Revista Cargo 273 Maio/Junho 2018

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BIMESTRAL M AI/JUN 2018

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One Belt, One Road Portugal: A peça que faltava? Victor Cardial (GASNAM): «Mercado está-se a desenvolver e as oportunidades começam a aparecer» David Carlos (MAN): «Aceitação da TGE tem sido acima das expectativas»

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BIMESTRAL MA I/JU N 2018

EDITORIAL

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6€

MARÍTIMO 4

Conceição Gallis (DGRM): «Não tardará muito para termos navios autónomos a circular nos mares»

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One Belt, One Road: Portugal, a peça que faltava?

10 Shipping 4.0: evento reflectiu sobre as oportunidades do «Mar de Amanhã»

13 Abram alas ao proteccionismo de Trump: Make Shipping Uncer-

ÍNDICE

Portugal no Puzzle Global

tain Again

17 III Curso de Shipping and Logistics Management: Sinergias reforçadas entre ENIDH e MSC

18 Opinião de José Augusto Felício: “Sustentabilidade e Resiliência Portuária”

22 Shipping Week: Entre Setembro e Outubro, todos os caminhos vão dar a Portugal

24 Breves Marítimo 26 Opinião de Vítor Caldeirinha: “Os modelos de Governação Portuária”

TERRESTRE, VEÍCULOS E LOGÍSTICA

28 Victor Cardial (Gasnam) «Mercado está-se a desenvolver e as oportunidades começam a surgir»

32 David Carlos (MAN Truck & Bus Portugal): «Aceitação da TGE tem sido acima das expectativas iniciais»

35 A corrida ao Hyperloop: A ficção científica que já deixou de o ser 37 Tim Potocnik (Eurosender): «Digitalização é um elemento fulcral que irá transformar a logística»

39 Breves Terrestre e Logística

AÉREO

40 Opinião de J.M. Pereira Coutinho: “A reversão da privatização da TAP”

42 Breves Aéreo Propriedade:

DIRECTOR DE INFORMAÇÃO Bruno Falcão Cardoso *MARKETING/PUBLICIDADE Simão Rodrigues *REDACÇÃO Rui Ribeiro, Joaquim Fonseca, João Cerqueira, Romeu Barroca *COLABORADORES ESPECIAIS José Augusto Felício, J. Martins Pereira Coutinho, Vítor Caldeirinha *EDITOR FOTOGRÁFICO Rui Ribeiro *DESIGN Joana Sardinha *ADMINISTRAÇÃO E REDACÇÃO Ed. Rocha do C. d’Óbidos, 1º, sala A Cais de Alcântara - 1350-352 Lisboa Tel. 911 166 932 *web: www.revistacargo.pt *e.mail: info@revistacargo.pt *EDITORA Magia Azul Edições, Unipessoal Lda * Morada: Ed. Rocha do C. d’Óbidos, 1º, sala A Cais de Alcântara - 1350-352 Lisboa *Tel. 911 166 932 *IMPRESSÃO E ACABAMENTO Grafisol Rua das Maçarocas Abrunheira Business Center nº03 Abrunheira 2710-056 Sintra- +351 219 158 150 geral@grafisol.pt *ASSINATURA ANUAL Portugal - 30 EUR Estrangeiro - 40 EUR Depósito legal nº 6196692 *PERIODICIDADE - Bimestral *TIRAGEM - 6.000 exemplares Estatuto Editorial disponível em: www.revistacargo.pt

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Será pela conjugação entre a reflexão dos fenómenos nacionais e a contemplação analítica do contexto internacional, que poderemos, com profundidade e escala, compreender e dar a compreender, não só as tendências como também as intersecções – estruturais mas também conjunturais – entre a evolução portuguesa e o mundo que nos envolve. É com base nesta abordagem que a presente edição tem um pé dentro e outro fora de Portugal: procurámos aliar, à análise interna, o retrato de um mundo cada vez mais interdependente e globalizante, que prospera quando em sintonia e que se deprecia quando envereda por desvios de dissensão exacerbada. É o caso de Donald Trump e da sua – agora já global – guerra das tarifas. Após meses de incertezas e reiteradas ameaças, o presidente dos EUA materializou o agravamento prometido, despoletando retaliações por parte da China e, expectavelmente, da UE. O tema, ao qual se junta a retirada do país do Acordo Nuclear, reflecte na perfeição o delicado novelo que são as relações económicas entre nações e empresas – e como o isolacionismo pode colocar em causa o equilíbrio das cadeias logísticas globais. Em sentido contrário, contemplamos a mega-iniciativa One Belt One Road e o seu carácter interactivo, integracionista e global. Aqui, Portugal poderá desempenhar um papel fundamental na Nova Rota da Seda, com Sines na linha da frente devido ao seu potencial geoestratégico assinalável. O estreitamento entre Portugal e China reforça o cariz cada vez mais internacionalizado da oferta infra-estrutural lusa e da competência operacional que vai sendo demonstrada: integrar para crescer – poderá este ser o lema (global) e a resposta aos desafios do futuro? A intersecção entre Portugal e o exterior não se fica por aqui: a entrevista à engenheira Conceição Gallis é disso cristalino exemplo, no âmbito da coordenação com a IMO no que aos MASS diz respeito. Também o caso da GASNAM (e a nomeação de um delegado para o domínio português) alia a essa componente a consolidação de novas alternativas energéticas (Gás Natural) para um novo horizonte mais sustentável, um contexto também explorado pela MAN Truck & Bus (por via da Electromobilidade). Bruno Falcão Cardoso

Director de Informação

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CONCEIÇÃO GALLIS (DGRM) «NÃO TARDARÁ MUITO PARA TERMOS NAVIOS AUTÓNOMOS A CIRCULAR NOS MARES» A automação marítima é actualmente um dos temas mais debatidos do Shipping internacional e a corrida das companhias tecnológicas à aposta nos navios autónomos é já uma realidade. O desafio, agora, é o de enquadrar o progresso efectuado numa moldura legislativa e regulamentar – uma tarefa que a IMO encetou em Maio. Para explicar o advento dos MASS (Maritime Autonomous Surface Ships) e o desenvolvimento dos trabalhos da IMO, entrevistámos quem acompanha de perto o assunto: a engenheira Conceição Gallis, representante técnica da DGRM na organização internacional. Gostávamos de começar por lhe perguntar: como encara esta nova vaga de automação marítima nos dias de hoje? É de facto um desafio. Os navios autónomos serão, senão o maior desafio, talvez um dos grandes desafios que iremos ter, muito devido a tudo o que a eles está agregado. Existe um filme muito curioso, feito pela RollsRoyce, sobre o que será o advento dos navios autónomos. Aquilo já deixou de ser futurologia, pois uma grande parte do conteúdo já se verifica nos tempos actuais. Não daquela forma especificamente, mas já se verifica. Desde sempre – e começamos logo em termos de aplicabilidade desta terminologia dos navios autónomos – estamos a falar apenas em navios que são abrangidos pela convenção SOLAS. Estamos a falar da convenção SOLAS, em termos de Segurança de vida no mar, da convenção MARPOL, ligada à parte da poluição, da convenção COLREG, sobre regulamentação em relação à forma como os navios se movimentam no mar e que pretende evitar abalroamentos no mar, da quarta grande convenção, que será a da arqueação (a Tonnage Convention) e a convenção STCW. Portanto, os navios aos quais estas cinco convenções se aplicam tornam isto num grande desafio, ainda para mais tendo em conta o elemento humano. Isto se pretendermos que o elemento humano permaneça, pois existem vários graus de autonomia.

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Tendo em conta os vários níveis de automação, o que é realmente um navio autónomo? Actualmente os navios já têm algum grau de autonomia, começando logo pelos próprios equipamentos: por exemplo, aquilo que se denomina na gíria ‘navegar em automático’, é só por si uma automação de processos. O que acontece é que actualmente esses sistemas são previamente programados para fazer aquilo e existe sempre a intervenção da componente humana em caso de correcção, não há integração de Inteligência Artificial (IA). Essa questão esteve em discussão na Organização Marítima Internacional (IMO), na última reunião do Comité de Segurança Marítima – a nonagésima nona – e foi esse o repto lançado pelo Sr. Secretário-geral (Kitack Lim), no final daquela reunião, ao grupo de trabalho para os navios autónomos: foi-nos pedido para efectuarmos o chamado scoping exercise, a que eu chamo ‘partir pedra’, e onde estamos reunidos a ver o que poderá sair dali. Não se trata exactamente de um brainstorming mas sim de uma fase prévia a isso. O que eu senti, dessa reunião, foi que existem tópicos que já estavam a ser trabalhados, como por exemplo a automação – já se está a trabalhar noutro subcomité, algo que é o ‘eNav’, em que já existe uma série de equipamentos que estão a ser pensados para isso, e que, ou serão utilizados como ajuda à navegação, ou poderão ser já concebidos a pensar num futuro no qual www.revistacargo.pt

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não haverá ninguém para os operar. Daí eu dizer que estamos a ‘partir pedra’. Onde é que vamos? Como é que se vai avançar? São estas as primeiras interrogações. Daí chegamos a quatro níveis de automação: a automação de que falei anteriormente, de apoio à decisão; depois temos os navios tripulados remotamente, mas com tripulantes a bordo; os navios controlados remotamente, sem tripulantes a bordo, em que próprio navio é concebido de forma a ser auto-suficiente; e por fim teremos os navios completamente autónomos, que nem precisam de ser controlados, eles próprios se autocontrolam. Serão estes os cinco passos que a IMO definiu nesta reunião do Comité de Segurança Marítima. Ficou ainda definido que, para a próxima reunião de Dezembro – que será a centésima – deverá ser apresentado o projecto enquanto projecto de facto. Teremos de analisar o modo como todas estas especificidades podem ou não entrar em conflito com as convenções, como é que elas se poderão interligar e ajustar às convenções existentes, e termos ainda de analisar outras situações, que sejam anómalas, e perceber como é que os sistemas deverão reagir a elas. No fundo, irão existir processos automatizados que são de apoio à decisão, nos quais existem tripulantes a bordo para correcções do rumo do navio, sendo que algumas dessas operações poderão ser completamente automáticas.


Qual entende que será o maior desafio da implementação do ponto de vista da IMO? Neste momento, para ser sincera, não tenho uma ideia constituída sobre as dificuldades de implementação. Por uma razão muito simples: a IMO é uma organização constituída por mais de 150 países, é preciso harmonizar ideias e é preciso que todos cheguem a um consenso em todas as áreas, e nem sempre isso é fácil. Por exemplo, neste momento está-se a mudar um capítulo da convenção, e o processo dura há mais de quatro anos. Isto tudo porque o trabalho que está associado é enorme, não basta dizer ‘isto deixa de ser assim, passa a ser de outra forma’, uma vez que toda a regulamentação da IMO tem de ser revista, e implica tudo aquilo que lhe está associado. Aí sim, está o grande desafio, algo que foi aliás frisado pelo Senhor Secretário-Geral na reunião de abertura do último encontro – é neste capítulo que reside o grande desafio, mas a IMO tudo fará para o levar a bom porto. No fundo, o objectivo é sempre a salvaguarda da vida humana no mar, dos seus bens, do ambiente marinho – proteger e mitigar qualquer tipo de poluição. Portanto, é esta perspectiva para a qual tem de ser orientada esta evolução. É também por isso que os procedimentos não são – nem poderiam ser – tão rápidos quanto algumas pessoas gostariam que fossem. As companhias continuam a investir, a executar testes…mas continua a existir um gap entre esse avanço tecnológico e a implementação de um enquadramento legal. Como encara isso? Eu penso que isso se passa não só com a IMO, passa-se também ao nível de outras organizações internacionais. Estou-me a lembrar por exemplo de uma analogia, relacionada com o espectro radioeléctrico: ainda há pouquíssimo tempo tínhamos telemóveis de primeira geração, e já vamos no 4G - e até já falamos no 5G. Aquilo que se passa é que a indústria vai sempre mais além, porque a indústria tem de ser ambiciosa, tem de olhar para os sectores em termos de futuro. E, neste momento, exactamente pela evolução da tecnologia, já não estamos na base

de começarmos a pensar em evoluir, depois de termos todos os standards. O que está a acontecer é uma tentativa de adaptação dos standards existentes à nova realidade, e não o contrário. A nível da IMO também é assim: existem determinados tipos de requisitos que supostamente deveriam ter por detrás certas normas, que, até à data, ainda não se conseguiram encontrar – ou porque têm de ser criadas, ou porque aquela função específica consegue ser feita por um equipamento, mas o mesmo equipamento também tem outras aplicações. E essa adaptação – garantindo-se sempre que a segurança (das pessoas, dos bens e do meio ambiente marinho) está acima de tudo – é que não é fácil, pela dimensão da IMO. Não é fácil ‘arrastá-la’ ao ritmo a que avança a indústria, cujo ritmo é frenético. Ainda há uns tempos atrás, foi lançado o maior navio de passageiros do mundo, colossal, com capacidade para mais de 5.000 passageiros. Lembro-me de ter visto ainda em maquete, numa reunião por volta de 2009, e a viagem inaugural do navio foi dez anos depois! Não que o navio tenha demorado esse tempo a ser construído, mas a fase de projecto, e todos os cuidados para garantir que um navio daquelas dimensões não terá problemas, toda a análise de risco que tem de ser feita, isso sim, demora. Isto para dizer que a maior dificuldade – e aquilo que levará mais tempo – será, muito provavelmente, o processo de análise de risco. Isso, neste momento, não cabe à indústria, porque o papel da indústria é avançar sempre mais adiante. Mas a garantia de que tudo correrá da melhor forma terá de caber às organizações competentes, neste caso, à IMO. Acha que há algum tipo de pressão, por parte da indústria, para que as coisas avancem a um ritmo mais rápido? Não. Agora, se me perguntar quais são os governos contratantes que estão mais motivados face a estas questões, aí sim, basta ver onde se encontram as empresas que estão a desenvolver esforços e a inovar nesta área, para perceber quais as administrações que mais incentivam a que hajam desenvolvimentos naquilo que poderá ser a navegação do futuro. É então essencial que a IMO seja próactiva, como dizia o Secretário-Geral há cerca de um ano atrás? Eu penso que a IMO já é pró-activa. Como é óbvio, existem sempre alguns

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‘velhos do Restelo’, mas de certa maneira, até essas pessoas mais conservadoras dão um bom contributo. Quando somos muito idealistas, às vezes esquecemo-nos de pôr os pés no chão. E eu lembro-me por exemplo, em relação a esta questão dos navios autónomos, a certa altura alguém chamou a atenção para o facto de já existir uma resolução, dos anos 90, que já previa a autonomia completa dos navios. Tudo bem que dos anos 90 para esta altura já passaram alguns anos, mas entretanto já saiu tanta resolução, e alterações às convenções, que já ninguém se lembrava daquela resolução. Portanto, também essas ideias são óptimos contributos, apresentando documentos e ideias que ajudam muito. Por exemplo, recentemente, um desses representantes chamou recentemente à atenção para uma questão da qual já ninguém se lembrava, relativa ao espaço, no caso de saída de emergência de um navio de passageiros – pelo facto das regras relativas esse tópico terem mais de 20 anos, e a altura média da população ter vindo a aumentar nos últimos anos. Chegou-se à conclusão de que o espaço estipulado anteriormente já não serve. E isto é apenas um exemplo de como as regras têm necessidade de estar em constante actualização. Isto para dizer que a pró-actividade da IMO pode acontecer das mais diversas perspectivas. E, de facto, existe. Afirmou que se está na fase de ‘partir pedra’: como será a evolução desse trabalho, até se conseguir enquadrar juridicamente a questão dos navios autónomos na perspectiva da IMO? Penso que quando nos voltarmos a reunir em Dezembro, já terá existido um trabalho muito grande, realizado pelo secretariado da IMO e pelos grupos de discussão. Todos os documentos a serem discutidos em Dezembro terão de ser apresentados e publicados até ao princípio de Setembro. Assim, todos participantes saberão todas as matérias e temáticas a ser abordadas, e acredito que, nessa altura, já existirá um documento base, que baterá em cada um dos cinco pontos anteriormente referidos, estruturado, com indicação de todos os documentos que se relacionam, para haver uma árvore documental, e assim sabermos onde poderemos ir buscar as fontes de informação e adoptarmos aquelas de onde se poderá retirar alguma coisa que possa servir de base de trabalho para o futuro. Tem sido esse o modus operandi destas reuniões. Esta reunião está a ser preparada desde o final da última.

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Para as empresas, o mais importante é a urgência da legislação; para a IMO, a prioridade será a Segurança. É esta a perspectiva global? O Secretário-geral participou muito activamente na nossa última reunião, não só no discurso de abertura, mas também sobre a temática dos MASS (Maritime Autonomous Surface Ships). Participou e opinou, e uma das coisas que disse, foi que «é importante que permaneçamos flexíveis para acolher as novas tecnologias e, assim, melhorar a eficiência da navegação mas, ao mesmo tempo, é importante termos em mente o papel do elemento humano e a necessidade de manter uma navegação segura, reduzindo ainda mais o número de acidentes e incidentes no mar». Portanto, sim, a IMO trabalhará tendo sempre em atenção o papel humano a bordo. Isto aplica-se a todo o tipo de incidentes, incluindo, por exemplo a pirataria – porque acredito que os navios autónomos serão uma frustração para os piratas, deixam de poder pedir resgates sobre as pessoas, apenas ficam com a carga. Nesse aspecto, também é importante saber se esta vaga de automação vai incrementar o nível de protecção (Security) marítima? Houve um tema na agenda deste último Comité de Segurança – os navios de depósito de armas. Devido à pirataria, há bandeiras que permitem que os seus navios andem com guardas armados a bordo, no entanto, nem todos os portos permitem que essas armas entrem, pois, por definição, um navio mercante é um navio desarmado, não é um navio de guerra. Ora, em locais de entrada mais sensíveis, estão navios que servem de depósito de armas, onde os navios que possuam elementos armados a bordo possam depositar as suas armas para poder ir aos portos onde as armas não são permitidas. Na IMO a questão foi abordada nesta perspectiva: «E se estes navios forem atacados?». Isto para concluir que, em relação à protecção, são vários os factores que ainda terão de ser discutidos. Também em relação a esta temática, acredita que poderão vir à tona problemas graves ao nível de ciber-segurança? A IMO não fala em cyber safety, muito menos em cybersecurity, não por que não seja uma preocupação, mas não se enquadra directamente nas convenções, uma vez que é um perigo que está em terra. A única questão abordada relacionase com o que está previsto no código ISPS (International Ship and Port Facility). Se olharmos para este documento, nunca se fala é em Terrorismo, essa palavra não é utilizada em ponto nenhum, nem da convenção SOLAS nem do código. O que existe é tentativa de causar dano ao navio e/ou às pessoas, seja por sequestro, assalto, colocação de explosivos, tentativa de entrada com substâncias proibidas, que não deixa de ser terrorismo, no entanto a palavra terrorismo, nunca é utilizada. Todo o código ISPS, toda a parte da regulamentação e tudo aquilo que é definido fazer, não é estipulado pelas administrações. Estas apenas têm de definir o nível de protecção do seu porto, através de uma análise de risco. Depois compete aos navios, e às companhias, identificarem os meios que possam ter de aplicar para dirimir o risco. Assim, o ciber-crime, não é analisado de dentro para fora do meio marítimo, o navio per si, não tem problemas de cibercrime, porque eu consigo ter o navio, do ponto de vista informático, completamente estanque, não sendo acessível ao exterior para que possa ser hackeado. Se o navio não for completamente autónomo, e for controlado remotamente, terá de haver uma análise de risco e parametrizações, através

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de salvaguardas ou barreiras, para que o navio possa estar imune a esse tipo de ataques - mas isto ao nível da construção. Mas um navio completamente autónomo é estanque, não estará sujeito a ataques externos quando está em alto mar, os problemas poderão surgir, sim, quando o navio está em porto, uma vez que há interacção com elementos vindos de terra. Na minha opinião, neste momento, o ciber-crime ainda é uma coisa que pode ser mitigada. Se poderão ocorrer ataques? Sim, mas apenas se os navios estiverem de facto ligados a algum tipo de sistema em rede. No entanto, se possuírem apenas sistemas passivos como a geo-referenciação, sensores ou outro tipo de sistemas internos e algoritmos que se auto-regulem, não vejo como elevado o risco de intrusão. Sinceramente penso que será sempre algo que irá surgir com o evoluir do MASS, e a progressão contínua dos navios autónomos naturalmente será enquadrada. Acredita que existirão grandes transformações no design e no processo de construção? Já existem. Não necessariamente devido ao incremento da automação, mas ao nível da concepção da ponte, que tende a dar uma perspectiva ao estilo 360º da própria proa, que está a inverter a sua orientação. Nota-se claramente que a concepção está a sofrer fortes mudanças, é uma forte evolução que está relacionada com o aumento da eficiência, pois chegou-se à conclusão que o desenho do navio tem impacto na eficiência energética e nos consumos dos navios. Da parte da IMO, existe uma preocupação muito grande com todos estes aspectos, e a existência de planos e certificados de eficiência energética é algo que tem muita importância para a organização. Quão avançado está o processo de aperfeiçoamento dos navios autónomos? No norte da Europa já estão a fazer alguns testes, existem dois locais de testes, sei também que já se equaciona a criação de uma zona de testes também no Mediterrâneo, e para já está-se a testar em áreas onde o acesso está facilitado. Ao mesmo tempo que estes testes estão a ser realizados, as várias etapas que mencionei em relação aos navios autónomos, estão já acontecer, em testes. A tecnologia está a ser desenvolvida, portanto, quando a IMO conseguir garantir a ‘roupagem’ necessária para que possa andar, terão de ter certificados. Quando acha que esse dia chegará? Está perto! Porque, inclusivamente, na próxima reunião, além de já haver trabalho preparado pelo secretariado, deverão também já existir ideias em relação aos certificados, e essas ideias poderão ser aprovadas logo ali, na hora, pois são alterações por resolução – se toda a gente concordar com o texto, é um processo quase automático. Acredito que a próxima reunião trará muitas novidades em relação a esta questão. A meta de 2020 apontada pela Rolls-Royce não será, então, uma miragem, ao contrário da visão do CEO da A.P Moller-Maersk, que afirmava que tal não aconteceria no seu tempo de vida? Depende do tipo de navios e do tipo de automação de que estamos a falar, no entanto eu penso que sim, que 2020 é um bom palpite. É óbvio que a Maersk possui navios portacontentores de uma escala colossal, e, nesse segmento, é algo que não é tão fácil assim de implementa já. Mas outro tipo de navios acredito que sim – não tardará muito para termos navios autónomos a circular nos mares.

