Onco& ed.10, ano II

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março/abril 2012 Ano 2 • no 10

Oncologia para todas as especialidades

Bioética Aplicação na pesquisa clínica e nos cuidados do paciente oncológico

Farmácia Erros de medicação: como evitá-los?

Do bem Informação sobre câncer nas ondas do rádio

Cuidados paliativos Veja como eles podem ajudar o paciente de câncer e o que fazer para incorporá-los na rotina médica

entrevista | emergências oncológicas | oncoplastia


sumário

Como Luciana Holtz fez do Instituto Oncoguia uma das principais fontes de informação sobre câncer para pacientes no Brasil

entrevista

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capa

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Confira os benefícios dos cuidados paliativos e os obstáculos enfrentados para incluí-los na rotina médica

emergências oncológicas

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Complicações neurológicas no paciente oncológico Luiz Gustavo Torres, Simone Maradei e Daniel Tabak

farmácia

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Erros de medicação em oncologia Annemeri Livinalli

bioética

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Bioética na prática médica Cícero Urban

mama

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Oncoplastia/reconstrução mamária Vilmar Marques Oliveira e Fábio Bagnoli

do bem

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No dial ou na internet, veja como o rádio se tornou mais um aliado no combate ao câncer

quiz

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A cada edição, um caso novo e pouco comum. E o diagnóstico é... Andrey Soares

curtas

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Notícias da indústria, iniciativas, prêmios: um giro pelo mundo da oncologia

calendário

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Programe-se: eventos e congressos para anotar na agenda


Conselho editorial Editor clínico: Sergio D. Simon

I – Cancerologia clínica Oncologia clínica: André Moraes (SP) Anelisa Coutinho (BA) Auro Del Giglio (SP) Carlos Sampaio (BA) Claudio Petrilli (SP) Clarissa Mathias (BA) Daniel Herchenhorn (RJ) Fernando Medina (SP) Gothardo Lima (CE) Igor Morbeck (DF) João Nunes (SP) José Bines (RJ) Karla Emerenciano (RN) Marcelo Aisen (SP) Marcelo Collaço Paulo (SC) Maria de Fátima Dias Gaui (RJ) Nise Yamaguchi (SP) Oren Smaletz (SP) Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP) Roberto Gil (RJ) Sebastião Cabral Filho (MG) Sérgio Azevedo (RS) Sergio Lago (RS) Onco-hematologia: Carlos Chiattone (SP) Carmino de Souza (SP) Daniel Tabak (RJ) Jane Dobbin (RJ) Nelson Spector (RJ) Vânia Hungria (SP)

Transplante de medula: Jairo Sobrinho (SP) Luis Fernando Bouzas (RJ) Nelson Hamerschlak (SP) Yana Novis (SP)

II – Biologia molecular Ada Alves (RJ) André Vettore (SP) Carlos Gil (RJ) Helenice Gobbi (MG) José Cláudio Casali (RJ) Luísa Lina Villa (SP) Maria Isabel Achatz (SP)

III – Cancerologia cirúrgica Neurologia: Manoel Jacobsen Teixeira (SP) Marcos Stavale (SP) Cabeça e pescoço: Luis Paulo Kowalski (SP) Vergilius Araújo (SP) Tórax: Angelo Fernandez (SP) Riad Naim Younes (SP) Abdômen: Ademar Lopes (SP) José Jukemura (SP) Laercio Gomes Lourenço (SP) Marcos Moraes (RJ) Paulo Herman (SP)

Mama: Alfredo Barros (SP) Antonio Frasson (SP) Carlos Alberto Ruiz (SP) Maira Caleffi (RS) Urologia: Antônio Carlos L. Pompeu (SP) Miguel Srougi (SP) Ginecologia: Jorge Saad Souen (SP) Sérgio Mancini Nicolau (SP) Sophie Derchain (SP) Tecido osteoconjuntivo: Olavo Pires de Camargo (SP) Reynaldo J. Garcia Filho (SP)

IV – Radioterapia Ludmila Siqueira (MG) Paulo Novaes (SP) Robson Ferrigno (SP) Rodrigo Hanriot (SP) Wladimir Nadalin (SP)

V – Cuidados paliativos e dor Ana Claudia Arantes (SP) Claudia Naylor Lisboa (RJ) Fabíola Minson (SP) João Marcos Rizzo (RS) Ricardo Caponero (SP)

Ano 2 • número 10 março/abril 2012

Publisher Simone Simon simone@iasoeditora.com.br Editorial Lilian Liang lilian@iasoeditora.com.br Sergio Azman sergio@iasoeditora.com.br Direção de arte Luciana Cury luciana@iasoeditora.com.br

Impressão: Ipsis Gráfica e Editora Tiragem: 10 mil exemplares ISSN: 2179-0930 Jornalista responsável: Lilian Liang (MTb 26.817) Colaboraram nesta edição: Andrey Soares, Annemeri Livinalli, Cícero Urban, Conceição Lemes, Daniel Tabak, Evandro Lucena, Fábio Bagnoli, Luiz Gustavo Torres, Simone Maradei, Valéria Hartt, Vilmar Marques Oliveira

A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, uma publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica, traz informações sobre oncologia a profissionais de todas as especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição nacional e gratuita por todo o território nacional. A reprodução do conteúdo da revista é permitida desde que citada a fonte. A opinião dos colaboradores não reflete necessariamente a posição da revista.

Pré-impressão Ione Gomes Franco Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva

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Abraçar o novo

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UDAR NUNCA É FÁCIL.

MUDAR O MODUS OPERANDI, MUDAR HÁBITOS, MUDAR PRÁTICAS – TUDO ISSO REQUER EMPENHO, VONTADE E uma boa dose de paciência. O caso com os cuidados paliativos não poderia ser diferente. Embora recentemente reconhecido como especialidade médica, os cuidados paliativos ainda são vistos com uma certa ressalva. Especialistas alardeiam seus benefícios. Estudos mostram que pacientes que recebem cuidados paliativos sofrem menos e, quando acontece, morrem melhor. Pacientes e famílias que recorreram a esse tipo de cuidados relatam suas vantagens. Então o que falta? Por que tanta resistência para incorporar os cuidados paliativos na rotina médica? É essa análise que a repórter Conceição Lemes faz em nossa matéria de capa. Numa reportagem bem apurada, em que levanta pontos importantíssimos, Conceição mostra que o novo pode ser muito bom. Mas é essencial estar aberto a ele. É preciso, antes de mais nada, querer conhecê-lo e estar disposto a encarar mudanças para abraçá-lo. Nós aqui na Onco& – Oncologia para todas as especialidades procuramos recepcionar o novo sempre de bom grado e com tapete vermelho. Acreditamos que ele traz consigo um frescor arejado e revigorante – um bom remédio para evitar que se caia na rotina e se deixe de enxergar o encanto naquilo que nos rodeia. Tentamos, de tempos em tempos, inventar modas, acrescentar seções na revista, pensar em projetos especiais, criar ideias mirabolantes para o site. O novo mantém acesas a criatividade e a vontade de melhorar.

Este editorial tem tom de despedida. Depois de dois anos à frente da Onco& – Oncologia para todas as especialidades, despeço-me para desbravar outros horizontes. Vou eu agora enfrentar o novo, porque há certos anseios dentro de nós que só ele pode aplacar. Gostaria de agradecer a todos que fizeram parte da minha jornada na revista pelos dois anos de muito aprendizado e crescimento – eles só foram possíveis graças à generosidade de vocês. Obrigada por terem acreditado no poder da informação como agente de mudanças. A revista fica a partir de agora sob os cuidados de Valéria Hartt, jornalista veterana e profunda conhecedora do tema – primeiro como voluntária, depois por experiência familiar e, hoje, como estudiosa. Valéria passa a integrar a equipe da Iaso Editora, time de primeira, com o qual foi um pri vilégio trabalhar. A revista não poderia estar em melhores mãos. Despeço-me já com saudades e certa de que o trabalho continuará sendo feito com carinho e empenho, para que sua missão – a de equipar o médico não especialista na árdua tarefa de detectar o câncer precocemente – se cumpra a cada edição. É um orgulho ter feito parte dessa iniciativa. Até a vista. E boa leitura!

Lilian Liang

* Jornalista especializada na cobertura de saúde, é editora da Onco& – Oncologia para todas as especialidades Contato: lilian@iasoeditora.com.br

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entrevista

Você conhece? O Instituto Oncoguia nasceu não apenas de uma vontade, mas de uma vocação. Sua fundadora e presidente, Luciana Holtz, conta como uma pequena iniciativa se tornou uma das principais fontes de informação sobre câncer para pacientes no Brasil Por Lilian Liang Divulgação

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Luciana Holtz

* Presidente do Instituto Oncoguia Contato: lucianaholtz@oncoguia.org.br

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ocês já conhecem a Luciana Holtz, do Oncoguia?” Essa foi uma das perguntas que mais escutei quando a Onco& ainda era apenas uma ideia. Nas conversas com especialistas e gerentes de produto para quem apresentava a proposta da revista, a pergunta era sempre a mesma. Dez edições da revista mais tarde, é impossível não conhecê-la. À frente do Instituto Oncoguia, o maior portal de informações sobre câncer do país, as iniciativas que Luciana encabeça são de impacto real. Com seu jeito simpático e delicado, mobiliza quem precisar – profissionais que trabalham com oncologia, laboratórios farmacêuticos, comunidades, políticos – com um único objetivo: melhorar a vida do paciente com câncer no Brasil. O começo foi lento. O Instituto Oncoguia nasceu tímido, em 2003, na sala de sua casa. Fruto de uma vocação que encontrou ainda na faculdade de psicologia, que cursou na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), e de uma preocupação real com o paciente de câncer, que recebe o diagnóstico e não sabe nem por onde começar a nova fase, Luciana partiu do princípio de que a informação de qualidade seria a palavra-chave. Enquanto aprendia mais sobre a doença e suas implicações, foi batendo em portas para viabilizar o Instituto Oncoguia. Conseguiu apoio da indústria farmacêutica e parcerias com médicos. Com maior visibilidade, os pacientes foram chegando, e Luciana e sua equipe – agora já havia uma equipe! – iam identificando o próximo passo no crescimento de sua instituição. Foi assim que desenhou o tripé sobre o qual a iniciativa se baseia: educação, apoio e suporte, e advocacy (políticas públicas).

Hoje, o Instituto Oncoguia se expandiu para além dos limites da web. Suas atividades incluem treinamentos, palestras, projetos em comunidades carentes e um trabalho pesado de advocacy em Brasília. Foi também selecionado como ONG Líder da Iniciativa Global Komen no Brasil, um programa global da instituição americana Susan G. Komen for the Cure voltado para conscientização, advocacy e investimento em pesquisas para a descoberta da cura do câncer de mama. A última iniciativa do Instituto Oncoguia, concebida sob a batuta da própria Luciana com os oncologistas Rafael Kaliks e Auro del Giglio, foi o livro Paciente com câncer – Um guia para quem acabou de receber o diagnóstico. A ideia era disponibilizar, em um único lugar, uma espécie de kit de sobrevivência com informações para quem acabou de entrar no mundo do câncer. Luciana faz questão de ressaltar que o Instituto Oncoguia não seria o que é hoje se não fosse o apoio maciço de um sem-número de pessoas, desde profissionais até pacientes. “A causa merece o engajamento de todos. Estamos aqui para salvar vidas. Tudo que fazemos passa por aí”, conta. E você, já conhece a Luciana do Oncoguia?

Onco& – O Instituto Oncoguia lançou o livro Paciente com câncer – Um guia para quem acabou de receber o diagnóstico. De onde veio a ideia? Luciana Holtz – Estamos o tempo todo quebrando a cabeça para encontrar novas formas de ajudar o paciente. No site do Instituto Oncoguia existe um mundo de informações, mas queríamos fazer um apanhado com as principais recomendações que acreditamos que farão sentido e darão um chão para esse paciente, com uma mensagem


positiva, que possa acolher e informar. Os livros estarão disponíveis nas livrarias, mas nosso desejo inicial era de que eles fossem vendidos em banca mesmo, para realmente chegar ao público leigo, que não tem acesso a nada. O que fica muito claro pelas questões que chegam ao Oncoguia é que nenhum paciente sabe nada. O grau de desinformação das pessoas em geral é imenso.

Onco& – O Oncoguia existe principalmente na internet. Você acha que esta é a plataforma mais apropriada?

Luciana – O Oncoguia nasceu em 2003. Com a explosão da internet, comecei a ficar preocupada, porque chegavam muitos pacientes para mim completamente perdidos, desestruturados emocionalmente por causa de uma informação inadequada que eles haviam achado na internet. “Olha, Luciana, aqui está escrito que eu tenho 25% de chance de sobrevida.” O que essa informação significava para aquele paciente? Aí fui refletir sobre isso: o que é uma informação útil, de qualidade, que faz diferença. Adianta ter estatística, falar em taxa de sobrevida? Não adianta. Portanto, o Oncoguia foi muito nesse sentido – trazer informação de qualidade sobre câncer à internet, que era onde eles estavam procurando as informações. O primeiro slogan do portal era “Informação também é qualidade de vida”. Com o tempo fomos percebendo que existe um período específico da doença em que os pacientes nos procuram. No impacto do diagnóstico, eles têm medo do que podem ler. Mas, depois que passa o choque inicial, eles começam a se preparar para enfrentar o tratamento. Fomos desenvolvendo outros canais de comunicação e nossa última novidade é o 0800, que é o programa de apoio ao paciente. É um número para o qual as pessoas podem ligar todos os dias, entre 10h e 19h, para esclarecer dúvidas sobre qualidade de vida e direitos do paciente. Porque uma coisa é o paciente com acesso à internet, outra é o paciente que não tem acesso a ela.

Onco& – O Oncoguia trabalha para educar e apoiar o paciente. Como você vê o papel do médico nessa história? Luciana – O papel do médico é muito importante. Mas, pensando nas perguntas que recebemos, percebemos que o paciente está insatisfeito com a informação que recebeu e está querendo saber mais. O que deixamos claro é que a relação que o paciente tem com o médico no tratamento do câncer é muito importante e que essa relação tem que passar por segurança e confiança, para que ele se sinta cuidado por esse profissional. Nós não damos segunda opinião médica, mas insistimos que o paciente tem que ter todas as respostas e que é para o médico que ele deve perguntar. E que, se isso não acontecer, o paciente tem direito de procurar uma segunda opinião. É importante também trazer o câncer para a realidade do médico não especialista, para que ele também fique atento aos sinais e consiga diagnosticar a doença precocemente. Uma ideia é introduzir o tema câncer em outros congressos. É preciso trabalhar em parceria, principalmente se são doenças que estão sendo negligenciadas pelo médico que cuida do dia a dia.

No câncer de mama, sabemos que muitos médicos não fazem exame clínico das mamas, que é muito importante. Também não pedem os exames adequados. Agora imagine o médico que está na UBS, ganhando pouco, não valorizado e com uma infinidade de pacientes para atender. Ele não examina e também não escuta. É um desafio, porque há essa barreira da não atenção do médico. Aí tentamos educar a mulher, para que ela seja proativa, mas o sistema todo de saúde não ajuda na proatividade dela.

Onco& – Como estão as atividades de advocacy? Luciana – O projeto com a senadora Ana Amélia, referente à atualização da lei da ANS para pagamento de quimioterapia oral, está indo muito bem. Temos um longo caminho pela frente, mas o fato de conseguirmos ter levado o tema ao Senado já é um grande passo. Além do próprio doutor Paulo Hoff, outras grandes referências estiveram no Senado discutindo o tema. Acho que é um grande desafio, pois se trata de um tratamento inovador, que os planos de saúde precisam cobrir. A grande questão é que ele também não está disponível no SUS. Aqui estamos falando especificamente da temática da quimioterapia oral, mas existem outros aspectos do câncer envolvidos também. São sementinhas que estamos plantando e eu acredito que nós realmente precisamos do apoio deles lá.

Onco& – Uma das dificuldades dos pacientes é navegar no labirinto da vida pós-diagnóstico. Como o Oncoguia pode ajudar?

Luciana – Vamos lançar em março o Programa do Navegador do Paciente. Estamos desde abril do ano passado com o projeto piloto dentro do Hospital Pérola Byington, em São Paulo. É um programa de suporte ao paciente com câncer, baseado num modelo da American Cancer Society, cujo papel é ajudar o paciente a navegar após o diagnóstico do câncer. O que está difícil é o tempo que essa paciente leva para chegar ao hospital. Estamos fazendo um grande mapeamento e desenvolvendo um banco de dados de recursos da comunidade. Na medida do possível, o Navegador tenta auxiliar na questão dos direitos, onde conseguir cesta básica, questões nutricionais. Ele também ajuda com questões práticas de transporte, uma barreira seríssima. Houve o caso de uma paciente que ia começar a radioterapia mas não sabia nem pegar o metrô para chegar ao hospital. Já chegamos ao ponto de colocar a paciente dentro do ônibus e dizer ao motorista “Por favor, deixe-a na frente de tal hospital”. Então o desafio é observar os obstáculos que elas estão enfrentando antes de chegar ao serviço. Estamos começando a pensar sobre um Navegador ampliado, na comunidade do M’Boi Mirim, para que as pessoas consigam chegar mais cedo ao hospital. Já estamos com a navegadora lá, está levantando dados.

Onco& – Que mudanças o Oncoguia vem causando no paciente? Luciana – O objetivo do Oncoguia, é dar ferramentas para que o paciente de câncer seja ativo e responsável. Queremos que ele perca o medo da informação. Se ele não se colocar ali à frente do que está acontecendo na vida dele, quem vai? É muito complicado o paciente colocar a vida nas mãos do médico. Já foi assim, mas acho que está mudando. Onco& março/abril 2012

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capa

Longo caminho Os cuidados paliativos vêm aos poucos conquistando um lugar ao sol, mas o caminho pela frente é longo. Conheça os principais obstáculos e como você pode agir para mudar esse cenário

Por Conceição Lemes

T “A questão é que, nas faculdades de medicina, ensina-se como começar a tratar o câncer, mas nunca como terminar o processo quando o tratamento não dá certo.”

