Revista Press

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ANO 20 - EDIÇÃO 173 - R$ 9,90

MANUAL DE

SOBREVIVÊNCIA

NO OCEANO DIGITAL Fazer jornalismo na web impõe regras, práticas e habilidades pouco perceptíveis a um olhar superficial sobre a rede

CLÁUDIO HUMBERTO

WILLIAM RANDOLPH HEARST

PRÊMIO PRESS 2016

O jornalista que sabe tudo dos bastidores do poder em Brasília

O dono de jornal que inspirou o Cidadão Kane

Conheça os finalistas nas 17 categorias

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O cartão que combina com a sua paixão.

Abra já sua conta. SAC: 0800.646.1515 Deficientes Auditivos e de Fala: 0800.648.1907 Ouvidoria: 0800.644.2200 Deficientes Auditivos e de Fala: (51) 3215.1068 /banrisul

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ALMANAQUE Um remédio contra as frases feitas

Com a decadência na leitura, despenca também a escrita. Na falta de repertório para narrar um fato, muletas verbais socorrem redatores capengas. Como antídoto para a epidemia de frases feitas e lugares-comuns, há um livro de Humberto Werneck com título apropriado. O Pai dos

Burros (edição da Arquipélago, de Porto Alegre, 2009) lista expressões para jamais repetir, tais como dizer que uma pessoa: - Abraçou uma carreira - Arrumou a casa - Conquistou o seu espaço - Curvou-se à evidência dos fatos - Depositou esperança em algo - É fã de carteirinha - É figura de destaque - Fez algo que "caiu como uma bomba" - Ou que "corre à boca pequena" - Ou que "encontrou eco" - Foi tomada pela emoção - Recebeu uma ducha de água fria - Tem característica marcante - Travou uma queda de braço Você costuma usar algumas dessas construções? Que tal sair da festa dos lugares-comuns. Que não tem hora para acabar.

STORYFUL

DITO POR AÍ

“É uma desgraça que um campo potencialmente tão dinâmico e vital como o jornalismo possa ser dominado por estúpidos e vagabundos, assombrados por miopia, apatia e complacência, e geralmente presos no pântano de uma estagnante mediocridade.” Hunter S. Thompson (1937-2005)

No meio dos terabytes de lixo despejados na internet e nas redes sociais, o jornalista irlandês Mark Little descobriu uma mina de ouro. Criou em 2010 a Storyful, uma agência especializada em coletar e validar conteúdos gerados pelo público. Com bases em Dublin, Nova York, Sydney e Hong Kong, a Redação não é nada tradicional. É formada por "garimpeiros" e curadores de conteúdos. A equipe segue uma metodologia própria para separar o "som" do "ruído". Vale a pena adotá-la. As dicas estão disponíveis no blog do site storyful.com

"O jornalismo é, antes de tudo e sobretudo, a prática diária da inteligência e o exercício cotidiano do caráter." Cláudio Abramo (1923-1987)

"A coisa mais importante em comunicação é ouvir o que não é dito." Henry Anatole Grunwald (1922-2005)

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MIX A partir desta edição, a Press Advertising está com novo editor. O Altair Nobre, embora novo mesmo – só 46 aninhos – já está há 30 anos na estrada. Começou aos 16 anos como repórter do Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, onde ficou por três anos. Uma breve passagem pela Gazeta do Sul e se mandou para Porto Alegre, para fazer vestibular e estudar na Famecos, em 1990. No primeiro semestre da faculdade, fez estágio no Já Bom Fim e no ano seguinte ingressou em Zero Hora, fazendo radioescuta. Permaneceu no jornal do Grupo RBS por 20 anos, tendo sido repórter, editor e editor-chefe. Em 2012 partiu para novos projetos, como a primeira revista para iPad, especializada em cervejas

Roda Viva 3.0

Aos 30 anos, o Roda Viva deu boasvindas ao fenômeno dos youtubers. Reuniu Hugo Gloss, PC Siqueira, Dani Noce & Paulo Cuenca, Taty Ferreira e Cauê Moura para debater "Dilemas Contemporâneos" com o historiador Leandro Karnal e o filósofo Luiz Felipe Pondé. Para ilustrar, Carlos Ruas, do blog de tirinhas Um Sábado Qualquer. Pode ser visto em youtube.com/rodaviva

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Foto: Maurício Zanin/Divulgação

Revista Press AD com novo editor

artesanais — a Beer Art. Altair se especializou em projetos de visualização de dados, como a produção do conteúdo interativo do Museu do Municipalismo, que ocupará o terraço da nova sede da Confederação Nacional de Municípios (CNM), em Brasília. Ele foi, ainda, professor convidado do Programa Avançado de Jornalismo Digital, ligado ao Master em Jornalismo, em São Paulo, e minis-

trou cursos de férias, sobre edição, na ESPM Sul. Ele chega à Press Advertising para comandar uma nova fase da revista, que está chegando aos seus 20 anos e deve passar por uma nova reformulação gráfica e editorial. Aliás, essa é uma das marcas da revista, sua constante mudança. Em 2015 lançamos a Press Agrobusiness e, neste ano, a Press Santa Catarina, o que nos credenciou a sermos finalistas como Veículo do Ano, do Salão da Propaganda da ARP — o Jantar da Propaganda, durante o qual será conhecido o vencedor, será dia 8 de dezembro, na Casa NTX. Para março, mês em que completamos as duas décadas de circulação ininterrupta, devemos anunciar novidades para as revistas e novos produtos. Para isso, vamos contar com a competência e a experiência do Altair Nobre. Vida longa a todos nós.

RBS derruba paredes

Liberal quando convém

O Grupo RBS reagrupa times. O primeiro movimento é a formação do Grupo de Investigação (GDI), com experientes jornalistas de Zero Hora, Diário Gaúcho, Rádio Gaúcha e RBS TV. Outras novidades são a Central de Serviços, dedicada a reportagens que facilitem a vida do leitor, e Editoria de Segurança com jornalistas de ZH e DG.

A depender da Associação Nacional de Jornais, os brasileiros serão privados do conteúdo produzido em português no país por empresas estrangeiras. Para frear a concorrência de serviços como os de El País, BBC e The Intercept, a ANJ recorreu ao Supremo. Argumenta que portais de notícias devem ser regulados pela mesma legislação que rege jornais e revistas impressos – com o objetivo de “garantir que a informação produzida para brasileiros passe por seleção e filtro de brasileiros”. Mas parece que o real "crime" desses sites tem sido injetar qualidade no mercado editorial, mais opções de escolha para os leitores e alternativas de trabalho para profissionais talentosos (brasileiros, aliás).

Voz renovada Você notou que, desde 31 de outubro, a Voz do Brasil está diferente? A mudança ocorre nos primeiros 25 minutos, de responsabilidade do Poder Executivo (os demais 35 são de Legislativo e Judiciário). Há troca de apresentadores, quadros novos e uma busca de mais descontração e interação com o cidadão.


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Foto: Nidin Sanches/Divulgação

MIX Cunha na Justiça

O pulo da Canguru Convencida de que a crise não é do jornalismo impresso, e sim do modelo de negócio, Ivana Moreira criou uma revista mensal em papel em um nicho que todo mundo via mas ninguém enxergava: a comunicação entre escolas e famílias. Lançou a Canguru em outubro de 2015, cinco meses depois do fechamento da redação de Veja BH, da qual era editora-chefe. Carregada na mochila de 25 mil alunos de 150 escolas particulares da capital mineira e articulada com site - não sabe o que fazer com as crianças no fim

de semana? A Canguru sabe e indica -, coluna na rádio CBN e canal no Youtube, a revista em 10 meses alcançou o primeiro milhão em faturamento, embora ainda esteja no vermelho. "Chegar ao azul é uma questão de tempo", avisa Ivana, "e, principalmente, de escala." Belo Horizonte é só a primeira etapa. O plano é replicar o modelo em outras cinco capitais, começando por São Paulo, e transformar a Canguru na maior plataforma de conteúdo sobre primeira infância do Brasil.

Gaúcho de Caxias desde 1980 em Brasília, onde é difícil encontrar uma sucursal de jornal ou revista que não tenha comandado, Luiz Cláudio Cunha assumiu a Comunicação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O convite partiu da ministra Carmen Lúcia, presidente do Supremo. Nos últimos 12 anos, o jornalista estava no Senado como assessor especial e conselheiro político (10 anos com Pedro Simon e, recentemente, dois com Randolfe Rodrigues). No CNJ, trabalha em linha com Mariângela Hamu, designada para a Comunicação do STF.

Cursos do Facebook Por muitos já apontado como o mais poderoso "editor" do mundo, o Facebook também passa a ser formador de jornalistas. Independentemente das polêmicas da iniciativa, os cursos são uma oportunidade. Online e gratuitos, dividem-se em três pilares: descoberta de conteúdos, criação de histórias e construção de uma audiência. As aulas, de início apenas em inglês, estão disponíveis por meio do Blueprint, plataforma global de e-learning do Facebook. O caminho é: www. fb.com/blueprint/courses/journalists

Mais negócio, menos arte

Efeemização

Mesmo sendo o maior jornal em circulação nos EUA, com cerca de 1,5 milhão de exemplares em papel e 900 mil assinaturas digitais, o Wall Street Journal sente o declínio de anúncios em sua versão impressa. Para se adaptar, optou por uma cirurgia profunda no papel. A reforma, que impacta os leitores a partir da segunda quinzena de novembro, reduz o espaço para artes e notícias locais e preserva o principal foco do diário, a cobertura de negócios. Com o enxugamento, seções serão fundidas.

