Revista Cargo 270

Page 1

Desde 1992

270

BIMESTRAL NOV/DEZ 2017

6€

A Logística de Natal

Não, não é o Pai Natal que traz as prendas*

*mantenha esta edição afastada das crianças

Porto de Setúbal:

Que futuro no sistema portuário?

Rui Barros (MITMYNID):

«O BIZCARGO tem registado um crescimento rápido e diversificado»

www.revistacargo.pt



EDITORIAL

BIMESTRAL NOV/DEZ 2017

6€

MARÍTIMO 4

Que futuro para o Porto de Setúbal no sistema portuário nacional?

5

Entrevista a Porfírio Gomes, presidente da CPS: «Não entedemos a insistência na construção de um novo terminal»

10 De “A” a “Z”: Recordamos os grandes temas do ano 2017 12 Opinião de Vítor Caldeirinha:“Impacto Profundo da aprendizagem

ÍNDICE

270

automática na logística e no shipping”

14 Entrevista a Rui Barros (MITMYNID): «O BIZCARGO quer ser o Marketplace de referência mundial nos Transportes e Logística»

18 Opinião de José Augusto Felício: “Porto de Lisboa e Porto de Setúbal são o mesmo porto para a região de Lisboa”

22 Breves Marítimo

TERRESTRE, VEÍCULOS E LOGÍSTICA 23 Fulgor natalício do e-commerce mudou para sempre a face da Logística

26 “Vítima” do sucesso: ALCONT adopta sistema Depot da MAEIL 28 Carlos Fernandes (IP) antecipa o futuro da ferrovia nacional 32 A Revista Cargo esteve ao volante da VW Caddy a gás natural 34 Transitários debatem novas tendências e tecnologias 36 Entrevista a Paulo Paiva (Presidente da APAT): «Não podemos virar costas à tecnologia

AÉREO 40 Opinião de J.M. Pereira Coutinho: “A primeira companhia de aviação do mundo”

42 Breves Aéreo

Propriedade:

DIRECTOR Joni Francisco *CHEFE DE REDACÇÃO Bruno Falcão Cardoso *MARKETING/PUBLICIDADE Simão Rodrigues *REDACÇÃO Rui Ribeiro, Joaquim Fonseca, João Cerqueira, Romeu Barroca *COLABORADORES ESPECIAIS José Augusto Felício, J. Martins Pereira Coutinho, Vítor Caldeirinha *EDITOR FOTOGRÁFICO Rui Ribeiro *ADMINISTRAÇÃO E REDACÇÃO Ed. Rocha do C. d’Óbidos, 1º, sala A Cais de Alcântara - 1350-352 Lisboa Tel. 911 166 932 *web: www.revistacargo.pt *e.mail: info@revistacargo. pt *EDITORA Magia Azul Edições, Unipessoal Lda * Morada: Ed. Rocha do C. d’Óbidos, 1º, sala A Cais de Alcântara - 1350-352 Lisboa *Tel. 911 166 932 *IMPRESSÃO E ACABAMENTO Gráfica, Lda *Praceta José Sebastião e Silva, Lote 20, Parque Industrial do Seixal - 2840-072 Aldeia de Paio Pires - T: 212 110 520 - Fax: 212 110 529 *ASSINATURA ANUAL Portugal - 30 EUR Estrangeiro - 40 EUR Depósito legal nº 6196692 *PERIODICIDADE - Bimestral *TIRAGEM - 6.000 exemplares Estatuto Editorial disponível em: www.revistacargo.pt

www.revistacargo.pt

Adeus 2017, olá 2018. O final de cada ano fica sempre marcado pelos balanços do capítulo que se fecha mas também pelas expectativas do que ali se começa - e, por tal, vale a pena ler o artigo das páginas 10 e 11 desta edição! Na Revista Cargo, o ano de 2017 ficou marcado por assinalar o 25.º aniversário da sua primeira edição impressa. Não vos vou falar dos méritos (nem das dificuldades) que estão por detrás de duas décadas e meia de actividade (porque muitos de vocês conhecem de perto esta realidade nas vossas empresas) nem aprofundarei o tema em redor da hercúlea tarefa que é fazê-lo num meio de comunicação social neste mundo tão transformado em que vivemos. Vou fazer, isso sim, o nosso próprio balanço. 2017 fecha com 250 Newsletters enviadas para os nossos leitores (exactamente o número de dias úteis que teve o ano), com mais de 2.000 notícias publicadas no nosso NOVÍSSIMO website, para além das seis edições impressas da Revista Cargo. E foi também o ano em que assinalámos o aguardado regresso dos eventos com o selo “Revista Cargo” (e logo nos Jerónimos!). Mas, confesso, mais do que os números (que nos orgulham), o que nos leva a fechar 2017 com aquele sentimento de dever cumprido é o retorno muito positivo que sentimos cada vez mais do lado do sector e das pessoas que nos seguem diariamente. Obrigado por isso. Com as mudanças profundas dos últimos tempos (novo Website, Revista Cargo em papel com a “cara lavada”, regresso aos eventos), antecipamos um ano de 2018 cheio de desafios e com uma aposta clara que se mantém: informar o sector com mais qualidade a cada dia que passa! A chave estará aí: trabalhar e aprender todos os dias para melhor cumprir o nosso dever de informar. Um muito sincero agradecimento pela vossa preferência. E desejos de um Feliz 2018 para todos! Joni Francisco Director

3


QUE FUTURO PARA O PORTO DE SETÚBAL NO SISTEMA PORTUÁRIO NACIONAL?

Conhecida que é a Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária para a próxima década e os investimentos previstos para o Porto de Setúbal - assim como o possível investimento infraestrutural em geografias próximas como o futuro Terminal do Barreiro -, a questão que se coloca é simples: onde se vai encaixar o porto sadino no contexto do sistema portuário nacional? Foi neste enquadramento que, no final de Novembro, a Comunidade Portuária de Setúbal (CPS) voltou aos seus eventos, organizando uma Conferência subordinada ao tema “Porto de Setúbal – Uma Solução para a Região de Lisboa – mais capacidade, maior competitividade”. O certame, tal como o mote já dava a entender, acabou centrado nas potencialidades do Porto de Setúbal e na sua viabilidade enquanto grande porto para a região de Lisboa.

Carlos Vasconcelos: «Setúbal tem todas as condições para ser o porto da região de Lisboa» A Conferência acabou inevitavelmente por ficar marcada pelas comparações entre uma eventual maior aposta no Porto de Setúbal ou o investimento que está planeado para o novo terminal no Barreiro – um tema que há muito tempo divide opiniões. Entre os oradores da Conferência esteve Carlos Vasconcelos, no papel de Administrador do operador ferroviário Medway, parte do grupo MSC Portugal. E o mesmo deixou claro que vê em Setúbal uma opção mais viável – e mais barata – do que um novo terminal no Barreiro. Questionado sobre o futuro portuário da região de Lisboa, em particular na carga contentorizada, Carlos Vasconcelos defende que «Setúbal tem todas as condições para ser o porto da região de Lisboa», não augurando grande futuro aos terminais de carga na margem Norte do Tejo. «Penso que a margem Norte do Porto de Lisboa está condenada», referiu mesmo o responsável da Medway e da MSC Portugal, acrescentando que «Setúbal não tem a pressão urbanística» que hoje se vê em Lisboa. Por outro lado, também não se mostrou convencido de que a solução possa passar pelo Barreiro: «A meu ver, a margem Sul não é uma opção nos contentores e na carga geral». «A lógica diz-nos que com um menor investimento se consegue fazer aqui [em Setúbal] um porto melhor», concluiu Carlos Vasconcelos a este propósito. «Sines demonstrou que a distância não é um problema» Enquanto máximo responsável da MSC Portugal, Carlos Vasconcelos está umbilicalmente ligado ao sucesso do Porto de Sines nos contentores. E usou o exemplo do porto alentejano para referir que «Sines demonstrou que a distância não é um problema» quando se comparam opções em geografias tão próximas como o Barreiro ou Setúbal. «A distância em termos de logística não existe, temos é de ter melhores serviços e ligações», acrescentou, lembrando que «o Porto de Sines conseguiu ser competitivo nas exportações estando a 150 quilómetros de Lisboa, por isso Setúbal estando mais perto também o conseguirá». Hub de transhipment na região de Lisboa e Setúbal? Outra questão colocada a Carlos Vasconcelos esteve relacionada com a possibilidade da região de Lisboa e Setúbal poder vir a ter, no futuro, um hub de transhipment, à imagem do que foi feito no Porto de Sines. Sobre esta questão, o responsável da MSC Portugal foi claro ao referir que o teste do algodão será sempre feito pelos armadores: «Quem decide onde se faz o transhipment? É o armador! Se decidir fazer em Peniche, faz em Peniche! Portugal tem condições para vários hubs de transhipment e para milhões de TEUs mas é necessário que existam armadores interessados». E neste campo, recordou que «há cada vez menos armadores mas há oportunidades». 4

«Bitola é uma falsa questão» Tema recorrente destes debates quando se fala de ferrovia é a questão da bitola ibérica e da bitola europeia. O que deve fazer Portugal neste campo? Carlos Vasconcelos não se mostrou alarmado e admite mesmo que «a bitola é uma falsa questão». «Quando falamos no hinterland espanhol, a bitola é ibérica. Por isso não é pela bitola que não servimos melhor a Península Ibérica por ferrovia», argumentou o administrador da Medway, acrescentando que nos contactos que tem mantido com as espanholas ADIF e Renfe o que lhe tem sido passado é que a mudança de bitola também não avançará para já em Espanha. Aqui, o Porto de Sines voltou a ser dado como exemplo, um porto que é líder nacional na carga movimentada por ferrovia – seguido na lista pelo Porto de Setúbal. «Temos nove comboios todos os dias para Sines com contentores, mais os comboios de carvão», recordou o responsável da Medway, mostrando-se optimista de que as intervenções que estão a avançar na ferrovia no Porto de Setúbal podem alavancar a carga ferroviária no porto sadino.

Lídia Sequeira: «Porto de Setúbal tem já o seu lugar no sistema portuário nacional» Na Conferência, a presidente da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) e da Administração do Porto de Lisboa (APL) não podia deixar de marcar presença. E Lídia Sequeira aproveitou a oportunidade para valorizar o papel que o Porto de Setúbal já tem no sistema portuário nacional, antecipando que o porto sadino deverá agora crescer em áreas como «o turismo e a náutica de recreio». E acrescenta que o novo Terminal do Barreiro será a demonstração da «ambição» que se deve ter para o sistema portuário nacional. Sobre o porto sadino, Lídia Sequeira recordou que «o Porto de Setúbal tem já o seu lugar no sistema portuário nacional, sendo o quarto maior porto nacional em tonelagem de carga movimentada». E deixou mais algumas notas sobre a dinâmica de Setúbal e a sua vocação, constituindo-se como «um porto essencialmente virado para a exportação» e que é já hoje «o segundo maior porto ferroviário do país, a seguir a Sines». A presidente da APSS lembrou ainda a «posição hegemónica no segmento ro-ro» ou a «vantagem competitiva de estar localizado junto do maior centro de consumo do país e um dos maiores da Península Ibérica, e inserido numa região com muitas indústrias» – algumas delas de extrema importância no panorama nacional. E, claro está, em Setúbal encontra-se ainda «o maior estaleiro de reparação naval do país e de toda a Europa», nas palavras da sua presidente. Contudo, Lídia Sequeira recorda que todas as valências do Porto de Setúbal ainda não são suficientes para fazer parte da estrutura core da Rede Transeuropeia de Transportes (RTE-T), algo que, por exemplo, tem inviabilizado o acesso a determinados fundos europeus. «Tudo o que existe ainda não é suficiente para colocar o Porto de Setúbal na rede core da RTE-T, da qual ainda não faz parte e que é algo que temos de conseguir», vincou a líder do porto sadino, que acrescentou que a luta é cada vez mais renhida até porque «hoje não existem tráfegos cativos numa região e num país». «É preciso competir, é preciso modernização, é preciso estar na linha da frente das tecnologias, são precisas acessibilidades marítimas e são precisas acessibilidades terrestres conectadas à RTE-T», concluiu a este propósito. Aposta «no turismo e na náutica de recreio» Para além da nota clara de que o Porto de Setúbal tem já o seu lugar no sistema portuário nacional, outra das mensagens fortes deixadas por Lídia Sequeira foi a de um futuro no qual o porto sadino deverá conseguir crescer noutras áreas de actividade, nomeadamente «no turismo e na náutica de recreio», sobretudo devido às «condições naturais que a extraordinária bacia do Sado tem para os nautas».

www.revistacargo.pt


Realçando que «o Porto de Setúbal tem aspectos que o distingue dos outros portos nacionais» a este nível, Lídia Sequeira vincou que «Setúbal orgulha-se de ser um porto com elevadas preocupações ambientais». Estratégia para Setúbal em andamento com acessibilidades marítimas e ferroviárias Dentro da Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária há investimentos essenciais para Setúbal que já estão em andamento, nomeadamente o aumento do canal de acesso marítimo ao porto ou a intervenção na ferrovia. Neste sentido, Lídia Sequeira defendeu que a Estratégia própria para o Porto de Setúbal está assente em «três vectores»: «A melhoria das acessibilidades marítimas de ligação ao foreland; a melhoria das acessibilidades ferroviárias de ligação ao hinterland; a evolução tecnológica, preservando a questão ambiental». Sobre o avanço destes vectores, destaque para os trabalhos nas acessibilidades marítimas que «permitirão aumentar a eficiência, a qualidade e a segurança na operação» de forma a «receber navios de maiores dimensões, sejam de carga, de turismo ou de lazer». Por outro lado, salientou ainda os trabalhos já em andamento na ferrovia, em conjunto com a Infraestruturas de Portugal, os quais «permitirão ultrapassar os constrangimentos actuais, reduzindo o número de manobras e permitindo fazer mais comboios». Ainda a nível de ferrovia, onde o Porto de Setúbal já se constitui como o segundo porto que mais usa este modo, Lídia Sequeira recordou também que, com a conclusão da melhoria da ligação ferroviária a Espanha, no âmbito dos trabalhos que estão a ser levados a cabo no Corredor Internacional Sul, «Setúbal será o porto nacional mais próximo de Madrid pela via ferroviária». «Com a conclusão, a curto prazo, dos projectos essenciais para Setúbal – e tivemos

de definir aqui prioridades! -, Setúbal poderá dar um salto qualitativo no ranking dos portos nacionais, e com isto acreditamos estar reunidas as condições para atrair investimento privado», concluiu a líder do Porto de Setúbal. Terminal no Barreiro é espelho da ambição da Estratégia para os portos A presidente da APSS e da APL falou também do projecto do novo terminal no Barreiro, um projecto que, na sua opinião, espelha a ambição do Governo apresentada na Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária. «Temos de rejeitar a visão paroquial de rejeitar a ideia de que precisamos de mais terminais para conseguir a meta ambiciosa definida na Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária. Temos de ser ambiciosos e trabalhar nesse sentido», defendeu, acrescentando que nessa Estratégia «o Porto de Setúbal tem um enorme papel a desempenhar».

Ana Paula Vitorino: «Não podemos encarar isto como Lisboa versus Setúbal» Foi a Ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, quem encerrou os trabalhos, numa intervenção onde quis deixar claro que «não podemos encarar isto como Lisboa versus Setúbal». «São os donos da carga que decidem que porto utilizar em função daquilo que lhes colocamos, não é o Governo que decide tirar a carga daqui e colocar ali», defendeu a Ministra, acrescentando que essa escolha acabará por ser feita segundo «a capacidade e disponibilidade de cada infraestrutura mas também da visibilidade que lhe conseguimos dar, porque ninguém ama aquilo que não conhece». «Não haverá Setúbal versus Lisboa, pelo menos durante a minha gestão», garantiu Ana Paula Vitorino sobre um debate que tende a continuar. Ministra recorda: «À escala global, isto é uma área logística!»

Ainda sobre a tendência de colocar o Porto de Lisboa e o Porto de Setúbal em pratos diferentes da mesma balança, Ana Paula Vitorino relembrou que do ponto de vista internacional não se olha para eles de forma individualizada mas sim de forma integrada: «À escala global, temos a região de Lisboa e Vale do Tejo que engloba a Península de Setúbal e Norte do Tejo. À escala global, isto é uma área logística! E a estratégia tem de ser analisada a esta escala». Ainda a este respeito, Ana Paula Vitorino defende mesmo que «a decisão mais estratégica tomada em relação ao Porto de Setúbal é este ser encarado de forma integrada com Lisboa». Governo avança para juntará Administrações Lisboa e Setúbal

“holding” que Portuárias de

Ora, nessa gestão integrada entre o Porto de Lisboa e o Porto de Setúbal, a Ministra do Mar deu ainda conta que pretende avançar em breve com uma verdadeira fusão da Administração do Porto de Lisboa (APL) e da Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS). Recorde-se que, nos primeiros meses de 2016, o Governo estipulou que o Porto de Lisboa e os Portos de Setúbal e Sesimbra passassem a ter um Conselho de Administração comum, em regime de acumulação de funções, para efeitos de planeamento estratégico e promoção de sinergias organizacionais e operacionais de ambas as empresas. Mas Ana Paula Vitorino admite agora que a solução tomada tem carácter provisório e que pretende ir mais além na fusão das duas Administrações. «Ter o mesmo Conselho de Administração para os dois portos foi feito assim porque era a solução mais rápida. A prazo – que espero mais curto do que longo – teremos aqui uma holding, havendo áreas mais operacionais que continuarão a ser autónomas», confirmou.

PORFÍRIO GOMES:«NÃO ENTENDEMOS A INSISTÊNCIA NA CONSTRUÇÃO DE UM NOVO TERMINAL»

Em entrevista à Revista Cargo, o presidente da Comunidade Portuária de Setúbal (CPS) falou das potencialidades do porto sadino e defendeu-o como a solução imediata para a região de Lisboa. REVISTA CARGO: A CPS organizou a Conferência “Porto de Setúbal – Uma Solução para a Região de Lisboa – Mais capacidade, Maior competitividade”. Que motivos justificaram a escolha deste tema e qual o seu objectivo? Esta Conferência insere-se num conjunto de Conferências que a Comunidade Portuária de Setúbal tem vindo a efetuar nos últimos anos. Começámos no final de 2013, realizámos outra um ano depois, e agora entendemos que é o momento para avançar com uma terceira edição para dar a conhecer o que se está a passar actualmente no Porto de Setúbal. Nas duas primeiras quisemos dar visibilidade ao Porto de Setúbal, mostrando-o aos stakeholders da Comunidade Portuária e à própria Comunidade Portuária. Isto porque havia pessoas que, estando directamente

relacionadas com a actividade do Porto de Setúbal, não conheciam toda a sua realidade. Quisemos criar visibilidade e chegar junto do poder porque percebemos que mesmo no poder os responsáveis não conheciam todo o potencial do que têm em mãos. Houve necessidade de lhes transmitir o que havia, as disponibilidades imediatas que o Porto de Setúbal tem para oferecer sem a necessidade dos grandes investimentos falados para outros portos. Na primeira Conferência, em 2013, uma das conclusões a que se chegou, reforçada pelo Professor Crespo de Carvalho, foi que o futuro do Porto de Lisboa era o Porto de Setúbal. Não é tanto uma visão de Lisboa versus Setúbal mas sim, de um ponto de vista helicopteriano, ou numa análise macro, constatar que Setúbal e Lisboa fazem parte www.revistacargo.pt

da mesma região logística, com a vantagem de Setúbal não sofrer da pressão urbanística que a cidade de Lisboa exerce sobre a sua infraestrutura portuária. Na segunda Conferência, tivemos a colaboração do Professor Augusto Felício que nos fez um estudo mais orientado para a competitividade de Setúbal. Foi um estudo bastante aprofundado, pois na altura já estava em causa a hipótese do terminal do Barreiro. O Professor Augusto Felício focou-se na questão da competitividade de Setúbal versus Barreiro, bem como da solução Trafaria, da qual ainda se falava. Foi um estudo bastante detalhado, com forte base científica onde foram analisadas várias componentes: as acessibilidades, marítimas e terrestres; os custos das dragagens; os custos da construção; foi-se ao ponto de se comparar

5


de funcionamento, entre outros. Uma das características que esta actividade apresenta é que, qualquer investimento, por norma, atinge valores muito elevados, veja-se os valores de que se fala para a construção de um novo terminal no Barreiro.

os custos do transporte rodoviário de um contentor, tendo por base várias origens/ destinos e o Porto de Setúbal e as hipóteses do Barreiro ou Trafaria. O estudo identificou um conjunto de vantagens e desvantagens para cada solução portuária, concluindo que Setúbal se apresenta como mais competitivo, apesar de estar um pouco mais longe de Lisboa ou de grande parte da carga ter origem/destino na margem norte do Tejo. Estes eventos foram, no fundo, uma forma de dar visibilidade ao Porto de Setúbal. O meu antecessor, o Engº Frederico Spranger, costumava dizer que «provavelmente devido à serra da Arrábida, o Porto de Setubal não tinha qualquer visibilidade». Considera que os investimentos agora previstos para o Porto de Setúbal lhe darão nova projecção e essa maior visibilidade? A CPS contribuiu activamente para identificar as restrições que hoje limitam o Porto de Setúbal. Da análise feita, foram identificados como factores restritivos da competitividade de Setúbal as acessibilidades marítimas e ferroviárias. A partir da identificação das restrições, a APSS com o apoio da CPS iniciou um trabalho cujo culminar foi apresentado nesta Conferência, nomeadamente a dragagem do Canal da Barra e do Canal Norte e a remodelação e electrificação dos troços da linha férrea no acesso aos terminais. Estamos convencidos que os investimentos que irão ser apresentados terão início no princípio de 2018, pois todos os trâmites administrativos já foram ultrapassados. Serão assim criadas condições para que o Porto de Setúbal possa aumentar o seu hinterland e entrar numa nova fase. Depois dos vários estudos mencionados, como é que a Comunidade Portuária viu os avanços no projecto do Barreiro? A CPS tem dificuldade em entender que, existindo capacidade instalada disponível em Setúbal, se continue a falar da construção de outro terminal na mesma região, seja no Barreiro ou em qualquer outro local. Não quer dizer que não seja uma solução para daqui a uns anos, mas no imediato os estudos tornam evidente que a solução é o Porto de Setúbal. O Porto de Setúbal tem junto de si a indústria, está perto de Lisboa, tem 12 terminais que praticamente satisfazem todo o tipo de solicitações quanto às mercadorias a movimentar, apresentando os terminais de serviço público uma grande margem para crescer à excepção do terminal Ro-Ro que actualmente apresenta uma taxa de ocupação relativamente elevada. Temos um terminal de contentores a 25%

6

da sua capacidade e os outros terminais a 50%. Portanto, o Porto de Setúbal apresenta resposta imediata para a região de Lisboa para os próximos tempos! Está longe de estar esgotada a capacidade instalada em Setúbal. O Porto de Setúbal é a resposta para que tipo de cargas? Setúbal é um porto cujas valências dos seus terminais respondem a praticamente todo o tipo se solicitações, sejam elas carga contentorizada, carga geral unitária, graneis sólidos e líquidos, entre outras. Em relação aos terminais mais orientados para a Carga Geral e Graneis, pensamos que terão um crescimento ligeiramente acima do crescimento da economia nacional. Isto porque têm um grande conjunto de cargas que apresentam um comportamento estrutural e não conjuntural, fruto do próprio ADN industrial do Porto de Setúbal. E, adicionalmente, existe outro conjunto de mercadorias que apresentam variações maiores em função de determinados ciclos económicos. A carga contentorizada é aquela que poderá crescer mais rapidamente. Dispomos de um terminal de contentores com um grande potencial, com 20 hectares de retaguarda e 723 metros de frente de cais, com capacidade para responder até 750.000 TEU’s e que com os novos projectos irá estar menos limitado no seu hinterland. Setúbal pode então substituir Lisboa em grande parte desses negócios ou vê os dois portos como complementares? Nós vemos Lisboa e Setúbal como dois portos que são dois braços do mesmo corpo para a região onde estão inseridos. Têm características diferentes que lhes permite complementarem-se um ao outro. A excepção poderá ser os contentores, onde podem concorrer ou complementarem-se dependendo da visão que se tenha para o porto versus cidade de Lisboa. O que é importante para nós é que se veja o somatório dos dois portos para servir a região. E, pelos estudos que temos, para os próximos 10 a 15 anos não haverá necessidade de um novo terminal. O novo terminal do Barreiro poderá tirar carga também a Setúbal? Um dos problemas de que os carregadores tanto se queixam é o valor da factura portuária. Na factura portuária, por princípio, devem ser reflectidos todos os custos associados à actividade portuária, nomeadamente investimentos em infraestruturas, acessibilidades marítimas e terrestres (rodo e ferroviárias), equipamentos, custos www.revistacargo.pt

