Revista DASartes 98

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ALEX KATZ JAMES TISSOT FRANK WALTER ANA PAULA OLIVEIRA WOLFGANG TILLMANS JANA EULER


DIRETORA Liege Gonzalez Jung CONSELHO EDITORIAL Agnaldo Farias Artur Lescher Guilherme Bueno Marcelo Campos Vanda Klabin EDIÇÃO . NEGÓCIOS André Fabro andre@dasartes.com MÍDIAS SOCIAIS . IMPRENSA dasartes@dasartes.com DESIGNER Moiré Art moire@moire.com.br

Capa: Alex Katz, Blue Umbrella 2, 1972. © 2020 Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.

REVISÃO Angela Moraes

Frank Walter, Sem título, sem data. Foto: Axel Schneider.

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Contracapa: James Tissot, La réponse (La lettre), 1874. Musée des beaux-arts du Canada, Ottawa. Foto: © MBAC


FRANK WALTER

10 WOLFGANG TILLMANS

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ALEX KATZ

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Agenda

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Notas do Mercado

8

Livros

106

Resenhas

108

Alto Falante

JAMES TISSOT

ANA PAULA OLIVEIRA

JANA EULER

48

98

86

66


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AGEnda

Esta, mais do que uma exposição, é a minha homenagem a Antônio Batista de Souza, Poteiro, um português que veio cedo com a família para o Brasil. No início ele usa barro para confeccionar peças utilitárias e objetos decorativos de pequenos formatos. Chega a ter duas fábricas de cerâmica, que acabam falindo. Começa na pintura incentivado pelo pintor Siron Franco e torna-se um grande colorista. Eu o conheci, rapidamente, no fim dos anos 80, quando fui sócia da Galeria Paulo Vasconcellos - um momento muito rico do meu descobrimento artístico, sobretudo na arte popular, quando ainda vivia a maioria dos grandes artistas hoje conhecidos. 4

Só vi sua última exposição, na saudosa Galeria São Paulo, de Regina Boni, ícone das artes nos brilhantes anos 80. Fui com minha mãe, que comprou o quadro cujo tema é o jogo de futebol. Ela o manteve em casa até a sua morte, em 2019, e o quadro me coube na divisão com meus irmãos. Sempre tive com ele uma forte ligação afetiva. Agora vocês podem apreciá-lo nesta mostra. (Vilma Eid)

POTEIRO: UMA HOMENAGEM • Mostra online • 30/6 a 31/7/2020 • www.galeriaestacao.com.br



Maria Polo

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NOTAS do mercado

James Lisboa inovou mais uma vez ao transmitir pela primeira vez seu leilão pela TV, no canal Arte1 no final de junho. É notável a melhora nos resultados das vendas em relação ao início do ano, com mais de 70% dos lotes vendidos e algumas boas disputas. O próximo leilão acontece dia 10 de agosto, também com transmissão pelo Arte1.

Eloá Carvalho

Outro sinal de retomada veio dos resultados dos leilões online das grandes casas em junho e julho. Driblando expectativas ruins – mercado de arte mundial encolheu 5% em 2019 (UBS/Art Basel) e logo veio Covid -, leilões da Sotheby’s, Christie’s e Phillips somaram mais de US$ 1 milhão nos últimos dois meses.

Em maio, expositores da SP-Arte se uniram em uma ação jurídica vencedora contra a feira cancelada, após o anuncio de que esta devolveria apenas um terço dos valores pagos pelos estandes. Agora, a SP-Arte desagradou mais uma vez ao divulgar a proposta para a feira online: galerias pagam de R$ 3 - R$ 9 mil para ter um espaço virtual, mais comissão de 2,5% sobre obras vendidas pela plataforma. Vai na contramão das feiras internacionais, que cobram pouco ou nada.


No leilão de Modernos e Impressionistas da Sotheby’s em junho, foram os surrealistas da América Latina que responderam pelos lotes mais disputados. Recordes de preços foram alcançados para três delas, incluindo Remedios Varo, cuja tela que inclui um autorretrato (foto acima) foi vendida por US$ 6,2 milhões com comissão. Em uma série de quatro vendas em leilão por valores muito acima das estimativas, as pinturas de céus de Lucas Arruda (foto abaixo) firmam o nome do jovem artista entre as estrelas do mercado internacional. Em fevereiro, em leilão na Phillips de Londres, uma destas de 30x37cm chegou a ser vendida a US$ 312 mil com comissão. Nos bastidores do circuito de colecionadores, vários colecionadores que têm obras desta série relatam ter recebido estrangeiros por propostas de valores ao redor de US$ 200 mil.

Hildebrando de Castro

Após o cancelamento da SP-Arte, a galerista Karla Osorio tomou a frente de um grupo de galerias sem-feira e lançou a Not Cancelled, primeira feira online brasileira, que esteve no ar de 10/6 a 8/7 com um time de 56 galerias. Como em quase todas as feiras online, as vendas foram poucas e de trabalhos de menor valor, mas o resultado agradou expositores, que relataram algumas vendas para clientes novos. Como a participação foi gratuita, todos os entrevistados consideraram que o balanço foi positivo. 7


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LIVros

Ao trazer a primeira coletânea de textos dedicados a temas de história da arte não europeia para o público brasileiro, este livro apresenta um fascinante universo de pesquisas que buscam ir além das narrativas tradicionais da disciplina e tratam seus objetos de estudo como parte de uma complexa rede de interações espaçotemporais. ARTE NÃO EUROPEIA: CONEXÕES HISTORIOGRÁFICAS A PARTIR DO BRASIL • Vários autores • Editora Estação Liberdade • R$ 56,00 • 240 páginas

Artista do cotidiano, João Loureiro se consagrou explorando a materialidade de objetos de uso e consumo correntes para refletir sobre o presente. O livro mescla suas obras a ensaios de curadores, críticos e outros artistas. O título retoma a trajetória do artista plástico com imagens de suas obras que aparecem mescladas a textos que discutem seu corpo de trabalho. JOÃO LOUREIRO: AMIGOS FUMANTES • Org: Thais Rivitti • UBU Editora • R$ 79,90 • 272 páginas

Este livro revê a trajetória da artista Afonso Tostes a partir de imagens de sua obra e relatos sobre o processo de trabalho, desde o início de sua produção até os dias de hoje. A publicação é dividida em quatro capítulos: Caminhos, Cidade humana; um segmento central com dois ensaios sobre o fazer artístico de Tostes; e Natureza humana. AFONSO TOSTES: ENTRE A CIDADE E A NATUREZA • Org: Daniel Rangel • Cobogó • R$ 60,00 • 120 páginas 8


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King size soul, sem data. Foto: Axel Schneider.

ALTO relevo


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FRANK walter


A OBRA DO ARTISTA CARIBENHO FRANK WALTER PARECE ESTAR EM OPOSIÇÃO ÀS ATRIBUIÇÕES RACIAIS E NACIONAIS PERMANENTES ÀS QUAIS ELE FOI EXPOSTO AO LONGO DE SUA VIDA. TÍMIDO E RESERVADO, FRANK SE TORNOU UM RECLUSO NA VIDA ADULTA, PARA SE DEDICAR À BUSCA DA ARTE

POR SUSANNE PFEFFER

“ .” James Baldwin, em uma conversa na televisão, 28 de agosto de 1963, Washington, DC “ Jamaica Kincaid,

” , 1988

Não existe um Frank Walter típico. Seu espectro pictórico é livre e amplo. O olhar dele é somente dele. Todo o trabalho é de excepcional clareza e franqueza. A concentração, que também pode ser atribuída ao tamanho das obras, abre uma abordagem desobstruída. Por mais variados que sejam os tópicos de Frank Walter, seus materiais são ainda mais diferentes. Criou obras sobre madeira, masonita, papelão, papel, linóleo ou no verso das fotografias, pintou e desenhou com tintas a óleo, têmpera, aquarelas, giz de cera e lápis, goma-laca e . Se ele não pintou, então ele escreveu, se ele não escreveu, ele gravou 12

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Sem tĂ­tulo, sem data. Foto: Axel Schneider.


