (P). A publicação inicial havia deAPRESENTADOS NA

monstrado uma alta taxa de resposta patológica completa nos tumores HER-2 positivo RH negativo. Quando comparados todos os pacientes que atingiram pRC com os que não alcançaram, o HR para DFS foi 0,68 (95% CI, 0,36 –1,26) e o HR para PFS foi 0,54 (95% CI, 0,29 –1,00). Outro estudo interessante foi o MARIANNE. Um na fase III que avaliou TDM-1 + /-pertuzumabe (P) versus trastuzumabe + taxane (HT) em primeira linha metastático. Com o conceito do duplo bloqueio e a ação sinergística de TDM-1 + pertuzumabe, os resultados foram desapontadores. 365 pacientes foram randomizados para HT, 367 para T-DM1 e 363 para T-DM1 P. O estudo alcançou “end point” para não inferioridade, mas não para superioridade. A sobrevida global foi similar em todos os braços. Concluindo, o duplo bloqueio não se mostrou superior, permanecendo como primeira linha de tratamento a associação de pertuzumabe + trastuzumabe + docetaxel. Para finalizar, um estudo com outro medicamento inibidor de pan-HER, HER-1, 2 e 4, o neratinibe, em terapia adjuvante. Mulheres com câncer de mama ECI-IIIc que receberam trastuzumabe adjuvante foram randomizadas para receber neratinibe ou placebo por 12 meses. Diarreia foi o efeito colateral mais comum, com 40% G3. O neratinibe mostrou ganho de DFS 93,9 versus 91,6 quando comparado ao placebo, com HR de 0,67 (0,50– 0,91) e p de 0,0046, mostrando que a adjuvância estendida pode beneficiar pacientes com câncer de mama HER-2 positivo.

Onco& julho/agosto 2015

25


ASCO 2015 – hormonioterapia

Por Ana

Carolina Nobre de Mello

Adoção precoce de terapias citotóxicas

A

HORMONIOTERAPIA AINDA SE MANTÉM

COMO TRATAMENTO PADRÃO DESDE 1940, PORÉM TEM SIDO ESTUDADO O USO DE TE-

rapias citotóxicas precocemente. O estudo CHAARTED, apresentado na sessão plenária da ASCO 2014 e agora publicado no New England Jornal of Medicine, foi o primeiro a mostrar que em um perfil apropriado de pacientes o uso da quimioterapia precocemente pode aumentar a sobrevida. Nesse contexto, foi apresentado o estudo STAMPED pelo Dr Nicholas D. James, MD, Ph.D. da Universidade de Warwick e Queen Elizabeth Hospital Birmingham (Inglaterra). Nesse ensaio clínico, foram randomizados 2.962 homens no tratamento padrão de terapia de privação ao androgênio (ADT) (combinada ou não a radioterapia), em ADT combinado a seis ciclos de docetaxel, ADT e ácido zoledrônico por dois anos, ou ADT combinado ao docetaxel e ácido zoledrônico. Os pacientes foram acompanhados por 42 meses.

26

julho/agosto 2015 Onco&

Homens atribuídos ao braço docetaxel tiveram uma sobrevida mediana significativamente melhor, 77 meses em comparação aos 67 meses do braço de ADT isolado (hazard ratio [HR] CI 0,76, 95% [0,63; 0,91]; p = 0,003). Além disso, o docetaxel melhorou a sobrevida livre de progressão em comparação ao ADT isolado (37 vs. 21 meses; HR 0,62; IC 95% [0,54; 0,71]; p <0,0000000001). A adição do ácido zoledrônico não impactou na sobrevida livre de progressão nem na sobrevida global. Quando os pesquisadores analisaram apenas os pacientes com doença metastática, eles encontraram um aumento na sobrevida em 22 meses no braço do docetaxel em comparação ao ADT isolado (65 vs. 43 meses; HR 0,73; IC 95% [0,59, 0,89]; p = 0,002). “O docetaxel deve ser considerado em pacientes bem selecionados com doença metastática recém-diagnosticada”, disse Nicholas D. James.


ASCO 2015 – hematologia

Por

Juliane Musacchio Rodrigo Abreu e Lima

Onco-hematologia em destaque

E

M QUATRO ENSAIOS CLÍNICOS PRINCIPAIS, FOI

DEMONSTRADO QUE NOVOS TRATAMENTOS DIRECIONADOS PODERÃO MELHORAR MUITO

o tratamento de pacientes com leucemia linfocítica crônica, (LLC), mielofibrose, linfoma não-Hodgkin (LNH) indolente e mieloma múltiplo: 1) Em um estudo de fase II, foi sugerido que o daratumumabe, um anticorpo anti-CD38, é eficaz como tratamento isolado em pacientes com mieloma múltiplo e vários tratamentos prévios: • First-in-Class Targeted Drug Daratumumab Shows Promise in Heavily Treatment-Resistant Multiple Myeloma Nesse estudo, o daratumumabe foi eficaz como tratamento isolado para os pacientes com mieloma múltiplo previamente tratado. Em um grupo de 106 pacientes cuja doença foi agravada após, pelo menos, três tratamentos anteriores, cerca de um em cada três respondeu ao daratumumabe, e a progressão da doença foi retardada em 3,7 meses em média. A taxa de sobrevida global estimada em um ano foi de 65%. O principal evento adverso do daratumumabe foi durante a infusão, que, tipicamente, ocorreu precocemente no decurso do tratamento e foi geralmente bem controlado, com menos de 5% dos pacientes tendo interrompido o tratamento. Outros eventos adversos incluíram fadiga, mielotoxicidade, lombalgia e tosse.

2) Foi descoberto, em um ensaio clínico de fase III, que a adição de obinutuzumabe à bendamustina mais que dobra a duração de remissão de pacientes com LNH indolente: • Obinutuzumab Doubles Remission Duration in Patients With Relapsed, Indolent Non-Hodgkin Lymphoma Foi demonstrado que, entre os pacientes com LNH indolente para os quais a terapêutica com rituximabe não ofereceu nenhum benefício, a duração média de remissão foi de 29,2 meses, após ter recebido a nova combinação vs. 14 meses após o uso isolado da bendamustina. O estudo foi interrompido precocemente com base nesses resultados animadores. Esse foi o primeiro ensaio de fase III randomizado para avaliar o potencial benefício do obinutuzumabe em pacientes com LNH. O FDA aprovou recentemente o obinutuzumabe em combinação com quimioterapia para os pacientes com leucemia linfocítica crônica. Nesse estudo, foram incluídos 396 pacientes com LNH de vários tipos, sendo o linfoma folicular o mais comum. Os pacientes foram distribuídos aleatoriamente para o tratamento com bendamustina isolada ou para combinação de bendamustina e obinutuzumabe, seguida por tratamento com obinutuzumabe de maneira isolada. Em geral, não houve eventos adversos inesperados ou preocupações de segurança com o regime de combinação. 3) Pela análise interina de um grande estudo

Onco& julho/agosto 2015

27


de fase III, sugere-se que a adição de ibrutinibe ao regime padrão de bendamustina com rituximabe pode melhorar os resultados em pacientes com leucemia linfocítica crônica resistente ao tratamento: • New Ibrutinib Combination Regimen Shows Substantial Benefits in Relapsed Chronic Lymphocytic Leukemia Com um seguimento mediano de 17 meses, os pacientes com LLC refratária que receberam ibrutinibe com bedamustina e rituximabe (BR) tiveram um risco 80% menor de progressão de doença ou óbito que aqueles que receberam placebo e BR. Com base nesse benefício impressionante, todos os pacientes foram autorizados a atravessar do grupo placebo para receber ibrutinibe, o inibidor da tirosina quinase de Bruton (BTK). No estudo, 578 pacientes com LLC previamente tratados foram distribuídos aleatoriamente para receber tratamento com ibrutinibe e BR ou placebo e BR. Após um acompanhamento mediano de 17,2 meses, a sobrevida livre de progressão mediana foi de 13,3 meses no grupo placebo e não foi alcançada no grupo do ibrutinibe. O risco de progressão ou morte foi reduzido em 80% naqueles que receberam ibrutinibe. As taxas de resposta foram significativamente maiores no grupo tratado com ibrutinibe que no grupo placebo (82,7% vs 67,8%). A fadiga relacionada à doença melhorou no grupo do ibrutinibe, e os pacientes relataram um benefício mais precoce (aos 6 meses vs 14 meses). No momento da análise provisória, 90 (31%) pacientes do grupo de placebo já tinham passado para o grupo do ibrutinibe. As taxas e os eventos adversos foram comparáveis entre os dois grupos de tratamento. Os efeitos secundários mais frequentes foram leucopenia e náuseas. Por fim, em um estudo de fase III, foi mostrado que o pacritinibe é mais eficaz que os tratamentos atuais para mielofibrose, especialmente para os pacientes com baixa contagem de plaquetas: • Novel JAK Inhibitor Pacritinib Proves Effective for Easing Symptoms of Myelofibrosis

28

julho/agosto 2015 Onco&

Os achados do estudo PERSIST-1, com pacientes com mielofibrose, sugerem que o pacritinibe é significativamente mais eficaz que a melhor terapia disponível (MTD), que inclui uma variedade de tratamentos off-label. Às 24 semanas de tratamento, 19,1% dos doentes no braço do pacritinibe tiveram redução do tamanho do baço, em comparação com apenas 4,7% dos pacientes no braço MTD. O pacritinibe também melhorou uma gama de sintomas adicionais e eliminou a necessidade de transfusão de sangue em um quarto dos pacientes que tinham sido anteriormente dependente de transfusões. No PERSIST-1, 327 pacientes foram aleatoriamente designados para o tratamento com pacritinibe ou MTD. Os pacientes no braço BAT receberam tratamentos que são rotineiramente prescritos off-label para mielofibrose, tais como eritropoetina, medicamentos imunomoduladores (por exemplo, talidomida, lenalidomida) e hidroxiureia. O ruxolitinibe foi intencionalmente excluído, porque nesse estudo foram incluídos pacientes com contagem de plaquetas muito baixa. Os efeitos do pacritinibe foram vistos quatro semanas após o início do tratamento. No subgrupo de pacientes com as mais baixas contagens de plaquetas (aqueles que não são candidatos para ruxolitinibe), a diminuição do baço ocorreu em 33,3% dos pacientes no braço pacritinibe vs 0% no grupo MTD. Em comparação com os pacientes no braço MTD, os pacientes no braço pacritinibe experimentaram um maior grau de alívio de sintomas como caquexia, suores noturnos, febre e dor óssea. A grande maioria (79%) dos pacientes no braço MTD passou para o braço do pacritinibe. Os efeitos secundários mais comuns do pacritinibe foram diarreia, náuseas e vômitos. Os sintomas tipicamente duraram menos que uma semana e poucos interromperam o tratamento devido aos efeitos secundários. Entretanto, um acompanhamento mais longo é necessário para determinar se o pacritinibe melhora a sobrevida dos pacientes com mielofibrose.


imunoterapia

Imunoterapia no tratamento do melanoma – avanços terapêuticos

A

TÉ BEM POUCO TEMPO ATRÁS, O TRATAMENTO

DO MELANOMA AVANÇADO ERA BASTANTE LIMI-

Divulgação

TADO, COM UM PEQUENO NÚMERO DE OPÇÕES

Andréia Melo * Mestre em oncologia pelo Inca e presidente da Regional Rio de Janeiro da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica

Contato: melo.andreia@uol.com.br

terapêuticas, resultados globais muito ruins e curta sobrevida para os pacientes diagnosticados com doença metastática. Aqueles doentes que apresentavam uma ou poucas metástases e cuja doença era considerada ressecável eram submetidos à cirurgia para retirar as lesões. Por outro lado, aos pacientes com múltiplas metástases ou doença considerada irressecável restavam alternativas limitadas de tratamento. O emprego de quimioterapia citotóxica convencional com agentes isolados como a dacarbazina, o temodal e a fotemustina ou mesmo a combinação de carboplatina e paclitaxel estavam relacionadas a poucas respostas, e quando as respostas aconteciam elas eram de curta duração, sem ganho em sobrevida global com nenhum desses agentes. Outras intervenções, como o uso de bioquimioterapia ou de interleucina-2 em altas doses, têm indicações específicas, e por sua complexidade, custo e toxicidade eram prescritas muito raramente no nosso cenário, com relatos interessantes na literatura de respostas sustentadas. O melhor conhecimento da carcinogênese do melanoma levou à identificação de mutações em genes específicos como o BRAF, o NRAS e ocKIT e, por consequência, ao desenvolvimento de drogas contra esses alvos específicos. Vários estudos empregando inibidores de BRAF e inibidores de MEK isoladamente ou em combinação já foram publicados com um grande número de respostas objetivas, mas com a duração de resposta limitada em muitos desses casos. A imunoterapia do câncer tem o objetivo de estimular o sistema imunológico a trabalhar de ma-

neira mais inteligente para destruir as células tumorais. Mesmo antes de o sistema imunológico ser bem compreendido pela comunidade científica, um cirurgião americano chamado William Coley observou que contrair uma infecção após a cirurgia parecia ajudar alguns pacientes com câncer. No fim do século XIX, ele começou a tratar pacientes com tumores, infectando-os com certos tipos de agentes biológicos como as bactérias. Apesar de ter algum sucesso, sua técnica foi deixada de lado quando surgiram outras formas de tratamento do câncer, como a radioterapia e os agentes citotóxicos convencionais. Desde então, os médicos aprenderam muito sobre o sistema imunológico, seus componentes e mecanismos de ação e como ele pode ser usado para tratar o câncer. O sistema imune tem um papel fundamental no controle e na erradicação do câncer. Por sua vez, alguns mecanismos complexos levam à “imunossupressão” na presença de algum tumor no organismo, impedindo uma atividade do sistema imunológico mais efetiva. O tratamento com anticorpos que agem contra algumas moléculas que regulam negativamente o sistema imune, os chamados checkpoints, tem demonstrado sucesso em uma variedade de tumores, incluindo o melanoma metastático. O CTLA-4 (Cytotoxic T lymphocyte-associated antigen 4) é uma proteína e foi o primeiro receptor a se tornar alvo na imunoterapia moderna, por se tratar de um regulador negativo da resposta imunológica. Habitualmente, horas ou dias após a ativação dos linfócitos T por algum antígeno, o CTLA-4 é expresso na membrana das células T com o objetivo de diminuir a atividade dessas, garantindo a homeostase do sistema imune e evitando que um estado de constante inflamação aconteça. Onco& julho/agosto 2015

29


O nivolumabe e o pembrolizumabe, já aprovados para o tratamento do melanoma por algumas agências regulatórias, estão relacionados a um grande número de respostas objetivas com durações prolongadas e toxicidade manejável