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RABALHO COMO JORNALISTA ESPECIALIZADA EM

EM JANEIRO DE 1998, TOMEI CONTATO PROFISsional, pela primeira vez, com “cuidado paliativo”. Fiz uma matéria sobre o tema para um boletim de educação médica. Guardo o título até hoje: Dignidade até o fim. Cuidado paliativo era recente entre nós. Preconizado pela filosofia hospice, criada em 1967 pela médica inglesa Cicely Saunders, ele crescia no mundo. Do Reino Unido, espalhou-se para Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Europa, Estados Unidos, depois para Japão, China, Israel e Brasil. Catorze anos se passaram. Curiosamente, pouco se avançou nisso por aqui. “Desde os anos 90, as faculdades de medicina do Canadá, Inglaterra, Nova Zelândia e Austrália têm cuidados paliativos como uma de suas disciplinas. No Brasil, nenhuma tem”, adverte o médico Toshio Chiba, chefe da equipe de cuidados paliativos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp). “Aqui, existem apenas iniciativas em algumas instituições que os colocam no meio de clínica médica, geriatria.” “Em geral, os médicos brasileiros não estão preparados para lidar com cuidados paliativos”, põe ainda mais o dedo na ferida o oncologista Ricardo Caponero, ex-presidente da Associação Brasileira de Cuidados Paliativos. “Todos os cursos médicos são voltados para cura, novas tecnologias, novas técnicas, novas drogas. Depois, nos congressos, os médicos são bombardeados pela indústria da cura. Não MEDICINA E SAÚDE HÁ QUASE

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ANOS.

se fazem congressos sobre ‘vamos falar sobre quando as coisas não dão certo’.” “Obviamente, nada contra a cura”, Chiba volta à carga. “A questão é que, nas faculdades de medicina, ensina-se como começar a tratar o câncer, mas nunca como terminar o processo quando o tratamento não dá certo.” Por outro lado, pela nossa tradição cultural, pacientes e familiares querem que se tente até o último recurso. Isso os torna particularmente vulneráveis a aderir a drogas divulgadas na mídia pela indústria farmacêutica como “de última geração”, e que às vezes nada têm de revolucionárias, assim como à indicação de radioterapia e até de cirurgia que não acrescentam nada – nem no tamanho nem na qualidade da sobrevida. Em 2008, Sandro*, 61 anos, descobriu que tinha câncer no pâncreas. Fez quimioterapia, radioterapia e cirurgia. Em 2010, recidivou. Encorajado pelo cirurgião – “nós vamos curar você com a cirurgia” –, ele, esperançoso, enfrentou o bisturi de novo. “Fizemos a nossa parte, a cirurgia foi um sucesso”, festejou o médico após deixar o centro cirúrgico – relembra Maria Amélia*. “Só que ficou um pouco de tumor lá. Em quatro meses, meu marido se foi. A cirurgia não adiantou nada. Foi totalmente desnecessária e ele ainda sofreu inutilmente no pós-operatório.” Em 2009, Luiza*, 57 anos, câncer disseminado de mama, foi informada laconicamente pelo seu médico: “Não há mais nada a fazer”, largando-a à própria sorte. “Minha irmã chorava de tristeza, pelo


abandono, e mais ainda de dor, por causa da doença; foi assim até o fim”, relata Elenice*. “Morfina?! Não, ela não usou, não. Iria viciar. O médico nos disse que poderia matá-la.” Em fevereiro de 2010, Ricardo*, 65 anos, soube que seu câncer colorretal havia invadido fígado e pulmões. Em dezembro, piorou. Foi internado na UTI. Logo depois entrou em coma. “O médico chegou a perguntar à minha mãe se queria mantê-lo na UTI ou deixar a doença seguir o seu curso natural”, expõe Anamárcia. “Decidimos mantê-lo na UTI, pois para Deus nada é impossível. Dois meses depois morreu, sem recobrar a consciência. Estava pele e osso, cheio de escaras nas costas.” As histórias de Sandro, Luiza e Ricardo não são raridade. Dos milhares de pacientes oncológicos que morrem por ano no Brasil, muitos são privados dos cuidados paliativos. A boa parte deles, esses recursos nem sequer são oferecidos. Quando indicados, algumas vezes são na dose errada, por exemplo; em outras, prescritos numa fase muito tardia da doença, depois de já terem sofrido bastante. Na raiz, problemas econômicos, mas principalmente preconceitos, mitos, desinformação da população e da classe médica.

Cuidado e conforto combinados a evidências científicas Paliar, de acordo com o dicionário Aurélio, significa tratar com paliativo, remediar provisoriamente, aliviar. Promessa que todo médico faz: abrandar a dor e o sofrimento, como ensinava Hipócrates, pai da Medicina, na Grécia antiga (460 a.C. a 377.a C.). O professor Derek Doyle, diretor-conselheiro da International Association for Hospice & Palliative Care (IAHPC) e um dos maiores especialistas em cuidado paliativo no mundo, moderniza o juramento para os tempos atuais: “Nossa especialidade é baseada tanto na nobre tradição de confortar e cuidar quanto em evidências científicas”. A Organização Mundial de Saúde (OMS), em conceito definido em 1990 e atualizado em 2002, detalha: Cuidados paliativos consistem na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar, que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e seus familiares, diante de uma doença que ameace a vida, por meio da prevenção e alívio do sofrimento, da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento de dor e demais sintomas físicos, sociais, psicológicos e espirituais. Traduzindo a caracterização de cuidados paliativos da OMS: 1. O atendimento envolve não apenas o paciente que se encontra em fase avançada, progressiva e incurável do câncer, mas também a família e outras pessoas interessadas nele. 2. O atendimento (não se diz que é médico) inclui não apenas a parte física, mas também a parte social, espiritual, psicológica. 3. Cuidados paliativos não se aplicam só a doentes oncológicos (embora representem boa parte), mas a todos os pacientes que caminham para uma situação de incurabilidade, progressão e irreversibilidade de sua doença. 4. O paciente não precisa estar morrendo para que se apliquem

cuidados paliativos. Eles são dirigidos a uma fase precoce de neoplasias, quando, em conjunção com outras doenças, podem alterar o curso delas ou o tratamento curativo. 5. Num sentido amplo, cuidados paliativos deveriam ser indicados desde o início de uma doença progressiva, incurável e que é acompanhada de sofrimento grande. “Se tirarmos a parte de expertise, que é muito restrita, é como se fazia medicina há 40, 50 anos, quando as tecnologias eram limitadíssimas”, explana Chiba. “Buscava-se enxergar o doente por inteiro: entender seu contexto social, sua angústia pessoal, psicológica, compreender seu background (inclusive religioso e/ou espiritual) e conduzir a situação dentro da limitação que ele tinha.”

O grande segredo é ouvir o que o paciente tem a dizer Vivemos tempos de evidências científicas, protocolos, consensos, busca de padrões. “Exceto o consenso quanto à necessidade de conforto, não há padrões de conduta em relação aos cuidados paliativos para pacientes oncológicos”, antecipa Caponero. “Afinal, cada situação é rigorosamente única.” Explico. De cara, a parte médica não é igual nos muitos tipos de tumores. Os de mama, por exemplo, não são idênticos aos de estômago. O linfoma não-Hodgkin da presidenta Dilma Rousseff nada tem a ver com o do ator Reynaldo Gianecchini. A parte psicossocial é menos semelhante ainda. Cada doente tem uma história de vida diferente. Tampouco há duas famílias exatamente iguais. Cada caso, portanto, é rigorosamente um caso, considerando-se que cuidado paliativo implica o biológico, psicológico e social, incluindo a família. Daí a impraticabilidade de se estabelecer padrões. “O grande segredo é ouvir com atenção o que o paciente tem a dizer e compreender o que ele quer para ele, considerando o seu modo de vida e pensar”, ensina Caponero. “Aí, tentar satisfazer ao máximo possível a vontade dele dentro daquilo que você pode.” Como? Experimente sentar junto ao doente com uma caneta e um pedaço de papel. Deixe-o falar. Procure saber não só quais são os seus medos, desconfortos físicos e emocionais, mas como ele quer ser tratado mais adiante. – “Ah, nessas horas, eu resolvo fácil”, alguém provavelmente dirá. “Trato os outros como gostaria que me tratassem...” “Só que isso não funciona para cuidados paliativos, pois o outro tem uma expectativa de vida diferente da sua, assim como eu tenho de você”, atalha Caponero. “O importante, como dizia Cicely Saunders, é o paciente saber que você se importa com ele, que estará ao seu lado não importa o caminho que escolha.” – Mas isso não se faz numa consulta de 5, 10 minutos?! – outros vão retrucar. Com certeza. A OMS vê como tempo razoável de 15 a 20 minutos. Onco& março/abril 2012

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No caso do Icesp, que é um serviço do SUS, os médicos de cuidados paliativos têm autorização para demorar 40 minutos. Mas não é apenas questão de tempo. Você tem de se interessar mesmo pelo doente. “No Icesp, juntos ou separados do doente, nós evidentemente abordamos também os familiares ao redor”, previne Chiba. “Às vezes gastamos até mais tempo com eles.”

“Doutor, vou ficar curado?” Os cuidados paliativos, já dissemos, aplicam-se a outras doenças. Mas na oncologia têm uma particularidade: todos os pacientes pensam que vão morrer quando recebem o diagnóstico, mesmo que seja um câncer “bonzinho” de pele. “Essa é a hora de plantarmos a semente da dúvida, para depois, se necessário, conversarmos sobre ela”, defende Caponero. “Os cuidados paliativos começam quando o paciente, iniciando a quimioterapia, por exemplo, nos pergunta: ‘Doutor, eu vou ficar curado, não vou?’.” Parte dos pacientes vai se curar e não precisará de nada mais importante. Mas parte deles, não. Só que, a priori, não dá para saber se este à sua frente integra o primeiro ou o segundo grupo. Por isso, para Caponero, se disser coisas como “com certeza” ou “essa quimioterapia é tiro e queda”, o doente tende a ficar com a ideia de que a cura é de 100%. E você, mesmo com a melhor das intenções, estará aplicando um cuidado antipaliativo, pois lhe tira a oportunidade de entrar em contato com o problema e tomar decisões. Além do que, obviamente, vai gerar grande frustração se a doença voltar. Mas isso não significa trazer à baila, de cara, uma perspectiva oposta, desesperadora, e dizer “pode ser que você morra”. O mais adequado, segundo Caponero, é apresentar uma perspectiva realista, respondendo “provavelmente” ou “talvez”. Afinal, o paciente à sua frente pode ser justamente o 1% que não vai dar certo. Daí deixar sempre a semente da dúvida para que ele possa pensar nos seus desejos, até onde quer ir, para trabalharmos isso depois. Para uma parte, infelizmente, chegará o dia em que se esgotam todas as possibilidades terapêuticas de cura capazes de mudar o curso natural da doença. Fez químio, rádio, hormonioterapia, cirurgia, enfim, todas as formas de terapias possíveis, sem sucesso. Esse paciente, então, precisa de continuidade de cuidado que leve em conta o aspecto psicológico/social/espiritual/religioso, além de atendimento médico decente, que se baseia em controle adequado de sintomas da melhor forma que for possível. “Começa aí a fase dos chamados cuidados paliativos exclusivos”, informa Chiba. “Paciente, família e médico vão ter de conversar, interagir. O foco principal é o paciente.”

Quem toma as decisões é o paciente: autonomia e direito O paciente tem as suas angústias, seus temores, pelo ciclo da vida que está findando. Os familiares querem que seus entes queridos vivam para sempre, mesmo vegetando em UTIs. Até porque hoje existe a possibilidade de, com a ajuda de recursos extraordinários, prolongar

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por muito tempo uma “vida”. Não por maldade, mas pelo chamado egoísmo possessivo do amor. “Já vi muitos pacientes bem preparados, que sabiam o que queriam, não desejavam quimioterapia paliativa nem ir para a UTI, e a família ficava pressionando, achando que estavam ‘desistindo’, ‘abandonando’, não tinham coragem”, exemplifica Caponero. “Quando isso acontece, tem de se tirar essa pressão negativa que a família exerce sobre o paciente e fazê-la entender que todos nós vamos perder nossos entes queridos.” Se você acompanhou esse paciente a doença inteira, já conhece muito do que ele pensa e quer, de como é a sua estrutura familiar. Se o está conhecendo agora, terá de se inteirar de tudo isso, para poder ajudá-lo ao máximo possível, inclusive fazer com que as decisões dele sobre o final da vida sejam respeitadas. Por isso, enquanto o doente está lúcido, alguns pontos têm de ser abordados, entre os quais estes: * Se a doença avançar muito, quer ir para a UTI, ser entubado, mesmo que fique “desligado” do mundo, ou prefere deixar a doença seguir o seu curso natural, como acontecia antigamente quando não existiam recursos extraordinários para preservar a vida, ainda que sem qualidade? * Faça de conta que vou colocar uma bombinha dentro de você. Deixarei o controle na sua mão. Supondo que você desmaie, a quem entregaria esse controle para tomar conta no seu lugar? É uma forma de você saber quem pode decidir pelo doente quando ele não conseguir mais. * Se, de repente, piorar muito, quer que a família leve você para o hospital ou prefere permanecer em casa junto com as pessoas que ama? * Se for necessário, aceitaria fazer traqueostomia, para facilitar a entrada de ar? Ela é indicada quando existe alguma obstrução que dificulta a passagem de ar da boca ou do nariz até os pulmões. * E gastrostomia, aceitaria? A gastrostomia é preferível à sonda nasogástrica, que incomoda muito o doente, rebaixando muito a sua autoestima. Crianças olham feio, adultos evitam olhar. O resto é explicar os cuidados paliativos, os prognósticos e dizer até onde vale a pena intervir. “A gente tem de voltar ao tempo em que não existia penicilina, tomografia, ressonância, pegar na mão do doente, sentar, conversar, ouvir a família, resgatar aquilo que o médico de antigamente fazia”, reforça Caponero. “É reaprender a ouvir o doente. É retomar o lado humanístico da medicina que foi perdido com toda a tecnologia que se tem hoje.” Mas por que tantas perguntas ao doente se ele muitas vezes já não sabe mais o que faz? Fundamentalmente, quem toma as decisões sobre a vida do paciente, seus passos seguintes, é o próprio paciente. Se não quiser quimioterapia paliativa, não fará. Se disser que não vai para a UTI,


não vai. É um direito dele. Lembre-se: o primeiro princípio da bioética é a autonomia. Cada um é dono da sua vida.

Quando e como entra a família; atente a possíveis interesses E a família, não vai ser ouvida? Sim, desde que o paciente não tenha condições de decidir e você desconheça a opinião dele. Mas se conversaram, se você sabe o que ele quer, a opinião dele é que vale. Isso não quer dizer que vá alijar a família dos cuidados. Então o que nós, médicos, devemos passar à família? O contexto exato da doença e as perspectivas rigorosas do tratamento. Além disso, ajudá-la a lidar com a angústia do desfecho que se avizinha. É preciso também saber quem é quem na família, os laços entre eles, quem decide (nem sempre a pessoa mais representativa é o parceiro; às vezes é o filho). “Não se trata de se meter na vida alheia”, atenta Caponero. “Às vezes há vínculos extraconjugais, disputa por herança e interesses por trás que podem interferir no encaminhamento do doente.” “Mas não é excesso de cautela?”, alguém pode sugerir. Não. Mas leia, primeiro, estas duas histórias vivenciadas por Caponero. A primeira se passou com dois senhores gêmeos, sócios numa distribuidora de sorvete. Um teve câncer, estava se tratando. O outro ia sempre ao hospital saber como ia o tratamento do doente, se daria certo. Até que um dia Caponero disse para o irmão com câncer: “Parabéns, o seu irmão é exemplar, é o cara que está mais interessado em você”. Ele devolveu: “Aquele f...d...p... quer saber quando vou morrer para ficar com a minha parte, ele quer que eu morra!”. “E eu pensando que era interesse pela saúde, mas o interesse era outro”, diz o médico, sem conter o riso. “Por trás, eles tinham uma hostilidade descarada. Como eu havia conversado com ambos em separado, nunca tinha percebido isso.” Em outra ocasião, Caponero tinha uma paciente internada e ela piorou. Era preciso definir se seria mandada ou não para a UTI. Como é algo que não se decide por telefone, ele ligou para o marido dela: “O senhor poderia passar por aqui para conversarmos? Vamos ficar mais uma hora, uma hora e meia”.

O marido: “Eu estou pertinho, estou indo já para aí”. Deveria estar do lado do hospital, pois chegou rápido com uma mocinha a tiracolo. “Estava na cara que não era filha nem tinha outro parentesco, pois a gente conhecia os outros membros da família. Aí, como eu ia perguntar na frente se ele queria que eu transferisse ou não a esposa para a UTI? Claro que ele iria dizer sim”, recorda-se o médico. “Aí, aprendi que só dá para confiar na relação de mãe para filho. De filho para mãe, não. Às vezes ele quer que a mãe morra, para ficar com a herança ou se livrar do ‘peso’.” Continua achando excesso de cautela? Não à toa os cuidados paliativos, segundo a própria definição da OMS, são multidisciplinares. O médico sozinho não tem condições de lidar com todas as demandas psicossociais dos pacientes oncológicos. É preciso uma equipe. Além de médicos, devem estar envolvidos psicólogo, enfermeiro, assistente social e até assistente espiritual.

Nada de cruzar os braços, esperando o doente morrer. Aja! De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), órgão do Ministério da Saúde, a abordagem paliativa deve entrar em cena quando a doença já está em estágio avançado ou evolui para essa condição, mesmo durante o tratamento com intenção curativa. Finalidade: manejo dos sintomas de difícil controle e de alguns aspectos psicossociais associados à doença. Já na fase terminal, quando faltam poucos dias para o óbito, o tratamento paliativo se impõe para, através de seus procedimentos, garantir qualidade de vida. O INCA informa também: 1. Os cuidados paliativos implicam fornecer alívio para dor e outros sintomas estressantes como astenia, anorexia, dispneia e outras emergências oncológicas. 2. Considerando a carga devastadora de sintomas físicos, emocionais e psicológicos que se avolumam no paciente com doença terminal, são necessários um diagnóstico precoce e condutas terapêuticas antecipadas, dinâmicas e ativas, respeitando-se os limites do próprio paciente. 3. Os sintomas do paciente devem ser avaliados rotineiramente e gerenciados de forma eficaz através de consultas frequentes e intervenções ativas.

“Cuidado paliativo não é cruzar os braços, esperando que o doente morra. Ao contrário. É agir – e muito – para dar qualidade de vida aos dias que restam.”

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A esta altura, algumas perguntas/observações inevitáveis quando se aborda esse assunto. Toshio Chiba esclarece cada uma delas: * Todo paciente com câncer tem dor? É o sintoma mais comum. É intensa e insuportável em 90% dos casos avançados de câncer. Causa tormento físico e psíquico. Porém, tratados adequadamente com morfina, cerca de 90% têm alívio. Acontece que o médico, devido ao pouco conhecimento e aos tabus, evita prescrevê-la. É a opiofobia que também afasta o farmacêutico e o enfermeiro, assim como pacientes e familiares. Quanto à dose a ser prescrita, é aquela que funciona. A morfina não tem um limite a partir do qual não atua. * Se não há mais nada a fazer, por que fazer algo? Primeiro, cuidado paliativo não é cruzar os braços, esperando que o doente morra. Ao contrário. É agir – e muito – para dar qualidade de vida aos dias que restam. Segundo, quem acha que não há mais o que fazer está praticando cuidados paliativos erroneamente. Imaginemos um paciente com tumor cervical que já fez todos os tratamentos curativos disponíveis mas não funcionaram. O tumor continua a progredir a ponto de já encostar no nervo do pescoço, causando dor insuportável. Todas as medicações orais possíveis foram tentadas. Nada. O que fazer? O setor de augologia do Icesp tem várias maneiras de atuar, inclusive de forma invasiva, mas que são bastante eficientes para tirar a dor: fazer implante de bomba de infusão contínua de morfina, secção cirúrgica de nervo, até um tipo de neurocirurgia. Isso é uma tremenda invasão, mas que se faz necessária para cuidar do doente. * Traqueostomia é mesmo tratamento paliativo? E gastrostomia? Afinal, são invasivos. Ao contrário do que muitos imaginam, tratamentos paliativos incluem métodos invasivos. Não é porque não há terapêuticas curativas que se vai abandonar o doente. São invasões indispensáveis para as necessidades propostas, com o fim de propiciar a qualidade de vida, principalmente aos que mantêm funcionalidade. * Quem vai para cuidados paliativos morre, lá eles matam os nossos pacientes... Não é verdade. Na realidade, nós estamos assistindo o paciente que está morrendo. Muitas vezes a própria quimioterapia acaba causando mucosite, depressão, infecção, desnutrição, que prejudicam muito o bem-estar do paciente, que pode vir a falecer também por causa disso. Nós não estamos aqui para contestar a quimioterapia. Ao contrário. A gente busca dar suporte para o paciente ir em frente no tratamento. Só que o subproduto do atendimento de paciente com doença avançada é ter várias sintomatologias. Guarde bem mais estes dois princípios do tratamento paliativo:

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1. Não apressar ou adiar a morte; 2. As decisões relacionadas a assistência e tratamentos médicos devem ser feitas com base em princípios éticos.

