RADICAL WOMEN GUERRILLA GIRLS ARTRIO LUSO-AFRO-BRASILEIRO RODRIGO SASSI ARTESANIA FOTOGRÁFICA
DIRETORA Liege Gonzalez Jung CONSELHO EDITORIAL Agnaldo Farias Artur Lescher Guilherme Bueno Marcelo Campos Vanda Klabin REDAÇÃO André Fabro
Capa: Sonia Gutiérrez, Y con unos lazos me izaron, 1977. Cortesia da artista. Artwork © the artist.
MÍDIAS SOCIAIS Pedro Antunes PUBLICIDADE publicidade@dasartes.com DESIGNER Arruda Arte & Cultura SUGESTÕES E CONTATO dasartes@dasartes.com Contracapa: Zanele Muholi, Bester I, Mayotte, 2015 © Zanele Muholi. Cortesia APOIE A DASARTES Stevenson, Cape Town/Johannesburg e Seja um amigo Dasartes e Yancey Richardson, New York. receba a revista impressa em casa em: https://benfeitoria.com/dasartesdigital
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ARTESANIA FOTOGRÁFICA
10 ARTRIO
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06 De Arte a Z 62 Livros
RADICAL WOMEN
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LUSO-AFROBRASILEIRO
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64 Resenha 66
Coluna do Meio
68 Notas de Mercado 70 Alto Falante
GUERRILLA GIRLS
RODRIGO SASSI
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DE ARTE A Z Notas do circuito de arte
LOUVRE ABU DHABI ABRE AS PORTAS COM LISTA ADMIRÁVEL DE OBRAS-PRIMAS
Com orçamento de 30 bilhões de dólares e depois de dez anos de construção, abre em novembro, na ilha de Saadiyat, o novo Louvre Abu Dhabi. Além do acervo de cerca de 600 obras de arte, foram emprestadas outras 300 obras dos principais museus da França, incluindo não só do Louvre, mas também do Musée d'Orsay, do Centre Georges Pompidou e de Versailles, etc. Os empréstimos representam um intercâmbio cultural sem precedentes entre as duas nações e constituem um volume de destaque da história da arte ocidental, com pinturas de Leonardo Da Vinci e Giovanni Bellini a Paul Gauguin, René Magritte (foto) e Piet Mondrian.
O caso das fotografias falsas de guerra
Museu móvel com arte em miniatura
Chá das cinco inspirado em artistas visuais
Investigação revela fraude
Criado minuciosamente
Em Londres
Durante anos, o surfista brasileiro Eduardo Martins foi elogiado por sua valente e compassiva fotografia sobre a guerra. Martins se apresentava como fotógrafo da ONU em campos de refúgio e foi noticiado em importantes meios de comunicação, incluindo a BBC, Al Jazeera e o Wall Street Journal. Porem, após intensa investigação, a BBC Brasil emitiu um extenso relatório revelando que o famoso “instagrammer” com mais de 120 mil seguidores, era um perfil falso e usava a identidade de um surfista britânico e imagens da internet. Após notificação, seu perfil foi deletado para novas investigações.
O artista americano Matt Neckers, passou mais de dois anos criando centenas de peças de arte em miniatura para as várias galerias do seu museu móvel. O museu estreou no City Hall Park, em Burlington, Vermont, nos EUA, e, desde então, viajou para diversos locais ao redor do Estado. O museu móvel de Neckers pode ser lido como uma caricatura, uma crítica da banalidade do museu moderno: como se a única maneira de tornar a arte contemporânea interessante ao público em geral é dimensioná-la de forma diferente.
O hotel Rosewood London tem uma reputação estabelecida como o principal expositor de artistas contemporâneos. No próximo mês, sua cozinha disponibilizará em seu cardápio um chá das cinco especial com guloseimas inspiradas em cinco artistas emblemáticos da atualizadade: Yayoi Kasuma, Alexander Calder, Mark Rothko, Damien Hirst e Banksy. Além das pequenas peças de arte no prato, será possível admirar as obras de arte 3D de Simon Bingle nas paredes. O chá da tarde com inspiração artística terá um valor de US$ 57 por pessoa.