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ONE BELT, ONE ROAD: PORTUGAL, A PEÇA QUE FALTAVA? A relação económico-financeira entre Portugal e a China estreitou-se significativamente desde a entrada da Three Gorges na EDP, ainda sob o jugo do anterior Executivo, mas o ano de 2017 ditou, sob novos desígnios auspiciosos, uma aproximação diplomática e comercial que o presente ano se encarregou de fortalecer ainda mais. Na base desta aproximação, cujo carácter estratégico é facto inegável, está o progresso incontornável da mega-iniciativa internacional One Belt One Road, anunciada pela primeira vez pelo presidente da República Popular da China, Xi Jinping, em 2013. Cinco anos volvidos, o projecto de interligação – que alia a vertente infra-estrutural à interoperabilidade e à complementaridade logística – já demonstra assinaláveis avanços e vem arrastando, devido ao seu pendor integracionista, grande parte do continente europeu, colocando países como Portugal na órbita da famigerada Nova Rota da Seda, e provando, assim, que a distância física é hoje, em pleno mundo global, um conceito cada vez mais volátil. Inspirada no ancião modelo de exportação que há mais de dois mil anos alargou os horizontes do comércio internacional, a iniciativa One Belt One Road pretende ressuscitar o espírito expansionista, a influência contagiante da China e o desenvolvimento concomitante das nações que integrem o projecto – em termos materiais, o objectivo final é o de criar a maior plataforma de cooperação económica do mundo, integrando, simultaneamente, a coordenação de políticas de cooperação e uma teia profícua de colaborações comerciais, financeiras e culturais. Em 2015, o Conselho de Estado chinês autorizou o plano de acção dividido em dois componentes principais: a Silk Road Economic Belt e a 21st Century Maritime Silk Road – é nesta última (projectada para integrar mais de 60 países) que Portugal se enquadra. A chamada Rota Marítima da Seda proporciona, pela sua delineação, uma oportunidade única para que Portugal assuma um papel estratégico preponderante na conexão do potencial económico oriental ao Ocidente. Perspectivando essa janela de oportunidade, o Ministério do Mar, liderado por Ana Paula Vitorino, cedo apostou no estreitamento diplomático com a China, um processo que culminou, em Junho, com um périplo oficial por terras chinesas: na cidade de Xangai, a tutela reuniuse com a poderosa operadora marítima COSCO Shipping Lines (subsidiária do grupo China COSCO Shipping) e também com a operadora de terminais Shanghai International Port Group (que detém o exclusividade da operação dos terminais públicos de Xangai), a fim de auscultar o potencial interesse empresarial chinês em investir em Portugal e, mais concretamente, na pedra basilar portuária lusa, autêntica peça em falta do puzzle do caminho marítimo da One Belt One Road: o Porto de Sines. Segundo revelou, à data, o gabinete do Ministério do Mar, a comitiva liderada pela ministra aflorou

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a possibilidade da COSCO «marcar uma presença mais forte em Portugal, em particular no Porto de Sines», um cenário passível de catapultá-lo para o «topo da tabela dos principais portos europeus» – desígnio já veiculado, ambiciosamente, por Ana Paula Vitorino, e secundado pelo presidente do Conselho de Administração dos Portos de Sines e do Algarve (APS), José Luís Cacho, também ele presente na comitiva. Segundo revelou a ministra, durante a visita, a SIPG «considerou que a localização de Portugal e particularmente do porto alentejano é uma boa localização com grandes vantagens a nível internacional, no cruzamento de várias rotas marítimas». Em declarações à TVI, a líder da pasta do Mar deu conta da «possibilidade» da operadora «concorrer no concurso para o novo terminal Vasco da Gama». Sines na Rota Marítima da Seda: o missing link que a China quer ‘descobrir’? Portugal está de facto na rota da China e o Porto de Sines surge, incontornavelmente, em todas as equações marítimas que envolvam os dois países – no rescaldo da visita à China, a Ministra do Mar vincou, em declarações à publicação TradeWinds, a imperatividade de Sines desempenhar o papel de passagem obrigatória rumo ao velho continente: «É impossível a China chegar à Europa sem passar pelo país mais ocidental da Europa», afirmou, assegurando existir uma real chance de Portugal se tornar o extremo mais ocidental da Rota da Seda Marítima, graças ao futuro segundo terminal de contentores (Terminal Vasco da Gama) no porto de águas profundas alentejano e também à expansão do seu Terminal XXI – mudanças que permitirão ao porto luso acolher navios porta-contentores de dimensões ainda maiores. Na evolução rumo a tornar-se no referencial portuário máximo do cruzamento estratégico entre o Mar Mediterrâneo e o Oceano Atlântico, o Porto de Sines, um dos expoentes europeus do transhipment, não enjeitaria, no contexto da concorrência directa com Algeciras, o ganho de novas escalas de navios da COSCO, transportadora marítima que está à beira de absorver a Orient Overseas Container Line (OOCL), tornando-se assim a terceira maior força no shipping internacional em termos de capacidade de transporte (TEU). Esse salto quantitativo é acompanhado pela igual pujança do segmento de terminais: a COSCO Shipping movimentou, nos primeiros cinco meses de 2018, cerca de 39 milhões de contentores, distribuídos pelos seus 34 terminais, espalhados por todo o mundo. Um resultado que traduz um crescimento homólogo de 13,7% e empurra, rapidamente, a operadora do conglomerado chinês para a liderança a nível mundial, já prevista pela analista britânica Drewry Shipping. Parece, assim, não restarem dúvidas sobre o timing, aparentemente ideal, para o fortalecimento dos laços económicos entre duas

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nações concentradas no desenvolvimento imediato, não apenas das respectivas infra-estruturas, mas também das suas eficiências marítimo-portuárias, logísticas e comerciais. Sobre o tema, a Ministra do Mar mostrou-se confortável com o reforço da cooperação entre a China e Portugal, afastando quaisquer preocupações conjunturais: «Do ponto de vista económico, não temos motivo para ter medo do investimento directo chinês», afiançou Ana Paula Vitorino ao TradeWinds. «Somos um país pequeno e precisamos de investimento internacional. É por isso que estamos mais preparados com um quadro legal forte e um alto nível de supervisão. Não temos empresas portuguesas fortes o suficiente para fazer o investimento sozinho», explicou, garantindo que, uma vez respeitados, escrupulosamente, todos os preceitos legais e jurídicos, «não importa a nacionalidade do dinheiro».

de raiz em novos sectores. A cooperação na mobilidade eléctrica seria particularmente promissora», completou. O corolário da intensificação da acção diplomática entre os dois países deu-se este mês de Junho, com a atribuição, no passado dia 8, do galardão de Embaixadora dos Oceanos a Ana Paula Vitorino, entregue pelas mãos do seu congénere chinês, assim reconhecendo e distinguindo a evolução da cooperação e a intenção futura de intensificar essa parceria comercial e diplomática. A atribuição marcou a primeira ocasião que um estrangeiro foi agraciado com tamanha distinção do Estado chinês – «Pela primeira vez nas nossas interacções, o ministro chinês assumiu que queremos fazer projectos económicos em conjunto, fazer parcerias entre as empresas chinesas e as empresas portuguesas» declarou, à TVI, a Ministra do Mar.

Diplomacia intensiva ao serviço do estreitamento da cooperação luso-chinesa

Agilização dos processos aduaneiros facilitará comércio entre China e Portugal

A relação entre os dois países vive um período de vitalidade nunca antes vista, com os dados a indicarem que as trocas comerciais cifraram-se nos 5,8 mil milhões de euros em 2016, um valor 29% superior ao período homólogo anterior. Por outro lado, o investimento chinês em Portugal superou os 6 mil milhões de euros, num crescimento que é «constante», na visão do embaixador da China em Portugal, Cai Run, que marcou presença, em 2017, no Fórum Empresarial das Oportunidades de Negócio entre Portugal, China e Macau, organizado pelo Instituto para a Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), pelo Conselho da China para a Promoção do Comércio Externo (CCPIT) e pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP). Por seu turno, o embaixador de Portugal em Pequim, José Augusto Duarte, considerou «que Portugal tem um interesse inequívoco em ficar conectado com esta iniciativa, do ponto de vista económico». Em declarações prestadas à imprensa portuguesa, o embaixador realçou que a reactivação das antigas vias comerciais entre a China e a Europa através da Ásia Central, África e Sudeste Asiático, poderá servir como instrumento de auxílio à economia portuguesa, uma vez que Portugal goza de «uma posição estratégica única na Europa». Segundo José Augusto Duarte, a «facilidade de ligação ao continente americano e ao continente africano pela via marítima, e por toda a massa continental euro-asiática» é um trunfo geoestratégico de grande importância no âmbito da One Belt One Road, visão partilhada também por Vítor Sereno, cônsul-geral de Portugal em Macau: «Queremos estar na primeira linha da iniciativa One Belt One Road. China e Portugal são parceiros nesta visão, podendo o meu país servir de ponto de encontro entre as rotas marítima e terrestre», comentou, à luz do estreitamento entre as duas nações. Sereno destacou o múltiplo potencial do Porto de Sines, situado «na confluência de três rotas internacionais de comércio (Mediterrâneo, África e Canal do Panamá)» e indicou que o presente é o momento ideal «para se dar um passo qualitativo no investimento chinês em Portugal, direccionando-o também para a criação de empreendimentos

Um dos grandes passos rumo ao progresso das relações comerciais entre Portugal e China foi dado na segunda metade de 2017, com a obtenção de um acordo político que visava agilizar os processos aduaneiros entre o porto de Sines e os portos chineses. A implementação de uma espécie de ‘via verde’ no âmbito das trocas comerciais entre os dois países ficou plasmada na assinatura, pelas mãos do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, e do Vice-Ministro da Administração Geral das Alfândegas da China, Zou Zhiwu, de um protocolo inserido no programa europeu SSTL – Smart and Secure Trade Lanes, visando o estabelecimento de uma rota comercial marítima directa entre o Porto de Sines e portos chineses, a agilização dos procedimentos aduaneiros e a minimização dos encargos administrativos, possibilitando assim uma libertação mais rápida das mercadorias (sujeitas a controlo na origem) e, consequentemente, melhorando a previsibilidade nas trocas comerciais. Outra das medidas aplicadas prendeu-se com o IVA aduaneiro, no qual as empresas importadoras eram obrigadas a antecipar o pagamento para o momento da importação. Alternativamente, caso importassem as suas mercadorias indirectamente através de países como Espanha e Holanda, as empresas deixavam de antecipar o pagamento do IVA, uma vez que não é exigida antecipação em tais países, o que constituía uma forte desvantagem competitiva para os portos nacionais. Ora, a nova medida passou a libertar as empresas importadoras deste encargo financeiro, facilitando a sua gestão de tesouraria ao libertar recursos e removendo o desincentivo à importação através dos portos nacionais. Em Setembro de 2017, António Mendonça Mendes destacava que tais alterações permitiam a simplificação dos controlos aduaneiros, «eliminando custos de contexto» e passando «o comércio que tem origem e destino no Porto de Sines» a «beneficiar de vantagens de um desalfandegamento mais rápido». Para o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, este foi um passo decisivo no sentido de «integrar o porto de Sines na Rota da Seda».

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Bruno Falcão Cardoso

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SHIPPING 4.0: EVENTO REFLECTIU SOBRE AS OPORTUNIDADES DO «MAR DE AMANHû No passado dia 16 de Maio, a acção conjunta da AGEPOR e da J. Canao deu vida à conferência ‘Shipping 4.0 – O Mar de Amanhã’, um evento que reuniu, nas instalações da ENIDH, vários ilustres representantes da indústria do Shipping e da Logística, nacionais e internacionais. Em análise esteve o avassalador progresso da onda da digitalização aplicada à reestruturação da gestão e dos processos de transporte de mercadorias. O seminário, que contou com a cobertura total da Revista Cargo, pautou-se pelo sucesso, fomentando o debate sobre uma multiplicidade de tópicos e alumiando o trilho da digitalização e suas respectivas potencialidades. A abertura da sessão ficou a cargo de António Belmar da Costa, presidente da AGEPOR – a sua frase inaugural, espelhou, na perfeição, o espírito da iniciativa: «Isto não será apenas para os nossos filhos, será ainda para nós, porque o futuro já aqui está». E, de facto, as intervenções dos reputados convidados comprovaram, eloquentemente, que o presente é um futuro em constante movimento – a mudança, imparável, transforma, todos os dias, o universo marítimo-portuário e logístico. É tempo de a abraçarmos. Economia do Mar «resistiu» com «resiliência» à crise iniciada em 2008 A primeira intervenção do evento pertenceu a Miguel Marques, partner da PwC. Explorando o tema ‘O Mar e a Revolução Digital’, actualmente enquadrado, explicou, por uma postura de «esperar para ver por parte do mercado». Dando conta, com base nos resultados do barómetro LEME da Economia do Mar em Portugal (de 2016), que «60% das variáveis» do contexto do Mar apresentaram desenvolvimentos «favoráveis», Miguel Marques realçou que este sector «resistiu bem à adversidade iniciada em 2008» com a crise financeira global, mostrando a sua vocação «de longo prazo» e «a sua resiliência». A sua intervenção incidiu também sobre a «evolução das cargas» movimentadas - os portos portugueses viram, nos últimos vinte anos, uma clara progressão no volume de mercadorias, facto que mereceu o elogio do membro da PwC e ao qual não será alheio o desenvolvimento digital que já se faz sentir há vários anos, pois, se a revolução digital vem batendo à porta, a verdade é que já experimentamos, recorrentemente, os efeitos de «alterações prévias próprias da necessidade de dinamização». O «excesso de capacidade», o «crescimento dos navios» e os adjacentes fenómenos de «concentração» no seio do transporte marítimo internacional marcam uma tendência global de consolidação que sopra ventos de mudança e provoca, até, modificações no cariz do financiamento deste sector, explicitou. De acordo com os estudos e inquéritos da PwC, «90% dos líderes inquiridos 10

acham que a digitalização não se trata apenas de uma moda», afiançou Miguel Marques. Este fenómeno tratarse-á, efectivamente, de um paradigma que veio para ficar, provocando «a entrada de novos players», a «diminuição de espaço de manobra dos intermediários» e «alterações nos comportamentos operadores marítimos e logísticos». Para que a digitalização já se incorporou no shipping (e continuará a fazê-lo de forma acentuada), o sector, em conjunto, deverá procurar «democratizar o acesso à tecnologia», buscar «mais formas de compatibilização da informação digital, mitigar o risco de ciber-ataques» e fomentar a «melhoria da cooperação para maximizar os benefícios da revolução digital», enumerou. Sistemas ciber-físicos e a ‘carga inteligente’ Pedro Galveia, Berth & Yard Operations Expert na Yilport Sotagus, abordou a temática ‘Sistemas Ciber-Físicos e os Portos’ – o especialista enfatizou o papel da vertente ciberfísica no progresso produtivo e organizacional dos portos. Para Galveia, o desenvolvimento dos sistemas ciber-físicos (compostos por elementos computacionais colaborativos com o intuito de controlar entidades físicas) poderá significar «um bypass entre carregadores e armadores», traduzindo-se num «risco» para agentes intermediários mas também numa «oportunidade» para uma maior dinamização, eficiência e simplificação dos processos no shipping. Para que esta componente da indústria 4.0 possa vingar em pleno, explicou, será necessário «criar confiança» entre agentes envolvidos e buscar, incessantemente, uma eficaz gestão e análise da «heterogeneidade de dados», da protecção da privacidade e do «controlo e segurança das comunicações», em prol de uma «conectividade» capaz de beneficiar todos os stakeholders. Segundo o especialista, «os sistemas ciber-físicos podem dar maior visibilidade às cargas dos clientes», dando também maior capacidade organizacional às infra-estruturas portuárias (controlo de rotas, movimentos e velocidade dos navios, optimizações de percurso, por exemplo) apelidando este desenvolvimento de ‘carga inteligente’. Com maior visibilidade, será mais acessível realizar um «tracking» de todas as envolventes que preocupam os portos. Elencando as potencialidades que estes sistemas aportam, Pedro Galveia explicou que a virtualização nos portos pode auxiliar na projecção das suas infra-estruturas, no tipo de equipamentos que devem merecer investimento futuro e até na própria manutenção preditiva dos mesmos, trunfo capaz de minimizar quebras de produtividade e «maximizar a produtividade dos equipamentos».

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essencial para preservar as bases de dados e as plataformas de gestão», afirmou, lembrando os presentes de que «à medida que a conectividade aumenta, também aumenta a exposição ao risco». Para Mitchell Cordero, a conectividade máxima é um trunfo incontornável que tem um reverso da medalha que não é facilmente eludível: a pirataria informática: «Os navios estão conectados mas cada vez mais vulneráveis. É preciso entender os riscos», avisou. Semeando o futuro através da aposta nos navios autónomos

Consolidação dos sistemas aplicacionais da DGRM em destaque A apresentação seguinte ficou a cargo do presidente da DGRM, o engenheiro José Carlos Simão – o seu discurso retratou a evolução de mais de um ano de trabalho ao nível da nova geração dos sistemas da Administração Marítima. Por se tratar de um organismo bastante complexo, pelo qual se cruzam vários stakeholders com diferentes interesses e preocupações e através do qual se forma uma intrincada rede de funções e respostas diferenciadas, «desde o pequeno pescador ao grande armador», o tema da «consolidação parcial dos sistemas da DGRM», como explicou, ganha especial relevância. Com «clientes muito variados» e stakeholders de múltiplas índoles, como universidades, associações, organizações internacionais (como é o caso da IMO), grandes armadores de cariz mundial, profissionais ligados à actividade da pesca e até a área da náutica de recreio, a DGRM avançou no trilho da harmonização dos seus procedimentos com as exigências de eficiência e acessibilidade do futuro na comunicação com os stakeholders e na arquitectura organizacional dos dados. Lembrando que coexistiam «42 sistemas aplicacionais», José Carlos Simão explicitou que a necessidade de redefinir uma «arquitectura de sistemas» da infoestrutura do organismo era prioritária, de forma a diminuir a «complexidade», os custos e os potenciais problemas que derivam dessa pecha. A «busca da compatibilidade» nos processos, através de uma «aposta em software aberto», foi acompanhada da evolução legislativa, que deu aval à criação do Sistema Nacional de Embarcações e Marítimos (SNEM) e do Bmar (Balcão Electrónico do Mar). A lei nº9/2018, de 2 de Março, avalizou os

dois instrumentos, sendo a DGRM responsável pelo tratamento dos dados inseridos neste sistema - o SNEM será um sistema de dados central e único que com intuito de dar publicidade aos registos e certificações e agregar e organizar informação relativa à actividade marítima. O acesso é feito através do Bmar, que operará qual interface único ao SNEM, no qual se poderão efectuar pedidos ao Estado, e pelo mesmo canal de comunicação, obter resposta, explicou, detalhadamente, o presidente da DGRM. «À medida que a aumenta, também exposição ao risco»

conectividade aumenta a

A primeira intervenção forasteira foi da responsabilidade do espanhol Mitchell Cordero, profissional dos quadros da sociedade classificadora Lloyds Register. Cordero começou por frisar o carácter revolucionário do paradigma 4.0, explicando que «sempre que há uma revolução, dá-se uma destruição». Na sua visão, o rápido processo evolutivo das novas tecnologias faz desmoronar, gradualmente, o edifício epistemológico que, outrora, foi a casa do shipping. Esta vaga de «tecnologias disruptivas influenciadas pelo custo», tem sido pautada por uma velocidade estonteante, praticamente impossível de ser acompanhada pela vertente jurídica e regulamentar: «A ciber-tecnologia move-se tremendamente depressa», comentou, ao explorar o tema da automação marítima, adiantando que a Lloyds Register vem estudando o dossier dos navios autónomos «há mais de 5 anos». «Presentemente não há legislação nem standards da IMO para navios autónomos. O organismo terá de tomar uma decisão», alertou, mostrando-se igualmente atento à emergência de fenómenos de pirataria cibernética: «A ciber-segurança é www.revistacargo.pt

Os nórdicos Carl Johansson (engenheiro da Rolls Royce) e Carsten Nygaard (consultor da Svitzer) trouxeram ao palco o badalado tópico dos navios autónomos – «O conceito marítimo 4.0 é a próxima grande mudança», antecipou Carl Johansson, definindo os conceitos de «controlo remoto e automação» como os grandes princípios de uma nova metodologia do transporte marítimo de mercadorias virada para a segurança e eficiência dos processos. Apontando 2020 como o ano da introdução dos primeiros modelos marítimos autónomos no mercado, o profissional da Rolls Royce abordou também os aspectos que ainda necessitam de percorrer um longo caminho rumo ao seu aperfeiçoamento: «precisaremos de melhorar a conectividade (comunicação entre satélites, wi-fi, ethernet) e o network bonding e a cibersegurança (como as firewalls)». O teste do rebocador autónomo da Svitzer foi, também, tópico de destaque – «Com o teste do rebocador autónomo da Svitzer, elevámos a fasquia para todos», declarou, aludindo à ‘prova de fogo’, realizada no Verão de 2017. O feito materializou o vanguardismo da Rolls Royce em matéria de navios autónomos dotados de Inteligência Artificial, colocando a companhia entre as mais avançadas no segmento. «É mais do que tempo de começar a fazer e parar apenas de falar», atirou, dando assim o mote para novas etapas de evolução. Por seu turno, Carsten Nygaard, abordou o tema do ponto de vista da empresa que integra o Grupo A.P. Moller-Maersk: «O que torna a Svitzer tão interessada num projecto destes?», perguntou, para logo de seguida responder, explicando as razões desta aposta no progresso digital: «O facto de querer estar na vanguarda, na frente do que se está a passar no sector». «Queremos pensar fora da caixa», garantiu. «A autonomia é o conceito central» que, dada a sua essência, se tornou «transversal» a toda a indústria do transporte. E, revelou durante o seu discurso, o foco não se cinge apenas aos rebocadores: «Não 11


estamos apenas concentrados nos rebocadores pois integramos o Grupo A.P. Moller-Maersk», afirmou. A arte da «linguagem universal» ao serviço da conexão entre stakeholders Grande precursor da conferência, José Canão foi outra das personalidades a abrilhantar o ‘Mar de Amanhã’ – trazendo, no discurso, a apologia da digitalização ao serviço da eficiência, o representante dos produtos CANOW elencou os pressupostos de «excelência», «simplicidade» e «uniformização» que sustentam a actividade da J. Canao. José Canão caracterizou o objectivo central de «ligar os stakeholders à área portuária», num processo de trabalho «para as pessoas, para os processos e tarefas». O «objectivo de simplificar» parte da necessidade da implementação, no sector, de uma «linguagem universal», criando um caminho de interligação entre partes envolvidas à boleia da tecnologia digital. No fundo, uma «interactividade contínua entre stakeholders», como explicou o líder da empresa J. Canao. Com as ferramentas ‘Navegador’, ‘Vista Geral’, ‘Vista Detalhe’, ‘Mapa Mental’ e ‘Construtor’, as soluções CANOW possibilitam camadas relativas à área do utilizador e da programação, ajustandose às necessidades e simplificando processos em prol dessa desejada conectividade, ora para «idealizar, inovar e construir», ora para «operar, gerir, auditar, avaliar, reflectir e rastrear». Para José Canão, esta é a forma ideal para uma interoperabilidade que cria «um somatório maior que a simples soma das partes». O discurso de José Canão não poderia ter terminado de forma mais representativa do espírito da conferência ‘O Mar de Amanhã’ CANOW: o futuro é agora, e pode, de facto, estar à simples distância de uma solução estandardizada, preparada para uma comunicação interligada e friendly-user. Um futuro «conectado, desmaterializado e virtualizado», para

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tornar o shipping mais eficiente. «Mais do que falar em Shipping 4.0, devemos sim falar de Logística 4.0» Carlos Vasconcelos fechou o programa do evento – «Para onde caminha o futuro do Shipping 4.0?», começou por indagar o experiente especialista, que realçou o facto de falar apenas em seu nome. Numa intervenção reflexiva, na qual procurou analisar os fundamentos e os princípios desta quarta revolução industrial, Carlos Vasconcelos realçou os progressos transversais da digitalização: desde a «realidade consumada» do «terminal chinês de Qingdao totalmente automatizado», passando pelos «desafios dos navios autónomos» dos «comboios sem maquinista» e do «platooning automático». «Mais tarde ou mais cedo, todo o processo produtivo, end-to-end, será totalmente automatizado», explicou, colocando a tónica numa «evolução muito mais rápida que o inicialmente imaginado» e prevendo a continuação do fenómeno de consolidação na indústria do Shipping, originado por um «investimento colossal»: para Carlos Vasconcelos, restarão «menos players» e sobrará, em consequência, «uma

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maior indiferenciação do produto». Para o especialista, «a grande revolução do Shipping 4.0 incidirá verdadeiramente, não no transporte das mercadorias, mas sim ao nível das relações de produção e também no software», inferindo também que «a tendência é a gradual eliminação dos intermediários e entre a produção e o consumo». Na sua análise, descreveu ainda a «redefinição do processo logístico» rumo à reestruturação da cadeia de abastecimento «em função dos comportamentos dos consumidores», à boleia das evoluções registadas na Big Data, Inteligência Artificial, interactividade global e desmaterialização. Durante o discurso, Carlos Vasconcelos dissertou também sobre a tendência de poder do controlo, progressivamente total, das cadeias de abastecimento por parte das operadoras marítimas (caso da compra da CEVA Logistics pela CMA CGM e da anunciada intenção da Maersk em apostar nos serviços ‘em terra)e também das retalhistas como a Amazon ou Alibaba, num contexto de «indiferenciação no mar e diferenciação em terra» - «mais do que falar em Shipping 4.0 (que mais se assemelha agora a uma comodity) devemos sim falar de Logística 4.0», rematou.