Riqueza garante quarto de luxo, mas não morte digna “Mas dá para garantir, a priori, que o paciente terá um fim digno?” – finalmente a pergunta que a maioria gostaria de fazer aos especialistas entrevistados por Onco&. “Não”, afirmam em coro os médicos Toshio Chiba e Ricardo Caponero. “Diversas variáveis podem interferir.” Eis algumas: * É insuficiente o número de profissionais para lidar com cuidados paliativos. * Não há estrutura física para cuidar dos pacientes submetidos a cuidados paliativos. * Cuidado paliativo de caráter contínuo não é remunerado. Por mês, os convênios pagam uma consulta e um retorno para atendimento do doente (às vezes é necessário muito mais) e nenhuma para o dos familiares. Assim, os profissionais não têm interesse em fazê-lo e, muito menos, em fazer bem-feito. * Riqueza pode garantir quarto hospitalar maravilhoso, mas não obrigatoriamente morte digna. * Mesmo quando a pessoa está muito bem esclarecida, não há como assegurar que não haverá problemas. “Tive um paciente que não queria ir para a UTI e foi para o andar geral do hospital”, relembra Caponero. “Como ele estava muito no final, passei um sedativo para que ele dormisse o tempo todo e não tivesse contato com o sofrimento.” “Depois, descobri que a enfermagem tirou o remédio, achando que o paciente estava dormindo demais”, prossegue. “Eu estava dando um cuidado paliativo e a enfermagem ficou com medo de estar matando o doente. Entendia aquilo como eutanásia.” Mas você pode contribuir para que seus pacientes tenham um fim digno. Não fique postergando o encaminhamento para cuidado paliativo. Cuidado o com subtratamento da dor e também com a subvalorização dos sintomas. São situações que causam sofrimento ao paciente. Na dúvida, converse com um colega. Foi o que a médica de Helena*, 52 anos, câncer disseminado de mama, fez. “Minha irmã teve a bênção de encontrar uma médica muito legal, que se dispôs a acompanhá-la, auxiliada por um amigo oncologista. Receitou até morfina quando as dores pioraram”, agradece Gislaine. “Ela voltou a sorrir, a frequentar nossas festinhas. No ano passado, em casa, rodeada pelos filhos e de carinho, ela se foi.”


emergências oncológicas

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Complicações neurológicas no paciente oncológico Síndrome de compressão medular

Luiz Gustavo Torres * Médico oncologista do Centro de Tratamento Oncológico (CENTRON)

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Contato: torres.luizgustavo@gmail.com

Simone Maradei * Hematologista do Centro de Tratamento Oncológico (CENTRON) e do Centro de Transplante de Medula Óssea (CEMO) – INCA Contato: simaradei@gmail.com

Daniel Tabak * Hematologista-oncologista; diretor médico do Centro de Tratamento Oncológico (CENTRON); membro titular da Academia Nacional de Medicina Contato: dantabak@terra.com.br

A compressão da medula espinhal é uma complicação comum em pacientes com neoplasia maligna avançada, sendo uma causa de morbidade muito importante. Os cânceres de mama, próstata e pulmão são responsáveis por mais de 60% dos casos. Aproximadamente 70% das síndromes de compressão medular (SCM) afetam a coluna torácica, sendo menos frequente o comprometimento da coluna cervical e sacra. Os pacientes geralmente apresentam deterioração aguda de funções neurológicas, tais como incapacidade de deambular, devido ao efeito de massa das doenças metastáticas na medula espinhal. Por isso, o diagnóstico precoce é de extrema importância para garantir a efetividade da terapêutica. A estratégia terapêutica tem evoluído ao longo dos anos, devido em parte aos avanços tecnológicos na instrumentação da coluna vertebral. Fisiopatologia A invasão pelo tumor altera a relação entre o plexo venoso epidural (plexo de Batson) – corpo vertebral – canal medular, provocando uma estase venosa e um edema medular que levam a uma diminuição do fluxo capilar e à liberação de prostaglandina, citocinas, neurotransmissores e mediadores da inflamação, responsáveis pelas alterações associadas a hipóxia, isquemia e dano tissular neurológico. Outra forma de comprometimento do espaço epidural pode estar relacionada ao contínuo crescimento e expansão da massa tumoral, ou de retropulsão de fragmentos ósseos após o colapso de um corpo vertebral enfraquecido pelo tumor. Além disso, alguns tumores, especialmente linfomas e neuroblastoma, podem atingir o espaço epidural pelo crescimento direto do tumor para dentro do canal vertebral, através de um forâmen intramedular. Outro importante mecanismo pelo qual os tumores metastáticos podem prejudicar a medula espinhal é a desestabilização da coluna vertebral. Denise e colaboradores propuseram um modelo de

três colunas para a avaliação da estabilidade da coluna vertebral. Nesse modelo, a coluna anterior é composta pelo ligamento longitudinal anterior, pelo anel anterior e pela parte anterior do corpo vertebral. A coluna do meio inclui o ligamento longitudinal posterior, o anel posterior e a porção posterior do corpo vertebral. A coluna posterior inclui as estruturas da coluna vertebral que são posteriores ao ligamento longitudinal posterior. A interrupção de duas ou três colunas cria uma coluna instável. O colapso vertebral frequentemente envolvido é o que compromete as colunas anterior e média. Quadro clínico O quadro neurológico pré-tratamento é de longe o mais importante preditor de função após tratamento. Portanto, é desejável diagnosticar a SCM antes que o paciente desenvolva qualquer déficit neurológico. A maioria dos pacientes com SCM tem um diagnóstico de câncer conhecido. A dor é o sintoma mais frequente, ocorrendo em aproximadamente 83% a 95% dos pacientes, e geralmente antecede a disfunção neurológica. Inicialmente, a dor pode ser localizada e restrita à região de metástases da coluna vertebral. A dor radicular também é comum entre pacientes com SCM e pode ocorrer quando a massa tumoral comprime ou invade as raízes nervosas, sendo mais comum em lesões lombossacras. Ela geralmente piora com o decúbito e está relacionada com a distensão do plexo venoso epidural devido ao alongamento da coluna vertebral, ou com a manobra de Valsalva. A fraqueza é o segundo sintoma mais comum de SCM (60-85%), seguido por deficiências sensoriais (40-80%). As queixas do paciente relacionadas a esses sintomas muitas vezes são vagas. Esse déficit motor pode envolver neurônios motores inferiores e superiores. Quando acomete o neurônio motor superior, a fraqueza é mais simétrica, enquanto a fraqueza do neurônio motor inferior muitas vezes é assimétrica e afeta a extremidade distal dos memOnco& março/abril 2012

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bros. Nas lesões da cauda equina, a fraqueza está associada à depressão dos reflexos tendinosos profundos nas pernas. A maioria dos pacientes não é ambulatorial no diagnóstico, e a gravidade da fraqueza é maior em pacientes com metástases torácicas. Os déficits sensoriais manifestam-se como parestesias ou hipoestesias, que se iniciam nos pés e podem subir até o nível afetado com o avanço da doença. A disfunção do esfíncter é uma apresentação mais tardia de comprometimento medular e ocorre em torno de 40-60% dos casos. Geralmente é um resultado final que pode estar presente em até metade dos pacientes. A neuropatia autonômica se apresenta comumente como retenção urinária, e raramente é o único sintoma de SCM. Uma exceção é quando a metástase comprime a medula espinhal ao nível do cone medular, muitas vezes causando dor nas costas com disfunção urinária e intestinal. Diagnóstico O diagnóstico de SCM começa com a obtenção de uma história clínica, nos achados clínico-neurológicos que indicam o nível medular afetado. Imagens da coluna inteira devem ser feitas em qualquer paciente com suspeita de SCM, não apenas para definir o diagnóstico mas para auxiliar no planejamento do tratamento cirúrgico ou radioterápico. Atualmente, a ressonância nuclear magnética (RNM) é o método de imagem padrão-ouro na avaliação de doença metastática da coluna vertebral, em virtude de sua alta sensibilidade (93%) e especificidade (97%). Caso a RNM não possa ser utilizada, devido à presença de implantes metálicos, por exemplo, a tomografia computadorizada auxilia no diagnóstico. Outras modalidades de imagem são menos úteis. Um exemplo são as radiografias simples, que têm baixa sensibilidade e especificidade para fazer um diagnóstico e não devem ser usadas como procedimento de triagem. A cintilografia óssea e a tomografia por emissão de radionuclídeos de pósitrons podem detectar SCM, mas não são tão precisas quanto a RNM devido à sua resolução mais baixa. Tratamento Os objetivos fundamentais do tratamento são: a) controlar a dor; b) evitar complicações; c) preservar a função neurológica. Tratamento clínico Embora a compressão medular seja frequentemente de instalação insidiosa, ela deve ser tratada como uma emergência. A maioria dos pacientes com SCM apresenta dor de forte intensi-

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dade, por vezes incapacitante. Os glicocorticoides melhoram a dor em algumas horas, mas grande parte dos pacientes necessita de analgésicos opiáceos. O repouso é relativo e geralmente não há necessidade de manter o paciente na cama. Os pacientes são bastante hábeis em evitar manobras que desencadeiam a dor. Embora o valor da profilaxia contra o tromboembolismo venoso não tenha sido estudado especificamente em pacientes com SCM, a anticoagulação deve ser considerada se o paciente é imobilizado devido à SCM. É importante observar também se não há sangramento ativo ou outras contraindicações ao uso de anticoagulantes. Os corticosteroides são usados para atrasar a deterioração neurológica, diminuindo edema da medula espinhal e podendo também ter um efeito antitumor em certos cânceres, como linfoma e mieloma múltiplo. Atualmente, ainda não existe um consenso sobre a dose dos esteroides. Porém, há regimes que preconizam doses elevadas, e outros, doses moderadas. Alguns grupos defendem o uso dos sintomas motores para titular a dose de esteroide, ou seja, pacientes com sintomas motores rapidamente progressivos, como a perda da capacidade de deambular, devem receber uma dose alta, enquanto os pacientes com fraqueza mínima ou não progressiva são tratados com doses moderadas. Radioterapia A radioterapia tem sido o tratamento mais usado na SCM. Sua eficácia na preservação ou melhoria da função neurológica em pacientes com SCM tem sido relatada em vários estudos retrospectivos. Entretanto, a dose ideal e o esquema de tratamento permanecem controversos. Em uma revisão sistemática de vários regimes posológicos, Sze e colaboradores não encontraram diferenças no alívio da dor entre as doses única e multifracionada de radioterapia. Atualmente, acredita-se que doses fracionadas (2,5-3,6 GY / 10 a 15 frações) de irradiação podem reduzir o risco de lesão medular. Alguns fatores devem ser considerados na escolha dessa terapia, tais como: (a) grau de limitações funcionais no início de radiação; (b) tipo de tumor; e (c) rapidez do início dos déficits neurológicos. Os tumores primários mais sensíveis à radiação são o linfoma e o tumor de células germinativas (seminomatoso). A maioria dos tumores sólidos, como os de mama, próstata e pulmão, apresentam sensibilidade intermediária à radiação. O melanoma, o osteossarcoma e o carcinoma de células renais geralmente são considerados radiorresistentes. Embora os pacientes com tumores radiorresistentes ainda possam se beneficiar da radioterapia paliativa, a chance de recuperação funcional e resposta de longo prazo é muito menor. Os pacientes que rapidamente desenvolvem déficits neurológicos são menos suscetíveis a melhora do que aqueles que desenvolvem déficits de forma mais gradual.


Cirurgia O papel da descompressão cirúrgica no tratamento de pacientes com SCM tem evoluído ao longo dos anos. Historicamente, a radiação sozinha era o tratamento padrão para SCM, principalmente devido ao fato de a laminectomia ser insuficiente na descompressão da medula espinhal. Atualmente, com o avanço das técnicas cirúrgicas e da instrumentação da coluna vertebral, tornou-se possível descomprimir a medula espinhal e imediatamente estabilizar a coluna, com alívio da dor. A cirurgia é indicada quando o diagnóstico oncológico é duvidoso, perante a progressão da lesão na vigência do tratamento radioterápico, em pacientes previamente irradiados e quando existir instabilidade mecânica. Entretanto, a decisão pela cirurgia deverá levar em consideração a condição clínica do paciente e o prognóstico oncológico. A radiocirurgia estereotáxica espinhal (RES) e outras formas emergentes de radioterapia, como a radioterapia de intensidade modulada, permitem que a radiação seja mais precisa, convergindo sobre a lesão de interesse uma dose elevada, limitando a exposição do tecido normal. A vertebroplastia percutânea e a cifoplastia têm recebido atenção considerável devido à sua capacidade de invasão mínima. Houve alguma evidência de que esses procedimentos podem levar ao alívio da dor em pacientes com dor intratável secundária e fraturas patológicas do corpo vertebral. É de se esperar que essas técnicas, quando combinadas com radioterapia, possam proporcionar o alívio da dor mesmo para pacientes com SCM. Quimioterapia A quimioterapia raramente é utilizada no tratamento imediato da SCM porque, mesmo com tumores quimiossensíveis, a resposta é muito lenta e imprevisível. No caso de tumores quimiossensíveis, a quimioterapia pode ser usada em conjunto com a radioterapia. Conclusão Na maioria dos casos o prognóstico é sombrio. Porém, um número grande de pacientes apresenta uma razoável sobrevida a longo prazo, principalmente os que apresentam mieloma, linfoma e câncer de próstata. Pacientes selecionados se beneficiaram do tratamento cirúrgico. A escolha da modalidade para o tratamento definitivo depende de muitos fatores, incluindo a presença ou ausência de instabilidade da coluna, o grau de compressão da medula espinhal e a radiossensibilidade relativa do tumor. O diagnóstico precoce antes da instalação do dano neurológico grave e a instauração imediata do tratamento são fatores essenciais para evitar a paralisia. O prognóstico e a expectativa de vida, além da qualidade de vida, devem ser levados em conta para a tomada de decisão.

Elevação da pressão intracraniana A elevação da pressão intracraniana (EPI) é uma complicação neurológica comum e potencialmente grave em pacientes com câncer. É causada principalmente por doença metastática intraparenquimatosa, mas outras potenciais causas, como hidrocefalia e doenças infecciosas, normalmente associadas à imunodeficiência, devem ser lembradas como diagnósticos diferenciais. Neoplasia de pulmão e pele (melanoma) são os tumores que mais comumente se disseminam para o cérebro. O crescimento tumoral produz sintomas focais por invasão e compressão do tecido cerebral. Quadro clínico Sintomas gerais como cefaleia, náuseas, vômitos e depressão do nível de consciência são resultado da elevação da pressão intracraniana, provocada por edema vasogênico ou obstrução do fluxo do líquido cerebroespinhal. O edema resulta da disfunção da barreira hematoencefálica (aumento da permeabilidade capilar) e do acúmulo de líquido no espaço extravascular. O efeito de massa provoca EPI, compromete o suprimento sanguíneo e eleva o risco de herniação cerebral. A cefaleia está presente em cerca de metade dos pacientes com tumor cerebral (primário ou secundário), especialmente os de crescimento acelerado ou infratentoriais. Inicialmente leve, a cefaleia se torna mais intensa em dias ou semanas, e tipicamente está associada a outros sintomas de EPI (náusea, vômitos) e sinais focais. Outros relatos comuns são: acordar à noite com cefaleia, dor mais intensa pela manhã ou agravada com mudanças de postura ou manobras de Valsalva. Vômitos em jato, sem náusea, são frequentemente observados em pacientes com tumores de fossa posterior que evoluem com hidrocefalia obstrutiva. Outros sintomas relacionados à EPI secundária à doença neoplásica: - Disfunção neurológica focal: 20-40% - Disfunçao cognitiva (transtornos de humor e personalidade): 30- 35% - Convulsões: 10-20% - Hemiparesia/plegia: 5-10% A história e o exame clínico podem detectar a presença de EPI, mas os exames de imagem são fundamentais para confirmar a impressão clínica e determinar a causa. O exame com maior capacidade de dar informações anatômicas detalhadas, que permita a distinção entre neoplasia, infecção, processo inflamatório ou isquêmico, é a ressonância magnética. Exames específicos para avaliação do fluxo liquórico, como a cisternagrafia cintilográfica, podem ser utéis nos pacientes com hidrocefalia. Na maioria dos casos, a elevação da pressão intracraniana em pacientes com câncer se desenvolve no decorrer de dias ou semanas. Na Onco& março/abril 2012

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medida em que identifica a EPI, medidas iniciais são adotadas para a redução da pressão, enquanto o planejamento para abordagem diagnóstica e terapia definitiva é realizado. A necessidade de abordagem cirúrgica de urgência é rara. Contudo, deve-se considerar a internação em unidade de terapia intensiva em caso de alteração do estado mental. Tratamento clínico a) Corticosteroides: a dexametasona é a principal droga no controle sintomático do edema cerebral vasogênico, sendo seu mecanismo de ação ainda não totalmente conhecido. A melhora sintomática ocorre em 70-80% dos pacientes e pode acontecer em poucas horas, com a melhora clínica máxima atingida após 24 a 72 horas. Quando a resposta clínica não é alcançada após 48 horas, a dose pode ser dobrada a cada 48 horas até a dose diária de 100 mg. Corticoides sistêmicos estão indicados em todos os pacientes que apresentam edema peritumoral sintomático. A dexametasona, por seu baixo potencial mineralocorticoide e por estar menos relacionada a alterações cognitivas, é a droga de escolha. A dose recomendada em pacientes com sintomas mais significativos é de 10 mg como dose inicial e manutenção de 4 mg a cada 6 horas, ou 8 mg a cada 12 horas. Já para pacientes com sintomas leves, a dose inicial recomendada é de 4 a 8 mg por dia. Apesar de a dexametasona ser administrada tipicamente em quatro tomadas diárias, sua meia-vida permite o uso a cada 12 horas. A dose mantida deve ser a mínima necessária para manter o controle sintomático. Possui excelente absorção oral. b) Redução da pressão intracraniana: com a redução da pCO2, ocorre a vasoconstrição, redução do volume sanguíneo cerebral e da pressão. Essa medida deve ser adotada para controle emergencial da pressão intracraniana, permitindo que outras medidas se tornem eficazes. c) Osmoterapia: agentes hiperosmolares são usados para reduzir o edema cerebral e a pressão intracraniana por ação osmótica, direcionando a água do espaço extracelular para o interior dos vasos. Manitol 20% é a droga mais usada (0,5-2g/kg IV, dose de ataque), com efeito em 15-30 minutos. d) Outras medidas: o uso de antitérmicos para controle rigoroso da temperatura e a elevação da cabeceira a 30 graus são medidas que devem ser adotadas. Convulsão Convulsões são frequentes durante o curso clínico dos tumores cerebrais, ocorrendo em cerca de 40-60% dos gliomas, em 30-40% dos tumores metastáticos e em aproximadamente 13% de todos os pacientes com câncer. Tumores de crescimento lento ou íntimos ao córtex cerebral estão associados a maior incidência dessa complicação.