Entrar na faixa FM é um desejo de oito em cada 10 AMs (das 1,8 mil emissoras, 1,4 mil pediram para migrar). Na lista das 189 rádios prontas para formalizar a migração no Planalto no Dia do Radialista (7 de novembro), chama a atenção a baixa presença de emissoras gaúchas: apenas cinco. Bem menos do que Minas (22), São Paulo (19), Santa Catarina (17) e Paraná (14). As gaúchas: São Roque (Faxinal do Soturno), Litoral (Imbé), Diplomata (São Marcos), Maristela (Torres) e Tapejara (Tapejara).

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Rua Riachuelo, 1482. Porto Alegre, Centro. Fone: 3225-1125 | www.atelierdemassas.com,br

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CARTA AO LEITOR

Fazer sentido é preciso Altair Nobre

A

viso aos navegantes e não navegantes: nem o sertão vai virar mar, nem o mar vai virar sertão. A quem percebe os meios tradicionais como um terreno árido, com os dias contados para serem tragados pela revolução digital, cuidado. Os veículos impressos consistentes têm futuro, em proporção inversa aos digitais irrelevantes. O tema de capa desta edição foge da ideia de uma sentença de morte para o jornalismo em meios analógicos. O objetivo, em lugar disso, é orientar quem migra – forçada ou espontaneamente – de um ecossistema para o outro. É servir como uma bússola para os profissionais jogados no oceano digital, onde as regras, as práticas e as armadilhas são impiedosas com os desavisados. Assumi o desafio de tratar esse assunto com profundidade e utilidade dignas de uma revista com 173 edições de História. Afinidade com a matéria não me falta. De certa maneira, a comunicação é uma obsessão para mim há exatas três décadas, desde o Jornal do Povo, em Cachoeira do Sul, onde comecei como repórter com 16 anos e muitas certezas, escasseadas com o tempo. Entre a Remington à qual eu datilografava e o MacBook no qual eu digito este texto, vivi o jornalismo de diferentes formas, todas intensas, seja como estudante da Famecos estagiário no Já Bom Fim por seis meses, seja como repórter, editor e editor-chefe na Zero Hora por 20 anos, seja como criador de revista em iPad e empreendedor digital há quatro anos. Na travessia, estive carregado de incertezas, algumas substituídas por descobertas ou revogadas por decepções, mas uma convicção ao menos fortaleci. Escrever não é preciso. Fazer sentido é preciso. A Press & Advertising, tem vida longa porque faz sentido. Trabalha, e muito, para produzir um conteúdo de reflexão, adequado ao seu meio. Com a revolução digital, multiplicam-se os canais, mas nenhum revoga a lógica da comunicação: informar da maneira mais adequada e eficaz possível conforme a vocação da mídia. Ajudar o leitor na jornada é o que move a reportagem de capa desta edição.

SUMÁRIO 3

Almanaque

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Mix

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Mix

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Carta ao Leitor

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Entrevista: Cláudio Humberto Rosa e Silva

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Capa: Manual de sobrevivência no Jornalismo

22 Clube de Opinião: Eliseu Padilha 24 Grandes Nomes: William Randolph Hearst 28 Opinião: Paulo Gilvane 29 Opinião: Mario Rocha 30 Galeria: Eike Batista

Diretora-Executiva NELCI GUADAGNIN

RUA SALDANHA MARINHO, 82 PORTO ALEGRE - RS CEP 90160-240 FONE/FAX (51) 3231 8181

Editor ALTAIR NOBRE

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Diretor-Geral JULIO RIBEIRO

Diagramação/ Arte Final ESPARTA DESIGN Imagens: Fotografia: Jefferson Bernardes/ Agência Preview Assinaturas atendimentoad@terra.com.br Impressão COMUNICAÇÃO IMPRESSA

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Comercialização PORTO ALEGRE: (51) 3231 8181 e (51) 9971 5805 com NELCI GUADAGNIN PRESS e ADVERTISING SÃO PUBLICAÇÕES MENSAIS DA ATHOS EDITORA, COM CIRCULAÇÃO NACIONAL, SOBRE OS MERCADOS DE COMUNICAÇÃO E IMPRENSA BRASILEIROS. OS ARTIGOS ASSINADOS E OPINIÕES EMITIDAS POR FONTES NÃO REPRESENTAM, NECESSARIAMENTE, O PENSAMENTO DA REVISTA.


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ENTREVISTA

ENTREVISTA CLÁUDIO HUMBERTO ROSA E SILVA Julio Ribeiro

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“O Brasil está à procura de um líder”


ENTREVISTA Com o estilo “Bateu, levou”, o alagoano Cláudio Humberto Rosa e Silva testemunhou como espectador privilegiado a construção e a destruição de um presidente. Assessor de imprensa de Fernando Collor de Mello desde a época em que o então candidato a governador de Alagoas mal chamava a atenção do país (1986) e porta-voz dele na Presidência (19901992), retratou no livro Mil Dias de Solidão a ascensão ao Palácio do Planalto e o ocaso. O jornalista, que atua no Grupo Bandeirantes, em telejornal, programa diário de rádio, coluna em jornais e no site Diário do Poder, recebeu em Brasília o publisher da Press, Julio Ribeiro, para esta entrevista, na qual faz um paralelo entre o primeiro e o segundo impeachments. Acompanhou os bastidores do primeiro como porta-voz até 6 de março de 1992 (a renúncia de Collor, véspera da condenação, ocorreu em 29 de dezembro) e os do segundo, de Dilma Rousseff, como colunista.

Foto:Andressa Anholete, Metro/Divulgação

Tem aquela máxima: a história se repete como farsa ou como tragédia. Tu viste por dentro o início da decomposição de um governo. Quais eram os sinais de que aquele governo perdia base no Congresso e na sociedade e poderia desembocar em um processo de impeachment? Foram governos que nunca conseguiram consolidar sequer uma base de sustentação sólida, confortável, que permitisse aprovar matérias de seu interesse. Collor naquela ocasião – comportamento que ele já não tem hoje – tinha uma atitude em relação aos aos parlamentares muito semelhante à da Dilma. De um certo pudor em relação a se relacionar com os políticos. Até um certo asco. Mas havia diferenças fundamentais. Collor vinha de uma família de políticos. Dilma não. Vinha, mas ele chegou ao poder como um outsider da política. Foi eleito por si próprio. Se recordar o apoio que Collor tinha quando fez a campanha presidencial, era quase nenhum. Eram gatos pingados, e a maioria até oportunista. Havia uma comunicação direta dele com o povo, com o eleitor, e isso o levou à Presidência da República. Dilma não. Chegou num projeto de poder do PT. Collor era filiado ao PMDB, foi deputado federal e governador pelo PMDB, mas na hora da candidatura o PMDB escolheu o Dr. Ulysses. Para viabilizar

a candidatura, ele teve de se filiar ao então Partido da Juventude, que praticamente não existia, e esse partido mudou de nome para Partido da Reconstrução Nacional. E a campanha, nós todos criamos a logomarca, o slogan. Tu estavas lá desde o início? Desde o início lá em Alagoas, quando eu era secretário de Comunicação dele. E Dilma perdeu essa sustentação no PT. A diferença dos dois era que Collor tinha um certo desprezo pela classe política, mas não o manifestava. Ela não só manifestava a ojeriza à classe política, mas também é uma pessoa grosseira, mal-educada. Fazia questão de parecer rude em relação aos políticos, inclusive da própria base de apoio. Jamais recebeu o senador Suplicy, uma das figuras mais queridas do Brasil, independentemente da filiação partidária. Porque não gosta dele. Ela achava que não precisava se relacionar com políticos. E, assim como Collor, caiu porque não se relacionava com o Congresso: os políticos tiveram grande dificuldade de obter audiências com o presidente. Só que Collor, quando recebia ou encontrava os parlamentares, sempre tratava-os com muita cordialidade. Ele é um gentleman. Nunca vi, em toda a minha convivência com ele – e a convivência foi estreita –, nenhum gesto de grosseria dele com absolutamente ninguém. Ao contrário dela. Ela é grosseira 24 horas por dia. O relato dos comandantes dos aviões de que ela raramente cumprimentava… Tem um relato mais recente, de um livro muito interessante de José António Saraiva, que foi diretor de Redação do semanário Expresso, a publicação mais importante de Portugal. Um dos relatos é com o ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, que acabou de sair do cargo. Quando se refere a Dilma, usa todas as expressões e adjetivos que acabei de mencionar. Ela foi capaz de grosserias em Portugal com o governo de um povo muito elegante. Eles são muito educados, muito cuidadosos na recepção a um visitante, sobretudo quando o visitante é presidente do Brasil. A Dilma chegou ao ponto de, em visita oficial, primeiro visitar próceres de oposição para depois concordar em conversar

