Revista Cargo 268

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1992-2017

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BIMESTRAL JUL/AGO 2017

6€

Rumo a 100 milhões de toneladas? Portos movimentam mais do que nunca!

Jorge d’Almeida (CPSI): «Vantagem de Sines está sobretudo no hinterland» MAIS lança cargueiro entre o Funchal e Lisboa

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18,3

milhões de toneladas

660 mil TEU’s

PORTO DE LEIXÕES

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O SEU PARCEIRO NO TRANSPORTE MARÍTIMO 2

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EDITORIAL

BIMESTRAL JUL/AGO 2017

6€

MARÍTIMO

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Portos nacionais apontam a fasquia inédita de 100 milhões de toneladas Entrevista a Jorge d’Almeida (CPSI): «O valor acrescentado de Sines está sobretudo no hinterland» Os ‘monstros’ do mar vieram para ficar... e os terminais? O Homem pensa, o software controla, a máquina opera!

ÍNDICE

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Opinião de Vítor Caldeirinha: “Internet física - Revolução em curso” PRIO: Uma década a crescer ao lado do porto de Aveiro Opinião de J.A. Felício: “Modelos de governação portuária europeus” Entrevista a Luís Baptista (ENIDH): «Existe hoje no exterior uma percepção muito positiva da Escola Náutica» Breves Marítimo

TERRESTRE, VEÍCULOS E LOGÍSTICA Unidade do Tramagal inicia produção em série da eCanter Test-Drive à Nova Volkswagen Crafter Breves Terrestre e Logística

AÉREO

34 38 40 42 Propriedade:

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Entrevista a António Beirão (Consórcio MAIS): «Pensamos de manhã à noite em ter o cargueiro cheio» Sessão ADFERSIT: Solução Montijo gera dúvidas entre técnicos Opinião de J.M. Pereira Coutinho: “Plataformas logísticas e o defunto Portugal Logístico” Breves Aéreo

DIRECTOR Joni Francisco *CHEFE DE REDACÇÃO Bruno Falcão Cardoso *MARKETING/PUBLICIDADE Simão Rodrigues *REDACÇÃO Rui Ribeiro, Joa-quim Fonseca, João Cerqueira, Romeu Barroca *COLABORADORES ESPECIAIS José Augusto Felício, J. Martins Pereira Coutinho, Vítor Caldeirinha *EDITOR FOTOGRÁFICO Rui Ribeiro *ADMINISTRAÇÃO E REDACÇÃO Ed. Rocha do C. d’Óbidos, 1º, sala A Cais de Alcântara - 1350-352 Lisboa Tel. 911 166 932 *web: www.revistacargo.pt *e.mail: info@ revistacargo.pt *EDITORA Magia Azul Edições, Unipessoal Lda * Morada: Ed. Rocha do C. d’Óbidos, 1º, sala A Cais de Alcântara - 1350-352 Lisboa *Tel. 911 166 932 *IMPRESSÃO E ACABAMENTO Gráfica, Lda *Praceta José Sebastião e Silva, Lote 20, Parque Industrial do Seixal - 2840-072 Aldeia de Paio Pires - T: 212 110 520 - Fax: 212 110 529 *ASSINATURA ANUAL Portugal - 30 EUR Estrangeiro - 40 EUR Depósito legal nº 6196692 *PERIODICIDADE - Bimestral *TIRAGEM - 6.000 exemplares Estatuto Editorial disponível em: www.revistacargo.pt

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Estamos (quase) todos de parabéns! A performance do sistema portuário nacional durante o primeiro semestre deste ano deve ser motivo de orgulho para todos aqueles que, directa ou indirectamente, têm contribuído para esta trajectória ascendente que se vem registando nos últimos anos. Uma trajectória que - vale a pena realçar! - é fortemente influenciada pelo porto de Sines mas que, observando o exercício em questão, vem tendo outros importantes contributos - de Leixões ou de Aveiro com os seus melhores semestres de sempre ou de Lisboa com a sua recuperação animadora. Mas os resultados recorde que vão caindo exercício após exercício merecem também uma análise mais profunda de quem decide hoje e de quem decidiu no passado. Porque temos portos e terminais a crescer como fruto de um trabalho notável de eficiência e produtividade, dadas as limitações de capacidade há muito identificadas em muitos deles. E neste campo, vale muito a pena ler a entrevista a Jorge d’Almeida, o presidente da Comunidade Portuária de Sines (CPSI), e perceber que passaram décadas (sim, décadas!) sem que problemas estruturais tenham sido resolvidos. São muito bem-vindos (e urgentes!) os desenvolvimentos portuários e ferroviários que se avizinham. Mas a ideia que fica é que o sistema portuário nacional cresce mais “apesar das decisões políticas” e menos “devido às decisões políticas”. Joni Francisco Director

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PORTOS A CAMINHO DOS 100 MILHÕES DE TONELADAS? OS PORTOS NACIONAIS FECHARAM O PRIMEIRO SEMESTRE COM NÚMEROS RECORDE QUE DEIXAM EM ABERTO A POSSIBILIDADE DE, JÁ ESTE ANO, ALCANÇAREM UMA FASQUIA QUE HÁ UM PAR DE ANOS PARECIA DEMASIADO DISTANTE.

Terá sido um exercício feito por muitos quando a AMT - Autoridade da Mobilidade e dos Transportes divulgou os resultados relativos à movimentação de mercadorias nos portos nacionais durante o primeiro semestre: estaremos mesmo a caminho de um ano no qual será alcançada a impressionante marca dos 100 milhões de toneladas num só ano? Os resultados dos primeiros seis meses deixavam antever um acumulado anual muito perto dessa marca que, admitamos, até há bem pouco tempo parecia inalcançável para o sistema portuário nacional. É que entre Janeiro e Junho, a globalidade dos portos nacionais conseguiu o melhor semestre de sempre, com a movimentação de 48,6 milhões de toneladas, marca sem paralelo em toda a história portuária nacional! Com quase 50 milhões de toneladas movimentadas até final de Junho, o valor acumulado representou um crescimento de 8,1% face ao primeiro semestre de 4

2016 - o ano que, saliente-se, ainda detém a marca de melhor registo anual de sempre! Neste momento, o exercício é simples: um segundo semestre ao nível do primeiro colocaria os portos nacionais a movimentar 97,2 milhões de toneladas, um valor que já seria de longe o melhor de sempre. Mas um segundo semestre pouco melhor que o primeiro traria esse ‘plus’ de chegar à fasquia dos 100 milhões. Mais 3,7 milhões de toneladas face ao ano passado O valor acumulado entre Janeiro e Junho cifrou-se, como referido atrás, nos 48,6 milhões de toneladas. Quando comparado com o mesmo período do ano passado, representa um crescimento de 8,1% que, em toneladas, significou que os portos nacionais manusearam mais 3,7 milhões de toneladas do que no primeiro semestre de 2016. Portanto, para que se possa chewww.revistacargo.pt

gar já este ano à marca dos 100 milhões, o segundo semestre terá que ser ainda melhor que o primeiro. Tarefa difícil... mas não impossível! Para esse total de 48,6 milhões de toneladas nos primeiros seis meses do ano, muito contribuiu o segmento dos contentores. 1,6 milhões de TEU: nunca se tinham movimentado tantos contentores em meio ano! Os dados da AMT relativos aos primeiros seis meses do ano mostravam assim um movimento global de contentores na ordem das 969,6 mil unidades e cerca de 1,6 milhões de TEU, valores que representam crescimentos de 20,3% e 23%, respectivamente, face ao mesmo período de 2016! Ou seja: nunca na história do sistema portuário nacional se tinham manuseado tantos contentores em meio ano!


Porto de Sines com quase 60% do total de TEU Como já vem sendo hábito, no segmento da carga contentorizada o grande destaque vai para o porto de Sines que mantém a liderança com uma quota de 59% do total de TEU - mais 4,7% do que no mesmo período de 2016. Já Leixões, Lisboa e Setúbal representam, respectivamente, 19,7%, 15,4% e 5,3% do total. Obviamente que importa realçar as operações de transhipment realizadas no porto de Sines, as quais foram foram responsáveis por 82,7% do tráfego do porto alentejano (em TEU) e por 48,8% do tráfego de todo o sistema portuário do Continente. Os dados da AMT realçam mesmo que estas operações registaram um crescimento de 41,1% face ao volume de TEU movimentado no mesmo período de 2016.

excelente performance, com crescimento de +15,3%. A Carga Geral continua a deter a quota mais significativa do mercado portuário, representando 45%. Seguem-se os Granéis Líquidos, com 34,6%, e os Granéis Sólidos, com 20,4%. Carga desembarcada com maior peso Entre carga embarcada e desembarca-

da, a segunda lidera. A carga embarcada (onde se inclui a carga de exportação), atingiu um volume superior a 20,2 milhões de toneladas (+5,6%), para o valor mais elevado de sempre nos primeiros semestres. Já a carga desembarcada (onde se incluem as importações) atingiu cerca de 28,5 milhões de toneladas, constituindo também o valor mais elevado de sempre nos períodos homólogos, excedendo em +9,9% o anterior registado em 2016.

Produtos petrolíferos também em destaque Para o movimento global de carga alcançado até Junho, muito contribuiu a Carga Contentorizada mas também os Produtos Petrolíferos. Se a primeira registou uma variação positiva de +18,9%, o segundo cresceu +19,4%. Também a carga Ro-Ro registou

SINES, LEIXÕES E AVEIRO COM MELHOR SEMESTRE DE SEMPRE Num sistema portuário nacional que conseguiu o melhor semestre de sempre, importa também analisar os resultados porto a porto. E aí, o destaque tem que ser dado a Sines, Leixões e Aveiro que conseguiram os seus melhores semestres de sempre! Mas também Lisboa por ser o porto que mais cresce em termos percentuais. Os dados da AMT mostram assim que, para o resultado de 48,6 milhões de toneladas alcançado pelos portos neste período, muito contribuíram as performances dos portos de Sines, Leixões e Aveiro, que cresceram 6,8%, 9% e 23,2%, respectivamente - alcançando todos eles os valores semestrais mais elevados de sempre! Porto de Lisboa é o que mais cresce Apesar dos três portos acima referidos terem conseguido os seus melhores se-

mestres de sempre, o título de porto que mais cresceu em termos percentuais no primeiro semestre vai para Lisboa. Com um crescimento de 26,3%, o porto da capital manuseou mais 1,22 milhões de toneladas do que no mesmo período do ano passado.

ses, agora com uma quota de mercado de 52,8% (um decréscimo de 0,6% face ao período homólogo de 2016). Nesse ranking, o porto de Leixões ocupa a segunda posição com uma quota de 19,9%. Segue-se o porto de Lisboa, com 12,1%, numa recuperação de 1,7%.

Porto de Sines ainda detém mais de metade da quota nacional

Portos de Viana do Castelo, Figueira da Foz, Setúbal e Faro com perfil exportador

Ao longo dos últimos anos, temos assistido a um escalar do porto de Sines no que à quota de movimento total portuário português diz respeito. Porém, o que se tem visto neste início de ano, com quase todos os restantes portos com performances positivas, é um atenuar da quota do porto alentejano. Ainda assim, o porto de Sines continua a ser responsável por mais de metade da carga movimentada nos portos portugue-

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Os dados da AMT mostram ainda que os portos de Viana do Castelo, Figueira da Foz, Setúbal e Faro são os portos que apresentam um perfil de porto “exportador”, todos eles registando um volume de carga embarcada superior ao da carga desembarcada - com um quociente entre carga embarcada e o total movimentado, no período em análise, de 75,4%, 62,5%, 58,2% e 100%, respectivamente. 5


CARGO: Como tem sido a evolução da actividade da Comunidade Portuária de Sines (CPSI) desde a sua criação? JORGE D’ALMEIDA: A Comunidade Portuária de Sines foi criada em 2009, numa altura em que eu era o Administrador Delegado da PSA Sines, entidade que opera o Terminal XXI. Nasce, sobretudo, pela iniciativa do Dr. Carlos Vasconcelos, o CEO da MSC Portugal. A PSA fez parte do conjunto de formadores e, desde o início, o objectivo da CPSI é o de ajudar a desenvolver toda a actividade comercial e produtiva de Sines ligada ao porto. O Dr. Carlos Vasconcelos ficou à frente da CPSI desde 2009 até ao início deste ano, quando me lançou o desafio de me candidatar à presidência. Eu considerei que seria a altura ideal, pelos desafios que existem em Sines e que de alguma forma complementam o projecto em que eu estive envolvido à frente do Terminal XXI, e por tal aceitei. Depois, tive a sorte da nova Administração do Porto de Sines ter uma atitude extremamente proactiva para desenvolver a actividade do porto e ligada ao porto. Tanto o Engº. Luís Cacho como o Dr. Duarte Lynce de Faria e a Dra. Fernanda Albino têm dado um grande apoio nas actividades desenvolvidas pela CPSI desde Fevereiro, nomeadamente o lançamento do novo website. Que motivos estiveram por detrás desse lançamento e qual será a missão dessa ferramenta?

Vemos o novo website como uma forma muito rápida e eficiente de dar a conhecer a nossa actividade. E também como uma forma de cativar mais sócios. Hoje somos 21 associados da CPSI e o objectivo passa por ter pelo menos o dobro, tornando a associação mais eficiente ao desenvolver a sua massa crítica. Porque o objectivo da CPSI passa por desenvolver toda a zona portuária, industrial e logística em parceria com todas as entidades envolvidas. Isto porque nenhuma delas pode querer fazer este trabalho sozinha, tem que ser um trabalho conjunto incluindo todas as empresas numa mesma entidade. O novo website mostra esse dinamismo entre entidades e dá a conhecer aquilo que está a ser feito, quem são os stakeholders, assim como as oportunidades que estão à nossa frente e que devemos saber aproveitar. O marketing portuário de Sines também pode ser uma tarefa da CPSI? Eu diria que a CPSI tem condições únicas para o fazer. Mas falo do marketing de toda a comunidade, porque é impossível vender o porto sem vender também a parte logística ou sem vender os próprios geradores de carga. A única entidade que reúne todas estas entidades é a CPSI. Mas a CPSI não vai fazer esse trabalho de forma autónoma e abstracta, tem que o fazer em coordenação e em colaboração com os seus associados.

O ano de 2017 marca o 40.º aniversario do porto de Sines. Conhecendo este porto como poucos, pergunto-lhe como tem visto a evolução de Sines nestes anos? A verdade é que o porto de Sines é um porto incrivelmente jovem quando comparamos com outros portos globais. O meu interesse pelo porto de Sines e pelos contentores começou quando trabalhava nos EUA, onde profissionalmente me cruzei com o homem que inventou o contentor: Malcom McLean. Foi ele que surgiu com a ideia de desenvolver o primeiro serviço global, algo totalmente inovador naquele tempo mas que hoje todas as empresas de navegação fazem: serviços com navios grandes que escalam alguns portos e depois navios mais pequenos que distribuem a carga por portos mais pequenos, o chamado transhipment. Eu estive envolvido nesse projecto como engenheiro, na equipa que projectou e depois dirigiu a construção dos navios na Coreia. Nessa altura, Malcom McLean procurou portos por todo o mundo onde iria desenvolver este tipo de serviço, um serviço que dava a volta ao mundo numa só direcção: Oeste para Leste. E porquê? Porque no Pacífico existia muito mais carga da Ásia para os Estados Unidos, no Atlântico havia muito mais carga dos EUA para a Europa, e não havia muita carga da Europa para a Ásia. Os navios passavam o Canal do Suez para se posicionarem de novo nos portos asiáticos. Foi nesse contexto que sugeri Sines,

"O VALOR ACRESCENTADO DE SINES ESTÁ SOBRETUDO NO HINTERLAND" JORGE D'ALMEIDA, PRESIDENTE DA COMUNIDADE PORTUÁRIA DE SINES

O porto de Sines vem registando recordes atrás de recordes ao longo dos últimos anos e a Comunidade Portuária de Sines (CPSI), entidade criada em 2009, vai tendo um papel dinamizador cada vez mais visível. Em entrevista à Revista Cargo, o Presidente da CPSI fala de um passado que ajudou a construir e de um futuro cheio de oportunidades e desafios. A não perder! 6

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porque senti que estava na geografia ideal. Com Sines, os navios não teriam de ir a Roterdão ou outros portos do Norte da Europa. O Sr. McLean enviou um consultor a Portugal, o qual eu acompanhei. Quando chegou cá, fez duas perguntas: «Que carga existe aqui em Sines?». E não havia nada de contentores. «E que ligações tem para os pontos onde há carga em Portugal ou Espanha?». Só tínhamos a estrada nacional… «Quando tiverem uma auto-estrada que ligue a Sines e uma ferrovia, aí Sines será um porto potencialmente muito interessante», concluiu. Estamos a falar de 1980, e a verdade é que há ainda coisas por fazer. Esse serviço arrancou, obviamente sem Sines. Os navios vinham de Roterdão e depois seguiam para o Mediterrâneo e depois para o Canal do Suez. Perdeu-se logo aí uma excelente oportunidade para Sines. Quando entra então Sines novamente nas contas? Só 20 anos depois surgiu uma segunda tentativa de vender Sines. Foi um trabalho feito pela Administração da altura e pelo Governo do Eng.º António Guterres, os quais enviaram um convite a todas as empresas potencialmente interessadas no porto de Sines, tanto operadores portuários como armadores. Havia uma condição essencial: todo o investimento teria de ser realizado pelo operador. E só apareceu uma interessada, a PSA. Esta, por razões estratégicas, decidiu agarrar o desafio, mesmo sem saber se seria um sucesso comercial ou não. Tinha a convicção de que a médio/ longo prazo era impossível Sines não se desenvolver. Mas a curto prazo não sabiam bem o que esperar. A aposta foi feita inicialmente num cais pequeno, com um investimento de 160 milhões de euros. E estiveram quase a desistir porque construíram o terminal, que foi inaugurado em Maio de 2003, mas não conseguiam clientes. Depois, também não conseguiam falar com a Administração da CP, que se recusava a conversar com a PSA Sines por entender que Sines não tinha nada que ir buscar carga a Lisboa, que era só transbordo puro. Foi nessa fase que eu comecei a trabalhar com a PSA como consultor e tivemos a sorte de mudar o Governo. Com o novo Governo chegou nova Administração da CP que, como é habitual, faz o contrário da anterior. Resolveram olhar para Sines a sério e a verdade é que, actualmente, Sines é o maior terminal ferroviário de carga da Península Ibérica. Foi uma aposta vencedora para todas as partes. E foi isso que tornou possível a Sines começar a atrair carga de locais onde ela existe, no Centro e Norte do País.