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Diagnóstico Usualmente o diagnóstico é realizado através da anamnese e do exame clínico, mas em algumas situações o EEG pode ser de fundamental importância (ex: status epitecticus não convulsivo). A tomografia computadorizada do crânio e o EEG devem ser considerados em todo paciente com história de crise convulsiva que chega para atendimento de emergência. Outros potenciais agentes etiológicos mais frequentes em pacientes com câncer são encefalopatia metabólica (ex: hiponatremia, hipoglicemia) e infecções oportunistas. Algumas causas podem estar associadas à terapia neoplásica específica, como a síndrome de leucoencefalopatia posterior relacionada especialmente ao uso da cisplatina. Tratamento Pacientes que já apresentaram convulsões secundárias a tumor cerebral devem iniciar terapia anticonvulsivante específica pelo elevado risco de recidiva. Sempre que possível, os anticonvulsivantes devem ter seus níveis séricos monitorados. Novas drogas, como topiramato e lamotrigina, são preferíveis nesse contexto pelo perfil de toxicidade mais favorável e menor potencial de interação medicamentosa. A Academia Americana de Neurologia (AAN) não recomenda profilaxia com droga anticonvulsiva em pacientes com doença neoplásica primária ou metastática, quando não há antecedente convulsivo.

Carcinomatose meníngea A carcinomatose meníngea (CM) pode ser identificada em 4-15% de pacientes portadores de tumores sólidos, leucemias e linfomas. Tumores cerebrais primários apresentam essa complicação em uma frequência bem menor. Adenocarcinomas representam a histologia mais habitual, e os tumores primários mais comumente identificados são mama, pulmão e melanoma. Fisiopatologia As células tumorais atingem as meninges por diversas vias: (1) disseminação hematogênica, através do plexo de Batson ou por disseminação arterial; (2) extensão direta por depósitos contíguos; e (3) através da migração centrípeta a partir de tumores sistêmicos ao longo dos espaços perineurais e perivasculares. Uma vez dentro do espaço subaracnoide, as células neoplásicas são transportadas pelo líquido cerebroespinhal, resultando em comprometimento disseminado e multifocal do neuroeixo. A infiltração tumoral é proeminente na base do crânio (mais especificamente nas cisternas basilares) e na superfície dorsal da medula espinhal (em particular na cauda equina). Hidrocefalia pode resultar da obstrução do fluxo do líquor por nódulos tumorais depositados ao nível do quarto ventrículo.


Quadro clínico A apresentação clínica da carcinomatose leptomeníngea consiste em manifestações pleomórficas que incluem sinais e sintomas em três áreas da função neurológica: (1) os hemisférios cerebrais; (2) os nervos cranianos; e (3) a medula espinhal e as raízes associadas. Os sinais no exame clínico geralmente excedem os sintomas relatados pelo paciente. As principais manifestações da disfunção dos hemisférios cerebrais são cefaleia e alterações do nível de consciência. Outros sinais incluem confusão, demência, convulsões e hemiparesias. O sinal mais comum de comprometimento é a diplopia, refletindo o comprometimento do sexto par craniano. Diagnóstico 1. Exame do líquido cerebroespinhal O exame do líquor representa o exame laboratorial mais adequado para o diagnóstico da CM. As anormalidades incluem: (1) pressão de abertura acima de 200 mm de água; (2) número de leucócitos > 4/mm3; (3) concentração de proteínas >50 mg/dl); e (4) níveis de glucose abaixo de 60 mg/dl. Essas alterações são sugestivas, porém não são diagnósticas. Já a presença de células neoplásicas estabelece o diagnóstico, porém elas nem sempre são identificadas em uma única amostra. Cerca de 45% dos pacientes apresentam um exame inicial negativo. A natureza do tumor não pode ser estabelecida através do exame citológico. Embora o diagnóstico possa ser estabelecido em 80% dos pacientes através de uma segunda punção, o benefício é limitado com a realização de um número maior de procedimentos. Os níveis de proteínas, glucose e células malignas variam ao longo de diferentes pontos do neuroeixo, mesmo quando não existe obstrução do fluxo liquórico. Na presença de sinais e sintomas cranianos, uma amostra obtida por punção ventricular geralmente apresenta uma positividade maior que o líquor obtido por via lombar. Já na presença de sinais e sintomas espinhais, a amostra obtida por punção lombar é mais frequentemente positiva. 2. Estudos neurorradiográficos A ressonância magnética (RM) contrastada com gadolíneo representa a técnica de escolha para avaliar pacientes com suspeita de metástases leptomeníngeas. Como o processo envolve todo o neuroeixo, a análise completa do sistema nervoso central é essencial para a abordagem adequada do paciente. A RM é mais sensível que a tomografia computadorizada contrastada, pois qualquer irritação das leptomeninges resultará em um aumento de sinal. A imagem revela uma fina camada que segue as circunvoluções e os sulcos cerebrais superficiais. A identificação de nódulos intradurais na RM espinhal (mais frequentemente

na cauda equina) pode ser considerada diagnóstica de CM em pacientes com câncer. Raramente a própria punção lombar pode resultar em alterações na RM, indicando a necessidade de sua realização após o método de imagem. A RM pode resultar em exames falsamente negativos em até 30% dos pacientes. Entretanto, em casos típicos, o exame é suficiente para estabelecer o diagnóstico. A utilização de radionuclídeos (ácido penta acético dietilenotetramina – DTPA - marcado com In111 ou macroagregados de albumina marcados com Tc99) constitui a técnica ideal para a avaliação da dinâmica do líquor. A circulação anormal do líquor é observada frequentemente, com bloqueios observados habitualmente na base do crânio, no canal espinhal e sobre as convexidades cerebrais. O bloqueio do fluxo liquórico representa um sinal de mau prognóstico e constitui uma indicação formal para o tratamento focal com radioterapia. O sucesso do tratamento é maior em pacientes com doença cerebral. O bloqueio liquórico resulta não apenas em nichos de células tumorais protegidos da ação dos quimioterápicos como também em áreas de acúmulo das drogas, determinando maior neurotoxicidade. Dessa forma, vários autores recomendam que um estudo do fluxo liquórico seja sempre realizado antes do início da quimioterapia intratecal, principalmente quando um reservatório de Ommaya for utilizado para o tratamento citotóxico. Prognóstico A sobrevida mediana de pacientes portadores de CM não tratada é de quatro a seis semanas, e o óbito é secundário à disfunção cerebral progressiva. A intenção do tratamento é melhorar ou estabilizar a condição neurológica, bem como prolongar a sobrevida. Déficits neurológicos fixos raramente regridem com o tratamento. Porém, a progressão das alterações funcionais pode ser interrompida e a sobrevida mediana ser estendida para quatro a seis meses. Nos tumores sólidos observa-se uma melhor resposta em pacientes portadores de carcinoma de mama, com uma sobrevida mediana de seis meses, sendo que de 11% a 25% dos pacientes sobrevivem mais de um ano após o diagnóstico. Vários fatores prognósticos foram relacionados com a sobrevida, como idade, sexo, duração dos sinais de CM, níveis de proteínas e de glucose. Seu significado, porém, é controverso. Geralmente a evolução é desfavorável em pacientes que apresentam comprometimento do estado geral, várias alterações neurológicas fixas, doença maciça no sistema nervoso central, encefalopatia carcinomatosa e várias anormalidades de fluxo observadas na ventriculografia por radionuclídeos. Pacientes com doença metastática sistêmica não responsiva aos tratamentos quimioterápicos dificilmente apresentarão um benefício da terapêutica intratecal. O tratamento precoce, antes do Onco& março/abril 2012

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aparecimento de déficits neurólógicos fixos, é crítico para impedir a progressão da doença – uma situação semelhante àquela observada na compressão epidural da medula espinhal. Tratamento A avaliação da eficácia do tratamento da CM é complicada pela ausência de uma conduta padrão, pela dificulade na demonstração de uma resposta diante dos métodos de diagnóstico pouco sensíveis e pelo fato de a mortalidade estar frequentemente associada à progressão da doença sistêmica. Entretanto, o tratamento promove claramente uma paliação efetiva e, em várias situações, um aumento da sobrevida. Cirurgia A cirurgia é utilizada para a inserção de: (1) cateter intraventricular e um reservatório subgaleal para administração de quimioterapia; (2) derivação ventriculoperitoneal em pacientes com hidrocefalia sintomática. Os agentes citotóxicos podem ser administrados no espaço subaracnoide através de uma punção lombar ou por meio de um reservatório intraventricular. Esta última via representa o sistema ideal por ser mais simples, mais confortável para o paciente e mais seguro do que a realização de punções lombares repetidas. A utilização do cateter intraventricular promove uma distribuição mais homogênea da droga no espaço liquórico e níveis mais consistentes no líquido cérebroespinhal. Em cerca de 10% dos pacientes, a droga é administrada no espaço epidural quando injetada através de uma punção lombar, mesmo quando existe retorno do líquor após a introdução da agulha. Existem dois tipos básicos de reservatório: o Rickham Style, que consiste em um reservatório plano colocado sobre o orifício de trepanação, e o reservatório de Ommaya, com a superfície em forma de cúpula, mais fácil de ser palpado. O cateter é posicionado no corno anterior do ventrículo lateral ou próximo do forâmen de Monro através de uma punção ventricular. É fundamental que a ponta do cateter e os orifícios laterais estejam posicionados completamente dentro do ventrículo para evitar a instilação da droga no parênquima cerebral. Quando existe bloqueio do fluxo liquórico, a radioterapia focal deve ser utilizada no sentido de evitar o acúmulo do quimioterápico e a toxicidade excessiva. Radioterapia A radioterapia é utilizada no tratamento da CM: (1) para a paliação de sintomas como a síndrome da cauda equina; (2) para a redução do volume tumoral secundário às metástases cerebrais coexistentes; e (3) para corrigir anormalidades do fluxo liquórico. Pacientes com dor e fraqueza das pernas, bem como alterações dos

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nervos cranianos, devem receber radioterapia craniana ou aplicada somente à base do encéfalo. A radioterapia de doença volumosa deve ser considerada, pois a penetração dos citotóxicos é limitada por uma capacidade de difusão de 2 a 3 mm nos nódulos tumorais. A irradiação de todo o neuroeixo é raramente recomendada em tumores sólidos devido à toxicidade sistêmica. Quimioterapia A quimioterapia é o único tratamento que pode tratar todo o neuroeixo. Ela pode ser administrada no espaço intratecal ou pela via sistêmica. Entretanto, a via intratecal representa a via utilizada por excelência. Três agentes são utilizados rotineiramente: metotrexato, citarabina (incluindo a preparação liposomal) e a trietilenotiofosforamida (tiotepa). Não existe diferença de resposta entre os diversos agentes, e a frequência de sua utilização é variável. Os níveis liquóricos do preparado lipossomal da citarabina podem permanecer por mais de dez dias e a sua utilização pode parecer mais vantajosa. Alguns estudos, entretanto, descrevem uma frequência maior de meningite química associada àquele agente. Infecções liquóricas ocorrem em cerca de 10% dos pacientes e resultam em cefaleia, febre e alterações do nível de consciência. O agente mais frequentemente identificado é o Staphylococcus epidermidis. Alguns autores recomendam a retirada imediata do reservatório e o tratamento da infecção com antibióticos sistêmicos. Mielossupressão pode ocorrer após o uso do metotrexato, e o resgate com ácido folínico é recomendado. A droga pode ser administrada via oral imediatamente após a injeção intratecal, uma vez que ela não penetra no espaço liquórico. A meningite química pode ser tratada com corticosteroides e repouso. O uso combinado de quimioterapia e radioterapia pode resultar em leucoencefalopatia tardia, frequentemente sintomática. Alguns estudos argumentam que a quimioterapia intratecal não contribui significativamente para o controle da doença meníngea quando comparada ao tratamento sistêmico. Entretanto, o tratamento intratecal permanece como a terapia padrão para esses pacientes. A avaliação de resposta, como mencionada, é limitada por uma análise citológica de difícil avaliação. Dos sintomas neurológicos associados à CM, a dor responde de uma forma mais consistente ao tratamento utilizado. Tratamento de suporte O tratamento agressivo deve ser reservado para pacientes com uma estimativa de sobrevida superior a três meses e um estado geral preservado. O tratamento de suporte deve ser oferecido para todos os


pacientes e inclui a utilização de anticonvulsivantes, analgésicos e ansiolíticos, quando necessários. Corticosteroides possuem eficácia limitada no controle de sintomas determinados pela CM. A redução da atenção e a sonolência causadas pela irradiação craniana podem ser tratadas com neuroestimulantes.

Síndromes paraneoplásicas As síndromes neurológicas paraneoplásicas (SNP) representam um grupo de desordens que ocorrem em pacientes portadores de câncer como um efeito remoto da neoplasia. As manifestações não podem ser atribuídas diretamente ao tumor ou às metastases, aos tratamentos utilizados, a infecções associadas, distúrbios vasculares ou da coagulação, bem como anormalidades metabólicas ou déficits nutricionais. As SNP são observadas em 5% dos pacientes portadores de câncer de pulmão de pequenas células, em 15% a 20% dos timomas e em 3% a 10% dos portadores de linfomas e plasmocitomas. Apesar de não frequentes, elas devem ser prontamente reconhecidas, pois antecedem o diagnóstico de câncer em mais de 80% dos pacientes. Podem resultar em morbidade significativa devido à destruição, muitas vezes irreversível, do tecido neural. Algumas apresentações são típicas de SNP, embora não necessariamente diagnósticas. São identificadas neste grupo: síndrome miastênica da Eaton Lambert, degeneração cerebelar subaguda, encefalite límbica, neuronopatia sensorial, opsoclonus-mioclonus, dermatomiosite, síndrome da pessoa rígida, encefalomielite e pseudo-obstrução gastrointestinal. O reconhecimento dessas síndromes pelo clínico é crítico, principalmente para aquele que trabalha nos serviços de emergência, pois a maioria dos pacientes não possui uma neoplasia diagnosticada. A apresentação e o curso da doença podem ser dramáticos quando comparados aos quadros não associados a neoplasias. Por definição, as sín-

Referências bibliográficas 1. Bartels RH, Feuth T, van der Maazen R, Verbeek AL, Kappelle AC, André Grotenhuis J, Leer JW. Development of a model with which to predict the life expectancy of patients with spinal epidural metastasis. Cancer. 2007 Nov 1;110(9):2042-9. 2. Denis F. The three column spine and its significance in the classification of acute thoracolumbar spinal injuries. Spine (Phila Pa 1976). 1983 NovDec;8(8):817-31.

dromes paraneoplásicas neurológicas requerem a identificação de uma neoplasia associada, até cinco anos antecedendo o diagnóstico. Entretanto, na maioria dos pacientes a neoplasia se apresenta em quatro a seis meses. Os exames de imagem devem ser realizados para identificar a neoplasia associada. Embora vários anticorpos associados a antígenos onconeurais tenham sido estudados, apenas alguns foram bem caracterizados, como o anti-Hu (anticorpo antineuronal tipo 1 ou ANNA-1), anti-Yo (anticorpo contra a célula de Purkinje tipo 1) e anti-Ri (ANNA-2). Entretanto, mais de 50% dos pacientes portadores de SNP não possuem anticorpos onconeurais detectáveis. O exame do líquor revela apenas discreta pleocitose, elevação de proteínas e bandas oligoclonais. O exame histopatológico identifica apenas uma infiltração inespecífica de linfócitos T. A RM do cérebro é típicamente normal. Entretanto, nos casos de encefalite límbica pode ser documentada uma alteração característica nos lobos temporais. Alterações mais generalizadas podem ser documentadas nos casos de encefalite límbica. A atrofia cerebelar é um achado tardio nos casos de degeneração cerebelar subaguda. Não existem recomendações terapêuticas formais para as SNP. O tratamento da neoplasia pode ser uma estratégia eficaz para a estabilização do quadro. A terapia imunológica pode ser bem-sucedida nos processos que comprometem o sistema nervoso periférico, a junção neuromuscular e o sistema muscular. Frequentemente são utilizados corticosteroides, imunoglobulina intravenosa ou plasmaférese. Os processos que envolvem o sistema nervoso central são mais refratários ao tratamento, embora existam relatos de resposta aos corticosteroides, bem como de remissões espontâneas. Comumente, apenas o tratamento sintomático das convulsões, das manifestações psiquiátricas e dos distúrbios do movimento é empregado.

3. Sze WM,Shelley MD et al. Palliation of metastatic bone pain:single fraction versus multifraction radiotherapy- a systematic review of randomised trials.Clin oncol (Rcoll Radiol) 2003;15:345-52. 4. Sun H, Nemecek AN.Optimal management of malignant epidural spinal cord compression. Hematol Oncol Clin North Am. 2010 Jun;24(3):537-51. 5. Cole JS, Patchell RA. Metastatic epidural spinal cord compression. Lancet Neurol. 2008 May;7(5):459-66.

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farmácia

Erros de medicação em oncologia

O

ERRO DE MEDICAÇÃO NÃO É UM PROBLEMA

INERENTE À ONCOLOGIA, ASSIM COMO NÃO É

Divulgação

UM TEMA RECENTE NA ÁREA HOSPITALAR OU

Annemeri Livinalli * Coordenadora de farmácia – GRENDACC - SP Contato: annelli@ig.com.br

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ambulatorial. Existe uma preocupação aumentada em relação a esses erros no âmbito da oncologia por causa das consequências do erro com esse tipo de medicamento, que por vezes pode ser fatal. Isso porque os medicamentos antineoplásicos apresentam um baixo índice terapêutico e estreita margem de segurança, tornando-os medicamentos perigosos e exigindo uma atenção aumentada dos profissionais envolvidos no seu processo de prescrição, preparo, dispensação e administração. Embora o tema “erros de medicação” seja amplamente estudado e as bases de dados disponibilizem diversos trabalhos publicados sobre o assunto, não se sabe com exatidão a prevalência de erros de medicação associada com medicamentos antineoplásicos1. Walsh e col. (2009) revisaram os registros de 1.262 consultas de pacientes adultos com câncer e 117 de pacientes pediátricos, que geraram 11.908 medicamentos prescritos (913 medicamentos de uso pediátrico) no ambulatório de três clínicas nos Estados Unidos. Entre os adultos foram identificados 90 erros de medicação, sendo que 55 tinham potencial para causar dano ao paciente. Entre os pacientes pediátricos foram identificados 22 erros de medicação. Desses, 57,1% tinham potencial para causar dano ao paciente. Somente 4% dos erros foram interceptados antes de chegar ao paciente2. Na pesquisa realizada por Gandhi e col. (2005), os autores revisaram 10.112 prescrições de medicamentos de 1.606 pacientes (15% pediátricos) atendidos no ambulatório de oncologia do Dana Farber Cancer Institute. Os autores encontraram uma taxa de erro de 3% nas prescrições de adultos de 3% nas

prescrições pediátricas, incluindo 2% de prescrições com potencial para causar agravo3. O National Coordinating Council on Medication Error Reporting and Prevention (NCCMERP) define erro de medicação como sendo “qualquer evento evitável que pode levar ao uso inapropriado do medicamento ou causar dano ao paciente enquanto o medicamento está sob responsabilidade do profissional da saúde, paciente ou consumidor1”. Tal evento pode estar relacionado à prática profissional, produtos de saúde, procedimentos e sistemas, incluindo a prescrição; comunicação verbal; identificação, embalagem e nomenclatura do produto; composição; dispensação; distribuição; administração; educação; monitoramento; uso1. Embora o erro de medicação possa ocorrer em qualquer área, os medicamentos antineoplásicos e os tratamentos propostos para o câncer por vezes tornam-se demasiadamente complexos, diferenciando-se das demais classes terapêuticas empregadas para o tratamento de outras enfermidades. Por se tratar de medicamentos às vezes empregados para diferentes tipos de câncer, a variação na dose proposta nos protocolos é enorme. Por exemplo, uma dose considerada correta para o metotrexato pode variar de 10 mg a 20.000 mg, representando uma oportunidade potencial para erros4 (Tabela 1).

