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A voz de Anná

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CENA E ENSAIO

CENA E ENSAIO

A VOZ DE ANNÁ A COMPOSITORA BUSCA SUA PRÓPRIA SONORIDADE POR MEIO DE COLAGENS MUSICAIS

“O primeiro choque foi quando eu escolhi fazer faculdade de cinema e não de medicina, como esperavam de mim”, conta Anná sobre o seu caminho. “E foi quando me mudei para São Paulo e conheci a noite paulistana. Desde então, estamos em um relacionamento estável e monogâmico”. E foi nessa mudança que ela passou a descobrir seus caminhos inesperados. Anná se encontrou no samba, nas tradições orais, no sentimento de pertencimento e comunidade. Anná diz que é do samba, mas já havia deixado claro: seu relacionamento sério é com a noite paulistana, e essa é conhecia pela diversidade.

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Quando gravou seu primeiro EP, Anná sentiu a necessidade de tomar posições. “Não tinha ninguém fazendo música sobre gordofobia, por exemplo, e eu escrevi “Carta à Boa Forma” sobre mim, mas não queria que fosse só sobre mim”. E foi assim que ela se organizou para gravar a música e o clipe com muitas mulheres cantando juntas.

Estando envolvida com o ativismo de diversas questões, estas foram transparecendo em seu trabalho, e eram transformadas em música por meio de uma colagem de influências diversas. As músicas de Anná não são “uma de cada jeito”, todas as músicas são de todos os jeitos. Explico, ela vai transformando o ritmo, arranjo e clima conforme os versos lhe surgem, com uma habilidade que pouquíssimos músicos têm. Suas experiências levam ao extremo alguns procedimentos tropicalistas, mostrando que, esteticamente, ela ouviu e entendeu Tom Zé e Caetano Veloso.

Uma vez que mencionamos a influência de Caetano, é possível, ao ouvir Anná, encontrar um fenômeno raro, possível nas primeiras gravações do baiano, que é ouvir o sorriso. Existe um gosto na dicção das palavras e uma alegria inerente ao ofício de fazer a música que extrapola qualquer explicação acerca da interpretação. Não é uma entonação, um timbre, um arranjo ou qualquer elemento musical que possa ser explicado para além da sensação de que Anná canta sorrindo.

Mas a própria formação musical de Anná funciona neste impalpável abstrato e informal. Ela

está envolvida na tradição oral da música negra brasileira, frequentando as rodas de samba e fazendo parte de grupos como o Ilú Obá de Min, de cujo coro faz parte. Na composição “Sobre a Rosa”, parte de seus mais novos lançamentos, hoje, olhando mais para si e para questões mais etéreas, mas não menos políticas ou profundas, contou com a participação do grupo. Não apenas a bateria e coro do Ilú, entre tampas e canetas e universos literais, a canção recebe um naipe de metais redondo que embala.

Aproveitando-se de todas as possibilidades de uma banda que sabe suingar, ela faz a colagem de “Plantaram Poesia” que homenageia seus pais, professores (acompanhado de um clipe montado sobre um VHS de sua infância), mostrando que não tem medo explorar a voz aveludada ou rasgada na mesma peça. É uma artista que mostra o amadurecimento em cada obra e que tem estofo para nos surpreender com criatividade e sem amarras ou rótulos.

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