E há também o factor MSC, certo? Exacto, a MSC aceitou o desafio de apostar em Sines com o único serviço que tinham em Portugal, um serviço que escalava o porto de Lisboa que vivia muitas greves. Era um serviço costeiro e que não tinha vantagem nenhuma em ir para Sines. Mas a MSC percebeu que tinha ali um terminal com condições excepcionais para trazer serviços intercontinentais. E foi o que aconteceu. Sines começou a crescer quando a MSC decidiu trazer serviços que antes não passavam por Portugal, serviços que escalavam portos no sul do Mediterrâneo como Las Palmas, Valência ou Le Havre. Muitos serviços com a componente de transbordo vieram para Sines porque este demonstrou ter grandes vantagens para desenvolver esse tipo de negócio. Depois, houve outro elemento muito importante também, ligado ao regime laboral. Na altura, os portos portugueses funcionavam todos sob o mesmo regime laboral. Era um contrato colectivo de trabalho muito pouco flexível, com o qual seria impossível desenvolver um negócio onde se concorre com portos internacionais. Felizmente encontramos um advogado excepcional, o Dr. Antonio Martinez, que foi o pai do regime laboral que existe em Sines – um regime que veio depois a ser adoptado no resto do País. Com este acordo, tem havido uma paz laboral importante e o Sindicato XXI tem tido inteligência de perceber as vantagens que tem em ser parceiro portuário e não estar no papel de antagonista. Que outros segredos estão por detrás do sucesso do Terminal XXI? O modelo de desenvolvimento do Terminal XXI em Sines esta alicerçado em vários pilares. O primeiro é servir o mercado português com serviços directos, algo que não era feito no País até surgir Sines. O porto de Sines teve condições para atrair navios maiores, fornecendo um serviço de transbordo competitivo, não só graças à estabilidade laboral mas também graças às facilidades que Sines tem a nível de acessibilidade marítima e todo o clima muito positivo de negócios envolvente. E falta ainda outro pilar, que não foi feito mas tem condições para ser desenvolvido: atrair negócios que sejam geradores de carga, que sejam centros de distribuição regional ou fábricas que aproveitem a localização perto de um porto para melhorar a sua competitividade. A Artlant foi um primeiro exemplo dessa visão. Aumentar o hinterland é também um desafio para o porto de Sines, reduzindo assim o peso do transhipment? www.revistacargo.pt

Sem dúvida. O valor acrescentado do projecto de Sines está sobretudo no hinterland, mais do que o transhipment. O grande potencial está no desenvolvimento do hinterland e em potenciar o desenvolvimento de indústrias que não podem existir a não ser que exista esta vantagem competitiva que Sines oferece. Falo de indústrias globais, com serviços muito espalhados e em que a parte do transporte representa uma grande fatia dos seus custos. É o exemplo da indústria petroquímica, da indústria electrónica ou da indústria automóvel onde vemos a Autoeuropa a aumentar substancialmente a sua produção e onde Sines pode ser uma alternativa para entrada de componentes que entram hoje por outros portos, alguns espanhóis. Nesse aumento do hinterland, até onde pode chegar Sines? O alvo mais óbvio, sobretudo numa primeira fase, é Madrid. É um mercado enorme e que está no centro da Península, pelo que tem de ser servido por portos a alguma distância. O porto mais próximo é Valência mas Valência tem algumas desvantagens para determinadas rotas nas quais se torna mais rápido chegar a Madrid por Sines do que por lá. Além disso, Valência é um porto muito desenvolvido e levanta alguns problemas de congestionamento. O mercado de Madrid funciona com uma logística radial, estando ligado a vários portos. Mas a ligação a Sines está ainda muito anémica porque está dependente do serviço ferroviário dada a distância. A ligação existe, está a ser testada e a Medway já realizou alguns serviços Sines- Madrid. Mas é fundamental ultrapassar os problemas estruturais de ligação à fronteira. E isso está finalmente a ser feito, onde é apontada a data de conclusão da ligação Évora-Caia para 2020. É algo que vai ter um impacto muito positivo, não tenho duvidas. Depois de chegar a Madrid numa primeira fase, há que ter ambição de ir até ao Centro da Europa. É muito possível ter a ambição de, em determinados tráfegos, chegar por exemplo a Paris. Que também é Central e por isso tem de ser abastecido por portos através da ferrovia. Temos o exemplo da DB Schenker, que tem muita ligação ao mercado automóvel mas que tem capacidade para alimentar muitos mais tipos de carga, sendo uma empresa que tem vindo a expandir a sua rede ferroviária para este lado da Europa. Mas, infelizmente, em Portugal não temos terminais ferroviários que possam prestar um serviço necessário para ter uma ligação eficiente a Espanha e ao resto da Europa. Só em Valladolid têm cinco serviços a sair para França e Norte da Europa! Parece-me

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que a Medway também está apostada em tirar partido desse potencial, e isso poderá ser importantíssimo para o nosso desenvolvimento. A MSC Portugal percebeu muito rapidamente que existe uma grande vantagem em aliar o transporte rodoviário ao transporte marítimo. Como tem sido a colaboração entre as diversas Comunidades Portuárias? Sinto que existe uma colaboração cada vez mais próxima, no sentido de se tentar promover projectos de interesse nacional. Uma das iniciativas tem a ver com a importância da tecnologia para o desenvolvimento da actividade do porto. No Plano Estratégico para o Aumento da Competitividade Portuária, esse é um dos pontos fundamentais, passando não só pela JUP mas também pela plataforma de aceleração tecnológica nos portos. Estamos neste momento a trabalhar no Cluster dos Portos Digitais. Percebemos que a tecnologia está a avançar de uma forma tão rápida que se não estivermos atentos ao que está a acontecer, ficaremos para trás e não tiraremos partido do potencial portuário. Existem várias tecnologias que estão a ser aplicadas ao sector portuário e Portugal até tem sido pioneiro nesse âmbito, nomeadamente no caso da JUP. Mas existem muitas outras tecnologias que não estão a ser aplicadas ainda e temos de trabalhar para que isso aconteça. Falo da Inteligência Artificial, do Big Data ou do Blockchain – uma tecnologia à qual tenho dado especial atenção por se tratar de uma revolução que me parece que muita gente ainda não percebeu o impacto que terá a muito curto prazo. No caso da Inteligência Artificial, temos o exemplo da automação, inclusive de navios. Quando estes forem automatizados, todo o sistema irá sofrer alterações. E isso inclui os terminais, onde sabemos que também já existem terminais a utilizar esse tipo de processo automatizado. Recentemente li uma notícia na Revista Cargo sobre os testes de um rebocador da Svitzer, que mostra exactamente o que já está a acontecer. A tecnologia existe e é muito mais difícil ser aplicada em automóveis do que em navios. Já a tecnologia do Big Data também está aí e, com o baixo custo dos sensores e dos processos de digitalização no geral, é cada vez mais possível ter informação extremamente detalhada sobre todo o processo ligado às linhas de abastecimento. E a informação é muito importante! Um dos problemas em Portugal é a falta de informação a nível de fluxos portuários, não só por razões institucionais mas também tecnológicas. Infelizmente, temos a ideia que essa informação é privada e não

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pode ser divulgada, mas somos o único pais no mundo a pensar assim. Em Espanha, quem quiser tem acesso à informação. E é muito mais produtivo que essa informação seja pública, pois permite a optimização das cadeias de negócio. Não se pode atrair carga para Portugal se não se conhecem os fluxos de carga. A tecnologia permite ter toda a informação, falta que mude apenas a mentalidade. Na última edição da Revista Cargo demos destaque à tecnologia Blockchain. De que forma esta poderá mudar o sector? O que o Blockchain faz é retirar o intermediamento institucional. Com o Blockchain veio o Bitcoin que retirou os bancos enquanto intermediários. Na sociedade temos entidades que existem apenas para manter a relação entre as partes mas o Blockchain promete fazê-lo de uma forma tecnológica, garantindo a transparência e a lisura dos processos sem necessidade de instituições. Isto garante uma confiança total no sector porque são métodos infalíveis. Infalíveis excepto nos casos dos ataques informáticos como o recente Petya… Todo o progresso traz as suas «doenças». Sempre que se evolui na escada, aparece qualquer coisa nova que levanta problemas. Mas não é por isso que se vai desistir nem é isso que vai evitar a chegada da tecnologia. As várias tecnologias estão já aí e Portugal tem que estar atento. A CPSI está empenhada nesta área e acreditamos que a JUP já foi um passo gigantesco e pode ser uma ferramenta consolidadora de todas estas novidades tecnológicas. Da Estratégia do Governo para o Aumento da Competitividade Portuária, ficou satisfeito com os planos para Sines? O mundo vive em constante mudança mas o que é imutável é a posição que Sines tem hoje no mercado internacional. É um porto reconhecido por ser muito competitivo para determinadas rotas. E a verdade é que Sines já atingiu a sua capacidade máxima. Por isso, há claramente uma oportunidade para aumentar a sua capacidade. A PSA já pediu autorização ao Governo para aumentar o Terminal XXI mas depois há uma área grande de expansão que permite pensar num novo terminal, o chamado Terminal Vasco da Gama. Um segundo terminal, com um novo operador, traria maior competitividade a Sines? Não me parece que em termos de concorrência seja importante. Estes terminais concorrem com terminais in-

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ternacionais, altamente competitivos. Eu diria que, pensando em estratégia nacional, deveria haver um único operador portuário, isso tornaria Portugal bem mais competitivo. Mas não sei se é viável. Há interessados na entrada de outro operador portuário, pois há empresas que são elas próprias accionistas de operadores portuários. Portanto, um único operador poderá não ser a maneira mais eficiente de atrair carga. Mas são os operadores que decidem onde querem fazer os seus hubs. O que sei é que Portugal é cada vez mais atraente pela sua carga e pelo potencial do hinterland até Madrid e também para o Centro da Europa. Acredita que Sines continuará a crescer? Sines não pode continuar a crescer enquanto o terminal não for aumentado, é impossível! Não há capacidade para crescer. Mas, instalando essa capacidade, não tenho duvidas que haverá a procura desejada. Ainda não é tarde demais mas teria sido melhor que essa expansão tivesse chegado mais cedo. Sobre o futuro Terminal Vasco da Gama, quem lhe parece que possa ter interesse nesse terminal? O ideal era que fosse a PSA, certamente terão interesse e possivelmente poderão avançar. Depois, acredito que qualquer grande operador poderá ter interesse. A CMA CGM, através do seu operador portuário, por exemplo. Embora não tenha ainda sido apontada, acredito que pode olhar para Sines como a MSC olhou. Depois temos a COSCO, que na teoria pode ter muito interesse e que já investiu na Grécia e mais recentemente em Valência. Se quiser seguir a MSC, poderá vir também para Sines. E porque não os japoneses? Ainda não têm cá nada e operam neste mercado do Extremo Oriente para a Europa…. Em que outras áreas poderemos ver Sines a crescer? A ferrovia é essencial para haver desenvolvimento. Mas julgo que também é importante chamar a atenção para a ligação rodoviária, que tem também de ser melhorada. Neste momento, somos basicamente um porto de transhipment e de transporte ferroviário. Mas se quisermos ser um porto que atraia investimento logístico, temos de fazer mais. Depois, vejo duas áreas de grande potencial para Sines. Uma é o abastecimento de gás natural aos navios, algo que também faz parte da Estratégia do Governo. A outra é o apoio logístico à exploração petrolífera. Joni Francisco


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Se durante 2016 a tendência que inclinava os pratos da balança a favor dos mega-navios refreou, a recente encomenda de nove porta-contentores de 22.000 TEU por parte da francesa CMA CGM veio, se dúvidas restassem, provar que a predominância dos monstros do mar não está intrinsecamente ligada às contingências flutuantes da indústria: a era dos ULCV (Ultra Large Container Vessel) veio mesmo para reinar e as restantes peças do puzzle é que terão de se adaptar esta nova configuração do mercado do transporte marítimo contentorizado. Isto porque a apologia dos grandes porta-contentores tem sido, ao longo da última década, um dos grandes trunfos argumentativos das poderosas economias de escala, onde a diminuição dos custos, a agilidade de processos produtivos e o encurtamento dos tempos de trânsito são inobliteráveis mandamentos cravados em pedra. «Se levarmos a análise até aos 24.000 TEU, verificamos que ainda existem reduções de custos a serem feitas», explorava o especialista Andrew Penfold há uns tempos atrás. O mote havia sido dado por vários analistas e pelos predadores da indústria, e Penfold, director da Ocean Shipping Consultants, traçava um futuro nada distante do presente: «Não há qualquer razão técnica para não construirmos navios de 24.000 TEU. Há uma redução de custos mais que razoável na passagem de um navio de 12.500 TEU para um de 18.000 TEU, e é por isso que as companhias marítimas deram esse salto», completava. Hoje, já na segunda metade de 2017, a consultora britânica Drewry augura uma viragem para 2018 com uma subida do índice de frota inactiva, num mercado magnetizado pelos ULCV – em pleno processo de consolidação, o sector encara agora novas perguntas que colocam em profunda reflexão o papel dos mega-navios face aos operadores de terminais. Como se adaptarão os terminais portuários ao reinado dos novos monstros do mar? Transportadoras vs Terminais: um choque de interesses? Ao duplicarem a sua capacidade média de transporte durante a última década, as companhias marítimas cortaram em um terço o custo total da movimentação por contentor. Se a isto aliarmos razões económicas (redução do consumo de combustível e o excesso de capacidade verificado) cria-se o ambiente - de consolidação - ideal para a proliferação dos ULCV. Este reinado implica, como o presente tem já comprovado, transformações potencialmente drásticas, não

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OS MONSTROS DO MAR VIERAM PARA FICAR...

AS ENCOMENDAS DE MEGA-NAVIOS P 'MONSTROS' DO MAR EM TERMOS DE CA ÍMPETO E REFORÇAM ASSIM O GRAN propriamente no mar, mas em terra: maiores navios obrigarão os terminais escalados a apetrecharem-se significativamente para lidarem com a opulência crescente dos porta-contentores. A pressão colocada sobre as plataformas portuárias aumentará gradualmente, com a corrida às remodelações físicas (cais com melhorados designs, munidos de maiores calados) e uma cada vez mais intensa aposta em modernas infra-estruturas de automação (gruas mais imponentes, controladas por controlo remoto) a pautarem a acção das operadoras, na busca pela captação de tráfego num mercado cada vez mais minimalista, onde o triunvirato das alianças (2M, THE Alliance e Ocean Alliance) dita as regras. De modo a acompanhar o ritmo exigente das transportadoras, os terminais serão chamados a acelerar o despacho de navios cada vez maiores, o que adicionará pressão ao manuseamento da carga e ao factor ‘berth productivity’. O contexto analítico piora se a estas condicionantes acrescentarmos a crível redução das escalas por parte das linhas marítimas – menos escalas com navios cada vez maiores, picos de carga mais intensos e pit stops céleres. Será esta a receita ideal para o pesadelo dos terminais? Ou só de alguns? É que é bom lembrar que muitos operadores de terminais têm ligações umbilicais aos armadores que correm atrás de navios cada vez maiores... Debruçando-se sobre o tema, o engenheiro holandês Yvo Saanen (membro da administração da TBA Netherlands) introduziu o problema com interrogações fulcrais: «Quais são os custos do aumento da dimensão dos navios para o operador de terminal em mercados estabilizados, como os EUA ou a Europa?

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Quem paga a conta das actualizações necessárias para facilitar a escala das embarcações maiores e quem paga a conta para lidar com estes em períodos mais curtos, enquanto o volume por escala aumenta?» – Para Saanen, estas perguntas não são apenas pertinentes para os portos que lidam com os grandes porta-contentores, mas também para os restantes, já que será de prever que o denominado «efeito cascata» acabe por afectar a rede marítimo-portuária a uma escala global, não deixando ninguém de fora. «À medida que os maiores navios escalam os maiores portos, o efeito cascata fará com que os navios que outrora se consideravam maiores, passem a escalar os portos regionais», conduzindo assim a uma progressiva marginalização dos pequenos portos e terminais menos desenvolvidos, conclui Yvo Saanen no seu ensaio ‘Mega ships: positive asset or terminal’s worst nightmare?’. Para o especialista na concepção de terminais, a conclusão é directa: existe uma colisão de interesses que ameaça a estabilidade da rede de terminais, pois a tendência hegemónica das grandes transportadoras sobrepor-se-á à auto-determinação do futuro de muitas destas estruturas – umas seguirão o rumo do avultado investimento financeiro, outras aceitarão o rebaixamento para ‘feeder routes’ e grande parte delas, não se fixando como ‘hubs’ de transbordo, cairão no esquecimento, por não serem capazes de lidar com o desfasamento proporcionado pelo «efeito cascata» de TEU’s, no qual os navios tenderão a ter dimensões não suportadas pelos terminais. «Navios de grandes dimensões são talvez o caminho mais certo para as transportadoras, mas não o são para os terminais», remata Saanen, justifican-


E OS TERMINAIS?

S PORTA-CONTENTORE S, AUTÊNT ICOS CAPACIDADE, PARECEM GANHAR NOVO RANDE DESAF IO PARA OS TERMINAIS. do: «Para manter os custos operacionais nos mesmos níveis, as taxas deveriam aumentar de 3 a 17% dependendo do aumento no tamanho do navio. No actual clima económico, esta não é uma mensagem que seria apreciada pelas transportadoras», explica o membro da TBA. Se analisarmos os custos operacionais das transportadoras (que têm vindo a declinar com o aumento do tamanho dos porta-contentores) e os custos dos terminais e portos (que têm vindo a crescer proporcionalmente ao aumento do tamanho desses mesmos porta-contentores) de forma combinada, verificamos, de acordo com a análise da consultora britânica Drewry, que a economia de custos combinada é limitada e que a passagem de navios de 8.000 TEU para os de 20.800 TEU resulta numa poupança (transversal, ou seja, de transportadora e terminal conjuntamente) de apenas 4% – dados que acentuam as interrogações sobre a proficuidade e sustentabilidade deste investimento a longo prazo (recorde-se que a redução de custos não prosseguirá linearmente como até aqui) e que certamente não vão ao encontro da sanidade económico-financeira da grande maioria dos terminais portuários. Um claro choque de objectivos que arrisca desequilibrar – ainda mais – a correlação de forças entre dois elementos fundamentais da cadeia logística, autênticos pilares da viabilidade da actual economia global. «Economias de escala mais elevadas levam a que poucas empresas possam operar de modo viável. O crescimento de mega-navios, ao aumentar as economias de escala e os custos fixos associados ao funcionamento em uma rota específica, reforçam a tendência da diminuição de operadores independentes no mercado

do ‘shipping’, empurrando os operadores menores para fora das principais rotas e rumo a nichos de mercado», explica o relatório ‘Competition issues in liner shipping’, de autoria de Hilde Meersman, Christa Sys, Eddy Van de Voorde and Thierry Vanelslande. Para Saanen, os terminais já se incluem neste processo de secundarização, restando, agora, uma introspecção da indústria em prol do bem comum – «As transportadoras e os terminais têm de enfrentar a situação. Só depois poderão as poupanças das transportadoras traduzir-se em ganhos de produtividade para os terminais», resume o especialista. ‘Consolidação terminal’ à vista? Lars Jensen, chefe executivo e analista da SeaIntelligence Consulting, tem sido outra das vozes a proclamar sérias dúvidas quanto à viabilidade duradoura da aposta massiva nos mega-navios – para o especialista nórdico, os portos encontram-se vulneráveis perante o fenómeno de consolidação ocorrido nas transportadoras e o ímpeto urgente de uma ‘corrida ao armamento’ infra-estrutural poderá conduzir a investimentos avultados com possibilidade de retornos nulos. «Receio que vários terminais venham a sofrer falhas económicas catastróficas durante os próximos anos», introduziu Jensen ao discursar no TOC Europe 2017, prosseguindo a explicação: «Em 2025 teremos um mercado com apenas 6 a 8 operadores globais e ao mesmo tempo deverá ocorrer uma grande redução no número de operadores regionais», para depois concluir, com estrondo, parte do seu pensamento: «Penso que dentro de poucos anos estaremos a debater o facto de todos estes ULVC terem sido inúteis». Referindo-se às consequências do

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‘efeito cascata’, o analista explicou que «todas as rotas recebem agora navios maiores, o que significa que se não houver volumes para enchê-los, haverá cada vez menos serviços em termos de frequência». Centrando a questão no investimento portuário, deixou um alerta à navegação: «Se pensam que as transportadoras sofreram muito nos últimos cinco anos, fiquem atentos ao que se passará com os portos nos próximos dez». Traçado o cenário futuro, Jensen aflorou o tipo de reacção desencadeada por portos e terminais: «Veremos tremenda competição entre ‘hubs portuários’ – o resultado será este: portos com capacidade para lidar com uma vasta quantia de TEU’s que não terão um único cliente». Estaremos, então, perante a chegada de uma nova era de consolidação, agora no sector portuário? Estará o pendor oligopolista do mercado das transportadoras marítimas a modelar um similar fenómeno na economia dos terminais? «As operadoras compraram 100 ULCV’s, um investimento de 15 mil milhões que leva os portos a ficarem presos a um jogo do qual não querem fazer parte, e será igual ao jogo em que as operadoras se encontraram antes. Quando uma ou duas transportadoras encomendaram ULCV’s, todas tiveram que o fazer, e isso traduziu-se numa perda para todas elas, já que criou excesso de capacidade», dissertou Jensen, considerando as situações análogas: «Os portos enfrentam agora o mesmo desafio: investir em instalações que permitam receber ULCV’s, fazendo investimentos apenas para poderem ter um lugar à mesa». Para Neil Davidson, eminente analista da Drewry Maritime Research, a consolidação e a cooperação intra-portuária poderão mesmo ser as soluções para os terminais resistentes: «A resposta natural à crescente tendência de alianças nas transportadoras é a consolidação de propriedade por parte dos operadores de terminais». Para o especialista, as alianças (ou até mesmo fusões e aquisições) entre terminais serão a resposta ideal para enfrentar a crescente pressão criada pelo triunvirato que reina no sector do transporte contentorizado. No entanto, Davidson rejeita a ideia catastrofista defendida por Lars Jensen, num artigo intitulado ‘Relatos da morte da rentabilidade portuária são extremamente exagerados’ – relembrando, na peça, que os grandes terminais continuam a apresentar «margens de lucro saudáveis». «Longe de ser o fim do mundo?», pergunta retoricamente. O futuro tudo desvendará. Bruno Falcão Cardoso