Causas dos erros de medicação As causas dos erros são sempre multifatoriais e podem estar diretamente relacionadas aos pontos fracos dos elementos envolvidos no sistema desenvolvido, que vão desde a informação relacionada ao paciente até fatores ambientais. Alguns exemplos de causa estão descritos na Tabela 2. Dos exemplos citados na Tabela 2, a similari-


dade de sons e de nomes dos princípios ativos ou nomes comerciais merece destaque. No arsenal terapêutico da oncologia existe uma grande quantidade de nomes comerciais e de nomes de princípio ativo disponíveis. O potencial para que ocorram erros em decorrência de confusão com esses nomes é significante. Contribuem para essas confusões a letra ilegível do prescritor, pouco conhecimento dos nomes dos fármacos, a chegada de novos produtos, embalagens semelhantes5. Erros de medicação por confusão entre os nomes dos fármacos podem acarretar sérias consequências para o paciente. Cada instituição que atende pacientes oncológicos deve avaliar todos os possíveis pares de nomes semelhantes a partir de metodologia apropriada e criar seus mecanismos de prevenção, através do fácil acesso às listas com os nomes semelhantes (Tabela 3) e alterando a localização dos medica-

mentos na prateleira do estoque4. Um método que também auxilia a evitar esse tipo de confusão é o uso de letras maiúsculas destacando parte da palavra, conforme os exemplos da Tabela 34. Em alguns casos, o uso de nomes comerciais também pode representar uma ferramenta de prevenção de erros. Em casos como o da doxorrubicina, que atualmente existe na forma farmacêutica lipossomal e não lipossomal, seguir a regra da prescrição com nome genérico com certeza acarretará risco no momento do cálculo da dose e na etapa da manipulação, visto que a dose varia entre as apresentações, e o fato de apenas a palavra “lipossomal” diferenciá-las pode gerar o equívoco de manipular o cloridrato de doxorrubicina no lugar da doxorrubicina lipossomal4.

Tabela 1 Exemplos de erros de medicação em oncologia4 Medicamento

Erro

Resultado

Carboplatina

Manipulado e administrado dose acima da recomendada em duas crianças

Possível surdez em uma das crianças

Docetaxel e paclitaxel

Dose incorreta. Uma dose de 260 mg de docetaxel foi administrada no lugar de paclitaxel

Paciente morreu cinco dias após o ocorrido (não se sabe se o erro foi a causa da morte)

Vincristina

Administrado intratecal

Relato de várias mortes

Vincristina e vimblastina

Calculada, manipulada e administrada a dose de vimblastina ao invés da vincristina

Paciente morreu

Tabela 2 Exemplos de causas de erros de medicação com antineoplásicos4 Excessiva interrupção no processo de prescrever ou na preparação Distância entre a farmácia e o local de tratamento do paciente, o que inibe a comunicação entre farmácia, enfermagem e equipe médica Falta de qualidade na embalagem e nas etiquetas dos produtos Uso de abreviaturas dos nomes dos fármacos na prescrição Similaridade de sons dos fármacos dentro de uma classe terapêutica Falta de uma cópia adequada da prescrição ou uso de cópia de fax, que pode estar ilegível Falta de conhecimento e/ou experiência profissional Fonte: Guide to the prevention of chemotherapy medication errors4

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Tabela 3 Medicamentos com sons e/ou escrita semelhantes CARBOplatina DAUNOrrubicina SORAFEnibe vimBLASTina Cisplatina Cladribina Epirrubicina Isotretinoina Mitotano Nab paclitaxel

CISplatina DOXOrrubicina SUNITInibe vinCRISTina Oxaliplatina Citarabina Idarrubicina Tretinoina Mitoxantrona Paclitaxel

Fonte: Kovacic L, Chambers C. Look alike, sound alike drugs in oncology. J oncol pharm pract, 17: 104-118, 2011.6

Estratégias para prevenir erros com medicamentos antineoplásicos As consequências dos erros com medicamentos antineoplásicos podem ser graves, irreversíveis e levar à morte. Por essa razão, os serviços que atendem pacientes com câncer devem avaliar continuamente as etapas que envolvem o medicamento até sua chegada ao paciente: prescrição – preparo – dispensação – administração, identificando suas fragilidades e implementando as ferramentas necessárias para, sempre que possível, evitar o erro. Esse é um processo contínuo e que precisa ser avaliado e validado periodicamente. Deve-se estabelecer uma sistemática de trabalho rigorosa, definindo cuidadosamente os procedimentos e as responsabilidades dentro desse fluxo7. Algumas estratégias recomendadas incluem: - Uso da prescrição eletrônica: atualmente existe uma variedade de softwares específicos para serviços de oncologia que permitem o uso do sistema informatizado para prescrever os medicamentos de que o paciente fará uso. Esses sistemas são um mecanismo de segurança, agregando às estratégias de prevenção de erros de medicação uma importante ferramenta. As prescrições informatizadas simplificam o processo da prescrição e eliminam a introdução de erros em etapas como a transcrição e cópias de prescrições manuscritas1. Embora a prescrição informatizada seja uma importante ferramenta para prevenir erros de medicação, nem todos os hospitais e clínicas que atendem pacientes com câncer possuem sistema para esse tipo de prescrição e continuam adeptos da prescrição manuscrita. As razões são diversas: custo do software, incompatibilidade com o sistema já existente, desconhecimento sobre o benefício, entre outros. Na ausência da prescrição informatizada, uma estratégia a ser adotada são as prescrições em forma de formulários pré-preenchidos. Nesse formulário devem constar, além do antineoplásico a ser admi-

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nistrado, o número do ciclo de quimioterapia que o paciente irá receber, idade, peso, altura e superfície corpórea do paciente, resultados de exames que sejam relevantes, hidratação, antieméticos, medicamentos de suporte e outras pré-medicações4. Para a criação dessas prescrições pré-impressas é importante que haja um consenso entre os médicos da equipe, a enfermagem e a farmácia1,4. - Padronização das informações na prescrição: o uso de abreviaturas deve ser banido. Há publicações e recomendações suficientes para reconhecer que o uso de abreviaturas representa um passo na direção do erro. A Joint Commission também reconhece os riscos associados ao uso de abreviatura. Com base nas publicações e nos relatos de erros, o Institute for Safe Medication Practices (ISMP) desenvolveu uma lista de abreviaturas sujeitas a erros. Nesse contexto, os serviços de saúde devem fazer suas próprias listas de abreviaturas “não permitidas” a fim de criar uma ferramenta para evitar que elas sejam utilizadas e eliminar o erro de interpretação da prescrição4. Embora seja um hábito dos prescritores e demais profissionais envolvidos no tratamento do paciente com câncer usar abreviaturas, siglas e até apelidos para descrever os medicamentos antineoplásicos e regimes de tratamento, essa conduta deve ser evitada. Alguns exemplos de siglas que devem ser evitadas: ADR – doxorrubicina MTX – metotrexato VBL – vimblastina - Estabelecer dose limite: nos sistemas de prescrição informatizada é possível incluir a quantidade máxima de um medicamento que pode ser administrado em dose única ou em um determinado intervalo de tempo, incluindo a taxa de administração parenteral e a via de administração1. No momento em que o médico está prescrevendo aparece um alerta na tela do computador informando a dose máxima do medicamento.


O ISMP tem contribuído muito para a prevenção dos erros de medicação na saúde como um todo. Entre as recomendações por eles publicadas, algumas são simples e não requerem grandes estruturas ou mudanças nos serviços4: - Desenvolver e implementar um plano estruturado que evite erros; - Estabelecer uma rotina para dupla checagem de prescrições; - Criar um ambiente seguro com boa iluminação e baixo nível de barulho, minimizar distrações; - Criar ambiente de estoque seguro para os medicamentos, considerando estratégias para separar os medicamentos com nomes ou embalagens que sejam semelhantes; - Continuamente avaliar as tecnologias empregadas e adotar automação para minimizar erros; - Envolver os pacientes no tratamento, oferecendo informação e realizando a reconciliação de medicamentos no momento da internação ou na transferência entre alas. Nesse contexto do desenvolvimento de estratégias e regras que previnam os erros de medicação, a indústria farmacêutica também exerce um papel fundamental. Na diretriz publicada pela Sociedade Americana de Farmacêuticos Hospitalares (ASHP), em 2002, a respeito da prevenção de erros de medicação com antineoplásicos, há um tópico de recomendações aos fabricantes e agências reguladoras dividindo com eles essa responsabilidade que assumimos nos serviços de saúde1. A ASHP considera que é responsabilidade do fabricante o desenvolvimento de embalagens e rótulos adequados, pois muitas vezes são eles que

contribuem com os erros. É importante que o fabricante se preocupe com a escolha do nome do produto, com as características da embalagem e do rótulo, evitando nomes semelhantes que possam causar erros (ex: cisplatina e carboplatina; daunorrubicina e doxorrubicina). A diferenciação na cor da embalagem de diversos produtos de um mesmo fabricante e destaques que chamem a atenção para diferenciar mesmos fármacos em apresentações distintas também são aspectos importantes a que os fabricantes de medicamentos antineoplásicos precisam estar atentos1. Sempre que uma indústria farmacêutica alterar algo no produto, essa alteração deve ser amplamente divulgada aos prescritores, farmacêuticos, enfermeiros e outros profissionais da saúde envolvidos no processo1.

Considerações finais Cada profissional tem responsabilidade no tratamento do paciente e na prevenção dos erros. A implementação de normas institucionais que regulamentem o serviço agrega maior clareza dessas responsabilidades e identificação das etapas de fragilidade. Trabalhar com a prevenção é a melhor ferramenta, e o seu desenvolvimento requer o reconhecimento de todo o processo envolvido no tratamento do paciente. O farmacêutico deve participar ativamente em todos os aspectos de cuidados relacionados ao tratamento do câncer, incluindo o desenvolvimento de regras para segurança e uso apropriado do medicamento, tanto na área de armazenamento quanto nas áreas por onde o medicamento passará, independentemente de ser na forma física ou escrita na prescrição.

“As consequências dos erros com medicamentos antineoplásicos podem ser graves, irreversíveis e levar à morte”

Referências bibliográficas: 1. ASHP guideline on preventing medication errors with antineoplastic agents. ASHP council on professional affairs. Am J Health-Syst Pharm, 59: 1648-68, 2002. 2. Walsh KE et al. Medication errors among adults and children with cancer in the outpatient setting. J Clin Oncol, 27 (6):891-896, 2009. 3. Gandhi STK et al. Medication safety in the ambulatory chemotherapy setting. Cancer, 104 (11): 2477-83, 2005. 4. Kloth DD. Guide to the prevention of chemotherapy medication errors. Mc Mahon, NY. 2ed, 2010. 5. The joint comission. Sentinel event alert: look-alike, sound-alike drug names, maio, 2011. 6. Kovacic L, Chambers C. Look alike, sound alike drugs in oncology. J oncol pharm pract, 17: 104-118, 2011. 7. Grupo español para el desarrollo de la farmacia oncologica. Documento de consenso para la prevención de errors de medicación em quimioterapia. Fev, 2001.

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bioética

Bioética na prática médica Introdução

A

BIOÉTICA SURGIU NA METADE DOS ANOS

1980

NO BRASIL, CONSIDERADA COMO UMA BIOÉTICA TARDIA NO CONTEXTO MUNDIAL. MESMO ASSIM,

Divulgação

vem assumindo uma importância progressiva dentro das principais sociedades médicas. Na oncologia ela está intimamente ligada às decisões à beira do leito, à pesquisa clínica e, particularmente, às questões relacionadas ao manejo dos pacientes terminais. De acordo com Reich, a bioética é o estudo sistemático das dimensões morais – incluindo a visão moral, as decisões, a conduta e as linhas que guiam – das ciências da vida e da saúde, com o emprego de uma variedade de metodologias éticas e uma impostação interdisciplinar. No âmbito médico, deve ser considerada como um instrumento para a tomada de decisões, que tem na interdisciplinaridade a sua característica mais importante. Sendo assim, os domínios da ética médica e da deontologia hoje interagem intimamente com a oncologia para a resolução de conflitos na pesquisa, nas decisões de saúde pública e na prática clínica. A bioética representa um dos campos mais emergentes e dinâmicos da reflexão filosófica aplicada à prática profissional. Neste ensaio, abordaremos sua aplicação na pesquisa clínica e nos cuidados do paciente terminal em oncologia.

Pesquisa clínica Cícero Urban * Cirurgião oncológico e mastologista, professor de bioética e de metodologia científica no curso de medicina e no mestrado em biotecnologia da Universidade Positivo em Curitiba Contato: cicerourban@hotmail.com

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Em 2001, uma jovem saudável de 24 anos, voluntária em um estudo clínico de fase I na Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, foi a óbito devido à falência de múltiplos órgãos. O estudo tinha como objetivo melhorar os conhecimentos da fisiopatologia da asma brônquica, empregando um fármaco chamado hexamethonium, e verificar os seus efeitos na função respiratória em indivíduos saudáveis.

Em resposta a esse incidente, o governo norteamericano suspendeu todas as verbas federais para as pesquisas que estavam em andamento naquela instituição, o que correspondia a cerca de US$ 305 milhões e envolvia 2,5 mil protocolos e aproximadamente 50 mil voluntários. A suspensão não foi determinada pela morte da jovem, mas por uma série de irregularidades encontradas no protocolo de pesquisa. Entre as mais importantes estava o fato de o pesquisador responsável pelo estudo não ter reportado ao Comitê de Ética em Pesquisa da instituição os efeitos colaterais de um primeiro voluntário saudável, que teve seus sintomas interpretados como relacionados a um quadro viral. Além disso, não foram revistos estudos prévios que relatavam a toxicidade pulmonar do fármaco em questão. E o pior, expôs-se o segundo voluntário – a jovem de 24 anos – antes mesmo que se resolvessem os sintomas do primeiro. O Brasil vem apresentando um aumento no número de estudos clínicos de grande porte patrocinados pela indústria farmacêutica, em colaboração com vários centros internacionais e envolvendo grande número de pacientes, sobretudo na oncologia. Esse crescimento exige que o sistema de controle institucional seja rigoroso e efetivo – não no sentido de barrar as pesquisas e o progresso necessário no combate às doenças, mas direcionado à proteção dos pacientes e voluntários participantes de pesquisa, cuidando para que sejam respeitadas as normas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Essa resolução, apesar de algumas falhas e da necessidade de revisão (já em andamento, já que a resolução encontra-se em seu 16o ano), contribuiu para a melhoria e a respeitabilidade da pesquisa clínica no Brasil pelos seus méritos de exigências éticas. Vale lembrar que os riscos são inerentes a qual-


quer tipo de experimentação em seres humanos e é necessário respeitar os pilares bioéticos de sustentação da pesquisa clínica: beneficência, não maleficência, autonomia e justiça. Para isso existem procedimentos técnicos importantes para a minimização desses riscos: cálculos metodológicos rigorosos; seleção adequada dos participantes; seguimento clínico dos participantes com possibilidade de intervenção de emergência; rede de comunicação eficaz entre participantes e grupos de pesquisa; boa capacidade de controle social da pesquisa pela comunidade em que ela se realiza; e revisão por comitê de ética em pesquisa independente. Um dos importantes fundamentos bioéticos das normativas para as pesquisas em seres humanos está na expectativa de que o conhecimento e os avanços gerados por ela, idealmente, levem ao bem-estar de toda a humanidade. Assim, o imperativo moral nas pesquisas em seres humanos é o respeito pela dignidade humana. Aqui, dois componentes fundamentais precisam ser destacados. O primeiro é a seleção dos sujeitos da pesquisa com fins moralmente aceitáveis em termos de benefícios, tanto para esses sujeitos como para outros grupos e para o avanço do conhecimento científico. O segundo é o emprego de meios moralmente aceitáveis para atingir esses mesmos fins. O ponto-chave na objeção moral de uma pesquisa é utilizar o ser humano apenas como meio para legitimar os fins. É inaceitável tratar pessoas como meio, objeto ou coisa. Agir dessa forma fere o respeito à dignidade inata do homem, empobrece a profissão médica e a ciência. Os riscos em cada pesquisa devem ser interpretados a partir do princípio ético da não maleficência, ou seja, o dever de prevenir ou minimizar os danos aos sujeitos da pesquisa, que não poderão ser submetidos a riscos desnecessários. Além disso, a pesquisa em seres humanos deve trazer benefícios ao avanço do conhecimento científico, à sociedade como um todo, mas também aos seus próprios sujeitos. Todos os pacientes com câncer envolvidos em pesquisas deverão também receber os benefícios dessa mesma pesquisa. O professor Umberto Veronesi defende que “si cura meglio dove si fà ricerca”, ou seja, se tratam

Figura 1: “O Médico”, de Sir Samuel Luke Fieldes, 1891

melhor os pacientes onde se faz pesquisa. É preciso, portanto, que esse princípio seja respeitado e defendido pelos membros das comissões de ética em pesquisa e também pelos próprios pesquisadores e patrocinadores envolvidos. Nesse sentido, a condução das pesquisas precisa centrar-se na pessoa do paciente com câncer. O pesquisador e os pesquisados nem sempre compreendem e respondem da mesma forma à aplicação das informações contidas dentro do processo de consentimento livre e esclarecido. As expectativas, os interesses e as esperanças dos pacientes na pesquisa científica algumas vezes são desproporcionais aos seus reais benefícios. Para que o processo do consentimento livre e esclarecido se estabeleça com todo o seu potencial, a transmissão da informação precisa ser tecnicamente adequada, individualizada e com linguagem compreensível. Dessa forma, cria-se um interessante relacionamento de vínculo e colaboração entre pesquisador e pesquisado, que pode ser de grande valor para o progresso da ciência e para a sua maior humanização. No caso da oncologia, é preciso salientar a vulnerabilidade que existe em pacientes com diagnóstico de doença grave e potencialmente mutilante. São pacientes que necessitam de atenção adicional em relação ao processo de tomada do consentimento livre e esclarecido e ao respeito à sua autonomia. Os princípios éticos que guiam as pesquisas envolvendo seres humanos em todo o mundo são inspirados principalmente na Declaração de Helsinque. No Brasil, a Resolução 196/96 considera, não obstante os riscos potenciais que existem em todas as pesquisas, que elas possam ser realizadas desde que sejam cientificamente embasadas, que os riscos sejam justificados pela importância dos benefícios esperados e que estes sejam maiores (ou no mínimo iguais) que as alternativas já estabelecidas para prevenção, diagnóstico ou tratamento. As pesquisas sem benefícios diretos aos indivíduos devem prever condições de ser bem suportadas por eles, e o pesquisador responsável é obrigado a suspendê-las imediatamente ao perceber riscos ou danos não previstos previamente no protocolo. A resolução também prevê a responsabilidade do pesquisador, do patrocinador e da instituição em dar assistência integral aos participantes da pesquisa e indenização no caso de dano. No Brasil, infelizmente, ainda existem claras dificuldades adicionais, se compararmos à realidade existente nos países desenvolvidos. Porém discordamos, em parte, quando alguns pesquisadores e representantes da indústria farmacêutica colocam que a burocracia e as dificuldades existentes no Brasil, como a impossibilidade de pagamento de voluntários para as pesquisas, são responsáveis pelo atraso em que nos encontramos em relação ao desenvolvimento de novos fármacos. Em primeiro lugar, a nossa população é mais vulnerável do que a americana e a europeia. O pagamento para voluntários não resolveria o atraso tecnológico, pois não é a falta de estudos de fase I que torna nossa capacidade subutilizada, mas a falta de incentivos e de tecnologia necessários ao desenvolvimento de novos fármacos. Nesse sentido, a Onco& março/abril 2012

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ausência de estudos de fase I é consequência, e não causa, desse fenômeno. Em um país como o nosso, o pagamento para voluntários pode gerar participantes “profissionais” de pesquisa. Além disso, parte da chamada “burocracia” que atrasa o início das pesquisas no nosso meio pode ser melhorada, sim, mas não se deve descuidar da proteção aos mais vulneráveis, pois a população que tem participado dos ensaios clínicos pertence, em sua maioria, às classes socioeconômicas assistidas pelo sistema público de saúde. Também não se pode esquecer das grandes diferenças regionais de um país com as dimensões do Brasil.