Sem título, sem data. Fotos: Axel Schneider.

sons. Walter criou com uma intensidade incrível, que também é visível e palpável em seu trabalho. Ele era livre apenas na arte. Livre da brutalidade que estava nas atribuições do normativo e permanentemente presente fora de sua arte. O ato subversivo associado foi a única maneira de Frank Walter reivindicar viver sua própria vida, autodeterminada e autodefinida. Nascido em Antígua, em 1926, como descendente de escravos e proprietários de plantações, ele recebeu uma educação escolar influenciada pela ocupação colonial britânica e se tornou o primeiro negro administrador de plantações em Antígua, em 1948. Constantemente se esforçando para melhorar as condições de trabalho, viajou para a Inglaterra, em 1953, para expandir seu conhecimento em agricultura. Quando chegou a Londres, não foi aceito pelo ramo de sua família lá. Diante do racismo onipresente, não conseguiu se inserir na sociedade. Sobreviveu como diarista; fome e frio, assim como ataques racistas e as alucinações que causaram, moldaram sua vida cotidiana. De 1957 a 1959, viajou para a Alemanha Ocidental várias vezes para explorar sua história familiar. Entre outras coisas, trabalhou para Mannesmann, em Gelsenkirchen, e aprendeu alemão. Em 1961, retornou ao Caribe, primeiro a Dominica, onde a maioria de suas esculturas foram criadas, e depois a Antígua, em 1967. De 1975 a 1984, trabalhou como fotógrafo, depois se mudou 14


para uma montanha remota fora da cidade de Liberta e construiu uma casa com um estúdio, onde viveu e trabalhou até sua morte, em 2009. Buscando se ver como um tema para sua arte, Frank Walter sabia muito bem que sua própria identidade era composta de pessoas diferentes. Seus numerosos autorretratos e fotografias de costas atestam isso e sua distância do Eu retratado é evidente nos autorretratos como branco. Em uma sociedade baseada na definição do homem branco europeu, parecia quase impossível para ele ter sua própria identidade negra. Frantz Fanon escreveu na época: “Há apenas um destino para o homem negro. E é branco.” Como mostram os autorretratos de costas, o artista preferia passar seu tempo longe das pessoas e da natureza. Suas pinturas de paisagens testemunham observações muito precisas, mas também a capacidade de condensar a respectiva atmosfera através da abstração. Eles não têm nada em comum com a pitoresca pintura de paisagem comum no Caribe, evocada pelo turismo. Em contraste com o idealizado de palmeiras e praia, Walter estudou a paisagem em detalhes, uma paisagem em que a história colonial estava profundamente inscrita e que, como Édouard Glissant coloca, é seu próprio monumento. 15


One floor up more highly, 2010. Instalação no MASS MoCA, North Adams, Massachusetts, 2010-2012. Foto: Arthur Evans.


Psycho Geometrics, sem data. Foto: Axel Schneider.


Sem título, sem data. Fotos: Axel Schneider.

Enquanto muitos residentes e turistas em Antígua conheciam os pequenos desenhos fotocopiados e coloridos que Frank Walter vendia em sua loja de fotografias, seu extenso trabalho artístico era pouco visto. Fez várias tentativas para exibir seu trabalho na Grã-Bretanha ou na Alemanha, buscou por meio de cartas parceiros para fundar sua própria galeria e montar uma exposição completa, que ele guardou em caixas prontas para serem despachadas. Durante sua vida, no entanto, seu trabalho nunca foi exibido, ele próprio não pôde entender como as pessoas o veriam.

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VIDA E OBRA Frank Walter (Francis Archibald Wentworth Walter) nasceu em 11 de setembro de 1926, em Liberta, Antígua, uma ilha nas Pequenas Antilhas no Caribe. Antígua foi colonizada pela Marinha Britânica em 1632 e formalmente anexada como colônia britânica em 1667. O açúcar sucedeu o tabaco como principal produto e as plantações, baseadas na exploração e escravidão, tornaram-se o ramo mais importante da economia. Em 1860, Antígua foi fundida com a ilha vizinha de Barbuda. Aos 22 anos, tornou-se gerente do Sindicato do Açúcar da Antígua. Foi o primeiro negro a alcançar uma posição de liderança na indústria açucareira do país. Os métodos modernos de cultivo e processamento por ele defendidos, bem como seus esforços para reduzir a exploração social e a desigualdade racial, deram-lhe reconhecimento social. Apesar de ter sido selecionado para se tornar líder do Sindicato, Walter optou por fazer uma viagem de treinamento à Europa, onde pretendia passar dez anos. Além de aprofundar seus conhecimentos e buscar soluções que melhorassem as condições em seu país, também buscava explorar a história de sua família, que contava com raízes em Markgröningen, na Alemanha. Durante toda a sua vida, a história da família continuou sendo objeto de extensa pesquisa genealógica. 19



Sem título, sem data. Foto: Axel Schneider.

Em 1953, Frank Walter viajou com a prima Eileen Gallwey para a Inglaterra, via França e Itália. Na chegada, seu tio Carl Walter, que morava em Londres, desaprovou a conexão entre os dois. Em virtude do racismo, que era virulento na Europa, ele vê Frank Walter como um obstáculo à carreira de Eileen. Rejeitado pelo braço inglês da família, teve dificuldade em se inserir na sociedade e sobreviveu de pequenos trabalhos braçais. Viveu em constante mudança de cidade, emprego e acomodações. Apesar das duras condições, conseguiu realizar estudos científicos e tecnológicos em várias faculdades de Stoke-on-Trent, onde também frequentava as bibliotecas públicas. Durante esse período, criou textos filosóficos, obras literárias, uma história de Antígua, poemas e desenhos e pinturas. 21



Tambourine and harp, sem data. Foto: Axel Schneider.


Self-portrait, sem data. Foto: Axel Schneider.

De 1957 a 1959, Walter viveu na Alemanha Ocidental e, em sua volta à Colônia e Düsseldorf, relatou alucinações, que o levaram a algumas estadias em clínicas psiquiátricas. Ao longo de toda sua vida na Europa, foi exposto a ataques racistas que, junto com sua situação econômica precária, o levaram a voltar a Antígua, em 1961. Em 1961, retornou ao Caribe, primeiro a Dominica, onde a maioria de suas esculturas foram criadas, e depois a Antígua, em 1967. De 1975 a 1984, trabalhou como fotógrafo, mas a vida na cidade não combinava com sua natureza introspectiva. Finalmente, mudou-se para uma montanha, onde viveu e trabalhou até sua morte, em 2009. Frank Walter deixou cerca de cinco mil pinturas e 600 esculturas em madeira, inúmeros brinquedos de madeira feitos à mão, molduras e fotos pintadas, além de mais de 50 mil páginas de prosa e poesia, peças de teatro, textos sobre história, filosofia, ciência política, genealogia e arte, além de mais de 450 horas de gravação em fitas. rosse, ao devassarem certas fronteiras, sussurrem-nos que

Susanne Pfeffer é historiadora de arte e diretora do Museum für Modern Kunst - MMK em Frankfurt, Alemanha.

FRANK WALTER: A RETROSPECTIVE • MUSEUM FÜR MODERN KUNST - MMK • FRANKFURT • 16/5 A 15/11/2020 24



Pear Cut, 2019, © the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne.

DEStaque

WOLFGANG


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tillmans


Chloe, 1995, Š the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.


WOLFGANG TILLMANS É CONHECIDO POR EXPLORAR OS LIMITES DA FOTOGRAFIA E DA IMAGEM. TODAY IS THE FIRST DAY É A PRIMEIRA EXPOSIÇÃO SOLO DO ARTISTA EM GRANDE ESCALA NA BÉLGICA E INCLUI UM CORPO DE TRABALHO DE TRÊS DÉCADAS

POR DEVRIM BAYAR

Nascido em 1968, em Remscheid, Alemanha, Tillmans estudou no Poole College of Art e Design, em Bournemouth, Inglaterra. Em 2000, ele foi o primeiro fotógrafo e primeiro artista não britânico a receber o Prêmio Turner. Desde o final da década de 1980, a prática artística de Wolfgang Tillmans ultrapassou os limites da fotografia e da criação de imagens. Tillmans chamou a atenção do mundo da arte pela primeira vez no início dos anos 1990 com imagens aparentemente cotidianas de seus contemporâneos e do cenário emergente da música eletrônica e das boates na Europa. Tillmans rapidamente se tornou um dos autores que definiu um novo estilo intimista de fotografia documental, e suas imagens capturaram o espírito não conformista de sua geração, as subculturas e identidades sexuais. Desde então, Tillmans se dedicou a aprofundar sua pesquisa, aventurando-se além da fotografia para desenvolver uma prática artística multidisciplinar, envolvida com as questões sociais e políticas de nosso tempo. 29 29


EXPOGRAFIA PARTICIPATIVA Para cada uma de suas exposições, que ele concebe como instalações , Tillmans brinca com uma grande variedade de formatos, suportes e sistemas suspensos. Suas instalações convidam os visitantes a observar o todo com tanto cuidado quanto cada elemento individual, deixando-os a liberdade de fazer suas próprias conexões. No WIELS, Tillmans integrou a arquitetura, a luz e o som na apresentação de suas imagens, transformando as qualidades do próprio espaço em parâmetros que influenciam a maneira como suas imagens são percebidas. Tecendo seu caminho por meio da riqueza da mídia e da variedade de seus temas, a noção no centro do trabalho de Tillmans é a visibilidade. Quando algo se torna perceptível? Qual é a relação entre o que percebemos e o que sabemos? Que impacto as novas tecnologias têm na maneira como vemos o mundo? Essas questões revelam o alcance político da obra de Tillmans, que, de maneira poética, chama nossa atenção para os movimentos contraditórios e às vezes quase imperceptíveis que compõem nosso presente. Luz e som são elementos essenciais da experiência que o artista quer promover. Na entrada do espaço, descobriu as janelas para permitir que suas fotografias fossem banhadas pela luz natural e suas intensidades flutuantes. Um número de imagens abstratas é apresentado, cuja visibilidade muda ao longo do dia. 30


À esquerda: Zero Gravity IV, 2001. Abaixo: I don’t want to get over you, 2000 © the artist, courtesy Maureen Paley, London.

