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TINHA UMA INFLUÊNCIA NO MEIO DO CAMINHO

Por Fernando de Freitas

David encarou seu trabalho e entendeu que transcendia a sua pessoa. Sua identidade era formada músicas que falavam do amadurecimento. Assim assumiu o nome Siso. “Veio disso, de siso ser um sinal de maturidade, uma maturidade que se questiona, porque que não tem função no corpo. É uma maturidade que envolve um processo de dor. É uma dor dentro de uma maturidade que vem se desenvolvendo. Eu acho que isso tem muito a ver com o que faço dentro da música” explica o músico. É diante das cicatrizes que adquirimos ao longo da vida que Siso apresenta seu mais novo trabalho, com o objetivo de mostrar composições dentro de um universo pop mais maduro, com referências já curadas pelo tempo. Essas cicatrizes são transformadas em ouro pelo processo do Kintsugi (técnica japonesa de remendar porcelana), trazendo uma nova roupagem a algo que já pode ser considerado tradição e cânone. Se engana quem associar o arcabouço conceitual de Siso com alguma aridez dificuldade em sua obra. Como o Kintsugi, é fácil apreciar e entender o seu valor, uma vez que os elementos que estão ali são tangíveis. Ele usa a porcelana e o ouro de Minas Gerais, de onde vem, mas os trabalha na megalópole de São Paulo. Siso é metáfora completa de seu trabalho, deixando a personalidade de David submersa pela obra.

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DA RECONSTRUÇÃO AO AFETO

O olhar de Siso no álbum homônimo é direcionado ao afeto. É a valorização do processo e dores a partir de uma posição de ternura despreocupada consigo. É a empatia de um velho monge que sabe apenas os erros constroem a sabedoria. É por

isso que, apesar da profundidade que apresenta, não está revestido de seriedade. O músico consegue trazer temas que indiretamente (ou não) se referem ao cenário político, como a canção Quando o Amor de 1 Homem é 1 Revolver, ao mesmo tempo em que faz uma descrição de um fenômeno cultural (para não dizer psicopatológico), com a leveza de quem responde a sua proposição, “é melhor correr”, no verso seguinte do refrão. Neste cenário, ele consegue construir a música em catarse com os versos repetidos “pesa mais o amor”. Ele tensiona a pista de dança que encontra a simplicidade da resolução de sua proposta. Esso modo de fazer música se repete com peso nos sintetizadores e beats ao longo do álbum. É interessante como ele emenda as canções Corpo para Amar com Não Me Venha Com Essa de Amor. Ele constrói, desconstrói e reconstrói o discurso e a canção fazendo a jornada dançante sobre nossa própria instabilidade e incoerência. Ao fazer isso, Siso acolhe os sentimentos mais comezinhos de seu ouvinte, “a gente aprende, a gente cresce, a gente desenvolve e ganha profundidade na vida e, ao mesmo tempo, como é que a gente pode lidar com isso com leveza?” reflete o compositor. “É a linha tênue entre a profundidade que a gente adquire e não se deixar afundar por isso”.

POP ANTIGO

A primeira música de trabalho deste álbum é Pop Antigo. Trata-se de um tema dançante e sensual que entra neste universo maduro que Siso frequenta. “É uma música pop que roqueiro gosta, tem algo de Depeche Mode”, conta Siso. E complementa: “tudo começou com a jornada de criação da música. Eu criei todo o instrumental dela e eu não sabia para que caminho ir com a letra, aí fui mostrando para algumas pessoas. Primeiro levei para a Letrux, ela não conseguiu trabalhar em cima porque estava fazendo Aos Prantos. Levei o pro Thiago Petit, não rolou também. Aí ei levei para a Yma, que falou ‘amigo isso me lembra 2002’ e imediatamente me veio o termo Pop Antigo”. A canção é feita dos mesmos contrastes que permeiam todo o álbum, trazendo climas solares e noturnos que refletem o mesmo tema. “Nada é uma coisa só ou a outra, eu tento integrar essas coisas na minha criação, está tudo dentro de uma dinâmica só” conta o músico. A música é feita para a noite, mas não a noite dos jovens que estão descobrindo a vida. É a trilha sonora daqueles que, entre idas e vindas, amores e desamores, ilusões e desilusões encontram espaço para espantar o fel na pista de dança.

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