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Discriminação de Pessoas Trans

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Casos Clínicos

Casos Clínicos

Texto de Rodrigo Martins

Apopulação trans é das principais comunidades alvo de discriminação, preconceito e estigma por parte da sociedade (1). É necessário um acesso a cuidados de saúde positivo e sem barreiras que vise colmatar as disparidades em saúde que esta população sofre (2). No entanto, a própria procura por tratamentos cirúrgicos, médicos e psicológicos específicos à sua condição, encontra-se altamente limitada. (1–3).

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Formas de discriminação a que pessoas trans são expostas regularmente incluem: desrespeito pelo seu nome e pronomes apropriados ao seu género, agressão, isolamento, marginalização e dificuldades económicas (1). Este estigma explica a maior prevalência de episódios depressivos, perturbações de ansiedade (4), perturbação de uso de substâncias, abusos psicológico, físico e sexual, e tentativas de suicídio nestes indivíduos (1).

Num estudo que pretendeu avaliar a discriminação e barreiras ao acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) percecionado por pessoas trans, concluiu-se que cerca de metade dos inquiridos sofreram, pelo menos, um episódio de discriminação (1). Relativamente a estes episódios, os principais foram, por ordem decrescente: o uso de linguagem preconceituosa ou insultuosa, negação e o desencorajamento da exploração da identidade de género e, também a recusa de assistência ou término de cuidados (1). Para além disto, quanto às barreiras de informação sobre a especificidade trans, 32,4% dos participantes referem que o profissional de saúde em causa não tinha conhecimento suficiente acerca da saúde de pessoas trans (ST), sendo por isso incapaz de aconselhar sobre a mesma, e que 69,1% dos inquiridos teve de ceder, pelo menos uma vez, informação sobre ST ao profissional (1).

A abordagem de questões relacionadas com diversidade de género ainda se associa a preconceitos e emoções negativas, que resulta nos constrangimentos referidos (3). É necessário o respeito pelo direito à autodeterminação que se traduz pela despatologização do percurso transgénero e transexual (3). Torna-se imprescindível protocolar os atos médicos (3) e dar a conhecer essas guidelines aos profissionais de saúde, de modo a que não sejam as próprias pessoas trans a os informarem acerca das mesmas, contribuindo assim para a ajuda do clínico em explorar a identidade de género do indivíduo (1) e fornecer um acompanhamento personalizado com opções de tratamento individualizadas (1,4).

A abordagem das questões relacionadas com o percurso da pessoa trans faz-se em vários passos (1). O diagnóstico requer profissionais experientes, principalmente no caso da transexualidade com ou sem disforia de género, sendo o médico de Medicina Geral e Familiar (MGF) o fator mais importante para esta fase (3). Feito o diagnóstico, o MGF

deve facilitar a exploração da identidade e expressão de género do indivíduo (1) e propor um tratamento individualizado com uma série de etapas: tratar a sintomatologia que possa surgir, disponibilizar apoio psicológico de aconselhamento e de psicoterapia de suporte, intervir no meio social de modo a defender o bem-estar do utente e articular com outras especialidades com vista a proceder à sua referenciação hospitalar (3). No caso de uma pessoa transgénero que deseje e tenha indicação clínica para a alteração física dos seus carateres sexuais primários e/ou secundários (1), existem algumas opções terapêuticas do tratamento de redesignação de sexo (TRS) que importa mencionar: tratamento com análogos da hormona libertadora de gonadotrofinas (GnRH), tratamentos hormonais “feminilizantes” e “masculinizantes” e, por fim, cirurgias de redesignação sexual (3).

A análise da legislação portuguesa relativamente às pessoas trans que têm um sofrimento psicopatológico constante com as caraterísticas do seu sexo biológico – disforia de género – é importante em duas vertentes (3). A primeira prende-se com a cirurgia para a transição de género que depende de: dois diagnósticos de disforia de género por duas equipas multidisciplinares distintas (3), acompanhamento médico durante todas as fases do TRS, em que o período antes da intervenção cirúrgica deve ser inferior a dois anos, utente ser maior de idade e cognitivamente capaz e, por fim, de um parecer por parte da Ordem dos Médicos (1). A outra diz respeito aos efeitos no registo civil quanto à alteração do sexo e nome, em que o interessado tem de ser maior de idade, preencher um requerimento e ter um relatório médico a comprovar a situação em causa (3).

Quanto ao percurso trans, a medicina preventiva pode atuar a dois níveis (2). O primeiro, tem como alvo pessoas trans em que, sendo esta uma comunidade suscetível aos tipos de discriminação referidos (2), muitos deles recorrem a cuidados de saúde numa fase tardia do seu sofrimento (3) pelo que, deve-se intervir o mais precocemente possível (2). O MGF constitui um pilar essencial para o ponto anterior pelo que, o segundo nível a atuar é na competência trans que este profissional deve possuir visto que (2), este acompanha o individuo da infância até à vida adulta, tendo inúmeras oportunidades para avaliar o seu desenvolvimento sexual (3).

As pessoas trans que, devido à sua especificidade, são alvo de estigma e discriminações social, económica e familiar, necessitam de um acesso a cuidados de saúde sem obstáculos e preconceitos (1). Através da eliminação da transfobia e da evolução para uma medicina mais inclusiva, esta comunidade pode ter ganhos positivos em saúde que contribuam o seu bem-estar físico, sexual, mental e social (1,3).

Referências bibliográficas

1. Rodrigues J, Lemos C, Figueiredo Z. Discriminação e Barreiras ao Acesso ao Serviço Nacional de Saúde Percecionados por Pessoas Trans. Rev Port Psiquiatr e Saúde Ment [Internet]. 2020 Dec 30;6(3):98–108. Available from: https://www.revistapsiquiatria.pt/index.php/sppsm/article/view/152 2. Romanelli M, Lindsey MA. Patterns of Healthcare Discrimination Among Transgender Help-Seekers. Am J Prev Med [Internet]. 2020;58(4):e123–31. Available from: https://doi.org/10.1016/j.amepre.2019.11.002 3. Olivera AGC, Vilaça AF, Gonçalves DT. Da transexualidade à disforia de género – protocolo de abordagem e orientação nos cuidados de saúde primários. Rev Port Med Geral e Fam [Internet]. 2019 Jun 1;35(3):210–22. Available from: http://rpmgf.pt/ojs/index.php/rpmgf/article/view/12105 4. Coleman E, Bockting W, Botzer M, Cohen-Kettenis P, DeCuypere G, Feldman J, et al. Standards of Care for the Health of Transsexual, Transgender, and Gender-Nonconforming People, Version 7. Int J Transgenderism [Internet]. 2012 Aug;13(4):165–232. Available from: http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/15532739.2011. 700873

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