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As duas gravuras monumentais da série (o nome de um certificado de natação alemão) foram, por sua vez, feitas diretamente na câmara escura. Nessas imagens, os pigmentos coloridos parecem se dissolver sob o efeito de um processo químico desconhecido que deixa traços ondulantes no papel, onde parecem ter sido congelados com o tempo. A projeção tripla, feita especialmente para esta mostra, consiste em uma concatenação em de sequências de filmes aparentemente heterogêneas. Vemos o braço ou a perna do artista, um banho fotográfico, o fundo de uma pia, barras de metal colidindo, um telescópio... Embora as fotos sejam estáticas, os próprios objetos filmados estão sempre em movimento – eles são, podemos dizer, 32


Freischwimmer 231, 2012, © the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.

sempre performativos. A água escorre, a perna salta, o tecido voa ao vento, o raio de luz digitaliza pedaços de papel em uma copiadora. Embora filmadas, todas essas imagens se referem a trabalhos fotográficos, principalmente as naturezas-mortas de Tillmans, suas fotografias abstratas e suas imagens fotocopiadas. A trilha sonora reúne músicas recentes de Tillmans. A música sempre foi uma fonte importante de inspiração para este artista, cujos trabalhos mais antigos incluem fotografias da vida noturna e pistas de dança. Desde 2014, a performance ganhou mais destaque na prática de Tillmans, com seu corpo – que já figura em várias de suas imagens e vídeos – se tornando um verdadeiro instrumento. As letras de suas músicas, por sua vez, refletem algumas das questões e controvérsias que o envolvem. 33


Congo night, 2018, Š the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.



IMAGENS IMPRESSAS Se o acaso e o controle são ingredientes essenciais na prática de Tillmans, é porque eles refletem o confronto com o desconhecido e as tentativas de dominá-lo que definem a própria vida. Os restos acidentais da impressão dos livros e catálogos de Tillmans e as composições que ele orquestrou imitando o processo de impressão estão em um conjunto de grandes impressões em que o preto domina: Tillmans criou essas imagens durante a impressão de seu livro (Hatje Cantz, 2011), brincando com a impressora e derramando tinta nas páginas. É também o caso da série recente , cada elemento consistindo em um arranjo de fotografias sobrepostas com orientações diferentes, permitindo que Tillmans componha uma espécie de orgia na qual os nus masculinos dominam. Embora algumas das composições tenham sido projetadas em um computador, outras 36


À esquerda: paper drop, Oranienplatz, d, 2017. Abaixo: Nee | Yaow eow eow, 2017. © the artist, courtesy Maureen Paley, London.

foram criadas diretamente nas impressoras ( ), com Tillmans imprimindo a mesma folha várias vezes, alterando a orientação a cada vez, em um semelhante ao das folhas de apoio que os técnicos costumam usar, verificando se a máquina está calibrada corretamente. Enquanto outras fotografias privilegiam a simultaneidade perceptiva, a abordagem sobreposta adotada aqui leva a um novo nível a multiplicação e a obsolescência da imagem na era digital. (2018) é uma peça de palavra falada em nove minutos, em que Tillmans gravou improvisado e de uma só vez em um ditafone. Nele, Tillmans descreve, em tom simultaneamente sério e irônico, o projeto fictício para um filme sobre as maneiras em que a tecnologia se infiltrou nossas vidas, indo desde os primeiros PCs para o agora onipotente e onipresente . Esta peça não visual é, paradoxalmente, um convite aos visitantes a meditar sobre como eles percebem e habitam o mundo. 37


6407-35, 2007, © the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris

FOTOGRAFIAS SEM CÂMERA No final dos anos 1990, Tillmans embarcou em uma investigação de uma década sobre a criação de fotografias sem câmera, ou seja, fotografias produzidas diretamente na câmara escura. A série pertence a esse corpo de trabalho. Todas as imagens foram criadas passando papel fotográfico através de uma máquina de processamento que não foi limpa dos resíduos químicos, vestígios de poeira e sujeira deixados pelas impressões anteriores. O papel monocromático preserva, assim, os traços do processo químico e mecânico do qual as imagens se originam. Tillmans mandou jatear a parede da exposição para revelar o cimento original escondido atrás de camadas de tinta. Essa intervenção arquitetônica sugere o quão importante é o espaço para o artista. Ao chamar a atenção para o concreto acidentado e irregular, Tillmans destaca mais uma vez a materialidade do suporte e chama a atenção para a história e, por extensão, à não neutralidade do cubo branco. A noção de comunidade tem sido central no trabalho de Tillmans desde o início, quando ele documentava a vida noturna e as paradas do Orgulho Gay. Está presente na série de fotografias de uma 38


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Layers, 2018. À direita: Shaker Tree, 1995. © the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.

comunidade , nos Estados Unidos, que Tillmans visitou várias vezes em meados dos anos 1990; as imagens irradiam a felicidade de seus membros, que vivem coletivamente em comunidades organizadas em torno de princípios espirituais e igualitários. Sua alegria parece infundir seu entorno; assim, por exemplo, vemos um arco-íris sobre uma casa enquanto uma árvore parece se abraçar. Nos últimos anos, Tillmans treinou suas lentes para as coletividades mais efêmeras que se formam durante manifestações políticas por democracia, paz e direitos das minorias, por exemplo, o movimento . Recentemente, Tillmans teve uma exposição itinerante na África e aproveitou a oportunidade para visitar um campo de refugiados em Kakuma, no Quênia, e mais especificamente a comunidade LGBTI que se formou dentro do campo, fotografando e entrevistando seus membros para a revista . Usando sua posição, o artista quer atuar como caixa sonora, ampliando as narrativas e chamando a atenção para as necessidades dessas comunidades. 40



Kammerspiele, 2016, Š the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.



Acima: FKK naturiste, 2008. À direita: Layers, 2018. © the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.

PRETO E BRANCO As impressões preto e branco estão entre os primeiros trabalhos de Tillmans, datados de quando ele começou a experimentar com a abstração enquanto era estudante. Em 1986, ele produziu uma série de imagens usando a primeira geração de fotocopiadoras a , permitindo-lhe reformular e ampliar as fotos que havia encontrado ou tirado. Tillmans ficou fascinado pela textura dessas fotocópias em preto e branco, que ele achou mais rico e mais interessante do que os desenhos e pinturas que ele estava fazendo na época. A partir dali, vem explorando o potencial transformador das ferramentas de reprodução.

“ ” 44


LIGHTER As séries desafiam a tradicional distinção entre imagem bidimensional e o objeto tridimensional. Para fazer esses trabalhos abstratos, Tillmans submeteu o papel fotográfico a uma variedade de luzes coloridas, dobrando e desdobrando-o antes ou depois de o revelar na câmara escura. Cada elemento desta série é único, mas todos eles provocam uma mudança perceptiva, pois nenhuma destas imagens se refere a outra realidade: todas são autorreferenciais e insistem em sua própria materialidade.


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À esquerda: CLC 014, 2017. À direita: Separate System, Reading Prison (self b), 2016. © the artist, courtesy Galerie Buchholz, Berlin/Cologne, Maureen Paley, London, David Zwirner, New York, Galerie Chantal Crousel, Paris.

TRABALHOS RECENTES Uma imagem abstrata com uma questão está entre os trabalhos mais recentes de Tillmans. A pergunta é: “Qual é a probabilidade de que apenas eu esteja certo nesse assunto?” Formulada na primeira pessoa, parece ter a intenção de ser introspectiva, tanto para o artista quanto para o público: é uma pergunta que todos devem enfrentar em algum momento. O trabalho faz parte de uma série feita com a digitalização de imagens e textos existentes, a maioria deles tirada do campo da neurociência. Durante o processo de cópia, a luz na máquina digitaliza o documento original várias vezes; enquanto isso acontece, Tillmans move o documento para criar distorções na reprodução. Esses movimentos produzem traços de cores diferentes que não coincidem mais com seus contornos. Essas divergências lembram como nossa percepção é deformada na era das notícias falsas e da pós-verdade.

Devrim Bayar é curadora do Centro de Arte Contemporânea WIELS, onde organizou exposições de Daan van Golden e Thomas Bayrle. Fundou, em 2011, a plataforma on-line Le Salon.

WOLFGANG TILLMANS: TODAY IS THE FIRST DAY • WIELS • BRUXELAS • BÉLGICA • 1/2 A 16/8/2020


The Red Smile, 1963. © Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.

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ALEX katz

CApa



ALEX KATZ (NEW YORK, 1927) É UMA DAS FIGURASCHAVE DA HISTÓRIA DA ARTE AMERICANA DO SÉCULO 20 E UM PRECURSOR DA POP ART QUE CONTINUA ATIVO ATÉ HOJE. A RETROSPECTIVA NO THYSSEN-BORNEMISZA, EM MADRI, OFERECE UMA PESQUISA DE TODOS OS TEMAS HABITUAIS DO ARTISTA: SEUS RETRATOS INDIVIDUAIS, DUPLOS E EM GRUPO, JUNTAMENTE DE SUAS FLORES CARACTERÍSTICAS E PAISAGENS ARREBATADORAS PINTADAS EM PLANOS DE FUNDO COM CORES VIVAS

POR IASMINE SOUZA A aparente simplicidade das pinceladas de Alex Katz pode gerar desinteresse apenas ao olhar desatento. Os grandes blocos de cor, a economia de linhas e a planicidade das imagens escondem o arrojo do audacioso pintor, que inovou a pintura da cena americana de sua época. Não é à toa que, a cada ano, cresce a atenção do circuito da arte em seus trabalhos. Aos 93 anos e considerado um dos mais célebres artistas da sua geração, Katz é representado por diversas galerias prestigiadas e suas obras, além de marcarem presença em uma longa lista de museus respeitados mundo afora – que inclui o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, o Centro Georges Pompidou, o Museu Reina Sofía, o Tate Modern, entre muitos outros –, são disputadas por colecionadores de altíssimo nível. Aos mais íntimos, Katz faz aquele tipo de pintor cujo estilo se reconhece de longe: a paleta de cores vibrantes e os planos de fundo monocromáticos reinam absolutos nas composições em larga escala. Elementos inconfundíveis que revelam um e atrevido da figuração. O americano de fato tratamento se liberta do rebuscamento de detalhes e conduz o espectador a um universo limpo e pouco previsível, de um jeito que lhe é bem peculiar, harmonizando o convívio entre contrastes, cortes dinâmicos e sensação de minimalismo. Alex Katz nasceu no Brooklyn, em 1927, e se mudou no ano seguinte para o Queens. Finalizou os estudos de arte na 50


SoHo Morning from 1987. Courtesy Alex Katz Studio. Foto: Paul Takeuchi.