ABRAM ALAS AO PROTECCIONISMO DE TRUMP: MAKE SHIPPING UNCERTAIN AGAIN Make America Great Again – o slogan, qual mote de ordem para um futuro redefinido, deu o tiro de partida da campanha eleitoral de Donald Trump, e, se às massas esse disparo soou a retumbante anúncio apoderador do orgulho nacional, para o universo do comércio livre e global soou, definitivamente, a uma bala tomada de raspão. A filosofia de actuação antecipada pelo então candidato à presidência dos Estados Unidos da América poderá ter aliciado os eleitores mas dificilmente terá criado falsas esperanças nos agentes internacionais que dão corpo ao comércio mundial: os dias do proteccionismo americano estavam próximos, e, com estes, novas dinâmicas de atrito e reajustamento nos panoramas diplomático, financeiro e do próprio trading global se formavam no horizonte. Os primórdios do presidencialismo de Trump, autocentrado, deixavam adivinhar uma aposta no reforço do poderio industrial e comercial da nação à custa da alteração dos paradigmas vigentes, com especial incidência no shipping internacional e nas tarifas aduaneiras – duas áreas umbilicalmente ligadas à estruturação do comércio global da contemporaneidade e à homeostase das correlações de forças entre blocos económicos. Directo, Trump não escondeu que chegava ao cargo para agitar as águas e redefinir os termos da liderança da potência norteamericana – durante os primeiros meses do seu mandato, Olaf Merk, especialista em Shipping e Portos na organização internacional OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) identificou os traços gerais da política do novo presidente e previu mudanças significativas a uma escala global. Esteve, diz-nos o presente, longe de errar em suas previsões. «Trump apoia o comércio global mas não sob as condições de outrem: o comércio não deve ser feito à custa de empresas e postos de trabalho americanos – esta directiva tem prioridade sobre os benefícios que os consumidores americanos possam obter através do comércio. Daí o seu desejo de renegociar ou quebrar o acordo NAFTA, opor-se à TTIP e impor muros tarifários contra certos países. E é neste aspecto que sua agenda económica está conectada ao transporte marítimo», começou por explicar Merk. A análise do especialista coloca em perspectiva a seguinte interrogação: será o modelo de acção que Trump preconiza contrário àquele das cadeias globais de valor pautado pelo paradigma da terceirização avançada, que como discerne Merk, se torna «possível graças aos custos de transporte marítimo muito baixos»? Em tese, sim, opinou o analista, que deixou ainda pertinente observação: «O transporte marítimo é subsidiado de várias maneiras. Parte destes subsídios (apoios às indústrias de construção naval e de navegação) são pagos pelos contribuintes chineses e coreanos. Mas – o que é mais importante para Trump – uma parte considerável é suportada por cidadãos americanos,

em particular para investimentos em portos que são as portas de entrada do comércio global. E aqui os EUA - a primeira potência económica do mundo, mas apenas a oitava maior nação marítima - está à mercê das companhias estrangeiras que comandam os oceanos e as costas». A última explicação de Olaf Merk resumia, no final de 2016, as linhas de orientação da administração de Donald Trump, nas quais o combate à concentração de poderes do shipping nas operadoras marítimas orientais e a correlação de forças nas tarifas, ambas faces da mesma moeda, ganham relevo essencial para os intentos dos EUA no cenário internacional. Para consumar esses pressupostos, Trump tem vindo a alertar a Comissão Federal Marítima (FMC) para a necessidade de uma restrita e vigilante postura face a potenciais alianças (recorde-se a decisão no caso da tríade nipónica ONE), a contemplar a subida dos custos do shipping (com potenciais taxas adicionais direccionadas às operadoras estrangeiras que escalem nos portos americanos), a reduzir o peso influenciador do Estado na esfera marítimo-portuária, reavaliando os termos do histórico Jones Act (uma hipótese bastante discutida actualmente) e liberalizando o sector para o dotar de capacidade competitiva similar à de outros países, e, finalmente, equacionando a mais drástica de todas elas: o aumento das tarifas. Enquanto grande parte destas hipotéticas acções paira sobre a cabeça do transporte marítimo internacional, o cenário do aumento das tarifas ganha, a cada dia que passa, contornos reais. «A sua postura proteccionista e anti-globalização prejudicará o transporte marítimo, já que se trata de uma indústria que prospera em barreiras comerciais baixas para a transacção dos produtos», afirmou Basil Karatzas, CEO da empresa Karatzas Marine Advisors, antecipando, já em 2017, potenciais medidas de endurecimento das tarifas aduaneiras. Ao Wall Street Journal, Karatzas referiu o pendor proteccionista do Executivo de Trump como a «maior das preocupações», capaz de despoletar acções similares de resposta por parte de outras potências mundiais. Uma opinião partilhada por Lars Jensen, CEO da companhia dinamarquesa SeaIntelligence Consulting: «O maior risco para o transporte marítimo é se tais acções causam um efeito cascata, no qual outros países tomam medidas semelhantes», comentou ao mesmo jornal. «A médio e longo prazo, isso teria um impacto negativo nas indústrias portuária e do transporte em todo o mundo», acrescentou, lembrando que a China é o maior parceiro comercial dos EUA, com comércio total entre os dois países de 416 mil milhões de dólares em 2017, segundo dados do governo americano. Tais números não impediram, no entanto, o presidente dos EUA de anunciar o início das hostilidades em Março de 2018 – a ameaça do aumento das tarifas sobre as importações de aço (25%) e alumínio (10%) para todos os países foi somente o pontapé de saída de um período

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de instabilidade comercial no qual Trump desempenhou o papel principal. «Quando um país está a perder milhares de milhões de dólares no comércio com praticamente todos os países com quem faz negócios, as guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar», comentou Donald Trump aquando do estalar da guerra comercial. Trade Wars: EUA, China, Canadá e UE em turbilhão retaliativo de tarifas Com a China na mira, o polémico presidente justificou as suas intenções com a protecção da economia e da segurança nacional, mas os argumentos não convenceram, nem a potência oriental nem a União Europeia, que encararam a ameaça como uma violação dos princípios veiculados pela Organização Mundial do Comércio. A Comissão Europeia foi lesta a responder, afirmando que iria «reagir firme e proporcionalmente» na defesa dos seus interesses, ao passo que o Executivo chinês – através do porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros Hua Chunying – pediu à administração de Trump que colocasse «um travão» às «medidas proteccionistas» e que respeitasse «regras do comércio multilateral», não deixando que lançar um alerta global: «Se outros países seguirem tal exemplo, teremos um grave impacto na ordem do comércio multilateral». Estava aberta a época das ameaças mútuas no plano aduaneiro, com o shipping internacional expectante, assistindo às quezílias diplomáticas em pleno período de incertezas. Imperturbável, Trump anunciou, a 31 de Maio, a

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implementação de taxas alfandegárias sobre as importações chinesas, podendo a medida atingir cerca de 50 milhões de dólares. Mas, como prometido, o magnata transformado presidente incluiu a UE no seu belicismo aduaneiro, decidindo não conceder qualquer tipo de isenção permanente às importações de aço e alumínio vindas do espaço europeu – o anúncio do Secretário do Comércio dos EUA, Wilbur Ross, anunciava que, a partir do dia 1 de Junho, as exportações destes metais para os Estados Unidos passavam a pagar taxas alfandegárias de 25% e 10%, respectivamente. Nem os parceiros comerciais México e Canadá escaparam ao isolacionismo de Trump, o que poderá ter significado o início do desmantelamento do acordo NAFTA, em vigor desde 1994. O tumulto instalado chega numa altura em que as operadoras marítimas tentam dissolver os resquícios da fatídica descompensação estrutural (excesso de capacidade e fretes em mínimos históricos) que culminou com a queda da Hanjin e uma sucessão de balanços financeiros desastrosos um pouco por todo o sector. Mas, se 2017 se pautou pela recuperação gradual dos indicadores gerais, 2018 poderá marcar um regresso a uma inconstância que, segundo os especialistas, não será imediatamente perceptível – «O comércio entre a China e os EUA representa cerca de 4% do comércio mundial, portanto, uma disputa entre os dois países prejudicará os parâmetros globais do comércio. Mais: o aumento das tarifas enviará um sinal errado

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ao mundo, dizendo que as restrições de mercado são uma plausível forma de progresso. Esta não é a solução correcta e, em última análise, prejudicará os consumidores de todo o mundo», explicou Jacob K. Clasen, director executivo da organização Danish Shipping Academy. «Todas as partes envolvidas – UE, EUA e China – devem buscar soluções pela via do diálogo e fazer todos os possíveis para que se evite uma guerra comercial muito prejudicial. É crucial que todas as partes travem a escalada do conflito», acrescentou, em declarações proferidas em Março. O analista-chefe da associação de armadores BIMCO, Peter Sand, reforçou a explanação de Clasen: «Todas as medidas que restrinjam o mercado são, por princípio, nefastas para o transporte marítimo internacional. Esta é uma tendência preocupante que limita a procura global do shipping», afirmou. Ao coro de apelos à pacificação juntou-se o presidente da Federação do Retalho dos EUA, Matthew Shay, que vê a classe média americana como a mais visada pelas medidas proteccionistas: «Abraçar agora uma guerra de tarifas resultará num aumento de preços para uma vasta gama de produtos. As tarifas trarão incerteza aos retalhistas», lembrou, o que é passível de contagiar negativamente o comportamento das cadeias de abastecimento de um dos mercados mais pujantes do globo. Até os portos americanos de Houston e Nova Orleães e a Northwest Seaport Alliance se posicionaram contra a política adoptada, por sentirem que o impacto da alteração das tarifas sobre o


aço e o alumínio afectará negativamente os volumes movimentados nos portos. Esta instabilidade não poderia vir em pior altura para o líder de mercado do transporte marítimo de contentores – a Maersk Line. Depois de um 2017 pleno de reestruturações (onde pontifica a alienação do segmento Maersk Oil), de ciber-ameaças e de um arranque de ano marcado pelo descontentamento dos accionistas, a transportadora do Grupo A.P. Moller-Maersk enfrenta agora, além da subida do preço dos combustíveis, um período de total incerteza pautado pelo discurso flutuante de Donald Trump – «uma companhia que é responsável por 1/5 de todo o tráfego de contentores pode, facilmente, ficar refém do megafone das tarifas de Trump», comentava o jornalista da Bloomberg Chris Bryant em Abril, resumindo então, em uma frase, o efeito destabilizador que o líder da Casa Branca tem exercido no shipping, especialmente nos últimos meses. A instabilidade global acentuou-se em pleno mês de Junho, com Trump a devotar ao fracasso a cimeira do G7 e a chocar de frente com o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, voltando ao plano das ameaças: «Face às suas falsas declarações e ao facto de o Canadá estar a impor enormes taxas sobre os nossos agricultores, trabalhadores e empresas americanas, pedi aos nossos representantes americanos que retirassem o apoio ao comunicado enquanto consideramos taxar os automóveis que estão a inundar o mercado americano», declarou Trump, voltando a fazer uso do seu megafone das tarifas. Debruçando-se sobre o tema, os analistas do jornal The New York Times Peter S. Goodman, Ian Austen e Elisabeth Malkin retrataram, para os seus leitores americanos, a degradação do contexto global

económico: «À medida que o conflito aumenta, as remessas diminuem nos portos e nos terminais de carga aérea um pouco por todo o mundo. Os preços das matérias-primas cruciais sobem. Nas fábricas, da Alemanha ao México, os pedidos vão sendo cortados e os investimentos adiados. Os agricultores americanos perdem em vendas», escreveram, no ensaio jornalístico intitulado ‘Apenas o medo constrange a economia global’. Retirada do Acordo Nuclear abriu novo foco de instabilidade comercial O carácter antagonista de Donald Trump não visou apenas a arqui-rival China ou os parceiros comerciais México e Canadá – também o imprevisível Irão foi visado pelo líder da Casa Branca. Em Maio passado, os EUA decidiram retirar-se do pacto nuclear (obrigando a várias limitações no programa nuclear do Irão em troca do alívio das sanções económicas) assinado em 2015 (pela administração de Barack Obama), voltando, automaticamente, a validar sanções contra o país. «Este foi um acordo unilateral horrível que nunca deveria ter sido feito. Não trouxe calma, não trouxe paz, e nunca trará», afirmou Donald Trump, aquando do anúncio da decisão. As consequências desta tomada de posição não se fizeram esperar e foram imediatamente sentidas no seio do shipping internacional – as duas líderes de mercado, a Maersk Line e a MSC, repensaram a sua actividade no Irão, acabando por retirar os seus portacontentores da região e eliminando dos seus serviços quaisquer escalas naquele país. Através de um comunicado, a operadora marítima da família Aponte comunicou a retirada, explicando, no entanto, que «para evitar e prevenir rupturas comerciais e quebras logísticas

abruptas», continuaria, «durante um período transitivo», a assegurar o transporte de determinadas mercadorias. A Maersk Line (que compõe, juntamente com a MSC, a Aliança 2M) seguiu-lhe as pisadas, adensando a lista de companhias europeias prontas a abandonar o Irão e a deixar o acordo nuclear com Teerão preso por arames – mais uma vez, a transportadora liderada por Soren Skou viu-se embrenhada na teia tecida pela turbulência de Trump: «Com as sanções que os americanos deverão impor, as empresas não poderão fazer negócios no Irão se também tiverem negócios nos EUA, e nós temos isso em larga escala», lamentou, ao reagir à decisão. Depois da guerra de tarifas – da qual muitas retaliações se esperam – Trump voltou a baralhar as cartas do comércio internacional e da diplomacia, obrigando as multinacionais com interesses no Irão a redefinirem os seus planos. Nem a gigante Amazon escapou à mira do proteccionismo de Trump O percurso de Trump enquanto presidente dos EUA tem sido feito de choques frontais múltiplos e nem só da guerra de tarifas vive o seu espírito polémico e confrontacional: na mira do líder da Casa Branca está também a gigante do retalho online Amazon, que se tem expandido de forma imparável, saltando do domínio digital para, sem precedentes, tomar cada vez mais conta da cadeia logística através da qual se estende até aos quatros cantos do mundo. Com o seu serviço de entregas Prime a todo o gás e o arrojado Shipping with Amazon na calha, a retalhista ameaça penetrar em força no mercado logístico para ganhar maior controlo das suas entregas de mercadorias, controlando também,


de modo mais apertado, os custos com as suas operações. Mas a mais recente pedra no caminho não se trata de um simples concorrente. A guerra entre Donald Trump e o timoneiro da Amazon, o multi-milionário Jeff Bezos, não é nova mas ganhou, nos últimos meses, capítulos ainda mais drásticos: o presidente dos EUA criticou, em Abril, a empresa americana, por pagar impostos demasiadamente baixos para Trump, a Amazon «terá de pagar os custos reais (e impostos) agora!», apelidando a conduta da retalhista de «falcatrua». Recorrendo a relatórios por si não especificados, Trump revelou que o serviço postal americano perderá «1,5 dólares em média por cada encomenda que entrega pela Amazon». A retalhista de Seattle detém uma parceria (anualmente revista por uma comissão independente) com o serviço postal americano, algo que, segundo a Amazon, tem influenciado positivamente o desenvolvimento desse segmento (actualmente em dificuldades financeiras); mas, para Donald Trump, a ligação tem apenas como objectivo beneficiar o negócio da retalhista, sendo prejudicial para o serviço postal - o líder do Executivo apelidou até os correios de «moço de recados» da Amazon. A troca de argumentos azedou o ambiente, que piorou substancialmente com a notícia do site Axios, dando conta da obsessão do presidente dos EUA com a regulamentação da Amazon (especialmente no que concerne às situações em que os vendedores usam o site mas não pagam impostos sobre as suas vendas). O efeito foi imediato, com a companhia a perder 4,83% do valor em bolsa (equivalente a 53 mil milhões de dólares). Apesar do azedume, a porta-voz da Casa Branca, Lindsay Walters, adiantou que, até agora, não estão previstas quaisquer «acções administrativas». «Ao contrário de outro, paga pouco ou nenhum imposto aos governos estaduais e locais, usa o nosso sistema postal como moço de entregas (o que causa uma perda tremenda para os Estados Unidos) e está a acabar com muitos milhares de retalhistas», acusou

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o líder da Casa Branca na rede social Twitter. «Vilas, cidades e Estados pelos EUA estão a sofrer - muitos empregos a perder-se», reforçou. Na opinião de Edward Kleinbard, professor de Direito da Universidade do Sul da Califórnia e ex-chefe de gabinete do Comité Conjunto de Impostos do Congresso dos EUA, «não existe razão para Trump apontar a Amazon como empresa que sonega impostos. Parece-me uma vingança política desconectada de qualquer facto real», afirmou, reforçando o parecer dos reguladores do serviço público que os correios americanos representam, sustentando que, de facto, a parceria com Amazon tem sido benéfica para as suas contas, apesar de um estudo realizado pelo Citigroup ter concluído, em 2017, que os preços cobrados pela entrega de encomendas estavam abaixo dos preços de mercado. «A Amazon paga impostos sobre as suas vendas em todo o país, de acordo com a localização do cliente. Os comerciantes da Amazon (third parties que utilizam a plataforma para vender) fazem-no ou não, dependendo da sua interpretação da lei federal. Essa legislação está completamente desactualizada, e isso é culpa do Congresso», completou Kleinbard. Paul Rafelson, advogado fiscal e professor da Universidade Pace, em Nova Iorque, complementa a visão de Kleinbard: «Tem havido uma vantagem competitiva da qual a Amazon beneficiou, mas tal tem a ver mais com os governos estaduais locais, que o permitem». A guerra (económico-financeira) parece não ter fim à vista e a incerteza o conceito reinante do reinado de Trump – conseguirão o Shipping e a Logística, estruturados numa interdependência globalizante, resistir aos desmandos do paladino do proteccionismo?

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Bruno Falcão Cardoso


III CURSO DE SHIPPING AND LOGISTICS MANAGEMENT SINERGIAS REFORÇADAS ENTRE ENIDH E MSC

Realizou-se, no passado dia 3 de Julho, nas instalações da Escola Superior Náutica Infante D. Henrique (ENIDH), a cerimónia de encerramento da terceira edição do Curso de Especialização em Shipping and Logistics Management, uma iniciativa de sucesso levada a cabo pela MSC Portugal em parceria com ENIDH, através da Academia MSC. O evento marcou o fim de mais de 400 horas de formação profissional leccionadas por um riquíssimo quadro de docentes, recheado de altas figuras das esferas do Shipping e da Logística. Como não poderia deixar de ser, a Revista Cargo marcou presença na sessão de encerramento: na sala, repleta de formandos, testemunhámos a entrega dos diplomas e as valiosas declarações de Luís Baptista, presidente da ENIDH, dos coordenadores Fernando Cruz Gonçalves e Manuela Baptista, e de Carlos Vasconcelos, representante da MSC na parceria formativa, um projecto pioneiro (composto por uma forte componente prática) que já consolidou, com sucesso, a sua presença no espectro académico do sector, focando-se nas necessidades do mercado. Luís Baptista considerou o projecto um «sucesso» com «grande aceitação do mercado» Luís Baptista abriu a sessão com um discurso centrado na orientação prática do curso, idealizado para efectuar uma profícua correspondência entre a necessidade de aprendizagem teórica e as bases práticas, que, mais tarde, serão o garante de uma natural consonância com as exigências do mercado de trabalho do sector. A evolução, tida como «uma agradável surpresa», fez deste «um projecto de sucesso» com «grande aceitação por parte do mercado». O presidente da ENIDH deixou ainda elogios a Carlos Vasconcelos, considerando-o o «grande entusiasta da iniciativa». Seguiu-se a intervenção de Fernando Cruz Gonçalves - o coordenador do curso da Academia MSC começou por realçar o sucesso da iniciativa, considerando fundamental o contínuo interesse demonstrado pelos formandos. «Existe um tópico chave, que é a literacia e a mudança de paradigma de abordagem do Mar por parte das gentes mais jovens», afirmou, relacionando a importância da componente formativa com a transformação da mentalidade dos futuros profissionais do sector.

O dom da palavra passou, depois, para Manuela Baptista, também ela peça fundamental na coordenação do curso. Manuela Baptista realçou a componente prática da Academia MSC e as «visitas ao Porto de Sines e ao Terminal da Bobadela», não deixando de enfatizar o «corpo docente muito heterogéneo», factor capaz de acrescentar valor à formação. Com uma taxa de assiduidade «acima dos 80%» e uma taxa de empregabilidade «que ronda os 90% nos dois primeiros anos», é fácil depreender das palavras de Manuela Baptista que a iniciativa confirmou o sucesso que havia encetado nos dois primeiros anos. Carlos Vasconcelos enfatizou sinergia «entre empresa e academia» A intervenção final pertenceu a Carlos Vasconcelos, que denotou o «enorme orgulho com que a MSC coopera neste projecto», não escondendo a sua «satisfação pessoal» pela consolidação da iniciativa. «Desejamos que se prolongue por muitas edições mais», declarou, elogiando o cruzamento conceptual e prático «entre a empresa e a academia», residindo, nessa intersecção, «o segredo do aproveitamento dos novos profissionais».

Cruz Gonçalves: «Era preciso reformular a forma de captar talentos e a MSC faz isso como ninguém»

Terceira edição prolonga sucessão de êxitos e reforça elevada taxa de empregabilidade

Para Fernando Cruz Gonçalves, o sector atravessa uma época de metamorfoses causadas pela digitalização e pelas novas tecnologias da informação, obrigando «os empregadores a buscarem novas formas de captar talento para o sector». «A MSC consegue fidelizar os mais jovens através deste modelo», comentou, apelidando Carlos Vasconcelos de «visionário». «Era preciso reformular a forma de captar talentos e a MSC faz isso como ninguém», atirou. Abordando «projectos futuros» dentro do contexto da Academia MSC - que considerou ser já «um modelo hegemónico» - Cruz Gonçalves adiantou que existe o desejo «de replicar, no Porto, o modelo de Lisboa», lembrando que a iniciativa ligou-se ao Porto da Praia da Vitória, com o intuito de «cativar o operador portuário a investir no porto» açoriano - um sinal de que o projecto de formação é já uma referência apelativa em todo o país. No ar foi ainda deixada a ambição de apostar, no futuro, nos intercâmbios de alunos e professores provenientes do Panamá. «Das três edições, este foi o curso academicamente mais forte», finalizou, em jeito de balanço.

Esta terceira edição veio corroborar e reforçar o sucesso da aposta de formação que uniu a MSC e a ENIDH em torno da criação de um elo de ligação crucial entre o mercado de trabalho e a tipologia do ensino – uma ligação que se pretende harmoniosa e que, naturalmente, transformará ambas as esferas numa intersecção de valores profícua. Tanto para os formandos como para as empresas. A taxa de empregabilidade deste curso mantém-se na ordem dos 90% (recorde-se que o ano inaugural pautou-se imediatamente pelo sucesso neste capítulo). Em Junho de 2017, a segunda edição do Curso de Especialização em Shipping and Logistics Management prolongou o sucesso da antecessora: à data, noticiava a Revista Cargo que 27 dos 29 inscritos terminaram o Curso, com uma média global de 15 valores. Marco Vale, Managing Director da MSC Portugal, deixou, na sessão de encerramento da segunda edição, palavras muito elogiosas para o «extraordinário trabalho do corpo docente da ENIDH e dos docentes convidados», frisando mais uma vez a elevadíssima taxa de empregabilidade: «Estes números fazem com que os alunos sintam que no fim do curso o sector os recebe e reconhece a sua valia», tal a facilidade com que o mercado «absorve» quem completa o Curso.

Manuela Baptista realçou virtudes do projecto, traduzidas em números bem expressivos

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OPINIÃO

SUSTENTABILIDADE E RESILIÊNCIA PORTUÁRIA

José Augusto Felício José Augusto Felício é Doutorado em Gestão no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Na mesma instituição, é hoje professor e Presidente do Centro de Estudos de Gestão. É ainda investigador nas áreas de gestão empresarial e gestão portuária e tem várias obras e textos publicados nesses âmbitos.