Para rentabilizar estes investimentos é necessário haver massa crítica. E é aqui que a CPS discorda dos novos investimentos em novas instalações portuárias, porquanto, o Porto de Setúbal apresenta níveis de ocupação entre 25 % e 50%, logo, muito longe de ter uma massa crítica que permita passar parte dos ganhos para os donos das mercadorias. E a situação irá piorar se na mesma região logística aparecer uma nova infraestrutura portuária. Por todas estas razões nós entendemos que não faz sentido estar a investir numa nova infraestrutura portuária, opinião que é também do Tribunal de Contas, que num relatório de há dois anos atrás, concluiu que os portos são infraestruturas de capital intensivo que precisam de massa crítica e tempo para serem rentabilizados. Este, é o tipo de investimentos que, por muito que se diga que só avança se houver privados que o queiram assumir, tem sempre uma parcela que será pública (nas acessibilidades, nas dragagens…), e que no caso concreto tudo indica que será bastante avultada. Ou seja, no fim haverá uma factura que irá parar ao Orçamento de Estado e, por consequência, aos bolsos dos contribuintes. Ainda sobre o Terminal do Barreiro, como viu as últimas notícias que falam num terminal multiusos? Na CPS temos dificuldade em comentar essas notícias. O Terminal do Barreiro já foi tanta coisa... Já foi terminal de águas profundas, já foi terminal de águas menos profundas, mas sempre de contentores, agora aparece o terminal multiusos... Ficamos com a sensação de que o que é necessário é fazer um terminal, depois logo se vê para que serve. Os terminais multiusos caracterizam-se pela tipologia de carga a movimentar. Quando se fala de multiusos significa logo à partida a possibilidade de movimentar todo o tipo de mercadoria, perdendo os contentores a sua grande expressão. A carga geral é um tipo de mercadoria que caracteriza um terminal multiusos e, na região de Setúbal e Lisboa, o volume movimentado desta mercadoria tem-se apresentado relativamente estável ao longo dos anos. É uma mercadoria que normalmente é um produto com origem ou destino às nossas indústrias transformadoras e não se prevê que estas de um dia para o outro dupliquem ou tripliquem as suas produções. Há anos que se discute se os portos são caros ou baratos. No entanto, parece que todos nos esquecemos que a componente de investimento fixo tem que ser diluída pela mercadoria movimentada: se for diluída por uma grande quantidade, terá um custo; se for diluída por pouca quantidade, terá um custo bem maior. É tudo uma questão de massa crítica. E é nosso entendimento que a quantidade actual é pequena para os terminais que existem. E mais pequena será com a adição de novos terminais. Nos contentores, acredita que o investimento que será feito no canal de


acesso possa trazer muito mais tráfego? O mercado dos contentores é diferente do mercado da carga geral ou mesmo dos graneis. O mercado de contentores tem que ser analisado em dois segmentos completamente distintos: por um lado o mercado do transhipment e, por outro, o mercado nacional, do hinterland. O mercado do transhipment, que é o do Porto de Sines, associado a terminais deep sea, é um mercado normalmente dominado e explorado pelos grandes armadores ou consórcios de armadores que, no âmbito das suas decisões estratégicas, decidem criar nós logísticos, os chamados terminais de transhipment que lhes permitam integrar as suas várias rotas de navegação. O movimento neste tipo de terminais tem normalmente um crescimento muito rápido pois dependem fundamentalmente do comércio mundial e do número de linhas que se cruzam nesse nó logístico do armador. Já o mercado nacional é constituído por terminais que, por norma, não são explorados por um armador ou consórcio de armadores, estão abertos a todos os armadores e os contentores aí movimentados, na sua quase totalidade, destinam-se ou têm origem no mercado nacional. No caso de Setúbal poderá ir até Espanha, nomeadamente a Estremadura espanhola. A carga contentorizada com origem ou destino no mercado nacional, embora crescendo a ritmos superiores aos da economia, cresce a ritmos que nada têm a ver com o mercado do transhipment, sendo também por norma terminais com movimentações anuais menores. É no mercado nacional que devemos colocar Setúbal, onde não há necessidade de terminais deep sea. A Sadoport, terminal de contentores de Setúbal, apresenta já um crescimento percentual relativamente elevado mas, em termos absolutos, ainda tem um grande caminho a percorrer. A melhoria dos canais de acesso com estas dragagens vem melhorar a competitividade de Setúbal pois, passa a poder receber navios Panamax, o que significa que novos horizontes se abrem. Nós na CPS acreditamos que vamos ter um misto de navios mais pequenos, de navegação mais europeia, como já recebemos hoje, com alguns navios um pouco maiores, oriundos ou com destino a outros continentes. Pensamos que este aprofundamento dos canais também vai ajudar a desmistificar alguma informação errada que tem sido passada aos armadores relativamente à capacidade que o Porto de Setúbal tem para receber determinados tipos de navios. Importa é perceber que o mercado de contentores do Porto de Setúbal não é o dos grandes navios, é o mercado nacional. No entanto, queremos criar melhores condições de segurança para os navios que aqui escalam, não perdendo o foco que o nosso mercado é o do short sea shipping. Com quantos membros conta hoje a Comunidade Portuária de Setúbal? A nossa Comunidade foi iniciada com um conjunto de membros fundadores mais ligados à actividade pura e dura do porto. São agentes, despachantes, operadores portuários, algumas indústrias locais e a APSS. Depois foram entrando outras empresas com actividade ligada ao sector. Fomos também

integrando outras entidades como a Câmara Municipal de Setúbal, a Reserva Natural do Sado, a Reserva Natural da Arrábida... Para a Comunidade Portuária de Setúbal é muito importante ter no nosso seio entidades como as atrás referidas, porque a sua contribuição com diferentes visões do porto é fundamental para a existência de uma relação harmoniosa entre as várias actividades ligadas ao porto e ao rio na sua relação com a cidade e o ambiente.

aproveitar Setúbal no seu todo, é preciso apostar também em projectos de investigação científica, para que o porto se transforme numa plataforma de aceleração tecnológica, com a criação dos clusters que melhor sirvam a região, envolvendo, naturalmente, o Instituto Politécnico de Setúbal.

E que particularidades identifica ambiente que rodeia Setúbal?

Vê muito potencial em Setúbal nessa área?

no

O Porto de Setúbal inverteu a sua vocação. Até ao início da década de 90 era um porto mais importador. Mas, a partir dessa altura, passámos a ser um porto com predominância exportadora. Hoje, cerca de 60% do movimento do porto é de exportação. Temos como clientes do porto e na nossa envolvente um conjunto de empresas grandes exportadoras nacionais como a Autoeuropa, a Lisnave, a Navigator, a Secil a Cimpor a S.N. Seixal a Lusosider... E isso dá ao porto um cariz industrial. No entanto, após as concessões do terminal da Tersado e da Sadoport, o Porto de Setúbal aumentou o hinterland. Deixou de ser um porto de cariz quase exclusivamente industrial, um porto que apenas servia a região de Setúbal e passou a servir uma região maior, no limite o próprio país. Considera que Setúbal é um porto dependente da actividade desse conjunto de grandes empresas? A verdade é que hoje em dia os negócios a 20 anos já não estão garantidos para ninguém. Temos de adaptar à realidade. O planeamento a médio/longo prazo pode fazer sentido desde que exista uma flexibilidade muito grande para fazer ajustamentos, pois hoje é tudo muito volátil. Temos de ter capacidade de responder rapidamente às solicitações das nossas indústrias, para que estejam satisfeitas com os serviços que o porto presta às suas cargas, isto com o mínimo de investimento possível! Os nossos clientes não querem saber se nós temos muitos ou poucos equipamentos, querem é que lhes prestemos um bom serviço. A nossa prioridade tem de ser prestar um serviço competitivo e eficiente. E isso faz-se muito mais com a cabeça do que com dinheiro. Temos que perceber o que os clientes querem do porto, ir ao encontro do que eles pretendem, porque o nosso objectivo é comum: o cliente quer ser competitivo na sua actividade e o porto tem a obrigação de os ajudar nesse objectivo. Estas empresas são, e pensamos que irão continuar a ser, uma âncora muito grande da actividade do Porto de Setúbal. No entanto, muito por via dos contentores, a actividade e os clientes do porto começam a ser mais diversificados. Como é que a Comunidade Portuária de Setúbal viu a apresentação da Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária? Nós na CPS fomos um pouco críticos com as propostas apresentadas e com a falta de investimento para Setúbal. Excluindo os projectos das acessibilidades, já anteriormente referidos, que classificamos como clássicos, pensamos que Setúbal tem capacidade para receber outros investimentos no decurso deste Plano Estratégico. Pensamos que se tem que www.revistacargo.pt

Estamos convencidos que, mais uma vez, a culpa foi da Serra da Arrábida, ficamos esquecidos mas ainda é tempo de corrigir este lapso. Vemos! Há algumas empresas de Setúbal, com muito know-how específico, que estão já a fazer parcerias. A Lisnave, por exemplo, já fez algumas parcerias de estudo e de implementação dos conhecimentos que domina. Depois temos o Instituto Politécnico de Setúbal que também tem know-how para poder intervir em qualquer acção, para a qual venha a ser solicitado. Na Comunidade Portuária de Setúbal pensamos que Setúbal tem condições para acolher alguns desses projectos apresentados na Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária. Ainda assim, o Governo tem destacado que o Porto de Setúbal será daqueles onde o investimento público mais se sobrepõe ao investimento privado... Cada um faz as contas como quer e mostra o que quer. Também podemos afirmar que Setúbal é o porto do continente com menor ratio de investimento público por milhão de toneladas movimentadas. Ou seja, é o porto onde melhor se está a rentabilizar o investimento público. O Estado português gastou muito pouco no Porto de Setúbal! O que se está a fazer agora é uma obrigação do Estado, que são as acessibilidades marítimas e ferroviárias. Quem haveria de o fazer? Já deveria era ter sido feito antes... Depois, sobre a falta de investimento privado, pretende-se que os privados invistam em quê? Em infraestruturas? Em equipamentos? Os terminais de Setúbal estão subutilizados, paralelamente temos a questão do Barreiro, Trafaria ou o que quer que seja... Vamos fazer ainda mais terminais? Não nos parece. Quanto a investimentos em equipamentos necessários para que cada terminal possa desempenhar a sua actividade, pensamos que esse problema nem se coloca. Isto porque, certamente, as entidades responsáveis pela exploração dos mesmos quererão responder às solicitações dos seus clientes de forma competitiva e o mais eficiente possível. Por vezes há a tentação de extrapolar o que se passa no Porto de Sines para o resto dos portos. O Porto de Sines é uma realidade à parte. É do interesse do armador que explora o Terminal XXI que Sines seja o que é, independentemente da economia Portuguesa. O Terminal XXI é algo que influencia a nossa economia mas que é muito pouco influenciado por ela. Os restantes portos e terminais nacionais de contentores não dependem de um só armador, são portos comerciais que dependem e trabalham para muitas linhas e, são portos cujo nível de actividade está directamente relacionada com o desempenho da economia nacional, crescem em função do

7


mercado português. Pode tentar-se replicar Sines, se houver outro grande armador interessado. Mas não se pode aplicar a mesma receita a todos os portos nacionais. É o que está a acontecer no Barreiro? Alguém pensou que podia fazer no Barreiro um novo Porto de Sines quando se falou de um terminal de águas profundas. Mas esse tipo de terminal só resulta se existir um grande armador ou consórcio que o assuma como próprio. O próprio Terminal XXI só cresceu a um ritmo elevado quando a MSC lá entrou. A maior parte dos grandes terminais no mundo do transhipment são de grandes linhas ou de coligação de linhas. São terminais com investimentos avultados, que funcionam como nós logísticos dos armadores. Não têm a mesma lógica de um porto comercial que abastece uma cidade. A natureza desses portos/terminais é completamente diferente, por isso é normal que os investimentos também sigam uma lógica diferente. A CPS esteve recentemente na China na comitiva portuguesa que acompanhou a Ministra do Mar, onde em Xangai visitámos um terminal que movimentava 15 milhões de TEU’s por ano. Para nós portugueses é um número impressionante. Mas, quando começamos a decompor esta grandiosidade e fazemos uma análise por exemplo dos valores unitários, há coisas que não diferem, como é o caso da produtividade. Por outro lado este terminal serve um hinterland que provavelmente tem uma população 7 ou 8 vezes a portuguesa. Em termos de produtividade, os portos portugueses estão ao nível do que melhor se faz lá fora? É um sector de actividade do país que tem respondido bem às solicitações que lhe têm sido feitas. Pode-se sempre aumentar as nossas competências e competitividade, mas nada melhor do que recorrer a instituições como o Banco Mundial para dizer como estão os portos portugueses quando comparados internacionalmente. Em 2015, as Comunidades Portuárias do Portos do Continente produziram um documento tendo por base o LPI – Logistics Performance Index, para a caracterização do Sistema Portuário Nacional, um índice construído pelo Banco Mundial. Neste índice construído sobre 166 Países, Portugal aparece na 26.ª posição com um LPI de 3,56, uma posição do Top Quintil onde estão os países Logistics Friendly. Neste indicador, a Alemanha é o 1.º País do Ranking, com um LPI de 4,12. Deste índice, podemos também retirar que a distância (0,88) que separa a Alemanha do topo, que é o LPI de 5,0, é superior à distancia que separa Portugal da Alemanha (0,56). Se tivermos também em conta que sendo a Alemanha o primeiro País Europeu em termos económicos e um dos mais fortes a nível mundial, Portugal, na sua 26ª posição, apresenta-se com um desempenho logístico correspondente a 82% do desempenho da Alemanha! De acordo com o Banco Mundial, há 14 anos que Portugal está entre os 20% de Países com melhor desempenho logístico a nível mundial, o que nos merece a classificação de Logistics Friendly. Quando falamos em competitividade dos

8

portos portugueses, não estamos a falar de ritmos de carga ou de descarga, de equipamentos rápidos ou lentos etc. Estamos a falar de uma realidade mais complexa, estamos a falar de transit time, estamos a falar por exemplo do tempo que determinada mercadoria leva desde que chega o navio ao porto até estar disponível a quem a adquiriu. O cliente está muito mais interessado no tempo que uma mercadoria demora desde que o navio chega ao porto até estar completamente despachada e disponível do que no tempo que demora a carregar ou descarregar e, sobre este assunto, os portos portugueses não devem nada a ninguém. Temos hoje a ferramenta JUP - Janela Única Portuária, cujo desenvolvimento foi da responsabilidade das Administrações Portuárias, que é, com certeza, uma das ferramentas mais abrangentes e integradoras das várias funções do estado, despachantes, agentes de navegação operadores portuários, a nível internacional. Posso concluir que terá ficado satisfeito com os recentes avanços da JUL, certo? Todos no sector temos razões para ficar satisfeitos. Quando há cerca de 10 anos a Engª. Ana Paula Vitorino, então Secretária de Estado, deu o grande impulso para o desenvolvimento de uma ferramenta que hoje é a JUP, recordome do esforço que foi necessário desenvolver para ultrapassar alguns estados de alma e criar vontades para levar por diante a tarefa. Impressionou-me, na primeira reunião que tivemos na secretaria de estado, estarem presentes, para além daqueles que nas várias Comunidades Portuárias pugnavam para que tal ferramenta fosse desenvolvida, dirigentes de praticamente todos os ministérios e departamentos do Estado com ligações à actividade portuária e comércio internacional. Todos sentados à mesma mesa, o que é demonstrativo do grande trabalho politico realizado pela Engª Ana Paula Vitorino. Nessa primeira reunião, com muito poucas excepções - e as que existiram de natureza mais institucional do que operacional - todas as entidades apresentaram uma vontade enorme de se avançar para o desenvolvimento de uma ferramenta que fosse muito mais além do que os programas de gestão portuária que à época cada Administração Portuária possuía. Foi necessário redefinir procedimentos, foram criados grupos para a simplificação de procedimentos. Aos poucos, toda a actividade dos agentes envolvidos nas actividades portuárias, públicos ou privados, foi sendo incorporada, e hoje praticamente toda a informação é introduzida e tratada num só sistema, ao qual todos os agentes envolvidos têm acesso. Provavelmente já poucos se lembram da quantidade de papéis que, fundamentalmente os agentes de navegação, tinham que carregar por vezes em duplicado e triplicado entre os diversos organismos do estado. A JUP traduziu-se em ganhos enormes na fiabilidade e rapidez da informação trocada entre as várias entidades envolvidas, originando uma agilização enorme no despacho das mercadorias. Passados estes anos, já com a JUP perfeitamente estabilizada, volta a ser a Engª Ana Paula Vitorino, agora na qualidade de Ministra do Mar, a dar um novo impulso para www.revistacargo.pt

o desenvolvimento da JUL – Janela Única Logística, que irá com certeza contribuir para que os portos portugueses continuem na vanguarda da facilitação das operações comerciais envolvendo os portos. Já falou do potencial que o Porto de Setúbal tem ao nível dos seus terminais. Mas há também potencial de crescimento em redor do porto, certo? Sem dúvida. Setúbal tem um conjunto de parques logísticos em seu redor, desde a BlueBiz da Aicep, a Sapec ou o próprio parque do Poceirão... Há vários parques de retaguarda que estão a curta distância do porto e com muito espaço para alojar novas empresas. Acreditamos que há muitas empresas que se poderão instalar nestes parques pois a proximidade ao porto apresenta-se como uma mais valia para a sua actividade. O nosso trabalho é dar a conhecer o Porto de Setúbal mas também tudo o que esta região tem para oferecer. Por exemplo, Setúbal tem um elevado nível de formação e oferta de mão-de-obra qualificada. Para além disso, está a 20 minutos de Lisboa. Recentemente foi notícia o aumento das taxas portuárias no terminal Ro-Ro e a insatisfação de alguns utilizadores. Como tem sido a relação entre a APSS e a Comunidade Portuária? O Terminal Ro-Ro tem particularidades diferentes dos restantes terminais em Setúbal, visto ser gerido pela APSS. Por isso, é esta entidade quem define os tarifários, por exemplo do parqueamento dos automóveis. Compreendemos as razões dos operadores do terminal que, tendo contratos plurianuais, se veem confrontados com mudanças a meio do contrato e não conseguem passar os aumentos para os seus clientes. No entanto, não discordamos da filosofia da APSS nem das razões que a levaram a tomar a decisão que tomou. Os espaços dos terminais portuários são espaços nobres, a sua função é servir de suporte à carga e descarga das mercadorias. Assim, não podem servir de armazéns ou parques, quando isso coloque em causa a principal função do porto que é carregar e descarregar mercadoria. Como havia falta de espaço e os responsáveis por retirar as mercadorias não o faziam em tempo útil, a APSS teve de aumentar de forma bastante expressiva os valores de parqueamento, criando assim um “estímulo” à retirada das viaturas de forma célere. Para concluir, para onde gostaria de ver o Porto de Setúbal caminhar nos próximos anos? A Comunidade portuária de Setúbal gostava muito de ver o Terminal de Contentores a crescer para valores mínimos de 10% ao ano. O ideal seria que se conseguisse pelo menos duplicar a sua actividade nos próximos cinco anos. Já para os outros terminais de serviço público, a nossa perspectiva é que irão crescer em função do mercado envolvente. Não é para nós expectável que tenhamos nestes segmentos crescimentos muito maiores do que 3% a 5% acima da economia nacional. Mas esperamos ter capacidade para melhorar cada vez mais a nossa eficiência e facilitar os nossos parceiros nos processos de importação e exportação.


www.revistacargo.pt

9


DE “A” A “Z”: RECORDAMOS OS GRANDES TEMAS DO ANO 2017! O ano de 2017 terminou e a Revista Cargo tomou a liberdade de recordar as mudanças profundas que se assistiram no sector dos Transportes e da Logística. Num exercício curioso, resumimos 2017 num único artigo e recordamos os grandes temas de “A” a “Z”.

A de Automação O fenómeno da Automação ganhou força ao longo de 2017, marcado por tecnologias que cada vez mais dispensam a intervenção humana. Os veículos rodoviários autónomos e os navios autónomos marcaram a agenda do sector e das notícias da Revista Cargo durante 2017, assim como os novos terminais portuários “fantasma”, onde não se vê um único trabalhador. B de Blockchain e Bitcoin Para a letra “B”, não conseguimos escolher entre duas novas tendências que prometem revolucionar o mundo e o sector dos Transportes e da Logística em particular. Primeiro, o fenómeno do Blockchain que foi exaustivamente analisado por nós ao longo de 2017. Já a Bitcoin ganhou notoriedade nos últimos meses, sendo o exemplo de criptomoeda com maior sucesso nos dias de hoje – e também já vai entrando no sector! C de Cibersegurança O tema da Cibersegurança acompanha, lado a lado, as novas tecnologias que ganham mais força. Porém, em 2017 foi destaque no sector dos Transportes e da Logística pelos piores motivos, quando o Petya fez colapsar os sistemas da Maersk ou da FedEx. Os efeitos perduraram por meses, afectaram os resultados das empresas e deixaram a nu as fragilidades do sector em termos de segurança informática. D de Dados Há quem diga que é o ‘Novo Ouro’ ou o ‘Novo Petróleo’. A valorização da Data (Dados) e da Big Data (grande volume de dados) ganhou novos contornos ao longo de 2017 e no sector dos Transportes e da Logística as coisas não são diferentes. Cada vez mais se observa a importância de trabalhar os Dados que, através da evolução tecnológica e de fenómenos como a IoT (Internet of Things) já chega de várias fontes. Trabalhar os Dados nunca foi tão importante e começamos a perceber verdadeiramente o que daí podemos extrair para os nossos negócios. E de e-Commerce A emergência das potências de e-Commerce como a Alibaba, a Amazon ou a JD.com não é de agora mas estes grandes players assentes em plataformas online têm sido notícia pela forma como 10

entram cada vez mais na área da logística. O ano de 2017 ficou marcado por uma série de passos dados na aproximação entre estas empresas e players marítimos de referência como a Maersk Line ou a Evergreen. F de Ferrovia 2020 2017 foi também ano de avanços no plano Ferrovia 2020, que contempla um grande investimento na rede ferroviária nacional, em particular para potenciar o transporte de mercadorias – nomeadamente ao nível do Corredor Internacional Norte e do Corredor Internacional Sul que melhoram as ligações entre os portos nacionais e a fronteira com Espanha. Em 2017 já foram lançados alguns concursos e colocadas no terreno algumas obras mas 2018 promete trazer avanços bem mais significativos. G de Gigaliners O ano de 2017 também ficou marcado pela chegada dos Gigaliners (megacamiões) a Portugal. Com algum atraso face ao que era de prever, só no final do ano a legislação nacional abriu a porta à utilização de camiões de 25,25 metros de comprimento, numa solução que poderá trazer poupanças de custos ou de emissões. H de Hamburg Süd A Hamburg Süd passou para as mãos da Maersk, naquele que foi o grande negócio do ano num sector do transporte marítimo contentorizado marcado por uma forte onda de consolidação de linhas. Muitos especialistas admitem que a consolidação no sector ainda não terminou e a Alphaliner antecipa que 2018 terá, pela primeira vez, mais de metade do mercado nas mãos dos três grandes: Maersk Line, MSC e CMA CGM. I de IATA Os números da IATA ao longo de 2017 deixaram claro que este foi um ano bastante positivo para a indústria da carga aérea. Com um início de ano pujante em termos de crescimento percentual, a IATA foi alertando para o facto do pico do mercado estar perto e a verdade é que nos últimos meses já se assistiam a crescimentos bem mais moderados. Ainda assim, a IATA estima que este ano feche com um crescimento de 9% na indústria e que o próximo ano traga mais 4,5% de crescimento. www.revistacargo.pt

J de JUL A JUL (Janela Única Logística) será, podemos dizer, a versão 2.0 da JUP (Janela Única Portuária). É um dos investimentos transversais aos diversos portos nacionais e parte da Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária apresentada pelo Ministério do Mar. A JUL foi verdadeiramente impulsionada durante o ano que agora termina, nomeadamente com a escolha de José Simão como Director-Geral da DGRM. Em breve será conhecida a empresa tecnológica vencedora do concurso para a implementação da ferramenta. K de Karlsruhe A cidade alemã de Karlsruhe ficou mais conhecida no sector dos Transportes e da Logística no ano de 2017, mas não pela melhor das razões. Isto porque foi aí, mais propriamente no Túnel de Rastatt, que ocorreu um dos grandes incidentes ferroviários do ano – não pela magnitude trágica ao nível de perdas humanas ou materiais mas pelos efeitos que teve na logística ferroviária do centro da Europa. O desabamento do Túnel de Rastatt ocorreu em Agosto deste ano e só alguns meses depois se voltaram a fazer comboios num dos troços de maior importância na logística ferroviária europeia. L de Lisbon Cruise Terminal É verdade que não se trata de um investimento para mercadorias mas não podíamos passar ao lado daquela que foi a grande inauguração a nível de infraestruturas portuárias em Portugal durante o ano de 2017. O Porto de Lisboa conta finalmente com um moderno, elegante e funcional Terminal de Cruzeiros, permitindo entrar no mercado do turnaround. M de Medway A Medway foi um dos players mais dinâmicos do ano e parece trazer uma luz ao fundo do túnel para o transporte ferroviário de mercadorias em Portugal. Com uma visão de crescimento a nível ibérico, apresentou novas locomotivas interoperáveis, ganhou o Terminal de San Lázaro – Mérida (numa parceria inédita com a espanhola Renfe) e posicionase na linha da frente para outros nós fundamentais da logística ferroviária ibérica.