30

julho/agosto 2015 Onco&

Dois anticorpos que se ligam ao CTLA-4, o ipilimumabee o tremelimumabe, já foram testados em pacientes com melanoma avançado em grandes estudos clínicos. Apesar de respostas duradouras relacionadas ao uso do tremelimumabe, não houve ganho em sobrevida global no estudo de fase III comparando os pacientes que receberam essa imunoterapia com os pacientes tratados com dacarbazina ou temozolamida. Provavelmente, essa falta de benefício em sobrevida global aconteceu porque parte dos pacientes tratados com a quimioterapia convencional acabou recebendo ipilimumabe após progressão de doença, nos programas de acesso expandido. Por sua vez, dois estudos de fase III tiveram ganho em sobrevida global com o ipilimumabe em pacientes com melanoma avançado. Dados compilados desses estudos com ipilimumabe mostraram que 20% dos pacientes estavam vivos três anos após o tratamento e com sobrevida relatada de até dez anos entre os pacientes que receberam esse tipo de imunoterapia. Com o sucesso do ipilimumabe, outros checkpoints, como o PD-1 (programmed cell death protein 1) e os seus ligantes, o PD-L1 e o PD-L2, têm sido estudados. O PD-1 também é um regulador negativo dos linfócitos T e tem atividade em diferentes momentos da resposta imunológica. Diferentemente do CTLA-4, que regula a atividade precoce do linfócito T, o PD-1 está envolvido em fases mais tardias da ativação dos linfócitos nos tecidos, nos tumores e no microambiente tumoral. O PD-1 é expresso nos linfócitos T, mas também nos linfócitos B e nas células natural killer. Vários anticorpos anti-PD-1 (nivolumabe, pembrolizumabe e pidilizumabe) e anti-PD-L1 estão em desenvolvimento clínico, muitos deles já em fase avançada. O nivolumabe e o pembrolizumabe, já aprovados para o tratamento do melanoma por algumas agências regulatórias, estão relacionados a um grande número de respostas objetivas com durações prolongadas e toxicidade manejável. Um estudo de fase III incluiu pacientes com melanoma avançado que progrediram após o uso de ipilimumabe – aqueles que receberam nivolumabe apresentaram uma resposta global de 32% comparado a 11% de resposta para os que foram tratados com quimioterapia (dacarbazina ou a combinação de carboplatina com paclitaxel) e com menos efeitos

colaterais. Outro estudo de fase III foi encerrado precocemente porque o tratamento com nivolumabe aumentou a sobrevida global em comparação aos pacientes que receberam dacarbazina. O pembrolizumabe também já foi bastante estudado em melanoma metastático e, assim como o nivolumabe, tem respostas objetivas muito maiores quando comparadas com o ipilimumabe, em quantidade, mas, ainda mais importante, com duração prolongada. O braço dos pacientes que recebeu pembrolizumabe teve maior sobrevida livre de progressão e sobrevida global. Mais recentemente, foram apresentados os resultados iniciais do estudo de fase III da combinação de ipilimumabe com nivolumabe versus cada um dos agentes usados de maneira isolada para pacientes com melanoma avançado que não haviam recebido nenhum tipo de tratamento prévio. O grupo de pacientes que recebeu ipilimumabe com nivolumabe e o nivolumabe isolado teve maior sobrevida livre de progressão com maior número de respostas objetivas quando comparado ao grupo que recebeu a prescrição de ipilimumabe isoladamente. Apesar de o estudo não ter sido desenhado para ter o poder estatístico de comparar o braço da combinação com o braço do nivolumabe isolado, o uso de ipilimumabe com nivolumabe teve numericamente uma maior sobrevida livre de progressão e maior resposta objetiva do que os pacientes tratados com nivolumabe isolado. Em termos de toxicidade, a combinação de nivolumabe e ipilimumabe apresentou um número muito maior de eventos adversos, inclusive eventos graus 3 e 4, em mais de 50% dos pacientes. De uma maneira geral, esses eventos foram consistentes com a experiência clínica prévia do tratamento com o nivolumabe e o ipilimumabe como droga isolada, sem novas toxicidades identificadas e sem óbitos relacionados ao tratamento no grupo da combinação. Os eventos adversos, mesmo aqueles graduados como graves, foram manejáveis de acordo com as recomendações de manejo já estabelecidas para as drogas isoladas, e muitas das alterações laboratoriais identificadas não estavam relacionadas a sintomas ou queixas dos pacientes e clinicamente não tiveram significado. Os efeitos colaterais dessas imunoterapias, os chamados eventos adversos imunorrelacionados, são diferentes daqueles causados pela quimiotera-


pia convencional ou da toxicidade descrita com o uso das drogas alvo (inibidores de BRAF e MEK ou suas combinações). Os principais efeitos envolvem a pele (rash e prurido), o trato gastrointestinal (diarreia e colite), o fígado (elevação das enzimas hepáticas), as endocrinopatias (alterações na função da tireoide, da hipófise e das adrenais) e outros eventos inflamatórios menos comuns, como uveíte, neurite, pancreatite, nefrite, pneumonite, etc. Apesar de todo o avanço observado nos últimos anos no tratamento do melanoma com essas imunoterapias, algumas questões continuam sem resposta, como a dosagem ótima dessas medicações, o intervalo entre as doses e a duração do tratamento. Isso tem importância tanto para a comodidade do paciente, para o manejo de eventos adversos, como também em questões relacionadas ao custo e ao acesso ao tratamento. A busca por biomarcadores preditores de resposta e de prognóstico ainda está em estudo também. A maior parte das investigações em biomarcadores para o uso de agentes anti-PD-1 está focada na expressão de seu ligante PD-L1 no microambiente tumoral por imuno-histoquímica. Nos estudos já publicados que incluem vários tipos de tumores, aquelas lesões que expressavam PD-L1 tiveram mais respostas objetivas ao uso de agentes anti-PD-1 se comparadas aos que não expressavam o ligante nas amostras tumorais. Entretanto, alguns pacientes que não expressavam o PD-L1 também tiveram resposta ob-

jetiva e, portanto, a questão segue em aberto e novos estudos precisam ser realizados. Outra forma de imunoterapia para o melanoma recentemente testada foi o talimogene Iaherparepvec (T-VEC). O T-VEC é um herpes vírus simples do tipo 1 modificado, desenhado para se replicar apenas em células tumorais, produzir e liberar no organismo o fator de estimulação de colônias de granulócitos e macrófagos (GM-CSF,) que estimula por sua vez a resposta imune antitumoral. O T-VEC foi comparado ao uso de GM-CSF em pacientes com melanoma avançado com baixo volume de doença visceral e com lesões que pudessem receber a injeção da droga em teste. O T-VEC foi a primeira imunoterapia oncolítica a demonstrar benefício no melanoma avançado em um estudo de fase III; foi bem tolerado e os objetivos do estudo foram alcançados com ganho na duração da resposta e aumento em sobrevida global. Em resumo, muito se aprendeu nos últimos anos com as novas modalidades de tratamento para o melanoma, especialmente as imunoterapias com os diversos bloqueadores de checkpoint (CTLA-4 e PD-1), mas também com o T-VEC. Essas imunoterapias têm melhorado o resultado, trazendo novas opções de tratamento. Hoje, o melanoma deixou de ser uma doença órfã de terapias que mostrassem ganho em sobrevida e se tornou um exemplo a ser seguido no tratamento oncológico.


gastrointestinal

Metástases hepáticas de câncer colorretal que desaparecem durante a quimioterapia

O

CÂNCER COLORRETAL

(CCR)

É A SEGUNDA

Divulgação

CAUSA DE CÂNCER EM MULHERES E A TERCEIRA

Maria de Lourdes Lopes de Oliveira * Médica oncologista e coordenadora do Grupo de Tumores Gastrointestinais da Oncologia D’Or

Contato: m.lourdes.oncologista@gmail.com

32

julho/agosto 2015 Onco&

EM HOMENS NO BRASIL, E UM DOS MAIS FREquentes no mundo. Em algum momento durante a evolução da doença, metade dos pacientes vai apresentar metástase hepática. Desses, de 10% a 25% são candidatos a ressecção cirúrgica na ocasião da apresentação¹. A utilização das estratégias de tratamento com esquemas combinados de drogas, incluindo agentes citotóxicos e agentes biológicos, leva a um aumento de 50% nas taxas de resposta em metástase hepática e 20% em procedimentos de ressecção com intenção curativa². Nesse contexto, existe um crescente aumento de metástases hepáticas que “desaparecem” durante a quimioterapia, ou seja, não se tornam mais visíveis aos métodos de imagem. Isso ocorre em 5% a 38% dos pacientes que se submetem a tratamento quimioterápico pré-operatório. Um recente artigo de revisão publicado na Hepatobiliary Surgery Nutr sugere um algoritmo a ser seguido nessa situação¹ (Figura 1).

Impacto na evolução das metástases hepáticas que “desaparecem” durante o tratamento pré-operatório Um estudo publicado em 2012 por um grupo do Japão³ avaliou 125 pacientes com câncer colorretal e metástase hepática que foram submetidos a tratamento com mFOLFOX 6 com ou sem bevacizumabe, selecionando aqueles nos quais os métodos de imagem (tomografia, PET CT e resso-

nância magnética) não evidenciaram mais existência de metástase. O número médio de lesões era oito, o diâmetro médio era de 1,8 cm e o tempo para que as lesões não fossem mais identificadas foi de 6,5 meses. Durante o acompanhamento desses pacientes, a taxa de recidiva in situ foi de 9,1, 9,1 e 31,1% em 1, 2 e 3 anos, respectivamente. Nesse estudo, o percentual de respostas completas verdadeiras das lesões que desapareceram foi de 18%. No entanto, apesar do resultado favorável desse estudo, os autores recomendam que sejam tomadas as seguintes estratégias para que após a quimioterapia as lesões não desapareçam: reduzir o número de ciclos de quimioterapia pré-operatória, acompanhar rigorosamente a imagem para que as metástases hepáticas não reduzam a ponto de o cirurgião não as identificar durante a cirurgia e, caso assim mesmo elas não consigam ser identificadas por imagem pré-operatória, seguir com um acompanhamento rigoroso. Outro estudo de um grupo canadense4, utilizando como métodos de imagem tomografia, ressonância magnética e PET CT, avaliou 435 pacientes, tratados com quimioterapia baseada em oxaliplatina, 5FU e iriinotecan, sem adição de cetuximabe ou bevacizumabe, e concluiu que os preditores de verdadeira resposta completa, em análise univariada, foram pacientes que não apresentavam tecido adjacente hepático esteatótico. Naqueles em que o índice da massa corpórea era <30 kg/m², quando a metástase hepática tinha sido tratada com quimio-


terapia intra-arterial, o CEA normalizava durante a quimioterapia. Já na análise multivariada, a normalização do CEA, a impossibilidade de detectar lesão na ressonância pós-tratamento e o uso de quimioterapia intra-arterial foram fatores independentes de resposta completa verdadeira. No follow up de 40 meses dos pacientes desse estudo, a taxa de recorrência no fígado foi de 44% e extra-hepática de 21%. No entanto, ao contrário do estudo anterior, esse estudo apresenta limitação por ser retrospectivo. Algoritmo para metástase hepática que desaparece após quimioterapia (MHD) Terapia neoadjuvante

O artigo de revisão de Alex Zendel et al, do Departamento de Cirurgia de Tel Aviv ao qual vamos nos deter¹, faz as seguintes considerações: 1 - Identificação de risco

Os fatores de risco para o desaparecimento das metástases em pacientes tratados com quimioterapia são: • Lesões pequenas no fígado (<2 cm), número inicial de metástases maior que três e tempo prolongado de quimioterapia pré-operatória (identificado como 7,7 versus 5,5 ciclos)5,6. Para cada ciclo adicional de tratamento existe aumento de 18% na chance de desaparecimento de metástase hepática. Esse risco aumenta entre 3 e 6 meses após o início do tratamento. Baseado nisso, alguns autores sugerem que na neoadjuvância sejam realizados de 4 a 6 ciclos de tratamento7,8. 2- Métodos de imagem

Redução da lesão

MHD

Ressonância

PET (doença extra-hepática)

Ressonância difusão/hepatobiliar

MHD

Exploração cirúrgica com inspeção e US

Tratamento local

Ressecção

MHD

A resposta radiológica completa varia dependendo do esquema de quimioterapia e da qualidade do método de imagem para a avaliação de resposta. • Tomografia computadorizada A qualidade da imagem vem melhorando ao longo das décadas, possibilitando uma sensibilidade para detecção de metástase hepática que varia de 63% a 90%, e especificidade de 85% a 90%5, 8,9,10,11. A esteatose é um complicador da boa avaliação do fígado, pois gera uma aparência negra de fundo no fígado, reduzindo o contraste das metástases hipovasculares, principalmente se o fígado tem mais de 30% de esteatose, mais de três metástases ou lesões menores que 1 cm7,9,12,13. • PET CT Esse método, apesar de ser excelente para detecção de doença extra-hepática, sofre com a redução de captação de glicose nas células que receberam quimioterapia, tendo sua sensibilidade reduzida a 51% em alguns estudos14,15. • Ressonância magnética É o melhor método de imagem, principalmente quando existe esteatose induzida pela quimioterapia2,16, em especial quando se usam técnicas de difusão e com fase hepatobiliar, o que propicia o contraste entre o hepatócito e as células tumorais6, fazendo deste o método de eleição para essa situação. 3- Esses pacientes devem ser sempre operados?

Ablação Segmentectomia “às cegas”

Figura 1. Algoritmo adaptado. Vanish liver metástases. Hepatobiliary Surg Nutr 2014;3(5):295-302

Não está claro se os pacientes que têm as suas metástases negativadas após a terapia devem ser submetidos a cirurgia. O autor sugere que seja discutido em equipe multidisciplinar. 4- Como melhorar a avaliação intraoperatória?

O uso de ultrassonografia peroperatória associada à palpação iden-

Onco& julho/agosto 2015

33


Os pontos mais importantes a serem considerados na abordagem dos pacientes com câncer colorretal e metástase hepática que desaparece durante a quimioterapia pré-operatória são: a imagem, o uso de ultrassonografia perioperatória e a abordagem por equipe multidisciplinar

tifica de 27% a 45% das lesões residuais5, sendo indispensável sua utilização. 5- Como abordar durante a cirurgia as lesões que sumiram?

Quando o cirurgião não consegue localizar a lesão durante o ato cirúrgico, pode optar por tratar cirurgicamente a localização anatômica. No entanto, o fato de realizar uma hepatectomia maior no local de doença prévia pode não diminuir a recorrência e, inclusive, piorar o prognóstico por reduzir a chance de segunda hepatectomia. Caso se opte por deixar a lesão in situ, esta deve ser monitorada por imagem. O tempo de acompanhamento ainda não está definido, mas, uma vez que a maioria das recidivas ocorre em seis a oito meses, pode ser considerado como resposta clínica durável se não houver aparecimento de lesão em um ano5,2,6.

Referências bibliográficas: 1. Aex Zendel,Eylon Lahat, et al. Vanishing liver metastases- A real challenge for liver surgeons .Hepatotobiliary Surg Nutr 2014;3(5):295-302. 2. Bischof DA, Clary, et al.BM. Surgical management of disappearring colorectal liver metastases. Br J Surg 2013;100:1414-20. 3. Tomojiro Ono, Hideyuki Ishida, et al. Outcoming in disappearing colorreactal cancer liver metastases during oxaliplatin-based chemotherapy. Oncology letters.2012;4:905-909. 4. Rebecca C Auer,Rebekah R White,et al. Predictors of a true complete response among disappearing liver metastases from colorectal cancer after chemotherapy. Cancer 2010;March 15: 1502-1509. 5. Van Vledder MG, de Jong MC, et al.Disappearing colorectal liver metatases after chemotherapy:should we be concerned? J Gastrointest Surg 2010; 14:1691-700. 6. Auer RC, White RR, Kenemy NE, et al. Predictors of a true response among disappearing liver metastases from colorectal cancer after chemotherapy. Cancer 2010;116:1502-9. 7. Thomay AA, Charpentier KP, et al. Optimazing ressection for “responding” hepatic metastases after neoadjuvant Chemotherapy. J Surg Oncol 2010; 102:1002-8. 8. Gaujoux S,Goéré D, et al. Complete response of colorectal liver metastases after chemotherapy: what can we expect? Dig Surg 2011;28:114-20. 9. Fowler KJ,Linehan DC, et al. Colrectal liver metastases : state of art imaging. Ann Surg Oncol 2013;21:1185-93.

36

julho/agosto 2015 Onco&

Por outro lado, o uso de radiofrequência é um bom método alternativo. A ablação é realizada no local previamente marcado como sítio de metástase, evitando grandes ressecções. Porém, ao contrário da cirurgia, a única maneira de avaliação de sucesso é na imagem de acompanhamento17. Não existe consenso na literatura, mas podemos usar como fatores preditivos de boa correlação da resposta completa radiológica com a patológica o número inicial de metástases, pacientes jovens (<60), CEA inicial (<30) que se normaliza durante a quimioterapia, ausência de imagem na ressonância pré-operatória e lesões pequenas (<3cm)18. Os pontos mais importantes a serem considerados na abordagem dos pacientes com câncer colorretal e metástase hepática que desaparece durante a quimioterapia pré-operatória são: a imagem (sendo a ressonância o principal método), o uso de ultrassonografia perioperatória e a abordagem por equipe multidisciplinar.