Resumo Sustentabilidade e resiliência são dois conceitos interligados. A sustentabilidade observa-se do ponto de vista económico, social e ambiental, neste caso, centrada no porto e no sistema portuário. A resiliência é condição relevante, em geral pouco debatida, mas muito importante e tem a ver com a memória dos sistemas, pouco compreendida. Pretendeu-se fazer uma breve reflexão e, desta forma, contribuir para que os portos e os sistemas portuários assegurem melhores condições de desenvolvimento, dada a sua importância. 1.Enquadramento Porto associa-se a infraestruturas de operação portuária com os seus terminais e espaços logísticos onde circulam e estacionam cargas e mercadorias. A sua funcionalidade depende de múltiplos agentes que intervêm no processo de controlo e gestão dessas cargas e mercadorias e das relações com os carregadores, armadores e outros operadores. A autoridade portuária encabeça o sistema de governação portuária, constituído pelo porto, agentes e operadores e outros membros que formam a comunidade portuária. O comum do cidadão quando se refere ao porto foca-se em geral nos terminais, no espaço que lhe está adstrito e nos equipamentos de operação, diferentemente dos carregadores e outros profissionais que se referem ao sistema portuário. No essencial, o que importa são os serviços prestados à carga ou mercadoria e ao navio e para o realizar há múltiplos agentes e operadores que intervêm para que seja possível prestar o serviço, num compósito algo complexo. A gestão portuária é portadora de elevada complexidade. Porto e portuário são conceitos distintos. A questão a abordar centra outros distintos conceitos o de sustentabilidade e o de resiliência portuária. Trata-se de compreender que a qualidade do serviço portuário alarga a outras exigências que no passado ainda recente não era verdadeiramente considerado, mas que hoje se tornou uma exigência o da sustentabilidade económica, social e ambiental. Destacam-se as questões ambientais, porém, a sustentabilidade económica é fundamental para que o conjunto das exigências sociais e ambientais possam ser satisfeitas. Não é concebível que um porto e o sistema portuário que o integra não assegure a sua sustentabilidade económica, da mesma forma que, actualmente, não é plausível falar de portos sem contemplar a componente de salvaguarda dos equilíbrios ambientais e ecológicos. A par destes equilíbrios reclamam, também, os equilíbrios sociais. A grande maioria dos portos, além disso, integram-se numa comunidade urbana ou num aglomerado urbano com as naturais pressões dos cidadão e daas cidades.

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A relação entre porto e cidade é fundamental e está no centro de muitas preocupações sociais. Neste particular, é diferente se o conceito se identifica com a cidade-porto ou se com o porto-cidade. Isto, porque há aglomerações urbanas que são independentes do porto e neste particular este tipo de infraestrutura passou a ser um obstáculo, ao passo que outras cidades dependem e desenvolvem-se em função do seu porto. Logo, as questões da sustentabilidade económica, socia, e ambiental, deve contemplar estas diferenças. Neste caso, pretende-se reflectir sobre a sustentabilidade nas suas diversas perspectivas. A resiliência não é propriamente o que se aborda quando se tata de estudar portos ou o sistema portuário. No entanto, é muito relevante compreender este conceito, para avaliar as consequências dos efeitos de entropia nos sistemas, associados a um relambório de decisões de investimentos disfuncionais e decisões de gestão da actividade, às quais portos e sistemas portuários resistem. Tantas vezes refere-se que foi tomada determinada decisão que a comunidade entende incorrecta. Desde logo, essa comunidade tem a noção dos efeitos negativos que irão ocorrer, que a todos prejudica, num ciclo económico mais ou menos longo. Ao mesmo tempo, induzem que mais tarde ou mais cedo essas decisões deverão ser corrigidas, com maior ou menor esforço, obrigando, em qualquer dos casos, os agentes, operadores e a comunidade a adaptar-se com as devidas consequências económicas, sociais e ambientais. Trata-se da resiliência reconhecida aos sistemas para resistirem a arbitrariedades, capacidade essa da qual emerge energia para evitar ou adequar processos que evitem a sua destruição ou o registo de danos maiores. Todos os sistemas, de uma forma ou de outra, em função da sua cultura, detêm independência e são portadores de personalidade própria que está muito para além dos seus agentes e operadores e, nomeadamente, dos seus decisores. Este é um tema não reflectido, mas que ganha crescentemente importância e ao qual se associa este conceito de resiliência dos sistemas, neste caso dos sistemas portuários.

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É muito pertinente compreender razões por que a sustentabilidade e a resiliência cada vez mais são associadas pelos profissionais e avaliar o tipo de interligações. A sustentabilidade como conceito envolve condições para que sejam asseguradas condições de harmonia que preservem o desenvolvimento, tendo em conta o complexo de interesses em disputa. Por sua vez, a resiliência como conceito envolve atributos que confluem em polos de resistência face a arbitrariedades ou disfunções, na perspectiva de que os sistemas tendem naturalmente a preservar-se na busca das melhores condições para o desenvolvimento. É aqui que entram naturalmente os conceitos de entropia e de energia. A abordagem integrada destes conceitos é muito interessante e falta realizar. Tenhase, em atenção, que as entidades orgânicas são sistemas vivos com personalidade. Trata-se de fazer esta abordagem aos portos e aos sistemas portuários. 2.Sustentabilidade A sustentabilidade compreende interesses ambientais, económicos e sociais, daqui resultando um conceito complexo. O desenvolvimento social e económico pressiona o meio ambiente desencadeando mudanças no seu estado e na disponibilidade dos recursos, com impactos nos ecossistemas e nos recursos físicos, conducentes a provocar uma resposta social. Por outro lado, o desenvolvimento sustentável refere-se à aptidão para assegurar condições de resiliência aos diversos tipos de stress e choques. Porém, a sustentabilidade delimita a relação entre a natureza e a sociedade, envolvendo todas as instâncias de governação, na perspectiva de ciclo longo. Reportase, neste caso, à dinâmica das atividades económicas e atitudes humanas, capacitadas para garantir a disponibilidade de recursos e a renovação dos ecossistemas e respectiva produtividade, com vista a assegurar e a manter um nível de vida aceitável por período longo (Mori & Christodoulou, 2012). Compreende-se, então, estarem as relações entre o sistema humano e o sistema ambiental insuficientemente compreendidas e serem difíceis de agrupar, o que exige informação política clara e específica sobre as forças dominantes, as pressões ambientais, o estado do meio ambiente, os impactos de alterações na qualidade ambiental e a resposta da sociedade a estas mudanças no ambiente. Os portos são plataformas de circulação de fluxos de materiais e

de energia (Cerceau et al., 2014), constituindo um nó logístico que desempenha papel importante na gestão e coordenação de fluxos de materiais e de informação (Martino, 2003). No seu desenvolvimento promovem condições, nas mais variadas áreas, para a instalação de indústrias relacionadas nas imediações. Na gestão portuária sustentável de portos de pequena dimensão a colaboração com portos de maior dimensão e mais desenvolvidos ganha importância ao permitir identificar as suas práticas de gestão sustentáveis e aprender e, também, por não disporem de conhecimento técnico e recursos suficientes. Estes portos menores desempenham importante papel para a região e no apoio comercial aos portos maiores. Isto revela a necessidade de contratar especialistas capazes de avaliar o potencial impacto das suas operações sobre a sustentabilidade do porto e consequentemente sobre a cidade (Kuznetsov et al., 2015). Ganha importância a interligação entre o porto e a cidade, desenvolvendo-se o conceito de cidade portuária. Cidade portuária refere-se à concentração urbana localizada próxima de um porto, dependente das funções portuárias, logísticas e outras (Ducruet, 2006). Ou seja, refere-se à cidade adjacente a um porto dependente das suas funções diretas ou indiretas. A expansão do porto resulta em maior exposição das cidades a problemas ambientais (Lee, Yeo, & Thai, 2014). Verifica-se, no caso de cidades portuárias de pequena dimensão www.revistacargo.pt

que a sustentabilidade ambiental se constitui como oportunidade para novos projetos e contribui para a melhoria da qualidade do ambiente. Estes crescentes problemas ambientais, resultantes das atividades portuárias e da expansão urbana envolvente, desafiam em geral práticas de gestão ambiental nestas áreas e promovem a adoção de estratégias de avaliação e promoção da sustentabilidade (Doust, 2014). Há a clara noção de que as atividades portuárias contribuem significativamente para o desenvolvimento económico das cidades e territórios envolventes. No entanto, não se devem negligenciar os crescentes problemas ambientais resultantes por suscitarem crescentes preocupações sobre a proteção do ambiente nas zonas portuárias, das quais resultam muitas vezes diversos projetos de colaboração porto-cidade, em busca do aproveitamento de sinergias, com efeitos para a promoção de uma imagem positiva do porto perante os cidadãos (Puig et al., 2015). A realidade apresenta em vários casos que o porto e a cidade conflituam, devido ao facto de o crescimento dos portos provocar alterações no território, com impactes económicos e ambientais negativos ao afectarem, nomeadamente, a qualidade do ar e da água e promoverem o ruído e o aumento do tráfego. No entanto, as cidades portuárias aproveitam e influenciam positivamente os respectivos portos. A diversidade 19


das relações porto-cidade determina-se em função do peso relativo do porto na cidade, da localização e organização espacial do porto e da contribuição para o desenvolvimento da cidade (Merk & Dang, 2013). É bem claro, em muitas experiências pelo mundo fora que as cidades aproveitam do progresso técnico e formam redes de sistemas complexos, cada vez mais integradas e interdependentes ao nível global, crescentemente dotadas para a prestação de serviços avançados (Hall, 2000). Não obstante, os cidadãos exigem cada vez mais espaço dentro da cidade, em conflito com as necessidades do porto que tudo fazendo, em muitos casos, para expulsar outros agentes que queiram e/ou necessitem do mesmo ou igual espaço. Em consequência, a pressão nas cidades leva ao aparecimento de novos centros urbanos nas periferias com forte caráter terciário. Em suma, fica claro que o objetivo da sustentabilidade num processo de desenvolvimento relaciona-se com a criação e manutenção de prosperidade nos sistemas social, económico e ecológico. Neste caso, a sustentabilidade dos portos exige a gestão de factores, em alguns casos contraditórios, mas sempre na perspectiva do desenvolvimento. 3.Resiliência Resiliência é a capacidade de um sistema absorver perturbações externas e, mesmo assim, manter as suas propriedades essenciais, incluindo serviços ecossistémicos essenciais para o bem-estar humano. A resiliência deriva da capacidade dos sistemas resistirem a distúrbios ambientais sociais e económicos, e desta forma alargarem as oportunidades de progresso e alargamento das escalas temporais e espaciais, em que ambas se devem manifestar, (Mori & Christodoulou, 2012). Trata-se de um conceito muito mais dinâmico do que a sustentabilidade porque, em vez de tentar definir algum nível máximo de perturbação que não pode ser ultrapassado, centra o seu foco na capacidade de mudança (Buschbacher, 2014). Enquanto estes sistemas são muitas vezes manuseados para maximizar um número limitado de recursos, baseados em premissas com funções de produção lineares, a abordagem de resiliência procura informar a gestão para a capacidade que os sistemas têm de aprender, se auto-organizar e se adaptar em face de mudanças imprevisíveis e não lineares. A resiliência contribui para a capacidade adaptativa dos sistemas socio-ecológicos (Folke, 2006). Reconhecem-se como aspectos-chave da resiliência a incorporação da sociedade humana em sistemas socio-ecológicos com fortes conexões entre processos sociais, econômicos, políticos e outros e os processos biofísicos, por exemplo, o clima, rios e outros. Estes processos interagem em múltiplas escalas, do local ao global. Quando os sistemas não têm capacidade para assegurar o desenvolvimento tornam-se insustentáveis e não resilientes. Podem, no entanto, responder bem a curto prazo. Há uma sustentabilidade frágil e uma sustentabilidade robusta que decorrem do facto de se associar à primeira a preservação da produtividade combinada na dimensão ambiental, social e económica e à segunda associar a permanência de funções ambientais específicas independentemente da sua relação com a procura da atividade económica ou dos limites ecológicos para o crescimento. O paradigma da resiliência evolutiva baseia-se na capacidade para reabilitar condições para a sustentabilidade. A resiliência direciona-se para perceber a capacidade de resposta face a crises naturais e tecnológicas, tendo sempre subjacente o regresso à posição de equilíbrio. Observa-se no efeito do tipo mola que distende e normaliza, consoante a tensão a que está sujeita. A resiliência decorre de medidas capazes de 20

reduzir os estragos, em crises futuras. Planear para a resiliência implica não apenas sustentar capacidades ou opções de desenvolvimento como, também, assegurar condições de segurança ambiental, social e económica (Folke et al., 2002). Há três aspetos importantes quando se perspetiva a resiliência no contexto do desenvolvimento sustentável (Folke et al., 2002): i) enfatizam as interconexões entre a biosfera e o nível de desenvolvimento das sociedades; ii) destacam a necessidade de ampliar a flexibilidade e a criação de plataformas colaborativas para a gestão dos sistemas sociais e ecológicos com instituições receptivas a integrar a aprendizagem e a criar capacidade adaptativa; iii) detetam mudanças graduais e sinais precoces de perdas de resiliência, posicionando-as no panorama geral onde se observem os limiares de funcionamento dos sistemas. Ganhos de resiliência consolidam a probabilidade de sustentar um percurso de desenvolvimento sustentável num quadro de estruturas ambientais e sociais em mudança, dominadas pela imprevisibilidade, quanto às opções de futuro. Sistemas territoriais resilientes congregam componentes biofísicas e outras socioeconómicas, em configurações que lhes permitam, cumulativamente, sobreviver, adaptar-se e progredir, mesmo em cenários de incerteza e de disrupção, cuja natureza e extensão se desconheçam (Fiksel, 2006). Observou-se o conceito de resiliência em geral, mas facilmente se compreende a sua importância na perspectiva dos portos e dos sistemas portuários, tudo o que envolve a complexa comunidade portuária, a relação do porto com a cidade e os naturais conflitos de interesse de quem necessita de assegurar condições de equilíbrio económico, social e ambiental, diferentemente do comum dos cidadãos que deverão ser educados para uma cultura de harmonia entre as actividades e o lazer muitas vezes associado às linhas de água e respectivas actividades náuticas, por exemplo. 4.Sustentabilidade e resiliência Sustentabilidade e resiliência surgem, lado a lado, na gestão de riscos e na identificação de vulnerabilidades, sejam elas, ambientais, sociais ou económicas. Está em

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económica, social e ambiental e exigem capacidade de resiliência para projectar um futuro de desenvolvimento, sempre sujeito a contradições e contrariedades que deverão minimizar. A resiliência é uma fórmula, que antes do mais exige conhecimento. 5. Conclusões A primeira noção a reflectir centra-se na necessidade de compreender o porto, na sua complexidade, com infraestrutura, superestrutura e supraestrutura que garante operações e serviços centrados no navio e no armador. Uma segunda noção refere-se a compreender o sistema portuário que integra o próprio porto, os agentes e operadores que cada uma em particular desenvolve a sua actividade confluente com o serviço prestado baseado no porto, a autoridade portuária e a comunidade portuária, em geral.

jogo a capacidade para lidar com situações críticas, nomeadamente, catástrofes, crises ou outras. No ciclo de vida dos sistemas é importante a relação entre sustentabilidade e resiliência para o funcionamento das estruturas económicas e empresariais Fiksel, (2003). Tradicionalmente, os sistemas procuram antecipar e resistir às disrupções, não evitando a condição de vulnerabilidade face a fatores imprevistos. A alternativa consiste em desenhar sistemas que internalizam resiliência, capitalizando a diversidade, eficiência, adaptabilidade e coesão, uma vez que o trabalho desenvolvido no campo da sustentabilidade se deslocou maioritariamente para o incremento da eficiência ecológica. O paradigma da resiliência é alternativo para se reequacionar e reabilitar a sustentabilidade. A adaptabilidade e a resiliência promovem a sustentabilidade. Uma característica fundamental dos sistemas complexos reside no seu potencial de mudança imprevista e rápida, o que frequentemente resulta de processos de feedback positivo. Construir resiliência para a sustentabilidade nos sistemas socioecológicos, exige, primeiramente, que se clarifique a relação homem e natureza e de seguida que se identifique como assegurar a sustentabilidade e porquê (Folke et al., 2002). A relação entre resiliência e sustentabilidade pode compreender-se orientada para a mitigação, para a recuperação e para averiguar fatores estruturais

e cognitivos (Tobin, 1999). As comunidades resilientes e sustentáveis, deste ponto de vista, estão estruturalmente organizadas para minimizar os efeitos dos desastres e, em simultâneo, apresentam competências para restabelecer a vitalidade socioeconómica. A ligação entre resiliência e sustentabilidade ganha peso nos processos de desenvolvimento, que conduz para o campo dos sistemas adaptativos complexos. Conjugam-se aqui, por um lado, a resiliência como normativo para a sustentabilidade e, por outro, a resiliência como objectivo que que sejam alcançadas as metas num quadro dinâmico de interacção exigente, diferentemente da sustentabilidade instrumental baseada numa certa rigidez (Pinho et al., 2008). Neste caso, a sustentabilidade, entendida como desígnio civilizacional, é reabilitada pelo referencial da resiliência evolutiva. Construir condições de resiliência nos sistemas exige que se planeie um futuro incerto e que se capacitem as comunidades para acompanhar o movimento da onda, em vez de serem arrastadas para o turbilhão que se forma no seu interior (Gross, 2008). O porto e os sistemas portuários exigem assegurar condições de sustentabilidade. Porém, estas entidades estão sujeitas a pressões enormes, sejam elas provenientes de outras organizações privadas ou públicas ou dos cidadãos, através da componente política da relação porto-cidade, de natureza www.revistacargo.pt

A questão da sustentabilidade do porto e do sistema portuário é tema muito debatido, mas, ainda, muito exigente. Impõe condições que envolvem todos os agentes, operadores e outras entidades para que a qualidade do serviço portuário seja assegurada, com salvaguarda da harmonia e viabilidade económica, social e ambiental, o que envolve múltiplas actividades que se complementam. A problemática da relação do porto com a cidade está presente e muitas das pressões exercidas derivam da sustentabilidade ambiental que, em alguns casos impõe condições com efeitos ao nível económico e que são da maior importância. Daí, a mais valia em reflectir sobre a sustentabilidade. A referência á resiliência acaba por ser um atributo adicional e diverso que em muito se relaciona com a sustentabilidade, mas diferente. A resistência que os operadores e agentes e outras entidades opõem a muitas das decisões tem consequências que vale a pena observar do ponto do porto e do sistema portuário como entidade de elevada complexidade. É, de alguma forma, o que se pretendeu apresentar, na perspectiva de que os sistemas têm vida própria e personalidade, que memorizam experiências expressas no conceito de resiliência. Nota: Referências serão dadas a pedido

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SHIPPING WEEK: ENTRE SETEMBRO E OUTUBRO, TODOS OS CAMINHOS VÃO DAR A PORTUGAL Decorreu, no passado dia 26 de Junho, a apresentação oficial dos quatro grandes eventos internacionais que terão como palco a capital portuguesa - na Gare Marítima de Alcântara, a Ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, acompanhada pela assessora Isabel Moura Ramos, pela presidente do conselho de administração da APL, Lídia Sequeira, pelo Director Geral de Política do Mar, Rúben Eiras e pelo presidente da Shipping Innovation, Llewellyn Bankes-Hughes, levantou o véu sobre as novidades que darão corpo, entre os meses de Setembro e Outubro, às temáticas aprofundadas pelo Portugal Shipping Week, pelo Seatrade Cruise Med, pelo Oceans Meeting 2018 e pelo BioMarine Business Convention. Bankes-Hughes abriu a apresentação: «Esta é a altura ideal para colocar Portugal e o shipping no mapa» A intervenção inaugural, em jeito de análise panorâmica, ficou a cargo de Llewellyn Bankes-Hughes - o presidente da Shipping Innovation enquadrou a vinda do evento para Portugal em 2018, afirmando que esta «é a altura ideal para colocar Portugal e também o shipping no mapa». Admitindo ser «uma grande herança», BankesHughes descreveu a onda de eventos internacionais do próximo Outono como catalisadora de «grandes mudanças» na Economia do Mar: «temos de trabalhar em conjunto para levar a cabo este grande esforço», declarou, caracterizando o Portugal Shipping Week como um «evento global que alberga várias atracções», capaz de reunir variados segmentos, desde o transporte contentorizado, aos granéis, passando pela indústria do GNL e pelo contributo das sociedades classificadoras. O evento, descrito há dias pela Ministra do Mar como um meio de «colocar Portugal na agenda internacional dos armadores, operadores e investidores de hoje», será este ano realizado em Lisboa, depois de ter nas importantes cidades de Bruxelas e Londres os seus habituais locais de eleição - Llewellyn Bankes-Hughes realçou a capacidade de Lisboa desempenhar o papel de anfitriã do evento, afirmando que «estão reunidas todas as condições» para que a capital torne o Shipping Week num sucesso garantido, «voltando a colocar Portugal no mapa», ao mostrar ao mundo 22

as empresas líderes do sector marítimo português - será realizada uma viagem ao Porto de Sines, que contempla visitas «à refinaria, ao terminal de GNL e ao terminal de contentores» e ainda a oportunidade de entrar a bordo de navios, revelou. À boleia do Seatrade Cruise Med, Lídia Sequeira abordou sucesso lisboeta: «2018 será o melhor ano de sempre no Porto de Lisboa nos cruzeiros» Findada a apresentação de Llewellyn Bankes-Hughes, seguiu-se a intervenção de Lídia Sequeira, focada no evento Seatrade Cruise Med, e, naturalmente, no papel de charneira que o Porto de Lisboa desempenha neste segmento - antecipando o «sucesso» do evento, garantiu que «é com muito prazer que a APL se associa a eventos tão relevantes para Portugal e para a Economia do Mar» e caracterizou o Seatrade Cruise Med como «uma das maiores feiras do mundo», cuja presença em Lisboa «confirma o carácter internacional de Portugal». Para a líder do conselho de administração da APL, a capital «será a casa dos grandes decisores» do sector marítimo e oferecerá «uma oportunidade única para as empresas portuguesas mostrarem o que têm para oferecer». «Apenas em conjunto poderemos construir os níveis de sucesso que todos pretendemos», afirmou ainda, deixando claro que «os portos e as cidades têm que encontrar soluções partilhadas de crescimento». A parte final do discurso de Lídia Sequeira enalteceu os números do Porto de Lisboa no passado recente e augurou um futuro promissor para o turismo lisboeta, cada vez mais internacional e massificado: «o ano de 2018 será o melhor de sempre no Porto de Lisboa no segmento dos cruzeiros, com 350 escalas», acrescentou. BioMarine Business «reunirá mais de 300 CEO’s» ligados às Ciências da Vida, adiantou Rúben Eiras A cargo de Rúben Eiras ficou a explanação do evento BioMarine Business Convention, realizado em Cascais - o Director Geral da DGPM deu conta que o acontecimento «reunirá mais de 300 CEO’s» ligados ao sector das Ciências da Vida e da Biotecnologia e contará com vários workshops sobre Inovação, reuniões B2B, pitch sessions, áreas de exposição e excelentes www.revistacargo.pt

oportunidades de networking. Isabel Moura Ramos tomou a palavra de seguida, para introduzir o Oceans Meeting 2018: o evento será «o culminar de uma grande semana», contando com 18 países participantes e sendo, «mais que um evento, o momento em que Portugal se afirma em matéria de oceanos». Oceans Meeting 2018: o momento de afirmação de Portugal «em matéria de oceanos» Será composto por uma conferência internacional, que versará sobre os paradigmas do Green Shipping, dos Port Tech Clusters e da Economia Azul Circular, e por uma reunião ministerial, que servirá para reflectir sobre os cenários em cima da mesa e gerar consensos sobre as medidas a tomar, com o intuito de colocar em prática políticas capazes de materializar os desígnios obtidos pela convenção. Como explicitou Isabel Moura Ramos, serão «discutidas oportunidades de negócio e crescimento sustentável» no âmbito da Economia Azul Circular, com foco no Green Shipping e na sua «linha revolucionária» que «deve ser acompanhada por Portugal» rumo a um «desenvolvimento mais sustentável», no qual os portos passam a desempenhar funções essenciais no contexto de uma economia circular preocupada com a integridade dos oceanos. Economia circular: «um pilar das próximas décadas», assinalou Ana Paula Vitorino A derradeira intervenção, centrada na importância dos oceanos, na preservação dos ecossistemas marinhos e no fomento da Economia Azul, coube a Ana Paula Vitorino. A tónica das palavras da Ministra do Mar acentuou o carácter indispensável de futuros projectos de sustentabilidade, orientados, em seus fundamentos, para a sensibilização da crucialidade dos oceanos, não só na qualidade de vida como também na prospecção de novas estruturas de negócio capazes de potenciar o estabelecimento de uma economia circular, de acrescentar valor ao sector marítimo e de eliminar o ciclo, até aqui imparável, da produção de lixo acumulado. «Temos de evitar o lixo, e, por isso, a economia circular tem de ser um pilar das próximas décadas», assinalou.