N de NAL O sector aeroportuário nacional voltou a ficar marcado pelo debate sobre a localização do Novo Aeroporto de Lisboa (NAL). Um debate que dura há décadas mas que ganhou ao longo dos últimos tempos uma nova urgência, devido ao esgotamento da capacidade do Aeroporto Humberto Delgado. Em tempo de vacas magras, o Novo Aeroporto de Lisboa não avançará para já. O Governo optou pela solução Portela+1, sendo o Montijo a localização escolhida para o aeroporto complementar. O de OBOR A iniciativa OBOR (One Belt, One Road), também conhecida como Belt and Road ou, com alguma ligeireza, por Nova Rota da Seda, parece ter ganho verdadeiro destaque em 2017. Apresentada em 2013 pelo Presidente chinês Xi Jinping, foi inicialmente vista com algum desdém mas também com receio devido à componente expansionista que previa para a China. A verdade é que muitos países começaram a ver o seu potencial e, sobretudo, a disponibilidade financeira chinesa para grandes projectos fora do seu território. A OBOR liga a China aos países da Ásia Central, Médio Oriente, África e Europa, por mar mas também por terra com cada vez mais serviços ferroviários a ligar a China à Europa. Numa iniciativa do Ministério do Mar, uma delegação de empresários e entidades portuguesas deslocou-se à China para afirmar o país dentro desta iniciativa. P de Portos O ano de 2017 fecha com um novo recorde anual de carga movimentada nos portos nacionais. Ao longo do ano, ainda se projectou que o sistema portuário nacional chegasse já à histórica fasquia de 100 milhões de toneladas mas tal não foi conseguido. Ainda assim, foi o melhor registo de sempre dos portos nacionais, impulsionados pelo contributo inegável de Sines mas também por um Porto de Lisboa que cresceu extraordinariamente, por um Porto de Aveiro que ultrapassou, pela primeira vez na sua história, 5 milhões de toneladas ou pelo Porto de Leixões que continua a crescer e a dar um valente contributo à economia nacional. Q de Qatar A meio de 2017, o Qatar ganhou A meio de 2017, o Qatar ganhou protagonismo nas notícias. A região do Médio Oriente foi confrontada com notícias de alegados apoios do país a actividades terroristas na região. Isso levou a que países vizinhos como os Emirados Árabes Unidos, a Arábia Saudita ou o Egipto decretassem um bloqueio ao Qatar, algo que afectou ferozmente as trocas comerciais na região. Companhias marítimas como a COSCO, a Evergreen ou a OOCL suspenderam serviços para o país, que contornou algumas das sanções com o novíssimo Porto de Hamad. R de Reino Unido 2017 será um ano que nunca mais será

2017 será um ano que nunca mais será apagado da história da União Europeia (UE) pois ficará recordado como o ano do ‘Brexit‘. Não era novidade para ninguém que o Reino Unido não tinha uma visão marcadamente europeísta das suas relações com os parceiros da Europa continental. Ainda assim, o sufrágio de 2017 apanhou muitos de surpresa. O resto do ano ficou marcado pelas difíceis negociações entre UE e Reino Unido para os termos da saída mas também pelos alertas no sector dos Transportes e da Logística, com muitas preocupações sobre os efeitos nos tráfegos europeus de mercadorias de e para o Reino Unido ou com a falta de mão-de-obra que o país tem neste sector. S de Sines Sines aparece nesta lista por várias razões. Primeiro, pelo seu porto que, em 2017, foi confirmado pela primeira vez no top-100 mundial e no top-15 europeu no que diz respeito à carga contentorizada. Depois, porque se assinalaram os 40 anos da APS e, por conseguinte, do desígnio do Porto de Sines enquanto porto com potencial para o transporte de mercadorias. Mas 2017 foi também o ano do “grito do Ipiranga” de toda uma região que, pela voz da APS, da Câmara Municipal de Sines ou da ZILS (detida pela aicep Global Parques) se apresentou ao mundo como pólo industrial e empresarial de grande potencial, beneficiando do grande porto em redor do qual se instala. Ah, e quase nos esquecíamos: o Porto de Sines posicionou-se também em 2017 como porto hub para a entrada do GNL norte-americano no espaço europeu! T de Tesla Semi A 16 de Novembro foi apresentado o camião eléctrico da Tesla: o Tesla Semi. Numa cerimónia com pompa e circunstância, Elon Musk, fundador da Tesla, apresentou o camião que promete revolucionar o sector do transporte rodoviário de mercadorias, nomeadamente pela sua autonomia de mais de 800km. O Tesla Semi só chegará ao mercado em 2019 mas está disponível para pré-reservas e vários têm sido os operadores que se têm chegado à frente – entre os quais a Walmart ou a PepsiCo. U de ULCV Os ULCVs (Ultra Large Container Vessels) foram outro dos hot topics do transporte marítimo contentorizado. Depois de uma fase de maior abrandamento nas encomendas de novos navios portacontentores de grandes dimensões, CMA CGM, MSC, Cosco ou HMM começaram a fazer novas encomendas de ULCVs, sendo que o armador francês foi também notícia por ter escolhido o GNL como combustível para os seus novos navios. V de Vasco da Gama Um dos grandes investimentos da Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária será o Novo Terminal de Contentores de Sines, já conhecido como Terminal Vasco da www.revistacargo.pt

Gama. O sucesso inegável do Terminal XXI parece justificar a necessidade de fazer crescer o Porto de Sines no negócio dos contentores e não será de estranhar que o concurso (a ser lançado nos primeiros meses de 2018) possa captar a atenção de grandes players mundiais. W de Wes Amelie No início de Outubro, o navio Wes Amelie, da Unifeeder, tornou-se o primeiro portacontentores a ser convertido a GNL, num projecto liderado pela MAN Diesel & Turbo. Não sendo a solução mais acessível em termos financeiros, a conversão de navios já em operação ao GNL é mais um dos caminhos que se pode seguir para combater as emissões poluentes e ir ao encontro das metas de sustentabilidade cada vez mais ambiciosas para o shipping. X de Xangai Número um mundial nos contentores, o Porto de Xangai vai sendo o suprasumo portuário em várias áreas, desde capacidade, produtividade, engenharia ou tecnologia. Foi lá que, também em 2017, foi inaugurado o primeiro grande terminal de contentores automatizado do mundo. Y de Yilport Depois de em 2016 fechar a aquisição da Tertir junto do Grupo Mota-Engil, a Yilport (do Grupo Yildirim) instalouse verdadeiramente enquanto marca em Portugal durante este ano de 2017, nomeadamente ao assumir o nome de todos os terminais que detém nos vários portos portugueses e espanhóis (o Yilport Leixões, antigo TCL; o Yilport Liscont; o Yilport Sotagus, e por aí fora). A Yilport é também destaque em 2017 pela ambição demonstrada para Portugal mas também pelas críticas deixadas à antiga dona da Tertir, pelos parcos avanços a nível tecnológico feitos nos terminais. Z de Zero-Emissões O ano de 2017 foi mais um marcado pela grande preocupação ambiental em torno do sector dos Transportes e das suas emissões, um dos grandes responsáveis pelas emissões de poluentes à escala global. Na rodovia, na ferrovia, no aéreo e no marítimo, alguns avanços foram dados no sentido de encontrar soluções mais sustentáveis e amigas do ambiente. O gás natural parece ser visto com cada vez maior interesse na indústria do shipping, algo confirmado com as recentes encomendas da CMA CGM de meganavios a GNL. Portugal afirmou, também em 2017, o objectivo de ser um grande hub no bunkering de navios a GNL. Já na rodovia, apesar de algumas cartas dadas pelo gás natural (nomeadamente o GNL para camiões de longo curso, opção cada vez mais testada pelas fabricantes), a electrificação dos veículos ganhou alguma dinâmica com os exemplos do Tesla Semi, da eCanter que começou a ser produzida em série no Tramagal ou de outros avanços como o camião eléctrico da MAN.

11


OPINIÃO IMPACTO PROFUNDO DA APRENDIZAGEM AUTOMÁTICA NA LOGÍSTICA E NO SHIPPING

Vítor Caldeirinha

A ML emergiu como o método de escolha para o desenvolvimento de software prático e simplificado para reconhecimento de fala, linguagem natural, reconhecimento de faces e imagens, processamento, controle de robôs e outras aplicações. Muitos programadores de sistemas AI reconhecem que, para muitas aplicações, pode ser muito mais fácil treinar um sistema mostrando exemplos do comportamento com inputs e output desejados, do que programar manualmente a totalidade das regras, antecipando todas as situações e as respostas, para todos os inputs possíveis.

Vítor Caldeirinha é Doutorado em Gestão Portuária e Mestre em Gestão/MBA, sendo hoje professor de Gestão e Estratégia Portuária no Instituto Superior de Economia e Gestão - ISEG (UTL).

Os especialistas preveem que nos próximos 10 a 20 anos a Inteligência Artificial (AI do inglês) seja uma nova revolução industrial, social e mental global, com um impacto profundo em todos os aspetos da nossa vida. Esse impacto será especialmente mais rápido e forte na cadeia de produção e em toda a cadeia logística, onde as mudanças já estão a acontecer a elevado ritmo. Os preços serão cada vez mais baixos, as entregas mais rápidas, o serviço melhor, a procura mais volátil com cada vez maior variedade de produtos, as cadeias de abastecimento cada vez mais complexas e os carregamentos menores e mais frequentes. Os efeitos também estão a chegar ao shipping e aos portos, mas o ritmo vai começar a aumentar cada vez mais nos próximos anos. Mas vamos por partes. Afinal o que é a Inteligência Artificial? A AI consiste na criação de algoritmos (software ou “agentes inteligentes”) que corre em computadores e imitam a inteligência humana e lhes permita executar funções de mentais e mecânicas que apenas os humanos conseguem realizar, com o mesmo desempenho ou melhor. Recorrese ao raciocínio, inferência, reconhecimento de padrões e aprendizagem automática. Dos principais campos da AI, aquele que tem conhecido maior desenvolvimento, e do qual é esperada a parte de leão da revolução dos próximos anos, é a aprendizagem automática (ML – Machine Learnig). A ML tem como objetivo desenhar algoritmos standard que permitam aos computadores aprenderem sozinhos todas as regras e padrões de qualquer problema em qualquer campo de interesse, de forma autónoma e sem intervenção humana, a partir de dados massivos de input e output que recolhe na realidade e na internet (Big Data), utilizando as diversas ferramentas científicas disponíveis. A ML permitirá que o mesmo software (Algoritmo-mestre) consiga aprender sozinho a guiar um automóvel, a jogar xadrez, a otimizar a cadeia logística ou a prever a evolução dos fretes. 12

O impacto na logística deverá ser enorme e profundo. Por agora apenas podemos imaginar algumas tendências: a) Veículos, equipamentos e máquinas de produção autónomas – A AI e a ML estão a permitir gradualmente que os computadores passem a conduzir camiões, carros, navios, aviões, drones, pórticos de cais, pórticos de parque, trailers de parque, empilhadores, máquinas, robots de produção, produção automática de produtos não standard, entre outros, de forma mais eficiente que os humanos, 24 horas, com maiores produtividades e sem greves; b) Melhoria da satisfação dos clientes – feedback em tempo real, conhecer o cliente com dados agregados, antecipação de compras, sugestão de compras, redução das falhas de previsão de produção, análise de Big Data, redução das reclamações. c) Redução de custos logísticos – redução dos espaços em vazios nos meios de transporte, redução dos percursos, otimização de meios, redução do tempo de entrega, gestão inteligente dos hubs locais e da rede, melhoria da performance ambiental da logística;

www.revistacargo.pt


Autonomous Logistics in Upstream Management Autonomous logistics could extend beyond warehouses to outside logistics with functions such as cross-docking, transshipment, and long-haul transport becoming fully automated and intelligent.

Technology

Companies

Autonomous

Kiva, Kuka, Savant, Automation Inc.,

Guided Vehicles

JBT Corporation.

Autonomous

Konecranes, Potain, Tower Cranes

Cranes Mobile Robots

Fetch Robotics, Aethon, Blue Frog Robotics

Source: Frost & Sulivan

d) Seguimento da carga em tempo real de todos os processos, eventos, localização, estado, previsão, otimizando alternativas a todo o momento de forma automática e evitando congestionamentos e falhas. e) Conhecimento total de todo o inventário a todo o momento versus conhecimento real da procura a todo o momento, em termos de produtos e destinos / tempos de entrega, melhorando a eficiência global e a satisfação. f) Previsão e planeamento da produção otimizada. g) Redução drástica do emprego humano a níveis nunca vistos na logística. O Shipping e os portos terão também um forte impacto da ML e da IA: a) A tecnologia de logística preditiva resultará no transporte personalizado de contentores, aproveitamento dos espaços em vazio, capacidade automática de superar problemas operacionais difíceis encontrados todos os dias e maior rentabilidade para a indústria de navegação. b) Os modelos de previsão fornecerão aos clientes rotas mais otimizadas de forma automática e adaptativa, sem decisão humana, navios não tripulados, terminais portuários sem pessoas, opções muito acessíveis e tempos de trânsito precisos, fiabilidade e transparência dos portos. Os expedidores e os compradores irão desfrutar de serviços de transporte fiáveis, visíveis e coerentes por via marítima, muito competitivos com a rodovia.

Drones

senseFly

Autonomous Ships

Rolls-Royce, ABB Marine, Fincantieri

Truck Platooning

Daimier, Iveco, Scania, DAF

AutonomousTrucks

Daimier, Iveco, Navistar, Paccar.

Self-driving cars

BMW, Daimer, Ford, Toyota, Hyundai

d) Ajudar os transportadores marítimos a prever com precisão a procura, analisar tendências em cadeias de abastecimentos, monitorar calendários sazonais e rastrear os padrões diários. e) No geral, essa inteligência pode ajudar os expedidores a reduzir o risco, otimizar as rotas e até mesmo aprender novas rotas à velocidade do raio. A LM pode preencher automaticamente ordens de envio, contas de embarque e outras transações, o que economiza o tempo valioso do remetente. f) Por exemplo, uma grande multinacional, com vários locais de produção, acompanhará e decidirá de forma automática sobre as previsões financeiras, ritmos e fluxos de produção e processamento de pedidos e rotas de shipping e portos. No futuro, a Internet de Todas as Coisas (IOE – Internet of Everything) e os computadores processarão continuamente sinais digitais - representando o estado das capacidades, inventário e movimentos, levando o mundo físico a convergir com o mundo digital. Isso exigirá à cadeia de abastecimentos soluções de software em tempo real. A informação pode ser usada para sincronização precisa entre fabrico, armazéns, lojas e consumidores finais. A ciência de dados e as “empresas de matemática” serão as competências básicas na gestão das modernas cadeias de abastecimentos.

c) Ajudará os carregadores a otimizar a seleção de operadoras, classificação, rotas e processos de controle de qualidade que economizem custos e melhoram a eficiência. Com a sua capacidade de reunir e analisar milhares de dados diferentes, a LM pode ajudar a resolver qualquer problema novo e desconhecido e reconhecer padrões, escolher a melhor rota, o melhor prestador de serviços de transporte intermodal, de forma automática, em mercados livre e com plena informação geridos por algoritmos.

www.revistacargo.pt

13


ENTREVISTA A RUI BARROS (MITMYNID): «O BIZCARGO QUER SER O MARKETPLACE DE REFERÊNCIA MUNDIAL NOS TRANSPORTES E LOGÍSTICA» Apresentado em Setembro de 2017, no Porto de Leixões, o portal BIZCARGO cumpre o primeiro trimestre de actividade e, em entrevista à Revista Cargo, Rui Barros faz um balanço muito positivo dos primeiros meses de operação da ferramenta que quer ser uma «referência mundial». Já com 150 entidades registadas, o BIZCARGO traça um caminho ambicioso para o futuro. Como nasceu o BIZCARGO e o que já se pode destacar desde a sua criação? A MITMYNID é uma Startup que resulta de uma spin-off de um grupo de investigação do INESC TEC que trabalha há mais de 20 anos com entidades da logística e dos transportes. Em particular, os Portos de Leixões e Lisboa, entre outros, têm sido das entidades pioneiras na inovação de sistemas com a qual este grupo tem feito investigação e inovação. Felizmente, o tecido empresarial português na área dos transportes e da logística tem uma visão muito voltada para a adopção de novos paradigmas e esta visão tem permitido que sejam realizados trabalhos em conjunto, com resultados muito interessantes, e que posicionam Portugal com algumas das boas práticas a seguir por outros países. O BIZCARGO é um dos resultados desta empresa e pretende constituir-se como o marketplace de referência mundial nos transportes e na logística. Que oportunidades ou falhas no mercado foram identificadas para que fosse lançada esta solução BIZCARGO? O sector dos transportes de mercadorias e da logística tem vindo a redescobrir novas formas de fazer negócio e, estando atentos ao que acontece noutros sectores, os clientes e os operadores começaram a sentir a necessidade

14

de introduzir novas ferramentas que aumentem a produtividade, melhorem a colaboração e permitam obter informação mais rapidamente. Por outro lado, as autoridades nacionais, europeias e internacionais necessitam ter informação atempadamente e mais precisa para que possam realizar as suas actividades de controlo e de segurança com maior eficácia. O BIZCARGO nasce como resultado de um processo de inovação que dá reposta às necessidades expressas pelos principais actores do transporte e da logística: os clientes, os operadores/ fornecedores e as autoridades.

com outras soluções similares no mercado? O BIZCARGO.com é um portal online para procurar e comparar os melhores serviços de transporte e logística com soluções simples ou multimodais portaa-porta, onde os clientes podem pedir cotações gratuitamente, gerir os seus bookings e acompanhar a execução do transporte. Procura e combina serviços para fornecer soluções optimizadas, dando relevância a requisitos como ecoeficiência, duração, preço e avaliação dos serviços, etc.

Dos estudos que realizamos, com players de referência no negócio e de clientes dos serviços de logística e transporte, concluímos que era necessário aumentar a visibilidade ao longo da cadeia logística, acrescentar valor com soluções multimodais porta-a-porta optimizadas, simplificar e harmonizar os processos de contratualização e interacção entre operadores, disponibilizar mecanismos de booking electrónico, fomentar soluções logísticas colaborativas – incluindo PMEs e melhorar o suporte aos processos de crédito documentário e de seguros, mas, focando essencialmente nas necessidades dos clientes de serviços logísticos e na interação entre operadores.

As soluções propostas baseiam-se em serviços de um catálogo próprio do BIZCARGO e em serviços presentes noutras plataformas online, simplificando a procura das melhores soluções numa única plataforma.

Que mais-valias identifica na solução BIZCARGO quando comparada

Os operadores de logística e transporte (transitários, rodoviários, marítimos,

www.revistacargo.pt

Os clientes de serviços logísticos e de transporte (empresas de indústria e comércio, particulares) passam a poder encontrar oferta diversificada (multimodal, multiempresa, concorrencial) para as suas necessidades, comparando as propostas e seguindo um processo harmonizado para todos os operadores. Poupam tempo dos seus recursos na descoberta de serviços e controlam as execuções facilmente, online ou através de APPs móveis.


ferroviários, despachantes, armazéns, etc.) passam a disponibilizar os seus serviços online, à semelhança dos grandes operadores globais, sem necessidade de fazer avultados investimentos em TI e passam a ter uma ferramenta eficaz para gerir electronicamente os bookings. Os seus colaboradores melhoram o desempenho com o uso das ferramentas de gestão de oportunidades e de gestão da execução (Planeamento e Track and Trace). A interoperabilidade entre o BIZCARGO e os actuais sistemas internos agiliza as tarefas deixando mais tempo aos operadores para cuidarem do negócio, evitando duplicação de tarefas. Inova no processo adicionando benefícios para operadores e clientes, porém convive facilmente com as formas actuais de fazer o negócio. Encontra novas soluções SMART, combinando serviços de empresas que não possuem pré-acordos de cooperação e que nunca antes foram combinados. O BIZCARGO é a solução que permite aos clientes reduzirem os custos na procura das melhores soluções, e que aumenta a produtividade e a colaboração dos fornecedores de serviços logísticos. Para que tipo de clientes da cadeia logística nasce esta solução? Os clientes de serviços de logística e transporte são muito diversificados e possuem necessidades particulares, contudo, os métodos de procura e de contratualização desses serviços é muito semelhante entre todos. O BIZCARGO vem posicionar-se exactamente nesse espaço, isto é, na facilitação da procura de serviços e fornecedores e na gestão dessa relação entre clientes e fornecedores. Assim, todos os clientes de serviços logísticos podem tirar partido das facilidades do BIZCARGO. A oferta de serviços que já existe na plataforma e que cresce semanalmente é diversificada e visa responder às necessidades dos mais variados tipos de clientes – indústria e comércio, importação e exportação, transporte local de mercadorias, entregas expresso, transporte de longo curso, etc. Por outro lado, o BIZCARGO permite contratualizar uma grande variedade de serviços como transporte, armazenagem, despacho, legais, seguros, crédito entre outros. O princípio de funcionamento permite que todo e qualquer serviço associado à movimentação de mercadorias seja contratado online através do BIZCARGO. com. Quantos clientes usam hoje a plataforma BIZCARGO? Qual a cobertura geográfica da mesma? E

quais os volumes já hoje processados? Desde o lançamento público da plataforma em Setembro, mais de 150 entidades já se registaram na plataforma e existem mais de 1700 serviços disponíveis. A cobertura geográfica da plataforma é global uma vez que os operadores presentes asseguram serviços para uma grande parte do globo, havendo actualmente, ao nível de serviços locais uma maior presença para Portugal e Espanha. O tipo de volumes processados varia desde a pequena encomenda, mobílias de habitações, paletes com produtos alimentares e não alimentares e contentores. Mais recentemente, surgiu a procura para volumes refrigerados. O BIZCARGO tem registado um crescimento rápido e diversificado, apesar das acções de marketing já realizadas visarem sobretudo a oferta de serviços. Brevemente, iremos iniciar campanhas de marketing para divulgação, visando os potenciais clientes que procurarão esses serviços logísticos. Dentro desses clientes há alguns nomes que mereçam ser destacados? Ou algumas incorporações novas de grande importância? O BIZCARGO foi desenvolvido integralmente pela MITMYNID, contudo, resulta de parcerias estratégicas e de projectos para os quais contribuíram empresas de referência. Na perspectiva de cliente contamos com a Sonae Indústria, o Grupo Amorim, a Cerealis, a Unicer e a Sogrape. Na perspectiva de gestores de infraestruturas e operadores, temos como parceiros o Porto de Leixões, o Porto de Lisboa, o Grupo ETE, a Comunidade Portuária de Leixões, a APAT - Associação de Transitários, a AGEPOR - Associação de Agentes de Navegação e mais recentemente a ODO - Ordem dos Despachantes Oficiais e a ANTRAM - Associação dos Operadores Rodoviários. Somente com estas parcerias estratégicas foi possível criar um serviço que dá resposta às necessidades de todos os intervenientes no transporte e logística de mercadorias. Todas as semanas, surgem novas empresas a operar no BIZCARGO e a sua adesão é divulgada através da página de entrada da plataforma. Fale-nos um pouco da oportunidade que surgiu de trabalhar com o Grupo ETE. Como surgiu a oportunidade e que conclusões foram retiradas desse trabalho? O Grupo ETE é uma das referências nacionais no sector dos transportes de mercadorias e da logística, integrando uma diversidade grande de empresas. www.revistacargo.pt

Esta parceria resulta da experiência e presença que temos no sector há muitos anos, bem como de outras parcerias estratégicas com entidades de referência. Durante 2016 e 2017, a MITMYNID realizou um projecto demonstrador cofinanciado pelo NORTE2020, Portugal 2020 e União Europeia, através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional que visou demonstrar o conceito e a aplicabilidade da tecnologia no sector dos transportes e da logística. A parceria que estabelecemos com o Grupo ETE permitiu identificar e validar os requisitos do sistema tendo em consideração diferentes perspectivas, bem como realizar um demonstrador em ambiente real. O projecto permitiu confirmar os pressupostos iniciais, dando assim validade à iniciativa, e assegurar que a tecnologia permitirá obter um crescimento substantivo na economia nacional e que possui uma grande capacidade de expansão internacional. Foi ainda possível concluir que uma plataforma com estas funcionalidades tem capacidade para estruturar a oferta de serviços de um grupo empresarial, apresentando aos clientes soluções integradas baseadas nos serviços de cada uma dessas empresas, melhorar a performance e aumentar a colaboração dentro e entre as empresas de um grupo, bem como da sua rede de parceiros. O caso de estudo realizado com o Grupo ETE permitiu demonstrar o potencial de replicação que esta solução tem no contexto de outros grupos empresariais do sector. O mundo está em mudança com novas tecnologias e tendências disruptivas. É o momento certo para plataformas como esta? A dúvida sobre o momento ideal para aplicar soluções de mudança nos sectores mais tradicionais, permanece como uma questão viva. A experiência de outros sectores mostra que não existem momentos ideais, mas antes, momentos em que a transformação acontece. Vejam-se os casos de sectores como a hotelaria e a aviação civil nos quais transformações semelhantes aconteceram há já alguns anos, ou mesmo décadas. As transformações nestes sectores tiveram impactos muito positivos, sendo os mais destacados a democratização no acesso aos serviços por parte de todos os cidadãos - independentemente das suas posses, o aumento generalizado do volume de transações e consequente crescimento dos setores e por fim, o surgimento de novos serviços mais adequados à procura, e, a indução de novas necessidades na população. 15