Acima: Vincent and Tony from 1969. À direita: Ada in Hat, 1990 e Five Women, 1977. © Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.

Cooper Union, em 1949, mas é apenas depois disso, durante uma sessão de pintura ao ar livre em pleno verão, entre 1949 e 1950, na oportunidade estudando na Escola Skowhegan, no Maine, que ele encontrou seu verdadeiro propósito na pintura. A experiência é tão grandiosa e inspiradora que o fez manter por lá uma casa à beira do lago, onde há mais de 60 anos passa todos os seus verões. Pintando, claro. A energia libertadora da observação e a pintura das paisagens do Maine viram mote para a construção de um novo olhar, muito diferente de tudo que estava sendo consumido e admirado à época. É ali que percebeu com clareza que o treinamento da faculdade não seria suficiente. Quando iniciou a carreira, o expressionismo abstrato era o “todo poderoso” da pintura americana. Mas ele não se encaixou. Corajoso, enquanto os amantes da arte estavam obcecados pelo fenômeno Jackson Pollock e pelas imagens surpreendentes geradas nos exercícios de arte abstrata, Katz permaneceu fiel à sua sensibilidade. Queria a espontaneidade, mas não estava disposto a abrir mão 52


do desenho com desapego emocional. Na arte , que fez de Andy Warhol e Roy Lichtenstein reis, tampouco. Constantemente associado ao movimento, inclusive como precursor, ele sempre recusou a aproximação. Mas, de fato, a estética comercial da publicidade televisiva e dos que invade a influencia diretamente a linguagem gráfica do seu trabalho. O esforço hercúleo de enquadrá-lo em categorias – isso não é incomum na história da arte – é absolutamente desnecessário e redutor. Katz, sem dispensar os aprendizados da formação modernista convencional, cujas referências permeiam inúmeras de suas obras ao longo dos 70 anos de carreira, encontra uma abordagem moderna própria, que, de início, fez muitos críticos “torcerem o nariz”: a pintura figurativa em escala não tradicional. E é assim que Alex Katz enterra o velho chavão da distância entre abstração e figuração, além de unir elementos pictóricos tradicionais e contemporâneos. 53


Acima: Gray Day, 1992.

Independente, ousado e fiel ao que vê, segue na representação dos dois maiores gêneros que lhe despertam interesse: paisagens e retratos. Embora já tenha realizado outras experiências – com colagens, por exemplo, entre 1955 e 1959 –, é no início na década de 1960 que se percebe um refinamento do estilo que é hoje reconhecido instantaneamente. As pinturas de paisagem são tranquilas, como um convite que atrai o observador. O interesse contumaz pelo efeito da luz do sol também cede espaço a pinturas noturnas a partir de 1986. Nos retratos, Alex apresenta figuras sozinhas, em dupla ou em grupo. São retratos do efervescente cotidiano social da classe média americana ao seu redor, de Nova York ao Maine. Um novo marco de carreira e obra se dá quando Katz conhece Ada, sua atual esposa, em 1957, especialmente no que diz respeito à maturidade no gosto pela representação da figura humana. Não é nenhuma novidade que, ao longo da história da arte, mulheres-musas permearam o imaginário masculino. Jeanne, para Modigliani. Gala, para Dalí. Ada Del Moro Katz agora entra para uma longa lista de mulheres que se transformaram em obsessões românticas nos pincéis. Estima-se que Alex Katz tenha retratado Ada por volta de 200 vezes desde que a conheceu. É ela que estampa o icônico (Imagem da capa), de 1972, que em 1986 serviu de capa para a maior exposição individual de pintor no Whitney Museum, em Nova Iorque, e agora promete ser a estrela na próxima mostra do museu Thyssen-Bornemisza, em Madri. É certamente um dos seus mais importantes trabalhos, justamente por apresentar o motivo de pintura revisitado ao longo de toda a carreira do americano, nas mais diversas cores e efeitos de luz. 54


À direita: Orange Hat, 1990 e Portrait of a Poet Kenneth Koch, 1970. © Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.

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A pintura, de impressionantes 244 cm x 366 cm, mostra a musa de Katz segurando um guarda-chuva azul em meio às gotas que escorrem por toda a composição. A bela Ada tem um olhar profundo, como se estivesse perdida em uma atmosfera misteriosa. Há algo de inquietante na maneira como parece desconectada da chuva que cai ao seu redor. Elegante, veste um casaco sofisticado e tem os cabelos envolvidos por um lenço estampado vermelho e branco, revelando o forte senso de moda presente nas obras do marido. Embora haja superfície tanto na representação da imagem atraente e glamourizada, como na estrutura plana da composição, não passa despercebida a impressão de que há algo além disso. Em 2019, uma pintura de dimensões menores desta mesma série, composta por apenas duas, foi vendida por aproximadamente US$ 4,1 milhões em um leilão da Philips, em Londres. , publicado em outubro de Em 2018, Katz lista uma enorme quantidade de artistas que o inspiraram e surpreenderam de alguma maneira: El Greco, Edward Hopper, Louise Bourgeois e Henri Matisse são alguns dos grandes nomes. Atento ao mundo ao seu redor, não menospreza qualquer assunto contemporâneo que inesperadamente o atraia, desde o vídeo de roupas íntimas que assiste dentro de um táxi à observação da longa trajetória publicitária da Coca-Cola. Aliás, são esses estalos que, em 2017 e 2018, dão origem a uma série de pinturas de mulheres de roupa íntima preta, as e às famosas , em que moças loiras em um maiô branco, movimentando-se das mais variadas formas, são destaque sob um plano de fundo vermelho arrebatador. Ao lado da sua Ada, Katz permanece extremamente produtivo, dividindo-se entre o estúdio no Maine e um espaço no Soho, em Nova York, no mesmo edifício onde vive e trabalha desde 1968. 56


Ada in Black Sweater, 1957. Courtesy Colby College Museum of Art.


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CK 4, 2017. Alex Katz Studio . Foto: Paul Takeuchi.


Vivien, 2016. © Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.

É preciso reposicionar Katz na história da arte ao lado dos grandes nomes do século 20. E é nesse caminho que o museu Thyssen-Bornemiza, em Madri, se prepara para sediar uma mostra inédita de 30 pinturas a óleo que chegam a cobrir paredes inteiras, agora atrasada em virtude da pandemia. O Instituto Tomie Ohtake também promoveria uma exposição individual do pintor neste segundo semestre, dentro do conjunto de exposições paralelas à 34ª Bienal de São Paulo, adiada para 2021. Em 2022, será a vez do museu Guggenheim, em Nova York, que pretende realizar uma retrospectiva histórica do pintor americano, o que certamente fará decolar ainda mais o seu mercado e a legião de fãs. Aguardaremos ansiosos. Afinal, não dá para perder Alex Katz.

Iasmine Souza Encarnação Novais é Procuradora do Município de São Paulo, entusiasta da história da arte e autora do perfil @minutodearte.

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Gold and Black II, 1993. © Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.


Apple Blossoms, 1994. © Alex Katz/Artists Rights Society (ARS), New York.



ALEX KATZ EM PROCESSO POR RICARDO KUGELMAS (Fundador do , espaço de arte independente em São Paulo) Alex Katz decide a composições de suas pinturas antes mesmo de começá-las. Quando aceitei posar para ele pela primeira vez, ele me disse: “Já vi a pintura. Pode por favor vir com seu rosa e chapéu?”. Tive então a oportunidade de observar seu processo de pintura, em quatro etapas. O primeiro passo é uma pequena pintura feita por observação em masonite (um material derivado da madeira). Em seguida, ainda na presença do retratado, um desenho de grafite sob papel captura os detalhes que a pinturinha não deu conta. No terceiro passo, já feito de papel já no tamanho em seu ateliê, amplia a imagem em um da pintura final. Por meio de uma técnica usado pelos pintores renascentistas, transfere a imagem para a tela grande, onde, em uma sessão, termina o processo.

Upside Down Ada from 1965. Courtesy MOMA, gift of Agnes Gund. À direita: Tracy on the Raft at 7h30, 1982. Colby College Museum of Art. Foto: Peter Siegel.