10. Kamel IR, Choti MA,et al. Surgically staged focal liver lesions. Accuracy and reproducibility of dual phase CT for detection and characterization. Radiology2003;227:752-71. 11. Kim YK, Park G , et al. Diagnostic efficacy of gadoxetic acid-enhanced MRI for the detection and characterisation of liver metastases;comparison with multidetector-row CT. Br J Radiol 2012;85:539-47. 12. Oliva MR,Mortele KJ,et al. Computed tompgraphy features nonalcholic steatohepatitis with histopathologic correlation. J Comput Assis Tomogr 2006;30:37-43. 13. Albercht T, Blomley MJ, et al. Improved detection of hepatic metastases with pulse-inversion US during the liver-specific phase of SHU 508A: multicenter study. Radiology 2003;227:361-70. 14. Niekel MC,Bipat S, et al. Diagnostic imaging of colorectal liver metastases with CT,MRimaging,FDG PT: a meta-analysis of prospective studies including patients who have not previously undergone treatment. Radiology 2002; 224:748-56. 15. Akhusrst T,Kates TJ,et al. Recent chemotherapy reduces the sensitivity of FDG PET in detection of colrectal metastases. J Clin Oncol 2005;23: 8713-6. 16. Kulemann V, Schims W, et al. Preoperative detection of liver metastases in fatty liver MDCT or MRI? Eur radiol 2011;79:el-6. 17. Mahvi DM, Lee FT Jr,et al.radiofrequency ablation of hepatic malignancies: is heat better than cold? Ann Surg 1999;230:9-11. 18. Bischof DA, Clary BM, et al. Surgical managment of disappearing colorectal liver metastases. Br J Surg 2013;100: 1414-20.


gestão

Aplicando lean na saúde

1

Nenhuma quantidade de contratações pode superar os defeitos fundamentais do sistema. W.E. Deming, em Saia da Crise, 1990.

O

Divulgação

INTERESSE NO USO DO PENSAMENTO LEAN NO

SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIRO É CRESCENTE E O ASSUNTO COMEÇA A GANHAR REPERCUSSÃO

Carlos Frederico Pinto * Diretor executivo do Grupo IOV

Divulgação

Contato: carlosfpinto@iov.com.br

Flávio Battaglia * Gerente de Projetos do Lean Institute Brasil

Contato: flavio@lean.org.br

seguindo tendências observadas no resto do mundo. Centros médicos e instituições de vanguarda na Europa, América do Norte e Oceania empreendem grandes iniciativas desenvolvendo e aplicando lean em seus hospitais, centros ambulatoriais e sistemas de saúde completos, como na Província de Saskatchewan, no Canadá, onde todo o sistema de saúde se desdobra a partir de uma única estratégia lean. Apesar de ainda recente – menos de 15 anos –, a utilização do lean no sistema de saúde vem trazendo resultados impressionantes, muitas vezes revolucionários, com economia expressiva de recursos e salto na qualidade dos serviços prestados. Os benefícios do lean na saúde envolvem ganhos na segurança dos processos, na eliminação de diversas formas de desperdício, jornadas clínicas mais rápidas e simples e uma melhor experiência global do cuidado prestado. O Sistema de Saúde do Reino Unido (NHS – National Health System) e o Sistema de Saúde Canadense aplicam o pensamento lean de maneira abrangente como políticas e práticas através de toda a sua estrutura há mais de uma década. Muitos dos melhores hospitais da América do Norte fazem parte de uma rede de cooperação de lean. A Healthcare Value Network (HVN) é uma organização voltada a compartilhar e ensinar as melhores práticas do lean na saúde. Hospitais como o John Hopkins Medical Center, a Clínica Mayo, a Cleveland Clinic, o Seattle’s Children Hospital, o

Centro Médico da Universidade de Stanford, o Barnes-Jewish Hospital, da Universidade de Washington, e os Centros Hospitalares da UCLA e da Universidade de Michigan fazem parte dessa network e já estão envolvidos com lean há vários anos, alguns há mais de dez anos.

O que se ganha com lean na saúde? Os benefícios do lean aplicado à saúde tratam exatamente dos problemas mais comuns ao sistema: longas filas, custos crescentes e diversos tipos de desperdício recorrentes em todos os sistemas de saúde que conhecemos. Pequenas iniciativas lean são capazes de reduzir filas, aumentar a agilidade e a qualidade da documentação dos processos, reduzir erros e custos indiretos (estoques, administração, logística) e otimizar a utilização dos recursos. Quando lean se torna a estratégia organizacional, a transformação pode ser profunda. O ThedaCare, um sistema de saúde com quatro hospitais e mais de 5 mil empregados no estado do Wisconsin, EUA, é uma dessas organizações onde a transformação lean é a base da estratégia da organização. Com isso, o ThedaCare gerou até hoje uma economia superior a 27 milhões de dólares. O modelo de cuidado colaborativo desenvolvido resultou em uma redução de 25% nos custos globais da assistência, com 100% de satisfação de seus clientes. Da mesma forma, até 2010, em dois de seus hospitais, 88% dos indicadores de qualidade e segurança haviam melhorado, e 85% dos indicadores de satisfação dos clientes e 83% dos indicadores de satisfação dos empregados também melhoraram.

Onco& julho/agosto 2015

37


Entre 2008 e 2011 o ThedaCare aumentou em quase 20% a margem bruta de seu fluxo de caixa. No pioneiro programa das “Accountable Care Organizations” (organizações para cuidados integrais e coordenados) do Medicare, o ThedaCare é o número 1 em qualidade e redução de custos do cuidado2. A tabela a seguir exibe os resultados do “cuidado colaborativo” do ThedaCare entre 2006 e 2009.

Medida

Erro na reconciliação medicamentosa Bundles

38

julho/agosto 2015 Onco&

Era “pré-cuidado colaborativo” (2006)

Final de 2007

Final de 2008

2009

Comparado a unidades sem “cuidado colaborativo”

1,05 por prontuário

0,01

0

0

1,25 por prontuário

38% pneumonia

100% pneumonia 92,5% ICC

95% pneumonia 85% ICC

95% pneumonia 92% ICC

83% pneumonia 90% ICC

68%

87%

90%

4,5 em escala até 5 (revisado em 2008)

Tempo de permanência

3,71 dias

2,96 dias

3,16 dias

3,01 dias

3,19

Custo médio por caso (usando Medicare RCC)

$ 5,669

$ 4,467 (-21% s. 2006)

$ 5,849

$ 5,567

$ 7,775

Satisfação do cliente

O Children’s Hospital, através de redesenho estrutural e ganho de capacidade, evitou um gasto de 180 milhões de dólares na expansão de sua área física

economia de recursos, impactam também na segurança dos processos e na qualidade dos serviços. O Sistema de Saúde do Reino Unido (NHS UK) vem utilizando estratégias lean há mais de uma década, com impacto em toda a cadeia produtiva da saúde. Projetos envolvendo os hospitais de emergência garantem hoje que 99% dos pacientes sejam atendidos, tratados e liberados ou internados em até quatro horas6. O tempo de espera para acesso a

O Collaborative Care do ThedaCare

Ainda nos EUA, o Virginia Mason Medical Center (VMMC), de Seattle, é também pioneiro e passou por uma transformação drástica: no início dos anos 2000, era um hospital deficitário e atravessava uma grave crise institucional após um traumático erro médico dentro de suas instalações. Após anos de um árduo trabalho aplicando lean, figurou como o melhor hospital geral dos EUA por seis anos consecutivos, entre 2006 e 2011, até ser eleito pelo LeapFrog Group (instituição voltada para a promoção da qualidade em saúde) como o melhor hospital dos EUA. O segundo colocado é um dos membros da HVN, o John Hopkins, de Baltimore. Ainda em Seattle, o Children’s Hospital, através de redesenho estrutural e ganho de capacidade, evitou um gasto de 180 milhões de dólares na expansão de sua área física. O St. Francis Hospital (Indianápolis) vem modificando seus processos na ordem de 3 mil a 4 mil melhorias por ano, gerando uma economia de recursos superior a 1 milhão de dólares anuais3. Os ganhos não estão limitados à

especialistas foi reduzido de 20 semanas para 36 horas. Houve uma redução de 7,8% no período médio de internação e de 33% no cancelamento de cirurgias cardiotorácicas eletivas. Milhões de libras foram economizadas em investimentos desnecessários, apenas com a melhoria dos fluxos e dos processos assistenciais7. A essência do pensamento lean é a contínua eliminação das atividades desnecessárias, os desperdícios, que permeiam praticamente todos os processos: assistenciais, de suporte e administrativos. Se formos capazes de eliminar o esforço desnecessário, teremos mais tempo e recursos para as coisas realmente importantes. Eliminar desperdícios significa ser capaz de deixar de fazer o que é irrelevante, ganhando capacidade para aprimorar aquilo que realmente interessa: a segurança do paciente e a qualidade do cuidado. Se não repensarmos drasticamente a maneira como organizamos o trabalho, promovemos melhorias, resolvemos problemas e desenvolvemos pessoas, a solução para


todos os nossos males será sempre “mais recursos”. O que realmente precisamos é de “mais gestão”, “mais gente pensando” e “menos desperdícios”.

A experiência lean do Grupo IOV O Grupo IOV começou sua jornada lean em 2008, e muitos projetos já foram executados desde então, com ganhos expressivos em capacidade operacional e eficiência. A tabela abaixo exibe os principais resultados do IOV nos últimos anos. No início de sua jornada, o IOV executava procedimentos para mais ou menos 70 pacientes por dia. Em 2012, atendia aproximadamente 200 pacientes por dia, com praticamente a mesma quantidade de recursos alocados. Não houve expansão das instalações. O crescimento de pessoal foi em torno de 10%, mas as horas extras caíram aproximadamente 40% entre 2010 e 2012. A segurança dos serviços também aumentou substancialmente, com redução de eventos sentinela na ordem de 75% e redução superior a 50% dos riscos associados aos procedimentos executados.

Mas seus benefícios reais surgem na integração em um sistema de gestão da organização através dos seis princípios do pensamento lean aplicado à saúde proposto por John Toussaint4,8, como veremos a seguir.

Princípio 1: criar valor para o cliente Definir valor num serviço de saúde pode ser algo subjetivo, principalmente sob a perspectiva do cliente. Mesmo que muitas coisas deem “errado” durante seu processo assistencial (como infecções hospitalares, embolias, erros de medicação e procedimentos), o paciente pode se sentir absolutamente satisfeito com o serviço prestado – envolvendo-se positivamente com a experiência do cuidado. No IOV foi adotado o conceito de “Experiência do cuidado perfeito” usando as Seis Dimensões do Cuidado (do Institute of Medicine, EUA): o cuidado seguro; eficiente; eficaz; ágil; centrado do cliente (que é um dos principais responsáveis pela “experiência perfeita”); e justo. Hoje, todas as iniciativas no IOV envolvem a “voz do cliente” – ou

Jornada lean no IOV: Como criamos valor até aqui Segurança (redução de eventos sentinela)

Menos 75% (2010-2012)

Agilidade (sistema público)

90% dos casos novos atendidos em até 15 dias

Eliminação de desperdício em movimento e transporte

18.000 km (acumulado)

Eliminação de desperdício em horas através da eliminação de tarefas, movimento, etc.

13.000 horas por ano, ou 6,25 postos de trabalho

Ganho de produtividade anual por colaborador

12 dias por ano (5,4%)

Redução de horas extras

Menos 40% (entre 2010 e 2012)

Redução do consumo de energia elétrica

Menos 16% (2013)

Estoques

Menos 70% (entre 2009 e 2013)

Ganho de capacidade associada aos projetos

Aproximadamente 170% (entre 2008 e 2013)

No IOV foi adotado o conceito de “Experiência do cuidado perfeito” usando as Seis Dimensões do Cuidado (do Institute of Medicine, EUA): o cuidado seguro; eficiente; eficaz; ágil; centrado do cliente; e justo

Criando Valor no IOV

A promessa do lean na saúde Da mesma forma que a adaptação do “Sistema Toyota de Produção” para o conceito de “manufatura lean” demandou tempo, esforço e vem evoluindo na maioria das manufaturas que o adotaram, a adaptação do lean ao sistema de saúde também vem evoluindo e se tornando cada vez mais uma estratégia organizacional e não apenas um conjunto de ferramentas operacionais. Os benefícios do lean são visíveis em pequenos projetos localizados, como usualmente vistos em unidades cirúrgicas ou prontos-socorros.

aquilo que realmente é importante para ele: a segurança nos processos, assim como as outras cinco dimensões. A percepção de valor também se dá identificando o que não é necessário no processo: o que é retrabalho, defeito ou movimento desnecessário. Separar “valor para o cliente” do “desperdício no processo” melhora não só a qualidade do cuidado, mas também reduz os custos assistenciais, eliminando centenas de etapas não críticas ou desconectadas dos processos essenciais que criam atrasos, filas e descontentamento.

Onco& julho/agosto 2015

39


Princípio 2: atitude de melhoria contínua

A principal ferramenta utilizada no IOV foi o “Mapeamento do fluxo de valor”, uma forma adaptada do “Ciclo do PDCA” voltada a identificar desperdícios associados aos principais fluxos do sistema de saúde: dos pacientes; dos médicos; dos recursos; do ambiente; e dos equipamentos, materiais e medicamentos

40

julho/agosto 2015 Onco&

Existem apenas quatro motivos para modificarmos um processo: facilitar, melhorar, agilizar ou barateá-lo. E há uma ordem de prioridade. As pessoas em geral não gostam de mudanças, mas lean é sobre mudanças que valham o esforço. Muito daquilo que chamamos de melhoria nos processos são apenas etapas adicionais, mais burocracia, custos extras e pouquíssimos benefícios reais para os clientes, sem ganhos na segurança ou na agilidade, e sem reduzir o custo do serviço. Se uma mudança não contemplar um dos quatro motivos acima, ela não vale a pena. Uma mudança para melhor envolve toda a organização e acontece de forma transversal: do topo até a linha de frente. Todos precisam estar envolvidos na eliminação dos defeitos, dos reprocessamentos e dos desperdícios para melhorar a experiência do cuidado. A principal ferramenta utilizada no IOV foi o “Mapeamento do fluxo de valor”, uma forma adaptada do “Ciclo do PDCA” voltada a identificar desperdícios associados aos principais fluxos do sistema de saúde: dos pacientes; dos médicos; dos recursos; do ambiente; e dos equipamentos, materiais e medicamentos.

Princípio 3: unidade de propósito Uma das grandes decepções com projetos de melhoria é que eles “não dão o resultado esperado”; às vezes ouvimos isso também sobre o processo de acreditação. Muito dessa impressão negativa está associado a um problema de alinhamento estratégico. Uma organização precisa não só de um objetivo – ou meta – estratégico, mas principalmente de orientação estratégica. No IOV nenhum projeto ou ação de melhoria pode ser executado se não estiverem claros o objetivo e a métrica a ser alcançados. E esse objetivo precisa estar alinhado ao menos a uma das seis dimensões do cuidado. Ao longo dos anos desenvolvemos também alinhamentos e metas específicas para ciclos anuais ou bianuais – dessa forma, iniciativas importantes, mas que não estejam ligadas ao ciclo atual, não serão aprovadas. A Unidade de Propósito é também uma forma de eliminar desperdício. Não alocamos recursos em projetos não alinhados, não gastamos energia com ideias que não deixem claro o benefício – e isso vale também para a operação diária: todas as tarefas diárias precisam

ser relevantes para o objetivo estratégico, todas devem nos levar ao nosso destino. Isso é o que em lean chamamos de “Norte verdadeiro”, ou o objetivo real de uma organização e de seus colaboradores, o motivo fundamental que nos faz sair de casa cedo todos os dias.

Princípio 4: respeito pelas pessoas Defeitos nos processos podem muitas vezes ser genericamente chamados de erros médicos, eventualmente podendo ser letais. Um processo que produz muitos erros foi desenvolvido para produzir muitos erros. 94% dos erros pertencem aos processos, apenas 4% são provocados pelas pessoas envolvidas ou por variação especial nos processos5,9. Respeitar as pessoas é compreender que um erro em um procedimento ou em uma medicação normalmente está associado a uma longa sequência de pequenos erros que foram ignorados ou nem sequer foram identificados. Criar processos seguros e um ambiente de trabalho seguro é um dos pilares do pensamento lean. É por onde a melhoria contínua deve começar: pela segurança de todos. Criar um ambiente no qual a segurança é prioridade envolve uma mudança cultural em todos os níveis dentro de uma organização: da manutenção geral ao diretor-geral. Isso significa criar um ambiente em que a comunicação possa ser aberta e transversal, em que as equipes possam socializar seus problemas, seus erros e o aprendizado envolvido (a melhoria contínua), em que todos sejam tratados com respeito.