Paciente terminal O câncer em fase avançada obriga o médico a se defrontar com o momento mais difícil e delicado da vida do paciente e da sua família (Figura 1). Em muitos países, grande parte dos cuidados dos pacientes terminais ainda tem sido realizada dentro dos hospitais. Nos Estados Unidos, apesar de a maioria dos pacientes passar os últimos meses ou anos de suas vidas em casa, aos cuidados de seus familiares, habitualmente eles não morrem em casa e os médicos estão mais diretamente envolvidos nas decisões sobre o final da vida dos seus pacientes do que em qualquer outra época da medicina. O crescimento do número de pacientes em fase terminal nos hospitais, entretanto, não foi acompanhado do melhor preparo dos médicos para trabalhar nessa área. Lamentavelmente, o domínio do modelo flexneriano na formação médica, mesmo que sem essa intenção, acabou por direcioná-la para o tratamento da doença, independentemente dos cuidados à pessoa e do alívio da dor e do sofrimento. A superespecialização gerou o profissional com conhecimentos limitados do todo. Esses fatores diminuíram a importância do papel terapêutico do relacionamento médico-paciente, característico da medicina hipocrática, e promoveram a supervalorização dos procedimentos diagnósticos e terapêuticos, contrastes da chamada medicina tecnicista, em que o médico quase não escuta ou toca mais os seus doentes. A busca dos doentes por métodos alternativos, não consagrados pela medicina tradicional, em alguma fase de seu tratamento reflete essa lacuna. Os debates bioéticos sobre a eutanásia e o suicídio assistido, apesar de encontrarem grande apelo na sociedade globalizada, têm pouca relevância do ponto de vista epidemiológico no Brasil. São raros os pacientes ou familiares de pacientes que desejariam realizá-los na prática, caso esses procedimentos fossem permitidos. Além disso, ainda não é consenso entre os oncologistas que com eles se possam melhorar os cuidados no final da vida. Emanuel e colaboradores, em um estudo envolvendo 3.299 membros da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), encontraram que a eutanásia e o suicídio assistido de pacientes terminais com dor intratável teve apoio de apenas 22,5% dos entrevistados. Entre os médicos participantes da pesquisa, 3,7% já haviam realizado

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eutanásia e 10,8% suicídio assistido. Os entrevistados também consideram que os pedidos de eutanásia e de suicídio assistido diminuem com a melhoria dos cuidados paliativos. Encontramos resultados semelhantes numa pesquisa com oncologistas no estado do Paraná, em 2005. A obstinação terapêutica (ou futilidade terapêutica) talvez seja o maior problema bioético dos pacientes terminais na realidade brasileira. É considerada como o emprego ou a manutenção de procedimentos diagnósticos ou terapêuticos sem que exista eficácia comprovada para uma evolução positiva e melhoramento das condições dos pacientes, seja em termos de sobrevida ou de qualidade de vida. Os conflitos relacionados a ela são geralmente resultantes de interpretações errôneas sobre a situação real do paciente, e da atenção insuficiente aos problemas físicos, emocionais ou espirituais, tanto do paciente quanto de seus familiares. Além disso, todos esses fatos também estão habitualmente ligados ao processo de comunicação inadequado e ao relacionamento insatisfatório entre as partes envolvidas. Segundo a linha seguida pela Universidade da Pensilvânia, a intervenção médica pode ser considerada como fútil se ela não responde a três questões fundamentais: • Questão 1: O tratamento restabelecerá, manterá ou melhorará a vida biológica? (Futilidade Biológica) • Questão 2: O tratamento restabelecerá, manterá ou melhorará a vida cognitiva? (Futilidade Cognitiva) • Questão 3: O tratamento restabelecerá, manterá ou melhorará a vida desejada pelo paciente? (Futilidade de Vida Desejada) Existem situações na prática clínica em que os pacientes ou seus familiares solicitam que seja feito todo o possível para prolongar a vida, mesmo que o paciente esteja em fase terminal e com grande sofrimento. Infelizmente, isso ocorre com certa frequência nos hospitais, em especial no Brasil. Em sua maioria, são pacientes e familiares para os quais não houve o preparo prévio adequado para a fase terminal. Não se discutiu, muitas vezes, sobre o manejo cientifica e humanamente esperados para essa fase. Além disso, a falta da regulamentação da ortotanásia traz uma preocupação adicional: a possibilidade de condenação do médico por homicídio. Para muitos, então, é melhor, no jargão médico, “pecar por excesso”. Infelizmente, o excesso pode em muitos casos aumentar a dor e o sofrimento. O documento da V Assembleia da Pontifícia Academia Pro Vita, publicado no Vaticano em 1999, em relação aos cuidados do paciente terminal, assinalou em suas conclusões finais: “Quando o médico de-


terminar que não existem meios possíveis para impedir a morte de um paciente, que o único resultado da aplicação de terapias avançadas é a adição de sofrimento ao sofrimento, ele precisa reconhecer os limites da medicina e da sua intervenção pessoal, aceitando a inevitabilidade da morte. O respeito à pessoa que está morrendo, neste ponto, é o mais importante. O trabalho do médico e dos profissionais de saúde continuará, atendendo e cuidando da aplicação de tratamentos proporcionais e cuidados paliativos”. Assim, os médicos têm a responsabilidade ética, baseada nos princípios de beneficência e de não maleficência, de não submeter os pacientes a tratamentos considerados desproporcionais. Estabelecer para cada caso individual os limites entre o que é ético e cientificamente adequado e o que é desproporcional e agride a dignidade do paciente e de seus familiares. Deve-se salientar, contudo, que os cuidados básicos com o paciente devem ser mantidos. Hidratar, alimentar, tratar a dor e outros sintomas associados, cuidar da parte psicológica e espiritual do paciente e da família continuam elementos fundamentais no manejo desses pacientes. Fazem parte dos cuidados paliativos e do próprio conceito de ortotanásia no modelo proposto para o Brasil. Também devem ser colocados os benefícios potenciais do não uso de vagas em unidades de terapia intensiva (UTI) por pacientes que não têm indicação clínica, e mesmo da diminuição de gastos desnecessários com tratamentos inadequados e ineficientes, que podem até mesmo agredir o paciente. Em sistemas de saúde carentes de recursos financeiros, e em algumas regiões com número insuficiente de vagas nas UTIs, isso deve ser considerado como algo importante. Pacientes terminais não se beneficiam do ambiente das UTIs. Ao contrário, essa instrumentalização da morte é, na maioria das vezes, deletéria e contribui para um aumento desnecessário do sofrimento. Porém, entre os benefícios potenciais mais importantes que podem ser alcançados para a sociedade, destaca-se o de tornar o conceito de proporcionalidade terapêutica cada vez mais claro aos profissionais de saúde, aos pacientes e seus fa-

miliares. A complexidade de cada caso individual e a aplicação do conhecimento ético e científico podem servir como aprendizado contínuo nesse sentido, visando a progressiva melhora nos cuidados dos pacientes terminais. Um estímulo ao desenvolvimento de uma das áreas mais importantes da medicina e, infelizmente, ainda pouco valorizada no nosso meio: a dos cuidados paliativos. A regulamentação da ortotanásia, com a vigência do novo Código de Ética Médica, exigirá dos médicos, pacientes e da sociedade como um todo um trabalho conjunto para os benefícios dos cuidados integrais com o paciente terminal. Comunicação adequada, critérios científicos rigorosos e, quando for necessária, a intervenção jurídica para evitar que ocorram agressões aos valores éticos dentro da nossa sociedade. Vislumbrar a transcendência do homem em todas as fases da vida, evitando-se ao máximo as decisões que o agridam em sua dignidade – esse sim deve ser o critério universal utilizado como base para as decisões médicas na fase final da vida. A formação médica deve contemplar também os cuidados na fase terminal, de maneira integral e com foco multidisciplinar. Além disso, a formação bioética pode auxiliar nas decisões sobre limitações e retirada de tratamentos oncológicos de alto custo e com efeitos adversos importantes, quando existem poucas perspectivas de melhora para a sobrevida e para a qualidade de vida dos pacientes oncológicos.

Conclusões e perspectivas A bioética tem caminhado junto com o desenvolvimento da biotecnologia e seus dilemas, que vão muito além do debate técnico-científico. Na oncologia, assim como em outras especialidades médicas, existe uma necessidade categórica de inseri-la nos programas de formação do especialista. O médico, independentemente de sua especialidade, deve ter, além da competência científica, a competência ética. A humildade de reconhecer o seu papel e seus limites: cuidar, mais do que curar. Essa é a virtude mais importante que pode ser cultivada com o auxílio da bioética. Re-humanizar a medicina, ou seja, trazê-la de volta para casa.

“Os médicos têm a responsabilidade ética de não submeter os pacientes a tratamentos considerados desproporcionais”

Leitura sugerida: * Urban CA (org). Bioética Clínica. Rio de Janeiro, Reviter, 2003.

* Ravitzki V, Fiester A, Caplan A (org). The Penn Center Guide to Bioethics. New York, Springer, 2009.

* Jonsen A, Siegler M, Winslade WJ. Clinical Ethics: a practical approach to ethical decisions in Clinical Medicine. New York, McGraw Hill, 2010

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mama

Divulgação

Oncoplastia/Reconstrução Mamária

D

ESDE A DESCRIÇÃO CLÁSSICA DE MASTECTOMIA

RADICAL POR

WILLIAM HALSTED

EM

1894,

O

TRATAMENTO CIRÚRGICO DO CÂNCER DE MAMA

Vilmar Marques Oliveira * Professor doutor assistente da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; chefe da Clínica de Mastologia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; membro do Grupo Especializado em Mastologia e Oncoplastia Mamária (GEMOM); 1o Secretário da Sociedade Brasileira de Mastologia Regional São Paulo; presidente do Departamento de Oncoplástica da SBM Contato: vilmarmarques@uol.com.nbr

Fábio Bagnoli * Professor instrutor e mestre da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; médico assistente da Clínica de Mastologia do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo; pós-graduando nível doutorado da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; membro do Grupo Especializado em Mastologia e Oncoplastia Mamária (GEMOM); membro do Instituto Brasileiro de Mastologia e Ginecologia (IBMG); membro do Departamento de Oncoplástica da SBM Contato: fbagnoli@uol.com.br

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apresentou inúmeras variações e modificações. Entre elas podem-se citar: mastectomias radicais modificadas (Patey, 1948 e Madden, 1952); cirurgia conservadora clássica ou quadrantectomia (Umberto Veronesi, 1986 e Bernard Fisher, 1989); mastectomias preservadoras de pele ou de pele e mamilo (Freeman, 1962); pesquisa do linfonodo sentinela (Giuliano, 1994); reconstrução mamária e a associação de cirurgia oncológica a técnicas de cirurgia plástica. Com o advento da cirurgia conservadora para o tratamento do câncer de mama, estabelecida no final da década de 1970, um novo paradigma cirúrgico veio à tona aos cirurgiões: ser cirurgicamente radical não era mais sinônimo de melhor tratamento. Assim, cada vez mais se procurou por terapias mais conservadoras que pudessem preservar a mama, mantendo dessa forma a autoestima e qualidade de vida das pacientes. A cirurgia oncoplástica e reconstrutiva mamária tem como objetivo não só propiciar ótimo resultado cirúrgico no tratamento do câncer de mama mas também trazer qualidade de vida às pacientes. Ela se fundamenta em dois princípios básicos: replacement, em que a correção do defeito promovido pelo volume tecidual removido só é possível por meio de retalhos locorregionais ou à distância; e displacement, no qual se utiliza o tecido mamário residual para remodelar a mama. Neste último, o volume excisado irá determinar a melhor abordagem a ser adotada. De forma geral, quando as ressecções são superiores a 10% do volume mamário nos quadrantes mediais e a 20% nos quadrantes laterais, alguma técnica oncoplástica deve ser adotada para prevenir deformidade. A oncoplastia (displacement) integra técnicas de cirurgias plásticas estéticas ao tratamento oncológico. Dessa forma, os objetivos principais da

cirurgia oncoplástica consistem em alcançar reposicionamento seguro e adequado do complexo areolomamilar, correção adequada da hipertrofia e ptose mamária, remodelamento do parênquima proporcionando aspecto natural ao cone mamário, confiabilidade no tratamento oncológico e baixos índices de complicações. A cirurgia oncológica associada a técnicas de mamoplastia adiciona segurança ao tratamento conservador por permitir maior ressecção de tecido mamário, com margens livres de neoplasia mais amplas. O pré-requisito essencial para o uso das técnicas de mamoplastia é o volume remanescente suficiente para a sua própria reparação, ou seja, mama doadora. Considera-se oportuna a abordagem da mama contralateral empregando-se a simetrização. A utilização de determinada técnica vai depender da localização do tumor. O princípio primordial é ressecar a área acometida pelo tumor e manter a irrigação do complexo areolomamilar viável e, com o tecido mamário remanescente, fazer o remodelamento mamário. No decorrer da história, foram vários os autores de importância na descrição de mamoplastias redutoras, entre eles Biesenberger (1928), Strombeck (1960) e Pitanguy (1961). A partir da segunda metade do século 20, os pedículos vasculares dos retalhos areolados da mama passaram a ser utilizados das formas mais variadas possíveis. Strombeck descreveu o retalho cutâneo horizontal bipediculado; McKissock, o retalho bipediculado vertical; Jurado idealizou o retalho de pedículo inferior, publicado posteriormente por Courtiss e Goldwyn. Em 1975, em nosso meio, foi publicada pelo cirurgião plástico Liacyr Ribeiro uma nova técnica de mamoplastia redutora. Diferentemente das técnicas até então empregadas, em que se preservavam os quadrantes superiores e ressecavam-se os inferiores, nessa técnica a área de tecido mamário a ser ressecada era dos quadrantes superiores, e a preser-


vação de tecido mamário dos quadrantes inferiores era responsável pela montagem da mama e, principalmente, pela preservação da quinta e da sexta artérias intercostais e do plexo subdérmico ali localizados, garantindo assim a irrigação do complexo areolomamilar. Tais procedimentos eram realizados seguindo o padrão de excisão cutânea descrito por Wise, e posteriormente por Pitanguy, que deixavam cicatrizes em T invertido. Com o intuito de retirar a incisão do sulco submamário medial e fornecer maior projeção desses quadrantes, alguns autores propuseram a mamoplastia em L, entre eles Peixoto, Lassus, Marchac e Lejour. Benelli, em sua técnica periareolar, introduziu nova forma de abordagem, o round block, com o objetivo de reduzir alargamentos da aréola, mesmo com grandes ressecções de pele. Dessa forma, aliandose os princípios de cirurgia oncológica conservadora às técnicas de mamoplastia, surgiu a oncoplastia mamária (displacement). Krishna Clough, em estudo publicado em 2003 com 101 casos de pacientes submetidas a tratamento oncoplástico, com ressecção tecidual média de 222 gramas, concluiu que a oncoplastia permite ressecções extensas com resultados estéticos favoráveis e segurança oncológica, ampliando a indicação de cirurgia conservadora. Em 2005, o grupo do Instituto Europeu de Oncologia publicou estudo comparativo entre a quadrantectomia e a cirurgia oncoplástica, mostrando que esta última proporcionava volumes ressecados maiores, tumores mais distantes das margens e maior número de margens livres, concluindo que a cirurgia oncoplástica determina uma maior acurácia na ressecção tumoral que a quadrantectomia e que essa abordagem pode ser útil para a ampliação da indicação da cirurgia conservadora. Paralelamente ao tratamento cirúrgico oncológico radical propriamente dito, ou mastectomia radical, surgiu a reconstrução mamária, que a princípio tinha como objetivo primordial o fechamento da área anteriormente ocupada pela mama, sem preocupação com o resultado estético. Com o passar dos anos, a reconstrução mamária passou a ter o objetivo de dar à paciente algo mais próximo de uma mama.

A história da reconstrução mamária inicia-se em 1906, com a rotação do músculo grande dorsal descrita por Tanzini. Sessenta anos depois foram utilizadas as primeiras próteses de silicone gel, porém os resultados estéticos foram insatisfatórios. A utilização de expansor de pele proporcionou resultados mais favoráveis, como descrito por Randovan em 1978. Em 1962, nos Estados Unidos, Freeman publicou uma nova técnica de mastectomia seguida de reconstrução imediata com prótese. Nessa técnica preservava-se a pele, porém removia-se o complexo areolomamilar (CAM). Fundada em princípios antigos com escassas evidências clínicas, a adenectomia profilática passou a ser realizada em casos seletos e incluía a remoção do CAM. Com a demonstração de que o acometimento do CAM por uma neoplasia em pacientes de risco era raro, e com a melhoria das técnicas de reconstrução, esse procedimento passou a ser mais amplamente explorado como método de redução de risco. Recentemente, com os resultados positivos dos trabalhos de mastectomia com preservação de pele (skin sparing mastectomy), nos quais a literatura é consistente em demonstrar que não existe diferença significante na sobrevida global, sobrevida livre de doença e recidiva locorregional entre esta e a mastectomia radical, um passo adiante foi dado e alguns autores começaram a propor, além da preservação da pele, a preservação também do CAM. Atualmente muitos centros vêm realizando a adenectomia dentro de protocolos de pesquisa ou até mesmo na prática diária. Garcia e col., em uma revisão da literatura com 1.826 casos de adenectomia para câncer, mostrou apenas três casos de recidiva local no CAM. Os eventos desfavoráveis relacionados à manutenção do CAM foram de 0,18%. Um dos importantes avanços nos resultados estéticos da reconstrução mamária foi o retalho musculocutâneo do reto abdominal descrito por Hartrampf em 1980. No Brasil, na década de 1970, iniciou-se a reconstrução imediata, a princípio realizada por Baroudi, com rotação de retalho cutâneo-adiposo abdominal para cobertura de áreas de mastectomias para grandes tumores. De-

“A oncoplastia determina maior acurácia na ressecção tumoral e pode ampliar a indicação da cirurgia conservadora”

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“Muitos estudos documentaram os benefícios psicológicos, sociais, emocionais e funcionais da reconstrução mamária”

pois, passaram-se a utilizar próteses de silicone sob o retalho e, dessa forma, surgiram as primeiras reconstruções mamárias imediatas, por Pinotti e seu grupo, com pioneirismo internacional. Em 1976, Pinotti e seu grupo passaram a utilizar o retalho musculocutâneo do grande dorsal e, a seguir, o retalho musculocutâneo do retoabdominal. Assim, aliando-se tratamento oncológico satisfatório com bons resultados estéticos, a reconstrução mamária passou a ser praticada com frequência, de forma imediata ou tardia. Com a prática da reconstrução mamária, algumas sequelas psicossociais causadas às mulheres submetidas à mastectomia, como depressão, baixa autoestima, pertubações nas atividades sociais e profissionais, puderam ser amenizadas. Passados mais de 30 anos, muitos estudos documentaram os benefícios psicológicos, sociais, emocionais e funcionais das reconstruções mamárias, entre eles melhora da saúde psicológica, da autoestima, da sexualidade, da imagem corporal e redução da preocupação com a recidiva do câncer. A literatura fornece fortes bases de que a reconstrução mamária pós-mastectomia será um dos fatores determinantes da saúde a longo prazo e do bem-estar das pacientes com câncer de mama. Um grande dilema presente no momento de se indicar a reconstrução mamária imediata ou tardia é em relação à necessidade de radioterapia pós-mastectomia. Nos últimos 20 anos, a segurança e a eficácia da reconstrução imediata foram comprovadas por inúmeros estudos, mostrando que a recorrência da

doença e a sobrevida não estavam comprometidas, uma vez que as técnicas para monitorar e detectar recidivas locais estavam mantidas. Brenelli (1944) avaliou 306 pacientes com câncer de mama estádio I, II e IIIA divididas em dois grupos de 153 pacientes cada, sendo que em um deles as pacientes foram submetidas a mastectomia e reconstrução imediata e, no outro, apenas mastectomia. Observou-se que não houve diferenças estatísticas em relação à sobrevida global e à recidiva local da doença. Esses resultados também foram comprovados por Huang et al em estudo que comparou pacientes tratadas por mastectomia e radioterapia complementar, sendo 82 casos com reconstrução imediata e 109 sem reconstrução. Resultados semelhantes foram obtidos por Patel et al em estudo com seguimento de dez anos. Com base nesses estudos, entre outros, há uma tendência de grupos de mastologistas, cirurgiões plásticos e cirurgiões oncoplásticos em defender a reconstrução imediata pós-mastectomia, salvando as devidas contraindicações absolutas, uma vez que, além de não interferir no tratamento e no prognóstico oncológico, favorece o melhor resultado estético final, mesmo com algumas complicações que podem surgir após a radioterapia, como esteatonecrose, endurecimento e diminuição de volume dos retalhos – no caso dos tecidos autólogos – e assimetria e contratura – no caso das próteses –, que são menos frequentes nos dias atuais graças à moderna radioterapia conformacional com intensidade modulada de dose e ao próprio aprimoramento da técnica reconstrutiva com a cobertura total

A Fotos A e B: Marcação para realização de cirurgia oncoplástica conservadora

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do implante por tecido muscular. Independentemente de qual profissional realizará o tratamento cirúrgico do câncer de mama, seja o mastologista em parceria com o cirurgião plástico, seja o cirurgião oncoplástico, o importante é que os profissionais que tratam essa doença tenham em mente o

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princípio da cirurgia oncoplástica, oferecendo o melhor tratamento para suas pacientes, a fim de que elas, já abaladas psicologicamente pela doença, tenham seu estado emocional menos comprometido graças a um tratamento cirúrgico que ofereça o menor grau de comprometimento físico e estético.