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BREVES MARÍTIMO

Eis o MSC Eloane: o maior porta-contentores «alguma vez recebido no Porto de Sines» O porta-contentores MSC Eloane escalou o Porto de Sines e a notícia faz-se a si própria, ou não fosse o navio, com uma capacidade de 19.472 TEU, um dos maiores do mundo. O Terminal de Contentores de Sines recebeu a escala do MSC Eloane que, informou a APS, introduz o serviço regular ‘SILK’.

Operado pela aliança 2M (composta pela Maersk Line e MSC), o serviço regular ‘SILK’ faz a conexão semanal entre o Porto de Sines e o Extremo Oriente (Tanjung Pelepas, Shanghai, Tianjin Xingang, Gwangyang, Ningbo, Yantian) aos portos do norte da Europa. «MSC Eloane é o maior porta-contentores alguma vez recebido no Porto de Sines», revela a APS

mento fora-a-fora, 59 metros de boca e 16 metros de calado. Nesta primeira escala, o MSC Eloane movimentará 3.387 contentores, tendo como próximo destino o porto alemão de Bremerhaven». Recorde dos sister ships MSC Zoe e Oliver quebrado Até agora o recorde pertencia aos “sister ships MSC Zoe e MSC Oliver, ambos com 19.224 TEU de capacidade, que em 2014 e 2016, respectivamente, escalaram o Porto de Sines pela primeira vez. «Fundos adequados e condições opera-

cionais de excelência continuam a colocar o Porto de Sines na rota dos grandes navios», acrescentou esta tarde, via comunicado, a APS.

De acordo com a APS, «o MSC Eloane é o maior porta-contentores alguma vez recebido no Porto de Sines, comportando 23 fiadas de contentores a bordo, com 400 metros de compri-

Criada Agência Marítimos Manning Portugal na Madeira para captar marítimos portugueses A SDM anunciou ter sido criada uma agência de manning (dedicada ao recrutamento de tripulantes) no Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) no âmbito do Registo Internacional de Navios da Madeira (MAR). O objectivo é o de atrair e captar novos marinheiros formados em Portugal, preenchendo-se assim postos de trabalho a bordo da marinha mercante com pavilhão português. Projecto Marítimos Manning Portugal reflecte «contributo do MAR para o cluster do shipping» nacional, diz a SDM No entender da Sociedade de Desenvolvimento da Madeira (SDM), este projecto, intitulado ‘Marítimos Manning Portugal’ (MMP)’, afigura-se «um exemplo que mostra o contributo do MAR para o cluster do shipping no país», enfatizando a «capacidade de manter e criar emprego para marinheiros portu-

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gueses, quer em alto mar, quer em terra nas empresas de serviços que suportam as actividades dos navios registados». O projecto, com faceta inovadora, terá como líder Carla Vieira e pretende fomentar o aumento do número de cidadãos portugueses entre as tripulações dos navios registados no MAR, conforme foi anunciado durante uma apresentação recente na Escola Náutica Infante D. Henrique (ENIDH). A MMP focar-se-á na aposta em tecnologias de ponta para conectar os armadores aos candidatos a tripulantes. Portugal deve «aproveitar» potencial do MAR de «porta de entrada em Portugal para armadores internacionais» «Em breve teremos o software pronto, pelo que poderemos começar já a trabalhar com os jovens que se graduarem este Verão na ENIDH», declarou Carla Vieira, citada pela www.revistacargo.pt

SDM. «Os promotores deste projecto acreditam firmemente na qualidade da formação em Portugal e na qualidade e capacidade dos marítimos portugueses para se adaptarem aos novos tempos da globalização na área do shipping», afirmou Carla Vieira, que realçou ainda ser essencial «aproveitar o facto do MAR ser uma porta de entrada em Portugal para armadores internacionais». Citada pela SDM, Carla Vieira declarou ainda que, o sustentáculo desta aposta é «a crença em Portugal e na Região como espaços de desenvolvimento da indústria do shipping» e a «capacidade dos marítimos portugueses». A rematar, a líder do projecto deixou uma frase marcante que vincou a esperança e a ambição com que será encarado este desafio: «Podemos, de facto, voltar ao mar, se quisermos. A base existe. Resta-nos desenvolvê-la».



OPINIÃO OS MODELOS DE GOVERNAÇÃO PORTUÁRIA A diversidade de modelos de governação portuária no mundo, em diferentes continentes e, por vezes, dentro do mesmo país, com origens históricas e políticas e desempenhos diversos, tem despertado o interesse de pesquisadores. A crescente importância do transporte marítimo nas economias globais e locais e as tendências da indústria portuária em direção às concessões de terminais levaram a uma redefinição do papel da autoridade portuária. A autoridade portuária assumiu um papel cada vez mais empreendedor, com maior autonomia devolution - e ampliação do foco para a cadeia logística e conectividade do interior – regionalization. A governação portuária é dividida em (a) governação portuária e (b) governação de autoridade portuária. No primeiro caso, a governação portuária abrange a forma como os serviços e terminais são geridos e sua relação com o porto; no segundo caso, refere-se à governação interna da autoridade portuária e sua relação com o governo e agências externas. A autoridade portuária é um órgão com responsabilidades estatutárias que gere o domínio marítimo e terrestre do porto, independentemente de sua propriedade e da respetiva natureza. A literatura destaca uma maior integração dos operadores de portos e terminais privados nas cadeias produtivas e de abastecimento e com a extensão geográfica da ação dos portos. A evolução do modelo de governação portuária, incluindo tendências como políticas de “devolution” e regionalização, tem aumentado a autonomia e responsabilidade da autoridade portuária, dando-lhes um papel mais amplo além do próprio porto. As características do modelo de governação portuária devem garantir eficiência e efetividade como condutores para a satisfação de clientes e usuários portuários, com custos reduzidos e serviços de alta qualidade. A literatura tem apontado para a necessidade de reformar os modelos de governação para garantir melhor desempenho portuário, especialmente em relação a: (a) criação de condições para o desenvolvimento económico, (b) 26

garantir eficiência por meio de satisfação e diferenciação necessidades da cadeia de suprimentos, e (c) promover o crescimento eficiente e produtivo da atividade portuária. As leis nacionais e legislação portuária específica têm influência direta no processo decisório sobre os mecanismos do modelo de governação portuária em cada país e sua evolução. A política nacional tem influência nos portos e nas decisões sobre o modelo de governação portuária. No caso da Itália, a política nacional tem uma influência especial sobre o modelo de autoridades portuárias regionalizadas que está a ser desenvolvido, contrariando tendências de maior autonomia e devolução local. No caso dos Países Baixos e da Bélgica, apesar das diferentes legislações nacionais para cada país, o modelo político municipal comum implica sistemas locais e autónomos de governação. A política portuária tem, portanto, um impacto especial nas escolhas e decisões políticas em todos os países. Na Holanda, a política empresarial orientada para o porto, com preocupações ambientais, levou ao desenvolvimento de um modelo de autoridade portuária como uma empresa de desenvolvimento portuário, que prospeta e investe em novos nichos de negócios. As mudanças técnicas e económicas globais têm determinado as características e decisões sobre o modelo de governação portuária, como é o caso da China, onde a desaceleração do crescimento económico e a recente estratégia da nova rota da seda (OBOR - One Belt, One Road) determinou um modelo de cooperação entre autoridades portuárias em um contexto de gestão flexível voltada para grandes investimentos, qualidade de serviço e expansão global. Os contextos de cidades e regiões determinam a governação portuária, como no caso da Bélgica e da Holanda, ou o caso do novo modelo de governação na Itália. Em Espanha, as regiões autónomas têm uma forte influência no modelo de gestão de cada porto, mas isso também é condicionado por instrumentos criados por Madrid para controlar a gestão de forma centralizada www.revistacargo.pt

Vítor Caldeirinha Vítor Caldeirinha é Doutorado em Gestão Portuária e Mestre em Gestão/MBA, sendo hoje professor de Gestão e Estratégia Portuária no Instituto Superior de Economia e Gestão - ISEG (UTL). através da agência governamental Puertos del Estado. Atores privados nos portos também determinam as escolhas do modelo de governação portuária. Os portos franceses têm forte proximidade local com os utilizadores do porto e nos portos turcos, as empresas privadas possuem espaços dentro das áreas de jurisdição dos portos condicionando sua gestão. Nos portos britânicos e australianos, as empresas privadas influenciam o modelo de governação dos portos baseado em empresas privadas. A dimensão do mercado também desempenha um papel no modelo de governação portuária, como os portos insulares como Chipre, onde as questões da dimensão da procura local implicam autoridades portuárias orientadas para as oportunidades internacionais de transbordo em Limassol. Também no Canadá e na França, onde os portos são divididos em diferentes modelos de governação, mais nacionais ou locais, de acordo com a dimensão. Decisões sobre o modelo de governação portuária podem ser tomadas por diversos stakeholders sob influência de fatores ambientais externos. Por exemplo, na Europa, os modelos de governação são subdivididos em tipo hanseático, com governação local, tipo latino, com uma governação mais central, e tipo anglo-saxônica, com gestão independente de governação, mas no resto do mundo existem muitos outros modelos e subtipos. E até misturam decisões de diferentes tipos, dependendo do país em concreto e do momento do tempo. Uma das principais variáveis de governação do porto está associada ao tipo de autoridade, as suas principais funções e relacionamento com os operadores. Neste caso, os portos são tradicionalmente divididos em (a) Porto de serviço, (b) Porto instrumental, (c) Porto do senhorio e (d) Porto privatizado (Banco Mundial, 2007). A maioria dos portos adotou estratégias de Porto senhorio (Landlord), embora alguns portos das caraíbas, especialmente em ilhas menores, e a Macaronésia (os arquipélagos dos Açores ou Cabo Verde, por exemplo) ou a África do Sul tenham adotado o modelo


de Porto de Serviços (Service Port). O modelo Tool Port ainda prevalece em alguns casos particulares, como no caso da ilha da Madeira ou do porto de Aveiro, em Portugal. No entanto, em muitos países, existe uma mistura desses modelos, como no caso do Brasil, onde alguns terminais privados foram recentemente criados sob a supervisão das autoridades federais. Na Coreia do Sul, o governo central opera diretamente os portos, mas está a prosseguir a introdução de uma mentalidade mais empreendedora. A maioria dos países não pretende privatizar as autoridades portuárias, adotando um modelo Porto Senhorio, com operadores privados com concessões de 30 anos ou mais. Por sua vez, há autoridades portuárias totalmente privatizadas como no porto da Nova Zelândia ou, por concessão do governo, como o Pireu ou novas autoridades portuárias autónomas, como as dos portos da Turquia e da China. Já no Brasil, o poder foi concentrado recentemente numa autoridade nacional, a ANTAQ. O foco das autoridades portuárias varia consideravelmente. Pode estar concentrada em seu negócio portuário central, pode ser nas relações locais, com a comunidade portuária e o município, ou pode estar num nível mais regional nas plataformas logísticas e cadeias de abastecimento (regionalização), que é considerado uma nova fase da vida portuária. Os portos mexicanos estão a procurar ampliar seu foco na logística do hinterland. A fase de regionalização traz a perspetiva de desenvolvimento portuário para uma escala geográfica mais alta, que está além do perímetro portuário. As relações entre portos próximos e suas autoridades portuárias são discutidas e incluem estratégias de integração Principais modelos de governação portuária

ou cooperação, como a China, e coopetição ou competição, como no caso dos portos belgas ou holandeses. Muitos portos regionais integram portos pequenos e há uma discussão sobre a possível integração de grandes portos localizados na mesma região, com os governos a exigir cada vez mais maior cooperação entre as autoridades portuárias. A coordenação da gestão entre portos, embora mantendo sua respetiva autonomia, é outra perspetiva possível. Existe o caso da cooperação entre os portos dos EUA na cadeia logística para combater a ameaça do Canal do Panamá. A cooperação entre portos concorrentes (tipicamente próximos) é frequentemente vista como pretendendo evitar a concorrência destrutiva entre portos. As autoridades portuárias esforçam-se por minimizar o ambiente competitivo usando uma estrutura de governação flexível interna e externa. A organização dos portos varia de país para país, variando de modelos mais centralizados de uma única autoridade portuária nacional, como a África do Sul, Chipre ou Taiwan, para as autoridades regionais ou multiportos, como está sendo desenvolvido na Itália e como é o caso dos portos da Austrália Ocidental. Algumas autoridades locais são diferenciadas por dimensão do porto, entre portos pequenos e grandes, como é o caso no Canadá. No entanto, por vezes, existem vários modelos dentro do mesmo país. As funções da autoridade portuária podem ser distinguidas em (a) operador conservador, (b) gestor de áreas e facilitador, e (c) novas atividades das empresas de desenvolvimento portuário (PDCs). A autoridade portuária conservadora concentra-se em gerir e implementar ações passivas e mecanizadas,

com distanciamento. A autoridade portuária “facilitadora” assume-se como mediadora e parceira entre interesses económicos e sociais, procurando envolver-se em parcerias regionais estratégicas. A autoridade portuária “business” combina características de facilitador com a atitude de um investidor, prestador de serviços e consultor. A regulação da concorrência intraportuária é uma característica importante do modelo de governação portuária e pode ser mais orientada para (a) liberalização dos serviços portuários; (b) limitação dos prestadores de serviços portuários ou (c) monopólio dos serviços portuários (Banco Mundial, 2007). O processo de seleção dos gestores de porto é um fator importante e pode influenciar o desempenho do porto. Os gestores podem ser indicados por políticos nacionais, políticos locais, por recurso a concurso técnico ou indicados pela comunidade portuária. Quando os gestores de portos, ou outras posições portuárias, são escolhidos por amizade ou proximidade política, não se podem esperar bons resultados e pode influenciar o desempenho. É possível distinguir o tipo de Controle de Gestão exercido sobre a autoridade portuária: (a) Controle interno, (b) Controle financeiro e de investimentos governamental, (c) KPIs de gestão, monitorados mensal ou trimestralmente pelo Governo; e (d) Controle total e dependência de decisão do governo central ou de outra entidade. Os governos criam mecanismos de controle que reduzem a independência dos portos, mas devem criar antes órgãos autónomos de supervisão. Foi possível identificar vários modelos principais de governação divididos entre os modelos Privado, Liberal, Controlado e Centralista (ver quadro abaixo):

Privado

Liberal

Controlado

Tipo de AP

Porto privado

Landlord

Landlord

Tool/Service port

Poder da AP

Poder privado

Devolution/Autonomy

Controlled Devolution

Centralist

Foco da AP

Core

Regional/ Internaconal

Regional

Core

Competição

Coopetição

Cooperação

Integração

Organizaç‹o geogr‡Þca

Cada porto 1 PA

Cada porto 1 PA

Fusão AP regional

Uma AP

Funções da AP

Gestor de áreas

Desenvolvimento

Facilitador

Operador

Liberalização

Liberalização

Limitação

Monopólio

Seleção de gestores

Técnica

Mix

Política

Politica

Tipo de controlo

Mínimo

Controlo interno

Controlo Þnanceiro e de investimentos

Controlo total

Natureza da AP

Privada

Empresa do Município

Empresa do Estado

Departamento do Estado

Paga ao Estado

Contas equilibradas

Ajuda do Governo

Financiamento público

Relações entre AP

Modelo de competição

Financiamento da AP

Centralista

AP – Autoridade Portuária Fonte: adapted from Baltazer & Brook (2006), Brooks & Cullinane (2007a), Bandara et al. (2013) www.revistacargo.pt

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VICTOR CARDIAL (GASNAM) «MERCADO ESTÁ-SE A DESENVOLVER E AS OPORTUNIDADES COMEÇAM A SURGIR» Numa altura em que os governos e as comunidades empresariais se consciencializam, à escala global, da urgência de novos paradigmas energéticos, a GASNAM ganha terreno, corpo e uma voz cada vez mais preponderante na defesa da implementação do Gás Natural enquanto solução para um futuro sustentável nos Transportes. A nomeação de Victor Cardial para Delegado em Portugal é mais um reflexo dessa progressão – em entrevista à Cargo, o experiente engenheiro explicou a génese e os desafios da associação ibérica. REVISTA CARGO: Fale-nos um pouco da origem da Gasnam em 2013 e do contexto em que se dá esse surgimento. VICTOR CARDIAL: Digamos que a questão que se colocou na altura era que já existia a associação europeia NGVA Europe, enquanto que, ao nível da península ibérica, não havia uma actividade estruturada em termos do gás natural na mobilidade. O gás natural enquanto combustível para consumo doméstico e industrial tinha grande pujança, mas, ao nível da mobilidade, estava numa fase muito emergente. Tinha havido algumas tentativas, algumas com sucesso como o caso italiano, e outras com menos sucesso como o caso alemão. Seria necessário, visto que era um combustível emergente ao nível da mobilidade, implementar uma estratégia na península ibérica que se adequasse ao desenvolvimento do mercado. É nessa perspectiva que surge a Gasnam, muito impulsionada pelos fornecedores de gás natural, mas também pelas áreas ligadas à tecnologia, aos produtores de automóveis e também aos transformadores. Efectivamente a estratégia seguida pela Gasnam, que me parece adequada, passa por apostar, numa primeira fase, nos veículos profissionais, que têm uma diferença em relação ao particular: têm circuitos muito definidos e consumos mais elevados, o que leva a que seja muito mais fácil viabilizar um posto de abastecimento a partir de uma frota profissional. Isso acontece não só em Espanha como também em Portugal, onde temos o caso da Carris e da STCP, esta última com uma atitude muito mais empenhada numa 28

primeira fase, conseguindo resultados bastante satisfatórios. Essas duas empresas tiveram a implementação de dois postos de abastecimento GNC, que diria que se auto-sustentavam. Em relação a postos públicos, o que foi surgindo, nos últimos anos, foram postos públicos que assentavam o seu modelo de negócio no abastecimento de GNL a camiões. Dessa forma pretendia-se, por um lado, criar os corredores europeus de abastecimento de GNL, e por outro, sendo consumos elevados, com uma pequena frota, viabilizar os postos de combustível. Basicamente, é este o enquadramento geral do surgimento da Gasnam e da estratégia que definimos em termos de implementação do processo que é significativamente diferente daquele que foi seguido na Alemanha, onde se apostou nos veículos particulares e as coisas não correram muito bem. Esta estratégia é, de facto, mais lenta, mas com menos investimento e consequentemente, com menor risco para os privados. Neste actual paradigma de restrição dos níveis de emissões poluentes, tanto no shipping como no transporte rodoviário, a Gasnam torna-se num instrumento fundamental para sensibilizar os sectores sobre as alternativas energéticas ao dispor? Estando eu neste sector já há alguns anos, creio que em Portugal, especificamente, começou-se a ter alguma atenção, e quando eu falo em atenção não é uma atenção mediática porque essa infelizmente ainda não foi atingida na plenitude, mas sim uma atenção por parte dos operadores de transportes. E isso tem www.revistacargo.pt

a ver com um conjunto de acções que foram desenvolvidas pela Gasnam e pelos seus associados em Portugal que permitiu que houvesse um incentivo ao gás natural em termos de IRC e ISP, que tornou mais atractiva ainda a questão da utilização do gás natural. Por outro lado, também temos agora um conjunto de equipamentos mais potentes: o que antes era uma restrição aos transportadores, deixou de existir. Portanto conjugaram-se aqui duas ou três questões que permitiram que o gás natural aparecesse como alternativa efectiva. Ao nível dos autocarros, a questão não era já novidade, mas teve um novo impulso com os concursos que foram abertos no ano passado e com a aquisição de autocarros a gás natural pela STCP, Auto Viação Feirense e pela Carris, e penso estar-se a criar aquilo que considero ser uma massa crítica ao nível do gás natural nos transportes. Ainda assim, infelizmente, estamos mais atrasados que Espanha, pois lá há outro nível de incentivos na aquisição dos veículos que não existe cá. Já tivemos oportunidade de apresentar um memorando ao Secretário de Estado da Energia, no sentido de pensar o aumento dos estímulos de forma a desenvolver o mercado que, não estando num impasse, acredito que necessita de um determinado estimulo para um desenvolvimento mais rápido e sustentado, nomeadamente ao nível dos particulares. Ao nível dos transportadores, creio que também o Estado tem alguma vantagem, nomeadamente, pela diferenciação de custos de combustível que pode criar com isto, sem criar um problema ao nível do mercado do gasóleo. Portanto, se os transportadores optarem por esta solução, deixa de haver o problema do sobrecusto


que neste momento eles sentem. Portanto, há aqui um conjunto de situações que eu diria que são extremamente positivas, não só a nível de ambiente urbano, como em termos de situações de poluição diversa, visto que nós falamos muito das emissões à saída da fábrica mas esquecemo-nos das emissões passados 5/10 anos. Se os carros a diesel têm hoje emissões relativamente baixas, isso apenas é verdade à saída da fábrica. Em relação aos navios, é evidente que a questão da grande longevidade dos navios é um óbice ao desenvolvimento do GNL marítimo. No entanto, começa a haver solução de transformação de motores marítimos também para GNL. Assim, existem aqui duas questões: as novas construções, que começam a ser, em grande parte, a GNL, e o retrofitting. Como é sabido, em determinadas zonas do Mar Báltico e em algumas zonas da costa dos EUA e até no Mar do Norte, as emissões são controladas – isso é algo que irá trazer um grande problema à navegação, e aí entra o GNL como grande solução. Portanto, neste momento, considero que estamos a assistir a uma viragem, um ganhar de relevo por parte do gás natural na mobilidade, a nível mundial e, muito particularmente, em Portugal. Estamos a tentar a sensibilizar primeiro os agentes públicos, mas também queremos sensibilizar a opinião pública, pois não acreditamos que a opinião pública esteja plenamente sensibilizada para esta questão. Há muita gente que confunde o gás natural com o GPL, e há necessidade de diferenciar essa questão. O GPL é uma solução para algumas situações, nomeadamente ao nível particular, mas não é uma solução a nível profissional, nem é uma solução, digamos, tão interessante como o gás natural. O GNL nos portos espanhóis é uma aposta cada vez mais forte. Será que Portugal pode recriar essa aposta, atendendo até ao potencial que Porto de Sines? Ainda hoje vi uma entrevista com o Dr. Jorge Seguro Santos, na qual falava na questão dos gasodutos e na questão do equilíbrio energético e do mercado único de energia. Essa é uma questão extremamente importante para nós porque o nosso porto de abastecimento de gás é Sines. É preciso dizer que na Península Ibérica temos 7 portos que têm capacidade de armazenar e receber gás natural por via marítima. O porto de Sines e a APS são nossos associados, tivemos duas reuniões há pouco tempo tanto com o Porto de Leixões como com o Porto de Lisboa, que se mostraram sensíveis a esta questão. No entanto existem algumas dificuldades. Essas dificuldades prendem-se com um determinado tipo de logística de abastecimento de GNL, ou seja, não é viável em termos práticos que um navio acoste a um cais e depois vá acostar ao outro para se abastecer – essa é uma primeira questão, complicada. Outra questão é, efectivamente, o espaço e o próprio licenciamento. Uma solução