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ALEX KATZ: RETROSPECTIVE • THYSSEN-BORNEMISZA MUSEO NACIONAL • MADRI • EM BREVE

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FLASHback

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JAMES tissot


Jour Saint (Holyday) vers 1876.© Tate, Londres, Dist. RMN-Grand Palais / Tate Photography.


PINTOR BRILHANTE DA ALTA CLASSE SOB O SEGUNDO IMPÉRIO E DOS COSTUMES DA SOCIEDADE VITORIANA INGLESA, DOS ARISTOCRATAS ELEGANTES E PARISIENSES NAS DÉCADAS DE 1870 E 1880, JAMES TISSOT CRIOU IMAGENS QUE SE TORNARAM VERDADEIROS ÍCONES DO PERÍODO. A RETROSPECTIVA NO MUSEU D’ORSAY É A PRIMEIRA EM PARIS DESDE A ORGANIZADA NO PETIT PALAIS, DESDE OS ANOS 1980

O MODERNO AMBÍGUO James Tissot nasceu em 1836 e morreu no alvorecer do século 20. Teve uma longa carreira em ambos os lados do Canal em um período de profundas mudanças sociais, políticas e estéticas. Aficionado por tudo o que era original e eclético, foi repreendido por se aproximar do pastiche, mas também elogiado por suas formas impressionantes de expressão pessoal. Sempre seguia suas próprias inclinações e quase empurrou essa tendência ao limite em seu retorno à França no início dos anos 1880, quando praticamente abandonou a pintura para se dedicar a ilustrar a Bíblia, produzindo uma nova iconografia da Escritura nos últimos anos do século, que inspirou cineastas do século 20. A grande força da arte de Tissot reside nesse desejo não apenas de explorar novas abordagens, mas também adotar novas técnicas para disseminar suas composições. Seu perspicaz conhecimento lhe disse que, em uma época em que a tecnologia podia produzir e distribuir imagens em uma escala sem precedentes, o artista tinha a responsabilidade de fabricá-las. 68

La femme à Paris : les dames des chars. © Courtesy of the RISD Museum, Providence, RI.

POR REDAÇÃO



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INFLUÊNCIAS Portsmouth Dockyard c.1877 © Tate, Londres, Dist. RMN-Grand Palais / Tate Photography

Jacques Joseph Tissot cresceu em Nantes, dividindo seu tempo entre os negócios de cortinas da família e os cais do rio Loire. Esse garoto, já matriculado como “James” na escola, e inicialmente interessado em arquitetura, escolheu se tornar pintor e se mudou para Paris em 1855. Treinou nos estúdios de Flandrin e Lamothe, ambos seguidores de Ingres, que inspiraram nele um amor pelo desenho. No entanto, os verdadeiros modelos de Tissot não eram franceses. Olhando mais longe, o jovem artista desenvolveu um amor pelos Primitivos – os falecidos mestres alemães medievais (Cranach, Dürer e Holbein) e os pintores italianos do Quattrocento (Carpaccio e Bellini) – e, entre seus contemporâneos, o artista belga Henri Leys e os pintores britânicos pré-rafaelitas, nos quais ele reconheceu uma execução requintada e uma abordagem igualmente autêntica para observar o mundo. Tissot expôs no Salon, em 1859. Seus trabalhos cheios de peculiaridades estranhas e coisas curiosas atraíram a atenção, mas também críticas duras. O pintor foi acusado de produzir pastiches dos velhos mestres e de Henri Leys e de se afundar no arcaico: “é triste ver um artista inteligente e talentoso trair seu talento com imitações pedantes”, escreveu o crítico Paul de Saint-Victor. No entanto, depois de alguns anos, Tissot lançou as bases para um estilo original, que incluía arte nítida e cores contrastantes, senso de detalhes e acumulação e figuras cansadas ou arrependidas, que ele posteriormente aplicou a temas modernos. 71


La galerie du HMS Calcutta (Portsmouth). © Tate, Londres, Dist. RMN-Grand Palais / Tate Photography.




À esquerda: Japonaise au bain, 1864. À direita: Two sisters, 1864.

FIGURAS E RETRATOS MODERNOS Depois de ser insultado por críticos pela falta de originalidade de suas composições historicistas, Tissot apresentou duas pinturas radicalmente diferentes no Salon de 1864: e . Essas pinturas com tema contemporâneo eram extremamente populares e deram a Tissot um lugar no campo realista. Apresentadas pelo artista como retratos, essas obras se inspiravam na , da pintura de gênero, nos retratos grande tradição do fotográficos e em figurinos. Como seus amigos Whistler e Degas, Tissot brincou com essas várias fontes e abraçou completamente esse processo de hibridação de categorias pictóricas. Inovadoras, mas não revolucionárias, sofisticadas, mas com certa grandeza, a arte e a personalidade de Tissot cativaram clientes ricos, dândis aristocráticos e a classe média alta, que lhe encomendaram retratos e coletaram cenas de gênero. Essas pinturas, divulgadas por meio da fotografia, vendidas por grandes revendedores em Paris e Londres e exportadas para os Estados Unidos, fizeram de Tissot um dos artistas mais importantes de seu tempo e ele rapidamente se tornou um homem rico. OLHANDO PARA O LESTE EM DIREÇÃO AO JAPÃO “O último evento original digno de nota é a abertura de um estúdio japonês de um jovem pintor com meios suficientes para comprar uma pequena casa na Champs-Élysées” – foi assim que o crítico Champfleury descreveu Tissot e seu gosto pela arte do Japão, em 1869. O artista fez parte da primeira onda de artistas franceses de inspiração japonesa, vários anos depois que o Japão abriu suas portas para o Ocidente, em 1853, e mesmo antes da Exposição Universal de Paris, em 1867, para o qual o Japão enviou uma delegação e na qual exibiu pela primeira vez. , continuou a canalizar seu amor Tissot, a quem a delegação japonesa chamou pelo Japão em seu trabalho. Em 1864, sua pintura principal ofereceu uma visão fantasiosa de um Oriente imaginário, retratando uma mulher europeia vestida com um quimono cintilante. 75


UM FRANCÊS EM LONDRES Em 30 de setembro de 1870, quando Paris estava sitiada pelas forças da Prússia, Tissot se juntou ao corpo de voluntários da Defesa Nacional no batalhão de infantaria do Sena. O pintor era um patriota fiel e se alistou como voluntário como outros artistas e participou dos combates em Malmaison, registrando em seus cadernos a ferocidade dos confrontos, que lhe causaram um impacto profundo e duradouro. Deixou a capital às pressas após a Semana Sangrenta, que encerrou a Comuna. Chegando a Londres, no verão de 1871, ele não perdeu tempo em relançar sua carreira. Sua reputação o precedeu, pois havia mostrado trabalhos lá em três ocasiões em exposições oficiais entre 1862 e 1864 e trabalhou com o negociante de arte de Londres, Ernest Gambart, desde 1863. Tissot recebeu uma recepção calorosa de seu amigo Thomas Gibson Bowles, editor da revista a quem ele já havia submetido algumas caricaturas durante o Segundo Império. Na Inglaterra, o pintor renovou o contato com seus amigos parisienses, os artistas Alphonse Legros, Giuseppe De Nittis e James Whistler. Ele também se infiltrou em círculos vitorianos da alta cultura e recebeu algumas comissões de retratos. No entanto, Tissot permaneceu um exilado francês em Londres e manteve certo grau de distância, tingido de ironia em relação à moral estrita da era Vitoriana. Pinturas como e refletem sua percepção francesa das convenções sociais britânicas. 76


TÂMISA E VARIAÇÕES Quando Tissot se estabeleceu em Londres, em 1871, desenvolveu um amor pela costa do Tâmisa e pelos costeiros britânicos. Seguindo os passos de seu amigo Whistler, que encontrou material para uma série de obras a partir da década de 1860, o pintor descobriu um terreno fértil para se inspirar na vida das docas e da costa britânica. Esse mundo, com sua mistura de indústria e lazer, o trivial e o belo, localizado entre a megalópole de Londres e o mar de onde os emigrantes partiam, foi objeto de composições que impressionaram os críticos da Royal Academy e da Grosvenor Gallery, onde Tissot mostrou seu trabalho. A imprensa também foi cativada por esse estrangeiro que reproduziu a realidade contemporânea com tanta acuidade. No entanto, certo cansaço às vezes se fazia sentir. Não era incomum encontrar vários trabalhos muito semelhantes de Tissot, e sua capacidade de adaptar suas composições a diferentes mídias com algumas modificações é fascinante e desconcertante quando a variação beira a repetição.

À esquerda: L'enfant prodigue : Le retour Nantes, musée d'Arts. L'Enfant prodigue: Le Veau gras Nantes, musée d'Arts © RMN-Grand Palais / Gérard Blot.



Portrait du marquis et de la marquise de Miramon et de leurs enfants, 1865. Š MusÊe d'Orsay, dist. RMN-Grand Palais / Patrice Schmidt.