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O HOMEM PENSA, O SOFTWARE CONTROLA, A MÁQUINA OPERA! A TECNOLOGIA E A AUTOMAÇÃO DE PROCESSOS GANHAM FORÇA GALOPANTE, TRAZENDO EVIDENTES BENEFÍCIOS MAS TAMBÉM NOVOS DESAFIOS À INDÚSTRIA. COMO CONCILIAR MÁQUINAS E HUMANOS? A era da automação irrompeu pela cena marítimo-portuária com a promessa de revolucionar, de fio a pavio, o fenómeno do transporte de mercadorias e da logística – à medida que a tecnologia de ponta encontrava soluções, agilizando processos e simplificando tramitações ao longo da cadeia de abastecimento, outras interrogações foram brotando, nascidas do mesmo ventre que havia dado à luz o advento digital da automação nos terminais de todo o mundo: afinal, como se conciliará o incompassivo e imparável progresso robótico com a utilidade sócio-económica do labor humano? Será o investimento na automação portuária uma aposta global de sucesso garantido ou o risco terá de ser alvo de constantes avaliações, tendo em conta os diferentes contextos e a flutuação de um mercado em sucessiva consolidação? Apesar das dúvidas, não há como não contemplar, com inerte admiração, o veloz admirável mundo novo que se ergue perante nós. A entrada em funcionamento do majestático (e totalmente automatizado) terminal Maasvlakte II, no Porto de Roterdão, em 2013, veio coroar a rápida ascensão do novo paradigma, já adoptado também por infra-estruturas de todo o mundo: na Europa, onde predomina a automação baseada nos guindastes automáticos de empilhamento (Automatic Stacking Cranes) e a maximização do transporte horizontal, infra-estruturas como o Euromax Terminal (nos Países Baixos), o DPW Antwerp Gateway Termi-

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nal (na Bélgica), os Container Terminal Altenwerder e Burchardkai (ambos no porto alemão de Hamburgo) ou o TTI Algeciras (em Espanha) vão dando cartas como cobaias de uma experiência bem sucedida; na Ásia, plataformas como o Pusan Newport (na Coreia do Sul), o Hong Kong International Terminal (China) ou o Kaohsiung Evergreen Terminal (em Taiwan) provam a eficiência das massivas Cantilevers RMG que deslizam pelos cais orientais, transportando elevados volumes de contentores; na América do Norte, foi o Terminal de Norfolk (Virgínia, EUA) a dar o mote para o investimento na automação portuária, seguido primeiramente pelos portos de Long Beach, Nova Iorque e Nova Jérsia. Com a introdução dos guindastes Ship-to-shore operados por controlo remoto, veículos automatizados (orientados por navegação a laser e sem recurso a condutor), transtainers (guindaste pórtico RTG, que, no terminal japonês de Tobishima, é já totalmente autómato) e autostrads, os portos do futuro ganham forma no presente, aliando o incansável esforço da maquinaria à cerebralização operacional dos novos softwares de gestão. A sistematização funcional destes ‘portos inteligentes’ permite às máquinas – recorrendo a controlos por GPS, scanner e infra-vermelhos – detectarem o posicionamento dos contentores e posteriormente deslocarem-nos de e para os veículos autómatos – uma mais-valia que abre a possibilidade, a terminais como o de Qingdao New Qianwan, operar na

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escuridão da noite e assim cortar 70% dos custos operacionais e obter ganhos de eficiência na ordem dos 30%. Corrida à automação: sobrevivência de uns, morte de outros Na base da migração para a automação está, fundamentalmente, a necessidade global de uma eficiência e celeridade cada vez mais competitivas. Com o ceptro do reino dos mares a pertencer aos mega-navios ULCV, o desenvolvimento dos ‘portos inteligentes’ torna-se condição imperativa para que a indústria – em fase de consolidação total – dê o passo que tanto ambiciona: movimentar maiores volumes de TEU’s em reduzidos tempos de trânsito, com custos menores e uma eficiência operacional ininterrupta mesmo perante picos de carga cada vez mais frenéticos. O crescente aumento de capacidade dos porta-contentores pressiona a dinamização dos terminais, obrigando-os a dar um salto infra-estrutural e a apostar na automação para acompanhar o nível de exigência das companhias marítimas. Se os terminais mais preponderantes sentiram a urgência de subir de patamar em termos de produtividade, também os mais pequenos, devido ao ‘efeito cascata’, estão forçados a apetrecharem-se, na tentativa de captarem os tráfegos dos porta-contentores deslocados pelas operadoras para as rotas secundárias. Esta luta pelo tráfego dificilmente será ganha sem que a vertente tecnológica


tome conta das operações nos terminais – a empreitada comporta múltiplas dificuldades, como oportunamente enumerou, no evento TOC Europe 2015, Alex Duca, chefe do departamento de Design da APM Terminals: «os cinco maiores desafios que a indústria portuária enfrentará serão a segurança, o aumento da complexidade operacional devido às crescentes dimensões dos navios, a gestão dos riscos inerentes à congestão, a manutenção da saúde económica apesar dos ciclos das operadoras e o fazer mais com menos espaço». Em todos esses desafios elencados por Alex Duca, a automação poderá ser um trunfo, defende Thomas Gylling, líder do departamento de Automação Global na empresa finlandesa Konecranes Port Cranes: «À medida que os porta-contentores aumentam de tamanho, os sistemas de manuseio de contentores terão de se tornar mais eficientes. A automação oferece um desempenho de manipulação de contentor mais estável e uma maior previsibilidade, já que o comportamento do equipamento de movimentação de contentores é controlado por um computador. Isso permite um planeamento e execução mais precisos, factor primordial no atendimento de embarcações de grandes dimensões», explicou, em entrevista concedida, em Abril de 2016, ao portal ‘Maritime News’. Considerando esta uma tendência ainda por consolidar a nível mundial, Thomas Gylling acredita que o potencial da automação portuária está, em grande parte, ainda por implementar: «O sector portuário está, em comparação com outras indústrias, como a manufacturação, ainda no início da era da Automação. Nos dias de hoje, apenas 1,5% dos terminais são automatizados, um número bastante modesto considerando o facto da era da automação na movimentação de carga contentorizada ter começado no terminal ECT Delta em 1993», relembrou, deixando uma certeza – «A automação é uma mega-tendência que continuará a crescer, e não ficarei surpreso se o ritmo persistir, já que novas opções de automação não param de surgir», finalizou. Mas para Antti Kaunonen, presidente da Kalmar, o desenvolvimento extremo da automação portuária no segmento contentorizado não deverá ser uma solução «one size fits all», já que as especificidades estruturais de cada terminal, o contexto comercial onde está inserido e a capacidade financeira de que dispõe, deverão ser as primeiras linhas de orientação num mercado cada vez mais impiedoso e agressivo: «Não faz qualquer sentido económico que todos

os operadores de terminais atinjam a fasquia da automação total», começou por dizer Kaunonen à publicação ‘Port Technology’, durante a última edição do TOC Europe. Aludindo à agressividade com que a corrida dos terminais à automação se tem feito nos últimos anos, o presidente da empresa sueca retratou a situação de muitos terminais que subsistem sem a tecnologia de ponta perante o investimento da concorrência: «Se pensarmos nos portos que não são automatizados, estes têm apenas uma decisão a tomar – investem ou fecham?». E se muitos terminais irão certamente perecer face a este factor concorrencial cada vez mais sufocante, os que possuírem estofo económico-financeiro para subsistir, aumentarão os seus gastos para ganhar terreno à competição: «Os investimentos no manuseio de contentores continuarão, apesar das cíclicas diminuições no tráfego contentorizado», comentou Thomas Gylling, prevendo a manutenção de um «cenário competitivo difícil» – «os portos precisam de se desenvolver constantemente e investigar novas tecnologias e conceitos para se manterem competitivos», concluiu, antecipando também um provável quadro de consolidação ao nível dos terminais. Como conciliar a automação e a vertente humana? Uma das grandes interrogações sobre a crescente automação (não só nas infra-estruturas portuárias como em grande parte das áreas laborais) continua a ser o factor humano, que, naturalmente, se entrelaça com a vertente sócio-económica de cada país: maior automação significa, na maioria dos casos, maior desemprego e, como consequência directa, menores receitas fiscais e maiores custos estatais com subsídios de auxílio aos despojados trabalhadores. Sobrepor-se-ão os ganhos de competitividade – da automação – às potenciais perdas para os cofres do Estado? A questão não tem ainda resposta cabal mas, desde a automação dos terminais, passando pelo imparável avanço de projectos relativos a navios, aviões e camiões autónomos, a verdade é que a inexorável coroação da robotização como paradigma do transporte de mercadorias e da logística aproxima-se a passos largos. O que fazer com toda a massa humana que se tornará obsoleta perante a eficácia, eficiência e fiabilidade da mais dispendiosa e moderna tecnologia? Sobre o tema, o presidente do Instituto Superior Técnico, cientista e investigador da inteligência artificial, Arlindo Oliveira, partilha a sua visão com

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o jornal Diário de Notícias: «Sou da opinião de que a inteligência artificial e a tecnologia em geral vão eliminar muito mais empregos do que os que vão criar. Não tenho grandes dúvidas sobre isso, porque se os economistas dizem que a Revolução Industrial destruiu muitos empregos mas criou mais, tal como as tecnologias sucessivas, a verdade é que nenhuma destas revoluções tecnológicas criou sistemas com a capacidade do ser humano». «Estou convencido de que a revolução tecnológica das próximas décadas vai destruir muitos empregos. Pode chegar aos 50%. Destruirá mais do que os que cria e, provavelmente, vai fazê-lo de tal maneira que uma fracção significativa da população em idade activa não terá emprego», aprofundou, traçando um cenário preocupante e perspectivando transfigurações na estrutura sócio-laboral: «A questão é se uma sociedade onde 50% das pessoas não têm emprego pode existir tal como a conhecemos agora». Para Arlindo Oliveira, a sociedade terá de «pensar em mecanismos como o rendimento mínimo garantido universal» e «discutir o impacto das tecnologias na estrutura da sociedade, nomeadamente na estrutura do emprego». A temática mereceu também recente análise da vice-presidente da INFORM Gmbh (empresa especializada no desenvolvimento de soluções de software para a optimização do planeamento empresarial e de decisões operacionais). Eva Savelsberg, especialista Software de Optimização e Agilidade aplicado aos processos de transporte e logística, entende que a sociedade deverá acarretar com «a responsabilidade de tomar conta de todos, de tomar conta de pessoas que não se sentem tão familiarizadas com a digitalização», assim defendendo um modelo tendencialmente integracionista – «Penso que os sindicatos poderão ser convencidos de que existem programas de treino para dar a toda a gente uma chance de fazer parte do futuro», explicou à ‘Port Technology’. «Poderemos, assim, estabelecer uma nova relação de confiança, tendo a automação como meio de competitividade, e, ao mesmo tempo, possuir um sólido programa de formação de modo a que todos possam participar. Isso poderá ser benéfico para ambas as partes, permitindo que todos possam dar um passo na direcção do futuro», concluiu. Visão naive e incomportável ou será possível, no futuro, conciliar o melhor de dois mundos? Bruno Falcão Cardoso

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Poderá a Internet física substituir ou optimizar funções das empresas logísticas de picking, sorting, dos transitários e agentes, a consolidação, o cross-docking? Ou mesmo reorganizar a relação entre os clientes e os transportadores? Ou reorganizar os sistemas de transportes nas cidades, no mar e nas estradas? Vítor Caldeirinha

INTERNET FÍSICA - UMA REVOLUÇÃO EM CURSO Poderá a Internet física transformar o shipping, os portos e as cadeias logísticas? Actualmente as cargas são produzidas, movidas, armazenadas e entregues de forma pouco sustentável em termos económicos e ambientais e ineficiente. Os camiões, os navios, os comboios e os contentores não andam cheios, provocando ineficiências, custos e impactos desnecessários no ambiente e para os consumidores. As carrinhas circulam nas cidades meio ou muito vazias e existem carrinhas a mais nas cidades para fazer a distribuição. Os navios andam muitas vezes meio vazios e os contentores e os trailers dos camiões não estão sempre completamente cheios, havendo um verdadeiro problema de logística de vazios. O E-commerce veio piorar esta situação, com entregas cada vez mais pequenas e frequentes, quer na longa distância, quer nas cidades, reduzindo stocks ao longo da cadeia e colocando pressão nos stocks na origem ou em decoupling-points e pressão na frequência dos meios de transporte e na concorrência com baixíssimas margens, apesar de estarem todos cada vez mais ineficientes em termos do transporte físico e utilização dos meios e pouco amigos do ambiente. Estamos a empacotar e a transportar cada vez mais ar, há cada vez mais viagens em vazio, usamos cada vez mais a rodovia na longa distância de forma ineficiente, os produtos passam muito tempo em armazém onde não são necessários, mesmo nas cadeias JIT, e não estão quando são precisos, muitos produtos são produzidos e não são vendidos, outros são transportados sem necessidade, as cidades estão infestadas de carrinhas vazias de várias empresas a provocar congestionamento e poluição, a cadeia logística não é segura, nem robusta, nem transparente, nem visível. Poderá a Internet física transformar o shipping, os portos e as cadeias logísti-

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cas? Poderá a Internet física substituir ou optimizar funções das empresas logísticas de picking, sorting, dos transitários e agentes, a consolidação, o cross-docking? Ou mesmo reorganizar a relação entre os clientes e os transportadores? Ou reorganizar os sistemas de transportes nas cidades, no mar e nas estradas? A Internet física parte da lógica de organização e transporte mundial e local dos pacotes de informação da internet digital, aplicando-a à cadeia de abastecimento de mercadorias físicas. Trata-se de um conceito que visa implementar um sistema livre e aberto de informação sobre as mercadorias para otimizar a interconetividade operacional e contribuir para uma maior eficiência global das cadeias logísticas e proteção do meio ambiente. Em termos globais, pretende-se criar um mercado aberto global na internet para o transporte de mercadorias, com oferta de armazenagem e transporte em todos os meios, de forma integrada e procura desagregada ao nível do pacote standard. Depois o sistema auto-organiza as mercadorias, os pacotes, separando-os ou juntando-os, por caminhos diversos, de acordo com a melhor forma de os colocar em tempo, no local pretendido, minimizando o custo e maximizando os meios utilizados, garantindo a utilização máxima de todos os transportes. Esta é a meta final mais global. Copiar o modelo eficiente da internet digital para a cadeia física. Mas existem outras submetas integrantes que têm de ser implementadas antes e já estão a ser implementadas por diversos fabricantes, empresas logísticas e transportadores. Primeiro a própria internet das coisas, que se interliga com a internet física, conferindo visibilidade à cadeia. Mas a grande revolução é passar a encarar as mercadorias como pacotes e não como cargas completas ou conjuntas. Estes pacotes, independentemente do tipo, destino, origem, proprietário, acordos, podem ser todos separados, misturados com outros diferentes em nada rel-

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OPINIÃO

acionados, até de outros proprietários e com destinos e origens diferentes, rearranjados em grupos para otimizarem o uso de camiões, carrinhas, navios, paletes e contentores, de acordo com percurso multimodais, sem amizades, conhecimentos, hábitos, apenas racionalização e lógica e multimodalidade/ intermodalidade, com paragens para cross-docking, no sentido de chegarem todos ao destino no momento certo, da forma mais económica, maximizando o uso dos meios de transporte, minimizando os custos. Podem até ser abertos pacotes e rearranjados os seus componentes em pacotes menores ou maiores, para caberem nos espaços existentes nos meios de transporte ou aproveitarem tarifas vantajosas de transportadores ou correios. Podem ser usados contentores modulares para facilitar a junção de cargas e a sua consolidação em paletes, contentores marítimos ou em trailers de camiões, ou o seu armazenamento em armazéns e portos standard, tornando tudo mais simples e barato. Deixam de existir paletes semi-vazias. É a sub-contentorização dos pacotes e das paletes. Uma verdadeira revolução que está a chegar sem ninguém dar por isso, que implicará equipamentos especiais harmonizados nas fábricas, armazéns, portos e navios para poderem movimentar e encaixar os pacotes standarizados como peças de LEGO que se consolidam em qualquer outro módulo mais macro. É a contentorização micro-logistica e o fim dos contentores, camiões ou paletes intocáveis ao longo da cadeia e a junção de flexibilidade dos pacotes e dimensões físicas das cargas com a standarização de medidas e equipamentos. E o desenho dos produtos passa a obedecer aos tamanhos standard dos pequenos contentores modulares e agregáveis e deixa de ser necessário estar à espera de juntar uma determinada


Caso de Estudo: Mixmovematch Uma empresa portuguesa de sistemas de informação para a logística complexa já está a operar este conceito de forma muito económica e simples com a 3M, DHL, BD e L´Oréal a nível internacional no projeto Mixmovematch.com. Mistura cargas e pacotes no centro de transporte de diferentes encomendas por produto, transportador e hub, maximizando a utilização posterior de meios de transporte e minimizando custos. Move as cargas misturadas para o hub mais próximo do destino, em transporte de intermodal de

longa distância minimizando custos e maximizando a respetiva utilização. E recombina as cargas com as encomendas dos clientes (sorting e paletização) para entrega. Garante camiões cheios combinando produtos e pacotes de múltiplas fontes e garante uma melhor utilização das carrinhas de entrega e dos armazéns, protegendo o ambiente nas cidades. Os resultados apontam para uma redução de custos de transporte até 35%, redução da pegada de carbono até 50% e aumento visibilidade e controle da cadeia de abastecimento.

Composição

Decomposição

Stantartização de Contentores Modulares

OPINIÃO

quantidade de carga para o transporte ser mais barato ou encher um camião ou um contentor, sendo possível reduzir stock realmente e aumentar a frequência sem perder preço e qualidade de serviço. E passa a haver uma ligação ao mundo da internet das coisas, com a comunicação permanente entre estes pacotes ou contentores standard e os sistemas de controlo das cadeias logísticas e da internet física. Os Projectos ALICE, ATROPINE e Modulushca estão a desenvolver este conceito, embora também já estejam a ser utilizados os pacotes existentes numa primeira fase em diversos outros desenvolvimentos já em operação e com provas dadas. A Internet física também vem revolucionar a logística das cidades. Os pacotes deixam de ser deste ou daquele proprietário, deste ou daquele transportador, chegando todos ao mesmo armazém é entrada da cidade e sendo distribuídos no seu interior de forma a maximizar o uso das carrinhas todas, os percursos e as viagens, minimizando custos, impactos no ambiente e o congestionamento. Podem até ser usados meios alternativos standard como bicicletas ou veículos elétricos em exclusivo entre o armazém exterior e as lojas e clientes. Este movimento criará portos, contentores e navios mais pesados, mais ocupados, mais eficientes, com equipamentos especializados na logística, com flexibilidade, robustez e adaptação constante ao longo da cadeira, acomodando as cargas, as rotas e os meios de transportes multimodais e intermodais aos atrasos, eventos, desistências de última hora, intempéries, oportunidades, o que trará em definitivo a logística para dentro do porto. Também permite maior facilitação das relações entre os atores de forma simples, direta e transparente, com visibilidade e transparência e conhecimento dos indicadores de performance, utilizados na seleção dos melhores meios e percursos. A ideia é numa visão holística criar redes abertas e globais de produtores, empresas logísticas, armazéns, portos, navios, camiões, comboios, carrinhas, centros de distribuição, clientes, lojas, aviões, organizando a oferta e a procura de forma racional, por pacotes standard, racionalizando e minimizando custos e protegendo o ambiente, melhorando o uso de infraestruturas e meios de transporte. A concorrência não desaparece, mas torna-se ágil, eficiente, transparente, flexível e rápida, com regras racionais, comprimindo-se espaço e tempo.