que tem vindo a ser estudada por vários dos nossos associados e implementada: o abastecimento flutuante. Portanto o abastecimento ship-to-ship parece-nos ser uma solução que poderá responder aos problemas quer de Lisboa quer de Leixões. Precisa ainda de ser um pouco mais desenvolvida, embora já existam muitas experiencias nesse sentido, mas parece-me que de facto é uma solução, pois precisa de menos espaço em terra e tem a facilidade de abastecer navios no sítio ou no cais onde acostam. Portanto, digamos que essa opção parece-nos extremamente válida e interessante para os portos portugueses. Neste momento, em Portugal, as grandes necessidades aparecem ainda relacionadas aos navios de cruzeiro, mas que vão começando a ser cada vez mais significativas, até porque creio que a Costa Cruzeiros já tem um cruzeiro a GNL. E, se nós pensarmos que se fazem cruzeiros para o Norte da Europa, têm de estar adequados a essa realidade. São efectivamente situações que nós temos que apreciar, até porque Lisboa é um destino de cruzeiros muito apetecível. Nós tivemos a oportunidade de apresentar um pequeno memorando sobre a questão, porque não existe, ainda, um regulamento claro do licenciamento do abastecimento a gás natural nos portos; portanto, é uma situação que tem de ser estudada e resolvida mas ao mesmo tempo terá de ser uma solução. Já houve um abastecimento, ou vários, do mesmo navio no Funchal, mas relativa aos motores de alimentação quando o navio estava parado. E houve também uma experiência feita em Sines, mas digamos que, em termos práticos, ainda estamos uma fase ainda muito embrionária. Sobre a sua nomeação: tal representa a vontade da Gasnam em expandir a sua influência na Península Ibérica? A existência de uma delegação em Portugal era uma reivindicação antiga dos associados portugueses da Gasnam. Efectivamente, apesar de o mercado em Portugal ser pequeno e existirem outras entidades que de certa forma estão vocacionadas para esta área, há actividades que necessitam de um determinado empenho que tem de ser dado de um ponto de vista profissional. Portanto, a minha nomeação surge em duplo sentido: por um lado, para reforçar a vertente ibérica da própria associação e também para dar apoio no mercado português aos associados portugueses e ao desenvolvimento do mercado. Como é evidente, o número de associados portugueses ainda é muito limitado, portanto estamos a trabalhar para que o número aumente. Penso que entrámos num momento em que o mercado se está a desenvolver e as oportunidades começam a surgir. As vantagens da associação não são facilmente percebidas por diversos operadores e existe um período de www.revistacargo.pt

desenvolvimento que não está a ser propriamente fácil. De qualquer maneira, conseguimos que o Sr. Secretário de Estado da Energia fosse ao congresso em Madrid, o que foi extremamente importante do ponto de vista da sensibilização da Secretaria de Estado para a importância e relevância do gás natural, pois o nosso congresso com 800 pessoas impressionou-o. Por outro lado, o empenho que a SEAT demonstrou no desenvolvimento dos veículos e dos motores a gás natural para o grupo Volkswagen também foi um sinal extremamente interessante. Digamos que, neste momento, temos já uma determinada imagem criada e transmitida sobre gás natural, nomeadamente em alguns sectores e espaços públicos. Também desenvolvemos relações com diversas associações, nomeadamente com a ACAP, com a ANTRAM, com a associação AMAGAS em que já iniciámos contactos – pois temos aspectos que se cruzam muito – e também com o Estado. Temos, efectivamente, de passar para uma fase seguinte – a de conseguirmos que existam mais pessoas e entidades que se associem, de maneira a que Portugal tenha uma relevância diferente nesta área e possa fazer algo que considero muito importante: intervir junto da opinião pública. Enquanto não tivermos essa visibilidade nos órgãos de comunicação social generalistas, penso que a opinião pública estará muito pouco sensibilizada. Como toma o pulso a esse desenvolvimento de consciências e sensibilização para um paradigma que se tem vindo a revelar crescente? Eu creio que basicamente neste momento em termos de país e em termos europeus, temos uma panóplia de alternativas de combustível que são não exclusivas mas sim complementares. Assim, terá de haver, da parte do Estado (até para benefício próprio), uma diversificação das fontes de energia. Nessa perspectiva, o gás natural surge como alternativa natural para quem tem necessidades de mobilidade de uma determinada dimensão, nomeadamente, por exemplo, em Madrid – existem muitas pessoas que vivem a 40/50km do emprego, portanto fazem, no mínimo, 100km por dia. Para pessoas que façam essas distâncias diárias, utilizar o gás natural torna-se muito simpático. Digamos que essa será talvez a grande questão que se levanta. Agora penso que estamos aqui com uma pescadinha de rabo na boca – uma pessoa não pode comprar um carro a gás natural se não tiver um posto de abastecimento. Mas os incentivos do IMT para o gás natural dizem que os carros terão de ser exclusivamente movidos a gás natural. Isso não existe no mercado. Os carros são todos híbridos. Portanto, neste momento, é irrealista pensar num carro exclusivamente a gás natural – muitas vezes os legisladores querem um grau de pureza que não se coaduna com a realidade.

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Por outro lado, existe uma pressão muito grande em relação à mobilidade eléctrica, que, na minha opinião pessoal, é interessante, mas não poderá ser encarada como exclusiva. E aí existe uma competição ao nível dos incentivos, pois os eléctricos beneficiam de maiores incentivos do que o gás natural. Algo que penso não ser correcto, pois o veiculo eléctrico tem uma componente que não é totalmente reutilizável – a electricidade não é totalmente renovável. Os custos de fabrico de baterias e a reciclagem são problemas muito complicados. Existe também o problema do abastecimento eléctrico dos veículos e se aumentar significativamente o parque….Não sabemos como poderá ser abastecido. Portanto, digamos que, como se costuma dizer em bom português, não se deve colocar os ovos todos no mesmo cesto. Eu creio que existe um segmento de utilizadores para quem o eléctrico é a solução mais vantajosa, e existe outro grupo para quem o gás natural é a solução mais vantajosa. E neste grupo, penso que estão claramente os utilizadores profissionais mas também utilizadores particulares com trajectos mais longos. Portanto digamos que é este um mix que eu acho necessário. Também ao nível dos veículos, nomeadamente das autarquias ou dos transportadores públicos de passageiros, a situação é, claramente favorável ao gás natural – falei há tempos com um transportador privado que me dizia, sobre os autocarros eléctricos: ‘eu tenho de comprar dois para uma rota, por causa da questão dos carregamentos’. Portanto, o custo é de facto muito elevado. Eu diria que são duas alternativas interessantes e que deveriam ser fomentadas de forma equivalente. Qual acha que é a razão para essa discrepância de apoios? Existe uma explicação: basicamente porque existe o fantasma dos gases de efeito estufa, que o gás natural terá e que os eléctricos não terão. A realidade é que muita da electricidade produzida para estes veículos o é a partir do gás natural. Existiu um problema de termos um consumo de gás natural extremamente elevado, com problemas que daí derivaram com contractos de compensação de carbono. Eu diria que a questão que aqui se põe será mesmo a falta de informação e conhecimento. Falta de sensibilização da opinião pública. Deficiente sensibilização dos agentes públicos. E ainda também alguma falta de conhecimento da tecnologia por parte dos operadores profissionais. O que aconteceu foi que neste início de ano surgiram vários veículos com potência superior aos 400 cavalos, ao nível do transporte internacional e houve um conjunto de aquisições relativamente experimentais. Estamos a falar de meia dúzia de veículos, mas que foram adquiridos por uma diversidade de transportadores. Eu direi que neste 30

momento em Portugal teremos 15 a 20 transportadores que já têm veículos a gás natural na sua frota. Portanto há umas que têm há mais tempo e podem de facto reportar a sua experiência, que acredito ser positiva. Existem veículos já com algumas centenas de milhares de quilómetros, sem qualquer problema, quer ao nível dos pequenos comerciais como ao nível dos camiões. Portanto dá a ideia de que, sendo essa experiencia positiva, o volume de aquisição destes veículos aumente também. Acontecendo isso, teremos então a possibilidade de criar a rede de postos de abastecimento que permitirá aos particulares fazer uso dessa mesma rede. Estamos a falar de um mercado emergente no caso dos ligeiros, que necessita de algum incentivo por parte do estado. Que importância têm os associados portugueses nesse caminho que estão a trilhar? Eu penso que neste momento temos um conjunto de associados extremamente relevante, cobrindo diversos sectores e isso também é muito interessante. Neste momento temos dois distribuidores, a Galp e a Dourogás, temos um porto, que é o de Sines, temos o grupo Sousa, que fundamentalmente está ligado ao transporte marítimo e também à distribuição de gás na ilha da Madeira, temos a PRF que é um fabricante e instalador de postos de abastecimento – uma empresa muito interessante desse ponto de vista e presente em vários mercados, recentemente com uma serie de instalações em França – depois temos os Transportes Os Três Mosqueteiros, também em Sines – que é um transportador com alguma capacidade de inovação e de desenvolvimento e que foi um dos pioneiros ao nível da utilização de camiões a gás natural em Portugal – e temos a OZ energia, que tem uma operação de distribuição de gás a particulares. Neste momento, o Instituto Tecnológico do Gás, eventualmente irá associar-se. Temos também outra questão: o facto de muitos dos nossos associados em Espanha também terem operações em Portugal e isso é uma questão que temos de equacionar, pois vamos criar um grupo de trabalho com os associados portugueses para desenvolvermos um conjunto de interacções sobre as acções a desenvolver aqui em Portugal. Qual a importância desses grupos e trabalho? Neste momento temos vários grupos de trabalho específicos, seja para a náutica, para a tecnologia, questões fiscais, etc – tudo a nível ibérico. Neste momento estamos a desenvolver um estudo com o instituto CEDAR, sobre os custos de transporte do gás natural, no fundo, em relação às portagens que se pagam e que em Portugal estão a limitar bastante a difusão dos postos de abastecimento de gás natural, pois os consumos iniciais são muito baixos, e, utilizando gás da rede a solução não é economicamente viável, www.revistacargo.pt

devíamos ter uma solução de, em vez da baixa pressão, a media pressão poder ser utilizada como a referência. A outra questão prende-se com o facto de que teremos de ganhar visibilidade, e nesse aspecto, temos interesse em realizar um seminário ainda este ano, abordando duas questões que me parecem fundamentais para a divulgação da importância do gás natural – uma delas é a questão da qualidade do ar, ou seja, o gás natural garante uma qualidade do ar, especialmente ao nível urbano, muito melhor, por causa da ausência de emissão de partículas e ausências dos Óxidos de Azoto (NOx) que são responsáveis pela maior parte das doenças respiratórias nas grandes cidades. A outra questão, prende-se com o nível técnico, pois a tecnologia cresceu muito, e actualmente os motores a gás natural conseguem ter desempenhos ao nível dos motores a diesel. E em relação a um potencial apoio governativo, acredita que isso está na agenda do futuro? Já houve algum feedback em relação a isso? Não posso falar em nome do Estado, mas posso dizer que nós sentimos por parte da Direção Geral da Energia e do Secretário de Estado da Energia muito interesse por este assunto. Neste momento esta a ser preparado o Orçamento de Estado e esperamos que este assunto tenha alguma atenção adicional. Nesse sentido elaborámos um conjunto de documentos que já referi e onde tentamos chamar a atenção para aspectos mais relevantes. É evidente que não é possível sem o apoio mais alargado dos associados, sem uma capacidade de intervenção na opinião pública mais sustentada, ter uma voz com o peso que merecemos. A questão da moda da electricidade, baseada apenas nos aspectos da utilização e não no aspecto desde o fabrico até ao abate dos veículos, penaliza o gás natural – porque enquanto no gás natural esses custos ambientais reflectem-se durante o período de utilização, os outros são fundamentalmente concentrados no fabrico e na reciclagem, e portanto, comparativamente, não é tão diferente o impacto em termos de gases de efeito estufa. Porque é disso que estamos a falar, o resto é algo irrelevante. Por outro lado a electricidade, não é solução para os profissionais. E os profissionais sabem-no? Eu tenho conhecimento de várias pessoas que fazem uma utilização profissional e é uma “dor de alma”, pois para irem para qualquer lado têm de fazer bem as contas, utilizar o ar condicionado é um problema, andar mais depressa é um problema, os postos de abastecimento rápidos são raros e muitos deles avariados…Portanto, quem faz mais do que 100 km por dia terá problemas. Um profissional com um veículo de distribuição não pode perder metade do dia a abastecer.


E no gás natural, estando a rede ainda pouco difundida, não sente que as pessoas também pensam que terão de fazer esse tipo de contas? Isso é claramente uma limitação neste momento. Estamos a falar de uma situação que, eliminando os entraves/restrições que existem neste momento – a questão dos estímulos à aquisição de veículos e a questão de redução de custos de instalação a partir da rede – vamos ter soluções. Eu diria que é um processo que terá de caminhar em paralelo, ou seja: existindo um posto de abastecimento, quem está ali perto poderá ter um carro a gás natural, se houver um conjunto de pessoas que já ali tenham carros a gás natural, poderá criar-se, a 30 km, um novo posto, e assim se vão criando a massa crítica e o efeito de rede.

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Por outro lado, existe essa norma comunitária que aponta para que cada cidade com mais de 100.000 habitantes tenha um posto de abastecimento. Para Portugal a ideia é que cada capital de distrito tenha um posto. E se essa instalação for apoiada pelo Estado, pois não serão rentáveis para os instaladores, a partir daí poderemos realizar esse crescimento dendrítico. Penso que se uma pessoa tem um posto de abastecimento no seu trajecto, perfeito; se não tem, é difícil, temos de ser realistas. Não tem vantagens. Eu acho que, da parte dos instaladores e distribuidores, já foi dado o primeiro passo. Neste momento com o EcoGate teremos uma rede em Portugal já com alguma dimensão. Estamos a falar de 20 postos servindo os principais centros do país, e isso já permite que o gás natural seja uma solução válida para os particulares também. Pode ser hipótese exequível a instalação de postos dentro das próprias empresas de transporte? Pode, mas para isso é necessário que seja economicamente viável. Esse é um assunto que eu pessoalmente tenho estudado. Para ser economicamente viável um posto terá de partir de uma frota de 50 veículos pesados. Se alguém tiver uma frota de 50 veículos, seja autocarros ou camiões, já se justifica. Não estamos a falar de ligeiros, mas sim de veículos pesados, seja de resíduos, seja de autocarros, seja de camiões. O que também quer dizer que, havendo 50 veículos pesados numa zona, pode haver um posto, e esse mesmo posto poderá também servir veículos particulares. E é essa a aposta da Gasnam: viabilizar os postos com os veículos pesados e depois fornecer também, a partir daí, os veículos ligeiros. Se estivermos a falar de veículos ligeiros, serão necessários 500 a 1000 veículos, estamos a falar de uma ordem de grandezas completamente diferente. Por exemplo em Itália têm 1000 veículos por posto de gás natural, em comparação com Portugal, que na totalidade, temos cerca de 100 no país inteiro. Sabemos que tem um especial interesse no tema da Sociedade 5.0, que papel tem o gás natural nessa questão? A sociedade 5.0 coloca a pessoa no centro do desenvolvimento de tecnologia. O mesmo se aplica às necessidades energéticas de cada indivíduo, e, aí, eu penso que o gás natural poderá ser a melhor alternativa para determinadas pessoas. Penso que a tecnologia deve ser posta ao serviço das pessoas, pois se nós olharmos para a tecnologia como um fim e não apenas como um meio, estamos a tirar as pessoas do centro e a colocar o cibernético no foco. O que nós devemos fazer é colocar a cibernética ao serviço das pessoas. Tenho uma apreciação especial pelo pensamento japonês, onde o conceito de sociedade 5.0 nasceu. E eu penso que os portugueses em termos de concepção e de estrutura social e maneira de estar na sociedade são muito semelhantes aos alemães e aos japoneses. Isso tem a ver com as questões do trabalho, tem a ver com a questão de uma determinada responsabilidade, de criação de afectos e de grupos de interligação e isso tem sido de certa forma destruído em Portugal nos últimos 30 anos e portanto nós temos desconstruindo a nossa sociedade para adoptarmos um modelo americano que não se ajusta a nossa maneira de ser e de pensar. Os japoneses perceberam que a tecnologia não pode existir pela tecnologia, deve sim servir um objectivo: as pessoas.

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DAVID CARLOS (MAN TRUCK & BUS PORTUGAL) «ACEITAÇÃO DA TGE NO MERCADO TEM SIDO ACIMA DAS EXPECTATIVAS INICIAIS» Cerca de um ano depois do lançamento da versátil e multifacetada gama TGE, a MAN Truck & Bus fez, pela voz de David Carlos, Country Manager da marca em Portugal, o primeiro balanço da entrada da insígnia no segmento dos veículos comerciais ligeiros. A entrevista concedida à Revista Cargo, à qual se juntou Luís Pereira Product/Marketing da fabricante, não deixou de fora temas como a implementação da plataforma RIO, a aposta na Electromobilidade, a exploração do platooning e a condução autónoma. REVISTA CARGO: Faz pouco mais de ano desde a introdução da MAN TGE no mercado, que marcou a entrada da fabricante no segmento dos comerciais ligeiros. O que esteve na base dessa decisão? E qual o balanço que faz? DAVID CARLOS: Em termos gerais a introdução da MAN TGE – dentro da gama de produtos da MAN – tem muito mais a ver com o completar de uma gama de veículos profissionais em que até então a MAN se dedicava apenas aos pesados. O nosso sector e os nossos clientes são cada vez mais operadores globais, que vão desde o transporte de longa distância até à distribuição porta-a-porta. Nesse sentido, foi um aproveitar das sinergias do grupo, mais o know-how da MAN, para ter uma oferta mais alargada de produto, sendo que sabemos que os desígnios da distribuição e da logística também tem muito a ver com distribuição capilar – somado o know-how e a experiência de quem vende soluções profissionais, tal já era razão para termos este produto. A aceitação no mercado tem sido muito boa, até acima das nossas expectativas iniciais. Claramente que estamos a falar de um mercado muito estabelecido para algumas marcas que operam no mercado há muitos anos. Mas nós temos a vantagem de ser um player recente no mercado. Digamos que se trata de uma vantagem não termos nenhuma ocorrência no passado, e, ao mesmo tempo, uma desvantagem, pois estamos a competir com players já há muito instalados. Nisso, o produto ajuda-nos bastante, especialmente ao nível daquilo que é o conforto e economia. Dentro dos veículos comerciais ligeiros – e aqui podemos falar de duas tipologias de clientes – há o cliente que é comprador/utilizador, que privilegia o conforto mas não pode descurar a economia e os consumos, mas também temos o outro segmento de clientes que são os compradores/não utilizadores, e aí o argumento que entra é efectivamente a economia. O nosso bloco de 2 litros é um bloco comprovado dentro do grupo e dentro de uma utilização racional tem prestações muito interessantes. E aí toca no cliente 100% profissional, aquele que compra mas que não utiliza. Temos aqui um equilíbrio muito interessante. Obviamente, ainda temos muito a fazer em termos de volume de vendas - estamos a falar de uma nova gama, na qual começámos do zero, logo, estamos ainda a montar a nossa equipa comercial, estamos a dotar os nossos concessionários das suas equipas comerciais. Este processo demora algum tempo. A verdade é que, embora nós nunca estejamos satisfeitos com aquilo que vendemos, as coisas até têm corrido muito bem. E curiosamente começaram pelos Açores… É verdade, temos lá um concessionário que é a MAN São Miguel, e foi o primeiro concessionário a entregar a um cliente final uma TGE. Acaba por ser interessante – o nosso concessionário dos Açores

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convenceu-nos que de facto não existem paradigmas. Veja que estamos a falar de uma ilha, onde a facilidade de acessos a peças e a serviços, é, pela localização geográfica, mais difícil do que no continente. Mais razões haveria para haver resistência a um produto novo. Mas apostamos, e o próprio cliente também apostou em nós, e, depois, também vos posso dizer que o concessionário dos Açores tem já uma performance muito interessante. O que considera ser o maior trunfo deste modelo? A gama TGE tem uma particularidade muito interessante em relação aos outros modelos no mercado, que tem a ver com a versatilidade: não só no que diz respeito às variantes e modelos existentes de fábrica, entre os vários tipos e dimensões oferecidos, mas também em relação aos serviços que nós temos associados à TGE que vêm da área dos camiões, como é o caso dos contratos de manutenção e reparação, as extensões de garantia…temos todos estes serviços que normalmente estão associados à viatura pesada, e conseguimos fazer a mesma oferta para a TGE. Ao nível da versatilidade do próprio produto, a TGE tem coisas muito interessantes, nomeadamente o facto de poder, além das variantes de cabines, ter variantes de tracção dianteira e variantes de tracção traseira. Nesta área as pessoas têm, normalmente, uma tendência natural para dizer que estes carros têm de ter tracção traseira. Isso é verdade, mas em algumas aplicações específicas, nomeadamente em situações de difícil acesso, e noutras em que a carga útil da viatura é extremamente essencial para a actividade, também temos as versões de tracção dianteira. Ou seja, o mesmo modelo poderá ter tracção dianteira ou traseira. Temos ainda uma versão 4x4, para aplicações como é o caso da construção ou outras off-road, que acaba por ser uma versão que não penaliza o desempenho da viatura em estrada normal, uma vez que é ‘desconectável’ e passa a um 4x2, acabando por dar características fora de estrada quando está fora de estrada, e características de estrada quando está em estrada. Efectivamente, uma das características que também nos diferencia – por estarmos a falar de viaturas que são muito sensíveis às questões de carga útil – é o facto de estarmos a falar de uma viatura que pode chegar acima de uma tonelada de carga útil, o que é, para este tipo de utilizadores, extremamente interessante; também pelo facto do nível de exigência relativo ao controlo dos pesos máximos da viatura ser cada vez mais apertado. Nós queremos contribuir, não só para o aumento do tempo útil da viatura, mas também para a redução das multas, pois a fiscalização intensificou a sua acção. Os aplicativos adicionais são múltiplos, permitindo aos clientes equipar o seu modelo consoante as suas necessidades, por exemplo na facilitação da carga e da descarga… Há um aí factor muito interessante, a própria amplitude de carga, o facto das paredes do veículo serem muito direitas, o que facilita as

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transformações locais, seja para converter em carro de frio ou outra modificação que seja necessária, o que o diferencia de outros furgões no mercado com paredes mais curvas. A TGE acaba por ser o resultado de várias experiências, nomeadamente dentro do grupo Volkswagen, com a Crafter, e também com a introdução de conceitos por parte de quem está habituado a vender camiões, quer ao nível de serviços quer ao nível da telemática. Hoje em dia fala-se muito de condução económica e eficiente, mas em camiões, pois são grandes distâncias e muitos litros de combustível gastos. Mas se nós olharmos à nossa volta vemos muitos veículos comerciais que também fazem muitos quilómetros, e, ao termos aqui todo esse know-how de telemetria e de análise de condução, tornase extremamente interessante aplicar esses conhecimentos a este veículos. Se nos colocarmos na pele de uma empresa que tenha de gerir 100 carros destes, certamente considerará interessante também esse nível análise. Por falar em telemática: a plataforma RIO também está disponível neste modelo? Vai estar, está previsto. É uma questão de meses. Contamos que, antes do final do ano, a plataforma RIO irá equipar a TGE, pois o objectivo é que abranja todas as viaturas do Grupo Volkswagen, incluindo a TGE. E qual pensa que será o papel dessa plataforma no futuro? O RIO é, para nós, mais uma evolução do nosso sistema telemático, o MAN Telematics, um sistema telemático a bordo do veículo. Claramente aqui o RIO tem duas componentes diferentes. A primeira ao nível do utilizador, é muito mais user-friendly que o seu antecessor, e por outro lado, queremos facilitar esse acesso aos nossos clientes. Nesse âmbito, entendemos que os sistemas telemáticos são extremamente importantes, mas devem ser simples de analisar, pois se forem demasiado complexos, o escasso tempo que um gestor de tráfego ou dono de uma empresa têm para analisar os seus dados complica o processo. O RIO vem facilitar todo o processo, quer ao nível do utilizador – que consegue ver muito mais facilmente onde é que está bem ou onde pode melhorar – mas também para quem está do lado de cá da secretária, percebendo-se, de uma forma simples, se o negócio está a ir no caminho certo. Mais: a plataforma RIO acaba por ter componentes de integração dentro do Grupo, tendose aproveitado as sinergias do Grupo e o seu conhecimento na área digital, tornando isto uma plataforma única e de fácil acesso. LUÍS PEREIRA: O sistema já está inclusivamente preparado para crescer com a digitalização, e está preparado para receber upgrades, para interagir com o veículo, enviando, por exemplo, relatórios para a oficina. Pode também ligar-se a todos os sistemas externos, ou seja, todos os operadores que queiram (sejam navios, aviões) poderão ligar-se e o cliente que tenha o veículo MAN, neste caso, poderá saber quando é que a sua carga está a chegar, optimizando assim toda a cadeia logística. Está também disponível para outros fabricantes? Sim, isto é um produto do Grupo Volkswagen, e claro, vendemos para outros clientes. Por exemplo, um cliente que tenha uma frota com veículos MAN e com veículos de outros fabricantes, precisa apenas de chegar a esses veículos com a box RIO e integrá-la também nessas viaturas. O RIO ainda é muito jovem, mas as potencialidades são enormes e já temos bastantes boxes a trabalhar.