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Croquet, 1878. Art Gallery of Hamilton. © Michael Lalich

KATHLEEN PERDEU E KATHLEEN ENCONTROU Em Londres, em 1876, Tissot, que tinha 41 anos, conheceu uma divorciada de 23 anos e mãe de dois filhos, Kathleen Newton. Ela rapidamente se juntou a ele e se tornou a principal fonte de inspiração para seus trabalhos mais emblemáticos no final da década. Como uma borboleta em uma estufa, Kathleen incorporou a visão ideal de feminilidade do artista no estúdio, na casa e no jardim como uma beleza jovem e radiante, mas frágil, que logo sucumbiria à doença e à morte. Kathleen estava com tuberculose e estava sendo “consumida” diante dos olhos de seu amante-artista, que continuou a usá-la como modelo até sua morte, em 9 de novembro de 1882. Tissot deixou a GrãBretanha para a França em 15 de novembro, e voltou a morar na casa da cidade em Paris. Afligido pela morte de Kathleen, o pintor logo começou a se familiarizar com experimentos de comunicação com os mortos e o espiritualismo, que estavam em voga na Europa na época. Tissot acreditava ter feito contato com Kathleen através do médium britânico Eglington, em uma sessão espírita realizada em Londres, em 20 de maio de 1885. Reproduziu fielmente essa “aparição” em um estilo único de , que combinava pintura intitulado elementos de figuras românticas fantasmagóricas e fotografias de espírito contemporâneo.

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Mort de deux prêtres, 1896-1902. Série L'Ancien Testament. © The Jewish Museum, New York, Dist. RMNGrand Palais / image The Jewish Museum, NY


TISSOT – UM ARTISTA PRÓDIGO? O interesse de Tissot pelo ocultismo foi associado à redescoberta de sua fé católica. Alguns meses após a aparição de Kathleen, ele experimentou outra visão, de Cristo, na igreja de Saint-Sulpice, em Paris. Esse evento o convenceu a dar as costas aos assuntos modernos e a se dedicar a ilustrar os Evangelhos. Essa decisão coincidiu com a recepção desfavorável da série , exibida em Paris e Londres em 1885. Seu objetivo era restabelecer a verdade da história da Bíblia em um mundo cristão cuja imaginação era “distorcida pelas fantasias dos pintores”. Para conseguir isso, o pintor viajou à Terra Santa em 1886, 1888 e 1896; onde pesquisou e mergulhou em lugares onde acreditava poder redescobrir a verdadeira mensagem das Escrituras. Essa busca por um Jesus histórico foi acompanhada por uma predileção pela iconografia sobrenatural e por uma dimensão apologética e mística original. Sua busca pela autenticidade foi fundada em sua fé, e as imagens que ele pintou traduziram suas “visões”.

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Voie des fleurs, voie des pleurs ou La danse de la mort, 1860. © Courtesy of the RISD Museum, Providence, RI

As 270 aquarelas (de um total de 365) apresentadas no Salon, em 1894, foram imensamente populares. Publicado por Mame, em 1896, com o título , o trabalho foi um e considerado um dos melhores livros do século. Depois de acompanhar suas ilustrações em uma exposição de turnês triunfante na América do Norte, Tissot começou a ilustrar o Antigo Testamento. O artista morreu aos 65 anos em sua propriedade em Buillon, em 1902, antes de concluir esse projeto.

JAMES TISSOT: L’AMBIGU MODERNE • MUSÉE D’ORSAY • PARIS • 23/6 A 13/9/2020


REFLexo

ANA PAULA


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oliveira

Ainda nĂŁo, contrapassaro, 2009.


A ARTISTA MINEIRA RADICADA EM SÃO PAULO, ANA PAULA OLIVEIRA CRIA SITUAÇÕES POR MEIO DE DIVERSAS LINGUAGENS E MATERIAIS E DA REFLEXÃO SOBRE SUAS RELAÇÕES. A TENSÃO, A FORÇA E O CONTROLE ESTÃO SEMPRE PRESENTES COMO AGENTES ORGANIZADORES E ESTRUTURAIS. SUA PRIMEIRA EXPOSIÇÃO NO RIO DE JANEIRO CHAMADA DE POÇA/POSSA FOI PENSADA ESPECIALMENTE PARA O MAM RIO. AO LONGO DE POUCO MAIS DE DUAS DÉCADAS, A ARTISTA VEM CONSTRUINDO UMA PRODUÇÃO INTERESSADA EM DISCUTIR QUESTÕES CARAS AO PENSAMENTO ESCULTÓRICO

POR ANA PAULA OLIVEIRA “Escrever sobre o próprio trabalho sempre é desafiador para mim, difícil encontrar palavras para algo indizível…. proponho aqui algumas reflexões importantes sobre alguns trabalhos realizados.” “A ocupação das coisas no espaço são ponto de partida para minhas criações.”

AINDA NÃO, CONTRAPASSARO, 2009 , foi um “Em trabalho duplo onde ocupei dois andares de uma galeria. Eles se conectavam pela laje quando o trabalho do andar debaixo era suspenso por cabos de aço que passavam por furos feitos no teto e presos por dormentes no chão do andar de cima. Ali, há uma situação de controle quando dormentes se equilibram entre si e seguravam grandes sacos com água cultivando peixes, criando um ecossistema controlado. Já no andar de baixo, há uma superfície criada por um conjunto de placas de ferro e borracha suspensas no seu ponto de gravidade e pássaros de chumbo controlando o equilíbrio da grande superfície criada por diversas placas. Um trabalho de duas placas de vidro incrustadas no chão é seguro por um pássaro taxidermizado no movimento de alçar voo.” 88



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IMINENTE, MUITO PRÓXIMO ENTÃO, 2009 “Meu trabalho tem relação direta com o espaço, então muitas das instalações que realizei são pensadas e resolvidas para ocupar um determinado lugar. Quase sempre utilizo materiais brutos e os coloco juntos sem interferir muito na sua essência, gosto das coisas como elas são e minha procura é estabelecer relações entre elas. , em 2009, conta sobre o tempo e o espaço, suas mudanças e transformações. O peso da massa de borracha suspensa pela grade dos dormentes de madeira centenários oriundos das estradas de ferro, as mudas de palmeira imperial ocupando uma saleta de uma residência de família.” 91


MEU CHAPÉU LÁ NO ALTO DO CÉU, 2012 “Em 2012, fiz , no Beco do Pinto, na Casa da Imagem, local que faz parte de um complexo de edificações em São Paulo tombado pelo Patrimônio Histórico, que na era colonial marca a ligação entre o Solar da Marquesa e a Casa Número Um, sendo a principal ligação entre o centro urbano e comercial. Jabuticabeiras são suspensas por dormentes de madeira e protegidas por borracha, estão espalhadas ao longo da escadaria, junto a grandes reservatórios de água. Eles são ligados a um sistema de gotejamento que, aliado ao desnível da escadaria, mantém as árvores hidratadas, acentuando a natureza da espécie para frutificar. O sistema de funcionamento do trabalho depende necessariamente do desnível da escada para acontecer e manter o fluxo ativo. Pensei muito no fluxo importante que existiu na época colonial, nas histórias de ambas as casas, no processo de tombamento histórico e na função atual da escadaria. Crio e invento um sistema quando os coloco juntos no espaço ou em uma peça de escultura, pois normalmente um depende do outro para existir. Ou seja, precisam se relacionar mesmo que não tenham qualquer proximidade. Isso aparece pela opção dos materiais e as relações que estabeleci quando os organizo dando forma e criando os trabalhos.” 92


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AINDA QUE TE VI, 2013 “Em , no espaço expositivo da galeria, centenas de casulos de borboletas foram instalados em cabos de aço que sustentam um único ponto de equilíbrio placas de mármore e granito, onde lentes de aumento são incrustadas nas pedras permitindo a visão detalhada dos casulos e seu processo de eclosão. Junto a isso, fotografias retratam caixas criadas para a eclosão dos casulos, vídeos , apresentam o momento de metamorfose das borboletas e o trabalho onde uma lente de aumento incrustada em um objeto feito de mármore travertino faz com que sua textura se misture com outras de objetos de naturezas diferentes como casulos de borboletas vivos fundidos ou não, latão, bronze, exoesqueleto. acontece em uma sala expositiva de uma galeria, ocupa um ambiente onde a arquitetura se limita a paredes, teto e chão. é um aparato para realçar a complexidade dos sistemas de arte onde o estranhamento, a repulsa, o encanto, o artifício e o controle do olhar se apresentam de forma natural e fictícia ao mesmo tempo. Sendo assim vidro, madeira, planta, barro, pedra, borracha, metal, plástico, animal, inseto vivo ou não, metalizado ou fundido, o próprio espaço, o observador são matéria para mim. Enfim, o que aparecer ou encontrar, deixo maturando, decantando, familiarizando-se até que surge algo, como se fizesse um “pacto”, dito as regras e determino o jogo. É aí, na relação, onde acontece o trabalho, o ponto que a obra nos conta. As coisas têm seu significado e junto com outras se transformam, cada material tem seu caráter, não tenho como mudar isto! ‘A beleza está na intimidade que existe entre as coisas’, palavras de Manoel de Barros.” 94




POÇA/POSSA, 2020 “Na minha individual recém-inaugurada no MAM Rio minha intenção foi interagir com a arquitetura do museu. Tendo um pé direito imenso e com mezanino que integra um espaço tão generoso como a sala de exposições do museu, resolvi tomar partido do contrário, se o espaço me deu uma verticalidade máxima, vou trazer a horizontalidade para complementar este lugar... e equalizar o lugar como se equaliza o som. ocupa o salão monumental do MAM Rio com grandes peças geométricas formadas por placas de vidro e graxa onde dormentes de madeira centenários seguram e pressionam tudo. Criei um sistema e estabeleci uma relação entre eles, estão intrinsecamente ligados. Se uma peça sair, acontece um desmonte e tudo se acaba. acontece em duas situações e se completam com a presença do observador quando, ao caminhar pela instalação, ele faz parte do trabalho, percorrendo o espaço e, ao subir no mezanino com a vista de cima, ele contempla o espaço estando de fora, tem distanciamento de toda situação criada embaixo. Também debaixo do mezanino, uma pintura em nanquim, de 20 metros de comprimento, ocupa a extensa parede reforçando sua horizontalidade. é o título da pintura de observação, que realizei no jardim Botânico, da Palmeira Imperial da Palmeira plantada por D. João em 1808.”