O sector dos transportes e da logística não é diferente dos referidos acima e tem um potencial enorme de crescimento por via do aumento da eficiência. A adopção de novas tecnologias e de novos paradigmas vem proporcionar esse crescimento e dar resposta às necessidades que já hoje se sentem por parte de quem compra serviços de transporte e logística. Convém realçar que as gerações que neste momento estão mais activas lidam diariamente com aplicações e plataformas para realizar as mais diversas actividades quotidianas. Os transportes de mercadorias não irão conseguir manter-se imunes a esta tendência por muito mais tempo. As empresas que mais rapidamente adoptem estas ferramentas e adequem a sua oferta e modo de operar, terão certamente uma vantagem competitiva muito grande relativamente às outras. Além do mais, o investimento para essas empresas é insignificante, uma vez que este é realizado pelos donos das plataformas. Nesta mudança de paradigma na forma de fazer negócios, sente que o mercado português está a abraçar com a devida rapidez as novas tecnologias? Portugal tem características intrínsecas na sua população que facilitam a entrada de novas tecnologias e a adopção de novos processos que facilitam as suas vidas. Além disso, o tecido empresarial tem vindo a acompanhar a dinâmica de inovação que existe, desde há alguns anos, e a vencer os receios que a introdução do digital induz. Os ganhos desta transformação são demasiado evidentes para que as empresas se deixem ficar fora deste movimento. Por outro lado, a sua adopção não depende de investimentos avultados, o que permite uma entrada acelerada de empresas com diferentes recursos, sejam grandes, médias ou pequenas empresas. O mercado português irá com certeza abraçar este desafio muito rapidamente. Não há tempo para hesitações ou para ficar a ver o que acontece, sob pena de - as empresas que não acompanhem deixarem de ser atractivas e competitivas. 16

A confidencialidade dos dados é um dos requisitos mais críticos? Sente que há resistência à partilha de dados no sector? A confidencialidade dos dados é efectivamente um requisito muito crítico! Convém referir que estes serviços de cariz digital estão sujeitos a legislação muito apertada no que se refere à manutenção da confidencialidade dos dados e que é possível garantir um nível muito elevado de segurança desses dados, sendo que a quebra da confidencialidade acontece essencialmente pela adopção de más práticas ou pela falta de implementação de normas de segurança. O sector dos transportes e da logística não é diferente de outros sectores quanto à partilha de informação, pois esta já se realiza com naturalidade. O que existe é uma sensação generalizada de que os parceiros e/ou concorrentes não conhecerão o negócio, a carteira de clientes e as condições aplicadas em cada negócio. A realidade é que o BIZCARGO não pretende alterar este estado de conhecimento nem fomentar o acesso indevido a dados de negócio. Apenas introduz mecanismos expeditos de negociação usando como base informação de carácter público relativamente aos serviços prestados pelas empresas e facilita as negociações entre clientes e fornecedores de um modo completamente privado, no qual somente utilizadores autorizados pelas entidades envolvidas em cada negócio podem aceder à informação. Como se tem trabalhado a plataforma BIZCARGO no âmbito da cibersegurança? A ciber-segurança passa essencialmente pela adopção de tecnologias confiáveis, pela aplicação de boas práticas no armazenamento e no acesso aos dados, pelo suporte e aconselhamento aos utilizadores e pelo cumprimento das normas e da legislação nacionais e internacionais. No desenvolvimento do BIZCARGO foram considerados todos os requisitos que asseguram um nível de segurança muito elevado e utilizadas as mesmas tecnologias que são usadas noutros sectores críticos, nomeadamente a www.revistacargo.pt

encriptação dos dados. Em termos de níveis de qualidade do serviço são utilizados recursos que permitem assegurar redundância, resiliência e elevada elasticidade de modo a garantir uma disponibilidade compatível com as necessidades do sector. Para o futuro, que metas estão traçadas para a evolução da plataforma? Desde a sua génese que a plataforma BIZCARGO tem um plano de desenvolvimento que prevê o surgimento permanente de novas funcionalidades ou serviços. Desde o lançamento da versão inicial, em Setembro, foram apresentadas novas funcionalidades todos os meses que visam facilitar as actividades e que têm em consideração o feedback recolhido dos utilizadores. Há um conjunto de novos desafios que estão já planeados e que serão trabalhados durante os anos de 2018 e 2019 e que visam manter uma dinâmica de inovação constante na plataforma. Temas como a análise das oportunidades de negócio, o aumento da interacção e da colaboração entre operadores, a integração com mais entidades e plataformas fazem parte do roadmap de evolução da plataforma. E que entraves de hoje gostaria de ver resolvidos? O sector dos transportes e da logística e os agentes económicos, de um modo geral, poderiam aumentar consideravelmente a sua competitividade se alguns dos processos burocráticos e obrigações a cumprir fossem modernizados e sujeitos a uma melhoria na interacção, com as respectivas autoridades, por via electrónica e suportada por processos automatizados. Por outro lado, a harmonização de procedimentos e a adopção de normas para a comunicação de dados viria certamente reduzir os designados custos de contexto que pesam sobre as operações no sector. Esta é uma área na qual a MITMYNID já se encontra a trabalhar activamente, nomeadamente com a Comissão Europeia através da Directorate-General for Informatics e o Digital Transport and Logistics Forum liderado pela DG MOVE - DG Mobility and Transport.


Melhores acessibilidades marítimas, Maiores navios. Melhores ligações ferroviárias, Maior eficiência. Melhor janela única portuária, Menos burocracia.

Melhor ambiente para negócios. www.revistacargo.pt

www.portodesetubal.pt 17


OPINIÃO PORTO DE LISBOA E PORTO DE SETÚBAL SÃO O MESMO PORTO PARA A REGIÃO DE LISBOA José Augusto Felício

Resumo A infraestrutura portuária de Setúbal tem como vocação a movimentação de cargas ro-ro, cargas fraccionadas e granéis em terminais multipurpose e cargas contentorizadas em terminais especializados e crescentemente complexos. O porto de Setúbal, configurado na base da filosofia porto-cidade, dispõe de condições para servir a região de Lisboa como principal porto de movimentação de cargas contentorizadas, substituindo-se ao porto de Lisboa, configurado na base da filosofia cidade-porto. A vocação da infraestrutura portuária de Lisboa é a actividade de cruzeiros marítimos, como importante plataforma de origem e destino de passageiros. O modelo de governação portuária Lisboa-Setúbal e a opção estratégica para o seu desenvolvimento sustentável obrigam à especialização e vocação destas infraestruturas portuárias. A gestão, como função ou cargo, é de enorme complexidade.

José Augusto Felício é Doutorado em Gestão no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). Na mesma instituição, é hoje professor e Presidente do Centro de Estudos de Gestão. É ainda investigador nas áreas de gestão empresarial e gestão portuária e tem várias obras e textos publicados nesses âmbitos.

1. Enquadramento A observação holística da região de Lisboa, na perspectiva helicopteriana, permite reconhecer a lógica de expansão urbana, a logística empresarial e a implantação das infraestruturas de transporte, em especial, tendo em vista a localização e alargamento necessário do porto de Setúbal e do porto de Lisboa. A cidade abraça o porto de Lisboa, ao longo da extensa costa estuarina, e evidencia todos os locais onde operam terminais de carga que obstaculizam o acesso ao espelho de água. Este conflito cidade - porto é, hoje em dia, assunto de primeira ordem, em todos os casos em que a massa urbana pressiona e exige a prevalência dos cidadãos sobre os terminais empurrando-os para fora da cidade. O porto coloca exigências tecnológicas e de organização do seu espaço próprio e de outros complementares que acentuam os conflitos com a cidade, por exemplo, nos acessos por via ferroviária e rodoviária. O acesso marítimo e a navegabilidade do estuário não apresentam grandes limitações, porém, a cidade sobrepõe-se no quadro do paradigma cidade-porto, para o que são predominantes os interesses da cidade sobre o porto. Por mais que a Comunidade Portuária de Lisboa lute em defesa dos seus interesses, baseando as decisões em critérios de racionalidade, desligadas de processos sombra, a realidade exige encontrar soluções alternativas e novas para a localização dos terminais de carga. A ideia de os transferir para a margem sul, no mínimo mantendo o actual volume de carga, não apresenta lógica, por várias razões das quais destacamse as questões de investimento em novos terminais e áreas logísticas, as questões envolvendo a distância percorrida no estuário, as questões sobre o movimento de cacilheiros na ligação de transporte de passageiros entre as margens nortesul, mas, sobretudo, questões quanto às condições de calado e manutenção dos canais de acesso e bacia de manobra para os navios de carga. Além de razões ambientais, os custos de manutenção são incomportáveis. No entanto, pensar na construção de um terminal de cargas contentorizadas e outras cargas na Trafaria, como terminal de transhipment, aproveitando o fecho da golada, tem todo o sentido, por razões bem mais relevantes e que se prendem com a natural solução que tarda, evitar um desastre humano e patrimonial na Costa da Caparica. Se ocorrer será bom, então, saber quem são os responsáveis e atribuir-lhes responsabilidades. 18

A alternativa natural aos terminais de carga do porto de Lisboa reside em apostar no desenvolvimento do porto de Setúbal, subordinado ao paradigma porto-cidade, como infraestrutura natural da região de Lisboa. As razões que suportam esta aposta são várias: Primeira, o porto de Lisboa e o porto de Setúbal referem-se ao mesmo porto, constituído por duas infraestruturas independentes e complementares, distantes cerca de 18 milhas marítimas, que na perspectiva marítima e portuária representa a mesma unidade portuária, embora com duas entidades administrativas (Figura 1); Segunda, estas infraestruturas não dispõem de massa crítica para competirem, a não ser que imponham preços (monopólio/oligopólio), e por isso são naturalmente complementares. Terceira, o porto de Setúbal dispõe ainda de condições de expansão para a criação de um importante cluster industrial na Península de Setúbal. Quarta, o porto e a região já dispõem de importantes infraestruturas rodoviárias e ferroviárias, entre outras razões. Quinta, a cidade de Setúbal obedece ao paradigma portocidade e desenvolve-se como cidade industrial e de pesca, com indústrias associadas, nomeadamente conserveira e outras, bem como, com actividades de construção e manutenção de embarcações de pesca e indústria naval. Em termos económicos, a Área Metropolitana de Lisboa representa 36,9% do PIB e 36,9% do VAB nacional, emprega 29,2% do total de emprego, a que correspondem cerca de 1.316 mil pessoas que, em média, obtêm de rendimento 22,8 m€ per capita, com uma produtividade aparente do trabalho de 1,3 vezes superior à do País (CML, 2016). O impacto económico do porto de Lisboa compreende um VAB de 4,5 mil milhões de euros e 40,0 mil postos de trabalho e o porto de Setúbal (2009) um VAB de 2,3 milhões (1,6% do VAB nacional) e 33,3 mil postos de trabalho. Em conjunto fica-se com a noção real da sua importância estratégica, em termos económicos, envolvendo as duas plataformas logísticas multimodais, em conjunto com cerca de 75 mil empregos e VAB de 7 mil milhões de euros. O porto de Lisboa é uma importante plataforma logística multimodal, sendo

www.revistacargo.pt


Figura 1 – Enquadramento territorial de Setúbal Fonte: CMS (2016). Plano Estratégico de Desenvolvimento

também estratégico na importação e exportação para a indústria agroalimentar Ibérica. Porém, o porto de Setúbal vai além por permitir condições de acesso natural aos seus terminais e áreas industriais e de actividades logísticas que, a par das acessibilidades rodo e ferroviárias, lhe confere vantagens competitivas para a expansão e consolidação de importantes ZIL e ZAL. O responsável do governo pelo sector, em reflexão sobre a relação entre o porto de Setúbal e o porto de Lisboa, envolvendo a Comunidade Portuária de Setúbal (CPS), refere que “O modelo de fusão dos portos de Setúbal e Lisboa não está decidido pelo Governo (2017), mas dispõem de um conselho de administração comum aos dois portos com estratégias adequadas à especificidade de cada uma das estruturas portuárias, num quadro de maior integração e coesão territorial da Região”. Considerando a avaliação produzida compreendem-se melhor, por um lado, a dificuldade quanto às oportunidades de solução com alcance estratégico, por outro, o ensejo das entidades privadas em obter essas mesmas soluções face a interesses de grande monta. Uma das questões centrais envolve o modelo de governação do porto Lisboa-Setúbal, constituído por duas infraestruturas, localizada uma em Lisboa e outra em Setúbal, formando a mesma entidade. Trata-se de definir a supraestrutura portuária (diferente de superestrutura) de governação, cujo desenho de arquitectura determina o maior ou menor sucesso de desenvolvimento sustentado das duas infraestruturas e das suas condições para servir a região de Lisboa. É interessante mencionar os três escalões de organização portuária envolvendo a infraestrutura (ex., acessos e terminais), a superestrutura (ex., equipamentos, armazéns, SIG, etc.) e supraestrutura (ex., governação, administração, gestão). O modelo de governação deve integrar o órgão de gestão executiva, o órgão de administração portuária, o conselho geral portuário, a assembleia geral portuária, etc. No caso da entidade denominada porto Lisboa-Setúbal é essencial que sejam envolvidas as Comunidades Portuárias de Lisboa e Setúbal, os representantes das autarquias de Lisboa e Setúbal, os representantes do governo e outras entidades que se considerem relevantes na defesa de interesses da região de Lisboa. Esta reflexão é da maior importância se houver o cuidado em assegurar a sustentabilidade do modelo de governação, o que exige estabilidade, responsabilização e total independência das múltiplas entidades envolvidas.

Cada uma das infraestruturas, a de Lisboa e a de Setúbal, deve ser gerida por profissionais reconhecidamente competentes e conhecedores do sector marítimo e portuário e integrar o conselho de administração da entidade comum, responsável pelo planeamento estratégico, política de investimentos e estratégia, aprovados pelos órgãos de governação respectivos. O pensamento sobre o porto Lisboa-Setúbal deverá considerar o «projecto do terminal de transhipment da Trafaria». Trata-se de um projecto estratégico, desfocado do mercado da região de Lisboa, este sim associado ao porto gateway que serve directamente o mercado pertinente. O «projecto da Trafaria» começa por solucionar o problema sério da costa da Caparica e ganha dimensão ao potenciar a posição geoestratégica de Portugal no cruzamento de dois dos maiores tráfegos marítimos do mundo, o que flui pelo mar do Mediterrânio via canal do Suez, que se cruza com os tráfegos marítimos do Atlântico sul, Brasil, África do Sul e Austrália, e com os tráfegos do Atlântico Norte que servem o mercado europeu e costa leste americana. O principal suporte destes tráfegos baseia-se no porto de transhipment de Sines, que tem como concorrentes o porto de Algeciras e o porto de Tanger-Med. O porto Lisboa-Setúbal alarga-se com a criação do terminal da Trafaria. Este projecto complementa a capacidade do porto de Sines, o que obriga a um entendimento estratégico entre o porto de Sines e o porto Lisboa-Setúbal. Compreende-se a importância atribuída ao pensamento estratégico, exigente na capacidade para pensar e antecipar o modelo de governação, procurando aproveitar as oportunidades potenciando os interesses da região de Lisboa e os interesses estratégicos do País no mundo, com a complementaridade de dois portos de transhipment em cooperação nacional. O porto de Sines suporta-se na zona industrial logística (ZIL) e zona de actividades logísticas (ZAL) que lhe estão adjacentes. O porto Lisboa-Setúbal aposta na ZIL localizada na Península de Setúbal, alargada para norte ou para leste, e na ZAL implantada junto da infraestrutura portuária de Setúbal. Este projecto da Trafaria confere outra escala e dimensão à economia nacional. Ou seja, alargando a reflexão ao muito falado e polémico «projecto portuário do Barreiro» só tem sentido como um pequeno terminal de expressão local ou regional, capacitado para o transporte de cabotagem ou pouco mais. Este tema da forma como tem sido abordado não faz qualquer sentido, por razões de inviabilidade económica e financeira e por razões ambientais, de acordo com os relatórios produzidos, sendo estranhas as mais diversas orientações em sua defesa.

www.revistacargo.pt

19


Figura 2 - AML (NUTS III)

2. Contentores em Setúbal e cruzeiros marítimos em Lisboa O porto de Lisboa desde tempos imemoriais se identificou com a cidade e suportou o seu crescimento, desenvolvimento e expansão urbana, mais recentemente como plataforma intermodal de movimentação de tráfegos de importação e exportação de mercadorias. Na sua circunscrição implantaram-se grandes indústrias e a região potenciou o seu poder económico. O recurso a cargas contentorizadas alterou em todo o mundo a filosofia do transporte, especialmente, o transporte marítimo, ao estabelecer o TEU (Twenty-foot Equivalent Unit) unidade estandardizada, permitindo especializar e dimensionar os navios, desenvolver a intermodalidade e aumentar o nível de eficiência portuária para valores nunca antes alcançados. O paradigma portocidade ao condicionar o desenvolvimento urbano define a tipologia de cidade o que, em muitos casos, decorre do sucesso portuário, levando ao invés que o paradigma cidade-porto expulsasse o porto tradicional da zona de expansão da cidade. É o que ocorre com a cidade de Lisboa, em que toda a filosofia de expansão e desenvolvimento urbano se baseia no paradigma cidadeporto. No caso da cidade de Setúbal a relação assenta no paradigma portocidade, razão porque esta urbe abraço o seu parto para se desenvolver conjuntamente ao mesmo tempo que o protege, também, por influência e proximidade da urbe dominante que é a cidade de Lisboa. Para além disso, o porto de Setúbal dispõe de condições de expansão para leste, espaço esse

20

desligado da cidade, o que lhe concede prerrogativas especiais e favoráveis, muito diferentes do que acontece com Lisboa (Figura 2). O Porto de Setúbal dispõe de infraestruturas para a movimentação de todos os tipos de carga, nomeadamente, carga ro-ro, carga contentorizada e carga fraccionada e granéis. Situase na junção dos principais eixos rodoferroviários do País com ligação a Espanha e de interface na ligação internacional e logística da região de Lisboa e Vale do Tejo e zona centro do País (Figura 3). A autoridade portuária (2013) gere directamente cinco terminais (multiusos, ro-ro e dedicados) e tem concessionados ou licenciados outros nove terminais. A vocação do porto de Setúbal abarca as mais diversas cargas, sejam o transporte de viaturas no terminal ro-ro, o transporte de cargas fraccionadas e granéis em terminais multipurpose, os terminais dedicados para indústrias específicas, bem como, as cargas contentorizadas que ganharam grande expressão em todo o mundo e que o porto de Lisboa resiste em manter nas suas infraestruturas portuárias, pressionadas pela expansão urbana. A vocação do porto de Lisboa, pelas razões aduzidas do interesse da cidade, pela necessidade de aproveitar e potenciar ao máximo as condições naturais de navegabilidade do estuário do Tejo, da arquitectura urbana e da paisagem citadina, associadas a interesses crescentes da indústria turística e náutica, considerado do que existe de melhor em qualquer parte

www.revistacargo.pt

do mundo, orienta para que sejam potenciadas as condições do porto de Lisboa como ponto de partidas e chegadas de cruzeiros marítimos de luxo e grande capacidade. A oferta hoteleira, patrimonial, histórica e gastronómica da cidade e os polos de interesse ao redor de Lisboa sobrepõem-se aos interesses económicos de movimentação de cargas no porto de Lisboa, numa extensão de dezenas de quilómetros de margens do estuário. Por outro lado, as infraestruturas portuárias existentes em Setúbal respondem cabalmente aos interesses económicos para a movimentação e transporte das cargas contentorizadas e de mercadorias diversas. Em suma, o facto de Lisboa dispor de um estuário constituído por um enorme espelho de água que se alonga por uma extensão ampla de costa, dotada de grande beleza natural de Cascais a Algés, com margens dotadas de potencialidades paisagistas e outras, que separam a cidade do seu estuário, interrompidas em vários pontos por terminais de carga contentorizada que formam barreiras e impedem o acesso pedonal ao rio, conduzem a tornar estes terminais de carga indesejáveis na cidade. Em contrapartida, essas mesmas condições reforçaram a importância de Lisboa como porto origem e terminal de passageiros de cruzeiros marítimos, o que favorece elege a cidade com vocação natural para cruzeiros marítimos. Em termos do interesse económico da região de Lisboa trata-se de alterar a localização da actividade tradicional de movimentação de cargas para o porto de Setúbal como infraestrutura vocacionada.


3. Vantagens competitivas de Setúbal A Comunidade Portuária de Setúbal (2016) salienta que ‘a capacidade do Porto de Setúbal para contentores é suficiente para os próximos 20 anos, exigindo, no entanto, que seja assegurada “uma estratégia portuária coerente” e levados até ao fim o “projecto do aprofundamento do canal da barra para 15 metros e a melhoria (electrificação) dos acessos ferroviários”, assegurando importantes vantagens competitivas ao porto de Setúbal. O Porto de Setúbal, através da APSS, destaca como vantagens competitivas, nomeadamente, a navegabilidade do estuário do Sado, as ligações terrestres directas ao porto, descongestionadas e fora do perímetro urbano, o afastamento da actividade portuária em relação ao centro urbano, a disponibilidade de áreas de expansão e de reserva, a existência de áreas para a expansão de infraestruturas logísticas na proximidade do porto, a existência de agentes económicos com relação consolidada com o porto, o sistema de informação de gestão portuária partilhado, as infraestruturas e equipamentos para a movimentação de todos os tipos de carga, a oferta de uma vasta gama de serviços complementares, o crescente envolvimento da iniciativa privada na gestão de terminais e o tarifário competitivo. A avaliação permite evidenciar alguns factores que são vantagens comparativas diferenciadas em relação ao porto de Lisboa, como são o caso das ligações terrestres directas e o facto da cidade se desenvolver em sentido contrário ao seu porto permitindo consolidar as infraestruturas portuárias e assegurar a sua potencial expansão, entre outras. Quer isto dizer, que as acessibilidades naturais às infraestruturas portuárias, se traduzem numa importante vantagem competitiva. Além do mais, essas infraestruturas são boas e modernas

com boas acessibilidades rodoviárias, ferroviárias e marítimas, permitindo serviços operacionais seguros e eficientes e serviços intermodais com rápida circulação de cargas. Mais, ainda, o porto dispõe de áreas potenciais de expansão portuária, industrial e logística, apoiado por um sector privado activo, capacitado com conhecimento e adequação estratégica para responder às exigências do mercado, que o mesmo é dizer, com uma gestão orientada para o cliente. Saliente-se o facto de a cidade de Setúbal ter aí localizada a sede da Agência Portuguesa de TMCD.

Figura 3 – Imagem do terminal do Porto de Setúbal Fonte: APSS

Conclusões A região alargada de Lisboa dispõe de um porto constituído por duas infraestruturas portuárias, uma localizada na cidade de Lisboa e outra localizada na cidade de Setúbal, que distam entre si cerca de 18 milhas, o que em termos marítimos não tem grande significado quanto ao custo e qualidade do serviço prestado aos carregadores e quanto ao potencial competitivo da região face a outros portos e regiões internacionais em competição. A tipologia porto-cidade seguida no caso da cidade de Setúbal impôs-se naturalmente à tipologia cidade-porto seguida pela cidade de Lisboa. Tratam-se de dois conceitos muito diferentes nos seus efeitos, tanto mais, quanto é fundamental assegurar condições de expansão e desenvolvimento portuário, só assegurado de forma sustentável neste caso pela tipologia porto-cidade. A infraestrutura portuária de Setúbal centra a sua vocação no desenvolvimento de actividades que necessitam de terminais ro-ro, actividades que mobilizam cargas fraccionadas e granéis movimentadas em terminais multipurpose, actividades envolvendo cargas contentorizadas com a especificidade, complexidade e necessidade de equipamentos capacitados e actividades exigentes em terminais dedicados. A concretização desta vocação portuária, além disso, exige dispor de áreas de expansão e implantação industrial e actividades logísticas servidas por uma rede de transporte intermodal. A infraestrutura portuária de Lisboa centra a sua vocação no desenvolvimento da actividade de cruzeiros marítimos, sem que isso signifique que em Lisboa não existam terminais de suporte e complementares, para a movimentação de cargas e mercadorias sempre que necessário. A infraestrutura portuária de Setúbal apresenta vantagens competitivas de grande alcance no que respeita às acessibilidades ao porto e á rede logística sem conflitos com o desenvolvimento urbano e que se baseia no paradigma porto-cidade.

www.revistacargo.pt

21


BREVES MARÍTIMO

Espaçotrans, Kartel, Warelog e Friopuerto instalam-se na Plataforma Logística de Leixões

Porto de Aveiro ultrapassou pela primeira vez cinco milhões de toneladas num só ano

O Porto de Leixões inaugurou, a 25 de Novembro, quatro novos centros de operações logísticas, num evento que contou com a presença da Ministra do Mar. O evento na Plataforma Logística do Porto de Leixões serviu também como oportunidade para Ana Paula Vitorino inteirar-se dos investimentos efectuados pela APDL neste projecto que conta já com várias empresas instaladas e outras em fase de instalação.