Foto C: Área ressecada (quadrantes superiores) Foto D: Pedículo inferior areolado confeccionado para remodelar a mama

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Leitura recomendada: 1. Ribeiro L. A new technique for reduction mammoplasty. Plast and Reconstr Surg 1975 , 55(3):330-34. 2. Clough KB et al. Oncoplastic techniques allow extensive resections for breastconserving therapy of breast carcinomas. Ann Surg 2003; 237(1):26-34. 3. Pitanguy I. Surgical treatment of breast hypertrophy. Br J Plast Surg. 1967;20(1):78-85. 4. Munhoz AM et al. Assessment of immediate conservative breast surgery reconstruction: a classification system of defects revisited and an algorithm for selecting the appropriate technique. PlastReconstr Surg. 2008 Mar;121(3):716-27. 5. Chung AP, Sacchini V. Nipple-sparing mastectomy: where are we now? Surg Oncol. 2008 Dec;17(4):261-6. Epub 2008 May 5. Review. 6. Garcia-Etienne CA, Cody Iii HS 3rd, Disa JJ, Cordeiro P, Sacchini V. Nipplesparing mastectomy: initial experience at the Memorial Sloan-Kettering Cancer Center and a comprehensive review of literature. Breast J. 2009 Jul-Aug;15(4):440-9. 7. Petit JY, Veronesi U, Orecchia R, Rey P, Martella S, Didier F, Viale G, Veronesi P, Luini A, Galimberti V, Bedolis R, Rietjens M, Garusi C, De Lorenzi F, Bosco R, Manconi A, Ivaldi GB, Youssef O. Nipple sparing mastectomy with nipple areola

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Foto E: Foto pré-operatória de oncoplastia Foto F: Foto pós-operatória do mesmo caso

intraoperative radiotherapy: one thousand and one cases of a five years experience at the European institute of oncology of Milan (EIO). Breast Cancer Res Treat. 2009 Jan 17. 8. Noone RB, Frazier TB, Noone GC et al. Recurrence of breast carcinomafollowing immediate reconstruction: a 13-year review. Plast Reconstr Surg.1994;93:96-106. 9. Brenelli HB. Influência da reconstrução mamária imediata com retalho miocutâneo abdominal no prognóstico e na qualidade de vida. Tese de doutorado da Universidade de Campinas, Brasil, 1994. 10. Huang CJ, Hou MF, Lin SD et al. Comparison of local recurrence and distant metastases between breast cancer patients after postmastectomy radiotherapy with and without TRAM flap reconstruction. Plast Reconstr Surg 2006; 118:1079-86. 11. Hartrampf C, Scheflan M, Black PW. Breast reconstruction with a transverse abdominal island flap. Plast Reconstr Surg 1982;69:216-25. 12. Barouidi R, Pinotti JA, Keppke EM. A transverse thoracoabdominal skin flap for closure after radical mastectomy. Plast Reconstr Surg 1978;61:547-54. 13. Pinotti JA, Teixeira LC, Keppeke EM et al. Mastectomia radical com reconstrução imediata. In Pinotti JA. Terapêutica em mastologia. Manole: SãoPaulo, 1984.

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do bem

Informação para todos Associações e centros de tratamento e pesquisa de câncer utilizam o rádio para dar dicas de saúde e divulgar informações

Por Sergio Azman

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“Se você coloca alguma coisa no jornal, dificilmente o pessoal da zona rural vai ter acesso. Mas o rádio, não”

UITO SE FALA SOBRE A IMPORTÂNCIA DA INFORMAÇÃO PARA O DIAGNÓSTICO PRECOCE

DO CÂNCER. OU, ANTES DISSO, PARA QUE SEjam tomadas medidas de prevenção que evitem esse diagnóstico. A informação é, de fato, muito importante. E, em tempos de tecnologia digital, internet e redes sociais, um dos mais antigos e tradicionais veículos de comunicação assume um posto essencial como disseminador de informações de prevenção e tratamento de câncer: o rádio. Seja no modo tradicional, em AM/FM, ou via internet, em podcasts (arquivos digitais de áudio) ou web rádios (rádios que usam a internet como plataforma de transmissão), o veículo tem se mostrado uma maneira dinâmica, agradável e fácil de levar dicas e ajudar as pessoas a cuidar da sua saúde. Com programas, spots ou canais específicos que trazem uma variedade de informações sobre oncologia, desde recomendações sobre prevenção até relatos de pacientes e familiares que passaram pela experiência da doença, associações e centros de referência em câncer descobriram no rádio um grande aliado para atingir um público cada vez maior e, muitas vezes, sem acesso a informação. Por seu caráter democrático, o rádio conversa com todo mundo: desde o agricultor isolado no interior até o executivo preso no trânsito maluco da metrópole.

Informação que pode salvar vidas Quando descobriu um câncer no intestino, em 2002 (depois viriam mais dois, de bexiga, em 2003, e mama, em 2004), Maria de Lourdes Barbosa Pinhoni teve dificuldade para conseguir um hospital para realizar seu tratamento pelo SUS.

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“Como sou veterinária e meu marido é técnico agrícola, nós lidamos muito com pessoas do meio rural, gente muito simples. Na minha cidade, Socorro (SP), existem 33 bairros na zona rural. Foi quando comecei a pensar: se para mim, que tenho curso superior e acesso a informação, já foi tão difícil, como será que acontece com as pessoas da zona rural? São pessoas tão simples, como eles descobrem um câncer?”, relembra. Com o passar do tempo, Maria descobriu que, infelizmente, a experiência com o câncer muitas vezes acontece da pior forma possível. “Tem gente que morre na cama, sem tratamento, o sofrimento é muito grande”, conta. Para mudar esse quadro, em suas andanças pela zona rural de Socorro, Maria e o marido, João Pinhoni Neto, passaram a exibir um filme institucional do Hospital do Câncer de Barretos (onde Maria recebeu tratamento), a falar sobre o câncer e o hospital e a colocar-se à disposição para ajudar quem precisasse de orientação e tratamento. Três anos depois, em 2005, fundaram a Associação São Peregrino, que promove iniciativas para aumentar a conscientização sobre o câncer na cidade do interior paulista. Uma dessas atividades é o programa de rádio “De bem com a vida”, que existe desde maio de 2009. “Antes de fundar a associação nós já participávamos de programas de rádio para falar sobre a nossa experiência com o câncer. Depois, resolvemos ter um programa nosso”, lembra. O “De bem com a vida” é transmitido aos sábados, das 13h às 14h, na rádio Socorro AM. Também passa ao vivo, pela internet, com apresentação dos idealizadores.


Maria conta que, principalmente para a população da área rural, o rádio ainda é o principal veículo de comunicação. “Se você coloca alguma coisa no jornal, dificilmente o pessoal da zona rural vai ter acesso. Mas o rádio, não. Tem senhoras que trabalham na roça e levam o rádio para ouvir nosso programa”, diz. O programa possui quatro blocos, divididos por temas. “Se o tema é câncer de útero, nós entrevistamos oncologistas especialistas em útero. A gente convida médicos, faz entrevistas, chama advogados para falar dos direitos dos pacientes, pacientes para contar sua própria experiência, familiares para falar da importância da família para o tratamento. Também falamos um pouco da associação, divulgando nosso trabalho”, conta. Entre as muitas histórias vividas em quase três anos de programa, Maria conta a de uma mulher de 34 anos que se submeteu a uma mamografia pois tinha suspeita de câncer de mama. Quando o médico lhe confirmou o diagnóstico, o medo foi tanto que ela colocou o exame na gaveta. “Mas ela tinha comentado o fato com a sogra, que ouviu nosso programa, pegou o exame e nos procurou. Entramos em contato e oferecemos ajuda. Ela aceitou, agendamos uma consulta no hospital de Barretos, ela fez todo o tratamento e agora está ótima. Hoje é comum o pessoal nos procurar, trazer um amigo que está com suspeita de câncer, ou que foi diagnosticado e não está conseguindo tratamento. E você conseguir ajudar a salvar uma vida, acho que não tem nada mais importante do que isso”, comemora.

Web rádio – A internet como suporte O Hospital do Câncer de Barretos é reconhecido pelo trabalho que realiza com prevenção. Projetos como as Carretas de Prevenção, entre outros, viabilizam o acesso a exames em várias regiões do país. Para levar ainda mais informação sobre prevenção de uma maneira dinâmica e popular, o hospital possui desde 2006 uma web rádio chamada “Direito de viver”. “Pensamos inicialmente no rádio por ser um meio que alcança todas as camadas. Fizemos uma petição para conseguir a outorga de uma emissora FM e, enquanto isso não acontece, entramos com um projeto via web. Infelizmente, por ser uma web rádio, a gente não atinge o público que realmente precisa atingir, que é aquele mais humilde, que às vezes nem computador tem em casa”, explica Paulo Henrique Brechol, assistente de comunicação institucional do Hospital do Câncer de Barretos e coordenador do projeto. A rádio funciona 24 horas, com 90% da programação produzida internamente. São programas musicais que trazem, entre um bloco e outro, alguma informação sobre prevenção, tratamento e cuidados com a saúde. “É uma programação de uma rádio normal. O único diferencial é que temos programas dedicados ao tratamento e à prevenção do câncer. Durante toda a programação, a cada 15 minutos entra uma informação. Temos também programas específicos, com entrevistas com todo o nosso corpo clínico, composto por mais de 200 médicos, com quem as pessoas tiram suas dúvidas”, diz. Brechol explica que o trabalho possui outras vertentes, como as Onco& março/abril 2012

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parcerias na chamada Rede da Prevenção. São atualmente 36 emissoras comerciais, comunitárias e educativas, que retransmitem alguns conteúdos da programação. Todas essas emissoras, juntas, alcançam 11 milhões de ouvintes. “Não é um número exato, não é feita uma pesquisa sobre o programa em si, mas baseado na audiência de cada emissora”, explica. Segundo Brechol, os temas são escolhidos semanalmente. Se o tópico da vez for, por exemplo, urologia, ele será debatido durante toda a semana, com a participação de profissionais da área – médicos especialistas, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, um a cada dia da semana. Como o programa é gravado, pessoas de todo o país, que ouvem os programas através das rádios parceiras, podem participar e sanar dúvidas. “Elas enviam a pergunta e nós informamos em qual dia será respondida. As questões que não foram incluídas no programa por falta de tempo são utilizadas em outro programete, o ‘Fala, doutor’. São dois minutos e meio, no máximo, com as respostas dos médicos às perguntas que nos enviam.” Hoje, mais de 40% das participações são de pessoas que não são pacientes, que muitas vezes nem conhecem o hospital. Um bom sinal, segundo Brechol, já que o objetivo principal é divulgar a prevenção. “Também utilizamos a rádio para divulgar ações do hospital, mas priorizamos a informação. Queremos levar saúde através do rádio.” Além das rádios, a web rádio do Hospital do Câncer de Barretos possui outras parcerias importantes. Um exemplo são 56 locutores de todo o país, que gravam voluntariamente qualquer conteúdo que precisem. Parcerias com a classe artística e empresas de comunicação, que apoiam e divulgam o trabalho, e empresas de conteúdo, que possibilitam que a rádio tenha uma programação dinâmica e pertinente, também desempenham um papel fundamental na missão de melhorar o acesso à informação sobre câncer. Para Brechol, a iniciativa é pioneira, até pela quantidade de conteúdo que tem a oferecer. “Hoje temos milhares de histórias, são mais de 3 mil pacientes por dia, o que nos faz ter muita experiência para compartilhar.”

Se estamos no verão, vamos falar de câncer de pele. Março é mês da mulher, então vamos falar de cânceres recorrentes em mulheres, porque isso cria uma prioridade na mídia. A gente acaba se antecipando, procurando os médicos e gerando esse conteúdo diante das datas, do que está acontecendo. Ou de fatos do mercado. Quando o Lula teve o problema dele, fizemos muitas divulgações sobre o câncer de laringe. A gente olha para esses momentos porque fica mais fácil captar a atenção das pessoas”, conta Adriana Seixas Braga, superintendente de marketing do hospital. Adriana conta que, por ser um centro que possui cerca de 400 médicos em seu corpo clínico, que por sua vez podem falar sobre qualquer tipo de câncer, o A.C. Camargo tem mais facilidade para produzir um material rico, repleto de informações importantes. “Às vezes um artigo publicado por algum médico do hospital traz uma novidade, ou estatísticas em relação aos pacientes. Temos 15 mil novos casos de câncer todo ano, é muita gente em tratamento. E com os números descobrimos coisas interessantes e relevantes para a população, como uma tendência na mudança da faixa etária para determinado tipo de câncer, ou o índice de cura, que vem crescendo. Conseguimos gerar nossas próprias estatísticas porque temos um volume grande”, diz. Os boletins muitas vezes usam notícias ruins como gancho para uma recomendação. A ideia não é causar pânico, mas contextualizar a informação de forma que ela gere uma ação. Portanto, a notícia sobre o aumento na incidência de câncer de intestino ou estômago pode gerar um impacto sobre os hábitos alimentares, já que hoje a alimentação adequada ainda não é uma prioridade. “Existe uma notícia ruim, mas é relevante. Eu transformo essa notícia ruim em uma informação importante para trabalhar a prevenção. Claro, as pessoas sempre vão tomar suas próprias decisões. Mas, quanto mais bem informadas, melhores serão essas decisões”, diz Adriana.

Cuidando bem de você O Hospital A.C. Camargo, em São Paulo, é outro importante centro de tratamento e pesquisa em câncer que utiliza esquetes e programas de rádio para transmitir o conhecimento produzido internamente. Os boletins “Cuidando bem de você”, produzidos pelo hospital, são transmitidos nas rádios Eldorado FM e ESPN, trazendo dicas e informações relevantes sobre saúde em três inserções diárias, sempre com temas alinhados ao calendário. “Os programas são rodiziados, sempre atrelados ao que está acontecendo no mercado, porque é mais fácil chamar a atenção das pessoas.

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• Programa “De bem com a vida” (Associação São Peregrino) Socorro AM 1570 www.radiosocorro.com.br • Rádio Direito de Viver (Hospital do Câncer de Barretos) www.cliquecontraocancer.com.br/direitodeviver/index.html • Boletins “Cuidando bem de você” (Hospital A.C. Camargo) Rádios Eldorado FM 107,3 e ESPN/Estadão FM 92,2


quiz

Quebra-cabeça O quiz é uma seção interativa de Onco& que convida leitores a dar opiniões, levantar dúvidas e emitir hipóteses do caso apresentado Novo caso M.A.C.I., sexo feminino, branca, 50 anos - Procurou o pronto atendimento com queixa de dor torácica retroesternal há 30 dias. - Apresenta piora progressiva, contínua, incaracterística, sem fatores de piora, melhora parcial com analgésicos comuns e opioides fracos, sem dispneia e sem sudorese. - Nega febre nesse período, com perda ponderal de 5 kg nos últimos 30 dias. - Nega tabagismo e etilismo. - Antecedentes pessoais: sem antecedentes pessoais e familiares relevantes. Medicação em uso: em tratamento de transtorno depressivo, faz uso de fluoxetina e bupropiona. Exame físico: bom estado geral, corada, hidratada, anictérica. PA: 130x70 mmHg; P: 92 bpm; Sat O2: 97%; FR: 24 ipm. Neurológico: sem alteração. ACV: bulhas rítmicas, hipofonéticas, sem sopros. AR: MV+ bilateralmente, sem ruídos adventícios. Abdômen: sem alteração.

Membros: sem alteração, pulsos presentes e simétricos. Exame laboratorial: Hb: 8,9 Ht: 28 Leucócitos: 17.200 Neutrófilos: 14.650 Eosinófilos: 250 Monócitos: 650 Linfócitos: 1.650 Plaquetas: 414.000 Ureia/Creatinina: 22/0,93 Na/K: 142/4,4 TGO/TGP: 39/22 BT/BD: 0,2/0,1 GGT/FA: 110/29 DHL: 108 Albumina: 2,4 Radiologia: Questões: 1. Qual a hipótese diagnóstica? 2. Qual a melhor proposta terapêutica?

Andrey Soares Oncologista clínico do Centro Paulista de Oncologia

Mande suas respostas para o e-mail: contato@revistaonco.com.br. Os resultados serão divulgados no site www.revistaonco.com.br e na próxima edição de Onco&.