ANA PAULA OLIVEIRA: POÇA/POSSA • MAM RIO • A REABRIR


gwf 9, Richter / Baselitz.

GARlimpo


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JANA euler


POR JAY SANDERS Concebidos nos últimos três anos, os trabalhos da exposição trazem muitas das investigações pictóricas de Euler sobre as inter-relações dinâmicas entre as formas autoconscientes e o espaço ao seu redor – institucional, doméstico e perceptivo. complexifica a natureza da própria pintura ao enfrentar as condições que informam a identidade e a autopercepção. Respondendo diretamente à renovação do novo espaço de exposição do Artists Space, em Nova York, as pinturas de Euler incluem telas esticadas convencionalmente e formas expansíveis sem estrutura, que funcionam como seres autônomos, novos objetos de pintura na forma de imensas lesmas. Evitando a fidelidade a qualquer estilo 100


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À esquerda: Body (Black Void), 2017. Abaixo: Under the perspective, 2015. Cortesia da artista e Galerie Neu, Berlin.

consistente, Euler manipula as formas de representação da figura para delinear novas maneiras de encarar confinamentos sociais e culturais, bem como aqueles raros momentos catalíticos de mudança ou epifanias – sejam emocionais ou institucionais – onde a falta de formação leva à reforma. começa com cinco novas pinturas de Euler. Cada uma apresenta temas de contenção, frustração e estase, usando as restrições físicas e dimensionais da tela para reunir questões mais amplas sobre a autoimagem e a imunidade criativa de expressão artística. Em , um único rosto aparece de uma variedade de fontes familiares, com olhos e cílios esticados em um olhar penetrante no que parece ser uma tela de 360 ​graus, e lábios cavados com orifícios para a ingestão 101


Close Rotation (Right) e Close Rotation (Left).

de álcool, cigarros, e drogas (recreativas e farmacêuticas). A face do sujeito da pintura é distorcida e desconstruída por seus próprios vícios através de um caleidoscópio de prazeres, mecanismos de enfrentamento e os onipresentes lubrificantes da vida em seu ambiente social. e se enfrentam. Pintados em um estilo figurativo realista, ambos apresentam o mesmo corpo masculino espelhado em orientações rotacionais opostas. A figura é distorcida desajeitadamente nas dimensões quadradas da tela, seu corpo encaixotado e capturado em uma postura de desconforto. A mudança na posição da figura nas duas pinturas evoca a ideia de movimento entre as duas obras, mas qualquer percepção de movimento é criada pelo espectador, com apenas um pequeno ajuste no arranjo composicional da pintura. Em , cuja composição é projetada para ser vista em qualquer rotação em ângulo reto, seu modelo masculino é retratado quatro vezes em poses distintas na mesma tela: estendido como o e também de pé, ajoelhado, e deitado na borda da pintura. Em , esses corpos repetidos coexistem e até deixam espaço para o espaço negativo da tela no centro da pintura. Com alças saindo da pintura como um sinal do constante reposicionamento da obra ao longo da exposição, a perspectiva fixa da pintura é deixada aberta à mudança. O mecanismo rotacional da pintura pode fornecer apenas modulações limitadas dentro dos limites estáveis ​de seu formato quadrado. Para , na qual duas figuras verdes se fundem em um sofá, seus corpos impossíveis de distinguir, submetidos a uma forma singular rústica e estranha. O título ( ou ) se refere a um raro distúrbio 102


mental em que duas pessoas têm uma ilusão idêntica, uma psicose compartilhada transmitida de uma para a outra. Essas duas figuras combinadas poderiam simbolizar o destino conjunto de artista e instituição, dois corpos suspensos em algo confuso: seja em união erótica, uma alucinação conjunta ou em um processo de exame psicológico recíproco no sofá. Técnicas de pintura separadas são usadas entre as pinturas, mas, quando consideradas juntas, revelam a exploração diagramática de Euler das várias interpenetrações e difusões que ocorrem no próprio ato de exibir.


No centro físico de há pinturasesculturas de lesmas, que Euler usa para fundir o formato da pintura com objetos que também servem como avatares para sua forma lúdica de fazer contato com o espaço expositivo e como a estase pode se desformar ( ). As criaturas, já em movimento lento, são congeladas em uma variedade de arranjos distintos com as colunas, cada uma executando uma articulação individual. A lesma já apareceu anteriormente nos trabalhos de Euler, como em (dépendence, Bruxelas, 2017), na qual Euler incluiu duas pinturas fotorrealistas de lesmas se movendo pela terra, cada uma retratada com uma mudança na profundidade de campo, criando incerteza sobre se a lesma ou seu observador alterou a velocidade de alguma forma.

JANA EULER: UNFORM • ARTISTS SPACE • NOVA YORK • A REABRIR


À esquerda: Vista da instalação na exposição Unform na Artists Space, NY, 2020.

Abaixo e à esquerda: GWF 5 e GWF 1 2019. Cortesia da artista e Galerie Neu, Berlim.

A única tela bidimensional maior da , um galeria é novo trabalho que é uma continuação da recente exposição de Euler, (Galerie Neu, Berlim, 2019). Euler apresentou uma série de pinturas que retratam tubarões subindo de cabeça para baixo do oceano, renderizados com a técnica de Gerhard Richter e pintados de cabeça para baixo ao estilo de Georg Baselitz. Este é o único tubarão da série de Euler a mergulhar em direção ao fundo do oceano, em vez de se erguer no ar, embora sua direção seja invertida na orientação instalada. A postura rígida do tubarão evoca o martírio masculino em sua forma de crucificação, imersa e sondando em busca de profundezas inobserváveis ​e estados de “informidade”.

Jay Sanders é diretor executivo e curador-chefe da Artists Space, uma organização sem fins lucrativos de Nova York. 105


GARlimpo

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RESenha

POR RENATA MARTINS

BETTINA POUSTTCHI " " Do espiritual na arte, Vassily Kandinsky Na Alemanha, especialmente em sua capital, o nome de Bettina Pousttchi é uma referência imediata à zona interseção entre fotografia, escultura e arquitetura. Isso porque, há exatos dez anos, por meio da colossal foto instalação (“Eco”), a artista teuto-iraniana (1971 – Mainz) revestiu o edifício da (“Museu Temporário de Arte”) com uma reprodução do Palácio da República, monumental prédio do Parlamento da República Democrática Alemã (RDA) demolido entre 2006 e 2008. Com esse gesto simbólico de resistência à demolição da memória histórica da antiga Alemanha Oriental, a artista já indicava o seu : por meio da ilusão ótica, colocaria em xeque os limites do espaço público urbano e, nesse processo, remodelaria o conceito de identidades nacionais e ressignificaria os elementos constituintes da paisagem citadina. Passada uma década desde então, Pousttchi volta a atacar novamente na capital alemã! Agora, o Museu de Arte Moderna recebe sua individual , aberta ao público até o dia 17 de agosto de 2020. Mesmo antes poder entrar no museu, o visitante já se encontra enredado em uma ilusão ótica com a qual a artista interveio o exterior do edifício. Criada a partir de fotografias trabalhadas digitalmente, uma película instalada sobre toda a fachada de vidro do museu confunde o observador, que tem impressão de que se trata de um típico padrão geométrico oriental – o que soaria bastante coerente se associarmos esse ato de criação artística às raízes iranianas da artista. No entanto, Pousttchi brinca com a primeira impressão do visitante e traz, na verdade, uma tomada meticulosa e propositalmente trabalhada de um detalhe das típicas fachadas arquitetônicas medievais em madeira no , presentes inclusive nas paisagens urbanas do país. Por meio dessa estilo provocação transnacional, a artista nos conduz a um caminho que nos leva a romper com a barreira de nossos “achismos” nacionais identitários e, ao mesmo tempo, a não acreditar cegamente no que vemos. Fazendo uso da urbanidade, sua matéria-prima, Pousttchi provoca certo estranhamento no visitante por deslocar e desconstruir sucessivamente a percepção que tem do habitat urbano. Agora, no interior do museu, ela faz uso de cinco enormes barreiras de estrada e Instaladas na contra colisão – aqui, sugestivamente denominadas vertical e encobertas de vermelho, a artista induz o observador à dúvida se realmente retirou das rodovias alemãs ( – daí vem a abreviatura ) o material de sua criação – o que teria causado um desmembrado de partes das rodovias A1, A2, A3, A4 e A5 que, efetivamente, tecem uma malha de ligações entre o Norte e o Sul e entre o Leste e o Oeste do país.