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Vítor Caldeirinha Vítor Caldeirinha é Doutorado em Gestão Portuária e Mestre em Gestão/MBA, sendo hoje professor de Gestão e Estratégia Portuária no Instituto Superior de Economia e Gestão - ISEG (UTL).

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Foi em 2006 que a PRIO instalou em Aveiro a sua fábrica de biodiesel, entrando no mercado energético com a promessa (cumprida!) de disponibilizar ao sector rodoviário português combustíveis Low Cost. Pouco mais de dez anos volvidos, a Revista Cargo visitou as instalações da PRIO no porto de Aveiro - e se a nível infraestrutural pouco mudou de 2006 para cá, o mesmo não se pode dizer da actividade e da própria estrutura da empresa. Nas instalações da PRIO no porto de Aveiro, a equipa da Revista Cargo foi recebida por Paulo Leal, membro da Comissão Executiva da PRIO - o qual, embora não tenha ainda muitos anos na ‘casa PRIO’, conta já com uma vasta experiência neste sector. Apesar de se ter instalado em Aveiro com a sua fábrica de biodiesel no ano de 2006, Paulo Leal recorda que só em 2008 é que a PRIO «inicia a actividade do Parque de Tanques, localizado no Terminal de Granéis Líquidos do porto de Aveiro». E os números estão à vista daquilo que é, na sua opinião, «um crescimento sustentado»: em pouco mais de dez anos de vida, a PRIO conta já com «quase 250 estações de serviço». «O primeiro foco da PRIO foi a área dos biocombustíveis», recorda Paulo Leal, acrescentando que «o crescimento das atividades associadas e a complexidade inerente tem vindo a conduzir no sentido da especialização». Assim, hoje a PRIO divide-se em três grandes áreas: o fabrico de biodiesel, na área ‘Bio’; a compra e venda de produtos em grandes volumes nos mercados nacionais e internacionais (incluindo a operação do Parque de Tanques de Aveiro), que diz respeito à área ‘Supply’; e aquela que é a face mais visível da PRIO, a ‘Energy’, que comercializa todos os produtos PRIO no mercado. Porto de Aveiro foi escolha criteriosa e é hoje um parceiro próximo Na análise de mercado feita pela PRIO antes de se instalar em Aveiro, foram vários os critérios que inclinaram a escolha para este porto. E hoje, embora reconhecendo as limitações específicas do mesmo, a PRIO parece tudo menos arrependida da escolha tomada. Primeiro que tudo, a PRIO olhou para a geografia nacional e percebeu que o que se preparava para fazer só encontrava paralelo no Barreiro, no terminal da Tanquipor - uma localização privilegiada para servir o mercado Centro Sul. A PRIO olhou mais para Norte e Paulo Leal justifica a escolha: pela sua localização geográfica, «o Parque de Tanques de Aveiro permite à PRIO servir o ‘hinterland’ do porto de Aveiro». A PRIO reconhecia assim os benefícios de uma instalação a partir da qual teria fácil acesso ao Norte e Cen-

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PRIO:

UMA DÉCADA COM CONTRIB DO PORTO DE tro do país. «Como em tudo na vida, as decisões são tomadas considerando um vasto conjunto de factores. No entanto, a proximidade ao mercado Centro Norte do país, zona até ao momento servida a partir do porto de Leixões, e a ausência de outros operadores no porto de Aveiro foram factores que pesaram na decisão», conta-nos Paulo Leal. Só que em Aveiro, nem tudo é fácil. Desde logo porque o porto local tem as suas próprias características, muitas delas limitadoras à actividade da PRIO. E as limitações começam logo no «calado máximo de 9 metros», vinca Paulo Leal. Por outro lado, as entradas e saídas no porto estão muito dependentes das marés, o que só dá à PRIO «janelas de quatro a seis horas por dia» para as entradas e saídas de navios. «Acresce ainda a falta de condições para a navegação nocturna quando se trata de matérias perigosas», refere o responsável da PRIO que realça assim uma limitação que faz com que «no Inverno tenhamos apenas uma janela por dia e www.revistacargo.pt

muito pequena». São factores que, conjugados, não deixam que a PRIO consiga uma ocupação da sua ponte cais acima dos 35 a 40%. «Mas essa é uma percentagem para 100% do tempo, depois colocam-se as restrições das janelas de entrada e saída», ressalva Paulo Leal. Mas a PRIO já sabia com o que iria contar em Aveiro. E nem isso a fez desviar do caminho escolhido. «O porto de Aveiro disse-nos logo que não íamos ter aqui o calado que o porto de Sines tem», recorda Paulo Leal, acrescentando que a Administração do Porto de Aveiro (APA) também informou desde o primeiro momento que não teria condições para a navegação nocturna. Só que a PRIO também percebeu desde logo que teria na APA um parceiro que tudo faria para lhe facilitar a vida. E nesta visita, Paulo Leal não poupou elogios à actuação das entidades locais, em particular da APA: «Tem existido um trabalho muito próximo entre a equipa da PRIO e a equipa do porto de Aveiro com o objectivo de trazer navios de maiores dimensões».


Hoje, a PRIO opera navios no porto de Aveiro para as suas várias áreas, transportando combustíveis, biocombustíveis e óleos. E recebe ainda navios com produtos para outras empresas - entre os quais combustíveis e produtos químicos. Neste campo, encontra-se mesmo a negociar com duas empresas a entrada dos seus produtos químicos em Aveiro. «No total operámos 81 navios e movimentámos um total superior a 800.000m cúbicos no ano passado», conta-nos o Director da PRIO Energy.

A A CRESCER IBUTO CHAVE E AVEIRO Conhecedora das limitações do seu porto como ninguém, a APA junta-se à PRIO para encontrar as melhores formas de as contornar. E hoje, salienta Paulo Leal, «para um navio que está a carregar no porto de Roterdão sabemos o ETA [Estimated Time Arrival] e sabemos também a janela horária de entrada, bem como as condições meteorológicas expectáveis, articulando com o porto de Aveiro ao pormenor para que o navio não fique à espera para entrar e que possa optimizar a carga útil» - reduzindo os elevados custos adicionais dos tempos de espera dos navios, bem como o custo total por tonelada de mercadoria transportada. Por outro lado, as limitações de calado também têm sido, de certa forma, contornadas. A estreita colaboração entre as partes envolvidas «tem permitido receber navios no cais operado por nós com capacidades superiores às definidas no projecto do Terminal de Granéis Líquidos», admite Paulo Leal, em alusão a um trabalho meticuloso e em conjunto que tem permitido tirar o máximo provei-

to do potencial do porto local - e, neste caso específico, ir mesmo para além da capacidade do mesmo, sem nunca por em causa as mais rigorosas condições de segurança. «A abertura, flexibilidade e competência do porto de Aveiro facilita muito o processo e sem essa colaboração não seria possível à PRIO continuar a optimizar as operações marítimo-portuárias», conclui Paulo Leal a este propósito. Para além da parceria próxima com a APA, há ainda espaço para colaboração entre as próprias empresas que utilizam o Terminal de Granéis Líquidos de Aveiro. Nas três pontes de cais concessionadas (cada uma com 150 metros de comprimento), a PRIO colabora com outro operador, o que terá aberto a possibilidade de «fazer entrar dois navios ao mesmo tempo quando há espaço disponível» aproveitando assim momentos em que o ‘vizinho’ não tem que fazer entrar um navio e conseguindo dessa forma gerir de forma mais eficiente as curtas janelas horárias de entrada em porto. www.revistacargo.pt

Três parceiros rodoviários escolhidos a dedo Se é desafiante toda a logística que envolve a parte marítima da actividade da PRIO em Aveiro, em terra também nada pode ser deixado ao acaso. Paulo Leal falou-nos da importância da «eficiência da logística primária, desde o transporte por navio à armazenagem» e do seu «peso importante no custo do produto», razões pelas quais a PRIO não pode descurar qualquer elo de toda a cadeia que leva os seus produtos até ao consumidor final. O critério em terra fica logo demonstrado no Parque de Tanques de Aveiro da PRIO, peça-chave de «suporte à estratégia ‘Top Low Cost’ que tanto sucesso tem tido junto do consumidor português», admite Paulo Leal. Nesse parque, a PRIO conta com «independência e com os mais elevados níveis de segurança, respeito pelo ambiente e qualidade», estando certificada em segurança, ambiente e qualidade. E se a PRIO pode ser suspeita ao falar de si própria, a realidade não engana: «A qualidade dos produtos e a segurança das operações têm merecido a confiança de dois dos quatro maiores operadores do mercado ibérico de combustíveis». As questões de segurança e qualidade não perdem relevância a partir do momento em que os camiões saem pela portaria do parque da PRIO. Com base em critérios de «segurança e qualidade do serviço de transporte», a PRIO seleccionou parceiros para fazer chegar os seus produtos ao mercado: «Trabalhamos com três empresas de referência do mercado, com as quais temos uma estreita integração de sistemas: a Transportes Paulo Duarte, a Transportes J. Amaral e a Transportes Aguieira - esta última operando exclusivamente para a PRIO. Por dia, são cerca de 60 os camiões que saem dos vários parques do Sistema Petrolífero Nacional, transportando cada um cerca de 30 mil litros de combustíveis com destino às estações PRIO espalhadas pelo país. 250 estações em todo o país e com autoestradas debaixo de olho À data da realização desta visita, a PRIO

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contava com 249 estações em todo o país, número bastante considerável se for tido em conta que opera há pouco mais de dez anos. Mas na PRIO vivem-se dias de expectativa face a uma oportunidade que está a surgir no mercado e em relação à qual Paulo Leal mostrou optimismo. Por um lado, a PRIO está bastante interessada na abertura de oportunidade que será o concurso para a concessão de vários postos de abastecimento em autoestradas de relevo um pouco por todo o país. Embora já esteja presente na A16 com duas posições - para as quais Paulo Leal nos fez um balanço extremamente positivo - o responsável da PRIO Energy admite que «estar presente nas principais autoestradas do país constitui um desafio e uma oportunidade». Ao todo, serão 15 os postos de abastecimento (dois por cada posição) que irão a concurso nas autoestradas nacionais e que estão debaixo de olho. «Aquilo que sentimos é um optimismo baseado na experiência que temos sentido com as posições da A16. A abertura de posições PRIO nesses eixos principais iria alargar a postura ‘Top Low Cost’ e permitir a mais Portugueses adquirir produtos e serviços PRIO ao mesmo preço, independentemente de os adquirir na autoestrada ou no seu local de residência», acrescenta Paulo Leal, mostrando-se ainda convencido de que a PRIO vai mudar o mercado caso consiga entrar nessas vias. E o optimismo para o futuro não se fica por aqui, visto que há uma outra oportunidade - esta bem mais consolidada

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Paulo Leal, membro da Comissão Executiva da PRIO - ao virar da esquina. Falamos da nova estação que a PRIO se prepara para inaugurar «na zona da Alta de Lisboa», uma posição que Paulo Leal considera de extrema importância pela entrada em força no mercado de Lisboa - até pela proximidade de vias muito movimentadas como a Segunda Circular. Embora a PRIO já esteja presente no centro de Lisboa com «duas posições de parceiros na Av. Roma e na Paiva Couceiro», Paulo Leal salienta que esta nova

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estação na Alta de Lisboa - que pode ser a 250.ª e cuja inauguração ser feita a muito curto prazo - «será a primeira grande posição da PRIO em Lisboa». E, tendo como base «o sucesso obtido com as outras posições, apesar de todas as suas limitações físicas», o responsável da PRIO mostra bastante optmismo relativamente a uma nova estação que «permitirá alargar a oferta do conceito ‘Top Low Cost’ a mais portugueses e, mais em particular, a mais lisboetas».


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A governação portuária influi na relação entre os proprietários, gestores, stakeholders e utilizadores e visa o desempenho com a melhor qualidade do serviço. A evolução verificada desde a década de oitenta constata grandes alterações na relação entre entidades públicos e agentes privados. J. Augusto Felício

MODELOS DE GOVERNAÇÃO PORTUÁRIA EUROPEUS Resumo Referem-se cinco modelos de governação portuária adoptados pela Grécia, França, Itália, Portugal e Holanda. Cada país adopta o seu modelo em função de objectivos, procurando conjugar perspectivas e interesses entre o Estado e os agentes privados para o máximo de eficiência e qualidade do sistema, em competição internacional.

1. Perspectivas da governação portuária A governação portuária influi na relação entre os proprietários, gestores, stakeholders e utilizadores e visa o desempenho com a melhor qualidade do serviço. A evolução verificada desde a década de oitenta constata grandes alterações na relação entre entidades públicos e agentes privados. A literatura reconhece que o modelo perfeito de governança portuária, “é um mito” (Brooks & Pallis, 2011). A discussão ao longo do tempo indica não haver uma única solução e que a sua escolha depende de muitos factores e do mercado. Cada porto constrói o seu modelo de governação portuária em função dos objectivos e da forma como se estrutura o porto, no quadro da sua dependência e relação com as autoridades e demais entidades, para servir os mais diversos utilizadores. As vantagens de um maior envolvimento do sector privado nos portos incluem uma maior eficiência e menor custo para o sector público, enquanto os impactos negativos incluem a perda ou o aumento da ambiguidade do controlo estatal, bem como as dificuldades e

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riscos com a gestão do processo de concessão e controlo. O World Bank (2000) identificou quatro modelos de governação que são: the public service port, the private port, the tool port e landlord port. Não obstante, verifica-se uma crescente heterogeneidade mesmo adoptando um dos modelos, caso dos landlord models, com distinta tipologia de organização, gestão e propriedade. A sua adaptação ao contexto de cada país confere uma reconfiguração híbrida aos modelos tradicionais, na busca da eficácia dos seus mecanismos de plasticidade institucional entre forças locais e forças globais. Reconhece-se à plasticidade institucional como potencial para desencadear os processos adaptativos dos modelos de governação portuária, envolvendo os stakeholders ao nível nacional, regional e local. Em geral, a transferência de um terminal público para um operador privado é um processo contínuo de reforma da governação ao integrar-se em redes de transporte e plataformas logísticas, dada a necessidade de atrair e manter tráfegos. Reconhece-se que as autoridades portuárias dependem das instituições existentes, por se inserirem nas convenções e relações sociais, por dependerem dos recursos e condições económicas, tanto nacionais como regionais, e por acumularem experiências. Os portos são drivers importantes para o desenvolvimento da economia, regional, nacional ou local, e o seu controlo é uma importante alavanca para o incremento do comércio internacional. A concessão de terminais portuários a operadores privados é relevante, como forma de harmonizar interesses de propriedade do Estado com a capacidade dos privados para o exercício da actividade eco-

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OPINIÃO

nómica, o que leva a considerar, ainda de forma mais alargada, a questão da privatização dos portos. Por exemplo, a problemática das autoridades portuárias dependentes do Estado evolui no sentido da sua transformação em empresas de direito privado que absorvem as suas competências. Porque deve ser o Estado o detentor da autoridade? As autoridades portuárias além do exercício de autoridade dispõem, em geral, de responsabilidades de desenvolvimento portuário e são entidades públicas na maioria dos países excepto, por exemplo, no Reino Unido e Austrália. A questão central que se coloca reside em saber se a autoridade portuária é indiscutivelmente uma entidade pública ou se pode ser privada com responsabilidades de autoridade delegadas pelo Estado. Ou, mesmo, se num mercado competitivo tem sentido a existência de uma autoridade portuária e se esse papel não deverá ser exercido pelas entidades privadas em defesa dos seus interesses no mercado liberalizado, obedecendo ao quadro legal estabelecido, naturalmente. Estas questões associam-se com as denominadas reformas portuárias que, em geral, todos os países realizam. Em termos económicos e do desenvolvimento portuário, em qualquer dos cenários, o problema envolve a adequação do modelo de governação portuária. Uma vez que o desenvolvimento portuário é um negócio a autoridade tem sentido ser assegurada por uma empresa de desenvolvimento portuário. Isto, porque as autoridades portuárias operam em ambientes competitivos, muitas com autoridade limitada ou sem autoridade e outras regulam e controlam as tarifas para evitar abusos de poder de mercado. Nas relações comerciais negoceiam preços de concessão, que


FIGURA 1 dependem do mercado, com entidades com quem estabelecem relações comerciais e quando isso acontece muitas vezes é injustificado. Estas e outras são razões que levam a defender, em substituição da autoridade portuária, uma empresa de desenvolvimento portuário.

2. Modelos de governação portuária 2.1 - Corporate governance dos portos da Grécia A Grécia decidiu seguir o caminho da empresarialização do modelo de ‘port devolution’ adoptado em vários países. Os portos de Piraeus (PPA) e Thessaloniki (ThPA), em 1999, converteram-se em empresas portuárias de propriedade do Estado (75%) e cotadas na Bolsa de Valores de Atenas. Em 2001, os outros 10 portos do Estado e de interesse nacional (Alexandroupoli, Kavala, Volos, Igoumenitsa, Elefsina, Corfu, Patras, Rafina, Lavrion, Herakleion) foram transferidos para 10 autoridades portuárias autónomas, ou seja, sociedades anónimas, com o objetivo de desenvolver as infraestruturas e oferecer serviços de qualidade e competitivos. Em 2009, o parlamento grego ratifica o contrato PPA-COSCO Pacific para operar e desenvolver o terminal de contentores de Piraeus (Piraeus Port Athority - PPA) e construir e comercializar dois novos terminais (Piraeus Container Terminal S.A. - PCT). Em 2010, num clima de crise financeira grave, a Grécia foi intervencionada pela Troika (FMI, CE, BCE) o que obriga à reforma e privatização dos portos (Figura 1). O governo introduz o Fundo de Desenvolvimento de Ativos da República Helénica (HRADF – Hellenic Republic Asset Development Fund), para organizar o programa de privatização. As acções próprias do Estado e os direitos de voto das 12 sociedades anónimas (SAs) foram transferidas para a HRADF. Em 2016, as ações da Autoridade Portuária de Salónica foram vendidas à China COSCO Shipping Corporation Ltd. que se comprometeu com investimentos, mantendo o Estado grego cerca de 8% das ações, o que corresponde a alto grau de privatização. O território é propriedade do Estado e o governo tem o direito de rescindir a concessão sob certas condições, não sendo os ativos transferidos para

o setor privado em perpetuidade e não podem ser vendidos de novo sem restrições. O sistema portuário grego inclui outras cerca de 900 instalações portuárias ao longo do seu imenso litoral. Existem 13 “Port Authorities” que atuam como sociedades anónimas, 3 “Port Funds” a nível regional, 69 “Municipal Port Funds” que operam a nível municipal e 2 “Port Offices” como escritórios portuários locais. Os municípios obtêm do Estado o controlo sobre os portos locais, em especial, porque as zonas portuárias extensas atribuídas oferecem oportunidades para atividades não portuárias. Para grande número de instalações portuárias o interesse é limitado, não existindo, nestes casos, instituições de gestão sendo as decisões tomadas a nível nacional. Em 2014, o governo estabelece a Autoridade Reguladora de Portos (RAL), a nível nacional, para monitorar a governação portuária e em 2016 o governo estabelece a Autoridade Pública para os Portos (PAP), responsável por todo o sistema portuário. Além do papel do RAL e PAP, o Ministry of Shipping and Island Policy, através da sua General Secretariat for Ports, Port Policy and Shipping, autoriza todos os aspectos da governação portuária, nomeadamente, o envolvido no planeamento,

aprovação das tarifas portuárias e o investimento em infraestruturas portuárias, bem como, nomeia os membros do board of directors (BoD) ou outros dirigentes portuários.