6 DE ARTE A Z
NOVOS ESPAÇOS
RUMOS ITAÚ CULTURAL Inscrições até 3/11 O Itaú Cultural abriu, no último dia 28 de agosto, as inscrições para o edital Rumos 2017-2018. O programa Rumos, plataforma de fomento do instituto para a produção artística e cultural brasileira, segue aberto conforme as modificações implementadas no programa em 2013. Assim, podem ser inscritos projetos ou trabalhos sobre arte e cultura brasileiras em qualquer expressão artística ou intelectual, apresentados ou desenvolvidos em qualquer tipo de suporte, formato, linguagem artística ou mídia. Não há valor mínimo ou máximo para os projetos. Também está aberta a exposição que apresenta um recorte dos projetos selecionados na última edição (2015-2016), chamado “Narrativas do Invisível - Mostra Rumos 2015-2016”. A mostra apresenta 24 trabalhos, entre os 117 projetos selecionados pelo programa, formando um conjunto que se debruça sobre questões inquietantes do mundo contemporâneo. Até 5/11.
Galeria AWZ aposta na valorização da Arte Popular Inaugurada pelas cariocas Zilá Horta e Ana Carolina Horta, a Galeria AWZ lança um novo olhar sobre a Arte Popular Brasileira. A dupla, que se dedica a revelar ao grande público talentos de todas as regiões do país, faz sua estreia no circuito artístico carioca e participará pela primeira vez da IDA (Feira de Design do Rio), que acontece de 14 a 17 de setembro. RUA REDENTOR, 279, IPANEMA RIO DE JANEIRO
Para se previnir “O chefe de segurança e alguns curadores e pessoal de manutenção permanecerão no prédio – eles têm comida e água suficientes por cerca de quatro dias e manterão vigia na construção, instalações e obras de arte”.
Scott Benarde, diretor de comunicações do Norton Museum of Art, em West Palm Beach, que decidiu fechar preventivamente as suas portas à espera da temporada de furacões no Estado da Flórida, EUA.
Tangente
Novo espaço de reflexão Seguindo a tendência dos espaços multiúso, o “Espaço Tangente” será um lugar de palestras e workshop de desenvolvimento humano, galeria, loja conceito, música e vivências. Em um ambiente sensorial cheio de arte e design, com exposições permanentes e itinerantes, serão discutidos temas como neurociência, filosofia e literatura, além de vida saudável, meditação, inovação e empreendedorismo. RUA CALIFÓRNIA, 1257 BROOKLIN, SÃO PAULO
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GIRO NA CENA
10 Contemporâneo agita capital mineira Dez importantes galerias mineiras com o mesmo propósito: criar uma agenda em comum para dar visibilidade à arte contemporânea e fortalecê-la. Assim pode ser definido o 10 Contemporâneo, que lança seu 2º Circuito com dez exposições inéditas e simultâneas, em Belo Horizonte. Participam: AM Galeria, Beatriz Abi-Acl, Cícero Mafra, Celma Albuquerque, dotART, Lemos de Sá, Manoel Macedo, Murilo Castro, Orlando Lemos e Quadrum. Veja a programação completa das exposições em nosso site.
EM BREVE, NO AR, A PRIMEIRA ESCULTURA ESPACIAL DO MUNDO O artista visual alemão Trevor Paglen é uma das figuras mais incomuns da arte, uma espécie de aventureiro filósofo cujo trabalho é muitas vezes conceitual e altamente técnico, mas também pode ser maravilhosamente gonzo, como suas fotografias de cabos de internet de fibra óptica serpenteando pelo fundo do oceano. Atualmente, ele está trabalhando em seu projeto mais radical. Ele planeja enviar um satélite – um inflável multifacetado – em órbita baixa, onde será visível à noite pela Terra por oito semanas ou mais, literalmente cintilando como um diamante no céu antes de se desintegrar na atmosfera. Se tudo correr de acordo com os planos, será a primeira escultura espacial do mundo, sem precedentes na arte contemporânea.