Princípio 5: lean é visual Uma das melhores formas de melhorar um processo, reduzir seus riscos e eliminar seus desperdícios é tornar os problemas visíveis. A capacidade de indivíduos e equipes de resolver problemas, tornando processos mais seguros e estáveis, cresceu no IOV à medida que tornávamos visuais os processos. Atualmente, todos os problemas são postados em um quadro visível a todos: clientes, colaboradores, acompanhantes, visitantes e fornecedores. Desde 2010, mais de 1,7 mil problemas foram identificados e tratados, e outras 800 boas ideias foram adotadas. Muitos processos também contam com apoios visuais e guias que facilitam a execução e a qualidade da assistência.


Princípio 6: lean é padronização com flexibilidade A instabilidade é tida como um dos grandes problemas do sistema de saúde. Prontos-socorros costumam lotar nas segundas-feiras e têm uma demanda significativamente maior nos períodos de outono e inverno (com as queixas gripais ou alérgicas). Entender essa variabilidade e ser capaz de criar mecanismos para estabilizar e suavizar os processos é um dos maiores desafios do sistema como um todo. Da mesma forma, serviços não padronizados não produzem resultados consistentes. Ser capaz de definir padrões sustentáveis – que façam sentido para todos – e ao mesmo tempo criar flexibilidade para que esses padrões continuem a melhorar é o último desafio. O paradoxo é que, ao reduzir a variabilidade dos processos, os tornamos não só mais confiáveis, mas também mais flexíveis: muitas das tarefas, hoje no IOV, podem ser realizadas por diferentes pessoas, com auxílios visuais e processos simplificados, fáceis de serem entendidos e seguidos. São padrões que estabilizam processos, aumentam a capacidade produtiva e criam espaço para novas mudanças – cada vez mais flexíveis, cada vez melhores.

Conclusão Existe uma enorme janela de oportunidade para a aplicação dos conceitos e técnicas lean na área da saúde, e estamos cada vez mais convencidos de que

esse corpo de conhecimento será um importante catalisador para a transformação da gestão em saúde no Brasil. Nossa sociedade precisa de um sistema de saúde que erre menos, que custe menos, que desperdice menos, que entenda as reais necessidades dos seus clientes e que seja capaz de entregar aquilo que eles desejam. Aplicar o pensamento lean é uma alternativa inovadora e comprovadamente eficaz para enxergar e resolver os problemas através de suas causas profundas. Adicionar mais recursos (materiais, tecnológicos, financeiros ou humanos) não é a melhor maneira de agir quando se está diante de um processo “quebrado”, no qual os recursos existentes são mal utilizados, consumidos por desperdícios de diversas naturezas. À medida que os resultados das primeiras experiências começam a se consolidar no Brasil, temos a impressão de estar diante de uma grande e possível transformação. Mudanças concretas, profundas, práticas e relativamente simples podem fazer a diferença na vida de milhares de pacientes e profissionais da área da saúde – do presidente ao assistente de portaria –, todos envolvidos na solução dos desafios técnicos, gerenciais e humanos do dia a dia. Talvez sejam esses os ingredientes necessários para reequilibrarmos a complexa equação de custo e qualidade da maioria das organizações e dos profissionais de saúde no Brasil. Lean pode ajudar, e muito.

Nossa sociedade precisa de um sistema de saúde que erre menos, que custe menos, que desperdice menos, que entenda as reais necessidades dos seus clientes e que seja capaz de entregar aquilo que eles desejam

Referências bibliográficas: 1. Texto adaptado da introdução do livro “Em Busca do Cuidado Perfeito: Aplicando Lean na Saúde”. Carlos Frederico Pinto. Ed. Lean Institute Brasil, São Paulo, 2014. 2. http://www.hhmglobal.com/knowledge-bank/case-studies/thedacare-improved-outcomes-with-lean-management. Acessado em 20/10/2013. 3. https://www.thedacare.org/News%20and%20Events/Company%20News/Bellin%20ThedaCare%20Health%20Partners%20are%201%20in%20Improving% 20Quality%20of%20Care.aspx. 4. Imai, Massaki. Kaizen: The Key to Japan´s Competitive Success. McGraw Hill, New York, 1986. 5. Graban M, Swartz JE. Healthcare Kaizen.CRC Press, Boca Raton, 2012. 6. Banerjee A.et al, The impact of process re-engineering on patient throughput in emergency departments in the UK Int J Emerg Med. Sep 2008; 1(3): 189–192. 7. http://www.leanhealthcareacademy.co.uk/Page/lean_case_studies. 8. Toussaint, J. S., and L. L. Berry. The promise of lean in health care. Mayo Clinic Proceedings 88, no. 1:74-82, 2013. 9. W.E. Deming, Out of Crisis, 1990.

Onco& julho/agosto 2015

41


cabeça e pescoço

Divulgação

Cuidados orais no paciente irradiado

S

ÃO ESPERADOS PARA 2015 CERCA DE 203 MILHÕES

DE HABITANTES NO

BRASIL. COM

O ENVELHECI-

MENTO GRADATIVO DA POPULAÇÃO E A MELHORA

Célia Maria Pais Viégas * Doutora em radioterapia, rádio-oncologista responsável pelo Centro Radioterápico Gávea, subchefe do Serviço de Radioterapia Instituto Nacional de Câncer (Inca)

Contato:

Divulgação

cmpviegas@yahoo.com.br

Carlos Manoel Mendonça de Araújo * Doutor em radioterapia, rádio-oncologista do Centro Radioterápico Gávea e chefe do Serviço de Radioterapia do Instituto Nacional de Câncer (Inca)

Contato: cmmaraujo@globo.com

42

julho/agosto 2015 Onco&

da qualidade de vida, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) prevê uma expectativa de vida de cerca de 75 anos: a população está envelhecendo e, com isso, surgem doenças crônico-degenerativas associadas ao envelhecimento, entre elas o câncer. Há projeções para 2050 de que o câncer será a maior causa de morte. Trata-se, portanto, de uma “epidemia” anunciada. O carcinoma de cabeça e pescoço (CCP) representa a terceira causa mais comum de óbito por câncer no mundo. As estimativas para 2015 são de cerca de 46 mil casos novos de CCP e 9 mil óbitos pela doença nos EUA. No Brasil são esperados de cerca de 500 mil casos novos de câncer e, entre esses pacientes, em sítio de CP, 22 mil casos novos e 9 mil óbitos, logo, uma maior letalidade brasileira. Isso é parcialmente explicado porque os pacientes se apresentam com estádios mais avançados, nos quais as taxas de controle tumoral e cura são inferiores. No CCP predomina o tipo histológico de carcinomas espinocelulares (CEC). Os sítios de maior acometimento são orofaringe, cavidade oral, hipofaringe ou laringe. O desenvolvimento de CEC de CP resulta da interação multifatorial de fatores ambientais (tabagismo, etilismo, infecções virais), doença de refluxo gastroesofageano e herança genética. Tabagismo e alcoolismo são os mais importantes fatores de risco para seu desenvolvimento e atuam sinergicamente. Outro fator importante é a infecção pelo papilomavírus humano (HPV), responsável por cerca de 1/4 dos casos: a infecção por HPV tem conhecido papel na carcinogênese orofaríngea, particularmente nos casos de câncer amigdaliano, com prognóstico mais favorável. Outros

fatores também descritos são higiene oral precária, história familiar e outros menos frequentes. Porém, nem todos os tabagistas, etilistas e expostos ao vírus HPV apresentam CEC de CP, indicando que a variação individual da suscetibilidade genética desempenha papel específico no seu desenvolvimento. Em estádios iniciais, cirurgia (CIR) ou radioterapia (RT) apresentam similares índices de boa resposta terapêutica, baseando-se sua escolha em preferência pessoal, peso de toxicidades específicas de tratamentos (como xerostomia x intervenções/ mutilações cirúrgicas, etc.) e tradição da especialidade no local de tratamento. Para casos avançados, entretanto, um tratamento bimodal com quimioterapia (QT) associada à RT ou mesmo trimodal (envolvendo CIR, QT e RT) é fundamental para a melhoria dos resultados terapêuticos e o controle da doença. Poderá haver alterações, por efeitos colaterais da QT e RT, nos tecidos orais e áreas adjacentes, resultado da interação da radiação ionizante com o tecido. Seu surgimento está associado à dose aplicada e ao tipo de radiação, bem como às características das células do tecido envolvido. Os principais efeitos são: dermatite, mucosite, xerostomia, perda do paladar, disfagia, trismo, cárie e osteorradionecrose, com graus variados de ocorrência e intensidade de efeito. É fundamental uma avaliação dentária do paciente, preferencial e otimamente nas semanas que precedem o início de tratamento. Deve-se envolver vários profissionais da saúde nessa etapa para garantir um tratamento com mínimos efeitos colaterais e o menos desconfortável, desde que seja exequível administrar. Será necessária avaliação multidisciplinar, com cirurgião de CP, rádio-oncologista, oncologista clínico, físico médico, enfer-


meira oncológica, nutricionista, dentista, otorrinolaringologista, entre outros. É necessário acompanhar e orientar o paciente desde o seu encaminhamento à RT, durante seu curso, até vários anos após o término do tratamento. Para maior conforto do paciente, devem ser realizados exames, incluindo anamnese; exame clínico completo e armado de cavidade oral, oro, nasofaringe e laringe. Na avaliação de cavidade oral já é possível estimar a condição de higiene oral do paciente e presença ou não de elementos dentários, prótese e restaurações metálicas. Também é possível detectar se há linfonodomegalias, junto aos exames complementares, o que avaliará a extensão da doença bem como a necessidade de ampliação dos campos de RT. Quanto maior a área a ser irradiada, maior volume integral irradiado e, portanto, maior probabilidade de complicações cutâneo-mucosas. No momento do exame, já é possível dividir o risco dos pacientes em três categorias: paciente sem dentes, com dentes em boa conservação e com dentes em condição de conservação não adequada. O risco de complicações cresce proporcionalmente com essa progressão. Deve-se solicitar uma radiografia panorâmica e periapical do paciente, a fim de registrar status de elementos dentários e ósseos, na qual são observados o número de elementos presentes. Avalia-se a presença ou não de cárie, necessidade de tratamento endodôntico, indicação de exérese, e demais lesões, tais como periapicais, fístulas, raízes residuais, ou ainda mobilidade acentuada, dentes molares inclusos que poderão trazer problemas odontológicos futuros e com necessidade de extração. São também observadas e anotadas as alterações gengivais e periodontais; quando necessário, exames complementares são efetuados. O tempo de tratamento pré-RT deve ser o mais breve possível, em média três semanas. É fundamental enfatizar a importância da saúde bucal, no contexto geral de saúde, não só durante o período da RT, mas também no seguimento do tratamento. O dentista usualmente prescreve bochechos de solução de gluconato de clorexidina 0,2%, tid, até o início da RT, quando é substituída por outras soluções. Noções gerais de higienização e escovação são fornecidas, uso adequado do fio dental, e orientações adicionais aos pacientes edêntulos que possuem próteses móveis, tais como re-

moção dos excessos alimentares na região de rebordo, palato e língua. Um dos efeitos que poderão ocorrer é xerostomia, e sugere-se adotar todas as medidas que aumentem a probabilidade de uma boca menos seca, sejam elas físicas, químicas ou cirúrgicas. Entre as alternativas físicas está a adoção de RT com modulação da intensidade do feixe de tratamento (IMRT) sempre que exequível. Entre as drogas para um maior conforto está a pilocarpina a 5% manipulada em farmácia, visto que ela não está disponível para uso oral comercial. Deve-se iniciar seu uso 2 semanas antes do começo da RT e por 9 semanas. Uma medida descrita, mas que dificilmente é adotada, é a transposição de glândulas submandibulares de seu sítio original para a região submentoneana, onde poderão ser bloqueadas da região usual de RT. Esse procedimento, entretanto, é pouco frequente, dispendioso e retarda em até 4 semanas o início da RT, pela necessidade de adequada cicatrização da ferida operatória. Outra medida clínica é o uso de amifostina injetável, cerca de 15 minutos antes da RT, mas essa é uma medida difícil de ser empregada, pela via, pelo custo e pelos efeitos colaterais (hipotensão). É nesse momento que se deve informar o paciente sobre a eventual necessidade de interposição de via alternativa alimentar (CNE ou preferencialmente gastrostomia), pois não é infrequente a perda de peso durante a RT e QT. Ademais, a disfagia devido à mucosite poderá determinar atrasos no prosseguimento de RT. Logo, sugere-se adotá-la previamente ao início da RT. A nutricionista irá sugerir os melhores alimentos em consistência e composição para minimizar o atrito de mucosas, maximizar a cicatrização e evitar a agressão química local (consistência semipastosa ou sólida). Deve-se evitar alimentos condimentados ou processados e dar preferência aos alimentos mais frescos em temperatura ambiente ou morna (evitar alimentação muito quente). Devem ser identificados todos os elementos dentários que possuem restaurações metálicas ou próteses externas fixas que determinam fenômeno de incidência e posterior espalhamento do feixe de RT na mucosa adjacente, com possibilidade de intensificação da mucosite. Para prevenir, é confeccionada uma moldeira dental de silicone, que será usada durante a RT, em caso de impossibilidade de substituição da restauração metálica dos elementos

São observadas e anotadas as alterações gengivais e periodontais; quando necessário, exames complementares são efetuados. O tempo de tratamento pré-RT deve ser o mais breve possível, em média três semanas

Onco& julho/agosto 2015

43


Medidas simples como o hábito de chupar e deglutir gelo são acessíveis, não dispendiosas e se mostraram mais eficazes em estudo de metanálise para prevenção e controle de mucosite, na ausência de alterações hematológicas

44

julho/agosto 2015 Onco&

por restaurações não metálicas, com menor reflexão do feixe ativo. A partir dessa adequação bucal inicial, seguemse os procedimentos cirúrgicos. As exéreses dos elementos determinados pelo dentista são realizadas, com antecedência mínima de 10 a 15 dias, visando ao menor trauma na estrutura óssea que envolve o elemento dental, bem como no tecido gengival, com aproximação de bordas, de forma a permitir uma reparação mais rápida e segura. Deve-se aplicar flúor gel neutro tópico, que reduz a sensibilidade da área tratada. Substituição de restaurações, fluoretização, cuidados de placa dental e tratamento de cáries podem ser realizados em qualquer momento da RT (previamente a ela, durante e após). Extrações dentárias, porém, devem ser realizadas antes do início da RT; e cuidados de canais são considerados uma zona cinzenta – há autores que indicam ser possível a realização após a radioterapia; outros, não. Por via das dúvidas, é melhor realizá-lo antes, se não postergar demais o início da RXT. Após o dentista liberar o paciente para o início da RT, o rádio-oncologista realiza o planejamento, a simulação e a proposta de tratamento em conjunto com QT ou exclusivamente com RT. Durante o planejamento de RXT devem ser tomados esforços no sentido de se manter as doses às regiões parotídeas em torno de 26 Gy, para minimizar riscos de xerostomia, restringir a dose na mandíbula inferior a 50 Gy e evitar pontos muito quentes (inferiores a 60 Gy), a fim de reduzir riscos de osteonecrose. Devem também ser definidas estruturas compreendendo a cavidade oral (estruturas abaixadoras de dose) para reduzir a dose em mucosa oral e com isso minimizar o risco de mucosite grave. Também é fundamental o delineamento de musculatura de deglutição para restringir doses e minimizar riscos de alterações de deglutição ou mesmo estenose de estruturas nobres, além de fistulização, bem como delineamento da articulação mandibular, para reduzir risco de trismo. Todos esses cuidados de planejamento deverão ser continuamente revistos durante o processo de tratamento, pois não é infrequente intensa perda de peso, o que indicará a necessidade de replanejamento da RT e novo cálculo para a situação de nova pesagem e deslocamento de estruturas (RT adaptativa).