com o primeiro-ministro. Há outras histórias no livro, como o fato de ela, dois anos depois de eleita, em 2012, ignorar quem é o presidente de um país que é irmão do Brasil. Em 2012, durante uma cúpula de chefes de estado e de governo ibero-latino-americanos, ela conversou longamente com o então presidente de Portugal, o Cavaco Silva, em portunhol. Ela tentando falar espanhol, como se ela não soubesse que ela estava conversando com o presidente de Portugal. É uma mistura de ignorância e grosseria. Nem a assessoria para ajudar… Ela não se deixa assessorar, sobretudo por diplomatas, que ela detesta. Digamos que ela fosse o contrário disso: gentil, educada, cuidadosa nas relações pessoais, assim mesmo ela teria caído. Porque o motivo foi a corrupção, ou não? A dificuldade de derrubá-la teria sido muito maior se ela fosse uma pessoa de relacionamento no mínimo cordial com a classe política. Quando ela ainda estava no primeiro mandato, no PT havia um movimento “Volta, Lula” . E se diz que havia um jogo por trás das cortinas para que o candidato na eleição passada fosse Lula, e não ela. Havia uma ânsia no PT de se livrar dela. Eu me lembro que, às vésperas da nomeação de Marcelo Crivella para o cargo de ministro da Pesca, almocei com o senador, e ele me falou que estava empenhado nesse movimento “Volta, Lula”. E ele me contou vários casos de como ela era mal-educada, grosseira. Em seguida, por contingências político-partidárias, ele acabaria sendo nomeado ministro. Há quem diga que o impeachment da Dilma era publicamente rejeitado pelo PT, mas intimamente bem-vindo. Basicamente a mesma turma, uma turma significativa do PT, que fazia o movimento “Volta, Lula” no final do primeiro mandato da Dilma, começou a fazer corpo mole no impeachment, pensando “Ela cai fora, e a gente volta com o Lula”. Só que não contavam com envolvimento do Lula tão profundo nas maracutaias reveladas pela Lava Jato.

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Foto: José Cruz/Agência Brasil

Foto: Elza Fiuza/Agência Brasil

ENTREVISTA

Em 1992, o primeiro presidente eleito depois do regime militar deixa o posto

As recentes eleições municipais demonstraram que os 54 milhões de votos aludidos pela Dilma, de salvaguarda do cargo, se esboroaram. Até publiquei na minha coluna. Fizemos um levantamento. O número de votos dos senadores que condenaram Dilma e a tiraram do cargo em definitivo vai a 86 milhões. É um número muito mais expressivo do que os 54 milhões dela. Ela não pode fazer uma alegação como essa, do mesmo modo que os 35 milhões de votos de Collor na ocasião, que era a maior votação que alguém já havia obtido no Brasil, também viraram pó com o impeachment. Mas o resultado eleitoral de agora foi contundente. Das 200 maiores cidades brasileiras, o PT foi alijado de todas. O PT perdeu dois terços das prefeituras que tinha. E o que sobrou foram prefeituras do chamado Brasil profundo. Você não encontrará prefeituras muito expressivas. Qual o futuro dessa corrente de esquerda e qual o futuro do PT? O PT inexoravelmente acaba. É um partido em definitivo vinculado a questões como corrupção. A associação que se faz é imediata.

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Em 2016, a primeira mulher eleita para a Presidência sofre impechment

Tanto que na campanha não usaram nem a estrela nem o nome do partido. Não estão usando nem a cor. O prefeito eleito em Rio Branco usava a cor laranja, para evitar o vermelho. E não usava o 13 na campanha. Nem a estrela. O PT acaba. A não ser que mude de nome. Mas mudar de nome talvez não seja uma boa ideia, se a gente verificar o exemplo do DEM, antigo PFL. Já foi o segundo maior partido do Brasil, mudou de nome e hoje é um partido com 28 deputados, se tanto [no momento da entrevista, são 27]. Teve 117 deputados. Onde vão desaguar esse voto e esse político que militava no PT. No PSOL? As sequelas deixadas pelo PT são muito profundas. Este é talvez o maior mal que o PT causou à cena política: colocar na expressão menos significativa as correntes progressistas do país. Isso aponta para que custo daqui a dois anos? O atual governo terá cacife para ter um candidato viável? Geraldo Alckmin? A impressão é de que a eleição presidencial está nas mãos do PSDB. O problema é que o PSDB não se entende. Tem três caciques… Tem três caciques, e todos eles querem a

mesma coisa. Eles não se entendem, se detestam, se desprezam, apesar das aparências. Alckmin não gosta de Aécio, que não gosta de Serra, que não gosta de Alckmin. Eles não se dão, e isto os afasta de uma vitória. Ou eles encontram um nó que una os três. Hoje um amigo estava falando: “Esse nome pode ser o Fernando Henrique Cardoso”. Mas eu acho que a idade não recomenda. E acho que ele está de saco cheio. A impressão que tenho é que Serra é o nome mais competitivo dos três. Porque tem o recall da campanha anterior. Pode ser um nome que una o PSDB e o PMDB, e aí ele vira uma candidatura forte. Mas, quanto mais você vê Serra de perto, menos você gosta dele. Caso este governo surpreenda positivamente, e até 2018 o país volte a crescer, e os empregos voltem a surgir, há possibilidade de Temer ser candidato? Almocei com ele esses dias e confrontei: “Presidente, se der tudo certo e o senhor fizer um governo que ganhe o reconhecimento da opinião pública, o senhor tem de levar em conta que o PSDB e o PMDB vão a sua porta pedir que o senhor seja o candidato da união dos dois partidos”. Ele usou um argumento que me pareceu muito plausível e sincero: “Sou um homem de certa idade. Tenho um filho pequeno, com quem preciso conviver mais.


Foto: Divulgação

ENTREVISTA

Cláudio Humberto se divide entre diferentes mídias

Tenho um neto mais ou menos da idade dele com quem preciso conviver mais. Tenho uma esposa jovem. Sou casado de novo. Tenho uma vida pessoal. Mereço uma privacidade que eu não teria se enveredasse por um novo mandato”. Mas, se ele não for candidato, e se der tudo certo, a bênção dele será importantíssima. Acho que essa é a maior pretensão dele: ser um eleitor decisivo. Agora, não vejo lideranças no PSDB. Isso é o que dá chance para uma alternativa mais à esquerda, e também à direita. Há esse risco. Se o centro não se entende, vai sair algum fenômeno de algum lugar. Não existe espaço vazio em política. A direita tem outros nomes além de Bolsonaro? É uma direita mais populista, mais popular. Ele é aquilo que a gente conhece. Não conheço ninguém que desejasse o nosso Brasil presidido por Bolsonaro. Mas ele é uma figura em quem é preciso prestar atenção. E que outros nomes a direita poderia cacifar? Fala-se no Ronaldo Caiado. Já passou o momento dele? Caiado tem uma limitação grande. Seria um candidato de um espectro conserva-

dor muito mais interessante que Bolsonaro mas não tem a mesma dimensão popular. Bolsonaro, além de querer ser candidato, se comporta como tal. Viaja frequentemente para os estados do Norte e do Nordeste. Aonde ele chega, tem uma grande receptividade, de candidato nacional. Ele não seria um bom candidato para a esquerda enfrentar? Vai depender que candidato a esquerda vai ter. A Marina talvez. Minha impressão é que a Marina deixou passar o tempo dela. Mas ela é a figura mais interessante na esquerda. O jornalismo passa por uma crise conceitual. Qualquer um pode ter um blog, um jornal online, mas ao mesmo tempo parece que se perdeu o senso da qualidade. Também não nos faltam líderes no jornalismo? Faltam referências. Ainda temos grandes jornalistas no Brasil. Se faz um jornalismo aqui muito parecido com o que há de melhor no mundo todo. É uma das áreas de excelência do Brasil. Mas e quanto aos novos veículos, a internet?

É uma das mazelas dos tempos modernos. Vivemos um tempo em que é mais importante que a pessoa saiba primeiro sobre determinado fato do que a forma como aquele fato chega a ela, ou seja, a qualidade da notícia bem elaborada. Há uma corrida tão desenfreada pelo furo, pela notícia em primeira mão, que acabam negligenciando a qualidade. Por outro lado, há um espaço para os curadores, os editores, como Cláudio Humberto, que apontam se a notícia é fidedigna. Há algumas referências. Saboreio cada letra de um texto de Elio Gaspari, de Mino Carta. Posso não concordar com o que o jornalista escreve, mas temos jornalistas de altíssimo nível, como são esses dois casos. Foram referência na nossa geração, assim como outros valores estão surgindo e vão se consolidando. Tenho muitas críticas a fazer à qualidade dos cursos de comunicação, por exemplo. É crescente o problema de encontrar valores, de jovens jornalistas bem formados. Mas eles existem. Tenho oportunidade de trabalhar hoje com jovens muito bem formados, meninos que escrevem bem porque adquiriram o hábito da leitura desde cedo, que falam inglês, outros idiomas.