Andrew Wyeth Retrospectiva Na cidade de Chadds Ford, Pensilvânia, nos EUA, o Museu do Rio Brandywine, apresenta uma grande exposição sobre Andrew Wyeth que tem todo potencial para inspirar ou desagradar. Dado que tanta manipulação foi gerada sobre Wyeth durante os últimos cinquenta anos que seu trabalho já é interessante. As críticas contra ele são mais ricas, variadas e contraditórias do que qualquer outro artista do século 20, com ele sendo lascivo e sexualmente reprimido, incrivelmente fantástico e chato, descritivo, embaraçosamente sentimental e opressivamente racista. Até 15/01/2018.
8 DE ARTE A Z
VISTO POR AÍ
Instalação "Jardim Lunar" do artista Daniel Arsham, na Galeria Cadillac House, em Nova York. Arsham combinou escultura, som e um ambiente imersivo que oferece aos visitantes uma reinterpretação de um tradicional jardim de rocha japonês.
ARTESANIA FOTOGRÁFICA PRENÚNCIO MODERNO, DESVIO CONTEMPORÂNEO
Ricardo Hantzschel, Joel Gavina (in memorian), 2012. (Papel salgado virado a ouro sobre Fabriano nยบ 5 texturizado).
Cris Bierrenbach, Only the lonely, 2017. (CianĂłtipo sobre papel manteiga).
Ailton Silva, SĂŠrie Plantas Rio de Janeiro, 2010/12 (Papel albuminado com viragem a ouro).
12 ALTO RELEVO
MOSTRA NO CENTRO CULTURAL BNDES, NO RIO DE JANEIRO, REÚNE SETE JOVENS FOTÓGRAFOS E 12 TÉCNICAS DISTINTAS QUE DEIXARAM DE SER PRATICADAS SISTEMATICAMENTE HÁ MAIS DE UM SÉCULO
POR MARCIA MELLO Ao entrar na era industrial no final do século 19, a fotografia deixa para trás um importante legado de processos fotográficos produzidos quase exclusivamente de forma artesanal. Inúmeras eram as etapas até se chegar a uma imagem impressa em papel, vidro ou placa metálica e cada uma delas obedecia a regras sistemáticas, fórmulas químicas precisas, uso de equipamentos pesados de processamento lento. Um verdadeiro ritual era praticado por artistas - recém-convertidos em fotógrafos -, exigindo paciência, domínio rigoroso de índices, além de talento e sensibilidade para um bom enquadramento e controle de luz. Para produzir daguerreótipos, ambrótipos, calótipos, papéis albuminados, cianotipias, fotogravuras, platinotipias, papel salgado, entre tantos outros fazeres fotográficos, alguns artistas vêm pesquisando em antigos manuais e buscando novos caminhos para suas poéticas. Uns radicalizam suas práticas, chegando a confeccionar as câmeras ou fazendo artesanalmente o papel de suporte da imagem. Outros optam por adaptar as etapas, servindo-se de equipamento digital na captura da imagem para depois migrar para químicos e gestuais próprios dos processos históricos. Há, ainda, os que buscam novas dimensões aos formatos diminutos históricos, finalizando seus trabalhos por meio das recentes impressões "fine art" em jato de tinta. A fotografia, já em sua invenção, resulta de pesquisas divergentes. A técnica híbrida, praticada por esses alquimistas da arte, alia o século 19 e o século 20, subverte um fazer histórico e cria um conjunto de questões que tocam a contemporaneidade. Com resultados de ritmos gráficos e dinâmicas estéticas dissemelhantes, evidenciam diferentes modos de se exprimir, negando o postulado segundo o qual a informação, na fotografia, prescinde do objeto, descortinando, assim, novos horizontes no cenário artístico atual.
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Acima: Francisco Moreira Costa, Vaso de Flores, Série Tempo Improvável, 2000/17 (Daguerreótipo) e Roger Sassaki, Anna Silveira, 2013. (Positivo de Vidro em Placa Úmida de Colódio - Ambrótipo).
…a fotografia artesanal ganha corpo e visibilidade por meio de rebeldes exemplares artísticos.