Iniciado o processo de simulação, planejamento e com o plano aprovado pelo médico, o paciente deverá iniciar o tratamento com instruções de higiene e flúor dentários, consulta constante com dentista e agendamento de laser profilático ou até mesmo terapêutico, em caso de surgimento de mucosite. Medidas simples como o hábito de chupar e deglutir gelo são acessíveis, não dispendiosa, e se mostraram mais eficazes em estudo de metanálise para prevenção e controle de mucosite, na ausência de alterações hematológicas. Medidas de prevenção de colonização secundária com fungos ou bactérias deverão ser adotadas com solução de nistatina oral 4-6 vezes ao dia e uso de medidas de proteção oral com dentifrícios e enxaguatórios orais específicos para RT, além de uso de saliva artificial manipulada. Não é infrequente a necessidade de associação de RT e QT. Logo, devese realizar hemograma semanal para controle das séries hematológicas que podem resultar alteradas e intervenção com antibioticoterapia de largo espectro ou antifúngicos, em caso de leucopenia, bem como uso de fatores de crescimento leucocitário, em conjunto com oncologista clínico. A partir da segunda para a terceira semana de tratamento já haverá surgimento de alterações gustatórias. É preciso estimular a necessidade de ingesta constante alimentar, em menores porções e a intervalos de 3-4 horas, além de uso eventual de suplementos para minimizar o emagrecimento acentuado e a necessidade de replanejamento da RT. Haverá perda total do paladar na quarta semana, que deverá retornar após 1-3 meses após o término da RT. A partir da terceira semana de tratamento já poderão ocorrer alterações de mucosa, denominadas mucosites, e, devido à sensibilidade individual e aos cuidados específicos de higiene adotados, seu grau de intensidade poderá variar e, eventualmente, determinar a necessidade de interrupção temporária da RT (se mucosite G3, sugerese a interrupção) até que seja recuperada a mucosa, para encerramento do tratamento, após conclusão das frações previstas. Com a retomada ou prosseguimento do tratamento poderá haver necessidade nesse momento de CNE ou gastrostomia dos pacientes que eventualmente tenham declinado inicialmente sua adoção. A fisioterapia auxilia na prevenção ou necessidade de medidas terapêuticas para trismo, que


Ao fim do tratamento devem ser enfatizadas as medidas de manutenção de higienização oral, cuidados de placa e prevenção de cárie e necrose óssea radioinduzidas, em visitas constantes ao dentista

pode ocorrer em consequência de sobredosagem da ATM, de crescimento e extensão tumoral (comprometimento de musculatura pterigóidea) ou mesmo de fatores individuais. A fonoaudióloga orientará exercícios específicos que facilitarão a alteração de peristalse que resulta em disfagia. Ao fim do tratamento devem ser enfatizadas as medidas de manutenção de higienização oral, cuidados de placa e prevenção de cárie e necrose óssea radioinduzidas, em visitas constantes ao dentista. Deve-se enfatizar a necessidade de higiene oral e de evitar extrações ou trauma ósseo por um período de cerca de cinco anos após o término da RXT, para reduzir risco de necrose óssea e cárie radioinduzida, bem como exposição óssea. Em resumo: tumores de CP são frequentes em nosso meio e a RT desempenha importante papel na abordagem terapêutica, seja de forma exclusiva ou em associações com CIR ou QT. O paciente que receber irradiação em região de CP deverá ser orientado sobre possíveis efeitos colaterais e sobre os cuidados odontológicos e orais de deglutição que deverão ser tomados. Ele deve ser acompanhado por uma equipe multidisciplinar, para minimizar o

grau de sofrimento e toxicidades que venha a sofrer durante e após a RT. Entre as orientações destacamos atenção à higienização oral, controle de placa, necessidade de extração de elementos previamente a RT e uso de laser, planejamento adequado de RT com restrição de doses em órgão de risco (parótidas, mucosa oral, musculatura mastigadora, ATM), revisões semanais, acompanhamento sistemático com dentista e nutricionista, cuidados e orientações alimentares para manutenção de peso, acompanhamento hematológico e do exame oral, para detecção precoce de toxicidades moderadas a graves, com pronta intervenção medicamentosa. Todos esses cuidados auxiliarão na tolerância ou eventualmente resultarão em uma rápida recuperação, em caso de toxicidades surgidas, e garantirão um acompanhamento holístico do paciente, com redução do prolongamento do tratamento, que, sabidamente compromete resultados: um paciente confortável, com poucos efeitos colaterais, é um paciente com maior adesão e cumplicidade, consequentemente com maiores chances de controle tumoral e encerramento terapêutico em tempo hábil.

Referências bibliográficas: 1. Brasil. IBGE. Estimativas populacionais. Projeções das populações mensais. Disponível em: http: www.ibge.com.br. 2. Brasil. Acesso à informação - Portal Brasil. Maior expectativa de vida aumenta período de contribuição. Disponível em: http: www.brasil.gov.br. 3. American Cancer Society: Cancer Facts and Figures 2015. Atlanta, Ga: American Cancer Society, 2015. 4. Brasil-MS-INCa. Estimativa de incidência de câncer no Brasil para 2014 MS-INCA:RJ, 2014. 5. NCI. A Snapshot in head and neck cancer. Disponível em : http: cancer.gov 6. Pignon JP, Bourhis J, Domenge C, Designe L.Chemotherapy added to locoregional treatment for head and neck squamous-cell carcinoma: three meta-analyses

of updated individual data. MACH-NC Collaborative Group. Meta-Analysis of Chemotherapy on Head and Neck Cancer.Lancet. 2000 Mar 18;355(9208):949-55. 7. Pignon JP, Baujat B, Bourhis J. [Individual patient data meta-analyses in head and neck carcinoma: what have we learnt?]Cancer Radiother. 2005 Feb;9(1):31-6. 8. Bourhis J, Overgaard J, Audry H, et al. Hyperfractionated or accelerated radiotherapy in head and neck cancer: a meta-analysis. Lancet 2006; 368: 843–54. 9. Budach W, Hehr T, Budach V et al. A meta-analysis of hyperfractionated and accelerated radiotherapy and combined chemotherapy and radiotherapy regimens

in unresected locally advanced squamous cell carcinoma of the head and neck. BMC Cancer 6(1),28 (2006). 10. Cooper JS, Pajak TF, Forastiere AA, et al. Postoperative concurrent radiotherapy and chemotherapy for high-risk squamous-cell carcinoma of the head and

neck. N Engl J Med. 2004 May 6;350(19):1937-44. 11. Bernier J, Cooper JS, Pajak TF, et al.Defining risk levels in locally advanced head and neck cancers: a comparative analysis of concurrent postoperative radiation plus chemotherapy trials of the EORTC (#22931) and RTOG (# 9501).Head Neck. 2005 Oct;27(10):843-50. 12. Chan RJ, Webster J, Chung B, et al. Prevention and treatment of acute radiation-induced skin reactions: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials.BMC Cancer. 2014 Jan 31;14:53. 13. Furness S, Worthington HV, Bryan G, Birchenough S, McMillan R.Interventions for the management of dry mouth: topical therapies.Cochrane Database Syst Rev. 2011 Dec 7;(12):CD008934. 14. Bjordal JM, Bensadoun RJ, Tunèr J, et al. A systematic review with meta-analysis of the effect of low-level laser therapy (LLLT) in cancer therapy-induced oral mucositis.Support Care Cancer. 2011 Aug;19(8):1069-77. 15. Roe JW, Carding PN, Dwivedi RC, et al.Swallowing outcomes following Intensity Modulated Radiation Therapy (IMRT) for head & neck cancer - a systematic review.Oral Oncol. 2010 Oct;46(10):727-33. 16. Marta GN, Silva V, de Andrade Carvalho H, et al.Intensity-modulated radiation therapy for head and neck cancer: systematic review and meta-analysis. Radiother Oncol. 2014 Jan;110(1):9-15.

46

julho/agosto 2015 Onco&


Divulgação

curtas D’Or

Aulas de yoga a pacientes oncológicos Por gerar maior calma e tranquilidade a seus praticantes, a yoga pode se tornar uma grande ajuda no tratamento oncológico, em que os pacientes se encontram sob forte estresse. Pensando nisso, desde março a prática faz parte da rotina dos pacientes da Unidade Sorocaba do Grupo Oncologia D’Or. O projeto conta com o apoio do Instituto Hermógenes, com base no trabalho desenvolvido pelo professor José Hermógenes, criador do instituto e autor de mais de 30 livros publicados sobre o assunto. As aulas são sempre às terças-feiras, exceto feriados, e contam com exercícios respiratórios, visualizações, meditação e relaxamentos. Entre os diversos benefícios com comprovação médica trazidos pela yoga estão a redução do estresse, a melhora da qualidade de vida e do sono, o fortalecimento dos sistemas de defesa do próprio organismo, a melhora da autoestima e da capacidade respiratória. Além dos benefícios físicos, a yoga também trabalha a aceitação dos fatos e ajuda na reflexão sobre como o nosso estado mental pode ajudar ou atrapalhar no tratamento. “Temos visto no Brasil e no mundo como o uso da yoga contribui para a melhor e mais rápida recuperação do paciente. O trabalho do professor Hermógenes vem sendo indicado por médicos há mais de 50 anos. Ele realizou um trabalho pioneiro de sucesso na Santa Casa do Rio de Janeiro na década de 60 no setor de doenças do tórax. Acreditamos que nossos pacientes têm muito a ganhar com essa parceria” afirma Leonardo Nunes, diretor-geral do Grupo Oncologia D’Or no Rio de Janeiro.

Acreditação internacional A segurança do paciente está entre os diferenciais de mercado para a acreditação internacional. Uma das quatro clínicas do Grupo Acreditar no Distrito Federal – empresa do Grupo Oncologia D´Or –, a Unidade Santa Marta, em Taguatinga, é um exemplo disso e já conquistou a acre-ditação da Joint Commission International (JCI), o mais importante órgão certificador internacional. Apenas oito ambulatórios de oncologia no mundo possuem essa acreditação internacional, entre eles esta unidade do Grupo Acreditar. O selo foi concedido de acordo com o manual de cuidados ambulatoriais da JCI, o que garante a utilização contínua de processos de cuidado ao paciente e qualidade no serviço. A busca pela excelência não para por aí: as outras duas clínicas do Grupo Acreditar receberão, em dezembro, uma visita diagnóstica dos profissionais credenciados pela JCI como requisito do processo de preparação para alcance do selo internacional.

48

julho/agosto 2015 Onco&


palavra do gestor

O tripé do cuidado

A

Rodrigo Abreu e Lima Diretor executivo da Oncologia D’Or Contato: rodrigo.lima@grupoacreditar.com.br

O LONGO DA ÚLTIMA REUNIÃO DA SOCIEDADE AMERICANA DE ONCOLOGIA CLÍNICA, A ASCO, UM ASSUNTO FEZ PARTE DE MUITOS debates: os desperdícios de tempo e de recursos nos sistemas de saúde em todo o mundo. Para quem atua no Brasil, esse é um assunto de fundamental importância, afinal o sistema de saúde brasileiro é marcado por desperdícios. Mas nós, da Oncologia D’Or, temos caminhado de maneira firme e resoluta para enfrentar esse problema, seja por meio de parcerias, seja através de ações internas que tomamos. Ao trabalhar para eliminar o desperdício de recursos e de tempo do setor, damos mais resolutividade ao paciente e aos seus familiares. Além disso, ganhamos uma cadeia mais humanizada, pronta para oferecer um cuidado integral a quem quer que precise de nossos serviços. Nossa atenção tem início no diagnóstico e é estendida até o pós-tratamento. Para atingir tal objetivo, contamos com a ajuda de nossa equipe e de todos os parceiros que nos auxiliam a fortalecer esse trabalho. Seja em nossas clínicas, nos hospitais da Rede D’Or ou com qualquer de nossos parceiros, os pacientes podem ter a certeza de que haverá um grupo de profissionais pronto para oferecer o melhor cuidado, tanto no momento do diagnóstico como durante o tratamento ou no período que se segue a ele. É uma filosofia de cuidado integral, da qual não abrimos mão. A forma que encontramos de manter isso sempre vivo em nossa estrutura é investindo em um tripé que consideramos fundamental: pesquisa, educação e assistência.

Ao investir em pesquisa, com o apoio de nossos grandes parceiros do IDOR, podemos fazer melhorias em cada etapa de nosso processo de trabalho. O resultado é uma gestão mais organizada, diagnósticos mais precisos e tratamentos muito mais acertados para nossos pacientes. No fim das contas, o efeito é a qualidade cada vez maior do serviço que oferecemos. Ao lado dos nossos investimentos em inovação está nosso foco em educação. Quando falo em nossa missão de educar, ressalto sempre a importância de levar informação contínua, atualizada e de qualidade a todo o nosso corpo clínico e de colaboradores. Nesse processo, o trabalho realizado com a Onco& tem se mostrado muito importante. Nós acreditamos que a capacitação é também parte relevante no processo que nos tem feito atingir um nível de assistência de melhores resultados. Pelo aspecto da gestão, temos feito um trabalho intenso para melhorar ainda mais a qualidade de nossos serviços. Exemplo disso é a implementação da metodologia Lean, desenvolvida pela Toyota e que tem por objetivo aumentar a satisfação dos clientes fazendo a melhor utilização possível dos recursos disponíveis. Também temos prosperado no processo de integração de nossa rede de clínicas, que avança tanto em relação aos protocolos médicos como em termos de gestão e colaboradores. São passos firmes que temos dado para responder às necessidades de nossos pacientes e trazer para eles o que há de mais moderno na oncologia mundial. Onco& julho/agosto 2015

49


mundo virtual

Onco& recomenda Sites e aplicativos sobre oncologia voltados tanto para médicos, com novidades e informações sobre a área, como para pacientes, com dicas de prevenção e assistência ao doente

Apoio na palma da mão Aplicativos para tablets e smartphones que ajudam médicos a se manter sempre atualizados e no melhor caminho para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes Visual DX Este aplicativo reúne mais de 25 mil imagens médicas relacionadas a mais de 1,2 mil diagnósticos para ajudar as análises e as decisões médicas. Além das imagens do próprio aplicativo, há outras 90 mil enviadas por diversas fontes e revisadas por médicos do mundo inteiro. Na lista de doenças apresentadas pelo app há problemas dermatológicos, infecciosos, genéticos, metabólicos, nutricionais, além de tumores benignos e malignos. O primeiro mês de uso é gratuito, mas depois há uma mensalidade, cujo valor varia conforme a utilização que será feita do conteúdo. Disponível para usuários do sistema Android e iOS.

eOpioid Administrar a dor dos pacientes com o uso de opioides é uma tarefa difícil, uma vez que uma dosagem errada pode ter consequências terríveis. Este aplicativo pretende ser uma importante ferramenta para que os médicos tenham maior suporte ao prescreverem esse tipo de droga. Ele é uma poderosa calculadora, que ajuda na definição de dosagens – realizando, inclusive, as conversões mais complicadas, em que se levam em consideração diversos fatores diferentes. O aplicativo serve também como um guia de remédios. O eOpioid está disponível apenas para aparelhos com o sistema operacional iOS, como iPhones e iPads, e é vendido a US$ 4,99.

Dr Drauzio Primeiros Socorros A aplicação é uma boa dica para ser dada a pacientes, parentes e cuidadores. Desenvolvido sob supervisão do Dr. Drauzio Varella, o programinha oferece orientações básicas sobre primeiros socorros, para auxiliar em casos de emergência ou até a chegada da equipe de socorristas do pronto atendimento. Por ser voltado para pacientes, ele conta com um menu bastante simplificado, que dá acesso aos procedimentos recomendados para dezenas de situações emergenciais e apresenta imagens claras, para facilitar os procedimentos. O aplicativo está disponível gratuitamente para aparelhos com sistemas operacionais desenvolvidos pela Apple e pelo Google.