O Porto de Aveiro atingiu mais um marco na sua longa existência ao ultrapassar, pela primeira vez na sua história, a fasquia dos cinco milhões de toneladas de mercadorias num só ano.

Os novos Centros de Operações Logísticas serão explorados e geridos pelas empresas Espaçotrans, Kartel, Warelog e Friopuerto. A plataforma encontra-se dividida em duas áreas (uma com 31 e outra com 35 hectares): a primeira, situada a apenas dois quilómetros do Porto de Leixões, «está actualmente ocupada a 38%, enquanto a segunda área, a três quilómetros do porto, tem uma taxa de ocupação de 47%», revelou, via comunicado, a APDL, que sublinhou o facto de estar a ser preparado «um concurso público para a concessão da actividade de exploração da Plataforma Logística de Leixões». No âmbito desse concurso, a APDL «irá promover a conclusão do investimento em infraestruturas incumbindo aos privados o investimento em outras estruturas, nomeadamente armazéns». A administração do Porto de Leixões adiantou ainda que o «investimento global associado à Plataforma Logística do Porto de Leixões está estimado em 176 milhões de euros», sendo o valor do investimento - realizado até ao momento pela APDL – de 106 milhões de euros. O investimento público previsto nos próximos três anos é de 13,6 milhões de euros, acrescentou a administração.

Porto de Lisboa ganhou mais de dois milhões de toneladas À data de fecho desta edição, não eram ainda conhecidos os números da movimentação de carga no sistema portuário nacional durante todo o ano de 2017. Contudo, os resultados já conhecidos deixavam claro uma coisa: o ano que agora termina foi de forte crescimento para o Porto de Lisboa.

22

A operação do navio Telma Kosan – que descarregou cloreto de vinilo na ponte-cais 23 operada pela Cires no Terminal de Granéis Líquidos – permitiu ao Porto de Aveiro completar o histórico marco da ultrapassagem do «limiar dos 5 milhões de toneladas», referiu a administração portuária. «O crescimento registado, é alimentado por todos os terminais portuários», afirmou a Administração do Porto de Aveiro (APA), acentuando assim o crescimento global da infra-estrutura. «Os granéis sólidos representam 50% do total movimentado, enquanto os granéis líquidos e a carga geral repartem equitativamente o remanescente. Segundo o sentido do fluxo, as importações são já 2/3 do movimento, enquanto 1/3 corresponde a exportações», esclareceu. Três anos depois de ter ultrapassado a meta dos quatro milhões de toneladas de carga movimentada, o Porto de Aveiro atingiu em 2017 o seu máximo histórico, numa evolução marcada pelos anos de 1986 (ano em que chegou ao milhão de toneladas), 1994 (data em que duplicou esse resultado) e 2002 – a entrada no novo milénio com três milhões de toneladas processadas. «O Porto de Aveiro demonstra estar à altura para responder às necessidades logísticas do tecido empresarial, através de um conjunto diversificado de empresas que oferecem soluções competitivas com uma componente de transporte marítimo», acrescentou a APA.

Os números da AMT foram deixando claro, mês após mês, que o porto da capital veio contrariando de forma bastante clara o ano negativo de 2016, conseguindo mesmo ser o enclave português com um crescimento percentual mais acentuado. Por exemplo, os números entre Janeiro e Outubro mostravam uma movimentação total de 81,3 milhões de toneladas nos portos nacionais e mais de 2,5 milhões de TEUs manuseados. Mas a AMT dava já particular destaque ao Porto de Lisboa que registou a melhor evolução entre todos os portos do sistema portuário nacional: o porto da capital movimentou mais 2,1 milhões de toneladas do que no mesmo período do ano passado, valor www.revistacargo.pt

que representa um crescimento homólogo de 26%! Por outro lado, até Outubro o Porto de Leixões surge também em destaque na lista dos portos que mais cresceram em termos percentuais. O porto nortenho movimentou mais 1,2 milhões de toneladas que no mesmo período de 2016, num aumento homólogo de 8,1%. Maior evolução teve o Porto de Aveiro, que cresceu 17%. O Porto de Sines, por sua vez, cresceu 0,9%, mas mantém a sua posição destacada enquanto porto que mais carga movimenta em Portugal, detendo agora uma quota de 52,2%.


LOGÍSTICA DO NATAL FULGOR NATALÍCIO DO ‘E-COMMERCE’ MUDOU PARA SEMPRE A FACE DA LOGÍSTICA

À medida que a ascensão do ‘e-commerce’ se torna uma realidade irreversível capaz de modelar novos padrões de consumo, a necessidade de encontrar metodologias revolucionárias para responder aos elevados fluxos comerciais é cada vez mais um desafio da Logística global. Num contexto económico em que o aqui e o agora definem o ritmo das entregas, a prerrogativa do consumidor ganha uma primazia à qual os retalhistas e as empresas que compõem o processo logístico se tentam adaptar – sob pena de perecerem em caso de falhanço, estes agentes viram-se forçados a reorganizar as suas estratégias de supply-chain e a investir intensamente em recursos adicionais para fazer frente a períodos frenéticos como a época natalícia, a cada vez mais badalada Black-Friday ou a posterior Cyber-Monday. De facto, os números traduzem, cristalinamente, o peso cada vez mais preponderante das vendas e-commerce em todo o planeta: de acordo com dados tratados pela e.Marketer.com, esta tipologia de comércio (à qual se acrescentam as plataformas ‘consumerto-consumer’ ou C2C) atingiu os 1.915 mil milhões de dólares em 2016 (representando cerca de 8,7% da totalidade das vendas) e deverá ascender aos 2.352 mil milhões em 2017 (responsabilizando-se por 10% das vendas), sendo de prever que siga a rota do aumento progressivo até aos 4.058 mil milhões já em 2020, altura em que responderá por 14,6% de todo o comércio mundial. O período compreendido entre 13 de Novembro e a véspera natalícia é, sem réstia de dúvida, a mais intensa e exaustiva janela temporal do ano – às ordens do corrupio consumidor, os agentes logísticos desdobram-se em esforços complementares para agilizar ainda mais a cadeia de abastecimento, dotando-a da elasticidade e dimensão necessárias para fazer face à desenfreada procura e ao esfíngico sistema de entrega de encomendas. A correctora de seguros britânica Staveley Head estimava que nesse período viessem a ser gastos, apenas no Reino Unido, 28,3 mil milhões de euros em compras

feitas online em 2017 (valor que triplicou desde 2011), num processo logístico de Natal que implicará a circulação de 79 mil camiões, 25,7 milhões de quilómetros percorridos pelos estafetas, 320 milhões de encomendas em trânsito e uma média de 22,5 quilómetros percorridos por cada despachante de armazém. As projecções, trabalhadas com recurso a dados da Royal Mail, UPS, Argos, Hermes, DPD e Amazon UK, espelhavam ainda o volume de reforço necessário para corresponder às exigências da cadeia de abastecimento natalícia: 49 mil novos funcionários são contratados especialmente para a quadra e 18550 veículos adicionais são lançados nas estradas britânicas. Feitas as contas somente ao staff detido pela Amazon, Argos e Royal Mail, chegamos aos 263 mil – um avultado número de profissionais ao serviço da eficiência logística durante a véspera de Natal em terras de Sua Majestade. Também o fim-de-semana da Black Friday e a respectiva Cyber Monday’ êm já reservados lugares especiais no calendário logístico – com gastos previstos de 7,9 mil milhões de euros via online, os cinco dias de avultados descontos (a azáfama começa no dia 23 de Novembro apenas termina no dia 27) obrigam à movimentação de 72 mil camiões para a entrega de 225 milhões de parcelas que estarão em trânsito – o período mais intenso é, sem dúvida, a Black Friday, com 2,84 mil milhões de euros gastos, o que significa compras de 1,9 milhões a cada minuto. A congestão não se resume ao fluxo logístico físico: um estudo datado de 2015, levado a cabo pela agência Ampersand, revela que um em cada cinco websites de retalho online experiencia falhas no carregamento de páginas e até mesmo congelamentos devido ao entupimento de seus servidores. Dados tratados pela analista PCA Predict indicam que, em 2015, o volume de actividade online no Reino Unido subiu 62% nas primeiras horas da Black Friday e que a referência Amazon vendeu nada mais nada menos que 86 itens por segundo – números impressionantes que exigem impressionantes respostas por parte da comunidade logística. www.revistacargo.pt

A necessidade aguçou o engenho: como a ‘supply chain’ se adaptou à mudança Perante um fluxo avassalador de encomendas, nunca antes visto porque pleno de contornos típicos do século XXI (o progresso do retalho online e a progressiva adaptação da cadeia logística à demanda consumista do aqui e agora), como operaram os agentes da ‘supply chain’ tal hercúlea resposta? Na verdade, a mais eficiente solução não é aquela que se prende somente com as particularidades do momento, mas sim a proposta de planeamento estruturante que antecipa os desafios das épocas de pico de vendas e coloca em prática estratégias de incremento funcional durante todo o ano – isso mesmo explica Prasad Satyavolu, líder da divisão Digital da multinacional norte-americana Cognizant, num ensaio intitulado ‘With e-commerce booming, optimizing the delivery process it’s not just for Christmas’. Optimizar o processo logístico implica investimento, capacidade analítica para prever os ritmos do mercado e uma flexível mas consolidada coordenação entre a gestão de inventários, as tarefas intralogísticas e a entrega das encomendas – tudo em tempos recorde. O desafio começa no armazém: para lidar com grandes volumes de encomendas, a deslocação entre diferentes áreas e a localização de múltiplos itens num curto espaço de tempo, a tecnologia de reconhecimento de voz oferece uma solução lesta para a orientação e hierarquização das tarefas da força de trabalho através de um fluxo contínuo de Q&A (Questions & Answers) entre a máquina e os funcionários, contribuindo até para agilizar os processos de produção e embalagem. A incorporação de drones equipados com câmaras para ler códigos de barras e auxiliar na gestão do inventário, poupando tempo e reduzindo a intervenção humana, é outro dos trunfos da tecnologia de ponta (estes podem também ser utilizados nas entregas ‘last-mile’); os óculos de realidade aumentada podem também melhorar, através da automação, a comunicação 23


entre funcionários, a verificação de actividades e o processamento de dados de inventário em consonância com os sistemas ERP (Enterprise Resource Planning); o embalamento perfeito e a sua transposição para os camiões ganham também relevo neste aspecto, já que concorrem para a pontualidade e integridade das entregas. Uma visão holística deste processo permite que os estafetas optimizem a preparação das encomendas; a utilização da Telemática para a transmissão de dados em tempo real é um trunfo na selecção das rotas mais apropriadas a cada momento, evitando-se congestionamentos ou outros percalços passíveis de atrasar a entrega dos produtos. «Com a decisão do consumidor a ser feita na base da conveniência, o desafio sobe de tom para o negócio do retalho. Ter um website estiloso ou várias apps já não é suficiente para marcar a diferença. A batalha trava-se agora ao nível da rapidez da satisfação do cliente: as empresas não podem arriscar falhanços, tanto no armazém como no seu serviço de entrega. Com as compras ‘on-demand’ a tornarem-se a norma, os negócios sentirão cada vez mais a pressão para aderirem a estas novas tecnologias, sob pena de perderem clientes», dissertou Prasad Satyavolu, concluindo: «As empresas deverão implementar tecnologias e processos que fomentem a eficiência durante todo o ano, criando infra-estruturas ágeis para lidar com os picos de intensidade com facilidade». Ora, para atingir o ideal planeamento é prioritário o cálculo do inventário em função da procura para cada tipo de produto nas diferentes épocas, evitando excessos ou insuficiências que implicarão prejuízos. A introdução de uma maior flexibilidade nos acordos com as operadoras marítimas também ajudou as retalhistas a gerir os seus stocks com maior índice de flutuação, adaptando o inventário às exigências de cada momento – «Há sete ou oito anos atrás, os contratos com as linhas marítimas estavam anexados aos volumes e menos a rotas específicas. Mas, hoje em dia, uma empresa nos EUA pode negociar contratos separados para entregas nas costas Leste e Oeste e, em seguida, equilibrar seu volume entre os dois, conforme exige a procura», explicou David Vernon, analista sénior na nova-iorquina Sanford Bernstein and Company, citado por Merrill Douglas (ex-CIO da Google e fundador da ZestFinance). A conformidade – a tempo e horas – do fornecedor é outros dos aspectos essenciais para tornar a estratégia retalhista num golpe de mestre: qualquer que seja a táctica da empresa sobre a gestão do seu stock, a supervisão feita aos respectivos fornecedores é crucial para a pontualidade da entrega. Tal torna-se ainda mais imperativo quando, em períodos como o Natal, um único fabricante estrangeiro pode ter milhares de trabalhadores produzindo produtos para vários retalhistas – «As empresas que mantenham cadeias de abastecimento bem interligadas com controlos e medidas, usando as parceiras 3PL para garantir a conformidade dos fornecedores», aprofundou Ro Sharma, gestor na DB Schenker. Mesmo com todos os cuidados, os atrasos de produção podem ser uma dura realidade, relembrou Sharma, citado pelo ensaio de Merrill Douglas – «Durante o

24

pico das temporadas festivas, a produção tardia pode forçar o retalhista a mudar o volume, do meio marítimo para o meio aéreo, acentuando a procura pela capacidade de carga aérea. Graças aos relacionamentos que mantêm com os operadores e à sua influência no mercado, as 3PL podem ajudar os clientes de retalho a garantir parcelas de espaço de carga, mantendo as remessas em movimento». Além de providenciar as importações, os retalhistas precisam ainda de assegurar uma fiável capacidade de transporte interno, suficiente para lidar com o aumento do volume de transacções nas épocas altas. Vários meses antes dos picos natalícios, são realizadas reuniões com transportadoras intermodais, de carga parcial (less-than-truckload ou LTL) e carga completa (truckload), com o objectivo de alinhar as necessidades dos clientes como os serviços das operadoras e seus respectivos preçários. «À medida que os picos se aproximam e a velocidade contagia os múltiplos retalhistas, estes podem consolidar o frete e montar redes de camiões ‘multistop’. Trabalhar com uma 3PL oferece oportunidades para obter essas economias de escala, colaborando com outros carregadores», esclareceu Donald Maltby, chefe da divisão de ‘Supply Chain’ na Unyson Logistics. As abordagens da FedEx, UPS, Torrestir e CTT ao ‘e-frenesim’ logístico A frenética recta final do ano é já um desafio sobejamente conhecido pela referência internacional FedEx, cujos planos para enfrentar a afamada holiday season são afinados a cada ano que passa. «A FedEx espera novamente que um número recorde de encomendas atravesse a nossa rede global durante o pico da temporada festiva», anunciou a companhia norte-americana em Novembro. «Esperamos, para todo o período, volumes de 380 a 400 milhões de embalagens», revelou a empresa sediada em Memphis, antevendo que «as transformações nas dinâmicas do mercado relacionadas com o crescimento do ‘e-commerce’» iriam, mais uma vez, «gerar os maiores aumentos de procura». Para lidar com a torrente de encomendas (nas Segundas-feiras entre a Black Friday e a véspera de Natal a companhia expectava a duplicação do volume diário de encomendas processadas), a FedEx expandiu a sua capacidade física, apostando em mais armazéns destinados a encomendas de maiores dimensões e aprimorando uma teia de micro-hubs capaz de se ligarem a 80% da população dos EUA em apenas cinco minutos. A sua agilidade intralogística reduz para duas as acções manuais dos funcionários face às embalagens, com as mesmas a serem transportadas a 540 pés por minuto e as tomadas de decisão sobre ordenamento e classificação a demorarem uma estonteante média de 5 segundos – só no seu ‘hub’ localizado na cidade de Memphis, a FedEx processa 325 mil embalagens por hora, sustentando-se numa força de trabalho de 11 mil funcionários. Já a rival e compatriota UPS esperava entregar cerca de 750 milhões embalagens em todo o mundo entre 24 de Novembro e a véspera de Natal, um aumento de 5% face a 2016 – para suprir as

www.revistacargo.pt


exigências, a companhia capacitou a sua rede global de entrega para processar perto do dobro do volume diário (situado nos 19 milhões de embalagens e documentos) entregue nos períodos normais. A UPS também revela que «tanto comércio online como o móvel transformaram o sector do retalho», estando a empresa «idealmente posicionada para servir os consumidores e clientes empresariais, mesmo durante este período mais movimentado». Para triunfar no período natalício, a companhia logística assegurou a aposta «no desenvolvimento das tecnologias operacionais com vista a uma maior facilidade da sua utilização por parte do consumidor bem como em melhorias nas instalações para poder cumprir com o aumento de entregas neste período festivo». Kate Gutmann, directora de Vendas da UPS elencou as soluções adoptadas para uma estratégia vencedora: «As ferramentas avançadas de visibilidade para o cliente, a conveniência do consumidor com o alargamento das opções de rede do ‘UPS Access Point’ e oferta dos novos serviços de entrega e recolha terrestre ao Sábado, fazem parte do aumento das nossas soluções. A UPS está a fornecer aos seus clientes e seus consumidores a possibilidade de aproveitarem ao máximo a temporada natalícia». Por Portugal, as estratégias montadas também acompanham, à escala, o ‘e-frenesim logístico’ que marca a cadência da época de Natal. «Nos últimos anos temos assistido a um aumento do online, Portugal tem crescido com números bastante interessantes, é a evolução do mundo digital, já o é em outros países e Portugal começa a ser um pais cada vez mais digital», afirmou à Revista CARGO a empresa Torrestir. Segura do planeamento global que impera durante todo o ano, a companhia portuguesa faz-se valer da experiência para vergar as dificuldades natalícias: «A Torrestir tem cerca de 54 anos nesta actividade pelo que nesta época não nos preparamos de uma forma diferente, sabemos o que esta época pode trazer mas por norma encaramos a época natalícia com naturalidade e tranquilidade, claro está aumentamos os meios humanos e o número de camiões, como fazemos todos os anos»; um desafio que não atemoriza a Torrestir – «Sabemos que o volume aumenta e temos que estar preparados para isso, acima de tudo tentamos que os nosso clientes não sintam este aumento, tudo passa a ser urgente e temos que saber lidar com essas situações». Também os CTT, detentores de mais de 50% da quota de mercado no âmbito das encomendas online e pioneiros nacionais

no investimento last-mile, abriram o livro à Revista CARGO: «O tráfego de encomendas cresce sempre com a aproximação do Natal, o que é reforçado com a organização de eventos de vendas como a Black Friday e a Cyber Monday. Com base na experiência de anos anteriores, estes eventos de vendas resultam num aumento que ronda os 50%, em média, face aos restantes dias, no número de encomendas de clientes e-commerce que entram na rede CTT. O Natal, como um todo que estende por várias semanas em Novembro e Dezembro, tem representado em média um crescimento do tráfego de encomendas da ordem dos 25%», comentou a empresa, não deixando de enaltecer o potencial de crescimento do comércio electrónico em Portugal e caracterizando-o como «um dos eixos estratégicos de desenvolvimento dos CTT». Para satisfazer a urgência dos pedidos, a empresa realçou a sua oferta múltipla de serviços: «Porque se pretende que a recepção da encomenda seja tão conveniente como a própria compra online, os CTT têm já em velocidade de cruzeiro um conjunto de possibilidades, na oferta e-segue, que permitem por exemplo a mudança do destino já com a encomenda a caminho, o acompanhamento via app e site do percurso da encomenda ou a devolução fácil das compras. É até possível a recolha das encomendas no domicílio do cliente (click and ship) e até a compra de bens em lojas online americanas que não vendem para Portugal (express2me)». Mas a ambição vai ainda mais longe: «Mas estamos a ir ainda mais longe: os CTT têm vindo a inovar e a apoiar as empresas na sua introdução ao comércio electrónico. Disso é exemplo a integração, ao nível dos sistemas de informação, entre a plataforma OLX e os CTT, que permite entre outras coisas a devolução grátis das encomendas na hora. E, também a possibilidade de os destinatários receberem as suas compras em cacifos automáticos, sem terem de esperar, no local e no horário que lhes for mais prático, localizados em 5 locais da Grande Lisboa (Parque de Estacionamento dos Restauradores, o Centro Comercial Atrium Saldanha, a Estação de Comboios de Entrecampos, a Estação de Serviço Galp da segunda-circular e o edifício-sede dos CTT). Basta ao cliente dirigir-se a um desses cacifos, marcar o código que, entretanto, recebeu no telemóvel e já está, tem as suas compras na mão. A estes cacifos juntamse cerca de 1000 pontos CTT espalhados pelo País entre lojas CTT e parceiros dos CTT no comércio de proximidade», finalizou a empresa.

www.revistacargo.pt

25


“VÍTIMA” DO SEU PRÓPRIO SUCESSO:

ALCONT ADOPTA SISTEMA DEPOT DA MAEIL

A convite da Alcont - Parqueamento e Reparação de Contentores e da tecnológica MAEIL, a Revista Cargo visitou o parque da Alcont na Bobadela num dos primeiros dias de operação do sistema “Depot” - naquele que é mais um exemplo prático de uma empresa portuguesa a abraçar a digitalização. O quadro repleto de post-its de várias cores nos escritórios onde se faz a gestão do parque de contentores da Alcont assusta quem chega de fora. Porém, na visita que a Revista Cargo fez ao parque localizado na Bobadela, localizado ali mesmo junto à movimentada linha ferroviária, rapidamente se apercebe que quem ali trabalha diriamente tem tudo mais do que controlado. Contudo, a tecnologia devora os velhos hábitos e há momentos em que a ruptura com os modos tradicionais de trabalho tem de ser feita. Em Dezembro, o parque da Alcont estava a estrear o Depot System da MAEIL, num processo de digitalização dos sistemas que se tornou ‘obrigatório’ com os seus cerca de 400 movimentos diários de contentores, entre entradas e saídas por camião e comboio. Hoje, a Alcont conta com uma área total de 9 hectares no seu parque da Bobadela, espaço que é utilizado para o parqueamento mas também para a reparação de contentores - uma área na qual a empresa é especialista, em particular nos contentores reefer (sendo mesmo a única entidade em Portugal a reparar este tipo de unidades, beneficiando da longa experiência do seu Gerente Manuel Gonçalves). A esta unidade junta-se um segundo parque no Norte do país, em Aveleda (Leixões), com uma dimensão de 5,8 hectares e menos actividade diária.

interna do parque, tarefas que continuam a ser feitas de forma manual com base num painel onde são inseridas informações em papel. São os papeis, as suas cores e as diferentes marcas neles escritas que hoje diferenciam os tamanhos dos contentores, as localizações no parque, o estado do contentor ou os clientes a que pertencem, com cores diferentes para os grandes clientes como a MSC ou a Garland. Comboio trouxe maior dinâmica... e maiores desafios! E se já não seria fácil todo o trabalho recorrendo apenas ao camião, o parque da Alcont junta um outro desafio: ali são feitos quatro comboios/dia, operando em média 30 contentores por comboio, com destino ao Porto de Sines ou à fronteira com Espanha. E, como se sabe, o comboio não tem a flexibilidade do camião, pelo que as composições terão que estar obrigatoriamente completas à hora exigida pelos vários operadores que ali trabalham, casos da Medway, Takargo, Transitex ou operadores espanhóis. «O comboio foi uma solução exigida pelos nossos clientes», conta-nos Manuel Gonçalves, o Gerente da Alcont, lembrando o investimento de «dois milhões de euros feito pela Alcont na criação do ramal de acesso ao parque, numa extensão de 350 metros e composto por duas linhas, que poderão vir a ser três no futuro».

Pela dimensão, dinâmica e maior urgência encontrada na operação do parque da Bobadela, a Alcont decidiu avançar primeiro aí com a solução tecnológica da MAEIL. À difícil tarefa de gerir 400 movimentos diários, que passa do papel para a plataforma online, junta-se a gestão de todo um parque de contentores com capacidade para 14 mil TEUs e que conta com uma ocupação média de 8 mil TEUs. Porém, a Alcont vai por etapas. Nesta primeira fase, o Depot System da MAEIL digitaliza e facilita as entradas e saídas do parque. O sistema identifica cada contentor entrado e saído do parque, validando o Gate In (com fotografias e anotações de possíveis danos no contentor), o Gate Out (também com fotos) ou as diversas mudanças no estado de cada contentor. Numa segunda fase, o sistema contará também com gestão

26

www.revistacargo.pt


Sistema instalado sem parar o parque um único dia Uma das exigências que a Alcont colocou à MAEIL esteve relacionada com a impossibilidade de parar o terminal na mudança das operações do papel para o digital. E, em jeito de balanço da experiência bem sucedida, o Gerente da Alcont recorda que tudo foi feito «sem parar o parque um único dia». Fazê-lo, recorda, implicaria a perda de muito dinheiro e o descontentamento de muitos clientes. Para o sucesso dessa mudança, a Alcont lembra o trabalho feito pela equipa da MAEIL, nomeadamente através da «formação que foi feita junto de mais de uma dezena de funcionários» basicamente todos aqueles que operam directamente no sistema. No final, tudo se tornou mais fácil com o trabalho em conjunto entre a equipa da Alcont e da MAEIL, que colocou no parque um técnico durante algumas semanas. Por outro lado, e olhando para dentro da sua casa, Manuel Gonçalves valorizou também a sua equipa «muito boa, jovem e habituada a trabalhar com as novas tecnologias».