2.2 - Corporate governance dos portos de França As alterações no modelo de governação portuária francesa ocorrem em fase mais tardia, face aos outros países, levando a estabelecer três níveis de portos de “interesse nacional”, os portos principais, portos secundários e pequenas instalações. A política portuária da França baseou-se na criação de zonas portuárias supervisionadas pelo Estado, nomeadamente, a zona que concentra os portos principais de Dunkirk, Fos-sur-Mer e Le Havre, a zona que abrange os portos secundários, tais como, Saint-Nazaire ou Bordeaux e o restante do país que alberga pequenas instalações portuárias e que responde a interesses de âmbito mais local ou regional. Em 2004 a França transfere a propriedade, desenvolvimento, manutenção e gestão de 17 portos de “interesse nacional” para as autoridades locais, mantendo a autonomia dos sete principais portos. Já em 1983 tinha transferi-

FIGURA 2

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do mais de 500 pequenos portos para os departamentos do Estado (portos comerciais e de pesca) e para os municípios (marinas), correspondendo a um tráfego diminuto. Adopta um modelo tridimensional de organização dos seus portos, envolvendo as novas autoridades de concessão (governo local), os concessionários (Câmaras de Comércio e Indústria) e o Estado com autoridade soberana (policiamento e legislativa). Em 2008, a França transforma os portos autónomos (Le Havre, Marselha, Dunkirk, Nantes-Saint Nazaire, Rouen, La Rochelle Bordeaux) em grandes portos marítimos (LMP – Large Maritime Ports) (Figura 2). A reforma centra as funções da autoridade portuária no planeamento e na regulamentação, desenvolve a operação privada dos portos, mantém um Estado centralizado e permite que as autoridades portuárias continuem a operar terminais menos rentáveis adversos aos agentes privados. O ‘supervisory board’ valida e controla a estratégia proposta e implementada pela Directoria. O ‘development board’ reúne as partes interessadas no desenvolvimento dos portos, que incluem as autoridades locais, empresas portuárias, usuários portuários, especialistas, etc. Depois de tudo, o Estado reforça a supervisão sobre os grandes portos marítimos (LMP), não assume de forma clara uma estratégia portuária nacional, limita a concorrência entre os LMP, adopta o favorecimento da indústria como componente chave da estratégia dos LPM e transfere actividades para as empresas privadas de operação portuária.

2.3 - Corporate governance dos portos de Itália A governação portuária italiana propicia uma melhor compreensão dos efeitos produzidos pela consolidação das condições de nível nacional, regional e local. Levantam-se fortes desafios aos decisores políticos e reguladores, dado o poder de negociação a nível local dos operadores portuários, concessionários, agentes de navegação, transitários e sindicatos, a que se junta a complexidade e a instabilidade globais provenientes da ação política em todos os níveis governamentais. O governo italiano em 1994 introduziu nos portos o modelo landlord port, instituindo 18 autoridades portuárias. Mas, a última reforma do sistema portuário nacional ocorre em 2016 e procura responder a 22

FIGURA 3

necessidades de dimensão crítica dos portos, a insuficiências financeiras e obtenção de fontes de financiamento, a baixa competitividade dos portos a nível internacional e à ineficiência das conexões internas. As autoridades portuárias (AP) agrupam-se e formam sistemas de autoridades em número de 15. A Port Directorate (PD) tem a responsabilidade pelos portos, a Port Committee, representante as partes interessadas no porto (stakeholders) e tem apenas papel consultivo (Figura 3). Os presidentes das PSAs são nomeados pelo Ministro entre 3 experts sugeridos pelas autoridades locais e o National Coordinating Committee racionaliza e coordena de forma global os investimentos e recursos financeiros das diferentes PSAs. A organização multinível três patamares de acções estratégicas para os portos, em que a nível Central tendo releva o seu papel de influência a nível financeiro, as PSAs desempenham o papel chave de planeamento e coordenação e os PD gerem os recursos locais. Uma das principais críticas reside no baixo grau de independência garantido às AP. Outras referem a incoerência intrínseca (interna) entre o Plano Estratégico Nacional elaborado pelo Ministério e o projeto de reforma do modelo de governação portuária. As PA não beneficiam suficientemente de condições para capturar fluxos de carga adicionais, sem condições para incrementar processos de comercialização agressivos por falta de objectivos económicos, dada a sua natureza pública com funções de regulação e de autoridade. A reforma delimita a PA dentro dos órgãos da administração pública, impedindo a realização de qualquer tipo de atividade comercial e o desenvolvimento de estratégias de marketing, bem como, a possibilidade de empreender estratégias de transporte do interior.

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2.4 - Corporate governance dos portos da Holanda ou Netherlands A Holanda adoptou a empresarialização. A autoridade do porto de Roterdão (PoR) foi empresarializada em 2004 e possui como accionistas maioritário o município de Roterdão e o Estado holandês. Zeeland Seaports transformou-se numa empresa do governo em 2011, tendo como accionistas a província da Zelândia e três municípios. O porto de Amsterdão tornou-se entidade corporativa em 2013, com um único accionista que é o município de Amsterdão. Os portos marítimos de Groningen transformaram-se em entidade corporativa do governo em 2013. O único acionista é uma participação, na qual participam a província de Groningen e dois municípios. O modelo de corporate governance é constituído pelo executive board, supervisory board, board of commissioners e accionistas (Figura 4). O executive board é responsável pela gestão do PDC. Os membros são nomeados pelos accionistas, com base numa proposta do supervisory board. Nos portos de Roterdão, Amsterdão e Zeeland, o board of commissioners é composto por membros independentes. No caso de Groningen, três dos cinco membros do conselho representam a província e os dois municípios envolvidos. Todos os quatro portos são propriedade do Estado através da PDC. Existem políticas formais dos acionistas para os portos de Roterdão, Amsterdão e Zeeland, não totalmente explícitas quanto aos objetivos que o governo pretende alcançar, substituído na sua ausência pelo supervisory board. Os pequenos portos holandeses abarcam segmentos específicos, nomeadamente, short sea (Moerdijk), indústria de pesca (Scheveningen, Lauwersoog, IJmuiden, Harlingen),


FIGURA 4

2.5 - Corporate governance dos portos de Portugal As autoridades portuárias focam-se especialmente no cliente. Com reporte a 2016 o Estado estabelece com as Autoridade Portuárias (AP) contractos de gestão, para maior autonomia e responsabilização (“devolution”). Os portos portugueses adoptam o modelo “landlord port”. A reforma do sector portuário português baseia-se num modelo de governação portuária, que favorece a ligação às cadeias logísticas, orientado para a eficácia e a satisfação dos clientes, ou seja, para o desenvolvimento da gestão dos portos e do seu desempenho, centrado no papel das autoridades portuárias (Figura 5). A gestão do porto é realizada pela autoridade portuária (AP) de cada porto, com funções de fiscalização, gestão e atribuição de uso privativo e de serviço público entre outras, ao mesmo tempo muito influente junto do governo, municípios e entidades do Estado. O Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) é um organismo da administração do Estado com autonomia e funções de apoio ao Estado. A Autoridade da Mobilidade e dos Transporte (AMT), tem atribuições de regulação, promoção e defesa da concorrência nos transportes e no sector marítimo-portuário. O Ministério das Finanças exerce a tutela dos portos com o Ministério das Infraestruturas e Transportes e o Ministério do Mar como accionista e no acompanhamento da função financeira das empresas, através da DGTF – Direção Geral do Tesouro e Finanças. As AP são constituídas pela assembleia geral em que o Estado é o único accionista, pelo conselho de ad-

ministração nomeado pelo Estado e constituído por 2 a 5 membros e pelo conselho fiscal também nomeada pelo Estado sendo um deles, independente e especialista. Não existe conselho consultivo. A ligação entre empresas realiza-se por intermédio das associações que agregam as Comunidades Portuárias, constituídas por operadores de terminais e de serviços portuários, agentes de navegação, carregadores, transportadores marítimos, rodoviários e ferroviários. Em alguns casos incluem entidades locais, ambientais, municípios e de turismo.

3. Resultados O Estado desenvolve a sua influência nos portos através de múltiplas entidades, na disputa com interesses

FIGURA 5

OPINIÃO

indústria off-shore (Den Helder, Harlingen, Schiedam), construção naval e reparação (Harlingen, Schiedam) e turismo (Oudeschild, Scheveningen). Também nestes pequenos portos a “governação” mudou.

estabelecidos pelas empresas privadas mais dotadas para a gestão. O modelo de governação portuária tem grande importância por congregar os múltiplos interesses públicos e privados. Constata-se não existir um modelo que responda aos diferentes portos ou sistemas portuários e que cada país evolui no tipo de modelo de governação portuária em função das suas condições particulares e interesses instalados, bem como, da dinâmica económica e social. A Grécia, França, Itália, Portugal e Holanda adoptaram modelos de governação portuaária em função de cada realidade e forma como a economia funciona a par do sistema político instituído e experiência. Em alguns casos apresentam semelhanças. Questiona-se, no entanto, o papel do Estado no modelo de governação portuária, em especial o da autoridade portuária no sentido de ser uma emanação do Estado ou se deve transformar-se numa organização sujeita ao direito económico privado propriedade do Estado ou se deverá ser totalmente privada. É um processo dinâmico que está a decorrer para tornar o sistema portuário mais eficiente e com elevada qualidade de serviços prestados, quando se reconhece que cada vez mais os portos são nós de uma rede logística internacional.

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José Augusto Felício José Augusto Felício é Doutorado em Gestão no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Na mesma instituição, é hoje professor e Presidente do Centro de Estudos de Gestão. É ainda investigador nas áreas de gestão empresarial e gestão portuária e tem várias obras e textos publicados nesses âmbitos.

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Está perto de terminar o actual mandato como presidente da ENIDH. Que balanço faz destes quatro anos? Faço um balanço bastante positivo. Partimos para este mandato com o objetivo de abrir a Escola ao exterior, através da internacionalização e ligação aos players do setor marítimo-portuário, melhorar as condições de ensino e de aprendizagem e adequar a formação da Escola aos novos desafios para o setor marítimo-portuário. Por outro lado, partimos de uma situação em que não tínhamos Erasmus na Escola, existiam edifícios que precisavam de um conjunto de obras muito significativas, era necessário aumentar a captação de receitas próprias para combater a falta de recursos, entre outros. Recebemos cada vez menos dinheiro do Orçamento de Estado, uma tendência que se acentuou com o anterior Governo. Com o atual Governo conseguimos, pelo menos, estabilizar o valor da dotação orçamental. Mas o valor que recebemos é claramente insuficiente para as nossas necessidades, daí a necessidade de aumentar as receitas próprias. Como foi conseguido esse aumento das receitas próprias? Com a realização de cursos de formação profissional que são necessários para os oficiais da marinha mercante – que são o nosso core business em termos de formação superior – e também para

empresas que nos procuram para realizar ações de formação de que necessitam para os seus quadros. As outras fontes de receita própria são as propinas e os alugueres de espaços. Por outro lado, lançámos ofertas formativas conjuntas com outras escolas e até mesmo com empresas, onde se destaca o Curso de Especialização em Logistics & Port Mangament que fizemos com a MSC Portugal, e que deu origem à Academia MSC/ENIDH. Essa iniciativa teve um enorme sucesso nas suas duas primeiras edições, onde conseguimos uma taxa de empregabilidade bastante alta dos diplomados, acima dos 90%. Criámos também os chamados CTeSP – Cursos Técnicos Superiores Profissionais, incentivados pelo Governo, embora aqui estejamos dependentes do financiamento que se comprometeram a atribuir-nos, mas que até ao momento ainda não foi pago. Destaco também o novo perfil de Oficial da Marinha Mercante que é o do Oficial Eletrotécnico (Electrotechnical Officer) e que deu origem à nova Licenciatura em Engenharia Eletrotécnica Marítima, que arrancou o ano passado. Todo este trabalho realizado na área formativa levou a que tenhamos neste momento um número total de alunos que rondará os 750 alunos. Quantos alunos tinha a ENIDH no início deste mandato?

Eram cerca de 720, se contarmos apenas com os alunos inscritos nas Licenciaturas, Mestrados e CETs. Não subimos tanto quanto gostaríamos, mas pelo menos conseguimos contrariar a tendência de redução do número de alunos que se verificou no ensino superior, devido à crise que atingiu o país nos últimos anos. E aqui incluem-se os novos alunos do Erasmus+, programa que iniciámos pela primeira vez em 2015. Hoje, já temos uma boa capacidade de receber e enviar alunos e os próprios docentes já realizam esse tipo de intercâmbio com outras escolas. Isto é muito importante, pois permite um alargar de horizontes ao conviver com outras realidades e outras práticas, algo que é sempre benéfico para a instituição e para as pessoas. Falou das obras feitas nas infraestruturas da ENIDH. Que trabalho foi feito? Temos trabalhado em várias frentes, no ginásio, na piscina, no edifício dos alojamentos que são uma grande preocupação, na substituição da canalização de abastecimento de água, etc… Encontrámos muitos problemas! No próprio edifício principal, temos tido a preocupação de substituir iluminação antiga por iluminação LED, a biblioteca foi completamente remodelada, as salas de aula contam hoje em dia com projetores multimédia fixados ao teto, os laboratórios também na sua maioria… Destaco ainda a instalação dos servi-

LUÍS BAPTISTA, PRESIDENTE DA ENIDH

"EXISTE HOJE NO EXTERIOR UMA PERCEPÇÃO MUITO POSITIVA DA ENIDH" 24

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A TERMINAR UM MANDATO DE QUATRO ANOS À FRENTE DA ESCOLA NÁUTICA, LUÍS BAPTISTA CONCEDE UMA ENTREVISTA À REVISTA CARGO ONDE FALA DO QUE FOI FEITO E DO QUE AINDA QUER FAZER. E ABORDA AINDA OS DESAF IOS DA TECNOLOGIA E DA AUTOMAÇÃO.


ços administrativos que estavam dispersos no edifício 2 e que passaram para o edifício principal, ganhando-se assim eficiência e produtividade pela proximidade entre todos. A internacionalização da ENIDH também tem sido uma das vitórias desta direção, certo? Sem dúvida, é a parte que mais satisfação me dá. Esse tem sido um objetivo da nossa gestão e temos feito os possíveis para divulgar a escola internacionalmente. Já possuímos brochuras dos cursos em formato bilingue e, muito brevemente, o nosso website vai passar a ter também uma versão em língua inglesa. O programa Erasmus veio trazer uma grande dinamização a essa componente e, com a assinatura do protocolo que fizemos com Instituto de Formação e Aproveitamento dos Recursos Humanos do Panamá (IFARHU), trouxemos no ano passado 35 alunos panamianos para as nossas Licenciaturas, Mestrados e Cursos Técnicos Profissionais. Tudo isso permitiu que o conjunto de alunos não portugueses passasse de 60 em 2016 para quase 104 no corrente ano. E esse é um número significativo numa escola com 750 alunos, são cerca de 14%, o que se traduz também em novos desafios e novas formas de trabalhar, nomeadamente pela necessidade de ministrar aulas em inglês. E vejo os alunos do Panamá muito satisfeitos, integrados e vontade por parte do Panamá em trazer mais alunos este ano. Há disponibilidade na ENIDH para receber mais alunos do Panamá? Estamos a trabalhar nisso. Nós temos 20% das vagas de licenciatura reservadas para alunos internacionais e temos tido muito interesse de candidatos do Brasil que querem vir para cá fazer a sua formação. Isto porque no Brasil só existem duas escolas náuticas, o que é muito pouco para um país daquela dimensão. Há muita falta de oferta e os brasileiros têm procurado a ENIDH para fazer a sua formação, tanto de Licenciaturas como de Mestrados. De que forma é que a ENIDH tem conseguido recuperar esse prestígio? É um trabalho que tem sido feito na divulgação da Escola, nomeadamente em jornais ou revistas como é o caso da Revista Cargo. Mas também nas redes sociais, no nosso website, através de brochuras, é um trabalho diário. E também temos tido uma participação cada vez mais consistente na feira Futurália, onde tivemos este ano um stand de 36m2 e com um simulador de navegação que cria grande impacto a quem lá passa.

A terminar o mandato, o objectivo passa por continuar e seguir esse caminho feito até aqui? Claro que há vontade de continuar. É verdade que estamos a falar de uma escola pública, com todos os constrangimentos legais, financeiros, etc… inerentes. Não podemos gastar o que gostaríamos, não temos os financiamentos que gostaríamos... E temos um parque escolar com alguma degradação, que precisa de investimentos na sua recuperação. Ainda falta fazer muita coisa e é nossa intenção avançar com candidaturas para financiamentos que visam melhorar a eficiência energética dos edifícios. É todo um trabalho que não se esgota num mandato porque estamos condicionados pelos prazos das candidaturas ... Há momentos próprios para avançar e pretendo continuar para dar seguimento a esse trabalho. Sente que o trabalho de valorização da ENIDH também tem sido reconhecido pelo sector? Sem dúvida! Tenho tido a oportunidade de ouvir os parceiros do setor, desde armadores a outras empresas, associações e todos os demais agentes que trabalham para o sector marítimo-portuário. E todos me dizem que a ENIDH voltou a ter um grau de reconhecimento muito superior, existe hoje no exterior uma percepção muito positiva da Escola. As pessoas já reconhecem a Escola e esta está a interagir com o sector. A ENIDH já consegue ter empresas muito próximas, como é o caso da Rebonave que realizou na ENIDH um seminário técnico dedicado ao reboque marítimo - algo que julgo nunca ter acontecido! Tudo isso contribui para uma perceção positiva da instituição e para um reconhecimento cada vez maior da escola no exterior. São os próprios agentes do setor que estão satisfeitos com o rumo que estamos a seguir, não há melhor indicador para nos dizer que este é o caminho certo. Teve a sensação, quando entrou para Presidente, que a ENIDH estava desvalorizada junto do sector? O que percebi é que havia pouca ligação entre a Escola e o sector, pouca interação com o exterior. E foi um trabalho exigente o que fizemos. Passou por participar em eventos, interagir com os players, fazer muitas reuniões. Tudo está relacionado com a dinâmica que se colocou, um trabalho árduo e que muitas vezes não se vê. É um trabalho diário! Mesmo em período de férias, é preciso estar sempre disponível. É um trabalho que faço com todo o gosto pois é um trabalho que sempre desejei, de www.revistacargo.pt

dar projeção à Escola, dinamizá-la, tornar a Escola num player importante para o sector onde estamos inseridos... Ainda recentemente tivemos mais um grande reconhecimento, do Grupo Sousa, um armador com o qual conseguimos celebrar um protocolo para embarque de praticante nos seus navios, algo que não acontecia até essa altura. Trata-se de um trabalho e uma colaboração muito positiva com um grande armador nacional, o que nos deixa muito satisfeitos. Todas essas novas parcerias ajudam a melhorar a taxa de empregabilidade, que é um dos grandes indicadores da ENIDH, certo? Sim, sem dúvida. Temos estabelecido imensos protocolos, sobretudo na área portuária e relacionados com os Cursos de Gestão de Transportes e Logística e Gestão Portuária. São protocolos com empresas que procuram os nossos alunos assim que estes terminam os seus cursos. Muitas vezes, antes de terminar o curso, os alunos já estão a estagiar. E a ENIDH consegue dar resposta à procura que existe no mercado? Não, porque infelizmente não conseguimos formar o número de diplomados que o mercado necessita. Essa é uma vertente que queremos melhorar e, se possível, começar a produzir mais diplomados. Não temos dúvidas que há mercado e que o mercado necessita dos nossos diplomados. Especialmente no sector portuário há todo o interesse em virem buscar diplomados à ENIDH pois são jovens que já estão familiarizados com a linguagem utilizada no meio marítimo, sabem o que é um navio, sabem o que são as operações portuárias, normas, legislação específica, etc. É uma bagagem que um diplomado de um curso tradicional de outra escola superior não tem. Os nossos alunos já entram com essa vantagem, mais rapidamente começam a ser produtivos e os empregadores sabem disso. Preocupa-o ver o Registo Convencional de Navios a perder quase todos os seus navios? Não nos podemos esquecer que o Registo da Madeira (RIN-MAR), que tem quase 500 navios, precisa de imensos marítimos qualificados. Mas, infelizmente, ainda não estamos a conseguir criar a ligação com esse registo para integrar os nossos diplomados. É um dos grandes objetivos para o próximo mandato, queremos estreitar essa ligação para que esses navios possam aceitar os nossos praticantes. Porque, na verdade, são navios que ostentam a bandeira portuguesa, portanto falta apelar à sensibilidade

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dos agentes do setor de forma a criar um clima mais favorável no sentido de poder canalizar para esses armadores os nossos praticantes. Se os conseguirmos colocar lá, estou certo que vão querer ficar com eles. A colocação no transporte marítimo internacional até já acontece, no âmbito do Programa Erasmus, com um protocolo que temos com o armador alemão Hamburg-Süd, que permitiu aos nossos praticantes receberem um financiamento através do Erasmus para que possam embarcar. É algo até interessante para o armador pois reduz os seus custos. E já canalizamos cerca de 12 diplomados para realizar estágios nestes navios, e alguns deles acabaram por ser contratados. O que falta para conseguir essa ligação da ENIDH ao Registo da Madeira?