Na contramão de uma fotografia banalizada pela profusão de "selfies" e imagens cotidianas difundidas nas redes sociais e escondidas entre as "nuvens" fotos cujo fazer, invisível, é automaticamente garantido pelo dispositivo -, a fotografia artesanal ganha corpo e visibilidade por meio de rebeldes exemplares artísticos. Veja a descrição de algumas das principais técnicas fotográficas praticadas do século 19 e recuperadas por artistas contemporâneos: DAGUERREÓTIPO O primeiro processo fotográfico, desenvolvido pelo francês Louis Jacques 14 ARTESANIA FOTOGRÁFICA
Mandé Daguerre, foi publicado pela Academie des Sciences de Paris, em 19 de agosto de 1839. A imagem fotográfica obtida retrata a imagem invertida em relação ao assunto, sendo cada exemplar um original único. Trata-se de uma placa de cobre prateada e polida, reluzente como um espelho, revelando uma imagem ora positiva, ora negativa. CALÓTIPO O negativo de papel, inventado por W.H. Fox Talbot, em 1841, é também conhecido por calótipo. Consiste em um fino papel de desenho sensibilizado em sais de iodeto, brometo e prata que é exposto ainda úmido na câmera e
Acima: Regina Alvarez, Sem tĂtulo (Gelatina e Prata).
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Acima: Tiago Moraes, Aterro do Flamengo, 1997. (Cianotipia sobre papel de algodão).
rapidamente revelado, gerando uma imagem negativa. A imagem pode ser positivada em diversos processos, destacando-se o papel salgado ou albuminado. PAPEL ALBUMINADO A albumina é uma substância extraída da clara de ovo, que é batida e salgada para o uso fotográfico. Após a fermentação, é aplicada sobre vidro ou papel para fixar os sais de prata, formadores da imagem. O processo foi desenvolvido por Louis Blanquart-Evrard, na França, e divulgado em 1850. Foi largamente utilizada no século 19 para imagens positivas sobre papel, obtidas a partir de um negativo de vidro de colódio ou gelatina. PLACA ÚMIDA DE COLÓDIO A técnica da placa úmida de colódio foi criada em 1851 por F. S. Archer e envolve duas etapas iniciais: recobrimento de uma placa de vidro ou metal com colódio iodizado e sensibilização em banho de 16
prata. A exposição e a revelação devem ser feitas antes de a superfície úmida de químicos secar. Existem três variantes principais feitas com a técnica: ambrótipo (positivo em vidro), ferrótipo (positivo em metal) e negativo de vidro.
Artesania Fotográfica, a construção e a desconstrução da imagem • Espaço Cultural BNDES Rio de Janeiro • 1/8 a 22/9
Marcia Mello é bacharel em Letras pela UFRJ, pesquisadora, curadora e conservadora de fotografia.
ART R I O AS PAREDES tem ouvido Ibrahim Mahama, Check Point Sekondi Loco, 2016–17. Foto: Ibrahim Mahama.
POR REDAÇÃO Segundo a numerologia, o 7 é o número da perfeição, integra os dois mundos e é considerado símbolo da totalidade do Universo em transformação. Com esse propósito de transformação e renovação, a 7ª edição da ArtRio apresenta ao público novo formato e novo local. Depois de seis anos, a feira se mudou do Píer Mauá para levantar novas paredes na Marina da Glória. De acordo com a diretoria da feira, ela aposta na linha de grandes feiras internacionais - cujo objetivo é entregar maior qualidade e não quantidade -, e reduziu o número de expositores pela metade. Há também uma reposta à frequente queixa da ausência de colecionadores pelos galeristas. Segundo a diretora Brenda Valansi, este ano haverá um grupo de cerca de 50 deles vindos de várias regiões do Brasil e do exterior e acrescenta: "Esta edição vai trazer uma série de mudanças, buscando apresentar uma feira extremamente consistente e madura, em total adequação às demandas do mercado". Conheça as novidades deste ano e algumas das obras de arte que estarão expostas em suas novas paredes.
À esquerda: Amelia Toledo, As paredes têm ouvidos, 1975 na Galeria Marcelo Guarnieri.