Chegada do sistema Depot ao parque de Leixões vem a seguir A visita da Revista Cargo ao parque da Alcont na Bobadela deu-se poucos dias depois do início da operação do Depot System. Mas os tablets, onde os operadores podem abrir e utilizar o sistema, parece que sempre estiveram lá. Não foi por isso de estranhar que nesse momento já se estivesse a preparar a instalação do Depot System no parque de Leixões, para onde seguem Cristiano Gonçalves, filho e braço direito de Manuel Gonçalves e que liderou no terreno a equipa da Alcont, e responsáveis da MAEIL que acompanharão todo o processo. Também aí o sistema simplificará de forma clara as operações e até permitirá uma maior articulação entre os parques, até porque o reposicionamento de contentores e equipamento é outra das tarefas do quotidiano da Alcont. «No Porto, a implementação do sistema será mais fácil porque será uma duplicação do que aqui foi feito e será apenas aplicado à rodovia, uma vez que não há operação ferroviária nesse parque», lembrou Cristiano Gonçalves à Revista Cargo. Mas a operação ferroviária no parque de Leixões é também uma ambição futura, confirmou-nos o Gerente.

www.revistacargo.pt

27


CARLOS FERNANDES (IP) ANTECIPOU O FUTURO DA FERROVIA EM PORTUGAL

Um dos grandes desafios que ainda se encontra na rede ferroviária europeia, e particularmente em Portugal, passa pela adopção do sistema europeu de gestão de tráfego ferroviário (conhecido pela sigla inglesa ERTMS, que significa European Rail Traffic Management System). Um sistema que, recorda Carlos Fernandes, tem um custo de implementação de «300 mil euros para cada locomotiva». Um valor avultado que dificilmente consegue ser suportado pelos operadores de uma assentada – «Temos de criar um período de transição para os operadores», admite o responsável da IP. Ora, este é apenas um dos vários exemplos que Carlos Fernandes podia dar e que justifica a abordagem cautelosa sobre as mudanças a fazer na ferrovia. «São várias decisões que têm de ser ponderadas. Por exemplo, a migração de bitola tem de ser efectuada garantindo a continuidade de todos os tráfegos nacionais, que são mais de 99% dos tráfegos em Portugal», concluiu a este propósito.

O desafio era complexo e deixava água na boca: a ADFERSIT preparou uma sessão técnica sobre as perspectivas da ferrovia nacional no pós-2020. Conhecido que é o Plano Ferrovia 2020, a ADFERSIT desafiou a Infraestruturas de Portugal (IP) para um debate sobre o que se está a preparar para depois desses investimentos – sob o mote “O Transporte Ferroviário no Pós-2020”. A IP aceitou o desafio e o seu vice-presidente, Carlos Fernandes, procurou dar resposta a várias questões – lembrando sempre, porém, que o mundo está hoje a sofrer mutações cada vez mais constantes e que planear a médio ou longo-prazo é cada vez mais difícil – o ideal, na sua opinião, é planear deixando sempre margem para adaptações a novas realidades. Novo ciclo ficará marcado pelo «aumento da capacidade» na ferrovia Sobre o que será a ferrovia nacional no pós-2020 (e os investimentos que deverão ser feitos), Carlos Fernandes recordou que já está a ser preparado o Plano Nacional de Investimentos 2030, documento que terá o seu momento de discussão pública e que terá de passar, por exemplo, pelo crivo de Bruxelas. E, perspectivando um futuro de investimento na janela 2020-2030, o vice-presidente da IP admite que um dos grandes desafios que se aproxima passará pelo «aumento da capacidade» – até porque «muitos troços na Linha do Norte estão perto do limite da sua capacidade». Isso significa que, depois das intervenções do Ferrovia 2020 na reabilitação e modernização da rede actual, o desafio que se segue passará pela «necessidade de investir no aumento da capacidade» – com os avultados investimentos que terão de ser feitos. O desafio da interoperabilidade na Europa Na sua intervenção, Carlos Fernandes recordou que a «interoperabilidade ferroviária» é um dos grandes desígnios no espaço europeu e que essa é, hoje, muito mais complexa do que a simples migração de bitola. «Há 50 anos atrás, o problema da interoperabilidade era apenas a bitola, mas hoje é muito mais do que isso», recorda. E acrescenta: «O que existe hoje na Europa não é uma ilha ferroviária mas um conjunto de ilhas ferroviárias com os seus subsistemas». 28

Três grandes parceiros comerciais por via terrestre – Corredor Atlântico Carlos Fernandes não tem dúvida que as análises e os trabalhos devem ser feitos, do ponto de vista das mercadorias, em redor de três grandes parceiros comerciais de Portugal. Recorrendo aos dados da movimentação de mercadorias por rodovia (que é o principal modo utilizado nas trocas comerciais com a Europa), o responsável da IP recordou que «Espanha representa 67% dos tráfegos de importação e exportação nacionais, enquanto França representa 13% e a Alemanha 10%». «É com estes três países que temos de trabalhar!», vincou, lembrando que esse trabalho já está a ser feito no âmbito do Corredor Atlântico. «O nosso mercado essencial é até à Alemanha porque para lá da Alemanha o navio é muito competitivo», conclui o vice-presidente da IP sobre este tema.

www.revistacargo.pt


Que investimentos permitirão maiores poupanças aos clientes?

Electrificação e o ERTMS representariam poupanças de 2% cada.

O foco da intervenção do responsável da IP voltou-se então para a questão do investimento. Onde investir na ferrovia? Que investimentos trazem maior retorno? Contudo, antes de aprofundar essa matéria, recordou que há trabalhos que podem e devem ser feitos fora investimentos. «Há muito a fazer no software sem que se mexa no hardware, há muito a fazer na optimização dos processos sobre aquilo que já temos hoje», vincou, admitindo que «muito desse trabalho já foi feito, nomeadamente com a entrada de operadores privados».

Por fim, quanto à ligação LeixõesMannheim, na Alemanha, as vantagens do aumento do tamanho dos comboios eram acentuadas (com poupanças de 12%), enquanto que a mudança de bitola representaria uma poupança de 6%.

Já sobre a pertinência dos diversos investimentos, recorreu a um estudo de avaliação dos impactos da infra-estrutura na operação ferroviária e nos custos de transporte, realizado pela equipa dos quatro países (Portugal, Espanha, França e Alemanha) que estão associados ao Corredor Atlântico (o Corredor 4 da Rede Transeuropeia de Transportes) – esse estudo de 2016 já admitia que a redução no custo de transporte com a mera Optimização de Processos (sem qualquer investimento em infra-estrutura) traria poupanças entre 13% a 19% para quem usa a ferrovia no transporte das suas mercadorias. Particularizando tipos de investimentos, e ainda com base nesse estudo, Carlos Fernandes trouxe o exemplo da avaliação do impacto de quatro investimentos específicos (na Electrificação, no Aumento do Comprimento dos Comboios, na Mudança para Bitola Europeia e na introdução do ERTMS) para o caso da ligação entre o Porto de Leixões e três eixos do Corredor Atlântico: até Madrid, até Paris e até Mannheim. Os resultados eram claros: na ligação entre Leixões e Madrid, o investimento que maior poupança traria ao cliente era o aumento do tamanho dos comboios, permitindo uma poupança de 7% no custo final do transporte. Já a electrificação permitiria uma poupança de 3%, o ERTMS de 1% e a bitola não significaria qualquer variação no custo final visto que Portugal e Espanha já fazem hoje comboios com a mesma bitola – a ibérica. Num trajecto mais longo, na ligação entre o Porto de Leixões e Paris, o aumento do tamanho dos comboios permitiria uma poupança ainda maior (de 10%), a mudança para bitola europeia já traria redução no custo final (de 7%), e a

Cenários pós-2020 dependem muito da evolução da rodovia Quando chegou o momento de analisar os cenários para a ferrovia no pós-2020 (o grande mote deste debate), Carlos Fernandes não deixou de lembrar que o modo rodoviário também vem sofrendo as suas mutações e que parece ganhar (ainda) maior competitividade. Nesse âmbito, identificou uma série de «desafios e incertezas» para a ferrovia no futuro – em grande parte relacionados com esse concorrente rodoviário – que tornam mais complexo o planeamento a médio e longo prazo. Entre elas destacou a introdução dos mega-camiões nas estradas europeias (e também já em Portugal), uma novidade que na sua opinião vem um pouco contra a estratégia europeia de retirar camiões da estrada, uma vez que ajudará a aportar maior competitividade à rodovia. Aos mega-camiões, juntou ainda o fenómeno da «Big Data, com o cruzamento de grandes volumes de dados», as questões em redor da «sustentabilidade ambiental, nomeadamente a introdução da mobilidade eléctrica ou o eventual reforço da penalização relativa às emissões poluentes», o fenómeno da «automação e a respectiva redução de intervenção humana» ou o advento da «conectividade, com veículos e infra-estruturas mais conectados, com capacidade de enviar e receber informação». Compilando todas essas tendências e incertezas, Carlos Fernandes antecipa então um «transporte no futuro mais eléctrico, mais autónomo, mais seguro, mais multimodal e partilhado, com mais capacidade e flexibilidade e mais integrado». E deixou uma palavra de preocupação em relação à evolução do modo rodoviário: «Se desaparecer o motorista do camião e o camião for eléctrico, poderá circular 24 horas por dia, poderemos fazer Portugal-Polónia em dois dias!». A crónica questão da mudança de bitola. Sim ou não? Se sim, quando? Como não poderia deixar de ser, o tema da mudança de bitola não poderia deixar www.revistacargo.pt

de ser analisado nesta sessão técnica: até porque, como referido acima, não sendo exemplo único de obstáculo à interoperabilidade ferroviária europeia, tem o seu contributo – e o seu custo no custo final do serviço, como também já se viu acima. Sobre a questão da migração da bitola ibérica para a bitola europeia (ou UIC), Carlos Fernandes admitiu uma série de «incertezas» que complicam o planeamento: «O calendário de realização em Espanha; A evolução do transporte rodoviário como concorrente; Os eixos de bitola variáveis para as mercadorias que podem ser uma realidade dentro de alguns anos; O eventual financiamento europeu dedicado à migração de bitola». E relativamente a este último ponto, admitiu que em Espanha se espera por apoios europeus para este propósito: «Já hoje existe linha de financiamento só para o ERTMS, e a Espanha tem aguardado uma linha de financiamento dedicada para generalizar a mudança de bitola». Fundos aos quais Espanha e Portugal poderiam concorrer… Ainda sobre as particularidades da mudança de bitola, o vice-presidente da IP não deixou de dar também as várias «soluções técnicas» existentes no mercado, tanto do ponto de vista do material circulante como da infraestrutura. E, do lado do material circulante, lembrou três opções para dar resposta em percursos com bitolas diferentes: O transbordo da carga; A mudança de bogies; Os eixos de bitola variável e os cambiadores (para já apenas existentes nos passageiros). Já do lado da infraestrutura, também apresentou três soluções para ter bitola europeia na ferrovia nacional: «A migração da bitola, introduzindo travessas polivalentes preparadas para tal»; «A introdução do terceiro carril, que se tem provado apenas viável para determinadas situações»; «A construção de novas linhas, com o custo elevado que iria acarretar». A migração faseada da bitola como cenário mais “leve” Partindo do pressuposto que se avançará, mais tarde ou mais cedo, para a mudança da bitola ibérica para a bitola europeia, Carlos Fernandes deu dois exemplos de como podem ser feitas as coisas: com bastantes diferenças ao nível da urgência ou do custo final.

29


Já a Fase 3 seria exactamente igual à do cenário mais ‘leve’ apresentado acima, pela tal complexidade da Linha do Norte que exigirá sempre uma linha nova para que se tenha aí bitola europeia. Essa fase ficaria então marcada pela «construção de um novo eixo ferroviário Valença-Sines em bitola UIC e ligação aos portos e terminais com recurso pontual à solução do terceiro carril». O tal investimento de «7 milhões de euros», um valor que Carlos Fernandes admite ser ainda provisório e que, provavelmente, até será superior. «Neste segundo cenário, teríamos que fazer também linhas novas em bitola europeia, num investimento que seria de quase mais 4 mil milhões de euros para nós face ao cenário anterior», conclui Carlos Fernandes.

O primeiro cenário apresentado, mais “leve” financeiramente, é aquele que prevê que Espanha migre as actuais ligações transfronteiriças para bitola UIC, algo que, recorda Carlos Fernandes, é «o cenário de referência, articulado com Espanha e apresentado à Comissão Europeia». Ora, para Portugal esse cenário contempla quatro fases, contando já com uma «fase zero» que está já em andamento (no âmbito do Ferrovia 2020) e que não diz respeito a trabalhos concretos de mudança de bitola mas sim à preparação para essa migração – através da «instalação de travessas polivalentes nos corredores internacionais Norte (Pampilhosa-Vilar Formoso) e Sul (Vendas Novas-Caia)», refere o responsável da IP. Já a Fase 1 desse cenário passará pela «construção de estações de transição de bitola na proximidade da Guarda e de Elvas e pela migração de bitola nos troços transfronteiriços», num investimento de 40 milhões de euros. Quanto à Fase 2, contempla a «construção de estações de transição de bitola na proximidade da Pampilhosa e de Vendas Novas» e a «migração de bitola nos corredores internacionais (Norte e Sul) com desvio transitório de tráfegos para as linhas da Beira Baixa e Leste», num investimento de 100 milhões de euros. Tráfegos da Linha do Norte exigem construção de nova linha por 7 mil milhões de euros.

Em jeito de conclusão sobre a questão particular da mudança de bitola, Carlos Fernandes realçou uma série de «princípios orientadores» que deverão marcar os trabalhos, devendo a IP garantir sempre pontos como: «A articulação com o desenvolvimento da bitola em Espanha, de forma a garantir efectivas condições de interoperabilidade externa»; «Privilegiar os corredores internacionais de mercadorias, já que existem soluções mais racionais para resolver a problemática inerente aos comboios de passageiros»; «Introdução de forma progressiva, tal como acontece em Espanha»; «Assegurar, em cada momento, o Princípio da Concordância de Bitola nas fronteiras ferroviárias luso-espanholas, para não comprometer a interoperabilidade ibérica»; «Minimizar os constrangimentos para os operadores». Analisada toda a temática, Carlos Fernandes considera evidente reconhecer a «complexidade do processo de mudança da bitola na rede ferroviária nacional», não só devido «à necessidade de garantir a articulação com Espanha no faseamento da migração/ introdução da bitola» como também por ser necessário «garantir o princípio da concordância de bitola nas fronteiras». Conclui então que é necessária a «aplicação generalizada de travessa polivalente na rede ferroviária nacional» para preparar para a migração, recorrendo «à tecnologia de três carris apenas em situações pontuais».

Mais complexa será a Fase 3 desse cenário, sobretudo devido à Linha do Norte. Aí, a migração de bitola ganha outra complexidade e Carlos Fernandes não tem dúvidas: «No Eixo Valença-Sines da rede ferroviária nacional, não será possível migrar a bitola face à complexidade e aos tráfegos da Linha do Norte. Aqui, precisaremos sempre de uma linha nova, um investimento que nunca será inferior a 7 mil milhões de euros».

«A mudança de bitola deve ser determinada exclusivamente pelos tráfegos internacionais de mercadorias», vinca ainda o responsável da IP, lembrando que do lado dos passageiros é também vital «garantir a possibilidade de utilização de material circulante de eixos variáveis para comboios de passageiros que circulem nas duas bitolas».

Uma quantia muito avultada e que teria sempre que ser investida «de forma faseada» dada a exigência de recursos. «O Ferrovia 2020 são 2 mil milhões de euros», recorda o responsável da IP para exemplificar o valor avultado deste investimento.

Retirando o foco da bitola, de forma mais abrangente Carlos Fernandes deixou ainda uma série de conclusões sobre aquilo que está a ser feito na ferrovia nacional e os desafios que se colocam para o pós-2020. Primeiro, sobre o Plano Ferrovia 2020, lembrou que este «constitui uma aposta na requalificação da rede ferroviária nacional, aumentando a competitividade do transporte ferroviário», sendo um Plano que «está totalmente alinhado com as normas europeias para a criação de uma rede ferroviária europeia interoperável, destacando-se o elevado aproveitamento de fundos comunitários».

Custo dispara se Espanha trouxer nova linha de bitola europeia até à fronteira Na antevisão daquilo que pode acontecer no futuro, Carlos Fernandes deixou também claro que não se pode colocar totalmente de parte a hipótese de Espanha fazer as coisas de forma diferente do que tem sido comunicado. «Num segundo cenário, Espanha traz uma linha nova de bitola europeia até à fronteira», admite o vice-presidente da IP – ressalvando que esse é um cenário que «não está previsto». Apesar de não parecer um cenário em cima da mesa, Carlos Fernandes não deixou de o apresentar e de mostrar o que essa mudança de estratégia em Espanha implicaria para Portugal. Nesse caso, Portugal teria que avançar numa primeira fase para a «construção da nova ligação em bitola UIC AveiroViseu-Vilar Formoso no Corredor Internacional Norte, incluindo a construção de uma estação de transição de bitola em Cacia», num investimento de 2.200 milhões de euros. Na Fase 2, o modelo seria replicado a Sul, com a «construção da nova ligação em bitola UIC Poceirão-Caia no Corredor Internacional Sul, incluindo a construção de uma estação de transição de bitola no Poceirão», num investimento de 1.500 milhões. 30

Aspectos a ter em consideração em relação à mudança de bitola.

Conclusões gerais da apresentação

Sobre a interoperabilidade, defendeu que «a migração de subsistemas ferroviários para o padrão europeu terá de ser gradual, preservando a coerência das redes ferroviárias nacionais e evitando a criação de “ilhas” ferroviárias dentro de cada país». E deu o exemplo do comboio da DB Schenker que, na sua opinião, «mostrou que, apesar das diferenças entre as redes ferroviárias dos vários países, é possível realizar comboios internacionais em condições competitivas com o transporte rodoviário». Já para o futuro depois de 2020, salientou que «no âmbito do Programa Nacional de Investimento (PNI) 2030 estão a ser avaliados cenários alternativos para a introdução da bitola UIC em Portugal, sendo este um dos múltiplos aspectos que constrange a circulação de comboios internacionais».

www.revistacargo.pt

Joni Francisco


CARLOS VASCONCELOS ADMITE QUE FALTA DE CAPACIDADE DA LINHA DO NORTE JÁ LIMITA PLANOS DA MEDWAY

Na sessão técnica ontem promovida pela ADFERSIT, onde se analisou o Futuro da Ferrovia no Pós-2020 com a presença de Carlos Fernandes (vice-presidente da Infraestruturas de Portugal), os dois operadores ferroviários de mercadorias (Medway e Takargo) marcaram presença na plateia e deixaram também o seu ponto de vista. Ora, na sua intervenção, Carlos Vasconcelos aproveitou um dos pontos críticos focados por Carlos Fernandes na sua apresentação – a necessidade de aumentar a capacidade da Linha do Norte, que já tem alguns troços muito perto da sua capacidade máxima – para adiantar que essas limitações já estão a colocar entraves à expansão da própria Medway. «Os projectos que temos para aumentar o número de comboios já se encontram limitados pela falta de capacidade na Linha do Norte», admitiu o responsável da Medway.

que essa realidade pode ser diferente em distâncias mais curtas, nomeadamente nos transportes entre Portugal e Espanha. «Para transportes entre Portugal e Espanha se calhar tem [impacto nos custos], caso Espanha avance com a bitola europeia», defendeu. Um dos exemplos que acabou por ser levado a debate diz respeito à ligação ferroviária entre a China e o centro da Europa, no âmbito da iniciativa Belt and Road – que vem ganhando cada vez mais serviços e mais carga. Ora, Carlos Fernandes salienta que essa é mais uma demonstração de que o transbordo não tem que ser impeditivo do transporte ferroviário de mercadorias, até porque num percurso completo nesse trajecto terão de ser sempre feitas, pelo menos, duas operações de transbordo: uma primeira, da bitola chinesa – que é a europeia – para a bitola russa; uma segunda, da bitola russa novamente para a bitola europeia.

«Bons terminais de transbordo» resolvem questão da bitola

«Comboio da DB Schenker foi boicotado pelos franceses»

Também na sua intervenção, Carlos Vasconcelos deixou ainda a opinião enquanto operador sobre o tema da mudança de bitola. E admite que, do ponto de vista das mercadorias, isso «não é um problema».

Outro caso concreto que demonstra que é possível fazer comboios competitivos com transbordo é bem mais familiar para os portugueses. O vice-presidente da IP lembrou a ligação ferroviária directa entre Portugal e a Alemanha, promovida pela DB Schenker, que teve sucesso a ponto de se lançar uma segunda ligação semanal, mas que acabou por não resultar – não por uma questão de bitola/necessidade de transbordo mas sim por problemas em atravessar França.

«A bitola não é um problema para a circulação das mercadorias, hoje só 4% das mercadorias feitas entre Portugal e Espanha são por ferrovia e a bitola é a mesma», recorda, acrescentando que «com bons terminais de transbordo, consegue-se uma eficiência extraordinária». «Com muitos menos milhões constroem-se bons terminais de transbordo», defendeu ainda o responsável da Medway, dando o exemplo marítimo que bem conhece: «A grande maioria dos contentores que anda no mar tem transbordo e não é pelo transbordo que deixa de ser competitivo». «O custo da mudança de bitola e os custos para os operadores na mudança do material circulante não se justifica», concluiu Carlos Vasconcelos.

«O comboio da DB Schenker foi boicotado pela França, que não queria que a alemã DB fizesse comboios dentro de França», referiu Carlos Fernandes. Recorde-se que o serviço era feito em Portugal pela antiga CP Carga, em Espanha pela Renfe e a partir da fronteira da Espanha com a França era feito pela alemã DB – algo que na opinião de Carlos Fernandes não agradou à francesa SNCF.

Carlos Fernandes vê diferentes impactos nos custos de transbordo, consoante o destino Ora, sobre a intervenção de Carlos Vasconcelos, o vice-presidente da IP respondeu admitindo que «o transbordo pode não ter custos elevados para transportes para países como a Alemanha» mas www.revistacargo.pt

31


A REVISTA CARGO ESTEVE AO VOLANTE DA VW CADDY A GÁS NATURAL

A Volkswagen colocou à disposição a sua Caddy TGI BlueMotion, para que as diversas empresas interessadas possam testar e comprovar por si mesmas as vantagens do gás natural comprimido (GNC) num período de três meses. A Revista Cargo chegou-se à frente e ‘reservou’ o modelo por uma semana. Antes de mais, parece-nos importante começar por referir que, se não existissem dois indicadores de combustível no painel de instrumentos, dificilmente nos apercebíamos que estávamos a conduzir um veículo sem recurso aos combustíveis tradicionais. Mas não é o caso: a Caddy TGI BlueMotion tem depósitos de GNC (em aço - robustos, resistentes ao calor e providos de válvulas de tripla protecção) que se dividem em quatro, e que possuem uma capacidade para 26 kg de gás natural (que passa aos 37 kg na versão Maxi, também disponibilizada pela fabricante) . Por outro lado, tem também um depósito de reserva com capacidade para 13 litros de gasolina. Poupanças são visíveis nos custos operacionais

Não se engane pelo tamanho: há espaço para tudo Já em relação às características gerais do furgão Caddy TGI BlueMotion, apesar dos seus 3,7 m³ de capacidade de carga, o seu design bem pensado e simplificado permite satisfazer inúmeras necessidades de carga, sobretudo porque possui também vários compartimentos e áreas de arrumação de diferentes tamanhos - como é exemplo a prateleira de tejadilho a toda a largura do veículo, aberta directamente por cima do banco do condutor e do passageiro. Em cada porta cabe ainda uma garrafa de um litro e a consola central é equipada com quatro suportes para copos. Pela primeira vez, encontramse também integrados dois porta-luvas abertos de forma a, segundo a fabricante, «estar sempre tudo no sítio certo». A este nível a Caddy possui também um porta-luvas com chave, uma gaveta com tampa fechável, compartimentos de arrumação por baixo de ambos os bancos, bem como uma rede para bagagem na longarina do tejadilho.

Ao nível dos consumos, a Caddy TGI BlueMotion também se destaca pelo interessante consumo combinado de 4,0 Kg/100. Algo que, quando combinado com o preço inferior do gás natural face ao diesel (em média de 30%) ou tendo em conta a maior eficiência do GNC, permitem uma poupança nos custos operacionais na ordem dos 50% (!). Isto para além de estar atrás do volante convicto de que está a ser mais amigo do ambiente, com emissões de CO2 a partir dos 109 g/km e bem abaixo dos combustíveis tradicionais.

32

www.revistacargo.pt


A sua carga sempre segura O compartimento de carga dispõe de seis olhais de fixação de carga rebatíveis, que se encontram firmemente aparafusados ao piso do veículo. E conta ainda com calhas de fixação metálicas, montadas a meia altura em ambas as paredes laterais do compartimento de carga. O pacote (opcional) de protecção para transporte está disponível com piso universal, incluindo calhas de fixação e um revestimento das paredes laterais, da altura do tejadilho, no compartimento de carga - ficando assim este compartimento protegido contra amolgadelas e riscos.