Acho que falta diálogo entre os organismos nacionais e o Registo da Madeira. Há uma falta de sensibilidade no sentido de cativar os armadores internacionais para receberem os nossos diplomados. Até porque estes navios, tendo bandeira portuguesa, deverão ter uma quota de marítimos portugueses, certo? Sim, uma quota de 30% e que já foi de 50%. Mas o que acontece é que os armadores internacionais pedem certificados de dispensa para embarcar os marítimos que pretendem. Basicamente, nestes casos pedem dispensa de embarcar marítimos portugueses. Como não há marítimos nacionais em número suficiente, os armadores acabam por nunca preencher essa quota. Os dados que tenho é que há dois anos a quota de marítimos portugueses

andava pelos 8% mas que deve ser hoje ainda mais reduzida, talvez na ordem dos 5%. Um estudo da BIMCO revela que há uma grande falta de profissionais neste sector. É mais uma demonstração da importância do papel de uma entidade como a ENIDH? É verdade. O estudo aponta para que em 2025 exista um défice de 150.000 oficiais no mundo inteiro, 80.000 dos quais da área da engenharia. Portanto, temos todo o interesse em aumentar a oferta de diplomados dos cursos marítimos! Temos a garantia de que há capacidade para que esses diplomados possam ser integralmente absorvidos pelas marinhas mercantes, sobretudo as comunitárias que são aquelas que nos interessam mais.

"AUTOMAÇÃO DOS NAVIOS NÃO SE COLOCARÁ NOS PRÓXIMOS ANOS" Como é que a ENIDH se está a preparar no campo da tecnologia, nomeadamente no que diz respeito aos investimentos em novos equipamentos? Não havendo disponibilidade orçamental para investir em novos equipamentos, em simuladores, em laboratórios, etc. a única hipótese que temos é procurar obter fundos europeus. Esse foi, de resto, uma das primeiras iniciativas desta direção, procurar saber as várias possibilidades de obtenção de fundos comunitários. Nesse âmbito, conseguimos que nos fosse atribuído um projeto com fundos doados pela Noruega, Islândia e Liechtenstein, os designados EEA Grants. Nesses fundos, entre 2018 e 2021 Portugal vai receber um pacote de 38 milhões de euros, sendo que a ENIDH candidatou-se a um financiamento de 2 milhões de euros para reequipamento de simuladores e outros equipamentos necessários à formação marítima. Foi uma aposta ganha, já foi assinado um memorando de entendimento em que esse projeto foi contemplado. Esta é uma oportunidade única para atualizarmos os nossos simuladores, atualizarmos tecnologicamente, prepararmo-nos para as novas tecnologias emergentes como a dos motores de navios com controlo eletrónico, queima de gás natural como combustível de marinha, propulsão elétrica de alta tensão, todo este conjunto de tecnologias que estão a ser desenvolvidas hoje em dia. Nós precisamos de tê-las nos nossos simuladores e só através destes fundos é que tal será possível. Por outro lado, também nos candidatámos ao programa de fundos comuni-

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tários Lisboa 2020, tendo já recebido uma primeira resposta positiva, para um valor global de 350.000 euros, para reequipar a Escola com sistemas informáticos, equipamentos de segurança marítima, etc. Preocupa-o, como Presidente da ENIDH, que os avanços tecnológicos substituam as pessoas? Fala-se muito em navios autónomos e que eles vão invadir o mercado mundial, mas é um cenário extremamente prematuro ainda. Temos entre 60 e 70 mil navios a navegar no mundo inteiro e um navio porta-contentores pode custar mais de 200 milhões de euros. Um armador não pode simplesmente descartar os navios que tem de um momento para o outro. Isso seria abdicar de toda uma frota existente e investir ainda mais em navios que serão ainda mais caros pelas tecnologias que terão incorporadas. E ainda temos os custos dos sistemas de controlo em terra e dos operadores que serão bem pagos, pessoas tecnicamente bem preparadas custam caro. A mudança que se fala será de tal forma complexa que o problema não se colocará nos tempos mais próximos. Isto no caso dos navios oceânicos, porque no caso dos ferries, navios que naveguem em rios, canais ou estuários parece-me mais provável que a mudança comece a fazer-se mais no curto prazo. Temos o caso da aviação civil, onde há muitos anos se fala de aviões autónomos. Li um estudo que mostrava que as pessoas não se importam de pagar mais desde que o avião tenha piloto. O factor humano continua a ser muito

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importante. Há muitas decisões que têm de ser tomadas na hora e se não for o ser humano a decidir o sistema automático pode não conseguir resolver. Os sistemas não têm ainda a capacidade de improvisação numa situação de risco. Por tudo isso, acho que devemos ter calma. É claro que não devemos ignorar o assunto porque há soluções e estudos muito interessantes. Mas não será, seguramente, uma mudança que se fará na nossa geração. Quando o dia chegar, acredita que o sector conseguirá adaptar-se de forma a criar novos postos de trabalho? Terá que se reinventar. O problema é que quando isto acontecer, será inevitável a perda de muitos postos de trabalho, visto o grande objetivo da automação ser esse mesmo. E isso é algo que nos preocupa, como entidade formadora. Gostávamos que essa mudança não fosse tão drástica. Os alunos já começam a demonstrar essa preocupação? No caso dos alunos, sinto que ainda não estão muito por dentro destes assuntos e vão reagindo às notícias que vão lendo, que não passam ainda de projetos-piloto, entre outros. São projetos experimentais mas há um alarmismo da parte deles com as coisas que vão aparecendo, e que nós tentamos ir esclarecendo da melhor forma possível, de modo a evitar que desistam da carreira na marinha mercante. Não podemos esquecer-nos que o Mar é um recurso que devemos aproveitar ao máximo para aumentar a riqueza do país.


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BREVES MARÍTIMO PORTO DE SINES CRESCEU 1000% NOS CONTENTORES NA ÚLTIMA DÉCADA Num dos mais recentes estudos de Theo Notteboom (especialista portuário e professor nas universidades de Gent, Antuérpia e na Universidade Marítima de Xangai) foi traçado um panorama global sobre a evolução da movimentação de contentores no continente europeu entre 2007 e 2016, e Portugal destaca-se com pompa. Pulando de 1,3% para 2,5% de quota de mercado nesta área, a movimentação lusa tem na proficuidade do Porto de Sines um feito operacional único: um crescimento de 1000% registado na última década, atingido-se a fasquia dos 1,51 milhões de TEU. Dispensando elogios à evolução do mercado da movimentação de contentores em Portugal, o especialista em Economia e Gestão Marítima realça que os portos portugueses ganharam a medalha de prata no que toca ao crescimento percentual - na Europa - referente ao período 2007-2016, com o ouro a ir para os portos da baía de Gdansk (Polónia). Theo Notteboom refere que as investidas do sistema marítimo-portuário português resultaram numa duplicação da quota de mercado do país no contexto europeu, feito que, realizado durante um período austero pleno de obstáculos económico-financeiros, é digno de menção honrosa. «Os portos portugueses estão a tentar arduamente expandir os seus negócios através do desenvolvimento de um papel de ‘transhipment’ e também por via do acesso ao mercado espanhol, através da constituição de corredores ferroviários e do desenvolvimento de portos secos», assinala Theo Notteboom, explicando que o período das «quedas das quotas de mercado» na Europa faz parte do passado. «O Porto de Sines registou o crescimento de tráfego mais avolumado, principalmente devido ao crescente volume empenhado pela MSC e à extensão adicional do terminal operacional PSA/MSC», acrescenta, rematando depois: «Sines atingiu os 1,51 milhões de TEU, dez vezes mais que em 2007». Portugal duplicou a sua quota europeia no segmento dos contentores, o Porto de Sines elevou-se astronomicamente, mas também o Porto de Leixões mereceu nota de destaque por parte de Theo Notteboom: «O volume do Porto de Leixões aumentou em 50% no mesmo período, enquanto o Porto de Lisboa manuseou menos 30% de contentores em 2016, quando comparado com 2007», analisou o especialista no seu estudo ‘Top EU container port regions (2007-2016): the rise of South Europe’.

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eCANTER JÁ COMEÇOU A SER PRODUZIDA EM SÉRIE NO TRAMAGAL

A FÁBRI CA DA FUS O NO T RA MAGA L TO RNOU - S E A S E G U N DA U N I DA D E À ESCALA MUNDIAL (A PRI ME I RA NA EUROPA) A P RO D U Z I R O P R I M E I RO VE Í C U LO C OME RC I A L DE MERCADORIAS TOTALMENTE ELÉCTRICO!

Portugal, mais propriamente a unidade de produção da Mitsubishi Fuso Truck and Bus Corporation no Tramagal, foi escolhido para a produção em série do primeiro veículo comercial de mercadorias totalmente eléctrico: a FUSO eCanter. O início da produção em série teve lugar no passado dia 27 de Junho, com várias presenças ilustres na unidade da Mitsubishi Fuso Truck and Bus Corporation, entre as quais a do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. A cerimónia, na qual a Revista Cargo também marcou presença, ganhou maior relevo dada a importância do momento. É que o dia não era para menos: a unidade do Tramagal é apenas a segunda do mundo a iniciar a produção em série destes veículos de mercadorias totalmente eléctricos, juntando-se à unidade japonesa de Kawazaki. É na unidade do Tramagal que a FUSO marca da Daimler Trucks Asia - produzirá e em boa parte exportará a eCanter para os mercados Europeu e Norte Americano, juntando a produção do modelo eléctrico à do comercial FUSO Canter convencional. Marc Llistosella destaca produção no Tramagal com destino a Nova Iorque O Presidente e CEO da Mitsubishi FUSO Truck and Bus Corporation e Responsável máximo da Daimler Trucks Asia, Marc Llistosella, fez questão de estar presente no dia que marcou a produção em série da eCanter. «Hoje, com o início de produção, tornámo-nos o primeiro fabricante do mundo a produzir em série veículos de mercadorias completamente eléctricos. A partir de agora poderemos corres-

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ponder à cada vez maior procura de viaturas comerciais sem emissões para distribuição dentro de Mega-Cidades. Já recebemos as primeiras encomendas e marcámos o lançamento global deste veículo para uma das mais icónicas Mega-Cidades, Nova Iorque, em Setembro. A nossa fábrica Portuguesa não se limita a produzir para a Europa e para os Estados Unidos da América, também beneficia de uma estreita colaboração com as autoridades em Portugal e Lisboa que vem testando os veículos comerciais desde 2014», declarou em comunicado antes do evento. Primeiro cliente da eCanter é do Japão e receberá 25 unidades No passado mês de Maio, a Mitsubishi FUSO Truck and Bus Corporation anunciou o seu primeiro cliente comercial no mercado japonês. Trata-se da companhia Seven-Eleven Co., Ltd. a qual irá ter a operar durante o próximo ano 25 unidades da nova eCanter. Foi também em Maio que a fabricante inaugurou a sua primeira estação de carga para veículos comercias, tendo já iniciado a produção na fábrica de Kawazaki (Japão), a 7 de Julho. A unidade de produção do Tramagal registou assim o início da produção da eCanter fora do Japão. Início ficará marcado por produção em série em pequena escala Apesar do dia de hoje ter marcado o início da produção em série da eCanter, o veículo só será produzido em larga escala a partir de 2019. Até lá, a produção será em pequena escala, beneficiando também da experiência www.revistacargo.pt

acumulada desta pequena série já nas mãos dos clientes. Destaque para o facto da unidade do Tramagal começar agora a produção da eCanter mas em simultâneo com o veículo comercial ligeiro de mercadorias Canter. No caso, somente os componentes específicos da propulsão eléctrica estarão instalados em boxes específicas ao longo da linha de produção. A FUSO eCanter em resumo Com a eCanter, a FUSO cria um comercial ligeiro de mercadorias totalmente eléctrico como resposta às necessidades do público de um veículo de mercadorias com zero emissões e zero ruído para distribuição dentro das cidades. No comunicado da FUSO pode ler-se: «A eCanter ajuda a resolver os cada vez maiores problemas de ruído e poluição em ambientes urbanos em todo o mundo. Para além de ser uma viatura amiga do ambiente, é ainda muito eficiente para o utilizador em termos económicos. A eCanter tem uma autonomia de 100 quilómetros e uma capacidade de carga de duas a três toneladas – dependendo dos tipos de caixa e utilização. O propulsor eléctrico da viatura contém seis baterias de alta voltagem com 420v e 13,8Kwh cada». Saliente-se que a eCanter beneficia da experiência proporcionada pelos testes realizados por clientes em Portugal e na Alemanha com a pré-série entre 2014-17. Face aos comerciais ligeiros convencionais a diesel, oferece poupanças nos custos de operação na ordem dos 1.000 euros por cada 10.000 quilómetros. Também oferece significativa redução de emissões de CO2.


O E E A A O L S

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TEST-DRIVE: CONDUZIMOS A NOVA CRAFTER PELAS DESAFIANTES RUAS DE LISBOA!

Quando nos passaram a chave para a mão, os profissionais da Volkswagen garantiram-nos que conduzir a Crafter era como conduzir um Golf. O aparente exagero foi-se esbatendo com o passar da semana, à medida que conhecemos melhor o veículo. As próximas duas páginas esclarecem essa e outras questões. Disponível em três tamanhos e três capacidades de carga, a nova Crafter furgão garante a melhor capacidade de carga global da sua classe ao contemplar, na sua versão maior, uma capacidade de carga de 18,3 m3 - o equivalente a seis euro paletes. A introdução da tracção dianteira permite que o seu piso de carga seja rebaixado em 100mm levando a que a sua altura de carga atinja os 2.196 mm. A abertura da porta lateral que vai até aos 1.311 mm de largura visa facilitar a carga e descarga, sobretudo de euro paletes - que têm dimensões de 1.200mm por 800mm. Completamente preparada para os desafios profissionais que lhe serão colocados, a Crafter conta ainda, por baixo dos bancos dos passageiros, com bastante espaço para arrumar as ferramentas de trabalho que necessite. Voltando ao espaço preparado para a mercadoria, a Crafter possui quatorze olhais de fixação embutidos no piso de carga, assim como calhas de fixação nas paredes laterais e ainda espaço de armazenagem no tejadilho interior. A Crafter torna-se ainda no primeiro (e até ver único) veículo da sua classe com uma caixa automática de oito velocidades em três sistemas de tracção diferentes (dos quais falaremos mais à frente), o que visa proporcionar um

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estilo de condução confortável e económico, mesmo em percursos citadinos com trânsito. A versão por nós testada, embora não tenha a caixa automática, proporcionou igualmente um grande conforto de condução em circuitos urbanos dada a sua elevada brecagem. E nunca é demais destacar o seu extremamente útil sistema de parqueamento automático - lembra-se das comparações com o Golf? É que estacionar um furgão destas dimensões nunca foi tão fácil... Os seus motores foram projectados para uma elevada vida útil, e concebidos para as particularidades dos veículos comercial e, garante a Volswagen, até no sector da distribuição (em que se atinge uma elevada quilometragem) a eficiência e fiabilidade operacional são garantidos e os baixos consumos são uma certeza. Três tracções disponíveis Ao nível das tracções, a nova Crafter conta, desde logo, com a tracção dianteira, a qual oferece possibilidades para uma altura de carga mais elevada - proporcionando, de resto, o maior volume de carga da sua classe ao beneficiar de uma altura de acesso e rebordo de carga rebaixados em 100mm. Tudo isto é possível graças ao motor dianteiro que está montado transversalmente. www.revistacargo.pt

Já a tracção traseira permite uma capacidade de reboque maior (até 3,5t) tendo uma capacidade máxima de tracção de 8t, ideal para lidar com grandes cargas maximizando a carga útil. O seu motor dianteiro montado longitudinalmente permite um bom desempenho mesmo quando carregada na totalidade. Por fim, existe ainda a versão com tracção integral 4motion, ideal para ir mais além - seja em locais enlameados, caminhos de terra batida e até em terrenos com grandes inclinações. A fiabilidade de tracção às quatro rodas está garantida bem como a melhor estabilidade direccional, numa solução disponível em versão de fábrica. Conforto garantido A Crafter não foi apenas concebida para proporcionar grandes capacidades de carga e elevado desempenho profissional. A Volkswagen não descurou o conforto de quem a conduz e é caso para dizer que nada foi deixado ao acaso. A começar pelos bancos pneumáticos ‘ergoComfort’, dotados de amortecedores de solavancos e 20 vias de regulação, dando resposta às directrizes AGR (campanha para costas mais saudáveis). E são ainda disponibilizadas as opções de aquecimento e de massagem! Outro dos pontos pensados para garantir um maior conforto ao condutor passou pelas sofisticadas soluções de


arrumação. À disposição do condutor e restantes passageiros existem compartimentos dedicados à arrumação de um metro dobrável, lanterna, óculos de sol, pastas de arquivo, luvas de trabalho bem como para smartphones, portáteis/tablets, garrafas de água de 1,5l nas portas, chávenas de café, e muito mais... Não faltará espaço dedicado a tudo aquilo que necessitar no dia-a-dia profissional! Também a nível de interface e ligações, soluções cada vez mais importantes na rotina de trabalho de um profissional, a nova Crafter vem equipada com kit mãos livres, porta USB para carregamento de dispositivos móveis, diversas tomadas de 12v (incluindo no compartimento de carga) e até uma tomada de 230V externa para carregar baterias de ferramentas e computadores portáteis. Ainda ao nível do conforto, o condutor pode contar ainda com ar condicionado, volante multifunções (que, opcionalmente pode ter aquecimento) e também pilares mais finos de forma a melhorar a visibilidade dianteira e a visão global. Robusta mas eficaz em percursos citadinos Apesar do seu volume, a nova Crafter é, ainda assim, uma óptima solução para percursos citadinos - tudo graças aos seus sistemas de segurança e de assistência à condução. O seu sistema ‘Rear Traffic Alert’ emite um aviso sonoro ao sair de marcha-atrás de um lugar de estacionamento quando um veículo se está a aproximar. E, se isso não for suficiente, ainda lhe reduz as potenciais consequências de um acidente ao travar. Por outro lado, possui também um sistema de ‘side assist’, que por meio de sinais acústicos e ópticos lhe per-

Versão

mite saber se está demasiado próximo de algum obstáculo. A Crafter redobra assim a atenção do condutor com vários ‘olhos’, estando incessantemente atenta a todos os obstáculos que a rodeiam no seu ambiente profissional. Inserido ainda naquilo que a torna uma excelente solução para a cidade está o acima referido auxiliar de estacionamento ‘Park Assist’. Uma valiosa ajuda nos estacionamentos transversais e longitudinais. Caso o estacionamento exija várias manobras, basta engrenar a marcha-atrás e o veículo assume autonomamente a direcção enquanto o condutor opera unicamente a embraiagem, o pedal do acelerador e o travão. Além destes auxílios, a nova Crafter possui ainda um sistema de manobras com reboque, o ‘Trailer Assit’, que direcciona automaticamente os veículos com reboque em estacionamentos paralelos

Altura

e perpendiculares. Tudo isto, beneficiando da direcção electromecânica ‘Servotronic’ que é sensível à velocidade e possui retorno activo do volante, melhorando a sensação de direcção em torno do ponto central, garantindo um nível de precisão da direcção inédito em veículos comerciais. Para a equipa da Revista Cargo, a nova Crafter não foi um parceiro profissional nem tão pouco a colocámos em cenários de exigência por aí além - mas as características que a definem não nos permitem duvidar do seu potencial para os mais diversos ambientes e desafios profissionais. Ainda assim, testámo-la num dos ambientes que mais dúvidas profissionais se podem colocar a este modelo, dada a sua dimensão: o delicado ambiente citadino. E, numa Lisboa que nos deixa tantas vezes a suar, a Crafter foi nunca nos deixou mal.