Memed Criado por um grupo de e preendedores paulistas, este sistema permite que médicos das mais diversas especialidades pesquisem e encontrem mais de 15 mil medicamentos por nome, veículo, princípio ativo ou laboratório. Além disso, uma série de filtros possibilita que os medicamentos sejam classificados por farmacoterapêutica e especialidade, o que ajuda os médicos a conhecer as opções do mercado. Após a pesquisa, é possível imprimir a prescrição diretamente do site do aplicativo, reduzindo problemas de falta de entendimento por parte do paciente ou do farmacêutico. O sistema ainda está em fase beta e a conta pode ser criada de forma gratuita no site da startup, o www.memed.com.br.

Participa de redes sociais? Curta a Onco& no Facebook (facebook.com/RevistaOnco) e acompanhe nossas novidades no Twitter (twitter.com/RevistaOnco)

50

julho/agosto 2015 Onco&


iStockphotos

curtas

Índice de cirurgias conservadoras da mama cresce nos Estados Unidos

A primeira grande revisão de estudos sobre terapias conservadoras da mama nos Estados Unidos mostrou que, ao longo dos últimos 13 anos, as taxas dessa modalidade de tratamentos para tumores em estágio inicial cresceram em um ritmo constante. Apesar disso, o estudo também mostrou que o acesso a esse tipo de tratamento está bastante relacionado a questões demográficas. Pesquisadores do MD Anderson Cancer Center encontraram disparidades relacionadas a fatores como idade, região geográfica, renda e distância entre o local de residência e o de tratamento. O estudo foi publicado no periódico online JAMA Surgery e tomou como base o National Cancer Data Base – um banco de dados sobre tratamentos oncológicos que reúne informações sobre cerca de 70% dos diagnósticos realizados anualmente nos Estados Unidos – para analisar as decisões cirúrgicas de mulheres com câncer de mama nos estágios T1 e T2 tratadas entre 1998 e 2011. O levantamento apontou que, entre a data inicial e a final, o percentual de mulheres submetidas a tratamentos conservadores da mama passou de 54,3% para 60,1%.

Cresce investimento em pesquisa da indústria farmacêutica brasileira iStockphotos

Uma pesquisa do Grupo FarmaBrasil, entidade que representa a indústria farmacêutica nacional de pesquisa, mostrou que as companhias brasileiras do setor investiram R$ 538 milhões em pesquisa e desenvolvimento apenas no primeiro trimestre deste ano. O valor representa 52% a mais do que havia sido investido no mesmo período de 2014. Em geral, os investimentos foram voltados a projetos de medicamentos biotecnológicos, grupo de drogas que vem recebendo especial atenção devido as Parcerias de Desenvolvimento Produtivo, que são acordos firmados entre empresas, governo federal e laboratórios públicos para a pesquisa e desenvolvimento de medicamentos. Segundo o Grupo FarmaBrasil, o aumento nos investimentos se deve ao fato de muitas empresas estarem trabalhando na construção de novas plantas, além de diversas pesquisas já estarem em fase de pesquisa clínica. “Trata-se de uma nova fronteira para a indústria brasileira de medicamentos. A própria consolidação das plantas produtivas já requer investimentos em pesquisas, pois estamos trabalhando com tecnologia da qual ainda não tínhamos nenhum know-how”, diz Reginaldo Arcuri, presidente da entidade.

FDA avalia pembrolizumabe para câncer de pulmão O laboratório MSD encaminhou ao órgão de vigilância sanitária americano, a Food and Drug Administration (FDA), um pedido de aprovação para o uso do pembrolizumabe, uma imunoterapia anti-PD-1, para o tratamento de câncer de pulmão de células não pequenas. O medicamento já tem aprovação para uso no tratamento de melanoma avançado com progressão de doença após o uso de ipilimumabe. O laboratório justifica a submissão com base nos dados de um estudo clínico apresentado durante a reunião anual da Associação Americana de Pesquisa do Câncer (AACR), realizada no final de abril. Além do melanoma e dos tumores de pulmão, o pembrolizumabe tem tido seu uso avaliado para uma série de outras doenças, como câncer de cabeça, pescoço e estômago.

Onco& julho/agosto 2015

51


IDOR

Por um tratamento mais específico Jorge Salluh, pesquisador do IDOR

P

acientes com câncer, além da morbidade gerada pela própria doença, estão mais vulneráveis a adquirir outras enfermidades que a população em geral. A pneumonia é a infecção mais comum nesse grupo. Um estudo conduzido por pesquisadores do IDOR, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), do Instituto Nacional de Câncer (Inca), do Hospital Sírio-Libanês e da Santa Casa da Misericórdia de Porto Alegre analisou os fatores associados à pneumonia grave em pacientes com câncer hospitalizados e sugere novos protocolos de tratamento, mais personalizados, para reduzir a mortalidade por essa razão. Até o momento, existiu na comunidade médica um consenso de que a maior prevalência de casos de pneumonia entre os pacientes com câncer se devia primeiro à debilidade do sistema imune dessas pessoas e, segundo, à ideia de que, por transitarem com frequência em ambientes hospitalares, elas estariam mais expostas a bactérias multirresistentes (superbactérias) que podem causar pneumonia. Os pesquisadores resolveram investigar essas premissas e o resultado foi diferente do consenso atual. Ao analisar dados de 325 pacientes com câncer internados com pneumonia em três grandes centros médicos no Brasil, eles encontraram uma baixa de taxa de bactérias multirresistentes nos doentes – menos de 14% apresentavam alguma infecção do tipo. O dado indica que a presença de bactérias multirresistentes, apesar de muito importante, não é tão significativa quanto se pensava para explicar o surgimento da pneumonia nesse grupo. Na clínica diária já tínhamos essa percepção e o estudo veio para comprovar. A gravidade da doença e a disfunção dos órgãos parecem ser os melhores fatores de predição de mortalidade do que a presença de patógenos multirresistentes. Novos protocolos A descoberta pode levar ao desenvolvimento de métodos de tratamento mais eficazes, que podem diminuir a mortalidade dos pacientes com câncer afetados por pneumonia. Como existe essa ideia de que as bactérias multirresistentes têm um grande peso, o tratamento atual é padronizado. Aplicamos para todos os pacientes dois ou três antibióticos que cobrem esses organismos resistentes.

52

julho/agosto 2015 Onco&

Mas a incidência dos diferentes tipos de bactérias é variável de acordo com a região do mundo e nem sempre isso é levado em consideração. Esse tratamento mais amplo é a primeira opção dos médicos porque o resultado dos exames para detecção de quais patógenos estão infectando o paciente pode levar até 72 horas. Sem poder esperar esse tempo, o médico tem que escolher o protocolo de tratamento que cobre um amplo espectro de bactérias. Isso, porém, pode gerar efeitos colaterais, além de induzir a resistência das bactérias aos antibióticos. Quando expostas frequentemente aos medicamentos, as bactérias se adaptam e as substâncias deixam de ter efeito sobre elas. A resistência das bactérias aos antibióticos é um dos graves desafios de saúde mundiais, sendo considerada “uma crise global” pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Cria-se um ciclo vicioso, que não tem fim. Tratamento mais eficaz Os pesquisadores estudam agora novas formas de tratamento que possam solucionar essa situação. Uma das frentes é a testagem de métodos de detecção de patógenos mais rápidos, que ofereçam resultado em até 6 horas e possibilitem que o médico aplique apenas os antibióticos específicos contra os microrganismos identificados. Outra ação, já em andamento, é fazer um estudo com um número maior de centros médicos e pacientes para desenvolver modelos de previsão para identificar os principais fatores ligados ao maior risco dos pacientes estarem realmente infectados com bactérias multirresistentes. Com esse modelo, seria possível selecionar apenas os pacientes com maior risco para receber o tratamento com antibióticos voltados para superbactérias. Nosso objetivo é chegar a um tratamento que atenda melhor as especificidades de cada paciente.

Referências bibliográficas: Rabello LSCF, Silva JRL, Azevedo LCP, Souza I, Torres VBL, et al. (2015) Clinical Outcomes and Microbiological Characteristics of Severe Pneumonia in Cancer Patients: A Prospective Cohort Study. Artigo disponível em: http://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0120544


políticas de saúde

Projeto tenta destravar pesquisas clínicas Tentativa de senadores é criar um marco regulatório que torne menos burocrática e mais transparente a inclusão de pacientes em estudos globais

Por Martha San Juan França

A

BUROCRACIA ACABA DIFICULTANDO O ACESSO DE

PACIENTES A TERAPIAS INOVADORAS CONTRA O

Istockphotos

CÂNCER, QUE SÓ CHEGAM AO PAÍS POR MEIO DE pesquisas clínicas. Enquanto nos Estados Unidos e em países da Comunidade Europeia o tempo médio de aprovação de um protocolo é de três meses e nos países da América Latina está entre quatro e seis meses, o mesmo processo no Brasil leva de 10 a 14 meses. Como resultado, centros reduzem número de funcionários, pesquisadores são desestimulados, estudos são cancelados e milhares de pacientes que poderiam receber tratamento de ponta anos antes

de estarem disponíveis no país são prejudicados. Esse cenário, Afonso Celso Haas, de 60 anos, comerciante de Ijuí, no Rio Grande do Sul, conhece bem. Em 2012, ele recebeu o diagnóstico de câncer de pulmão em estágio avançado. Submeteu-se a uma quimioterapia convencional antes de ter a oportunidade de participar como voluntário dos testes com o nivolumabe, uma droga que, segundo resultados apresentados no último congresso anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), realizado em Chicago, nos Estados Unidos, pode dobrar a sobrevida de alguns pacientes com a doença. Hoje, no quarto protocolo de pesquisa, Haas se considera um privilegiado. “Não tive atraso porque estou correndo na frente, procurando alternativas, e tive a sorte de contar com bons médicos”, afirma. “Mas eu acompanho o caso de muitas pessoas que poderiam estar em situação mais favorável e encontram dificuldade para ter acesso a medicamentos de ponta.” Por iniciativa de Haas, o assunto deixou o nicho dos especialistas e começou a ser debatido no Congresso Nacional no início do ano passado. Após tomar conhecimento da situação pelo comerciante, a senadora Ana Amélia (PP/RS) solicitou audiência pública na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, para discutir as causas do atraso. Os problemas apontados na audiência levaram à criação da Aliança Pesquisa Clínica Brasil, orgaOnco& julho/agosto 2015

53


Hoje, as propostas de realização de pesquisas com seres humanos precisam ser submetidas aos comitês de ética em pesquisa (CEP) das instituições proponentes e à Conep. Por esse sistema, queixam-se os interessados, há uma sobreposição de competências que obriga muitos projetos a serem avaliados duas vezes

54

julho/agosto 2015 Onco&

nização que reúne representantes de pacientes, médicos, pesquisadores, laboratórios e instituições públicas e particulares em busca do aprimoramento das regras. Foi realizada uma audiência pública na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado em março de 2014, com a participação de diretores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), após a qual foi criado um grupo de trabalho para elaborar propostas de aperfeiçoamento do sistema. O resultado foi o projeto PLS 200/2015, apresentado em 7 de abril deste ano por Ana Amélia e pelos senadores Walter Pinheiro (PT-BA) e Waldemir Moka (PMDB-MS). A proposta é criar um marco regulatório às pesquisas clínicas com novos medicamentos no Brasil. Atualmente, ela é regulada pela Resolução 196, instituída pelo Conselho Nacional de Saúde em 1976 e revista em 2012 para dar lugar à Resolução 466. “Ficou evidente no debate que o Brasil precisava ter uma lei que regulasse o assunto, já que há apenas essa norma do Conselho Nacional de Saúde e muitas dúvidas se ela é suficiente para regular um tema de tamanha importância”, afirmou o senador Moka. “O PLS 200/2015 busca oferecer aos pacientes melhores condições de tratamento e contribuir para a saúde pública”, afirma o presidente da Aliança Pesquisa Clínica Brasil, Jaderson Lima. Ele explica que hoje a forma como as pesquisas são reguladas não tem respaldo legal e as resoluções podem ser alteradas. E cita parecer do jurista Luiz Roberto Barroso, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal, a partir de consulta feita pela Interfarma – Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa. Para Barroso, “o sistema atual enfrenta sérios problemas de validade jurídica, por falta de lastro legal para as competências exercidas e para as providências determinadas”. Hoje, as propostas de realização de pesquisas com seres humanos precisam ser submetidas aos comitês de ética em pesquisa (CEP) das instituições proponentes e à Conep, vinculada ao Conselho Nacional de Saúde (CNS), que centraliza todas as aprovações. Por esse sistema, queixam-se os interessados, há uma sobreposição de competências que obriga muitos projetos a serem avaliados duas vezes. Além disso, muitos projetos de pesquisa, es-

pecialmente aqueles que envolvem testes clínicos de novas drogas e produtos patrocinados pela indústria farmacêutica, precisam ser aprovados também pela Anvisa, órgão responsável pelo registro e pelo controle do uso de medicamentos no país. O resultado é a demora, que tanto prejudica o andamento dos trabalhos e faz com que o Brasil participe de cerca de 2% dos testes clínicos dos mais de 150 mil projetos cadastrados no site www.clinicaltrials.gov, banco de dados do governo americano que disponibiliza informações globais. Nos últimos 15 anos, das mais de 48 mil pesquisas na área de oncologia, o Brasil participou apenas de 841. “Esta é a maior oportunidade de melhorar o setor”, afirma o coordenador de pesquisa em oncologia do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino, Carlos Gil. “Até agora, só tínhamos alcançado algumas medidas paliativas de pouco impacto. Esse projeto de lei ainda vai amadurecer bastante, mas só a sua existência já é uma prova de que finalmente esse problema está recebendo a relevância que merece.” As pesquisas clínicas são estudos realizados com voluntários para medir os parâmetros de segurança e eficácia de novos medicamentos, sendo essencial para a chegada de novas alternativas terapêuticas ao mercado. Esses ensaios são divididos em fases I, II, III e IV, de acordo com a quantidade de participantes e os objetivos específicos de cada etapa. A maior parte (80%) é patrocinada pelas multinacionais de saúde, que abrem protocolo para recrutamento de um número pré-fixado de voluntários em dezenas de países com instituições de pesquisa reconhecidas para avaliação dos resultados de diferentes perfis populacionais. As instituições que conseguem aprovação para iniciar o recrutamento precocemente têm vantagens. Aquelas que perdem mais tempo no processo regulatório começam a recrutar voluntários mais tarde e, quando conseguem cumprir todas as etapas de seleção, o prazo já venceu. O oncologista Fábio Franke, diretor do Centro de Alta Complexidade em Oncologia (Cacon) do Hospital de Caridade de Ijuí, que participa de mais de 120 protocolos de pesquisa, conta que, entre o Conep e a Anvisa, um dos ensaios de que participa demorou um ano para ser aprovado. “Sobraram dois dias para recrutar voluntários antes do vencimento do prazo”, recorda.


Outros prejuízos são citados pelo oncologista Evanius Wiermann, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC): “Pesquisas geram divisas, movimentam os profissionais, permitem que o país tenha acesso ao conhecimento mais atualizado sobre as doenças e equipamentos para estudar seus efeitos na população. O Brasil perde em competitividade ao não as realizar”. Por tudo isso, a proposta do PLS é racionalizar a tramitação dos projetos de pesquisa, mantendo o sistema de revisão ética e da própria Anvisa. A ideia é conceder mais autonomia aos CEPs, que ficariam responsáveis pela análise da maioria dos estudos clínicos, e a Conep só se envolveria em casos excepcionais. O projeto de lei não conta com o apoio da Conep. Em apoio à entidade, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o Centro de Estudos Brasileiros em Saúde (Cebes) e a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB) afirmam que indústrias, entidades, médicos, cientistas e profissionais de saúde querem impor um conjunto de medidas e de ausências regulatórias que fragilizam a proteção da dignidade humana e os direitos dos participantes das pesquisas clínicas. “O projeto retira os direitos dos participantes das pesquisas, fragiliza o sistema e, por consequência, o Conselho Nacional de Saúde”, afirma Francisca Rego Oliveira de Araújo, coordenadora adjunta da entidade. Além disso, não reconhece o empenho recente da Conep em diminuir o tempo de análise dos protocolos para cerca de 60 dias. A Anvisa ainda não se pronunciou sobre o assunto. Em nota, sua assessoria de imprensa afirma que isso só deverá ocorrer depois da reunião de sua diretoria colegiada, ainda não prevista. Mas ressalta que a agência tem realizado esforços para definir regras que visam agilizar as pesquisas, em especial as resoluções 09 e 10 de março de 2015, que definem prazo fixo para avaliação dos dossiês de desenvolvimento clínico de medicamentos na maior parte dos casos em até 90 dias, reconhecidamente uma das reivindicações do setor.