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Resposta do quiz anterior – edição 9 Paciente feminina de 71 anos, branca, casada, natural do Rio de Janeiro. Apresenta baixa acuidade visual progressiva no olho direito há seis semanas. Refere dor torácica à direita quando inspira e apresenta tosse seca há alguns meses. Nega outros sintomas. Submetida a mastectomia da mama direita há mais de 20 anos. Câncer de mama segundo relato da própria paciente. Colecistectomia e apendicectomia há mais de 25 anos. Nega diabetes. Nega HAS. Ao exame oftalmológico observamos acuidade visual corrigida de 20/200 no olho direito e 20/20 no olho esquerdo. Segmento anterior sem anormalidades em ambos os olhos. Fundoscopia sob midríase (fotos 1 e 2) revelou no olho direito massa grande, de aproximadamente 6 mm de base e 1,5 mm de elevação (medida pela ultrassonografia scan B ocular), brancacenta, localizada em polo posterior. Observamos ainda pigmentação de aspecto moteado e má delimitação de bordos. Há um descolamento seroso de retina associado. Fundoscopia sob midríase dentro dos limites da normalidade no olho esquerdo. Testes de função hepática, hemograma e bioquímica do sangue normais em ambos os olhos. Foi solicitado exame de tomografia computadorizada de tórax. Fotos a seguir. Qual é o seu diagnóstico? O diagnóstico é adenocarcinoma de pulmão metastático para coroide. Qual o tratamento? A paciente foi tratada com terapia fotodinâmica mediada por indocianina verde. Evoluiu com discreta perda visual central e acuidade visual final de 20/80 no olho afetado. Discussão Lesões metastáticas representam a forma mais comum de câncer intraocular. Estudos recentes demonstram que aproximadamente 9,3% dos casos fatais de câncer apresentam alguma lesão metastática intraocular, com uma incidência estimada de 20 mil casos anuais nos Estados Unidos. Entretanto, na prática clínica da oncologia ocular não são encontrados tão frequentemente quanto o melanoma maligno da coroide, possivelmente porque os pacientes afetados apresentam tantas outras alterações sistêmicas que não chegam a ser avaliados por um oftamologista. Por outro lado, 25% dos pacientes que se apresentam ao oftalmologista com um tumor metastático intraocular não têm história prévia de câncer. Após uma avaliação sistêmica inicial subsequente,

cerca de 10% não apresentam um primário detectável (oculto). Dessa forma, é importante que os clínicos estejam familiarizados com a possibilidade de manifestações da metástase intraocular. A lesão metastática atinge o olho por via hematogênica, alcançando o trato uveal e acometendo a coroide em 90% dos casos, e corpo ciliar e íris em mais de 9% dos casos. Lesões para retina e vítreo são incomuns. A maioria das metástases intraoculares são carcinomas originários da mama nas mulheres e do pulmão nos homens. Menos frequentemente as lesões se originam do trato gastrointestinal, tireoide, rins, pâncreas e outros órgãos. As manifestações clínicas variam de acordo com o sítio do implante, sendo o mais comum a baixa visual face ao envolvimento de mácula e polo posterior ou papila. Exame cuidadoso do segmento anterior com a lâmpada de fenda e a oftalmoscopia binocular indireta sob midríase frequentemente são suficientes para o diagnóstico. A angiofluoresceinografia e a ultrassonografia ocular completam o diagnóstico. A conduta varia conforme a situação, e múltiplas modalidades de tratamento estão disponíveis. Referências: 1. Ferry et al: Carcinoma metastatic to the eye. I. Clinicopathologic study of 227 eyes. Arch Ophthalmol 1975;92:276-286. 2. Shields et al. Survey of 520 ocular metastasis. Ophthalmol 1997; 104:1265-1276 3. Shields et al. Intraocular tumors: text and atlas. Philadelphia 1999;151-168.

Evandro Lucena Médico oftalmologista do Instituto Nacional de Câncer (INCA); ex-fellow Harvard Medical School/Massachusetts Eye and Ear Infirmary

Tem algum caso interessante que gostaria de divulgar? Mande para contato@revistaonco.com.br

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curtas

Instituto Oncoguia lança o Programa de Apoio ao Paciente com Câncer – PAP

O Instituto Oncoguia, associação cuja missão é promover o acesso a informação, prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer, lançou em fevereiro o Programa de Apoio ao Paciente com Câncer – PAP, que pretende orientar e buscar a solução adequada a partir da questão apresentada pelo paciente. Com frentes de atendimento especializadas em prevenção, apoio emocional e informações sobre qualidade de vida e direitos do paciente com câncer, o usuário poderá acesar o PAP de três formas – por telefone, com um serviço 0800, e pelo site do instituto, através do Fale Conosco e do Chat. O 0800 é um serviço de atendimento telefônico gratuito, no qual a pessoa será direcionada para o profissional apto a ajudá-la. O Fale Conosco, presente no site do Instituto Oncoguia (www.oncoguia. com.br), serve como plataforma para o usuário enviar dúvidas, buscar informações sobre os diferentes tipos da doença e novidades para seu caso. Os usuários cadastrados também terão acesso a conteúdos exclusivos e materiais específicos sobre câncer. A terceira frente de atendimento ao paciente será o Chat Oncoguia, com temas de interesse do paciente com participação de especialistas. Uma importante atuação do PAP será relacionada à questão dos direitos dos pacientes. Existem inúmeras leis que asseguram aos pacientes oncológicos benefícios e direitos totalmente desconhecidos da grande maioria das pessoas. Por meio do PAP, o paciente terá acesso a orientação sobre esses direitos de forma didática e personalizada. Serviço: Programa de Apoio ao Paciente – PAP www.oncoguia.org.br 0800-7731666 Atendimento de segunda a sexta, das 10h às 19h

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Medikidz explica câncer e outras doenças a crianças e jovens Todos os dias, milhões de crianças são diagnosticadas com doenças que mesmo seus pais acham difícil compreender. A maioria não entende suas condições médicas e teme pelo que pode acontecer. Explicar a informação médica a crianças em linguagem simples é a missão do Medikidz, grupo de super-heróis de uma série de livros que inclui títulos como O que há com Lyndon? Medikidz explicam osteossarcoma. Chi, Pump, Skinderella, Axon e Gastro levam as crianças a uma viagem através de Mediland – um planeta com a forma de um corpo humano – para explicar o diagnóstico, a investigação, o tratamento e a prevenção de diferentes condições médicas, entre elas tumores cerebrais, melanomas e vários outros tipos de câncer. Cada livro, de 32 páginas, é concebido como um romance gráfico, com ilustrações vibrantes e personagens atraentes e divertidos, criados para manter as crianças envolvidas. A iniciativa é dos pediatras Kim Chilman-Blair e Kate Hersov, que perceberam a falta de material para crianças e jovens em torno da medicina e da saúde. Atualmente já são 25 títulos de histórias em quadrinhos, escritos por redatores médicos e clínicos, e posteriormente analisados por consultores de cada área. Para saber mais: www.medikidz.com

Novo centro de referência em oncologia clínica e experimental em São Paulo Desde fevereiro, a cidade de São Paulo conta com mais um serviço de referência para o tratamento em câncer, formação de médicos e pesquisa. O Centro de Oncologia Clínica e Experimental (COCE) atenderá pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) e reúne, no mesmo espaço, as áreas de diagnóstico, tratamento e pesquisa básica da doença. O COCE nasce vinculado à Escola Paulista de Medicina (EPM), da Universidade Federal de São Paulo, e ao Hospital São Paulo e, em breve, deve consolidar parceria com o Hospital do Câncer de Barretos. Além disso, já está alinhado com três laboratórios que desenvolverão marcadores tumorais para estadiamento de câncer no Brasil. “Além do compromisso social de garantir atendimento de alto nível aos pacientes, o centro também permitirá a construção do conhecimento por meio de pesquisas de ponta e sua aplicação imediata na comunidade”, afirma Antônio Carlos Lopes, diretor da EPM. Sergio Simon, oncologista clínico e coordenador do COCE, acredita que a tríade que engloba pesquisa, educação e assistência é o motor que deverá nortear o centro integrado de oncologia.


Avastin® (bevacizumabe) aumenta sobrevida em recidiva de casos avançados de câncer colorretal No Brasil, o câncer colorretal é o terceiro tipo de câncer mais frequente, com cerca de 30 mil novos casos registrados por ano. Como progride de maneira silenciosa, muitas vezes sem provocar dor ou apresentar sintomas aparentes, um grande número de casos é diagnosticado já em estágio avançado. O Avastin® (bevacizumabe) é um medicamento do laboratório Roche usado no tratamento do câncer colorretal metastático (CCRm) desde 2007 no Brasil e pode ser utilizado em primeira ou em segunda linha, em associação com quimioterapia. Agora, o primeiro estudo multicêntrico, randomizado, a avaliar a manutenção de Avastin® (bevacizumabe) após a primeira progressão tumoral concluiu que manter o medicamento durante a segunda linha de quimioterapia aumenta a sobrevida dos pacientes com CCRm. Os primeiros resultados da pesquisa mostram que aqueles que associaram Avastin® à quimioterapia como primeiro tratamento, no momento da detecção de progressão do tumor, viveram mais do que os pacientes que receberam apenas quimioterapia.

Parceria entre Sírio-Libanês e Santa Paula aumenta cobertura via planos de saúde O Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês e o Instituto de Oncologia do Hospital Santa Paula estabeleceram, em fevereiro, um acordo de gestão técnica. Sob a direção do oncologista Paulo Hoff, diretor-geral do Centro de Oncologia do HSL, a parceria é importante porque aumenta a cobertura via planos de saúde que o Sírio-Libanês não contemplava, principalmente porque o foco do Santa Paula hoje são as classes B e C. Agora, os pacientes do Instituto de Oncologia do Hospital Santa Paula passam a contar com o atendimento por médicos do HSL. A parceria também aumenta a possibilidade de investir e realizar mais pesquisas clínicas com um maior número de pacientes, ampliando as atividades de ensino e troca de experiências para os corpos clínicos.


INCA divulga estudo bienal sobre a incidência de câncer no país O Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) estima cerca de 520 mil novos casos da doença para 2012. O número faz parte da publicação Estimativa 2012 – Incidência de Câncer no Brasil. Realizado a cada dois anos, o estudo é uma importante ferramenta para o planejamento e a gestão da saúde pública na área oncológica no país, permitindo estabelecer prioridades e alocar recursos direcionados para a melhora do cenário da doença no país. O volume destaca os tipos de câncer mais incidentes nas regiões brasileiras, como de pele não melanoma, próstata, mama e pulmão. A novidade fica por conta das sete novas localizações de câncer que entraram no ranking dos tumores mais frequentes do país. As novas localizações dos tumores são bexiga, ovário, tireoide (nas mulheres), sistema nervoso central, corpo do útero, laringe (nos homens) e linfoma não Hodgkin. Nessa edição foram considerados 18 tipos específicos de câncer, com base na magnitude e no impacto. As informações são apresentadas de forma consolidada para o país e de forma desagregada para estados e capitais. Os números de casos novos para cada tipo de câncer foram calculados com base nas taxas de mortalidade dos estados e capitais brasileiras (Sistema de Informação Sobre Mortalidade – SIM), e as taxas de incidência foram obtidas nas 17 cidades em que existem Registros de Câncer de Base Populacional (RCPB).

Rio de Janeiro anuncia construção de dois novos hospitais de oncologia O governo do estado do Rio de Janeiro irá construir dois novos hospitais para tratamento de pacientes com câncer, um em Nova Friburgo, na região serrana, e outro em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. As obras de reforma e construção devem ser iniciadas no segundo semestre deste ano, com inauguração prevista para o primeiro semestre de 2014. A unidade de tratamento de câncer de Nova Iguaçu terá mais de 250 leitos para o tratamento oncológico. Já o projeto do Hospital de Oncologia de Nova Friburgo terá o INCA como parceiro, e contará com a colaboração de Marcos Moraes, especialista no tratamento oncológico e presidente da Fundação do Câncer. A unidade ocupará o espaço onde funcionava o Centro de Qualidade de Vida do Hospital Silvestre e não prestará atendimento pediátrico, serviço que a princípio será realizado pelo INCA.

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Anvisa aprova Zelboraf® (vemurafenibe) para melanoma

O tratamento do melanoma avançado, tipo mais grave de câncer de pele, conta com uma nova opção em medicina personalizada para tratamento e detecção da doença no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o medicamento Zelboraf® (vemurafenibe) para uso no tratamento de melanoma metastático positivo para mutação BRAF V600E, presente em cerca de 50% dos pacientes. Essa mutação é identificada por meio de um teste também aprovado pela agência, o cobas® 4800 BRAF V600, da Roche. Zelboraf® (vemurafenibe) é o primeiro medicamento personalizado aprovado no Brasil que demonstrou melhorar a sobrevida de pacientes. O teste cobas® 4800 BRAF V600 também é o único no Brasil com aprovação da Anvisa para diagnóstico dessa mutação em melanoma avançado. A droga, aprovada em agosto de 2011 pela Food and Drug Administration (FDA), agência regulatória dos Estados Unidos, conseguiu reduzir em 63% o risco de morte e em 74% o risco de morte ou progressão da doença, quando comparada à quimioterapia. De acordo com o estudo clínico internacional BRIM 3, o tempo de sobrevida livre de progressão da doença foi de 5,3 meses para o grupo de pacientes que foram tratados com Zelboraf® (vemurafenibe) e 1,6 mês para aqueles cujo tratamento foi quimioterapia.


mundo virtual

Onco& recomenda Na internet é possível encontrar de tudo. A rede é um terreno fértil para estudo e aprendizado dos profissionais de saúde. São milhares de sites com notícias sobre oncologia, novas drogas, pesquisas e informações para médicos e pacientes. Em meio a tanto conhecimento, separar o joio do trigo nem sempre é uma tarefa fácil. Para ajudá-lo nessa missão de selecionar o que é ou não relevante e confiável, criamos a seção Mundo Virtual. A cada edição, apresentaremos dois sites importantes em oncologia, voltados tanto para médicos, com novidades e informações sobre a área, como para pacientes, com dicas de prevenção e assistência ao doente. Confira abaixo os sites selecionados para inaugurar a seção.

• www.cancer.net/patient/Multimedia/ Cancer.Net+Videos Produzido pela American Society of Clinical Oncology (ASCO), o site Cancer.Net disponibiliza vídeos com especialistas trazendo informações importantes e com base científica sobre diversos aspectos da doença. Em linguagem acessível, com foco no paciente, os vídeos são postados regularmente e podem ser acessados pelos temas fixos ou pela ferramenta de busca. Entre os assuntos tratados estão efeitos colaterais, tratamentos, testes e procedimentos, qualidade de vida, vida após o tratamento para sobreviventes de câncer, além de notícias sobre pesquisas e apoio a família e amigos de pacientes.

• www.cancer.org/Cancer/News/ExpertVoices/ O blog Expert Voices é o mais novo recurso da American Cancer Society para os interessados em novidades de oncologia. Expert Voices dá voz a especialistas, que discutem as questões relevantes sobre a doença e o tratamento, tudo com base científica. A busca pelos posts pode ser feita pelo nome do colaborador autor do post ou por uma lista de temas, que vão desde os mais diversos tipos de câncer até assuntos como mitos da doença, dietas e exercício ou novidades em pesquisas.

Também conhece sites interessantes sobre oncologia? Mande sua sugestão para contato@revistaonco.com.br.

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calendário 2012

Evento

Data

Local

Informações

VI Congresso Latino-Americano de Cuidados Paliativos

14 a 17 de março

Curitiba, PR

www.vicongresoalcp.org

I Simpósio de Enfermagem em Centro Cirúrgico do INCA

16 de março

Rio de Janeiro, RJ

www.inca.gov.br

XX Simpósio Internacional de Hematologia e Hemoterapia do Hospital Israelita Albert Einstein

23 e 24 de março

São Paulo, SP

www.einstein.br

III Congresso Internacional de Uro-Oncologia

23 a 25 de março

São Paulo, SP

www.eventosuptodate.com.br/uro-oncologia

5o Simpósio Internacional de Atualização em Câncer Gastrointestinal

29 a 31 de março

Praia do Forte, BA

www.nucleodeoncologia.com.br/simposios

IV Curso Multiprofissional em Cuidados Paliativos

31 de março e 1 de abril

Rio de Janeiro, RJ

www.inca.gov.br

1o Congresso Ítalo-Brasileiro de Cirurgia de Cabeça e Pescoço

12 a 14 de abril

Natal, RN

www.cbopnatal.com.br/index.php

2o Curso Básico de Onco-Hematologia

12 de abril a 31 de maio

Rio de Janeiro, RJ

www.institutocoi.org

1st International Cooperative Cancer Symposium – Intersections – treating cancer today and tomorrow

13 e 14 de abril

São Paulo, SP

www.intersections-hsl.com

I Jornada de Odontologia Oncológica do INCA

18 e 19 de abril

Rio de Janeiro, RJ

www.inca.gov.br

IX Congresso Paulista de Clínica Médica

20 e 21 de abril

São Paulo, SP

www.sbcm.org.br/site/

III Simpósio Internacional de Câncer Urológico

20 e 21 de abril

São Paulo, SP

www.uro.usp.br/cancerurologico

VI Congresso Brasileiro de Farmacêuticos em Oncologia

20 a 22 de abril

Brasília, DF

www.sobrafo.org.br

Calendário de eventos de 2012 completo e atualizado:

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março/abril 2012 Onco&


om.br www.revistaonco.c

www.revistaon co.co

m.br

Oncologia para

ialidades todas as espec

Junho/Julho 2011 o Ano 1 • n 6

Agosto/Setemb ro 2011 Ano 2 • n o 7

Oncologia para

todas as espe cialidades

Emergências oncológicas

e câncer Neutropenia febril

Avanços em pesquisa Novos medicamentos Procedimentos inovadores Responsabilidade social

Transplante la co de meedu de células-tron O transplant e a crescente hematopoéticas doadores de disponibilidade

Entrevista

m Do bemais um recurso para

Câncer em três conversa com tempos: uma da Fundação Marcos Moraes, do Câncer

Hospices: ivos no Brasil os cuidados paliat

Patologia

central el cada vez mais er Entenda o pap no âmbito do cânc do patologista

men entrevista | abdô

io | curtas | calendár

Mama Diagnóstico prec de mama: com oce em câncer quais são as o proceder e controvérsias ?

ASCO 2011

Confira as ten dên e as polêmicas cias que foram destaq ue na 47 a edição do congresso

Quiz

Uma nova seçã conhecimento o para testar seus s em oncologia

radioterapia

| emergênci as oncológic as | do bem

.br www.revistaonco.com

Outubro/Novembro o Ano 2 • n 8

Oncologia para todas

2011

as especialidades

www.revistaonc o.com.br

Nutriçãoólicas e

Alterações metab em câncer terapia nutricional

Dezembro 2011/J aneiro-Feverei ro 2012 Ano 2 • n o 9

Oncologia para

ica Oncogenét ? Medicina O futuro já chegou ca baseada em genéti tos e seus desdobramen

Especial SB OC

XVII Congresso Oncologia Clíni Brasileiro de ca: muito da oncologia além clínica

Do bemte:

Além do pacien quando quem cuida cuidado também precisa ser

Entrevista

Uma nova form a de abordar as doenças uma entrevist não transmissíveis: a com Gene Bukhman, da Universid ade Harvard

Oncogeriatriaáreas

as É hora de aproximar forma e encontrar uma nova câncer de tratar o idoso com ias oncológicas atologia | emergênc entrevista | onco-hem

todas as espe cialidades

Quiz

Uma nova testar seus conhseção para ecimentos em oncologia

Cirurgia robó tica

Sempre a mel hor opção? Conheça as vantagens, as desvantagen e as polêmic s as dessa técn ica

ginecologia | nut

rição | do bem

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Tudo isso e muito mais você encontra nas páginas da revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, que chega à sua 10a edição. O objetivo desta publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica, é transformar a oncologia em um tema mais familiar para o não especialista na área. Com artigos e reportagens atuais e relevantes para a prática no consultório, a Onco& chega gratuitamente a 10 mil médicos de todo o país, com a proposta de dar ao profissional de saúde mais ferramentas para a prevenção, o diagnóstico precoce e o acompanhamento de seu paciente durante e após o tratamento do câncer.


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