A MAN firmou com a DB Schenker uma parceria na área da evolução digital e da inter-conectividade com o platooning – Já tem alguns dados em relação a esses testes? DAVID CARLOS: Não temos ainda uma fotografia final do processo, mas, em termos gerais, podemos dizer que é uma aposta de sucesso. Muito se fala da optimização das cargas, das energias alternativas… É um tema claramente na moda, mas antes de passarmos para uma situação em que desistimos de motores de combustão interna, há que fazer um trabalho enorme no que diz respeito à optimização da carga e dos tempos de condução, e o platooning acaba por somar, no futuro, não sabemos muito bem quando, pois há regulamentação que ainda terá de ser redigida e depois cumprida. Hoje em dia os nossos clientes têm graves problemas de falta de motoristas, uma situação mundial, e o platooning é, também, de acordo com os nossos desígnios estratégicos, uma solução para isso. Claramente é um processo, que requer desenvolvimentos técnicos (e a esse nível nós estamos já preparados), mas existe ainda muita coisa para ser feita ao nível da regulamentação da circulação rodoviária normal para que existam progressos nesse sentido. Isso e também os transportes combinados de grandes volumetrias, os mega-camiões, outro dos caminhos a seguir. Não se trata de não querermos vender mais camiões, queremos, acima de tudo, satisfazer as necessidades do nosso cliente, quer a nível económico quer ao nível de congestionamento de viaturas. Falou nos combustíveis alternativos – esse tópico não consta do rol de apostas da MAN? Ao nível do gás natural, temos uma gama em autocarros, que foi uma aposta muito reconhecida, inclusivamente aqui em Portugal. Mas, nos camiões, a nossa aposta saltou por cima dessa fase. Como devem imaginar, era extremamente simples para nós enquanto marca – dado que temos todo o know-how vindo dos autocarros – passar essa experiência para os camiões, mas, aí, a aposta é claramente a Electromobilidade. Foi essa a decisão estratégica do Grupo – no caso da MAN, seguir o caminho da Electromobilidade, sendo que no grupo também temos quem aposte no gás natural. Que desenvolvimentos têm tido a esse nível? Curiosamente, em Portugal temos já alguns interessados. Nós neste momento estamos a fazer testes na Escandinávia e já temos pessoas a perguntar-nos ‘quando? Como? Onde?’, pois estão interessados em realizar testes. Este ano teremos o lançamento da TGE eléctrica também, que vem no sentido da mobilidade eléctrica e, por incrível que pareça, existe o interesse em Portugal. Acreditamos que chegará cá mais rápido do que se pensa, apesar do grande investimento que representa – não que o retorno não seja fácil. Existe sim, um grande paradigma e um grande fantasma face àquilo que é o investimento num veículo com esta tecnologia em relação ao diesel, mas no custo de operação diária, o custo é residual quando comparado com um veículo a diesel. LUÍS PEREIRA: É algo que está a andar para a frente, com força. Inclusivamente, já tivemos, no ano passado, um camião eléctrico no congresso da ANTRAM, e este criou furor. E em relação à autonomia, como é que a MAN pensa resolver esse problema? A autonomia dos carros eléctricos é um falso problema, pois a autonomia pode ser aquela que nós quisermos que seja. A única coisa que temos que balancear é a carga útil da viatura. Há um passo que tem de ser dado pelos fabricantes de baterias: decidir que tecnologia irão utilizar e se irão optar pelo chumbo tradicional ou pelo lítio. Para resolver esse problema e essa indecisão, nós, enquanto Grupo, resolvemos fazer um investimento brutal numa fábrica de baterias, portanto, nós próprios vamos desenvolver as nossas baterias em função das nossas necessidades. A MAN, é, dentro do grupo, a marca que está a servir de rampa de lançamento para essa tecnologia e vamos aproveitar essas sinergias. Acreditamos na mobilidade eléctrica, mas também acredito que acontecerá aqui um passo intermédio com híbridos. Recorde que este ano já fizemos o lançamento de um autocarro com essa tecnologia. Acredito também que ainda faremos umas 2.500 entrevistas como esta e ainda viajaremos para a entrevista num carro de combustão interna e falaremos de carros de combustão interna.

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Qual o factor que contribui para que o processo seja mais rápido ou mais lento? Só há duas formas de tornar o processo mais rápido: ou surge regulamentação que obriga os fabricantes a adaptaremse a essa regulamentação, ou é o próprio mercado exige esse tipo de alterações. Se nós olharmos 10 anos para trás, não existia vertente eléctrica, os motores eram Euro0, e agora já são todos Euro6. Com muita facilidade, qualquer um de nós já mete adblue no nosso próprio carro. Eu penso que os fabricantes já estão todos na linha de partida para arrancar, mas vamos, entretanto, damos umas voltas de aquecimento para quando soar o disparo, toda a gente correr a toda a velocidade. Há também aqui um efeito que tem de ser contornado, e nós aqui em Portugal também temos de o contornar: o abastecimento eléctrico é, aparentemente, fácil nas grandes cidades, no entanto, não vendemos produtos que estarão parqueados num parque de um centro comercial a carregar. Estamos a falar de viaturas de estrada que fazem muitos quilómetros, e postos de abastecimento eléctrico numa A1, por exemplo, neste momento existem 3, e a velocidade de carregamento não é assim tão grande quanto isso. Ora, se nós temos condutores que têm timings, e têm até condicionantes de períodos de condução, e estes forem obrigados a estar muito tempo inactivos à espera do carregamento, nem a mercadoria chega no devido tempo, nem o nosso cliente tem o retorno. Será a troca de baterias a solução? Eu acho que as nossas áreas de serviço tendem a assimilar-se à realidade de outros países, em que a área de serviço serve para descansar, comer, e, quanto muito, abastecer o veículo. Não me parecesse que haja disponibilidade para fazer operações de manutenção, porque estamos a falar de baterias com dimensão e peso consideráveis. Isto para dizer que não acredito nessa solução. Acredito sim na melhoria dos sistemas de carregamento, e isso será possível. Daí entender que o híbrido é um caminho que pode, de facto, ser seguido, e no qual a própria energia cinética pode ser usada para carregar as baterias. Em relação à falta de motoristas – como encaram os fabricantes este crescente fenómeno? Encaramos isto com alguma, para não dizer muita, preocupação. Efectivamente, os nossos clientes têm necessidades de investimento todos os anos, uns por renovação de frota, outros por novos contratos, e acabamos por ver as viaturas muitas vezes paradas, ou os investimentos adiados, porque não há motoristas. LUIS PEREIRA: Aqui há um factor importante – além da questão da segurança, a MAN sempre faz questão de ter um assinalável conforto típico de uma cabine agradável, para que o motorista, quando tiver de optar entre uma empresa onde terá camiões que não proporcionem o mesmo nível de conforto e uma empresa onde os camiões são MAN, 34

opte por esta última. Queremos também contribuir, dessa forma, para ajudar os nossos clientes, atraindo os motoristas. Outra das questões prende-se com a telemetria, através da qual o gestor de frota consegue monitorizar o desempenho do motorista e isto também ajuda a manter os poucos bons motoristas que existem no mercado. DAVID CARLOS: Nós também apostamos noutro aspecto, que é a formação, para todos os camiões que vendemos. Providenciamos formação ao motorista que o vai conduzir. Um dos aspectos apontados para a pouca atractividade da profissão é o facto de os camiões não estarem adaptados aos dias de hoje e às exigências das novas gerações… Sim, e estamos neste momento a agora sentir a factura dos anos da crise, pois nessa altura os poucos investimentos que eram feitos foram direccionados para camiões mais ‘despidos’, porque as empresas debatiam-se com graves problemas de liquidez e precisavam de rentabilidade máxima. Então reduziu-se ao mínimo tudo aquilo que era conforto que não fosse operacional. Neste momento já recuperamos um pouco, mas sabemos que os motoristas não desapareceram, ‘fugiram’, muitos deles, para o país vizinho, porque a tipologia de camiões que se vende em Espanha é nitidamente diferente daquela que se vendia em Portugal. Na MAN temos a particularidade do tractor TGX, munido de uma cabine muito acima da média e com uma habitabilidade consideravelmente superior, e pode ser este um caminho para melhorar a atractividade da profissão. Tivemos recentemente um cliente para o quem o factor primordial de decisão era precisamente a dimensão da cabine. Ele explicava: «Eu tenho de ter camiões onde os homens se sintam confortáveis e possam descansar». Isto mostra que a questão não se resume apenas à parte económica. Quanto à condução autónoma – quando é que acredita que esta será uma solução efectiva? Eu diria que na nossa cabeça essa solução estará muito perto, mas, na prática, acredito que esteja ainda longe. Pelas mesmas razões do platooning, que está previsto para 2025. Creio que só após o platooning estar a 100% - e seja verificado o seu sucesso – é que a condução autónoma poderá ser uma solução real. No entanto existem, de facto, vários desenvolvimentos, até nos veículos que estão no mercado, como a TGE, que já incorpora sistemas que podem ser considerados semi-autónomos, como o park assist, o cruise control adaptativo. No final, a ideia será juntar os sistemas e colocálos a trabalhar em conjunto – aí é que está o desafio. Sobre o seu novo cargo – quais os factores aliciantes e os maiores desafios desta nova etapa profissional? A razão de querer abraçar este projecto, foi, precisamente, o desafio que representa. Esta organização é uma organização extremamente estável e capaz. Digamos que, do ponto de vista tecnológico, www.revistacargo.pt

estamos a falar de uma potência ao nível do desenvolvimento e também ao nível da qualidade. O desafio em Portugal passa muito pela tarefa de vincar o peso da marca, de uma forma mais coerente e estável para o mercado, razão pela qual, está um português nesta função. O Grupo entendeu, claramente, que a passagem de informação terá de ser feita por um local. Temos desafios a vários níveis – um deles, que abordei de modo muito pessoal, tem a ver com nível de serviço, pois nós acreditamos que o futuro passa pelo serviço. Não a venda propriamente dita, não o pósvenda tradicional (de reparação quando o carro avaria). Nem eu nem o Grupo acreditamos nisso, acreditamos sim num serviço global ao cliente: este necessita de um veículo, nós encontramos um carro para ele e efectuamos a venda da forma que lhe for mais conveniente; mas, além disso, o cliente pode chegar até nós e dizer: ‘eu tenho um projecto, esse projecto comporta x euros por quilómetro, este serviço tem estes tempos de imobilização: MAN o que é que conseguem fazer por nós?». E aí também queremos estar presentes. Esse serviço poderá incluir a mobilidade partilhada? Não inclui para já, pois claramente, nesta área, ainda existem alguns constrangimentos empresariais nesse sentido. Temos vindo a transformar a cultura da empresa, para acabar com os departamentos e direcções para sermos uma empresa global que presta um serviço global. Haverá sempre especialidades, mas o nosso cliente poderá bater a qualquer porta e seja qual for a sua necessidade, ela será resolvida. A própria forma como estão a ser desenvolvidas as plataformas do MAN Service Care, vai nesse sentido: existe uma globalização da empresa e do serviço, para que o cliente no final se sinta confortável. No limite, entendemos que a decisão da escolha entre a marca A, B ou C, tem muito a ver com o nível de confiança que o cliente tem na marca. Na teoria, um camião é algo que serve para transportar mercadoria entre o ponto A e o ponto B, mas nós acreditamos que, nesse percurso, quanto melhores e agregadores forem os nossos serviços, maior será a eficiência do percurso. O desafio é este: fazer parte de uma organização em mudança, organização essa que tem um background histórico fantástico, todo um know-how de uma presença fortíssima na Europa, e isso é o que queremos fazer em Portugal. Não o facto de sermos a marca que mais vende, mas sim o desígnio de estabelecermos relações de confiança com os nossos clientes. O que todas as marcas ambicionam é serem parceiras dos seus clientes – nós queremos elevar isso para outro nível, e para nós o importante é que, no final do ano, existam resultados verificados em relação a essa parceria.


A CORRIDA AO HYPERLOOP: A FICÇÃO CIENTÍFICA QUE JÁ DEIXOU DE O SER

Imagine que, através de um passo de mágica, poderíamos transportar mercadorias a velocidades ultra-sónicas através de um inovador tubo saído dos típicos filmes de ficção científica? Não precisará de imaginar por muito mais tempo, pois tal cenário tornar-se-á realidade: o nome é Hyperloop, clama estar à beira de revolucionar o universo do transporte de cargas e está longe de ser produto da ficção. Idealizado a partir do vactrain do histórico físico e inventor Robert Goddard e dos designs da joint venture entre a Tesla e a SpaceX, o conceito define um sistema de transporte de alta velocidade que recorre a uma infra-estrutura tubular (de baixa pressão) selada para projectar, sobre um fluxo constante de ar pressurizado, cápsulas de transporte capazes de viajar sem resistência do ar ou de qualquer outro atrito, podendo atingir velocidades na ordem dos 1200 quilómetros por hora. Não se trata de magia – o magnata Elon Musk que o diga: considerado um dos principais impulsionadores do conceito, o CEO da Tesla publicitou-o pela primeira vez em 2012, explicitando os pilares do funcionamento do revolucionário sistema conceptual que estará, brevemente, apto para transportar mercadorias e até passageiros. Caracterizado por Musk como «um quinto meio de transporte», o Hyperloop passou do domínio conceptual para o reino material em 2015, com o tiro de partida da corrida à concretização do projecto a ser dado por várias companhias internacionais apostadas em desenvolver, não apenas os protótipos mas também infra-estruturas de teste – «O chamado ‘Movimento Hyperloop’ é já oficialmente maior que o homem que o iniciou», escrevia o Wall Street Journal em Novembro desse ano,

num artigo de Alexander Chee intitulado ‘The Race to Create Elon Musk’s Hyperloop Heats Up’. As primeiras fases de testes ocorreram em Maio de 2016, com o sistema de propulsão a disparar uma plataforma metálica a cerca de 2.4G, ou seja, disparando-a até aos 85 quilómetros por hora em apenas um segundo. Positivos prenúncios que o tempo se encarregou de efectivar. A corrida à materialização do Hyperloop afunilou-se até coroar dois colossos que, actualmente, são tidos como os grandes contendores à introdução cabal do conceito no universo do transporte de mercadorias: a Hyperloop Transportation Technologies (HTT), presidida por Bipop Gresta e sustentada por uma forte vertente de crowdsourcing e a Hyperloop One, presidida pelo excêntrico magnata Richard Branson e apoiada pelo investimento da gigantesca Virgin. Julho de 2017 marcou o irreversível progresso da nova tecnologia: os derradeiros testes de fogo levados a cabo no Estado americano do Nevada pela Hyperloop One provaram a viabilidade do sistema e confirmaram, ao mundo, que o conceito não voltaria para a gaveta. Seria, sim, uma inevitável realidade dentro de poucos anos. «Pela primeira vez em mais de 100 anos, um novo modo de transporte foi introduzido. O Hyperloop é uma realidade, e já chegou», referia, na ressaca dos testes, Shervin Pishevar, cofundador e, à data, presidente executivo do Hyperloop One. «Alcançando o vácuo total, basicamente inventámos um céu próprio dentro de um tubo, como se estivéssemos a voar a 200.000 pés», descreveu. O interesse gerado pela evolução do conceito teve três epicentros www.revistacargo.pt

principais que, desde 2016, lideram o desenvolvimento do Hyperloop: os Estados Unidos da América (EUA), os Emirados Árabes Unidos e a Índia. Os passos iniciais foram dados em solo americano: depois dos sucessos dos testes em Las Vegas e Los Angeles, o país acordou para o frenesi do Hyperloop, equacionando a construção de uma ligação entre as cidades de Chicago e Cleveland, ambas consideradas pólos logísticos importantes dos EUA e como regiões economicamente capazes de dinamizar a cadeia de abastecimento norte-americana. A materialização dessa ligação ganhou força com a assinatura de um acordo entre as entidades North Ohio Areawide Coordinating Agency (NOACA), a Illinois Department of Transportation (IDOT) e a companhia americana HTT. Através do marcante estabelecimento desta parceria, as três organizações comprometeramse a elaborar um exaustivo estudo de exequibilidade que componha um cenário de transporte que ligue os hubs das duas cidades de Chicago e Cleveland através deste novo conceito tecnológico. «Lugares como Cleveland, Chicago e Pittsburgh possuem a manufacturação, as matérias-primas, o talento e trabalhadores esforçados para que as coisas aconteçam», disse Andrea La Mendola, chefe de operações da HTT. Segundo a companhia, vários virtuais corredores entre as duas cidades foram já identificados, contudo, esta não é a única acção com vista ao estabelecimento de uma ligação entre Chicago e Ohio: a Mid-Ohio Regional Planning Commission tem vindo a trabalhar com a concorrente da HTT, a Virgin Hyperloop One, para no projecto chamado ‘Midwest Connect’, que se 35


propõe a ligar Pittsburgh a Chicago via Columbus. A proposta de ligação, que levou à sinergia de esforços entre a comissão de Columbus e a Virgin Hyperloop One, contou já como os apoios dos governadores de Ohio, Indiana e também do Departamento de Transportes de Ohio. Mas a febre do Hyperloop também já chegou, intensamente, ao Médio Oriente – depois de plantar a sua bandeira em terras do Uncle Sam, a HTT expandiuse para os Emirados Árabes Unidos, ao firmar, com a Aldar Properties, uma das grandes promotoras imobiliárias de Abu Dhabi, um acordo para o desenvolvimento de uma conexão de cariz comercial que ligará os emirados de Abu Dhabi ao Dubai – a linha estender-se-á por dez quilómetros e terá vasos comunicantes com o Aeroporto Internacional de Dubai e o perímetro que albergará o evento da Expo 2020. Em projecto semelhante trabalha também a Hyperloop One, mas na Índia: a empresa presidida por Branson já encetou os planos de construção de uma ligação entre os portos indianos de Mumbai e Pune, na sequência de um protocolo de cooperação com o Estado regional de Maharashtra. A ligação terá potencial para conectar o coração de Pune ao novo aeroporto da segunda maior cidade da Índia (o New Pune International Airport) e o porto Jawaharlal Nehru, em Mumbai, às zonas industriais económicas de Pune. DP World sem medo de fazer ‘all in’ no projecto de Richard Branson A aposta da Virgin Hyperloop One na Índia como pólo de desenvolvimento da tecnologia de transporte obedece a um desígnio estratégico da emiradense DP World – a poderosa operadora de terminais foi uma das grandes financiadoras do projecto e, desde cedo, se colocou ao lado da companhia californiana na persecução da materialização do Hyperloop. Em recente entrevista, o CEO da operadora sediada no Dubai (que em 2017 gerou receitas de 4.7 mil milhões de dólares) Ahmed bin Sulayem, sublinhou a importância estratégica da Índia no contexto das operações da DP World e recordou o investimento próprio, de cerca de 3 mil milhões de dólares, com o intuito de dinamizar o sector industrial indiano. O Hyperloop One será trave mestra nesta equação estratégica, fomentando o crescimento logístico e industrial do país e devotando ao sucesso a astronómico valor investido pela companhia árabe - isto porque, na visão do CEO da DP World, o ponto fraco da Índia não é o seu sistema portuário mas sim o «transporte da carga até ao cliente final e vice-versa». Uma necessidade que encaixará que nem uma luva no potencial da nova tecnologia, ou não tivesse garantido a Hyperloop One que o seu grande trunfo será «a célere movimentação de fretes de paletes e carga ligeira», especialmente, no futuro imediato, «entre o Porto de Mumbai e Pune, criando uma robusta espinha dorsal para entregas on-demand, cadeias de abastecimento e logísticas do futuro». Com um investimento superior a 50 milhões de dólares no potencial da Virgin Hyperloop One, a DP World tornou-se num dos grandes patronos do conceito, um ano depois de ter inaugurado a estreita cooperação com a Hyperloop One – em 2016, ambas as empresas haviam já projectado a instalação de um sistema de Hyperloop destinado apenas para a carga movimentada através do Porto de Jebel Ali, nos Emirados Árabes Unidos (o nono porto mais movimentado do mundo). Na sequência do novo investimento, o presidente e famoso magnata Richard Branson vincou a satisfação pelo apoio da DP

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World: «O recente investimento dos nossos parceiros permite à empresa perseguir oportunidades cruciais nos mercados do Médio Oriente, Europa e Rússia, ao ser capaz de desenvolver um modelo inovador de transporte terrestre», declarou, recordando o sucesso das prévias fases de testes, nas quais foram atingidos 387 km/h e se verificaram a fiabilidade do motor eléctrico e a levitação magnética da composição. A terceira fase de experimentação decorreu num tubo despressurizado com condições que recriavam a pressão atmosférica sentida a cerca de 600 metros abaixo do nível do mar. «A terceira fase de testes continua a provar a incrível persistência e grande determinação da nossa equipa DevLoop, feita de 200 engenheiros, maquinistas, soldadores e fabricantes, todos eles a trabalharem para tornarem o Hyperloop uma realidade», comentou Josh Giegel, co-fundador da Virgin Hyperloop One, em Dezembro de 2017. DP World CargoSpeed: a ambição de uma ultra-mobilidade entre as ligações terrestres e os portos A ligação estratégica entre a Virgin Hyperloop One e a DP World afigura-se, cada vez mais, como a mais preparada sinergia para liderar a abrangente implementação do novo sistema de transporte terrestre a uma escala global – para atestar o valor dessa afirmação basta contemplar a criação da DP World CargoSpeed, a uma entidade que proporcionará sistemas de carga adaptados para retirar os proveitos da tecnologia Hyperloop, rumo a uma entrega de cargas paletizadas mais «rápida, sustentável e eficiente», como explicaram ambas as empresas, em comunicado conjunto divulgado no passado mês de Maio. Este pioneirismo propõe-se a providenciar «um serviço excepcional para mercadorias de alta prioridade, entregando a carga na velocidade do voo a um custo próximo ao do oferecido pelo transporte rodoviário». «A carga sempre foi o catalisador de revoluções no transporte. Fizemos um investimento significativo na Virgin Hyperloop One porque vemos a necessidade de uma rede de carga habilitada para o Hyperloop de entregas rápidas em todo o mundo. Acreditamos na visão de longo prazo da Virgin Hyperloop One, são o parceiro certo para moldar o futuro da logística global», declarou Ahmed Bin Sulayem. As palavras do CEO da DP World são ambiciosas mas concretizáveis: a tecnologia promete interligar os portos às infra-estruturas ferroviárias e aos perímetros logísticos de forma ultra-veloz, criando uma rede de artérias capaz de agilizar, como nunca, as cadeias de abastecimento, retirando pressão às vias rodoviárias e contribuindo para a criação de mega-zonas económicas. Numa das suas recentes intervenções, Richard Branson dissertou sobre o paralelismo entre a transformação dos padrões de consumo dos clientes e a busca por um sistema de transporte de mercadorias sustentado por uma velocidade (muito) acima da média, assim justificando, de certa forma, a necessidade da aposta neste revolucionário método – «O crescimento global do comércio electrónico conduziu a uma mudança radical no comportamento do consumidor e do negócio», sendo essencial que a esfera logística se adapte às novas exigências de um padrão de consumo cada vez mais veloz, automático e interdependente».