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ENTREVISTA Tu estás fazendo rádio, tens o blog, a coluna em dezenas de jornais brasileiros. Para cada mídia dessas, há um tipo de informação diferente, ou é a mesma informação, só tratamento é diferente? O que dá mais prazer? Sinto um prazer quase sexual de trabalhar em todas as áreas. Tenho muita dificuldade de me sentir fisicamente cansado, e o cansaço, quando aparece, é prazeroso. Faço televisão. Tenho um telejornal às 12h30min, tenho um programa diário na Rádio Band News FM, tenho um programa diário na Rádio Bandeirantes de São Paulo, no fim da tarde, tenho o site Diário do Poder, tenho a coluna e o jornal Metro. A minha amiga Belisa Ribeiro, que tem uma carreira brilhante como jornalista e hoje virou mãe do Gabriel O Pensador, me disse que tenho uma agenda “Escrava Isaura”. Levaste muitos processos? Já, mas isso é parte do jogo. Não toma processo quem não ousa. Lido com noticiário político. Cada denúncia que eu publico, e elas são diárias, resulta numa situação constrangedora para quem é denunciado. E em quase todos os casos o cara processa para dar uma satisfação em casa. Não é apenas ao eleitorado. É para chegar para a mulher dele em casa e dizer “Processei o cara”. A matéria de capa de uma das nossas edições recentes foi “A imprensa que sabia de menos”. Com todo o convívio da imprensa com a Petrobras e os órgãos do governo, nenhum jornalista pensou em investigar seriamente, por exemplo, as denúncias que Paulo Francis fez lá atrás contra a Petrobras. Vista grossa? Eu, por exemplo, há mais de dois anos publiquei a primeira denúncia sobre a maracutaia de envolvimento do BNDES no financiamento de obras da Odebrecht no Exterior. Foram dois anos para que essa coisa se transformasse no que se transformou. Sempre houve financiamento do BNDES em obras no Exterior. Só que tem de passar pela aprovação do Senado. É uma chateação, é demorado. Tem de passar nas comissões. Nunca é prioridade. Eles criaram o crime perfeito, como eles próprios chamavam, de brincadeira, entre eles. Como funciona: Lula, acionado frequentemente pelas

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empreiteiras como presidente e depois como ex-presidente, ia para países como Angola, Cuba… Como relações-públicas... Não, como lobista mesmo. Lobista de luxo. Ia já com a informação identificada pela empreiteira. Aconteceu, por exemplo, na Guiné Equatorial, onde um ditador herdou a ditadura do pai dele. Chegou ao ditador e disse: “Olha, estou sabendo que o senhor pretende construir um aeroporto novo. O Brasil vai financiar o seu aeroporto. Com juros camaradas, prazo de carência de 25 anos. Só tem um condição. O Brasil indica a construtora”. Daqui a 25 anos, quando o povo começar a pagar, eu já morri. Vou entrar para a história por ter feito esse aeroporto. A partir dali o Brasil firmou um termo de cooperação bilateral, com a chancela da embaixada no país estrangeiro. Vinha para o Brasil, o BNDES já era cientificado. O acordo já trazia a contratação da Odebrecht, e o dinheiro saía do Tesouro, ia para o BNDES a 11%, o BNDES emprestava ao país amigo a 6%. Um spread negativo de 5%. O dinheiro não saía do país. Era depositado em reais na conta da Odebrecht. O ditador também não via a cor do dinheiro. Havia um entendimento de corrupção da empreiteira com o ditador, mas o grosso que bancava a obra era depositado em reais na conta da empreiteira aqui. Foi assim que se contraíram hidrelétricas de 14 bilhões nos últimos anos, 3 bilhões só agenciados pelo Lula em Angola – essa é a denúncia do Ministério Público. Tem hidrelétrica na República Dominicana. Tem o porto de Mariel em Havana e por aí afora. Tu denunciaste há dois anos. Por que nenhum outro veículo foi atrás e investigou a fundo? A partir daí alguns veículos, meses depois, começaram a botar uma matéria ali, outra lá. Os parlamentares acabaram tomando conhecimento. Para eles era fácil. Era só ter uma conversa franca, em off, com qualquer diplomata de qualquer um desses países onde o Brasil fez esse tipo de negociata. Eles contavam. Os diplomatas são funcionários de Estado. São homens e mulheres de bem, honestos, que viam ali flagrantemente o

que estava acontecendo. Para jornalista era mais difícil. Parlamentares acabaram conseguindo essa confirmação. Como aconteceu com a minha coluna, Diário do Poder, também houve no Estadão, na Folha, no Globo, denúncias envolvendo a Petrobras. O problema é que ninguém sabia ao certo. A Petrobras se blindava por ser um dos principais anunciantes do Brasil. Petrobras, Caixa, Banco do Brasil financiam tudo. Só não patrocinaram nada aqui comigo. A gente percebia um certo cuidado em mexer em órgãos como esse. É preciso lembrar que o juiz Sérgio Moro e o Ministério Público atiraram no que viram e acertaram no que não viram. Aquele posto de gasolina que tinha um doleiro... Que é aqui na rua seguinte. Na sobreloja do posto com uma lava jato, funcionava uma loja de câmbio. É um posto superconhecido na cidade porque vende gasolina mais barata. Eles prenderam Alberto Youssef, o alvo principal da operação, porque ele já era reincidente. Tinha sido condenado por irregularidades na época do Banestado. Fez acordo de delação premiada. E voltou a cometer os crimes. A polícia montou uma operação para pegá-lo. Quando prendem ele e fazem a busca e apreensão, encontram registros da relação dele com Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras. Na mesma operação, eles tinham um mandado de condução coercitiva de Paulo Roberto Costa. Levado para depor, ao sair do depoimento, ele liga para a família, genros, filhas e tal, e manda irem ao escritório dele e limpar tudo. A questão era que ele já estava grampeado a essa altura. Quando a polícia escuta ele mandar limpar tudo, vai ao escritório dele, prende filha, genro, todo mundo, com a sacola cheia de papéis. Ele, então, é preso, e a família, acusada de tentativa de obstrução de Justiça. De apenas uma testemunha, suspeito chamado a depor sobre Alberto Youssef… Virou réu. Pior do que ele ter virado réu, a família virou ré. Ele fez um acordo de delação premiada para livrar a família de ser responsabilizada. Nós temos mais sorte do que juízo, então...


ENTREVISTA Na delação premiada, Paulo Roberto Costa conta tudo. O pai da operação Lava Jato é Paulo Roberto Costa.

Por que tu achas que até agora ele não foi preso? Indícios têm de sobra. Isso me intriga também porque tem muita gente que está presa há mais de um ano. O que pesa contra essas pessoas é tanto quanto o que pesa contra o Lula. Ele tem coisas mais graves ainda. Além de tudo, há depoimentos muito concretos: papel, troca de mensagens. O Brasil sai melhor disso? O Brasil já melhorou muito depois disso. É só verificar o resultados das eleições. As pessoas mais claramente vinculadas a esses escândalos foram punidas pelas urnas. Em quase cinco anos em Portugal, conviveste com a imprensa europeia. Há uma injustiça que alguns “ólogos” fazem ao dizer que o Brasil é assim porque nossa colonização é lusitana, e não germânica, ou anglo-saxã. Isso é uma masturbação sociológica. Portugal é um país muito sério. Também tem políticos corruptos, como qualquer país mundo afora. A diferença é que, quando eles foram pegos, foram punidos severamente. Saíste do governo Collor antes do impeachment. Voltaste cinco anos depois e retomaste a carreira… Criei um site, o primeiro do gênero. Era uma coluna política. Na época não havia a expressão blog. Foi há 18 anos. Sentiste algum preconceito do tipo “O Cláudio Humberto era o homem do Collor”? Quanto hoje tu te sentes livre para criticar a direita, a esquerda, o centro, o lado... Sempre exerci a minha profissão com

Foto: Divulgação

Tu acha que Lula vai ser preso? Acho. Nas três ações em que ele foi transformado réu, se ele for considerado culpado, a pena máxima somada é 56 anos de cadeia. É só o começo. É bom lembrar que Lula foi citado em depoimentos de delatores e testemunhas 96 vezes. Não sei se vão gerar 96 inquéritos, mas há 96 referências que comprometem Lula.

Jornalista planeja um novo livro de histórias da seção "Poder sem Pudor"

absoluta independência. Fui secretário de imprensa e agi com idêntica independência. Coincidiu com o fato de que a minha atitude como porta-voz do presidente era o que ele queria que fosse feito. Ele nunca me desautorizou. Muito pelo contrário: até me prestigiava muito. Antes de ser porta-voz, eu era jornalista na Província, na minha cidade. Fui colunista. Fui diretor de Redação de jornais. Tento fazer o melhor como eu faria se eu fosse um bancário, um padeiro. Sempre procurei me ver de fora. Foi uma lição que meu pai deu certa vez quando fui exercer o primeiro cargo de chefia, muito jovem ainda. Meu pai era um homem de esquerda e sempre teve grandes preocupações com burocracia. Era a grande incompatibilidade que ele tinha com o Partidão, os burocratas do partido. Ele me recomendou: “De vez em quando, você atravessa a rua, vá no orelhão mais próximo e de lá tente falar com você ao telefone, vê o que acontece”. Fiz isso, duas ou três vezes. Deu para medir o grau de dificuldade que há no Brasil de você como cidadão falar com o gestor de qualquer lugar. Em Portugal, quando morava lá, criei uma pequena revista mensal de informática e tinha uma demanda com um banco, de trocar promissória, cheque pré-datado. E eles não faziam isso. O gerente não

conseguia entender o que eu queria. São muito cartesianos. Fiz um fax para o presidente do banco. Na época não havia e-mail ainda. Em 15 minutos recebi o telefonema da secretária dele. O interesse dele era que eu, como cliente, me sentisse atendido. Algum livro no prelo? Tenho a pretensão de reunir em livro outra vez histórias de uma seção que tenho em minha coluna, Poder sem Pudor. Histórias interessantes, engraçadas. O primeiro livro fiz com 500 histórias. O segundo, talvez, eu faça um pouco maior. De onde vêm as tuas histórias? Das mais variadas fontes. São histórias que me contam. Que eu extraio de reportagens, de livros. Certa vez juntei quatro ou cinco histórias e liguei para o embaixador José Aparecido para confirmar aquelas que eu tinha sobre ele. Como tínhamos jornalistas que eram grandes ficcionistas, descobri na apuração de muitas histórias que elas não aconteceram. Liguei para o José Aparecido, ele foi embaixador em Lisboa, convivemos muito proximamente, ficou grande amigo meu. Ele me respondeu: “Eu conheço essas histórias, já vi publicadas, são ótimas, mas nenhuma aconteceu”. Foi uma frustração.