Segundo José Emílio Neto, diretor-secretário da Associação Brasileira de Organizações Representativas de Pesquisas Clínicas (Abracro), a principal função do PLS 200 é trazer à tona a necessidade de um marco legal efetivo, independentemente dos esforços reconhecidos da Anvisa e da Conep em tentar agilizar o setor. “É triste constatar que se perdem estudos por burocracia quando somos reconhecidos pela qualidade de nosso trabalho”, afirma. “Por estarmos expostos a regulamentações apenas, ficamos numa situação de fragilidade e dependentes da eficiência da gestão das autoridades no cumprimento de metas. Não estamos pedindo facilidades, queremos apenas um sistema mais eficiente.” O Instituto Oncoguia, associação que tem o objetivo de ajudar o paciente com câncer, é uma das entidades que participam da Aliança para a Pesquisa Clínica Brasil e defendem a iniciativa do projeto de lei. “O cenário para o paciente é difícil, com poucos estudos sendo realizados”, afirma o diretor jurídico do instituto, Tiago Farina Matos. “E nós sabemos que a pesquisa clínica significa acesso aos melhores tratamentos existentes.” Segundo a entidade, pela primeira vez todos os interessados estão tentando criar situações e medidas para melhorar o sistema, acelerando processos que antes só estavam no plano da discussão, inclusive Conep e Anvisa. Mas ele considera que o texto do projeto precisa de adaptações. “Deve ser visto como uma oportunidade para a sociedade discutir questões importantes e avançar para a definição do melhor modelo para o país”, frisa o diretor jurídico do instituto. O PLS 200/2015 corre na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, tendo como relator o senador Eduardo Amorim (PSC/SE), seguindo depois para as comissões de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática. E encerra o seu ciclo no Senado na Comissão de Assuntos Sociais, não precisando ir ao Senado. Se aprovado, segue para a Câmara dos Deputados.

A Anvisa ainda não se pronunciou sobre o projeto dos senadores, mas em nota ressalta que tem realizado esforços para definir regras que visam agilizar as pesquisas, em especial as resoluções que definem prazo fixo para avaliação dos dossiês de desenvolvimento clínico de medicamentos

Onco& julho/agosto 2015

55


especial EHA

Por Juliane Musacchio – julianemusacchio@hotmail.com e Rodrigo Abreu e Lima – rodrigo.lima@oncologiador.com.br

O 20º Congresso da European Hematology Association (EHA) contou com a participação de 10 mil médicos hematologistas em Viena, na Áustria, no período de 11 a 14 de junho de 2015

Aqui destacamos os principais trabalhos apresentados: 1) Foram apresentados os resultados de dois grandes projetos. O primeiro é um estudo sobre o custo das doenças hematológicas nos estados-membros da União Europeia e na Noruega, Islândia e Suíça, que demonstrou um gasto equivalente a cerca de 23 bilhões de euros por ano. A maioria desses custos, cerca de um terço, é associada à hospitalização de pacientes com doenças do sangue, mas quase 20% se devem aos custos dos medicamentos. O segundo grande projeto foi um roteiro para a investigação em hematologia na Europa. Cerca de 300 pesquisadores de alto nível e outros especialistas de mais de 20 países da Europa elaboraram um manuscrito (a ser publicado em uma revista científica até o fim deste ano) que descreve o estado da arte e as futuras necessidades de investigação em hematologia. 2) Foi demonstrada, pela primeira vez, em um estudo randomizado, a atividade de um inibidor de tirosina quinase em pacientes com leucemia mieloide aguda (LMA). O conhecimento da variedade de mutações que existem na LMA tem levado os investigadores a estudar o sorafenibe, um inibidor de tirosina quinase oral, que bloqueia a atividade de várias enzimas mutadas, as quais podem levar ao desenvolvimento da doença. Dessa forma, 267 pacientes com LMA, entre 18 e 60 anos de idade, foram incluídos em um estudo de fase II e randomizados para receber

56

julho/agosto 2015 Onco&

sorafenibe (134 pacientes) ou placebo (133 pacientes), além do protocolo padrão. Após três anos de seguimento, os pacientes tratados com sorafenibe tiveram uma sobrevida livre de eventos mediana de 20,5 meses e uma sobrevida livre de recidiva em três anos de 56%. Em comparação, os pacientes que receberam o placebo tiveram uma sobrevida livre de eventos mediana de 9,2 meses e sobrevida livre de recidiva em três anos de 38%. Entretanto, o tratamento com sorafenibe aumentou a probabilidade de efeitos secundários, tais como febre, exantema e hemorragias, mas foi geralmente bem tolerado. Assim, as respostas positivas e duradouras que foram observadas nos pacientes com LMA que receberam sorafenibe representaram a primeira evidência de benefício clínico de um inibidor da tirosina quinase nesse tipo de leucemia. 3) Foi apresentado que a adição do elotuzumabe ao tratamento padrão para pacientes com mieloma múltiplo reduz significativamente o risco de progressão da doença, com benefício sustentado por dois anos. Esse foi o primeiro estudo de fase III em que foi avaliada a combinação de elotuzumabe com lenalidomida e dexametasona, com o objetivo de demonstrar o benefício de se ativar diretamente o sistema imunológico, nos pacientes com mieloma múltiplo em recidiva ou refratariedade. Acredita-se que elotuzumabe funciona através de um duplo mecanismo de ação: ligação da molécula de sinalização para ativação de linfócitos (SLAMF7) nas células natural killer (NK), ativando-as diretamente, bem como a ligação da SLAMF7 nas células do mieloma, assinalando-os para o reconhecimento das células NK e destruição.


No estudo foram cumpridos os seus objetivos, com demonstração de melhor taxa de resposta global e melhor sobrevida livre de progressão (SLP): no braço do elotuzumabe, houve uma redução de 30% no risco de progressão da doença ou óbito, com benefícios sustentados em dois anos (SLP em 2 anos de 41% no braço do elotuzumabe vs 27% no braço placebo). Além disso, um benefício consistente foi observado em todos os subgrupos e uma toxicidade mínima foi observada com a adição do elotuzumabe ao tratamento padrão. Esses dados confirmaram o mecanismo de ação do elotuzumabe, com um novo alvo molecular (SLAMF7), como sendo importante no tratamento dos pacientes com mieloma múltiplo.

pré-especificadas, que cobriram 92,5 milhões de habitantes. Esses foram os primeiros dados desse tipo recolhidos na Europa. A maioria (94%) dos pacientes foi diagnosticada em fase precoce da doença e recebeu o tratamento com imatinibe, de acordo com as recomendações do ELN (80%). As opções de tratamento mais recentes foram utilizadas por pacientes em ensaios clínicos ou com anormalidades cromossômicas. O tratamento não padrão foi usado raramente, mas principalmente em pacientes mais velhos. A sobrevida foi menor que nos resultados de ensaios clínicos. No entanto, depois de se ajustar para o perfil prognóstico, as taxas de sobrevida foram semelhantes às observadas nos estudos clínicos.

4) Em outro estudo, foram avaliados o tratamento e a sobrevida dos pacientes com leucemia mieloide crônica (LMC) na Europa.

5) Por fim, uma nova combinação terapêutica foi apresentada com potencial para tratamento de recidiva em pacientes com leucemia linfocítica crônica (LLC).

Desde a introdução de inibidores da tirosina quinase para o tratamento de pacientes com LMC, o tempo de sobrevida foi significativamente melhorado. Porém, muito pouco se sabe se essas notáveis realizações da medicina moderna, como visto em ensaios clínicos, foram transferidos para os cuidados de saúde de rotina dos pacientes com LMC. Assim, o objetivo desse estudo foi investigar se todos os pacientes com LMC são tratados de acordo com as diretrizes atuais e alcançam igualmente bons resultados de tratamento, em comparação com os ensaios clínicos. O LeukemiaNet Europeia (ELN) e a Novartis estabeleceram um registro com base na web para registrar todos os pacientes recém-diagnosticados com LMC em 20 países da Europa ou regiões

Sabe-se que os pacientes com LLC refratária ou em recidiva precisam de novos tipos de tratamento. Uma nova combinação de duas terapias direcionadas demonstrou um grande potencial para o tratamento dos pacientes nessas circunstâncias. Nesse ensaio clínico, foi combinado o venetoclax (anteriormente ABT-199 / GDC-0199), um anticorpo anti-Bcl2, com o rituximabe. Foi relatada uma taxa de resposta de 84% nos 49 pacientes com LLC refratária. Notavelmente, 41% de todos os pacientes alcançaram uma resposta completa, muitos dos quais sem doença residual mínima. Seis pacientes tiveram que interromper o tratamento e cinco permanecem livres de recorrência.

Onco& julho/agosto 2015

57


especial AUA

Por Mauro Pinheiro – mauropinheiro@yahoo.com Departamento de Medicina Sexual da SBU-RJ, integrante da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) e da International Society of Sexual Medicine (ISSM)

Preservação da função erétil no centro do debate

N

OS ÚLTIMOS ANOS, EM TODOS OS EN-

AMERICAN UROLOGICAL ASSOCIATION (AUA), SÃO DISCUTIDOS cuidados e condutas em relação ao que se deve fazer para preservar e recuperar a função erétil dos pacientes submetidos ao tratamento do câncer de próstata, principalmente o tratamento cirúrgico, que ainda é a modalidade mais empregada no mundo. Na última reunião da AUA 2015 e da Sexual Medicine Society of North America 2015 (SMSNA), que ocorre dentro do evento, esse assunto novamente foi amplamente debatido. A grande discussão sobre esse tema é a baixa evidência científica da eficácia dessas condutas. Muitos médicos questionam se realmente elas devem ser realizadas. Apesar de pouca evidência científica, a Sociedade Internacional de Medicina Sexual (ISSM) aconselha que os tratamentos de reabilitação peniana devem ser realizados, recomendação já adotada pela maioria de seus associados envolvidos no tratamento da disfunção erétil. A proposta elementar para o tratamento de reabilitação é tentar restaurar, restabelecer o estado de função erétil anterior à cirurgia/radioterapia. Ele não é aplicado, portanto, para pacientes que já apresentam um quadro de ereção muito ruim antes do tratamento do câncer de próstata. O intuito desse tratamento seria prevenir as alterações de endotélio e da musculatura lisa do pênis envolvida na função erétil. SabeCONTROS DA

mos que a ausência da ereção por tempo prolongado resulta em hipóxia tecidual, o que ocasiona fibrose dos corpos cavernosos. Essa fibrose, uma vez estabelecida, resulta em perda de comprimento do pênis e torna ainda mais difícil o restabelecimento da ereção pela disfunção do mecanismo veno-oclusivo, responsável pelo “aprisionamento” do sangue que mantém a ereção. Apesar da discussão sobre evidência científica, a recomendação de tratamento já é suportada por estudos que sugerem que tais condutas podem ajudar na preservação dos tecidos do pênis e do comprimento peniano. Como ainda não existe um protocolo de tratamento ou guideline utilizado pelas Sociedades de Urologia, são seguidas as orientações aplicadas nos grandes centros mundiais e pelos maiores experts no tratamento da disfunção erétil. Podem ser utilizados separadamente ou, na maioria dos casos, em associação: • Inibidores da enzima 5-PDE: como sildenafil (Viagra e genéricos) e tadalafil (Cialis), que devem ser tomados de forma constante e em doses plenas. • Injeção intracavernosa: alprostadil, BIMIX ou TRIMIX (prostaglandina, papaverina, fentolamina). A frequência de uso não é bem estabelecida, com alguns trabalhos recentes que demonstram que a maior frequência de aplicações sugere melhor preservação do

comprimento peniano. As doses são individualizadas para cada paciente. • Bomba de vácuo: cilindro de vácuo no qual o pênis é introduzido, promovendo a distensão dos tecidos e a entrada de sangue no mesmo, com ereção por sangue venoso e arterial. Baixa evidência científica de resultados, porém com alguns trabalhos que demonstram preservação do comprimento com seu uso. A pergunta final, portanto, seria: por que submeter os pacientes a um tipo de tratamento que tem baixa evidência científica? Porque, primeiramente, temos que tomar uma simples decisão: fazer algo por nossos pacientes ou simplesmente não fazer nada. Porque a maioria dos urologistas envolvidos com câncer de próstata e disfunção erétil realiza em seus pacientes algum tipo de tratamento de reabilitação. Porque sabemos que a disfunção erétil é a principal causa de depressão e queda da qualidade de vida no pós-operatório. Porque os sinais dos estudos já realizados são claros e robustos e, principalmente, pela possibilidade de permitirmos ao paciente manter sua vida sexual durante o período de recuperação da melhor forma possível. Deve-se, portanto, expor a todos os pacientes submetidos à prostatectomia radical as reais expectativas do tratamento de reabilitação peniana e o potencial benefício, discutindo individualmente vantagens/desvantagens, riscos, custos e apoio psicológico.

Referências bibliográficas: – http://www.issm.info – https://www.auanet.org – Erectile Function Rehabilitation after Radical Prostatectomy: Practice Patterns among AUA Members, Raanan Tal MD, Patrick Teloken MD and John P. Mulhall MD, The Journal of Sexual Medicine, Volume 8, Issue 8, pages 2370–2376, August 2011. – Penile Rehabilitation Following Radical Prostatectomy: Predicting Success- Robert C. Flanigan MD2 and John P. Mulhall MD1,* The Journal of Sexual Medicine-Volume 6, Issue 10, pages 2806–2812, October 2009-Teloken et al. J Sex Med 2009; Jul;6(7):2032-8 (Patrick Teloken MD1,*, Francesco Montorsi MD2 and John Mulhall MD3). – Monga et al. SCS AUA 85th 2006 Abstract 50. – Montorsi et al. J Urol 1997; 158:1408-10. – Mulhall et al. J Sex Med 2005;2:532-40. – Effects of tadalalfil treatment on Erectile Dysfunction Recovery following bilateral nerve sparing radical prostatectomy- European Urology, Volume 65,Issue1-Montorsi-Brock et al.

58

julho/agosto 2015 Onco&


acontece

Divulgação

Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização e outros tantos eventos do mundo da oncologia. Confira aqui os principais eventos dos próximos meses

XX Concan

Breast Cancer Symposium

Será realizada entre os dias 2 e 5 de setembro a vigésima edição do Congresso Brasileiro de Cancerologia. O evento é organizado pela Sociedade Brasileira de Cancerologia e, pela primeira vez, acontecerá em Brasília. O tema do evento deste ano será “A interdisciplinaridade como ferramenta primordial na cura do câncer”. Durante as palestras e debates serão abordados os principais aspectos relacionados a biologia, políticas de prevenção e progressos no tratamento das principais neoplasias. Para mais informações sobre o programa e as inscrições, acesse a página do evento, no endereço: http://www.concan2015brasilia.com.br.

Entre os dias 25 e 27 de setembro acontece, em São Francisco, um dos maiores eventos do mundo voltados para especialistas em câncer de mama. O Breast Cancer Symposium é organizado em parceria por algumas das principais sociedades de oncologia dos Estados Unidos – a ASCO, a ASTRO e a SSO –, além da The American Society of Breas Surgeons. A cada ano, o evento conta com a participação de cerca de 800 especialistas e traz os estudos mais relevantes que vêm sendo conduzidos sobre câncer de mama. Mais informações podem ser obtidas em www.breastcasym.org.