Diversas configurações disponíveis Tendo em conta que as portas de um veículo comercial são abertas e fechadas várias vezes por dia, estando por isso sujeitas a um elevado desgaste, a Caddy TGI BlueMotion dispõe de dobradiças, calhas e manípulos que satisfazem as mais elevadas exigências. Também a altura de carga reduzida e as inúmeras variantes de portas visam ir ao encontro das mais variadas exigências do dia-a-dia profissional. A pedido, a nova Caddy a gás natural pode ser adaptada de forma absolutamente precisa às necessidades de cada cliente - desde a traseira sem janelas e sem porta lateral deslizante até ao compartimento de passageiros com vidros de privacidade e duas portas deslizantes laterais extra largas de série na versão King Cab de 3 lugares N1. Nesse sentido, também o portão traseiro está equipado de série com um sistema de fecho «Softtouch» e abre-se facilmente premindo um botão.

Tecnologia BlueMotion Equipada com motores que cumprem a norma Euro 6, a Caddy dispõe de tecnologia BlueMotion, com sistema start-stop, travagem regenerativa, assistente de arranque em subidas e pneus com resistência ao rolamento optimizada. Opcionalmente, tem ainda à disposição cruise control adaptativo (ajustando a sua velocidade à do veículo da frente) associado ao sistema de monitorização do trânsito circundante ‘Front Assist’ (com emissão de avisos ópticos e acústicos quando a distância em relação ao veículo da frente é considerada crítica). A nível de estacionamento as opções vão desde o auxiliar de estacionamento (com avisos acústicos) à câmara de marchaatrás ‘Rear View’ (muito útil em lugares mais apertados), passando pelo ParkPilot (que além de avisos acústicos apresenta ainda um grafismo no visor com a distância aos obstáculos).

www.revistacargo.pt

33


«Sem conectividade» não teremos exportação dos nossos produtos»

TENDÊNCIAS E TECNOLOGIAS E-MERGENTES TRANSITÁRIOS ANTECIPAM FUTURO

A Associação dos Transitários de Portugal (APAT) realizou, entre os dias 10 e 11 de Novembro, o seu 16º Congresso, subordinado ao tema ‘Actividade Transitária & Logística: Tendências e tecnologias e-mergentes’, reunindo centenas de personalidades de relevo provenientes de várias áreas adjacentes ao fenómeno transitário português e internacional. Com o apoio do semanário ‘Expresso’ e a cobertura detalhada da Revista Cargo, o evento – que teve lugar no Pavilhão Carlos Lopes – pautou-se por uma transversalidade de tópicos, debruçando-se sobre os pontos fortes e fracos do sector logístico, os desafios do comércio em Portugal, a estratégia para as infra-estruturas nacionais, as novas tecnologias que transfiguram a face da cadeia global de abastecimento, a ascensão do comércio electrónico, as novas batalhas do frete marítimo no contexto de consolidação e a evolução da carga aérea em termos internacionais. A abertura da sessão ficou a cargo de João Carvalho, presidente da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT) – na sua intervenção, o presidente do organismo que regula os transportes terrestres, fluviais, ferroviários ou a actividade no sector dos portos, abordou o contexto de evolução das novas tecnologias aplicadas ao universo logístico, a nova era digital e adaptação da supervisão aos novos moldes trazidos pela indústria 4.0. Discursando perante a plateia, João Carvalho enquadrou as funções levadas a cabo pela AMT no ecossistema logístico português – no qual os transportes desempenham, inevitavelmente, um papel vital - lembrando que um dos grandes desafios do organismo «passa, actualmente, pela antecipação dos efeitos das novas tecnologias»; esta antecipação deverá, segundo o presidente da AMT, compreender as novas as soluções trazidas pelas «tecnologias limpas» sob um clima de urgente «eficiência energética» e crescente exigência de uma «mobilidade sustentável». Defendendo «a digitalização dos transportes» como sendo «o caminho do futuro», João Carvalho apontou à criação de um «quadro de interdependência no qual se maximizam os recursos»; no processo, afirmou também ser essencial a «adequação da legislação» às novas tendências tecnológicas que vêm transfigurando a face do transportes e da logística, com o objectivo de dotar os novos fenómenos de «maior transparência» e regulação, afigurandose indispensável «permanente atenção reguladora» por parte da AMT. A «cooperação entre sectores de actividade» e a criação de «soluções interoperáveis» foram também relevadas no discurso do presidente da AMT, assim como as potencialidades (muitas delas ainda por explorar) do ‘Big Data’, que aporta «benefícios que importam aproveitar». A intervenção focou, ainda, a necessidade de captação de investimento privado no âmbito do desenvolvimento logístico e o acolhimento de «novos modelos de negócio» capazes de dinamizar a economia portuguesa. 34

soluções

«para

a

Um dos momentos altos do Congresso residiu na mesa redonda protagonizada por Ana Paula Raposo (sub-directora geral da Área de Procedimentos Aduaneiros da Autoridade Tributária e Aduaneira), Vicente Pedro Nunes (director financeiro da Ribeiralves), Luís Teixeira (director-geral da Farfetch) e Paulo Paiva, presidente da APAT. Com moderação do reputado jornalista Nicolau Santos, a explanação de ideias contou com a assertiva análise do anfitrião – «Só recorre a um transitário para organização do transporte de mercadorias quem tem necessidades intrínsecas ao comércio internacional, e a resposta de um transitário tem de ser de tal forma eficiente a ponto de o cliente valorizar o seu trabalho como sendo uma parte que não se pode dissociar do produto que importa ou exporta», começou por dizer Paulo Paiva, apontando o «factor logístico» como «grande diferenciador dos produtos», capaz de os dotar de «valor acrescentado» e de assim concorrer, de modo vital, para a competitividade e para a diferenciação. Para o presidente da APAT, a chave está na projecção dos produtos além-fronteiras: «De nada nos adianta investir em Investigação e Desenvolvimento, termos as melhores tecnologias, o design mais atractivo, a melhor qualidade e um preço competitivo à saída da fábrica se, depois, não conseguimos colocar os produtos nos mercados internacionais. Neste factor logístico, os transitários têm um papel fundamental», rematou o presidente da APAT, não esquecendo, ainda assim, a importância da adopção de estratégias digitais e o recurso às novas tecnologias - mas, para que essa aposta se concretize, são necessárias mudanças infra-estruturais, sublinhou. Ora, na sua visão, essa aposta infra-estrutural não cabe às empresas, mas sim aos decisores. «De toda a cadeia logística em Portugal, as infra-estruturas aeroportuárias, marítimas e ferroviárias são o elo mais fraco. As que estão em funcionamento actualmente desempenham a sua função, vão servindo, colocando maiores ou menores problemas aos seus utilizadores, condicionadas ao que os decisores políticos estabelecem como mínimo aceitável», afirmou. «Mas a aposta deveria ser um permanente desenvolvimento dessas infra-estruturas, com adequados e criteriosos investimentos naquelas que se possam assumir como verdadeiras aceleradoras do crescimento da nossa economia», finalizou.

www.revistacargo.pt


Análises preditivas e ‘Blockchain’ poderão transfigurar o mercado

«País não pode adiar criação de novas condições logísticas» Admitindo que o tema das novas tecnologias «tem sido uma missão assumida pela direcção» desde que tomou posse, Paulo Paiva, presidente da APAT, afirmou que as tendências ‘e-mergentes’ vindas do exterior são exemplos a ter em conta, mas os desafios infra-estruturais nacionais continuam a ser um tópico de extrema crucialidade. «Se não olharmos para o exterior não somos viáveis», comentou Paulo Paiva, acentuando, no entanto, que «os maiores desafios em Portugal são ao nível das infra-estruturas logísticas» - «o principal desafio da economia é a resolução dos problemas das infraestruturas», reforçou, alertando que o país «não pode continuar a adiar a criação de novas condições logísticas». Questionado sobre a solução do novo terminal de contentores do Barreiro, o líder da associação foi directo: «Pela informação que tenho, não faz sentido», atirou, aludindo aos «constrangimentos marítimos» e à falta de «massa crítica para trazer os grandes navios» para Lisboa. Apontando a ausência de capacidade morfológica para um porto de águas profundas como pecha que desde logo enfraquece a solução do novo terminal no Barreiro, Paulo Paiva reforçou a opinião de que o cenário «não é solução» para dinamizar a movimentação de carga contentorizada; sobre a ferrovia, o presidente da APAT colocou a tónica «na ligação à península ibérica», na «adopção da bitola europeia» e na necessidade de «conectar os portos portugueses» de forma eficaz e estratégica, com base num paradigma holístico que encare a conectividade total como a visão correcta para o desenvolvimento logístico do país. Questionado sobre a solução ‘Portela+1’, Paulo Paiva voltou a ser peremptório: afirmou claramente que o projecto «não está a levar em linha de conta a carga» e que a solução está apenas pensada e vocacionada para o segmento dos passageiros - o que, para o líder da associação, «é um erro». «É vital que se aposte de uma vez por todas na carga aérea», instou Paulo Paiva durante o debate, caracterizando este segmento como «uma segunda preocupação» que, sem gozar do devido cuidado, «não tem condições para crescer». «Não há conectividade», lamentou, reforçando a necessidade premente de uma aposta estratégica nacional no segmento da carga aérea. Sobre as duras concorrências protagonizadas pelas potências mundiais como a Amazon, que, com bolsos fundos, ameaçam conquistar todas as etapas da moderna cadeia de abastecimento, Paulo Paiva afirmou serem desafios do futuro – «A Amazon é o exemplo de um dos grandes desafios que hoje em dia se colocam aos transitários», comentou, relembrando que uma parte significativa dos transitários portugueses integram pequenas e médias empresas com um poder económicofinanceiro infinitamente mais parco que o gigante mundial do comércio electrónico e do ‘cloud computing’. Mas, acrescentou o presidente da APAT, todos os desafios abrem a porta a novas oportunidades que devem ser enfrentadas com coragem e empenho. Na sua perspectiva, os transitários «devem apostar na mudança, adoptando novos procedimentos que advêm das novas tecnologias». As exigências do processo logístico reflectem, explicou, uma nova atitude por parte do cliente - «as empresas devem apostar para continuar a dar resposta às necessidades dos seus clientes», seja no «encurtamento dos prazos» seja «na tomada de decisões de curto prazo», dado o imediatismo das suas demandas.

António Pires Santos, líder de Soluções Cognitivas do Sector Público da IBM, foi um dos oradores que abrilhantou o primeiro dia do congresso - o profissional, ligado à IBM há mais de duas décadas, analisou a nova arquitectura logística e os comportamentos modeladores do consumidor, num cenário transformado pela «produção centralizada no consumidor, pela ‘costumização’ e por uma economia cada vez mais individualizada», onde os nichos de mercado são cada vez mais usuais e o «tráfego de parcelas de menores dimensões é mais recorrente». Vivendo um período que desembocará «numa economia de todos para todos», os sectores ligados ao consumo global terão na tecnologia o seu mais fundamental e inabalável suporte, explicou António Pires Santos. E, apesar da individuação económica que a revolução digital tem fomentado, a verdade é que «as cadeias logísticas permanecem globais, interdependentes e interligadas» - realidades múltiplas mas complementares, que se organizam sob o chapéu analítico, ordenador e agregador de uma indústria 4.0, sustentada pela ‘cloud’, pela Internet das Coisas, pelo poder interpretativo da ‘Big Data’ e suas análises preditivas. «Em 2025 existirão cerca de 165 ‘zetabytes’ de informação em estado puro, ainda por tratar e analisar», revelou o profissional da IBM, enfatizando a quantia infindável de dados gerados pelo ‘Big Data’ que ainda carecem de atenção analítica e processamento adequado - «estes dados poderão ser usados para prever e prevenir perturbações na cadeia logística», algo que poderá «aliviar a pressão sobre os ‘players’ do mercado», afirmou, abrindo-se assim «novas formas de negócio». A tecnologia ‘Blockchain’ foi também alvo de análise: este «livro de razão ‘online’ mudará o relacionamento das empresas», permitindo «definir contratos», trocar informação em tempo real e «aumentar a confiança e a celeridade» das transacções, já que a estrutura dos registos se mantém inalterada e incorruptível. JUP e JUL como legítima»

«instrumentos de apoio à economia

A presença de Ana Paula Raposo, sub-directora geral da Área de Procedimentos Aduaneiros da Autoridade Tributária e Aduaneira, enriqueceu também a troca de ideias, colocando os holofotes numa das partes mais importantes no ciclo logístico: as alfândegas. A sua intervenção abordou os desafios das alfândegas numa era de crescente desmaterialização de processos e emergência do ‘e-commerce’, focalizando focalizar a chegada das novas tecnologias da informação ao domínio logístico e do transporte de mercadorias na perspectiva da autoridade tributária e das alfândegas - se os transitários se deparam com novos desafios, «também a alfândega enfrenta novas realidades» - «O ‘e-commerce’ é um desafio enorme para as alfândegas», admitiu. Este fenómeno, explicou, «traz constrangimentos às alfandegas», com «a informação electrónica a ser cada vez maior e cada vez mais necessária para supervisionar as cargas movimentadas» - daí o papel da chamada ‘Big Data’ ganhar uma relevância cada vez maior, tanto no panorama logístico como na área de actividade das alfândegas, em prol da transparência, da segurança e «da prevenção de tráfegos ilícitos». Ana Paula Raposo acrescentou ainda que «as alfândegas devem monitorizar as cadeias logísticas globais», zelando pelos aspectos acima referidos. Já sobre a informatização progressiva dos sistemas administrativos no universo portuário luso, Ana Paula Raposo reservou elogios rasgados: «A Janela Única Portuária (JUP) e a Janela Única Logística (JUL) são, claramente, instrumentos de apoio à economia legítima», ressalvou ainda Ana Paula Raposo, caracterizando as pioneiras ferramentas utilizadas nos portos portugueses de «instrumentos facilitadores» que dotam os processos de maior transparência e responsabilidade e contribuem para uma eficaz protecção das cargas.

www.revistacargo.pt

Bruno F. Cardoso

35


PAULO PAIVA, PRESIDENTE DA APAT:

«NÃO PODEMOS VIRAR COSTAS À TECNOLOGIA

Em entrevista à Revista Cargo, o presidente da Associação Portuguesa de Transitários fez um balanço muito positivo de mais um Congresso, justificando a pertinência dos temas em debate no certame de dois dias: a tecnologia e as novas tendências como uma realidade incontornável; e os investimentos em infra-estruturas logísticas como momento chave para o sector. A APAT realizou recentemente o seu mais recente Congresso. Que balanço faz dos dois dias de trabalhos? Em termos de participação, o balanço é seguramente positivo. Depois, o feedback também foi muito positivo, tivemos pessoas que nos disseram que consideraram este o melhor Congresso de sempre. E, de facto, a nossa aposta quer nos assuntos quer nos oradores foi uma aposta ganha. Um dos objectivos que tínhamos para o Congresso era torná-lo um marco para a Associação, e isso foi plenamente atingido. Quantos participantes marcaram presença no Congresso? Tivemos cerca de 150 participantes e estiveram representados 100 associados da APAT. Esses 100 associados foram uma representatividade do vosso universo de associados? Podemos dizer que sim. Mas gostávamos de ter conseguido mais, temos hoje 256 associados e por isso ainda temos muito trabalho para fazer. No entanto, a expectativa deste Congresso ficou nivelada por cima e acredito que quem cá esteve vai passar a mensagem a quem não esteve e teremos uma maior participação no futuro. Mas também posso dizer que o número de associados presentes nos nossos eventos tem sido crescente. O mote do Congresso foi a “Actividade Transitária & Logística: Tendências e Tecnologias E-mergentes”. O que levou a esta selecção de temáticas? A escolha foi feita porque consideramos importante que, neste momento, se passe aos nossos associados uma ideia que vem em consonância com aquilo que temos vindo a fazer desde o início deste mandato: alertar as pessoas e torná-las atentas às mudanças que estão a acontecer e que afectam as nossa actividade. Entre as mudanças ao nosso redor, era importante dar a conhecer os investimentos que estão planeados para as infra-estruturas e, por outro lado, uma realidade que será o mais impactante não só para a actividade transitária mas para todas as actividades: as mudanças tecnológicas que estão a ocorrer todos os dias! Conseguimos trazer para este Congresso dois temas estruturantes para a nossa actividade, temas que não são conjunturais. As mudanças que estão a acontecer e que vão acontecer vão impactar o nosso negócio. E um transitário é, cada vez mais, um operador de logística internacional, a ideia de que os transitários existiam para comprar transporte e revender está cada vez mais ultrapassada. E, sendo um operador de logística internacional, se não acompanharmos as mudanças a nível tecnológico a própria actividade extingue-se por ela. Para a actividade transitária, as novas tecnologias são uma ameaça ou uma oportunidade? Eu sou uma pessoa positiva e acredito que seja uma oportunidade. Mas depende também da forma como abordamos a tecnologia, porque se quiser pensar de forma negativa é fácil encontrar vários pontos negativos. Desde logo, na questão da abordagem ao negócio, na abordagem aos clientes que pode tornar-se bem mais impessoal. No entanto, a tecnologia aliada a uma segmentação do mercado pode trazer resultados bastante positivos para as empresas. Portanto, acredito que podemos utilizar de forma bastante 36

positiva essa tecnologia e também acredito que é cada vez mais fácil a utilização dessa tecnologia. Tivemos até uma intervenção no Congresso sobre isso, onde ficou claro que é cada vez mais barato o acesso a meios tecnológicos mais avançados. Por exemplo, já temos acesso no telemóvel a uma aplicação que nos diz as companhias marítimas que escalam em determinados portos. No espaço de 5 a 10 segundos temos esse resultado e um comparativo entre todas as companhias! Essa é informação que, aliada à nossa experiência e ao nosso know-how, pode ser uma mais-valia que podemos dar aos nossos clientes. E isto é apenas um entre vários exemplos. O que não podemos é virar as costas à tecnologia. Nem pensar que, ao acedermos a elas, estamos a perder parte do nosso negócio. Estamos sim a modernizar e a tentar acompanhar a evolução do mercado. Temos lido várias notícias e análises que falam de alguma resistência neste sector à adopção dessas tecnologias. O que tem estado por detrás dessa parca aposta da parte dos transitários? O ser humano é averso à mudança por natureza, e as tecnologias trazem muitas mudanças, nomeadamente na forma de contacto. É sobretudo aí que se sentem as diferenças, os transitários mais antigos ainda se lembram dos tempos do telex, e agora já usam o e-mail, janelas de chat nos próprios sites, conversações no Facebook, no Whatsapp, entre outros. Há inúmeras formas de comunicação, o que nos compete é conseguir adaptar os nossos recursos humanos a essas mudanças e estar aptos a dar respostas. O mercado está cada vez mais exigente e quer respostas rápidas e precisas, respostas que lhes resolvam os problemas. Por outro lado, há alguma desconfiança em relação às plataformas. Dou-lhe o exemplo da minha empresa, onde não temos um servidor há 3 anos. O nosso software operacional funciona na cloud, passei de um servidor físico no escritório - que eu penso que controlo, no qual faço backups e eu próprio garanto que funciona – para uma coisa que é a cloud? Quem tem acesso à informação que lá esta? Tudo isto gera desconfiança. Na minha empresa e noutras foi ultrapassada essa barreira e estamos a utilizar todas as vantagens da cloud, a nível de segurança, de ciber-segurança, no acesso aos dados... Temos acesso onde quer que estejamos! Existem imensas vantagens que se retiram mas é preciso ultrapassar a mentalidade do «eu tenho a minha estrutura informática na empresa e é disso que eu preciso, não a vou estar a entregar a estranhos». Até porque a nível particular já entregamos essa informação aos bancos e ao Estado, portanto é mais uma questão de hábito. É algo que devemos aceitar e abraçar com cautelas – e refiro-me naturalmente à necessidade de ser gerir adequadamente o risco do cibercrime – mas é sem dúvida o caminho a perseguir. Depois, em relação aos investimentos, não creio que seja um entrave. Até porque o recurso às plataforma digitais – quaisquer que sejam – sempre será mais económico do que ter uma máquina na minha empresa. Resumindo, parece-me sobretudo uma questão de mentalidade. Mais cedo ou mais tarde, todas terão de perceber que o caminho a seguir será este e a velocidade a que se faz dependerá de

www.revistacargo.pt


contribuiram para algum marasmo nos portos. Que pontos são esses que a APAT não concorda dentro da Estratégia para os portos?

quem está na liderança. No Congresso, deu o caso da Alibaba como exemplo dos grandes disruptores desta actividade. De que forma estão estes players a mudar o negócio? Os grandes operadores como a Alibaba têm feito acordos com companhias marítimas, transportadoras aéreas, operadores logísticos... Por outro lado, são muito fortes no mercado B2C, muito embora tenham também apetência para se assumir como fortes concorrentes no B2B. E são empresas de capital intensivo e que conseguem criar - ou já conseguiram! - massa crítica que advém da forma como estão no mercado e vão percebendo que negócios têm potencial, entre os quais a logística. Os números que estes operadores movimentam são de tal forma grandes que se justifica eles serem, eles próprios, operadores logísticos! Mas acredito que o mercado tem espaço para esses grandes operadores logísticos e para as PME’s, tudo depende da abordagem. Obviamente que nenhuma pequena empresa portuguesa poderá competir com a Alibaba, com a Amazon, com a Uber, ou com grandes plataformas de compra e venda de serviços de transporte logístico que são elas próprias concorrentes da nossa actividade. Se queremos ser competitivos com essas empresas temos que adquirir especialização em determinados tipos de mercados onde essas empresas não conseguem chegar. Temos o caso do transporte de matérias perigosas, de perecíveis a determinadas condições... Há uma data de segmentos nos quais as empresas mais pequenas são mais competitivas, porque investem mais do seu esforço e estratégia sobre esse segmento e tornam-se mais eficientes. Por outro lado, essas grandes plataformas tornam-se mais impessoais e há determinados tipos de produtos que necessitam de um acompanhamento e informação de uma forma mais proactiva do que aquilo que eles conseguem dar ao mercado. São uma ameaça, sem dúvida, mas não acredito que tenham um impacto tão profundo que venha a secar tudo à sua volta. Eu recordo-me que quando começaram a crescer os integrators, como a DHL, a UPS ou a FedEx, também se falava na ameaça para o negócio dos transitários. Mas a verdade é que as empresas se posicionaram em determinado segmento e os transitários ainda cá andam, segmentando os negócios e sendo muitas vezes parceiros desses integrators. A outra grande temática em foco no evento, como referiu anteriormente, foram os investimentos nas infra-estruturas. Começando pelos portos, o que pensa a APAT da Estratégia para o Aumento da Competitividade Portuária? Parece-nos muito importante que tenha sido definida uma estratégia para os portos nacionais, e apoiamos a aplicação dessa Estratégia. Não concordamos inteiramente com todos os pontos da Estratégia, mas penso que o mais relevante é existir essa preocupação de tornar os portos competitivos, porque quanto mais competitivos formos a nível de portos e infra-estruturas no geral mais facilmente podemos apoiar-nos no comércio internacional. E, pensando em nós, quanto mais comércio internacional existir mais negócio há para os transitários. Mas sobre o que está definido nessa Estratégia, há coisas que podiam ser encaradas de outra forma. Mas é sobretudo importante existir Estratégia e que o Governo que venha a seguir lhe dê continuidade. Não podemos interromper estes processos porque é contraproducente, como já se comprovou nos últimos 20, 30 ou 40 anos em que temos vindo a adiar decisões que só