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REPORTAGEM DE CAPA

Manual de sobrevivência no jornalismo Em meio ao oceano digital, produzir conteúdo impõe regras, práticas e habilidades pouco perceptíveis a um olhar superficial sobre a rede

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Next Issue Midia

REPORTAGEM DE CAPA

Preservação: num ecossistema dominado por Google e Facebook, é preferível a posição de peixe-rêmora, a ser devorado pelos predadores

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arregado de experiência e talento, o jornalista de uma empresa de tradição é jogado ao mar digital pela tempestuosa mudança no mercado de trabalho. Ainda atordoado, monta um blog com a ajuda de um ex-colega mais jovem e compartilha nas redes sociais posts de seus textos inaugurais no endereço virtual. Sabe qual o provável efeito desse esforço? Nenhum. Navegar na era digital impõe regras, práticas e habilidades pouco perceptíveis a um olhar superficial sobre a internet. O perigo para quem desconhece esses rituais é sucumbir a frustrações e interpretar o momento como o fim da profissão. Aos pessimistas, à deriva entre as águas revoltas da transição nos modelos de negócio, uma notícia importante: o emprego pode encolher, mas o ofício sobrevive à tempestade. Não sem sofrer uma metamorfose. Exige um aprendizado, com alguns preceitos a serem detalhados a seguir. Antes, fique claro: não é a finalidade deste texto disseminar o uso acrítico de técnicas e relegar o debate ético, e sim demonstrar o quanto é vital compreendê-las, até para saber como reagir às ondas, por uma questão de sobrevivência profissional.

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Primeiro, uma volta no tempo, quando publicar uma notícia era torná-la pública, como sugere o verbo. O centro do sistema era o veículo (jornal/revista, rádio ou TV aberta), com uma audiência estável, em geral fiel, não raro passiva. Uma inversão desse movimento, na era das redes sociais, das plataformas colaborativas e dos serviços de streaming, coloca os veículos na órbita do consumidor da informação. Os meios se multiplicam, a competição se acirra em busca de uma audiência infiel, e em geral proativa. Agora, na maior parte dos casos, quem publica algo pouco torna de fato público o conteúdo. Porque, para isso, falta algo básico: ser notado. Se a comunicação é um oceano, quem ignora o marketing digital hoje vive em uma espécie de Mar Morto, sem ser percebido pelo público alvo de seu conteúdo. Inevitável comparar a tubarões o Google e o Facebook, pelo poder conquistado e pela forma como atuam. Como é preferível ser o peixe-rêmora, beneficiado com o avanço dos predadores, a ser devorado por eles, é preciso entender a lógica própria do ecossistema digital e, assim, se proteger e, quem sabe, ter a chance de prosperar.

Um editor influente: o motor do Google Em Who Owns the Future? (Simon & Schuster, 2013), Jaron Lanier chama as megaempresas da web de "Siren Servers", comparadas às "Sereias de Ulisses" e seu canto sedutor, descritas no poema épico Odisseia, atribuído ao grego Homero, oito séculos antes de Cristo. Com algoritmos desenhados conforme seus interesses comerciais, corporações do Vale do Silício ditam o que será destacado ou ocultado. Ao inspirar táticas de adaptação, moldam inclusive a forma de apurar e escrever. Um exemplo é o manual de redação da Blasting News, organização lançada há apenas três anos (agosto de 2013) e hoje "líder mundial em jornalismo participativo". Quando esta reportagem de capa da Press começou a ser produzida, no início de outubro, era o 177° site mais acessado do mundo. Quando foi concluída, na última semana do mês, já era o 169º. Ao propor com exclamação "Ganhe até R$ 500 por artigo" e dar dicas de como potencializar a chance de atingir a meta, mostra como se dá a concorrência pelo acesso ao leitor.


Ler as dicas dessa plataforma de "Notícias Explosivas" é como percorrer uma pauta escrita não pelo chefe de reportagem, e sim por um impessoal editor, o motor de busca do Google. A começar pelo tema (o passo 1 é "Entre no Google Trends para descobrir os temas quentes"). Escolhido o assunto, a sugestão da Blasting News é a de escolher as palavras mais relevantes, não no Dicionário de Sinônimos, mas no Google Keyword Planner. A ferramenta aponta as palavras-chaves mais buscadas na web no contexto da pauta. "A mais buscada será incluída no título do seu artigo, assim como em negrito no primeiro parágrafo da sua matéria", orienta. Como um texto se faz com mais de uma palavra, o terceiro passo sugerido pela Blasting News é usar as ferramentas Ubersuggest e KeywordTool.io para encontrar palavras-chave relacionadas à principal. A inteligência artificial ganha feições humanizadas: "É importante que você inclua palavras-chave relacionadas para 'ajudar' o Google a entender melhor do que trata seu conteúdo e conseguir classificar seu artigo quanto melhor possível". O Guia Blaster completa: "Tente dar ao seu conteúdo um ponto de vista único. Não se limite a relatar a notícia: tente utilizar algumas palavras-chave específicas relacionadas frequentemente procuradas no Google. Isso ajudará você a diferenciar seu artigo dos outros que tratam o mesmo tema, melhorará seu conteúdo e o posicionamento no Google por termos relacionados. Se relatar apenas uma notícia, você está dizendo ao Google algo que já 'sabe' (a não ser que seja uma notícia de última hora)." Concluir o texto e postá-lo na rede mundial de computadores é apenas a metade do caminho. A segunda parte é promover o conteúdo nas redes sociais, para obter mais leitores. Quem lida com comunicação pela internet se acostuma a viradas nas marés e ao surgimento de novas ilhas, mas algumas rotinas estão consagradas, como as de compartilhar o texto em grupos de discussão do assunto no Facebook e/ou criar uma página

Provocação: em vídeo, a Blasting News compara o jornalismo de ontem, "centralizado", com a de hoje, "meritocrático"

para ter um público de leitores fidelizado com rápido acesso aos seus artigos e no Twitter usar hashtags com relação ao enfoque e assim estimular o aumento no número de cliques para o tweet. Com técnicas bem adotadas, se o conteúdo é interessante, o autor tem mais chance de atrair leitores sem pagar por impulsionamento e assim se tornar viável o negócio, pois a internet está longe de ser a mina de ouro idealizada. Para efeito de comparação, sabe quantas vi-

sitas únicas um artigo sobre temas de política e economia requer para garantir os R$ 500 prometidos pelo Blasting News? São 25 mil, dentro do prazo de 30 dias, e não está se falando em quem curte um post no Facebook sem dedicar muita atenção, e sim quem entrou no link da matéria. Não é fácil atrair o olhar de 25 mil leitores, disputado por títulos como "Vexame de Paula Fernandes em duo com Andrea Bocelli" ou "Veja como remover a sua verruga rapidinho".

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REPORTAGEM DE CAPA

Reorganização: a reportagem ressurge na internet em uma nova forma de relação com o veículo, no caso a BBC Brasil

Gestão passa a ser bem-vinda Ao celebrar o ceticismo e a independência, ambos bem-vindos à profissão, jornalistas em grandes redações fortaleceram uma cultura avessa a patrões. Com isso forjaram, porém, um ranço contra gestão, empreendedorismo e atuação empresarial. É hora de aposentar esses preconceitos. A reconfiguração do mercado exige uma postura empreendedora, especialmente de quem ganha a vida como freelancer. A demanda por conteúdo não acabou. Mas a produção está mais descentralizada e a recompensa mais voltada a "meritocracia", embora essa palavra nem todos apreciem. Aliás, ambos os conceitos fazem parte do vídeo de divulgação do Blasting News, com direito a uma imagem provocativa: uma Redação ao moldes antigos, com redatores com rostos sem olhos, nariz e boca, e sobre essa cena de fundo os dizeres "Yesterday journalism was centralized" ("Ontem o jornalismo era centralizado"). O jornalista assume preocupações antes alheias ao seu cotidiano ou relegadas:

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distribuição do conteúdo, conversa com o público, eficiência na escolha da pauta e viabilidade econômica. Em lugar de Redações e Sucursais formais, novas formas de redes de colaboradores se estruturam. Em lugar de currículos, importa mais a qualidade da pauta. É o foco do escritório brasileiro da respeitada BBC, que em busca de boas histórias, vem selecionando sugestões. Se forem interessantes e viáveis e passarem pelo crivo dos editores, combinam-se o valor e a data de entrega. O propósito do veículo britânico é ampliar a diversidade regional do conteúdo, trazendo, com boas e surpreendentes histórias humanas, de preferência fora do eixo Rio-São Paulo-Brasília, mas com impacto nacional. Um detalhe relevante é a o requisito de, além do texto bem escrito, terem boas imagens (vídeos são bem-vindos). Dentro desse projeto, Paula Sperb produziu a reportagem "Agrotóxicos, depressão e dívidas criam ‘bomba-relógio’ de suicídios no RS". Este é o início do texto:

A família de agricultores acordou cedo e tomou chimarrão naquela manhã quente de 21 de dezembro de 2013. A mãe fez bolinhos para o lanche e iniciou o preparo da lentilha para o almoço. Mas, quando Simone Rovadoski, de 39 anos, saiu da casa para ajudar o marido José Dell Osbel, de 44 anos, no cultivo dos 48 mil pés de tabaco da família, encontrou-o morto. "Não pude evitar que as crianças vissem. Foi um horror", relembra Simone sobre o suicídio do marido, em Gramado Xavier, a 156 km de Porto Alegre. "Ajuda a salvar meu pai, ajuda!", pedia o filho do casal, na época com 13 anos, para curiosos que se aproximavam. Osbel passou a integrar as estatísticas que fazem do Rio Grande do Sul o Estado com mais casos de suicídios no Brasil: 10 a cada 100 mil habitantes. A taxa é praticamente o dobro da brasileira (5,2 por 100 mil em 2012, segundo dados do Ministério da Saúde) e próxima da taxa mundial (11,4 por 100 mil, segundo a Organização Mundial da Saúde)."

Com esta matéria, a jornalista gaúcha demonstrou, ao mesmo tempo, que é possível lidar com um tema tabu, de forma contextualizada, e que a internet tem espaço para uma história com mais de 140 caracteres. Para quem preza o bom jornalismo, não há motivo para pânico.


LIÇÕES AMERICANAS

O que aprender com...

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ais do que Hillary Clinton, a grande derrotada na sucessão dos Estados Unidos em 2016 é a cobertura política. Refém de pesquisas eleitorais com metodologias equivocadas, perdeu a chance de se diferenciar dos achismos e ufanismos cultivados em uma incubadora de ilusões, as redes sociais. Existem exceções, de veículos que resistiram à ignorância coletiva e buscaram vozes dissonantes. Fugiram do "software" do lugar-comum e praticaram a essência do jornalismo. Há também quem foi além da incapacidade de dimensionar o fenômeno Donald Trump e se enquadrou na modalidade do vexame.

A REVISTA QUE ABUSOU Antes do resultado das urnas, a Newsweek distribuiu nas bancas 125 mil cópias de uma edição especial com Hillary Clinton, como se ela é que tivesse sido eleita. Como nem todos os vendedores cumpriram a ordem de aguardar a contagem dos votos, alguns exemplares circularam. Tão segura em relação às pesquisas que previam uma vitória da democrata, a revista americana chegou a preparar uma versão com Donald Trump mas não a imprimiu com antecedência. Na ânsia de superar a concorrência, a empresa esqueceu ensinamentos de primeiro semestre de faculdade. O vexame tem um preço bem mais alto do que o ganho previsto com o triunfo da "Madam President".

QUEM ACERTOU

QUEM ERROU

Nos quatro meses finais de campanha, o Los Angeles Times apontou intenções de voto para o bilionário, em média, seis pontos percentuais acima das levadas em conta pelo restante da mídia. O segredo das pesquisas, em parceria com a Universidade de South Califórnia, é a metodologia de refino das respostas em relação à diversidade da população. Embora tenha apoiado Hillary, o LA Times acredita ter ajudado Trump ao revelar tendências para a campanha do republicano explorar: em agosto, apontou que o empresário dependia da mobilização de americanos brancos que não haviam ido às urnas quatro anos antes. Outro detalhe: eleitores admitiram o desconforto de declarar o apoio ao republicano pelo telefone, instrumento usado pela maior parte dos institutos. No caso do LA Times, não havia problema: as pesquisas eram online.

A legião dos equivocados é numerosa. E tem um guru. Na véspera da eleição, o economista Nate Silver tinha dado chances de vitória de 71% para Hillary. Famoso por ter acertado o resultado das eleições presidenciais em 49 estados em 2008 e em todos os 50 em 2012, desta vez foi engolido pela confiança. Não por falta de aviso. Reportagem da Folha de S.Paulo duas semanas antes da eleição, com acadêmicos, destacou que a maior parte das sondagens usava uma metodologia defasada, pouco confiável para uma disputa atípica como a deste ano. Um dos experts ouvidos pela Folha, Paul Lavrakas (Instituto Norc, de Chicago), avisou: "A quantidade de pessoas que não respondem às pesquisas é tão extrema nesta eleição que isso pode refletir sentimentos que não representam os entrevistados".

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CLUBE DE OPINIÃO

Clube de Opinião recebe ministro Eliseu Padilha

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o último dia 4 de novembro, o Clube de Opinião do RS promoveu reunião-almoço, tendo como convidado o Ministro Chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. O encontro aconteceu no salão de honra do Palácio do Comércio, tendo como anfitriã a Associação Comercial de Porto Alegre, representada pelo seu presidente Paulo Afonso Pereira. O encontro durou mais de duas horas e teve a participação de 30 jornalistas com espaços em rádio, tevê, jornal, revista e internet. O ministro Padilha fez

um speech inicial, tratando da situação das contas da União e das ações que o governo Temer está empreendendo para enfrentar o déficit público e alavancar a retomada do crescimento econômico do país. A seguir, numa conversa informal, ele foi questionado por vários dos profissionais de imprensa presentes e não deixou pergunta sem resposta. O Clube de Opinião do RS, lançado em 2002, reúne comentaristas e apresentadores de rádio e tevê, colunistas de mídia imprensa e blogueiros, sempre tendo algum personagem importante

como convidado. A ideia do Clube, segundo seu presidente Julio Ribeiro, é poder qualificar a opinião de seus membros através de informações exclusivas e tomadas com profundidade diretamente da fonte. O especialista em redes sociais Marco Poli fez a cobertura do evento através do Twitter, tendo várias de suas publicações curtidas pelo próprio ministro. Inspirados por ele, resolvemos resumir o encontro na mesma lógica das frases curtas e objetivas. As primeiras dez são tweets do colega jornalista.

TWEETS "A pauta do governo não Pode ser a da Lava-Jato ou do julgamento no STF. Temos convicção de que as contas da campanha são separadas" "Não tem mais como aumentar imposto. A carga já chegou ao limite. O governo vai ter de fazer a sua parte em gestão." "A reforma possível vai ser doída. Quando a previdência foi criada a expectativa de vida era de 56 anos; hj está em quase 80" O governo federal está destinando uma verba razoável para segurança aos estados. Esse dinheiro não pode ser usado para salários" "Hj 70% dos brasileiros são a favor da reforma da previdência. É remédio amargo pra doença ruim. É isso ou quebra" Se não fizer a reforma da previdência em 2024 acabou, não vai ter dinheiro pra mais nada a não ser pagar a folha "Político tb vai para o sistema de previdência geral; quem estiver acima do teto vai pra previdência complementar" "Vamos propor um corte para homens em 50 anos e mulher 45, valendo daqui a 20 anos" "As reformas não estão sendo feitas pra tirar direitos de ninguém" "As bondades que os governos fazem com o dinheiro público, são maldades feitas ao cidadão, que paga a conta" "De 1991 até 2016, as despesas públicas da União subiram 6% ao ano, acima da inflação. Não tem orçamento que resista a isso" "Neste período, apenas se aumentou impostos. A carga tributária que era de 22% em 1991, hoje é de 37%. O cidadão e as empresas não têm como pagar mais impostos" "Quem financiou essa diferença sempre foi o cidadão, porque não existe 'dinheiro público', existe o dinheiro do cidadão"

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"Os pacotes de bondades aprovados pelos legislativos sempre acabam sendo maldades contra o cidadão, que é quem paga a conta" "20 dos 27 estados brasileiros estão em sérias dificuldades financeiras e outros sete logo vão sofrer o mesmo. Um dos motivos é o sistema de previdência dos servidores" "O déficit da Previdência, neste ano, será de R$ 145 bilhões e ele vai crescer, moderadamente, nos próximos anos. Em dez anos dará um pico e, se nada for feito, vai quebrar o sistema" "A reforma da Previdência não vai mexer em direitos adquiridos. Quem tem mais de 50 anos, vai se aposentar pela lei atual" "A reforma só terá impacto positivo sobre as contas da União em 20 anos. Mas, se nada for feito agora, em 2024 só haverá dinheiro para folha e aposentadorias, mais nada" "O RS opera com déficit desde 1971 e todos nós concordamos com isso, nesses 45 anos" "Precisa haver um grande pacto no Rio Grande, que junte governo, sociedade, corporações e o setor produtivo para equacionar, de vez, esse problema"

Encontro: o presidente do Clube de Opinião, Julio Ribeiro, o ministro Eliseu Padilha e o presidente da Associação Comercial de Porto Alegre, Paulo Afonso Pereira