ECC 2015 A edição de 2015 do European Cancer Congress (ECC 2015) será realizada em Viena, na Áustria, entre os dias 25 e 29 de setembro. O evento, que acontece a cada dois anos e é intercalado com a reunião da European Society for Medical Oncology (ESMO), é um dos mais importantes da oncologia mundial e contará com a apresentação de pesquisas em áreas que têm sido muito debatidas ao longo dos últimos anos. O tema do encontro deste ano será “Reforçando a multidisciplinaridade”. Para acompanhar e fortalecer essa temática, a organização do encontro preparou sessões integradas entre as diversas áreas da medicina e da pesquisa. Além de uma série de estudos, haverá espaço para divulgação de trabalhos de associações de pacientes. A organização do evento é uma parceria entre a European Cancer Organization (ECCO) e a ESMO. Para outras informações, acesse o site www.europeancancercongress.org.

Onco& julho/agosto 2015

59


do bem

Informação para tratar Grupos de apoio ao paciente e hospitais investem na disseminação de informações como forma de ajudar na prevenção, diagnóstico e cuidados das doenças oncológicas Por Gabriel Ferreira

R

ECEBER A NOTÍCIA DE QUE SE ESTÁ COM CÂNCER

COSTUMA SER UM DOS MOMENTOS MAIS IMPACTANTES DA VIDA DO PACIENTE E DAS PESSOAS

próximas a ele. Por mais que os tratamentos tenham evoluído muito e que hoje seja possível obter sobrevida muito maior e com excelentes índices de qualidade de vida durante o tratamento de muitas neoplasias, o diagnóstico ainda é encarado por muita gente como uma sentença de morte inegociável. Muito dessa forma de ver a doença está relacionado à falta de informação. O desafio se mostra ainda maior nos dias de hoje, em que a popularização da internet tornou o acesso à informação muito mais amplo. Isso tem um lado positivo, é claro, mas também faz com que o paciente possa chegar facilmente a conteúdos de menor qualidade que, em vez de ajudar e servir de apoio para passar pelo período de tratamento, acabam se provando um elemento complicador – seja por dar falsas esperanças, seja por fazer com que as pessoas encarem a doença de forma mais grave do que seria necessário. Mas nem tudo são problemas. De olho nesse desafio, diversas instituições criaram, ao longo do tempo, espaços em que o paciente pode se informar sobre o diagnóstico e o tratamento de forma mais confiável. Duas organizações vêm se destacando

60

julho/agosto 2015 Onco&

na realização desse tipo de trabalho: os institutos Lado a Lado pela Vida e Oncoguia. Essas instituições têm abraçado a missão de levar à população em geral e aos pacientes e seus entes mais próximos conteúdos de qualidade, que ajudem a quebrar estigmas sobre o câncer, seu diagnóstico e tratamento. O trabalho do Lado a Lado está bastante relacionado à criação e ao desenvolvimento de grandes campanhas que tenham como missão alertar as pessoas sobre os cuidados que devem ser tomados em relação à saúde. “Nossa missão é levar ao cidadão leigo informações e conhecimento sobre saúde e bem-estar por meio de ações práticas, campanhas e conteúdo em portais próprios e redes sociais, falando de prevenção, inclusão social e quebrando paradigmas e preconceitos”, afirma Marlene Oliveira, presidente do Lado a Lado. “O trabalho do instituto é empoderar os cidadãos para que, mais informados sobre sua própria saúde e seus direitos, possam conquistar uma melhor qualidade de vida.” Um dos principais focos do grupo tem sido o lançamento de ações voltadas ao público masculino – um grupo de pacientes que tende a buscar menos informações sobre sua saúde de forma ativa e, por isso mesmo, precisa ser alvo de ações mais impactantes. Foi o Lado a Lado que, em 2012, impulsionou o surgimento da campanha Novembro Azul, cujo principal objetivo é informar a população em geral sobre o câncer de próstata – um dos maiores desafios dos médicos é quebrar o preconceito dos pacientes com relação aos exames diagnósticos.


Apenas no último ano, foram realizadas 2,2 mil ações relacionadas à campanha em todo o país. São medidas que vão desde aquelas voltadas a despertar o interesse da mídia e das pessoas sobre o assunto – a iluminação de pontos turísticos, como o Cristo Redentor e o Monumento às Bandeiras, e ações em estádios de futebol, por exemplo – até estratégias em que a informação é levada às pessoas de forma mais direta – como a realização de palestras e debates sobre o tema e intervenções em eventos populares. “Toda essa iniciativa fez com que, hoje, o Novembro Azul já faça parte do calendário nacional de campanhas de prevenção no Brasil”, diz Marlene. Fundado em 2009, o Oncoguia tem na disseminação de informações o centro de sua missão. Isso tem muito a ver com a própria história do instituto, que, antes de se constituir como uma ampla organização de apoio aos pacientes, era um portal de internet com informações sobre as doenças oncológicas. Hoje, o portal Oncoguia ainda se mantém como um dos principais centros de informação sobre o câncer para o público leigo no Brasil, repercutindo notícias divulgadas na grande mídia, apresentando informações sobre prevenção, diagnóstico e tratamento e, principalmente, difundindo novidades científicas em uma linguagem mais acessível para o paciente e seus familiares em geral. Além do site, o Oncoguia atua em outras frentes, como a organização de eventos que reúnam os diversos públicos interessados no desenvolvimento de políticas de combate ao câncer para discutir o tema. Exemplo disso são os Fóruns de Discussão de Políticas de Saúde em Oncologia, que têm por objetivo reunir os mais diversos atores do poder público e da sociedade civil para debater a melhora dos programas de saúde voltados para o tratamento do câncer. Neste ano, foi realizada em Brasília a quinta edição do Fórum, que promoveu debates em torno do tema tecnologia, humanização e acesso. Segundo o instituto, levar informação sobre a doença é questão fundamental para fazer com que parte significativa da população se converta no que eles chamam de PAR – pessoa ativa e responsável com a própria saúde. Para isso, a informação seria um elemento fundamental, uma vez que pessoas bem informadas sobre questões de saúde têm maior chance de mudar suas atitudes para não apenas prevenir e enfrentar uma doença grave como o câncer

como também lutar por seus direitos sempre que necessário.

Hospitais A missão de levar informação de qualidade sobre as doenças oncológicas ao público leigo também tem sido abraçada por diversos hospitais. É o caso do A.C. Camargo Cancer Center, de São Paulo. Desde 2009, a instituição promove o Grupo de Apoio ao Paciente com Câncer Amor à Vida. O trabalho é organizado pelo serviço de enfermagem e envolve toda a equipe multidisciplinar da instituição. A ideia do Grupo Amor é realizar reuniões quinzenais para pacientes oncológicos e seus familiares. Os encontros são abertos para a comunidade em geral, não havendo necessidade de estar se tratando na instituição para participar. Em geral, os encontros envolvem uma palestra informativa ministrada por algum especialista do hospital e troca de experiências entre os participantes. O calendário de encontros pode ser acessado pela página www.accamargo.org.br/amor-a-vida/. Na Oncologia D’Or, o Programa Conte Conosco desempenha papel parecido. Coordenado pela psicanalista Elena Lerner, o projeto oferece a possibilidade de compartilhamento de experiências entre pessoas que enfrentam ou enfrentaram um câncer e tem na troca de informações sobre a doença um de seus principais pilares. “Um diagnóstico de câncer implica com frequência em tratamentos agressivos, mudanças súbitas na rotina de vida, abalo nas relações familiares e no campo profissional. É muita coisa ao mesmo tempo, e a cobrança quanto ao pensamento positivo pode ser opressiva”, afirma Elena. “O Conte Conosco é um espaço privilegiado de discussão dessas questões.” Criado em 1996, o programa realiza encontros mensais e é aberto a pacientes interessados em participar. Antes de entrarem para o grupo, eles passam por uma entrevista individual, para ver se esse tipo de iniciativa é indicada em seu caso. As reuniões não seguem roteiros específicos e são conduzidas de acordo com os questionamentos trazidos pelos pacientes a cada encontro. “A aposta é que aquelas pessoas se tornem mais participantes de seus tratamentos e com mais recursos para conviver com os desafios impostos pela doença”, conclui a coordenadora do projeto.

Segundo o instituto Oncoguia, levar informação sobre a doença é fundamental para fazer com que parte significativa da população se converta no que eles chamam de PAR – pessoa ativa e responsável com a própria saúde

Onco& julho/agosto 2015

61


campanhas

Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e nas redes sociais

Divulgação

Associações e indústria se unem para pedir melhora no tratamento do câncer de mama metastático no SUS

62

julho/agosto 2015 Onco&

A importância de democratizar o acesso aos tratamentos para câncer de mama metastático é o tema de uma nova campanha lançada em junho pelo Instituto Oncoguia, pela Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama) e pelo laboratório Farmacêutico Roche. Batizada de Por Mais Tempo, a campanha foi apresentada ao público em um evento que reuniu pacientes, médicos e imprensa no auditório do Museu de Arte de São Paulo (Masp). O mote da campanha gira em torno da pergunta “o que você faria se tivesse mais tempo?” e pretende levar a uma reflexão sobre a diferença que pode fazer na vida das pacientes de câncer de mama metastático e seus entes queridos a garantia de acesso aos melhores tratamentos disponíveis no mercado – e, portanto, de mais tempo de vida. O vídeo da campanha conta com a participação de artistas como Bárbara Paz, Glória Pires, Ana Maria Braga, Marília Gabriela, Reinaldo Gianechini, Oscar Magrini, Arlete Salles entre outros. O fato de muitas pacientes chegarem ao Sistema Único de Saúde (SUS) já em estágio mais avançado faz com que o câncer de mama metastático seja uma questão bastante frequente no Brasil. “Mas não há dados concretos sobre isso. Parece até que as pessoas têm medo de falar dessa doença, como se não houvesse o que fazer”, afirma Maira Caleffi, presidente voluntária da Femama. A falta de acesso aos principais tratamentos no sistema público de saúde acaba gerando um problema para quem depende do serviço. “Temos uma dicotomia, em que pacientes da rede privada têm acesso aos melhores tratamentos e os do SUS não”, diz Luciana Holtz, presidente do Instituto Oncoguia. “Isso não é justo.” O site da campanha na internet (www.pormaistempor.com.br) tem uma petição que deve ser encaminhada ao Ministério da Saúde solicitando a incorporação de tratamentos mais adequados para as pacientes com câncer de mama metastático ao SUS. A página traz também mais detalhes sobre a campanha e depoimentos de pacientes.


apoio Lado a Lado

Reflexão sobre a autoestima Por Marlene Oliveira

A

PALAVRA AUTOESTIMA CAIU NO GOSTO

POPULAR E GANHOU UMA INFINIDADE DE

SIGNIFICADOS. MUITAS VEZES, ELA É DITA quase que “automaticamente”, e as pessoas pouco param para pensar sobre o que significa. Para o paciente oncológico, ela se mostra fundamental no caminho de superação e enfrentamento da doença. Do ponto de vista psicológico, a autoestima está ligada ao autoconceito, e revela o juízo que a pessoa faz de si. A ideia é determinar se existe o reconhecimento positivo das qualidades, competências e valores de cada um. Mas como todos nós podemos praticar a autoestima? Primeiro, precisamos levar em conta que ela só é possível por meio de um movimento de interiorização, sempre tendo como ponto de referência o mundo ao redor e a relação com os outros. Praticar a autoestima é um exercício de sensibilidade, uma ação constante de perceber a si

mesmo pelos sentidos, expandindo o campo de contato com a subjetividade. Algo como “escuta-te a ti mesmo”, “olha-te a ti mesmo”, “experimenta-te a ti mesmo”, enfim, “conhece-te a ti mesmo”. A prática de perceber a si mesmo é uma aproximação com a interioridade, e o mundo exterior só comparece como instância coadjuvante. Esse aprendizado contínuo, ao contrário de fechar o indivíduo, impulsiona-o para fora. Isso porque a autoestima não pressupõe individualismo, que se reflete em pensamentos como “eu me basto” ou “não dependo de ninguém para me sentir feliz”. A felicidade pessoal que não considera o ambiente coletivo pode gerar sentimentos como arrogância e pretensão. Por isso, nesse processo de autoconhecimento, é importante não confundir a autoestima com ser um verniz entusiástico, sem nenhum compromisso com o processo de reflexão. A autoestima nada tem a ver com “amor

próprio”, que serve somente para manter nosso estado psicológico na zona de conforto. Muitas vezes, para buscar o aumento da autoestima, muitas vezes recorre-se a guias práticos que usam termos como “sucesso” e “competência”. Mas isso é a transformação da autoestima em mercadoria, e não o caminho genuíno para o autoconhecimento. Para que a autoestima se faça presente a olhos vistos é preciso exercitá-la tal qual um mantra, estabelecendo um diálogo interno de convencimento, no qual pensamentos poderosos exercem papel importante, mostrando que a pessoa é passível de apreço e reconhecimento por parte de si e das pessoas que a rodeiam. É enxergar a si próprio pelos seus olhos e sentir pelo seu coração, como diria o filósofo suíço Jean-Jacques Rousseau. Assim, a responsabilidade por não deixar a “peteca cair” é somente da pessoa, ficando ela incumbida da tarefa de não se deixar afetar pelas contradições da realidade moderna, que muitas vezes despreza o sentir e o pensar, além de racionalizar os afetos.

Instituto Lado a Lado

Campanha Vencer com Autoestima

Marlene Oliveira – Presidente do Instituto Lado a Lado pela Vida

O Instituto Lado a Lado pela Vida desenvolve há sete anos a campanha Vencer com Autoestima, focada para pacientes em tratamento com o objetivo de resgate da autoestima. Com foco nos cânceres de ovário, útero e mama, desde 2009 a campanha cumpre importante papel motivador para que as mulheres se mantenham firmes na prevenção e no combate das doenças. São realizadas diversas ações para valorizar a autoestima da mulher e da paciente em tratamento, com atividades presenciais, arteterapia, palestras, rodas de conversa, oficina de lenços, desfiles de moda e beleza, artesanato, oficinas de pintura e aquarela para pacientes em clínicas e hospitais de todo o Brasil. Onco& julho/agosto 2015

63


calendário 2015 Evento

Data

Local

Informações

World GI 2015

1º a 4 de julho

Barcelona – Espanha

http://migre.me/qp5O3

Gastrão 2015

1º a 4 de julho

São Paulo – SP

http://www.gastrao.org.br/

VII Simpósio Internacional de Ginecologia, Obstetrícia e Mastologia – PUCRS

2 a 4 de julho

Gramado – RS

http://www.plenariumcongressos.com.br /congressos/gineco2015/

II Simpósio de Psicologia do Inca

5 de agosto

Rio de Janeiro – RJ

http://www.inca.gov.br/ie_eventos/

5º Fórum Latino-Americano de Biossimilares e 6º Forum Brasileiro de Biossimilares

5 e 6 de agosto

Brasília – DF

http://www.biossimilares2015.com.br/

Seminário Internacional de Segurança do Paciente e Acreditação em Saúde

7 e 8 de agosto

São Paulo – SP

www.onaeventos.com.br

XX Congresso Brasileiro de Física Médica e Simpósio Internacional de Proteção Radiológica em Medicina

12 a 15 de agosto

Rio de Janeiro – RJ

http://acquaviva.com.br/CBFM2015/

13º Fórum de Ética em Pesquisa Clínica

17 de agosto

São Paulo – SP

http://migre.me/qp6bI

Câncer de Mama 10º Edição

27 a 29 de agosto

Gramado – RS

http://www.cancerdemamagramado.com.br/

I Simpósio do Centro de Oncologia do Hospital Universitário Oswaldo Cruz – Tumores Ginecológicos

29 de agosto

Recife – PE

contato@sequipe.com.br

Concan 2015

2 a 5 de setembro

Brasília – DF

www.concan2015brasilia.com.br

IASLC 16th World Conference on Lung Cancer

6 a 9 de setembro

Denver – EUA

https://www.iaslc.org/

III Simpósio Internacional de Melanoma

19 de setembro

São Paulo – SP

www.rvmais.com.br

ASCO 2015 Breast Cancer Symposium

25 a 27 de setembro

São Francisco – EUA

http://breastcasym.org/

European Cancer Congress 2015 / ESMO 2015

25 a 29 de setembro

Viena – Austria

http://www.esmo.org/

Calendário de eventos de 2015 completo e atualizado:

66

julho/agosto 2015 Onco&


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.