Comprimento

PVP (eur)

Médio Tecto Baixo

2,36m

5,99m

29.701,53

Médio Tecto Alto

2,36m

5,99m

30.698,00

Longo Tecto Alto

2,59m

6,84m

33.886,69

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BREVES TERRESTRE E LOGÍSTICA GRUPO DE SIGNATÁRIOS ENTREGA MANIFESTO CONTRA "ILHA FERROVIÁRIA" EM PORTUGAL Um grupo de empresários, gestores e investigadores fez chegar aos partidos com assento parlamentar e ao Presidente da República um documento intitulado ‘Portugal, uma ilha ferroviária da União Europeia’, no qual os 39 signatários alertam para o isolamento ferroviário que perspectivam para o futuro do país. Recordando que do lado espanhol estão já a ser feitas as alterações ao nível de bitola, passando da bitola ibérica para a bitola europeia, o grupo vinca a urgência de Portugal aproveitar

os fundos comunitários para seguir o mesmo caminho, sob pena de se sujeitar a um isolamento ferroviário - e afectando assim a competitividade das exportações portuguesas. O Manifesto ‘Portugal, uma ilha ferroviária na União Europeia” é promovido pelo empresário Henrique Neto e pelo investigador Eugénio Sequeira. Nele podem ler-se alertas sobre o que os signatários consideram ser o «abandono a que foram votados os caminhos-de-ferro portugueses». Ainda segundo o documento, Portu-

gal caminha para uma situação em que as mercadorias terão que ser transferidas para comboios espanhóis ou para a rodovia para atravessar a fronteira, lembrando os custos logísticos e de tempo associados a esse transbordo. Sobre a aposta portuguesa na ferrovia, que passa pela modernização da actual rede, os signatários consideram ser um erro por não contemplar a necessária mudança de bitola, perspectivando um futuro em que Portugal será uma ilha ferroviária na rede europeia. disponíveis e a sua localização.

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ANTÓNIO BEIRÃO (MAIS):

"PENSAMOS DE MANHÃ À NOITE EM TER O CARGUEIRO CHEIO"

O Consórcio MAIS (Madeira Integrated Solutions), composto pela ALS, Swiftair e Loginsular, iniciou a operação de um cargueiro que liga a Madeira a Lisboa. Em entrevista à Revista Cargo, António Beirão fala dos desafios mas também de uma enorme ambição. Um avião de maior capacidade e os Açores são objectivos. Como nasceu o Consórcio MAIS (Madeira Integrated Solutions), composto pela ALS, Swiftair e Loginsular? Eu sempre acreditei que sozinhos não conseguimos chegar muito longe. Há que trabalhar em equipa e isso não significa apenas trabalhar dentro de cada empresa. Passa também por trabalhar em equipa nos mercados, com os nossos parceiros, com os nossos clientes, com os nossos fornecedores... E é com base nessa linha condutora que nasce este consórcio. A ALS sozinha, como broker da aviação, nunca teria conseguido colocar este avião no ar. Procurámos parcerias para o fazer, em primeira instância com uma companhia aérea. E a companhia que se juntou a nós, a Swiftair, avançou connosco na própria exploração do avião, mitigando assim o nosso risco e concedendo o aval ao projecto. Isto porque uma coisa é ter um avião pago à hora e ter a obrigação de o colocar no ar e de, sozinho, fazer dele um projecto rentável. Outra coisa bem diferente é estar a própria companhia envolvida na exploração, numa partilha de responsabilidade perante o mercado e dando a garantia que teremos aqui um serviço para muitos anos. Em segundo, também conseguimos a parceria de um agente local através da Loginsular. É um parceiro que conhece bem o mercado da Madeira e com experiência no sector da logística, um parceiro que acrescenta esse conhecimento e ainda entende os desafios da economia regional melhor que nós, tendo para além disso uma forte vertente comercial. A Loginsular já era um operador com um conjunto alargado de operações na Madeira, com uma das maiores frotas de camiões naquele mercado. E eles

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viram aqui uma oportunidade de alargar os seus serviços logísticos, elegendo o avião como um meio. Só estas parcerias permitiram avançar com o projecto. Como foi recebida na Madeira a ideia de iniciar a operação do cargueiro a ligar o Funchal e Lisboa? Devo dizer que, desde o início, sentimos todo o apoio das entidades da Madeira, quer privadas quer institucionais. Falo de apoio no sentido de nos incentivarem a arrancar com o projecto e de nos tentarem facilitar o mesmo. Isto porque, nos dias de hoje, colocar uma aeronave a voar não é fácil. Os aeroportos estão sobrelotados, as auto-estradas aéreas também têm restrições... Só graças a todas as entidades envolvidas, uns como shareholders e outos como stakeholders, conseguimos dar luz a este projecto. Falou de vários tipos de apoio mas não de apoios financeiros... Teria sido bom ter esse apoio também, porque ajudaria a reforçar economicamente o projecto. Mas sabemos que hoje em dia é impossivel obter esse tipo de apoio. Por isso, o que procurámos foi apoio institucional. E temos mantido um contacto muito próximo junto das entidades institucionais, as quais vamos informando sobre como vai correndo a operação. Percebemos que é estruturante para a própria economia regional a existência deste serviço, e acredito que eles também o entendem muito bem. E nada melhor para quem está no poder do que ter um privado que por sua conta risco, com uma iniciativa destas, disponibilizando importantes meios e recursos para o desenvolvimento da www.revistacargo.pt

economia regional. Para esta ligação entre Lisboa e o Funchal, iniciada há pouco tempo, que oportunidades foram identificadas? O mercado estava num período de estabilidade, de marasmo. A capacidade disponível de transporte aéreo entre o continente e a Madeira não aumentou nos últimos anos, tendo mesmo diminuído. Ora, não havendo oferta, a procura foi asfixiada, não se dando o desenvolvimento que se esperava nesta área da carga. Se olharmos para os dados dos últimos anos, veremos que houve um decréscimo nos volumes de carga transportados por modo aéreo entre o continente e o Funchal, o que só se justifica com o facto da oferta ter reduzido e a procura estar asfixiada. Portanto, o nosso estudo de mercado foi feito com base na abertura do mercado, na criação de maior capacidade, porque estamos cientes que a procura existirá se houver essa capacidade disponível. Que oferta diferenciada terá a MAIS face à anteriormente existente? Por exemplo, estamos a preparar a criação de produtos específicos que serão lançados a cada mês. Produtos premium, produtos expresso, produtos dedicados a determinados mercados... Temos pensado lançar um produto para os estudantes universitários, que permitirá colocar as suas bagagens no nosso avião, visto que neste regresso às aulas é muito complicado e caro colocar essas bagagens pesadas em aviões de passageiros. Serão formas de contribuir para que a procura cresça. Temos o exemplo daquilo que se passou em Espanha, com as Baleares e as


Canárias. À medida que a capacidade foi aumentando, a procura também aumentou. Depois, estamos também focados na qualidade do serviço. Como metemos no ar um avião cargueiro, pensamos de manhã à noite em ter o cargueiro cheio, em cumprir horários, em servir bem os clientes, em reduzir os tempos de trânsito, em reduzir os tempos de entrega da documentação, em reduzir os tempos de entrega da mercadoria... Vivemos focados nisto, algo que noutras companhias não acontece porque têm outro tipo de pressões. Estamos prontos para tudo, temos duas tripulações. Temos em Lisboa uma segunda tripulação e um avião de menor dimensão que, a curto prazo, nos pode permitir fazer algum voo charter caso exista procura para isso. Temos o voo regular mas estamos abertos a outras opções ocasionais. Sente que do lado da TAP a entrada da MAIS no mercado pode ser vista como uma ‘ameaça’? Não, não é visto como uma ameaça, até porque nós temos uma dimensão muito pequena. Queremos apenas acrescentar valor à economia, dinamizar o mercado. A TAP tem o seu caminho e nós queremos traçar o nosso. E acredito que no futuro poderemos ter uma colaboração mais próxima, até porque a direcção de carga da TAP tem uma grande visão estratégica do mercado. Essa oportunidade ainda não surgiu, o nosso avião também só voa há uns dias... Mas acredito que a curto prazo nos podemos sentar à mesa. Que grandes vantagens traz este cargueiro para os clientes, nomeadamente na comparação com o modo marítimo? Este serviço também complementa, de certa forma, os serviços marítimos que ligam hoje Portugal continental e a Madeira. Mas nós sabemos que grande parte da pressão nas trocas comerciais é colocada na cadeia logística e na cadeia de transporte. Muitos clientes tiveram que adaptar as suas ofertas aos serviços que tinham disponíveis. Tendo apenas o serviço marítimo, tiveram de se adaptar a ele. Mas a nossa capacidade são oito toneladas/dia, o que não é nada para o transporte marítimo. A capacidade total do avião por semana é a equivalente a dois contentores de 20 pés . Mas as trocas comerciais, por via marítima, entre a Madeira e o continente são de umas centenas de toneladas por semana. Ao transporte marítimo não aflige a nossa oferta. Mas aos clientes permite grandes vantagens, nomeadamente para cargas

urgentes. E essas existem todos os dias. E aqui é importante frisar a importância do agente transitário, com o qual não queremos concorrer. Ele é, isso sim, o nosso principal cliente! Queremos colaborar com eles para que eles criem os seus produtos e acrescentem valor aos produtos dos seus clientes. Não estamos aqui para ir bater à porta dos exportadores e dos importadores, estamos para gerir um avião. Esperamos que os agentes transitários possam aproveitar essa oportunidade para acrescentar valor. Também parecem apostados em mitigar os custos e fala-se em 1 euro por quilo transportado. É esse o preço para colocar carga neste cargueiro? Falou-se nesse valor mas é um preço médio. Como é óbvio, um cliente com grandes quantidades pode até pagar menos que isso. Mas um cliente que nos chegue com uma carga pequena, como é óbvio pagará mais do que isso. E também é diferente o custo do continente para o Funchal do custo do Funchal para o continente. A partir do Funchal, o preço é mais baixo. Mas, na média final, o preço não anda muito longe desse valor de 1 euro por quilo transportado. Como funciona o cargueiro ao nível de frequência e de horários? Foi tudo definido com base nos inputs do mercado, fomos saber o que o mercado procurava. Percebemos, por exemplo, que ao domingo não há produção, pelo que um voo a uma segunda-feira a sair às 6h da manhã voaria vazio. Por isso, voamos apenas a partir de terça, saindo de Lisboa às 6h da manhã e levando os produtos de segunda. Chegamos à Madeira por volta das 8:30h, o que nos permite ter carga liberta para o cliente às 8:45h. E isto é extraordinário porque permite captar certos mercados como a imprensa, produtos frescos para vender no próprio dia... O serviço prolonga-se de terça até sábado, porque nos pediram que no sábado de manhã fizessemos a ligação para os clientes que ainda produzem na sexta-feira. Já na viagem de regresso, a saída é às 14:00h, dando tempo para que o pescado passe pela lota e possa estar no aeroporto a horas. No regresso, chegamos a Lisboa às 16:00h. De notar que a operação arrancou no mês de Agosto, um mês extremamente complicado no aeroporto de Lisboa dada a elevada procura. Felizmente, conjugou-se um conjunto de vontades para tornar possível esta operação. E por isso digo que os stakeholders do aeroporto de Lisboa também foram muito www.revistacargo.pt

importantes para que a operação fosse possível, pois tiveram a capacidade de entender que este projecto é um projecto para durar. Ainda temos algumas limitações, por exemplo o horário de regresso não é o que ambicionávamos. Mas é algo que esperamos ver mudado quando terminar este período mais agitado. Já dá para fazer algum balanço destes primeiros tempos de actividade? Ainda estamos aquém da situação ideal que passa por ter lotação esgotada em todos os voos e nos dois sentidos. Mas já superamos os 60% de ocupação. Temos previsto atingir o ‘break-even’ no segundo mês de actividade e estamos a caminho disso. Queremos chegar a esse segundo mês numa situação de velocidade cruzeiro, o que nos permitiria passar o Outono a experimentar novos produtos, aumentando ainda mais a dinâmica. A taxa de ocupação tem sido equilibrada entre os voos de ida e os de regresso? Infelizmente não, ainda há um grande desequilíbrio entre a ida e a volta. Na viagem do Funchal para Lisboa temos trazido pouca carga, abaixo do que esperávamos. Mas sabemos que têm existido constragimentos ao nível da pesca, o que tem afectado o preenchimento do voo de regresso porque o peixe é uma das cargas que mais potencial tem nessa ligação. Temos tido uma procura nessa viagem de regresso que fica entre 15% a 20% aquém daquilo que esperávamos. Mas é uma questão de tempo. Que outro tipo de produtos tem sido atraído por este cargueiro? No serviço Lisboa-Funchal, os nossos clientes estão bem identificados. São as companhias ‘courier’ que têm compromissos com os seus clientes, seja no sector farmacêutico ou no sector automóvel, para além de todo o sector da imprensa... São clientes que têm aqui uma solução dedicada. E vamos avançar com um serviço para colocar os produtos no destino final caso o agente nos peça. Já na ligação entre o Funchal e Lisboa, o principal produto é o pescado mas também os produtos agrícolas e outros tipos de produtos que não se dão bem dentro de um contentor. Temos noção que muitos deles são produtos sazonais, daí que existam procuras diferenciadas ao longo do ano. E devo dizer que temos uma grande expectativa em relação ao desenvolvimento da aquacultura na Madeira, há

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projectos muito interessantes e que prometem fazer crescer de forma acentuada a produção de peixe. Acredito que quando começar a funcionar em pleno, o avião que temos vai tornar-se pequeno. Mas vamos esperar seis meses, o peixe está a crescer. Entretanto, vamos ganhando experiência. As coisas não se fazem de um dia para o outro. O avião cargueiro escolhido foi um ATR72. Que razões estiveram por detrás da escolha desta aeronave? Este avião tem uma grande vantagem que é a relação qualidade-preço. É um avião com consumos baixos, bastante fiável e sólido. Se quisermos passar para um outro avião com maior capacidade, seria já um avião a jacto. Acreditamos que teremos procura para avançar para um Boeing 737-F. Mas, neste momento, essa aeronave faria com que tivessemos de praticar preços proibitivos. O avião ideal para os primeiros seis meses ou para o primeiro ano é o ATR-72. Mas se a procura crescer como esperamos, avançaremos para um avião com maior capacidade. Porém, importa salientar ainda que para utilizar um avião como o 737, provavelmente teremos de alargar a operação a outros destinos. E aí temos pensado ligar também a Ponta Delgada, numa ligação triangular Lisboa-Funchal-Ponta Delgada e regresso a Lisboa. Os Açores já foram uma possibilidade em cima da mesa e queremos mesmo chegar lá. Acreditamos que será a forma ideal de trazer mais carga para Lisboa, equilibrando a ida com a volta. Porque há muita mais procura de carga de Ponta Delgada para Lisboa do que do Funchal, desde pescado a carne. Mas vamos primeiro consolidar este projecto, teremos tempo para chegar a Ponta Delgada. E que outras ligações estão previstas

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na Europa continental? Estamos a lançar um camião diário entre o Porto e Lisboa, que sairá do Porto ao princípio da noite e chegará a Lisboa às 2h da manhã, com carga que poderá ser transportada no avião para o Funchal às 6h. Por outro lado, temos já a funcionar uma ligação de camião entre Lisboa e Madrid, que coloca os produtos perecíveis da Madeira no mercado de Madrid no próprio dia. O avião chega a Lisboa às 16:15h e às 17:30h o camião sai com destino a Madrid. Neste caso, trata-se de um camião a temperatura controlada dado o tipo de produto transportado. Essa ligação ao Porto é só para produtos de Portugal continental para a Madeira ou o camião regressa depois ao Porto com carga da Madeira para o norte do país? Para já não tivemos pedidos para levar carga para o Porto. Mas se amanhã os clientes nos pedirem, estamos preparados. E há oportunidade para chegar a outros pontos por via aérea? Sim, isso passará pelo acordo Interline que vamos fazer com algumas companhias aéreas. Com esse, nós faremos o serviço do Funchal até Lisboa e depois passamos a carga para os aviões da British Airways, da Lufthansa e de outras companhias. É um acordo que só será elaborado em Setembro, pelo que não estará em vigor antes do início de Outubro. O que inviabilizou a entrada nos Açores? Nos Açores as coisas funcionam de maneira diferente. Existiram dois concursos públicos de concessão lançados pelo Governo, com um conjunto de normas que para nós seriam pouco comerciais. O Governo preparava-se

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para compensar a empresa que explorasse a linha em regime de concessão, com um determinado montante, e a empresa obrigava-se a explorar a linha a um custo que estava no caderno de encargos. Mas, por mais que fizessemos as contas, não seria viável. Perde-se tempo com concursos que fogem muito da realidade, concursos para cumprir determinados calendários. Mas alguma coisa tem de ser feita e é um mercado de que não desistimos. Mas, com a consolidação do projecto na Madeira e com a possível introdução de um avião com outra capacidade, parece-nos possível começar a voar para os Açores sem contrato de concessão. A entrada nos Açores também pode ganhar força pelo facto de já existir a ligação à Madeira? Sem dúvida! Muitos dos clientes serão os mesmos e podemos ir à boleia do sucesso que esperamos ter na Madeira. Os Açores podem ser o mercado que precisamos para equilibrar a ida e o regresso. E percebemos o potencial que existe no actual contexto turístico do arquipélago. Haverá potencial para fazer cada vez mais carga também para alimentar toda uma economia ligada ao turismo. É que temos muitos voos para os Açores mas são sobretudo de companhias Low Cost que não transportam carga. Ter um parceiro como a Swiftair com a experiência das Baleares e das Canárias é também uma vantagem nessa área, certo? Sim, sem dúvida! A Swiftair traz não apenas os aviões, como todo um conhecimento acumulado. Eles viveram há uns anos o que nós estamos a viver aqui. Têm-nos incentivado muito, dizem que as coisas estão a correr muito melhor do que esperavam.