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Créditos

WILLIAM RANDOLPH HEARST 24 | Press 173


GRANDES NOMES

Um inovador inconveniente

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s trens de pai e filho se cruzam. O pai, vindo da Califórnia, onde fez fortuna na corrida do ouro, em direção a Washington, para assumir cadeira no Senado. O filho, expulso de Harvard, onde fez fama de má companhia, rumo a San Francisco, para assumir o jornal da família. Na Costa Leste, George Hearst toma posse como senador em 4 de março de 1887. No mesmo dia, na Costa Oeste, o cabeçalho do San Francisco Examiner ostenta pela primeira vez a menção “W.R. Hearst, proprietário”. Um mês antes de completar 24 anos (o aniversário é em 29 de abril), William Randolf Hearst começa a erguer um império que, fundado em suas contradições, transformaria o jornalismo. A expulsão da universidade mostra, com uma dose cômica, uma das facetas mais marcantes desse personagem polêmico: a ousadia. Na aristocrática instituição, era percebido como estudante negligente e "líder de um grupo ocupado em converter Harvard em um playground", como descrito na biografia The Chief, de David Nasaw. Uma das brincadeiras consistiu na entrega de penicos personalizados aos professores, cada um com o nome do destinatário gravado no fundo. O atrevimento, para boas ou más ações, ditaria a sua carreira na comunicação. "Não tenha medo de cometer um erro, seus leitores podem gostar dele", dizia. Por causa das práticas da guerra por audiência travada com Joseph Pulitzer, inspirou o termo “Yellow Journalism” (no Brasil, popularizado como “jornalismo marrom”, em vez de amarelo). Esse singular protagonista do século 20 merece ser compreendido não apenas por atitudes condenáveis, mas também por avanços nas técnicas de fazer jornalismo e na busca de qualidade. Graças a

sua visão da comunicação, formou um conglomerado de publicações ainda hoje referências, como as revistas Cosmopolitan, Esquire e Harper's Bazaar. Aos repórteres, orientava: "Mantenha a sua mente no objetivo, não no obstáculo". Sua vida pautou o jornalismo, o cinema e a política na primeira metade do século 20. Serviu de principal inspiração para o protagonista de Cidadão Kane, obra-prima escrita, produzida e dirigida por Orson Welles. Incomodado, ofereceu ao cineasta dinheiro em troca da destruição de todas as cópias do longa-metragem que retrata a metamorfose de um jornalista idealista em magnata obcecado pelo poder. Não teve êxito na proposta, e o lançamento ocorreu em 1941. O plano B, pouco útil, foi baixar a censura ao filme nos jornais do grupo. “Você pode esmagar um homem com jornalismo”, dizia o mesmo editor capaz de ensinar: “Notícia é o que as pessoas não querem que você imprima. Todo o resto é publicidade”. A citação vem sendo erroneamente atribuída ao britânico George Orwell (1903-1950) – talvez a origem do equívoco seja o desconforto com a reputação do real autor. Em 1887, quando recebeu do pai o comando do jornal, o San Francisco Examiner era uma máquina de consumir dólares. Era o terceiro diário em circulação na nona maior cidade dos EUA. Com uma reforma, o jornal se tornou mais vibrante, arrojado e consistente. Hearst podia ser hiperbólico na cobertura policial. Em um texto sobre um "bando de assassinos", atacou a polícia por forçar os repórteres do Examiner a fazerem o trabalho deles. Ao mesmo tempo, ampliou o espaço para notícias internacionais e enviou repórteres para desvelar a corrupção e a ineficiência na

administração municipal. Em uma das matérias memoráveis, a repórter Winifred Black foi internada no hospital local para mostrar como mulheres indigentes eram tratadas com crueldade. A equipe inteira de atendimento foi demitida na mesma manhã em que os exemplares foram levados às ruas. No início dos anos 1890, o Examiner já era bem-estruturado e rentável. Hearst voltou seus olhos para a outra ponta do mapa, precisamente o palco de sua mais acirrada concorrência e de sua prosperidade. Comprou em 1895 o New York Journal, um "penny paper" (jornal popular) que havia pertencido a um irmão de Pulitzer. Começava ali a disputa de dois titãs da imprensa. A principal arena de combate viria três anos depois, em 1898, quando uma cobertura nada edificante feita pelos jornais de ambos empurraria o presidente republicano William McKinley para uma guerra que ele tinha a intenção de evitar. O episódio é lembrado com uma frase antológica atribuída a Hearst. Às 21h40min de 15 de fevereiro de 1898, no porto de Havana, o encouraçado americano Maine sofreu uma explosão, fatal para 266 marinheiros, em meio à insurreição cubana pela independência em relação à Espanha. Até hoje pairam dúvidas se a causa do naufrágio foi um acidente interno ou um ataque externo. Mas os editores de jornais Hearst e Pulitzer decidiram que os espanhóis eram os culpados e reforçaram a teoria com histórias sensacionalistas e surpreendentes de "atrocidades" cometidas pelos espanhóis em Cuba. As histórias foram baseadas em verdade, mas escritas com linguagem incendiária. Assim provocaram reações emocionais e muitas vezes acaloradas entre os leitores.

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O naufrágio foi o estopim para o desfecho de uma campanha beligerante anterior ao fato. Meses antes, Hearst enviou a Cuba o artista gráfico Frederic Remington para conferir no front e ilustrar a luta pela independência em relação à Espanha. O correspondente encontrou escassa guerra para desenhar e, frustrado ao traçar canaviais em chamas, telegrafou ao chefe: “Tudo quieto, nenhuma confusão aqui. Não haverá guerra. Desejo retornar. Remington”. Teria recebido a seguinte mensagem em resposta: “Por favor, permaneça. Você fornece as imagens, e eu fornecerei a guerra. Hearst”. Embora alguns historiadores ainda considerem lenda esse diálogo, havia motivações partidárias para o publisher. Mesmo com posições conservadores, como a defesa da Lei Seca, ele pertencia ao Partido Democrata, em oposição ao então presidente. Sua atuação ia além do papel de simpatizante. Foi eleito para a Câmara duas vezes e, sem sucesso, concorreria à prefeitura de Nova York em 1905 e 1909, para governador do Estado em 1906 e vice em 1910. Três décadas depois da inglória Guerra Hispano-Americana, o rival Joseph Pulitzer (1847-1911) já havia morrido, e o império Hearst era hegemônico: um de cada quatro norte-americanos liam algum jornal do grupo. Nos anos 1920, a rede tinha 20 diários e 11 dominicais em 13 cidades, além de seis revistas e uma produtora de cinema. Com uma visão aguçada para o negócio, reprovava a impessoalidade da imprensa. "Publicar um jornal sem promoção é como dar uma piscadinha a uma garota no escuro: bem-intencionado, mas ineficaz", comparava, a sua maneira irreverente. Nacionalista e fervoroso anticomunista, usava o poder de

seus jornais para influenciar a opinião pública em favor de suas causas. Ficou conhecido como um dos principais apoiadores da Marihuana Tax Act de 1937, que tornou ilegal a maconha nos EUA. Mesmo tendo uma atuação partidária, mantinha sobre o meio político uma visão cética, até mesmo cínica: "Um político fará qualquer coisa para manter o seu emprego – até mesmo se tornar um patriota". A Depressão, após o crash na Bolsa em 1929, abalou o patrimônio. A produtora de cinema foi fechada, assim como alguns dos veículos. Em 1937, a corporação sofreu uma recuperação judicial, e Hearst foi forçado a vender muitas de suas antiguidades e coleções de arte para saldar dívidas. Nessa época, seus editoriais se tornaram mais agressivos. Ele se voltou contra Roosevelt, entrando em choque com a maioria de seus leitores, composta de trabalhadores fiéis ao presidente que lideraria o país contra o nazismo na II Guerra (1939-1945), enquanto Hearst tinha sua imagem associada ao inimigo porque, em 1934, havia visitado Adolph Hitler em Berlim, ajudando a legitimar a liderança do genocida na Alemanha. Lançado no ano em que os EUA entraram na II Guerra, o filme que Hearst não conseguiu paralisar marcou o início de seu ocaso, sua última década de vida. A influência de seu império de mídia sobre o público decaía, assim como a sua saúde. Morreu em 14 de agosto de 1951, em Beverly Hills (Califórnia), aos 88 anos. Por trás do personagem Cidadão Kane, restou um complexo William Randolf Hearst a ser dissecado. A verdade não é apenas mais estranha do que a ficção, é mais interessante. É um dos ensinamentos que legou.

Império de papel: lançamento de Cidadão Kane, em 1941, inicia a década do ocaso do magnata que inspirou o cineasta Orson Welles

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OPINIÃO

Conflito de gerações

F

uncionário de uma empresa de comunicação não teve tempo de abrir conta em banco e, ao receber um cheque, pergunta como faz para, enfim, ter aquele dinheiro na mão. Ao ouvir que deveria ir ao banco para “descontar”, sentencia: “Esse negócio de cheque não pegou muito, né!”. Ele não fez datilografia, não conhece fax, não escutou vinil nem mesmo CD. Ah, não vai ficar num emprego se for chato, não faz questão de trabalhar na Globo e, se puder, cria um negócio próprio.