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Bruno Falcão Cardoso


TIM POTOCNIK (EUROSENDER): «DIGITALIZAÇÃO É UM ELEMENTO FULCRAL QUE IRÁ TRANSFORMAR A LOGÍSTICA» O crescimento meteórico mas sustentado da Eurosender não tem passado despercebido – a plataforma digital 3PL, focalizada nas entregas porta-a-porta no continente europeu, cresce a olhos vistos também em Portugal, país onde actua desde 2015. Tivemos, assim, a oportunidade de ouro para conversar com Tim Potocnik, CEO da Eurosender, que nos fez uma retrospectiva do percurso da companhia e traçou as metas de um futuro que se espera ser pautado pelo crescimento generalizado nos vários países onde a marca desenvolve a sua actividade. Revista Cargo: A Eurosender foi fundada em 2014 e tem, desde então, experienciado um crescimento sólido e progressivo – conte-nos um pouco sobre essa mesma evolução, desde a génese da empresa até aos dias de hoje. A Eurosender foi fundada após ter sentido na pele a dificuldade em enviar alguns pacotes da Polónia, onde estive a estudar, para a Eslovénia, o meu país de origem. Lembro-me de como os serviços de logística eram caros e confusos naquela época. Era praticamente impossível fazer um pedido de um envio online; em vez disso, tive que ligar e enviar e-mail para empresas de distribuição individualmente. Escusado será dizer que levei imenso tempo. Nesse momento pensei para comigo mesmo que provavelmente não seria o único a ter que enfrentar este tipo de problemas. Liguei para o meu amigo Jan Stefe e juntos começámos a desenvolver a Eurosender - uma plataforma online onde as pessoas podem enviar os seus pertences em 3 minutos ou menos com preços até 70% mais baratos do que a oferta habitual. Tivemos o nosso primeiro grande empurrão quando nos juntamos ao acelerador Pro SiebenSat 1 em Outubro de 2014. O acelerador - parte de uma empresa de Media multinacional alemã - que nos ajudou com consultoria sobre tudo, de marketing e vendas, com as

questões legais e de administração, mas acima de tudo nos apresentou executivos em quase todas as principais empresas de logística europeias (DPD, DHL, Kuehne + Nagel, GLS). Nos meses e anos seguintes, estreámonos em 30 novos mercados, fizemos novas parcerias (entre outras, com o grupo alemão de seguros Ergo e a rede britânica de pontos de recolha Parcelly) e aumentámos investimentos de business angels, venture capitals e corporações – sendo a mais recente a POST Luxembourg. Também desenvolvemos novos serviços e recursos como entrega de paletes, aumentámos substancialmente a equipa (actualmente somos 40) e abrimos escritórios em toda a Europa para fornecer melhor atendimento ao cliente, desenvolver novos serviços e crescer ainda mais, até nos tornarmos uma das maiores plataformas logísticas online globais. O ano de 2017 voltou a não desiludir e marcou novo passo de evolutivo da Eurosender – quais os resultados financeiros e os volumes apresentados? No ano passado, duplicamos os resultados de 2016, registando cerca de 150.000 clientes entre os consumidores finais e mais de 30.000 em torno de Pequenas e Médias Empresas (PME’s). Tendo em conta este desenvolvimento sustentável, quais as perspectivas www.revistacargo.pt

para este ano? Tal como no ano passado, contamos pelo menos duplicar os resultados em 2018. E considerando o crescimento actual, estamos no caminho certo para alcançar estas metas. Em que moldes tem sido levada a cabo a evolução no contexto do mercado português? A Eurosender está em Portugal quase desde o seu início. Depois da Eslovénia (o nosso país de origem) e da Croácia, decidimos que Portugal seria um mercado perfeito para ver se a Eurosender é realmente interessante para mercados externos àqueles que conhecíamos bem. Em 2015, fomos para Lisboa, comprámos um bilhete de avião de ida e dissemos que ficaríamos o tempo necessário para gerar a primeira venda. Em apenas algumas semanas, conseguimos fazer exactamente isso. Portugal cresceu e tornou-se no nosso melhor mercado em termos de vendas em 2017. Representou mais de 10% do volume total em todos os 30 mercados. Actualmente, cerca de 15% de todos os nossos clientes são portugueses. Estes dados indicam a significância deste mercado para nós e - em relação aos resultados de 2018 até o momento – vai continuar a crescer de forma significativa. Quais são, para a Eurosender, as oportunidades e os desafios nesse

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mesmo mercado português? Estamo-nos a concentrar no crescimento em todos os segmentos. Em Portugal, queremos especialmente chegar às empresas portuguesas - aquelas que começaram a experimentar o e-commerce, por exemplo. A Internet é a forma ideal para investir num negócio, mas enviar produtos sempre foi um incómodo. Acredito que podemos ajudá-las a superar esses obstáculos.
 Há muitos portugueses a residir no exterior. Além disso, Portugal é também um dos destinos mais populares para estudantes do programa de intercâmbio Erasmus. Recebeu 12600 estudantes em 2016 – da grande maioria dos países da Europa, se tivermos em conta o seu tamanho. Estes são todos nossos potenciais clientes. Já estamos a começar a trabalhar com eles e continuaremos a fazê-lo oferecendo serviços cada vez melhores e preços mais acessíveis.

É verdade, contudo, que os portugueses são um pouco cépticos no início (querem saber como o serviço funciona), mas quando correspondemos à expectativa, tornam a recorrer ao serviço - a taxa de retenção entre os portugueses está entre as mais altas para nós. Quais são os grandes desafios do sector de actividade da Eurosender à escala global? No geral, o sector da logística está sob enorme pressão devido ao crescimento massivo do comércio online B2C e dos novos modelos de logística, enquanto as empresas tradicionais (provedores de logística tradicionais) são desafiadas por novos players, desde as operadoras de correios e a Amazon, até concorrentes como a 38

Eurosender. Outro desafio importante para eles é reestruturar a infra-estrutura criada outrora para responder melhor às necessidades e expectativas dos clientes de hoje. As empresas de logística precisarão de melhores ferramentas de TI para melhorar não só as interacções com o cliente, mas também o processo interno de forma a compreenderem melhor os clientes. Tendo em conta a tipologia da oferta da Eurosender, quão importante é o fenómeno crescente da digitalização no contexto da Logística 4.0? Considero a digitalização como um elemento fulcral que irá transformar a logística e os processos da cadeia de suprimentos em sistemas altamente integrados e eficientes. As empresas que já estão a implantar o sistema de paletes inteligentes, sistemas de gestão de armazéns, portais de comunicação com apoio de IA ou sistemas de transporte automáticos terão uma enorme vantagem em comparação com todos os outros que ainda se estão a perguntar o que fazer. É claro que, na maioria dos casos, as empresas menores não têm capacidade económica ou conhecimento para desenvolver soluções internas que automatizem a logística. Esses terão de se voltar para o fornecimento de tecnologia por terceiros, mas na minha opinião, apenas um punhado deles acabará por servir 80% do mercado. Nesse aspecto, quais os grandes trunfos competitivos oferecidos pela Eurosender? Há algumas vantagens que a Eurosender oferece. Em primeiro lugar, oferecemos apoio ao cliente e suporte de vendas no idioma nativo. Temos, por exemplo, três www.revistacargo.pt

pessoas que dão resposta a contactos telefónicos e e-mails em português. Isso ajuda muito a estabelecer uma relação de confiança e de longo prazo com clientes em países específicos. O mesmo vale para os nossos sites; estes são traduzidos em quase todos os idiomas europeus - também estamos a trabalhar arduamente para fornecer conteúdo adicional (blog posts, por exemplo) em idiomas, além do inglês. 
A segunda coisa é a plataforma por si só, que se torna mais inteligente com quantos mais dados receber. Desenvolvemos um algoritmo de processamento de dados que de base que é capaz de analisar a taxa de sucesso das entregas num determinado destino. Em seguida, combina os dados sobre a confiabilidade dos correios com seus preços (actualmente, temos mais de 100 milhões de cotações no nosso banco de dados) e, no final, surge a melhor combinação possível para o cliente. Tudo isto leva apenas alguns segundos. Acredito que no mundo em que as pessoas estão a exigir cada vez melhores serviços e mais intuitivos (e com razão), implementar este tipo de solução tecnológica é a única forma de nos mantermos à frente. Em terceiro lugar, somos capazes de fornecer cotações imediatas e finais, não só ao realizar as encomendas em pacote, mas também com paletes somos os únicos capazes de fornecer este tipo de serviço a nível europeu. E, finalmente, trabalhamos com os nomes mais respeitados do sector de logística. Ao longo dos anos, estabelecemos uma rede de mais de 100 parceiros de distribuição que entregam fisicamente o pacote que agendado pelo cliente na nossa plataforma. Entre eles estão a DHL, a DPD, a GLS e a Kuehne.


BREVES TERRESTRE E LOGÍSTICA

Medway anuncia contratação de 37 novos operadores de manobras para diversas zonas do país A Medway anunciou no passado dia 5 de Julho, a contratação de 37 novos operadores de manobras para diversas zonas do país, particularmente para Leixões, Gaia, Pampilhosa, Souselas, Louriçal, Entroncamento, Bobadela, Poceirão, Praias Sado e Penalva. O operador informa ainda que, as contratações para estas localizações visam dar resposta à necessidade de atender ao volume e também à dispersão da actividade a nível nacional. Estas contratações implicaram ainda a aplicação de formação específica e exclusiva para as funções, num total de 318 horas, das quais 80 foram dedicadas es-

pecificamente a estágio prático. Esta é uma área de enorme relevância e criticidade para a segurança da actividade o que explica a forte componente prática desta formação. Plano estratégico prevê mais investimentos significativos «Este processo de recrutamento insere-se também no plano estratégico da Medway para os próximos anos que, para além de alargar o número de colaboradores, prevê investimentos significativos em equipamentos, bem como em estruturas de apoio à actividade», explicou Carlos Vasconcelos, Administrador da Medway.

Pacote de Mobilidade rejeitado pela segunda vez com sindicatos a reclamarem vitória Foi rejeitado, pela segunda vez, o chamado Pacote de Mobilidade, que regressa agora à Comissão dos Transportes para ser revisto. Relembre-se que este pacote, apresentado em Maio de 2017 pela Comissária dos Transportes, Violeta Bulc, continha medidas concretas relacionadas com os tempos de descanso, bem como limites de cabotagem e salários mínimos dos motoristas profissionais. Sindicatos congratulam-se com a decisão «Esta rejeição representa um duro e novo revés para a Comissão Europeia e uma vitória momentânea para o movimento sindical», reagiu a Federação de Serviços para a Cidadania, que se opunha a algumas das propostas que considera representarem um «claro retrocesso nos direitos dos motoristas profissionais». «Apesar das importantes modificações introduzidas no Pacote, como a inclusão do controlo nos veículos que

realizam transporte internacional com mais de 2,4 toneladas máximas autorizadas, a não exclusão do transporte de passageiros, e o ter acedido a algumas das pretensões dos sindicatos, como a manutenção dos tempos actuais de condução e descanso, consideramos que há ainda inúmeras propostas que visam uma maior protecção do trabalhador, que não foram sequer levadas em consideração». IRU demonstrava preocupação em Junho Não apenas os sindicatos se demonstravam descontentes com as propostas apresentadas e, ainda no passado mês de Junho, a União Internacional dos Transportes Rodoviários (IRU) identificava uma «confusão caótica de interpretações nacionais» e defendia ser «urgentemente necessários acordos para assegurar que o sector dos transportes rodoviários continuam a impulsionar a economia europeia».

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OPINIÃO A REVERSÃO DA PRIVATIZAÇÃO DA TAP E DE OUTRAS CONCESSÕES

Em Novembro de 2015, concretizou-se o longo processo de privatização da TAP, depois do Governo de José Sócrates o ter incluído no pacote de privatizações que negociou com a Tróica. Doutro modo, não teria os 78 mil milhões de euros que tinha pedido, para honrar compromissos do Estado e evitar a bancarrota do nosso País Por isso, a partir de então, a TAP deixava de ser uma empresa pública para ser uma empresa privada, com 61% do seu valor na posse do consórcio Atlantic Gateway, liderado por Humberto Pedrosa e David Neeleman, dono da companhia aérea brasileira Azul. Porém, em Fevereiro de 2016, o primeiro-ministro António Costa decidiu reconverter a privatização e tentar convencer os novos donos da TAP a aceitarem a redução do seu capital, a favor do Estado. Ou seja, ao exigir 51% do seu capital no Estado, António Costa pretendia apropriar-se da TAP! No entanto, as negociações com o consórcio Atlantic Gateway não correram bem ao primeiro-ministro e, como retaliação, fez ameaças e garantiu em Bruxelas que o acordo seria feito «a bem ou mal»! Uma atitude de prepotência política, como se vivêssemos num regime ditatorial… Entretanto, António Costa não esclareceu, como devia, quais foram as contrapartidas que deu aos accionistas do consórcio Atlantic Gateway, para deixarem de ter 61% do capital da TAP! Um processo de reversão que, segundo Humberto Pedrosa e David Neeleman, foi feito com «opacidade e falta de transparência»… Mais tarde, António Costa aceitou que o Estado ficasse com 50% do capital da TAP. E isso obrigou o Estado a pagar 1,9 milhões de euros ao consórcio Atlantic Gateway, como compensação da alteração do contrato de privatização. Curiosamente, Diogo Lacerda Machado, amigo do primeiroministro, tinha participado na negociação do contrato de privatização da TAP com o Governo de Passos Coelho. Esta danosa alteração foi contestada por partidos políticos e trabalhadores da TAP, por ser um negócio com contornos insólitos… Foi uma operação, em que o Estado pagou caro o maquiavélico malabarismo ideológico de António Costa. Por alguma razão, os accionistas privados, com apenas 45% do capital da TAP, ficaram a mandar e a gerir a empresa! Em 11 de Fevereiro de 2016, o ministro das Infra-estruturas afirmou que «o governo conseguiu assumir uma posição efectiva na TAP» e que «nenhuma decisão relevante para a

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empresa será feita sem o acordo do Estado». Uma falácia do ministro Pedro Marques, que parece ignorar que quem toma decisões na TAP é o consórcio Atlantic Gateway e não o Estado. Além do ministro, em 13 de Fevereiro de 2016, António Costa também afirmou que «é um acordo que satisfaz aquilo que nos interessava, que era assegurar o controlo estratégico perene dos destinos da empresa». É mais uma falsidade do primeiro-ministro, depois ter sido derrotado na sua pretensão de ter 51% do capital da TAP, no Estado. Num encontro partidário, realizado no Norte, António Costa garantiu «que o Governo vai defender a manutenção de uma base no Aeroporto do Porto e respectivas rotas». Pouco tempo depois, o ministro Pedro Marques desmentiu-o, afirmando que «o Estado não tinha nada a ver com rotas!» É verdade, mas esqueceu-se de acrescentar que o Estado também não pode interferir na gestão da TAP! No meio desta trapalhada socialista, o ministro Mário Centeno não queria reverter a privatização da TAP. E, em 12 de Fevereiro de 2016, afirmou ao canal americano CNBC, que «a TAP continua a ser uma empresa privada» e que a solução Costa favorece «os investidores privados em termos de retorno do investimento». Esta afirmação, revela a sua ignorância sobre a débil situação financeira da TAP… Apesar disso, acrescentou: «Não mudámos a natureza da empresa enquanto uma companhia privada, continuará a ser assim». Antes, porém, Mário Centeno tinha sido desautorizado por António Costa e calou-se... Preferiu engolir mais um sapo! O último, foi quando não concordou com as 35 horas semanais para os funcionários públicos. Em 3 de Maio de 2015, na oposição, António Costa afirmou que a TAP «garante a soberania nacional» e que perder esse valor, «é um risco enorme para o futuro do País». Ou seja, para o primeiro-ministro, defensor da estatização do sector privado, a falida TAP é que representa a soberania de Portugal e garante o seu futuro! Uma idiotice política, que evidencia ignorância e falta de sentido de Estado. De facto, seguindo a sua tese socialista, o Governo de Passos Coelho deveria ter desistido da privatização da TAP e colocado na empresa, mais alguns milhares de milhões de euros do Estado! Esta era a receita funesta de António Costa, para governar Portugal. Um País levado à bancarrota pelo Governo de José Sócrates, do qual ele foi ministro e braçodireito do então primeiro-ministro…

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J. Martins Pereira Coutinho José Martins Pereira Coutinho entrou em 1958 na KLM Royal Dutch Airlines. Foi depois Director da KLM Cargo para Portugal, lugar que ocupou até à aposentação. Publicou inúmeros artigos e livros sobre a indústria de transporte aéreo.

Mas o mais grave é que, na sua opinião, mesmo que não houvesse recursos do Estado para fazer a sua capitalização, a solução deveria ter sido «aumentar o capital da TAP por via da sua dispersão em bolsa», recusando perder a posição maioritária do Estado no capital da empresa. Resta saber, porém, onde e como António Costa iria arranjar dinheiro para pagar as dívidas da TAP, depois do Banco Espírito Santo ter falido e deixado de existir…

Esta dívida de 800 milhões de euros vai ser paga por todos os contribuintes e não apenas por aqueles que vivem em Lisboa, se a dívida permanecesse na CML. Isto foi confirmado por António Costa, ao afirmar «que acabou o tempo de gerir para o EBITDA e é preciso gerir para os clientes». Assim, seguindo a sua cartilha populista, outras empresas públicas de transportes poderão também exigir que as suas dívidas sejam pagas pelo Estado!

Esta leviandade política, mostra que António Costa queria que os Portugueses, utilizassem ou não a TAP, pagassem a sua recapitalização. O seu objectivo era pôr o Estado a pagar a incompetência dos gestores da empresa e dos amigos que lá colocou, entre os quais Lacerda Machado e a mulher do presidente duma Câmara socialista…

Depois desta benesse do primeiro-ministro, Fernando Medina, presidente da CML, anunciou que iria baixar o preço dos passes de transporte para jovens e idosos, contratar mais 220 motoristas e adquirir 250 novos autocarros! Um negócio estranho, pago pelo Estado e contribuintes.

Em 14 de Setembro de 2015, num debate com o BE, António Costa recusou nacionalizar a GALP, EDP e REN. No entanto, no Governo, não honrou a sua palavra e reverteu cinco privatizações, feitas no Governo de Passos Coelho. E teria feito mais, se tivesse tido sucesso noutras tentativas de reverter o que era privado, uma característica dos governantes marxistas... Uma das bandeiras do programa eleitoral do Partido Socialista era «manter a TAP na esfera pública, revertendo o processo de privatização iniciado pelo Governo PSD/CDS-PP». E isso, lamentavelmente, foi concretizado por António Costa, com danosas consequências para o futuro da TAP e elevados prejuízos para o Estado. Além da reversão da privatização da TAP, António Costa anulou as subconcessões de transportes públicos a empresas privadas, nomeadamente o Metro do Porto, STCP, Carris e Metro de Lisboa. Na Carris, a gestão foi transferida para o amigo Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Além disso, foi garantido que a Carris ficará na esfera pública. E, julgando-se DDT, António Costa afirmou que «o Estado não faz nenhum favor em assumir a dívida» da Carris! Uma afirmação irresponsável, fruto da sua demagogia e do seu desprezo pelo dinheiro público e aumento da despesa do Estado. Aquando da entrega da Carris à Câmara Municipal de Lisboa, o primeiro-ministro permitiu-se ajudar o presidente e amigo Fernando Medina, transferindo a dívida de 800 milhões de euros da Carris para o Estado! Com esta abusiva decisão socialista, a Carris poderá criar novas dívidas para, mais tarde, serem pagas pelo Estado.

As empresas estrangeiras, a quem António Costa retirou as subconcessões do Metro do Porto, STCP, Metro de Lisboa e Carris – ganhas em concurso público - contestaram a reversão dos seus contratos. E avançaram para os tribunais, exigindo indemnizações de muitos milhões de euros e pedindo a impugnação da anulação dos contratos, assinados com o Governo de Portugal. Um escândalo, que mancha o nome e a imagem do nosso País. A decisão do ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, de anular estes contratos de concessão de transportes públicos, confirma a aversão que o Governo socialista tem ao sucesso do sector empresarial privado. E isso, por muito que neguem e reneguem na praça pública, vai lesar a economia, o Estado e os Portugueses. Lembramos, a propósito, que a Comissão Europeia, em Fevereiro de 2016, criticou todas estas reversões do Governo de António Costa. Nomeadamente, «a inversão parcial» da privatização da TAP - um «risco suplementar» sobre o Orçamento do Estado - e o cancelamento das concessões de transportes urbanos em Lisboa e no Porto. Considerando estes e outros abusos, o aumento da dívida pública, do défice e da despesa do Estado, é possível que, mais tarde ou mais cedo, surja a necessidade de um novo resgate, a menos que, entretanto, também surja a oportunidade dos Portugueses reverterem o Governo de António Costa, apoiado pelo PCP e BE...

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BREVES AÉREO

TAP irá lançar operação de carga entre Portugal, China e Brasil A TAP irá iniciar, ainda este ano, uma operação carga que ligará a Portugal, China e Brasil com um Boeing 747 Cargo, com as insígnias da Beijing Capital Airlines e da própria TAP, aquilo que o presidente da companhia área portuguesa, Miguel Frasquilho, considera «uma via rápida entre o Extremo Oriente e o Brasil». À margem da II Feira e Conferência Internacional de Negócios, que decorreu ontem em Matosinhos, Frasquilho, em declarações ao Dinheiro Vivo,

demonstrou a sua vontade em alvancar a parceria com o HNA, grupo chinês que integra o consórcio privado Atlantic Gateway, que detém 45% da TAP. Os planos da companhia passam por assegurar, para já, uma ligação comercial com a china em ‘code share‘ com a Beijing Capital Airlines, mas, a longo prazo, a portuguesa quer ter a sua própria operação para o mercado chinês.

Consórcio MAIS anunciou, para Julho, ligação aérea de carga entre Lisboa e Ponta Delgada Do sucesso da Madeira para a aventura nos Açores: o consórcio MAIS (Madeira Air Integrated Solutions) passará também garantir uma conexão aérea diária para transporte de cargas entre Lisboa e Ponta Delgada. O primeiro voo está marcado para o próximo dia 3 de Julho. Consórcio MAIS chega agora aos Açores – ligação Lisboa-Ponta Delgada arrancou a 3 de Julho Ao jornal ‘Público’, o CEO da ALS Portugal (que juntamente com a espanhola Swiftair e a companhia madeirense dedicada à logística Loginsular constituem a MAIS), António Beirão, afirmou que «a vontade é começar a operação a 3 de Julho, mas estamos ainda a negociar slots no aeroporto de Lisboa, e a ver se conseguimos reduzir as taxas aeroportuárias

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nos Açores». Ao que tudo indica, será um questão de (pouco) tempo até todas as barreiras estarem ultrapassadas. Para executar a ligação entre a capital portuguesa e Ponta Delgada foi seleccionado o modelo ATR 72-300F, idêntico ao que assegura a linha Funchal-Lisboa – este fará cinco rotações por semana, estando apto para transportar cerca de cinco toneladas de mercadorias. Segundo revelou o ‘Público’, faltará definir se os voos serão feitos de Segunda a Sexta-feira ou se os ciclos começarão na Terça-feira, findado no Sábado seguinte. Chegada da MAIS aos Açores despoletada pelas exportações da ACPA A chegada da MAIS aos Açores tem o dedo da Associação dos Comerciantes de Pescado dos www.revistacargo.pt

Açores (ACPA), já que esta pretende saltar entraves e exportar para mercados como o japonês e o europeu – o papel da MAIS será assim fulcral para assegurar uma linha aérea de carga regular, cuja utilidade permitirá expandir a ambição da ACPA. «Além do pescado, vamos ter outros produtos do mercado de exportação que vão viabilizar a operação», desvendou ainda António Beirão. O CEO da ALS Portugal revelou também que prevê uma «exploração mais equilibrada» que aquela que se sucede actualmente na Madeira – o avião de carga tem, explicou, voado com cerca de 75% da carga total na ligação entre Lisboa e o Funchal, ao passo que no sentido contrário não ultrapassa 70% da capacidade total.


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