É impossível não falar no Barreiro. Sem entrar em questões técnicas, pensamos que faz sentido um investimento num porto se ele de facto trouxer mais-valia à economia. E a verdade é que, pela informação que temos, é duvidosa essa mais-valia quando se trata de um investimento na ordem dos muitos milhões no Barreiro, mesmo que sejam privados a investir. O que gostava era que fosse feita uma análise rigorosa e que saísse para a opinião pública, com tudo o que falta saber do investimento no Barreiro. E já achei grave realizar um estudo de impacte ambiental para depois chegarem à conclusão que afinal não é bem ali a localização. Parece-me que há alguma desorientação em relação ao Barreiro... Se andamos para trás um pouco, vemos que o Barreiro surge como alternativa a uma estratégia anterior, evoluiu de uma estratégia de deep sea na Trafaria, depois no Barreiro onde se verificou que não era possível... E agora transformaram a ideia numa plataforma multimodal. Parece que é por obrigação que se tem de fazer qualquer coisa ali. Do ponto de vista da carga, e pensando em alternativas à Margem Norte do Tejo, o Porto de Setúbal poderia dar a resposta necessária? O Porto de Setúbal terá mais valor e será mais competitivo quanto maior for a conectividade que consiga fornecer aos clientes. Setúbal é um porto que se segmentou em determinados tipos de tráfegos, neste momento está a alargar a sua oferta para os contentores também. E será tanto mais competitivo quanto as soluções de transporte que consiga fornecer aos clientes. O mesmo para o Barreiro, certo? Sim, a mesma coisa se colocará no Barreiro. Nós até já temos clientes da zona de Lisboa a colocar as suas cargas em Sines. Não é tanto pela questão da proximidade porque com as infraestruturas adequadas tudo se faz. Essa é uma falsa questão. Setúbal terá de resolver algumas questões a nível ferroviário, que está em andamento e foi mencionado pela Drª Lídia Sequeira no Congresso da APAT. Depois, tem tudo a ver com o serviço e criação de valor que o porto consiga gerar. Falando em ferrovia, o que pensa a APAT dos investimentos que estão a ser feitos nesta área, nomeadamente do Ferrovia 2020? Eu penso que, apesar da União Europeia ter colocado a tónica no transporte ferroviário como motor de desenvolvimento para os próximos anos, nós próprios criámos esta ilha ferroviária como muita gente lhe chama. E isso aconteceu precisamente pela falta de investimento na ferrovia. E não falo só nas ligações a Espanha porque mesmo internamente houve um desinvestimento. Assistimos a alguma dinamização com os acessos ao Porto de Sines, com as ligações entre Leixões e Sines para carga, com as plataformas no centro do País... Tudo isso veio contribuir para algum dinamismo, mas os investimentos de fundo estiveram estagnados durante algum tempo. Ainda assim, a IP está a tentar resolver as grandes questões que nos podem permitir considerar a ferrovia como mais um parceiro no serviço logístico de futuro em Portugal. A escassa utilização da ferrovia em Portugal será resolvida com estes investimentos que estão em curso? A falta de procura vem no seguimento da falta de criação de condições que possam atrair clientes para a ferrovia. A falta de condições advém do desinteresse e da falta de motivação para criar essas condições. A própria estratégia do país foi de investimento avultado na rodovia, o que retirou competitividade à ferrovia. Apesar de haver investimentos desastrosos na rodovia, conseguimos ter em Portugal uma rede de auto-estradas ao nível das melhores do mundo. Mas o mesmo não foi feito em relação à ferrovia. Depois, a questão da bitola é uma questão que neste momento até é inferior, porque do outro lado da fronteira a bitola é a mesma. Temos a questão além-Pirinéus mas onde existem outros entraves que não estão apenas relacionados com a bitola. Aí, a bitola é apenas uma entre muitas questões.

www.revistacargo.pt

37


Mas é sobretudo importante que esses investimentos referidos para a ferrovia sejam concretizados! E para o transporte aéreo de carga, que estratégia existe? No aéreo, infelizmente, não parece existir estratégia para a carga. Temos uma rodovia bastante desenvolvida, portos que parecem no caminho certo e investimentos anunciados na ferrovia. Mas no aéreo, nada. O que se vê neste momento é que poucas ou nenhumas vantagens houve para o Estado Português da passagem da ANA do sector público para o sector privado. Na altura, acreditei que iria haver uma mudança de mentalidade, que iria ser criada finalmente uma estratégia para os aeroportos nacionais no segmento da carga, e que o segmento da carga fosse encarado como um negócio vital para o próprio aeroporto. Mas não é isso que está a acontecer, não conhecemos uma estratégia para a carga. Só posso concluir que não há vantagem nenhuma na passagem de um monopólio estatal para um monopólio privado. A carga está a ser penalizada pelo facto do segmento dos passageiros estar a correr “demasiado” bem? É nitidamente isso que se passa. A área dos passageiros sustenta o negócio da empresa. Enquanto empresa do Estado, nunca necessitou de um forte empenho para conseguir resultados, o número de passageiros cresce ano após ano... Tomam-se decisões apenas quando estão mais atrapalhados, subindo simplesmente e unilateralmente as tarifas. Mas passou-se para o privado e continua-se a fazer o mesmo. Para o país, para os utilizadores do aeroporto e para a carga não há vantagem nenhuma neste modelo. Portanto, é muito importante que a ANA comece a estabelecer estratégias concretas para a carga em Portugal se queremos fazer parte das cadeias de valor global. O que gostava de ver nessa eventual estratégia para os aeroportos nacionais? Precisamos de uma infra-estrutura aeroportuária que consiga atrair companhias aéreas. Isto acaba por ser comum à competitividade de um porto: um aeroporto é tanto mais competitivo quanto mais ligações consiga ter. A partir do momento em que o aeroporto consiga ter condições de atrair essas companhias aéreas, entra-se numa espiral positiva, num desenvolvimento do próprio aeroporto que depois motiva também o crescimento de todos os outros negócios à volta e vai também influenciar decisões de investimento estrangeiro. Uma empresa que queira estar Que balanço faz da actividade levada a cabo nos últimos tempos pela APAT e por esta direcção em particular? A APAT tem mostrado um maior dinamismo nos últimos anos mas esse dinamismo ainda não teve a devida correspondência no aumento de associados. Há uma grande rotatividade no sector, há empresas que surgem e outras que desaparecem. Apesar de termos mais associados, não é um aumento significativo, o que também significa que o mercado é mais ou menos estável. Mas, desde que assumimos o mandato, definimos o objectivo de tornar a actividade transitária mais mediática do que aquilo que era. Quando chegámos, quase não havia comunicação para fora. Havia comunicação com os associados - e nisso a Associação sempre funcionou muito bem - e existia o suporte aos associados, que também funcionou sempre bem. A nossa entrada coincidiu com a renovação de quadros na Associação, temos uma nova Presidente Executiva que é a Dra. Joana Coelho que é, ela própria, 38

presente na cadeia de valor global, se tiver que optar por um país que ofereça ligações rápidas a uma data de pontos do globo ou um país que não tenha essa capacidade, se calhar escolhe o primeiro mesmo com custos mais elevados de mão de obra ou de instalação. O factor logístico entra sempre em linha de conta e pode ser aquilo que nos elimina nestas escolhas. Por isso, é necessário criar uma estratégia para os aeroportos mas sempre com essa visão holística. Não podemos pensar só nos passageiros porque carga e passageiros têm de andar de mão dada. Independentemente de haver segmentos de mercado que não movimentam carga, nomeadamente as low-cost, há outras empresas que fazem da carga um negócio importante e uma alavanca importante até para traçar novas rotas para novos mercados. Não antevejo que passageiros e carga se venham a separar de forma radical, e em termos de oportunidades de mercado é um erro não aproveitar as sinergias entre os dois. Neste momento, por exemplo, temos limitações ao nível de capacidade nos aeroportos nacionais. E tudo por falta de estratégia, falta de investimento, tensões... Se formos verificar a história, vemos que andamos há 50 anos a discutir a necessidade de um novo aeroporto, quando o que é necessário é tomar uma decisão! Que lhe parece a solução Montijo? A posição da APAT é que tem de haver bom senso no investimento que se vai fazer e considerar a carga também. É preciso perceber se é viável ser no Montijo, se é possível ou não ter ali um aeroporto com condições que lhe permitam dar resposta ao aumento de passageiros mas que também tenha capacidade para movimentar carga. Ainda há uns tempos li o presidente da Ryanair a dizer que se o Montijo é para as low-cost então é melhor que não seja um investimento avultado porque as low-cost não vão querer tarifas elevadas... Ainda assim, parece-lhe que o Montijo pode libertar espaço em Lisboa para mais ligações e para mais carga? Eu penso que o Montijo seria mais uma solução para o curto prazo. Já devíamos ter investido há muito tempo num aeroporto verdadeiramente internacional e com outras condições. E não teria de ser feito logo todo o investimento, poderia começar com uma pista, depois duas, depois três... O importante era ter potencial para crescer de acordo com as necessidades que surgissem, que é precisamente o que não temos em Lisboa. E, com o Montijo, também se vai esgotar muito rapidamente.

uma pessoa dinâmica e tem abraçado com entusiasmo este projecto. Mas confesso que o grande objectivo é tornar a APAT e a actividade transitária mais pública e mais visível. Ainda hoje temos de explicar ao cidadão comum o que é um transitário e o que que faz. Depois, temos objectivos como a formação, a actualização dos nossos associados, a assistência a nível laboral e a nível de legislação de transportes, a representação junto das autoridades... E temos também os Certificados de Excelência que acabam por ser uma resposta à falta de regulamentação da actividade. Tivemos necessidade de dizer ao mercado quais os transitários que oferecem um serviço confiável e que oferece rigor, quais as empresas sustentáveis e economicamente viáveis, empresas que trabalham dentro da legalidade... Acaba por ser uma garantia no mercado que existem empresas que, apesar da regulamentação ser muito pouco exigente, vão além das exigências legais para melhorar o seu serviço. Que perspectivas existem para os resultados da actividade em 2017? www.revistacargo.pt

Os números de 2017 apontam para algo um pouco superior até aos de 2015. Em 2016 tivemos uma quebra no volume de negócios dos nossos associados. Apesar de ainda não ter acabado o ano, a percepção que temos é de que esse volume de negócios vai crescer este ano e isso é coincidente com o aumento das exportações. A nossa actividade está umbilicalmente ligada às exportações, as empresas que são nossos clientes procuram muito os mercados exteriores. E como tem sido a relação entre a APAT e os decisores políticos? Tem sido consultada para a elaboração das estratégias do sector? Nalgumas coisas temos sido contactados, noutras não. Por exemplo, na Estratégia para o Aumento da Competitividade dos Portos estivemos envolvidos através das Comunidades Portuárias e fomos ouvidos em algumas coisas. Não tanto quanto desejaríamos mas estamos cá e estamos prontos para colaborar e contribuir com ideias em benefício da economia nacional e do comércio internacional.


VÁ POR ATALHOS SEM SE METER EM TRABALHOS. Não é uma Van. É uma MAN. A nova MAN TGE. www.revistacargo.pt

39


OPINIÃO

A PRIMEIRA COMPANHIA DE AVIAÇÃO DO MUNDO J. Martins Pereira Coutinho José Martins Pereira Coutinho entrou em 1958 na KLM Royal Dutch Airlines. Foi depois Director da KLM Cargo para Portugal, lugar que ocupou até à aposentação. Publicou inúmeros artigos e livros sobre a indústria de transporte aéreo.

Ao questionarmo-nos sobre o que iríamos escrever neste espaço, ocorreu-nos a ideia de divulgar, embora resumidamente, a história da KLM, a primeira companhia de aviação do mundo, a qual tivemos a honra e o privilégio de servir durante quase quatro décadas. Entre outras lembranças, vieram-nos à memória gratas recordações de uma vida dedicada a uma profissão apaixonante e a uma companhia exemplar, na sua organização e ambiente de trabalho. Um exemplo na disciplina laboral, na exigência e na promoção do mérito profissional, que contribuíram para o seu crescimento e sucesso no mundo da aviação. Em 12 de Setembro de 1919, a Rainha Guilhermina, da Holanda, concedeu excepcionalmente e como prémio de confiança, o título Koninklijke (Real) à Companhia de Aviação, ainda em embrião, a qual viria a denominar-se K.L.M. – Koninklijke luchtvaart Maatschappij N.V.. Albert Plesman, militar na “Netherlands Royal Flying Corps”, foi então convidado para formar a nova companhia, KLM – Royal Dutch Airlines ‘For Holland and Colonies’. Albert Plesman estava colocado numa base militar no Aeroporto de Schiphol. Mais tarde, seria o seu presidente. Depois do fim da Primeira Grande Guerra Mundial, verificou-se um invulgar interesse pelo transporte aéreo e Albert Plesman organizou a primeira exposição de aviação, em Amesterdão, entre 1 de Agosto e 15 de Setembro de 1919. Albert Plesman trabalhava arduamente para atingir os seus objectivos. Era conhecido como um homem duro, da linha antes quebrar que torcer. A KLM organizou-se, então, como empresa privada de responsabilidade limitada e começou a operar em Outubro de 1919. No primeiro voo, entre Amesterdão e Londres, transportou passageiros, carga e correio. Em 17 de Maio de 1920, foi inaugurada a primeira carreira aérea regular entre Londres e Amesterdão, a mais velha ligação aérea do mundo. Na inauguração, foi utilizado o avião “De Haviland DH 16”, o qual tinha o “cockpit” descoberto e espaço apenas para o piloto Jerry Shaw e dois passageiros, a quem a KLM fornecia agasalhos e botijas de água quente. Além dos passageiros E. O’Brian e H. Rhodes, jornalistas, seguiram jornais da manhã e uma mensagem do Presidente da Câmara de Londres, para o Burgomestre de Amesterdão.

40

Em 8 de Junho de 1920, efectuou-se o primeiro transporte de animais, aos quais a KLM sempre se dedicou. Em 5 de Julho, realiza-se o primeiro transporte de correio aéreo, que pesava 14 libras. No fim desse ano, os 4 aviões da KLM tinham voado 82.000kms, transportando 345 passageiros, 22 toneladas de carga e 3 toneladas de correio. Em 14 de Abril de 1921, Sua Alteza Real o Príncipe Hendrik, da Holanda, inaugura oficialmente o tráfego aéreo. Depois, a KLM passou a voar com o seu próprio avião e os seus pilotos, G. J. Geyesendorffer e R. Hostra. Em 7 de Junho de 1922, este avião transportou o primeiro carregamento de flores, de Amesterdão para Londres. Em 1924, a fábrica Fokker entregou o primeiro de uma série de aviões F.7, com capacidade para transportar 8 passageiros. Estes foram os primeiros aviões a serem equipados com toilettes. E foi também o primeiro avião que a KLM equipou com rádio-telefonia. Mais tarde, em 1927, o Fokker F.8 já tinha capacidade para transportar 15 passageiros e 1.500kgs de carga, que era carregada através do nariz do avião. Em 1927, a KLM fez o primeiro voo de fretamento intercontinental do mundo, de Amesterdão para Jakarta, na Indonésia. A viagem demorou 12 dias, com o tempo de voo de 86 horas e 27 minutos, para percorrer 9.120 milhas. No regresso, a viagem demorou 14 dias e 97 horas de voo! Em 1928, num percurso de 14.000kms, a KLM transportou carga e passageiros de Amesterdão para Batavia, capital da Dutch East Indies. Durante anos, foi a rota mais longa do mundo. No início de vida da KLM, os seus aviões foram fabricados pela empresa holandesa Fokker. O Fokker F.3, curiosamente, foi um dos primeiros aviões da KLM. Em 1929, a KLM inaugurou um serviço quinzenal entre Amesterdão e Jakarta, na Indonésia, com o avião trimotor Fokker F.7b. Nesse ano, também passou a voar para Nuremberga, Budapeste, Sofia e Istambul. Em 1930, juntouse Atenas e, em 1931, Hanôver, Lyons, Marselha, Roma e Belgrado. Em 1934, foi importado dos EUA o primeiro avião fabricado em metal, o Douglas DC-2. A KLM foi a primeira companhia europeia a encomendá-lo, tendo adquirido mais 18 até à Segunda Guerra Mundial. Este avião, além da carga, podia transportar até 14 passageiros. Depois, adquiriu o DC-3 e o Lockeed L14 Super Electra.

www.revistacargo.pt


Fonte: KLM

Em 1940, a KLM inaugurou os seus voos para Portugal, utilizando os aeródromos de Espinho e da Granja do Marquês, em Sintra. O primeiro voo realizou-se em 2 de Abril, entre Amesterdão e Espinho. A ligação aérea entre Portugal e Holanda, demorava então 8 horas! Devido à conjuntura internacional da época, estes e outros voos na Europa foram suspensos. Lembramos que, em 10 de Maio de 1940, as tropas alemãs invadiram a Holanda. Destruíram cidades e vidas e paralisaram todas as actividades da KLM, em Amesterdão. No bombardeamento ao Aeroporto de Schiphol, foram destruídos 18 aviões da KLM e capturados mais 11. Apesar dos perigos da Segunda Guerra Mundial, a KLM manteve-se ligada a Portugal, na chamada “Rota da Vida”, entre Bristol e Lisboa. Era a única ligação aérea entre o continente e a Grã-Bretanha. Outro dado histórico: o primeiro avião a aterrar no Aeroporto da Portela, era da KLM. Este acontecimento mereceu dos jornais de 3 de Abril de 1940, a seguinte “manchete”: “A inauguração da carreira aérea Amesterdão – Porto – Lisboa – Amesterdão, pela KLM”. O Século referia-se à chegada do DC-2 ao aeródromo de Sintra, nestes termos: “A Esposa do Chefe do Estado recebeu ontem um ramo de flores colhidas horas antes num jardim da Holanda e trazidas para Portugal no avião da KLM, que inaugurou a linha Amesterdão – Lisboa.

Na altura, a KLM já tinha projectos para alargar a cooperação entre a Holanda e Portugal, no sector do transporte aéreo. De facto, pretendia alargar a sua rede, fazendo de Lisboa a plataforma das suas novas rotas intercontinentais para o Brasil, Uruguai e Argentina e, também, para Angola e África do Sul. A proposta apresentada às autoridades portuguesas, resultado do grupo de trabalho chefiado pelo comandante van Balkom, referia-se a um projecto para a exploração das linhas Lisboa-Niamey-Lobito-Cape Town; Lobito-Moçambique; Lisboa-Madeira-Guiné-Sal e Lisboa-Sal-Pernambuco-Rio de Janeiro-Montevideo- Buenos Aires. Este projecto previa a aquisição de três aviões LockeedConstellation, com capacidade para 64 passageiros e 16 toneladas de carga. Porém, tudo isto não passou de um sonho dos pioneiros da KLM. No entanto, tradicionalmente, os holandeses sempre estiveram envolvidos com sucesso em transportes e comércio. De qualquer modo, a KLM sempre foi reconhecida pela sua capacidade em desenvolver o transporte aéreo de mercadorias e passageiros. Em Portugal, foi pioneira em várias iniciativas promocionais, na criação de novas rotas e mercados, na oferta de cursos de formação aos agentes de turismo e agentes transitários, entre outras operações de marketing.

O Jornal de Notícias, do Porto, tinha o seguinte título e chamada: “Asas de Fogo: de Amesterdão ao Porto em oito horas! Dois “azes” da aviação inauguraram ontem, brilhantemente, a carreira aérea entre Portugal e a Holanda, dois países de belas tradições marítimas, secularmente amigos”. Na época, a aviação merecia a atenção e o destaque noticioso de jornais e jornalistas.

Como resultado de um trabalho iniciado em 1964, em 6 de Maio de 1971, a KLM, numa operação “Joint-Venture” com a TAP, inaugurou o primeiro voo cargueiro no percurso Lisboa/ Porto/Amesterdão/Lisboa, operado por um avião B727-QC com capacidade para 15 toneladas de carga. Uma operação que durou 10 anos e que contribuiu para a promoção da carga aérea, em Portugal.

Neste voo, a KLM transportou passageiros e malas de correio para Portugal e EUA, aproveitando a ligação aérea existente entre Lisboa e Nova Iorque. E a Philips recebeu uma remessa de aparelhos, inaugurando, assim, o serviço de carga aérea entre os dois países.

Terminada esta operação, a KLM criou o transporte combinado camião - avião em Portugal, oferecendo, semanalmente, um novo serviço de camião - avião de Lisboa e Porto para o Aeroporto de Schiphol, onde oferecia ligações aéreas directas para várias cidades nos EUA e outros países.

Na cerimónia de recepção, Johan Sillen, ministro da Holanda, anunciou que a Rainha Guilhermina agraciara Alfredo Sintra e Vasco de Orey com a Ordem de Orange-Nassau, em reconhecimento dos seus esforços para o estabelecimento da linha aérea e do seu contributo para estreitar as relações económicas, entre os dois países.

Ontem como hoje, a KLM é reconhecida como pioneira da carga aérea e como uma das primeiras companhias de aviação a aperceber-se da sua importância no desenvolvimento do comércio internacional. Por isso e pelo prestígio granjeado no mercado internacional, a KLM continua a ser uma das companhias de aviação mais credíveis e utilizadas, a nível mundial.

www.revistacargo.pt

41


BREVES AÉREO

Consórcio MAIS já conta com uma aeronave maior para a rota diária Lisboa-Funchal-Lisboa

DHL Express espera começar a construir novo hub de Lisboa na primeira metade de 2018

O consórcio MAIS (Madeira Air Integrated Solutions), que liga diariamente Lisboa e Funchal, passou a operar com uma nova aeronave, o modelo ATR 72 – 500, que concede maior capacidade e maior potência à estrutura empresarial que agrega a ALS, a Swiftair e a Loginsular.

É uma ambição da DHL Express Portugal há muito tempo e parece que os derradeiros passos estão já a ser dados: a empresa deverá iniciar ainda no primeiro semestre deste ano a constução do seu novo hub no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa.

Este novo passo no desenvolvimento da actividade era um desígnio ambicionado pelo consórcio liderado por António Beirão que, em recente entrevista à Revista CARGO, já tinha antecipado este caminho. «O avião ideal para os primeiros seis meses ou para o primeiro ano é o ATR-72. Mas se a procura crescer como esperamos, avançaremos para um avião com maior capacidade», referia António Beirão à Revista Cargo há um par de meses. O passo foi agora consumado, e, a acompanhá-lo, o consórcio deixou também uma mensagem de ambição e progresso: «Estamos a crescer…literalmente! Mais potência e maior capacidade de carga, trazem ainda MAIS vantagens para os nossos clientes».

«Está tudo internamente aprovado e com outros parceiros também, mas estamos a fazer o projecto para ser licenciado pela Câmara. Está nesta fase. No ano de 2018 tem mesmo de começar a construção. Esperamos que seja o mais cedo possível. Na pior das hipóteses até ao fim do primeiro semestre. Já perdemos muito tempo nisto», admite Américo Fernandes, director geral da DHL Express Portugal.

À Revista Cargo, fonte do Consórcio justificou o aumento de capacidade (em cerca de uma tonelada por viagem) com a crescente procura que a ligação Lisboa-Funchal-Lisboa vem registando, em particular desde que a MAIS começou a oferecer um serviço rodoviário Porto-Lisboa, permitindo assim que a região Norte possa também aproveitar a ligação aérea para a Madeira.

A ambição da DHL, depois de muitos avanços e recuos e até de algum desespero pela demora do processo, passa por ter em Lisboa um hub que complemente a sua rede europeia e que possa estar já em operação no ano de 2020. A DHL tenciona investir mais de 30 milhões de euros no Aeroporto Humberto Delgado, duplicando a actual capacidade de 20 para 40 toneladas/dia, no espaço de três a quatro anos. A essa capacidade acrescem ainda as 30 toneladas/dia que a DHL Express Portugal já pode fazer no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, no Porto. A DHL Express Portugal movimenta hoje em Portugal cerca de 12.000 toneladas/ano, por isso terá com o novo hub de Lisboa muito espaço para crescer nos próximos tempos, aponta ainda Américo Fernandes.

Porém, a companhia já tem a mira voltada para o ano que agora começou e prova disso são as três novidades que acaba de anunciar: o “Must Go Door”, o “e-booking” e o “eAWB”.

TAP Cargo fechou ano de 2017 com 78.500 toneladas e crescimento de 25% A TAP Cargo fechou o ano de 2017 com um total 78.500 toneladas de carga e correio movimentados, um valor que representa um crescimento de 25% quando comparado com os resultados alcançados em 2016. 42

Começando pelo “Must Go Door: a companhia apresenta o novo produto como um fruto da sua parceria com a Azul. Basicamente, com este a TAP Cargo assegura o transporte portaa-porta nos seus serviços que ligam Portugal ao Brasil. «Este novo serviço vai estar ao dispor da comunidade brasileira residente em Portugal, bem como da comunidade portuguesa residente no Brasil, ao mesmo tempo que trará vantagens para as pequenas e médias empresas, de ambos os países, que apostam em vendas de e-commerce», informa a TAP Cargo em comunicado. Já o “e-booking”, como o nome indica www.revistacargo.pt

passa pela disponibilização de reservas online aos agentes de carga que se registem na plataforma da TAP Cargo (em www.tapcargo.pt) – ferramenta que concede toda a informação necessária como os voos disponíveis, a possibilidade de reservar espaço ou até a possibilidade do agente adoptar o eAWB (Carta de Porte Electrónica). Assim, o ano de 2018 marca então a entrada da TAP Cargo no eAWB, contribuindo para um processo de digitalização que vem sendo forte aposta da IATA mas que ainda não tem a adesão global que se esperava por esta altura. «A TAP Cargo acompanha, assim, a estratégia da companhia no caminho da digitalização, da modernização e de um melhor serviço prestado aos seus clientes», salienta a companhia aérea portuguesa.


SPEED UP YOUR BUSINESS www.tcl-leixoes.pt

A nossa velocidade é a economia do seu negócio! Com uma capacidade instalada de 850.000 TEU, o Terminal de Contentores de Leixões, assegura máxima rapidez, total eficiência e fluidez na movimentação dos diferentes tipos de carga. Ocupando um papel importante na fachada Atlântica da Península Ibérica e em todo o sistema portuário Europeu, é o mais ocidental da Europa, servindo um vasto e rico hinterland com aproximadamente 15 milhões de habitantes e oferecendo a melhor logística e integração na cadeia intermodal, equipamentos avançados e sofisticadas tecnologias da informação.

TCL - Terminal de Contentores de Leixões, S.A. Rua Mouzinho de Albuquerque, 13 · 4450-204 Matosinhos - Portugal Tel.: 351 22 939 41 00 · Fax: 351 22 937 88 05 · www.tcl-leixoes.pt · tcl@tcl-leixoes.pt www.revistacargo.pt 43


44

www.revistacargo.pt


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.