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A ADFERSIT (Associação Portuguesa para o Desenvolvimento dos Sistemas Integrados de Transporte) promoveu uma sessão de debate sobre a opção Montijo como aeroporto complementar ao Aeroporto da Portela. A abrir a sessão, o Presidente da ADFERSIT, Leiria Pinto, justificou o motivo de escolha deste tema para o debate, lembrando que a Associação por si presidida quer discutir as várias temáticas actuais do sistema integrado dos transportes - e que esse é o caso do tema Montijo. Numa fase em que «aguardamos a declaração de Impacto Ambiental e a elaboração do Plano Director», Leiria Pinto considera este o momento ideal para debater e discutir esta opção. O contexto de mais de meio século de avanços e recuos O Engenheiro Artur Ravara, conhecedor profundo do sector e da evolução deste tema, foi desafiado pela ADFERSIT para contextualizar a escolha do Montijo, percorrendo mais de meio século de avanços e recuos. Meio século em que estiveram em cima da mesa várias opções, desde novos aeroportos para substituir o da Portela a aeroportos complementares do mesmo. E várias localizações que avançaram e recuaram, desde o Rio Frio, à Ota, a Alcochete ou, finalmente, ao Montijo. Artur Navarra recorda que, depois de décadas sem avanços, «só no fim da década de 90 o processo foi dinamizado», então com uma escolha de localização para um novo aeroporto de Lisboa, na Ota. «Uma escolha que não foi nada consensual», lembra. Porém, em 2002 este processo «voltou a ser suspenso, novamente por mudança de Governo», voltando em força «entre 2005 e 2010, primeiro com a hipótese Ota e depois com a solução em Alcochete». A decisão por Alcochete foi «consolidada em 2008», recorda o Engenheiro. Nesse momento, recorda, a previsão apontava para que o novo aeroporto «fosse inaugurado em 2017, com duas pistas e capacidade para 22 milhões de passageiros», tendo contemplada uma «folga de cinco milhões porque estimava-se então que o tráfego em 2017 fosse de 17 38

SESSÃO ADFERSIT: SOLUÇÃO MONTIJO GERA DÚVIDAS ENTRE TÉCNICOS

milhões de passageiros» - uma estimativa que a realidade veio mostrar ser desajustada, dada a procura bem mais acentuada que se registou. Artur Ravara lembra que foi nessa fase que começou também «a ser falada a opção Portela+1», uma solução de aeroporto complementar ao Aeroporto da Portela. «E com a publicação do PET, é assumida a decisão de avançar para a Portela+1, sobretudo devido à situação financeira do país», acrescenta. Montijo é uma escolha pouco consensual no meio técnico O Governo avança agora para a criação desse aeroporto ‘+1’ no Montijo, uma solução que Artur Ravara vê como «relativamente bem aceite pela opinião pública», nomeadamente www.revistacargo.pt

por questões de «falta de capacidade financeira» ou pelo «crescimento acentuado da procura que vem sendo resolvida com mais investimentos na Portela». Pista do MontIjo é uma das principais questões em discussão pelos técnicos Porém, vinca que da parte dos técnicos a opção Montijo é tudo menos consensual. «Há uma diferença muito grande entre a opinião pública e o meio técnicos», defende, acrescentando que existe uma grande preocupação demonstrada pelo meio técnico, nomeadamente ao nível da segurança. «O meio técnico preocupa-se e tem reagido a esta opção», salienta o Engenheiro Artur Ravara, lembrando os


até que ponto não teria sido possível «conciliar as duas propostas?». Outra questão pertinente deixada pelo Controlador Aéreo diz respeito ao futuro da Ryanair em Lisboa. «Será que a Ryanair irá mudar para o Montijo?», questiona, recordando que «o CEO da companhia não foi muito claro nesta questão». Sobre esta questão, mostra-se convicto que «a Ryanair não quer sair da Portela» - podendo, eventualmente, estar a pensar no Montijo como uma solução para «a expansão das suas actividades». «Espero que o Plano Director venha responder a estas e outras questões», conclui Vítor Coelho. Solução fluvial para o tráfego de passageiros entre as duas margens

EM DEBATE PROMOVIDO PELA ADFERSIT NO AUDITÓRIO DO METRO DO ALTO DOS MOINHOS, FORAM MUI TAS AS QUESTÕES DEIXADAS PELOS TÉCNICOS EM RELAÇÃO À VIABILIDADE DO AEROPORTO NO MONTIJO.

debates promovidos pela Ordem dos Engenheiros no LNEC ou no programa ‘Prós e Contras’ da RTP. Entre as preocupações evidenciadas por Artur Ravara está a questão das características das pistas do Montijo. O Engenheiro recorda que os «aviões que estão previstos para o Montijo são da Classe C, particularmente utilizados pelas low-cost». E, recorrendo aos dados exigidos pelos aviões da Embraer, Boeing ou Airbus dessa classe, mostra que «a pista no Montijo tem de ser ampliada em mais de 1.000 metros e tem de se aumentar muito a capacidade de resistência da mesma [o chamado PCN]». Várias questões que ainda estão por responder Já Vítor Coelho, Controlador Aéreo e

outro dos convidados pela ADFERSIT para discutir esta temática, deixou uma série de questões que considera importantes, e as quais pretende ver respondidas de forma que se consiga fazer uma melhor avaliação do projecto e das ideias para o mesmo. Por um lado, questiona o motivo pelo qual a Easyjet não foi colocada na amostra: «Se o Montijo é considerado um aeroporto para as low-cost, qual o motivo pelo qual a Easyjet foi retirada da amostra?». Uma questão que Vítor Coelho gostava de ver respondida até porque, na sua opinião, as low-cost (Easyjet incluída) «ou passam todas para o Montijo ou repartem as operações entre o Montijo e a Portela». Por outro lado, Vítor Coelho questiona ainda a razão pela qual «apenas se considerou a proposta da NAV e não a proposta da Força Aérea» - e www.revistacargo.pt

Osvaldo Bagarrão, membro da ADFERSIT, foi o terceiro orador da sessão, ficando a cargo da análise de outro tema muito pertinente da solução Montijo: o transporte de passageiros Montijo-Lisboa e Lisboa-Montijo. Segundo o responsável da ADFERSIT, a solução fluvial aparece como a opção «mais rápida, mais segura e mais capaz» para que os passageiros atravessem o Tejo - e até uma solução interessante do ponto de vista turístico, ao permitir que os passageiros entrem em Lisboa pela via fluvial. Porém, lembrou que falta saber a forma como tudo poderá ser feito para articular o modo fluvial ao novo aeroporto, deixando muitos pontos de dúvida: a solução que existirá para ligar o terminal de passageiros do aeroporto ao terminal fluvial; as necessárias intervenções no terminal fluvial do Seixalinho, no Montijo, hoje apenas com um cais disponível; a frequência dos navios e a capacidade dos mesmos; a articulação do tráfego fluvial com o futuro Terminal de Cruzeiros de Lisboa; o terminal/ terminais que dará/darão resposta na Margem Norte; entre outros. São, portanto, muitas as questões ainda por responder relativas à opção Montijo. Os próximos meses prometem novidades mas uma coisa é certa: o meio técnico, esse, está muito preocupado com as consequências a vários níveis de um novo aeroporto no Montijo. Joni Francisco 39


É inadmissível que uma ex-secretária de Estado dos Transportes tenha defendido “a transferência dos modos rodoviário e aéreo para o transporte ferroviário, no eixo de maior intensidade de tráfego do nosso País.” Uma atitude lamentável, que nos lembra a ignorância atrevida de outros governantes, que, além de terem lesado a economia nacional, levaram o nosso País à bancarrota... J. Martins Pereira Coutinho

PLATAFORMAS LOGÍSTICAS E O DEFUNTO 'PORTUGAL LOGÍSTICO'” Para a maioria dos profissionais envolvidos nos diferentes modos de transporte, uma plataforma logística é uma área com espaço livre e apropriado para acomodar actividades relacionadas com o transporte, a logística e a distribuição de mercadorias em trânsito, a nível nacional ou internacional, executadas por um ou mais operadores. Assim, nas instalações duma plataforma logística deve haver espaço reservado para escritórios das diferentes empresas, para armazenamento de mercadorias e também para parques de estacionamento, permitindo, assim, o acesso a todas as empresas envolvidas nas respectivas actividades de transporte e distribuição de mercadorias. Na verdade, uma plataforma logística é uma estrutura importante nas cadeias de transporte, dado que permite fomentar a economia e o desenvolvimento da actividade de vários modos de transporte. Além disso, torna-se um espaço indispensável para fomentar a inter-modalidade de transportes e, assim, facilitar o movimento das mercadorias e potenciar o crescimento económico. Talvez por isso, em 2007, a ex-secretária de Estado dos Transportes, Ana Paula Vitorino, afirmava, publicamente, que o Governo, então chefiado por José Sócrates, tinha apresentado, em 2006, “documentos fundamentais para o desenvolvimento sustentável dos transportes a médio e longo prazos, orientações estratégicas para o sector logístico, ferroviário e marítimo -portuário.” E acrescentava que a sua estratégia passava por “disponibilizar condições de ar mazenamento, com valor acrescentado, através da construção de plataformas logísticas localizadas em pontos estratégicos e devidamente dimensionadas, privilegiando os modos marítimo e ferroviário.” Assim, o transporte aéreo e rodoviário foram excluídos da 40

sua estratégia. Estranhamente, para Ana Paula Vitorino, não existiam! Eram extraterrestres… Seja como for, é inadmissível que uma ex-secretária de Estado dos Transportes tenha defendido “a transferência dos modos rodoviário e aéreo para o transporte ferroviário, no eixo de maior intensidade de tráfego do nosso País.” Uma atitude lamentável, que nos lembra a ignorância atrevida de outros governantes, que, além de terem lesado a economia nacional, levaram o nosso País à bancarrota... Nesse Governo, Ana Paula Vitorino considerava “os portos como pontoschave da transferência modal e vitais para o desenvolvimento da logística.” E confirmava a conclusão da infraestruturação das plataformas logísticas de Sines e da Guarda; o início da construção da Plataforma de AveiroCacia e a assinatura do protocolo para o desenvolvimento da maior plataforma logística da Rede, no Poceirão. Além disso, afirmava que a Plataforma de Leixões estava em fase de projecto e que Elvas/Caia, Valença e Maia/Trofa estavam em fase de estudos avançados. E, depois de sublinhar a importância destas plataformas, anunciava que previa, até 2013, um investimento de 1.600 milhões de euros e a criação de 15.000 postos de trabalho! Ou seja, Portugal seria um país logístico e um criador de milhares de empregos! Porém, tudo morreu na casca… Depois, Ana Paula Vitorino anunciou também um projecto da Rede de Alta Velocidade (RAV), que incluía as ligações Lisboa-Porto, Lisboa-Madrid, Aveiro-Salamanca e Porto Vigo, cujo investimento atingia 8 mil milhões de euros! Só nos eixos Lisboa-Porto e Lisboa-Madrid, o investimento era de 7,7 mil milhões de euros. Com a vaidade e presunção que a caracteriza, gabavase que estes dados “mostravam bem www.revistacargo.pt

OPINIÃO

o empenho do Governo e da RAVE, na gestão do projecto.” Embalada na sua verborreia, a exsecretária de Estado dos Transportes foi mais longe e referiu que a Alta Velocidade criaria 36 mil novos postos de trabalho permanente, um aumento de investimento privado de 76 mil milhões de euros, um aumento do PIB na ordem dos 99 mil milhões de euros e uma receita fiscal de 21 milhões de euros!!! Curiosamente, este anúncio de milhares de empregos e de milhares de milhões de euros, trouxe-nos à memória a famigerada cartilha de propaganda política de José Sócrates, anunciando o TGV, um Novo Aeroporto de Lisboa, uma nova Ponte sobre o Tejo, novas auto-estradas e outras desnecessárias obras públicas. Porém, com a bancarrota a bater à porta, tudo o vento levou… Em todo o caso, a apresentação oficial do “Portugal Logístico” foi feita na Alfândega do Porto e presidida por Mário Lino, ministro das Obras Públicas. Na ocasião, Ana Paula Vitorino garantiu que era “um projecto que pretendia ser a resposta a um dos mais importantes desafios para o desenvolvimento do nosso País, transformando-o numa plataforma atlântica para os movimentos internacionais no mercado ibérico e europeu.” Ou seja, se isto não fosse um “bluff”, Portugal seria um oásis logístico ao serviço do continente europeu… Mas ainda ousou dizer que o Portugal Logístico representava “um novo paradigma para o sistema logístico nacional, criando as condições necessárias para que Portugal se constitua como um elo nas cadeias intercontinentais e europeias.” E acrescentou: “ao Estado caberá um papel de regulação e planeamento, a avaliação e aprovação dos projectos, o licenciamento das plataformas, a ligação da Rede e a coordenação da infra-estrutura comum e promovendo


diferentes actividades e localizações. E têm importantes centros de carga aérea, em Barcelona, Madrid e Vitória. Em Itália, as plataformas logísticas estão localizadas maioritariamente no Norte do País, onde, como acontece em Portugal, há mais procura e as infraestruturas são mais adequadas ao seu desenvolvimento. Em França, a rede de plataformas logísticas foi desenvolvida num sistema radial e estão estrategicamente localizadas, com o objectivo de servirem as costas do Atlântico, Mediterrâneo e Canal da Mancha, assim como os

OPINIÃO

a eliminação dos estrangulamentos existentes ao nível das redes de transporte.” Uma lengalenga, fastidiosa e sonolenta… Entretanto, em 2008, o então primeiroministro, José Sócrates, lançou o projecto da Plataforma Logística Lisboa-Norte, que previa um investimento de 265 milhões de euros e a criação de 17.500 empregos! Mas, estranhamente, em 2011, ainda não tinha sido construído um único pavilhão no respectivo local! Além disso, as obras estavam paradas! Por algum motivo, o então presidente da Junta de Freguesia de Castanheira do Ribatejo chamou-lhe “um elefante branco”. Joaquim Ventura Reis confirmou ainda que “o terreno escolhido para o projecto continha uma reserva agrícola e ecológica importante, que incluía um lençol de água doce que era um dos maiores da Europa.” Um escândalo, abafado por quem devia evitá-lo e defender os interesses do Estado… Apesar desta realidade, esta Plataforma Logística foi entregue pelo Governo de José Sócrates à empresa espanhola Albertis Logística. Nessa altura, curiosamente, a comunicação social referia que o primeiro-ministro José Sócrates, além de frequentes e calorosos elogios, considerava Zapatero, primeiro-ministro espanhol, como o seu “melhor amigo”! Resta, porém, saber se era mesmo amizade, ou se era uma consequência do crescente domínio espanhol, na banca e economia nacionais… No mesmo período, o projecto logístico Maia –Trofa, por não ser rentável, foi abandonado pela Somague. Lembramos que, em 2005, o Portugal Logístico era uma bandeira do Governo de José Sócrates e, talvez por isso, foi eleito como uma das grandes apostas para a economia nacional. Por esta ou qualquer outra razão, para sustentar este projecto, estava prevista uma verba de 2 mil milhões de euros! A rede de plataformas logísticas incluía 11 infra-estruturas, espalhadas por todo o País. Depois de adjudicadas as plataformas de Castanheira do Ribatejo, de Maia -Trofa e do Poceirão, o processo do Portugal Logístico ruiu e faliu. Hoje, não há uma plataforma logística no nosso País que tenha feito parte do Plano Portugal Logístico, liderado por Ana Paula Vitorino, promovida a ministra do Mar, no actual Governo de António Costa. Ao contrário de Portugal, na Europa há planeamento logístico e estratégico. Em Espanha, por exemplo, as plataformas logísticas caracterizam-se pelas suas

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principais aeroportos e vias rodoviárias. Uma decisão correcta, que contraria a leviana decisão de Ana Paula Vitorino, que, arbitrariamente, excluiu o transporte aéreo e rodoviário do defunto “Portugal Logístico”. Esperamos, agora, que as respectivas entidades apurem as inerentes responsabilidades e se dignem investigar tudo o que se passou com este ruinoso plano logístico, que causou graves danos económicos e financeiros ao Estado, devido à falta de competência e visão estratégica da sua progenitora, Ana Paula Vitorino, hoje, ministra do Mar…

J. Martins Pereira Coutinho José Martins Pereira Coutinho entrou em 1958 na KLM Royal Dutch Airlines. Foi depois Director da KLM Cargo para Portugal, lugar que ocupou até à aposentação. Publicou inúmeros artigos e livros sobre a indústria de transporte aéreo.

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BREVES AÉREO IFACP ESTABELECE NOVOS MOLDES NA RELAÇÃO ENTRE COMPANHIAS E TRANSITÁRIOS Após cinco anos de intensa preparação, o ‘acordo-quadro’ gizado para a relação entre a companhia aérea e o transitário encaminha-se finalmente para a fase de implementação, depois de um processo piloto no Canadá destinado a testar o enquadramento do acordo. Com a introdução do Programa de Carga Aérea IATA-FIATA (IFACP), a relação entre transportadora aérea e transitário é assim integrada num contexto de consonância com a realidade comercial vivida pelas duas partes do processo logístico em causa. O actual Programa de Agência de Carga, em vigor desde a década de 60 (com o intuito de optimizar as relações comerciais entre as linhas aéreas e os respectivos agentes de vendas) encontra-se já bastante obsoleto - tendo em conta a realidade actual - ainda considerando os transitários como agentes dos transportadores, um papel (basea-

do na comissão) que caiu em desuso há já várias décadas. «Já que mais de 80% das transacções são realizadas por transitários actuando como actores-chave, é melhor o IFACP esclarecer e validar o negócio através de uma relação comprador-vendedor», analisou Juan Antonio Rodriguez, da IATA. Para o membro da IATA, «simplificar a estrutura de gestão reduz o requisito administrativo para gerir o programa». Já no entender de Bill Gottlieb, presidente do Comité do Frete Aéreo da Canadian International Freight Forwarders Association, «o novo acordo reflectirá bem melhor a realidade da indústria e os seus desafios» - «Deixa-se de ser apenas mais um agente da companhia aérea, passando a ser-se um dos principais», acrescentou, realçando a diferença que o novo enquadramento introduzirá. A fase piloto deverá arrancar durante

o próximo mês de Outubro, sendo que a IFACP será depois lançada globalmente, num processo que terminará nos fins de 2019. Este novo regime será tutelado pela IATA e pela FIATA, cada uma escolhendo seis representantes para integrarem o quadro directivo. Pela banda dos transitários alinhar-se-ão representantes de empresas de menor dimensão (do Canadá, Hong Kong, África do Sul e Índia) e administradores de companhias como a Panalpina, Kuehne+Nagel, que representarão a Europa e o contingente mais considerável de transitários. A representação das linhas aéreas será composta por delegados de empresas como a Lufthansa, American Airlines, Emirates, FedEx, Cathay Pacific e EgyptAir. De forma unânime, o novo ‘acordo-quadro’ será, como realçou também Keshav Tanna, próxima presidente do Instituto do Frete Aéreo da FIATA, «a base para o rumo do futuro».

TRANSPORTE AÉREO DE CARGA CONSEGUE O MELHOR PRIMEIRO SEMESTRE DESDE 2010 A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) divulgou novas informações relativamente ao mercado global do frete aéreo: a procura no sector aumentou cerca de 10,4% face aos primeiros seis meses de 2016, tornando este no melhor e mais robusto primeiro semestre do mercado desde o turbulento ano de 2010, aquando da ressaca da implosão financeira. O crescimento homólogo de 10,4% representa também o triplo do crescimento médio do sector (3,9%) verificado nos últimos cinco anos. A associação indicou ainda que também a capacidade do frete aéreo aumentou 3,6%. Ao fim destes seis meses, os sinais dados pela procura consolidam a ideia de crescimento que vinha sendo verificado nos anteriores meses, com esta a ultrapassar o crescimento da capacidade

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do frete aéreo, facto que potencia os rendimentos das companhias. «Período de crescimento cíclico pode ter atingido o pico», diz IATA «O crescimento sustentado da procura de frete aéreo é consistente com uma melhoria no comércio global, com novas ordens de exportação globais permanecendo perto de um máximo de seis anos. No entanto, existem alguns sinais de que o período de crescimento cíclico pode ter atingido o pico», explica a IATA. «O índice global de inventário para vendas parou de cair. Isso indica que o período em que as empresas buscam reabastecer inventários rapidamente pode estar a chegar ao fim», acrescenta. No entanto, as previsões para o futuro do sector são positivas: «Independen-

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temente desses desenvolvimentos, as perspectivas para o frete aéreo são optimistas, com a expectativa de crescimento da demanda a uma taxa robusta de 8% durante o terceiro trimestre deste ano», declara a IATA. As palavras de Alexandre de Juniac, CEO da associação, vão ao encontro deste prisma: «A carga aérea está sustentada numa economia global mais forte», declarou, citado pela ‘newsletter’ do organismo. «A procura cresce a um ritmo mais rápido do que em qualquer momento desde a crise financeira global. Essa é uma óptima notícia depois de muitos anos de estagnação. E, ainda mais importante, a indústria está a aproveitar esse impulso para acelerar a modernização do processo tão necessário e melhorar o valor que proporciona aos seus muitos clientes», completou.


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