No entanto, o questionamento sobre a origem de sua materialidade fica em segundo plano, quando se vê que tais estruturas colossais de aço são, na verdade, entes com vida própria, figuras antropomórficas que preenchem o espaço expositivo com a sutil e elegante gestualidade típica de bailarinos. Capturados em um instante de baile, esses corpos, que outrora serviam como barreiras estáticas, agora recebem uma vida interna e deslizam pelo espaço gerando uma atmosfera orgânica. Essa mesma pulsão antropomórfica é trabalhada em outras dez instalações batizadas com nomes próprios como “Jakob”, “Olga”, “Paul”, “Marie”. Aqui, a estaticidade de suportes metálicos para atar bicicletas ou de barreiras recebem uma remodelagem e, consequentemente, uma ressignificação pelas mãos de Pousttchi: passam a ser outros entes com vida própria que se movimentam, aproximam-se, roçam-se, entrelaçam-se e se viciam às vistas dos visitantes. E, fechando brilhantemente o tema de ressignificação de barreiras transnacionais, Pousttchi reproduz fotos em preto e branco de 24 relógios analógicos de espaços públicos de 24 cidades ao redor no mundo. Para a série , ela viajou entre 2008 e 2016 fotografando o mesmo horário marcado nesses relógios, tanto por numerais romanos quanto arábicos ou cardinais. Trabalhadas digitalmente para que pudessem ter um visual semelhante, essas fotos mostram a mesma hora conforme o sistema (Tempo Universal Coordenado) em distintos pontos da Terra (como Rio, Berlim, Honolulu, Almati): 13:55 ou 01:55 – não se sabe ao certo. Assim, entende-se que a artista quis reproduzir a sincronicidade que o mundo globalizado tem tecida. O que, por um lado, evidencia o método colonialista europeu de estabelecer, desde o final do século 19, uma normativa para a manipulação do tempo em todo o mundo – vide a aplicação inicialmente do (Hora Média em Greenwich) e, a partir de 1975, do . Mas, por outro, registra os fenômenos de conexão e simultaneidade que regem o acelerado ritmo dos centros urbanos em todo o planeta. Dessa forma, e uma vez mais, Pousttchi desmembra as barreiras transnacionais.

Fotos: Alexander Kilian.

Renata Martins é mestre em Literatura Alemã pela USP e especialista em curadoria de arte pela Universidade das Artes de Berlim.

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GARlimpo

ALTO falante

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POR ALEXANDRE SÁ

AMOR

Elxs acordaram em um tempo cíclico, onde a referência de passado e futuro tinha desaparecido quase instantaneamente. E, mesmo sabendo que, de fato, o tempo é em si um exercício de circularidade a ser atravessado como que se mergulha, talvez tenham se habituado, ao longo da vida, com a certeza ilógica da marcação parcial feita pelos relógios que carregavam em seus pulsos ou aqueles tantos que ficavam pendurados em suas respectivas paredes. O problema é que, depois daquele momento específico de suspensão, tal civilização percebeu que o tempo, mesmo para as máquinas desejantes, já não mais conseguiria ser marcado, pois, as ações que auxiliavam na percepção da passagem tórrida das horas e dos dias, também foram penduradas. A sensação de que tais aparelhos não funcionavam mais se deu na mesma medida em que a iluminação trazida pelo dia e pela noite também começou a soar extremamente similar, perecendo de um sintoma que é próprio da demência. Tratava-se um tempo extenso, expandido, ampliado e, talvez exatamente por isso, por essa dificuldade de marcação simbólica, que tal emoção lhes parecia, em um primeiro momento, paradoxal, pois já não havia nem mesmo a possibilidade remota de um primeiro nem segundo. Era só o meio. Talvez tivesse sido apenas um momento percebido como tal, propício a angústias extremas. Aos poucos, perderam o hábito de quererem saber que horas seriam. Que horas poderiam vir a ser. Os dias, as semanas, os meses e os anos também não lhes interessavam mais. Mesmo as datas festivas e os aniversários começaram vagarosamente a perder seu tônus e talvez tenham enfrentado a realidade de um tempo que se tornou apenas passagem de si. Na cidadela em que viviam, aos poucos, quaisquer diálogos que fizessem referência ao tempo começaram a ser evitados. Não que o tempo tenha se tornado um tabu, mas, por respeito ao processo trágico de não encontrar mais referências, optou-se por certo tipo de acordo silencioso, no qual a temporalidade, pressupostamente evolutiva, jamais tinha existido ali. Curiosamente, e talvez por isso, as conversas começaram a apontar para questões mais densas e não menos graves sobre o sentido do viver e a realidade específica que também se dava como clausura. Mesmo evitando o tempo como elemento discursivo, os moradores daquele vilarejo, sem medidas, compreenderam que também lhes seria salutar se evadirem de qualquer referência ao espaço. Começaram então um jogo semântico curioso de também esquecer os nomes das ruas e da cidade onde moravam. Se eventualmente surgia alguma necessidade de indicação de direção, como um passante nos pergunta atônito como chegar a determinado lugar, as respostas se davam pelas árvores, pelas cores das casas e pelos terrenos baldios em suas respectivas monumentalidades. Nada foi programado. Essa estrutura comunicativa que, diante do abismo absoluto do viver, escolheu suprimir em seus discursos elementos referenciais, deu-se de forma natural e extremamente rápida. Mesmo sem o que dizer, a população compreendia que tal situação implicava a supressão de seguranças prévias. Consequentemente, as eleições . O único cartório da cidade também encerrou suas atividades por foram adiadas motivos óbvios. E, de forma surpreendente, o xerife, o prefeito e o zelador, por perceberem que não seriam substituídos, exaustos que estavam, renunciaram aos seus cargos. A fatalidade 108


da duração e a remota possibilidade de estarem atrelados a tais funções lhes gerava um pânico inelutável. Não fizeram um comunicado formal, mas reuniram toda a sua família e alguns assessores e foram em silêncio, e de maneira sorrateira, em busca de outra terra onde o tempo fosse tão ávido quanto estiveram acostumados ao longo de todo esse tempo ainda nomeável. Os aprisionados da única e charmosa cadeia da cidade, que ficava no final da avenida mais larga, quase na fronteira com o nada de outro vilarejo, perceberam que a voz amarga e as botas por cima da mesa, que ordenava gozosamente a aplicação de castigos, havia emudecido. Estranharam. Os guardas também. Os dois vetores, em uma tentativa fracassada de contar os dias e as noites resolveram, também, sem combinação alguma, marcar o tempo na parede de suas selas respectivas que, de forma muito ligeira, preencheu-se de teor plástico sem preocupação alguma. Ao perceberem que a tal voz das botas havia desaparecido, guardas e presos também não fizeram qualquer movimento de busca e apreensão da disciplina. Olharam-se mutuamente e, de forma extremamente redundante, resolveram que já era hora, fosse ela qual fosse, de encontrar as chaves que abririam as celas de seus diálogos truncados. E assim o foi. Resolveram sair juntxs da cadeia e a cidade parecia não devastada. Mas oca. Deliciosamente mergulhada no precipício real da angústia de quando se assume que o amanhã não virá. O elemento paradoxal dessa experiência é que puderam ter alguma experiência. E olharam estupefatos as ruas que agora já tinham tido suas placas com os nomes de outrora retiradas. No lugar, havia nada. Nenhum nome. Apenas o vento que, vez por outra levantava alguma poeira, era capaz de provocar alguma solidez naquele ponto de pura passagem. Ser. Tão. Contudo, a população que resistia ao torpor de viver sem tempo nem espaço precisaria fazer uma reunião urgente para definir as novas diretrizes de convívio. Acharam que o melhor ponto de encontro seria a pequena ágora que havia sido construída como palanque. O enorme problema que se apresentava é que, embora soubessem onde ainda ficava tal marco, jamais conseguiriam indicar o horário possível do encontro. De todo modo, a única solução era ir de casa em casa, convidando os moradores para que fossem já para o local in-determinado. Contudo, jamais imaginariam que ir de casa em casa também colocaria a urgência do fórum em suspensão. Aproveitaram para entrar, tomar café, conversar sobre outros assuntos nada urgentes, olhar algumas fotos nas paredes e rir de não mais saber em qual ano teriam sido tiradas. A cidade que sempre corrida parecia, mesmo sabendo da ligeira importância do encontro democrático proposto por pequenos alguns, esqueceu-se da responsabilidade pública. Mergulhou na intimidade desconhecida e jamais quis sair dali. Foram noites memoráveis de música, candeeiro, fumaça, frio e causos. Dizem que, para anunciar outro dia, mesmo sabendo que este seria apenas um desejo fadado ao fracasso, reuniram em uma grande fogueira, feita como que uma barricada, todos os relógios que tinham parado. Talvez por vontade própria. No mais absoluto exercício da autonomia. Pura alegria. Alexandre Sá é artista-pesquisador. Atual diretor do Instituto de Artes da UERJ. Pós-doutor em Filosofia pelo PPGF/UFRJ. Pós-doutor em Estudos Contemporâneos das Artes pela UFF e Doutor em Artes Visuais pela EBAUFRJ. E-mail: alexandresabarretto@gmail.com 109


Lançada em 2008, a Dasartes é a primeira revista de artes visuais do Brasil desde os anos 1990. Em 2015, passou a ser digital, disponível mensalmente para tablets e celulares no site dasartes.com.br, o portal de artes visuais mais visitado do Brasil. Para ficar por dentro do mundo da arte, siga a Dasartes.

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