Volta a fita uns 40 anos Quatro ou cinco anos de faculdade, dependendo do gosto pelas festas e pela sinuca e o cara estava formado. Diploma na mão, o objetivo do jornalista era o de buscar uma “colocação” para “trabalhar em veículo”. Rádio, TV ou Jornal? As redações da hoje chamada mídia tradicional eram as principais portas de entrada dessa turma. Assessoria de imprensa? Havia pouca vaga e a atividade era vista com certo preconceito pela categoria.

Avança a fita A Internet e as redes sociais produzem uma mudança radical na plataforma de comunicação. Vejam só, agora é possível ter um site, um canal de TV no YouTube, uma rádio corporativa, um jornal online, tudo próprio. Fora a fan page no Face, conta no Twitter, no Instagram, tem até um tal de Snapchat... A crise econômica reduz o investimento publicitário. E, para agravar, boa

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O mercado continua precisando de bons contadores de história

parte deste investimento agora migra para a plataforma digital. Cresce a frequência da aparição daquele objeto voador muito bem identificado e temido nas redações: o “passaralho”. Trata-se agora de extinção de postos de trabalho, aliada a uma “juniorização” das redações, o que é bem diferente de renovação de equipe, no qual o entusiasmo da juventude dialoga com a experiência dos veteranos. Criam-se alternativas que concentram as atividades de vários veículos de um mesmo grupo em núcleos de produção. O profissional precisa dominar todas as mídias – fecha a matéria do jornal, posta uma versão no site, faz um ao vivo no rádio. Ah, tem ainda aquela entradinha na TV, coisa rápida. Trabalho multimídia, salário unimídia.

Virada de chave A transição para o mundo digital, do offline para o online, não é como virar aquela chave on/off do toca-fitas. Sair fazendo todos os cursos de mídia digital não vai transformar um neófito das redes num expert. Quando alguém de três anos lida melhor do que nós com o smartphone é porque nascemos off.

Paulo Gilvane

Mas há algo que ninguém pode tirar destes profissionais das redações que foram “disponibilizados para o mercado”. A capacidade de produzir (bom) conteúdo. Há muita iniciativa já em andamento na área de produção de conteúdo para todos os gostos e formatos. Talvez você comece fazendo algum Job, trabalhando meio on demand até que o pessoal perceba que você é bom pra c***. Sabe aquele pessoal de assessoria de imprensa? Alguns viraram empresários. Tem Agência de Comunicação com redações maiores do que muito veículo da mídia tradicional. Você também pode empreender, tentar ser dono do próprio nariz, dos seus horários e das contas também. No nosso setor a taxa média de lucro é de 15%. Ou seja, para colocar cinco mil na conta, tem que faturar R$ 35 mil. E agora o comercial é você. Apesar das novas plataformas, tecnologias e dessa parafernália toda, o mercado continua precisando de bons contadores de história, com aquela capacidade de apuração, aquele texto preciso, denso e consistente. Aquele curso de datilografia não vai ajudar muito agora. Mas, a rigor, ele apenas facilita a transferência do que você elabora para a ponta dos dedos. O tal do conteúdo está aí no seu cérebro, é só organizar e dar o comando para os dedos começarem a digitar. Foram-se apenas os anéis! *Paulo Gilvane Borges é fundador e diretor geral da Agência Radioweb


OPINIÃO

Horripilantes algoritmos

P

ergunte-me se algum dia temi um holocausto nuclear resultante da “guerra fria” entre EUA e URSS entrando em ebulição com algum ensandecido apertando botões, girando chaves, digitando códigos, escaneando impressões digitais, retina e o que o mais seja necessário para autorizar o lançamento das bombas. Nunca. Inquira-me se já tive medo da morte, seja ela serena como o fim da chama de uma vela ao ser consumida, atroz devido a alguma moléstia devastadora ou surpreendente na forma de violência urbana que a nossa Imprensa gosta tanto de alardear sem dedicar pelos menos um décimo do espaço e do tempo para ir mais fundo na causa real: nosso sistema de castas. Nunca. Em verdade, em verdade vos digo que sou um fatalista. O que tem de vir, virá. Um pouco de cuidado é importante, mas não mantenho o olhar para nas alturas receando que o céu desabe e recuso viver recluso ou me esgueirando pelas ruas na tentativa de evitar proximidades com quem possa me agredir. Então, nada temo? Pelo contrário. Vivo simplesmente apavorado com uns bichinhos chamados algoritmos. Eles estão por toda parte e só esperam que um pensamento meu entre no meio digital para me classificar, hierarquizar, categorizar, colocar numa lista. Paranoia? Antes fosse. O que me sustenta financeira e emocionalmente é o domínio relativo da palavra. As plataformas digitais para distribuição

O caos está sendo construído e resulta de códigos fonte secretos

das minhas palavras são administradas por não sei quem e estão contaminadas. Os inúmeros não sei quem permitem – mais do que isso, estimulam! – que os bichinhos selecionem quem recebe o que distribuo e o que chega a mim do que outros produziram. A prática do bom jornalismo não pode conviver com tais interferências espúrias. As organizações jornalísticas e os profissionais autônomos precisam assegurar-se de que no barco onde navegam a bússola efetivamente aponta o Norte. Talvez seja mais seguro abandonar o instrumento suspeito de vício e voltar a consultar as estrelas. Tenho pena de quem acha que se informa pelas mídias sociais. O prezado leitor e a estimada leitora por certo sabem sobre o que estou escrevendo. Eu não me informo nas mídias sociais. Eu – nós – recolhemos e opinamos sobre parte do que outros produziram e esta parte foi criminosamente – sim, a palavra é essa mesma! – direcionada para nós. Sem jornalismo, a informação brota no caos. O problema é que este caos

Mario Rocha

está sendo intencionalmente construído e resulta de códigos fonte secretos. Há uma lógica no processo que visa esbulhar a sociedade. Primeiro, dos seus direitos; depois, de seus bens tangíveis e intangíveis. Não há caminho de volta se permanecermos no formato da livre concorrência. Os bichinhos já se impuseram. Estão erodindo as bases do edifício social. Por incrível que possa parecer, a solução está na política. Não nos políticos, evidente, mas na pressão da sociedade sobre os políticos para que novas leis controlem quem produz o caos em seu próprio benefício. O horizonte desta ação não está circunscrito por fronteiras nacionais. Ela só poderá ter sucesso com abrangência mundial. Talvez a Imprensa possa ser a deflagradora da nova ordem que permita repensar as estruturas do poder econômico controlador da Informação que tornou-se o Leviatã moderno. As organizações jornalísticas acomodadas no modelo atual de negócio seguem preocupadas com o próprio umbigo e pensam apenas em resistir. As mais competentes retardarão a própria derrocada e talvez até colham algum lucro antes de abandoná-lo (o negócio, não o umbigo). Precisam de um quase impensável plano estratégico de interferência. Não acontecerá. É por isso que morro de medo dos horripilantes algoritmos.

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GALERIA

C

om um suspiro de impotência, jornalistas costumam mencionar o quanto a memória curta do brasileiro favorece figurões desapegados com o bem comum. Porém, políticos e empresários com carência de escrúpulos não são os únicos beneficiados pela amnésia social. O mau jornalismo também é. Quem lembra a capa da Veja de 18 de junho de 2008? "Nasce o maior bilionário brasileiro", destacou a revista, em indisfarçada euforia. Não se tratava de uma reportagem factual, limitada à descrição, e sim a interpretação de como Eike Batista personificava o ingresso do Brasil, enfim, em um estágio evoluído do capitalismo. A ideia seria reforçada em uma sucessão de capas nos anos seguintes. Em janeiro de 2012, a semanal chegou a "vestir" o empresário com uniforme de ditador chinês, ao lado da frase “Enriquecer é glorioso”, atribuída ao líder da jornada que transformou a China em potência. O fascínio editorial com o empreendedor estava em alta: “A nova leva de milionários brasileiros tem Eike Batista como ídolo, trabalha muito, compete honestamente, orgulha-se de gerar empregos e não se envergonha da riqueza”. Dois anos depois, a fortuna estimada em US$ 34 bilhões despencou para um patrimônio líquido de US$ 1 bilhão negativo, conforme reportagem de Maria Fernanda Delmas e Glauce Cavalcanti, n'O Globo, em setembro daquele ano. Hoje, daquela capa do bilionário recém-nascido, o bebê cinquentão de olhar enigmático com o queixo sustentado pelas costas das mãos tem uma rotina nada fascinante. As principais ocupações são proteger-se da ira de acionistas quebrados e reunir-se com advogados para dar explicações à Justiça. Tenta, esclarecer, por exemplo, doações de campanha entregues

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Do bilionário recém-nascido, restou a certeza de que a falta de memória também protege o mau jornalismo

ao ex-ministro petista Antonio Palocci, apontado à Operação Lava Jato pelo ex-líder do governo da presidente cassada Dilma Rousseff (PT) no Senado, Delcídio Amaral, como a "ponte" com empresários. A trajetória midiática do Deng

Xiaoping de Governador Valadares revela um pouco "como centenas de jornalistas experientes que cobrem o poder não revelaram antes a roubalheira na Petrobras", tema principal da Press 170, cujo protagonista foi "a Imprensa que sabia de menos".


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