Como em edições anteriores, as galerias são separadas em dois programas: "Panorama", que inclui as mais tradicionais e reconhecidas, e "Vista", dedicado a projetos de curadoria experimental por galerias jovens. Nesta edição, estas seções e as atividades paralelas ocupam uma única área, o que deve melhorar a circulação e integração. As duas grandes estreias são os novos programas "Mira" e "Palavra". As novas propostas apresentam uma interação com o público dentro e fora da feira. A primeira edição do "Mira", realizada em parceria com a Fundação Iberê Camargo, será um projeto totalmente dedicado à videoarte. Bernardo José de Souza, curador residente da Fundação, assina a seleção. Já o programa "Palavra" tem curadoria da poetisa e artista plástica Claudia Sehbe. A ideia é mostrar como a palavra - escrita e falada - é importante nos diferentes processos de criação da arte. A programação vai unir poetas e artistas que usam a palavra como peça em seu processo criativo. A agenda vai acontecer em um palco no estilo teatro de arena, projetado exclusivamente por Zanini de Zanine e instalado nos jardins da Marina da Glória. Outra ação importante é a realização do Prêmio FOCO Bradesco ArtRio em sua 5ª edição. Concentrado em artistas brasileiros jovens, o Prêmio estimula o desenvolvimento artístico de seus vencedores, premiando com residências. Este ano os vencedores foram Iris Helena (Zipper Galeria), Ismael Monticelli (galerias Portas Vilaseca e Aura) e Cleverson Luiz Salvaro (Galeria Ybakatu). 22 DESTAQUE
De cima para baixo: Acrílica de Luiz Zerbini na Fortes D'Aloia & Gabriel, pigmento sobre papel de Vânia Medeiros na RV Cultura e Arte e acrílica de Antonio Manuel na Cassia Bomeny Galeria.
Litografia colorida “Olho na Justiça” de Xico Chaves na Galeria Movimento e silkscreen “Anarchy” de Damien Hirst na Other Criteria.
Dora Longo Bahia, Olimpiadas (15/08/2016), 2017 na Galeria Vermelho.
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Entre as obras que prometem chamar atenção nos estandes cariocas estão as de Hilal Sami Hilal na Marcia Barrozo do Amaral e de Daniel Senise na Silvia Cintra; fotografias de Celso Brandão e Pedro David na Galeria da Gávea e de Rodrigo Braga na Anita Schwartz. O galerista Artur Fidalgo apresenta a obra "mapeamento cognitivo" de Walmor Corrêa e A Gentil Carioca, "silk" digital sobre tecido dos artistas Botner e Pedro. Marcelo Guarnieri leva a obra miniatura de Amélia Toledo, de 1975. Com o título "As paredes tem ouvido", uma orelha é moldada em gesso simulando uma parede branca com ouvidos. Martha Pagy Escritório de Arte traz obras da mineira Leonora Weissmann, uma das vencedoras do concurso Garimpo Dasartes 2017 e Galeria Mercedes Viegas, obras do artista americano abstrato, Robert Kelly. "Favela", um óleo sobre madeira de Candido Portinari, de 1957, será exposto pela Galeria de Arte Ipanema e, na Galeria Movimento, o destaque fica para "Olho na Justiça", de Xico Chaves, de 1992, em formato de litografia colorida.
Acima: Tela de Franz Ackermann na Fortes D'Aloia & Gabriel. Abaixo: Tela de Eloá Carvalho na C.Galeria.
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Óleo de Isabelle Borges na Roberto Alban Galeria.
De São Paulo, os destaques ficam por conta dos desenhos de Nazareno na Lume e das coloridas pinturas de Franz Ackermann e Luiz Zerbini na Fortes D'Aloia & Gabriel. Na Nara Roesler, chama atenção a instalação "Prismas e Espelhos", de Daniel Buren e na Zipper Galeria, fotografias de Flávia Junqueira. Já a Carbono Galeria investe em novas pinturas do artista Paulo Pasta. A galeria Frente aposta em nomes como Alfredo Volpi, Abraham Palatnik e Antônio Maluf e a Pinakotheke Cultural resgata obras dos anos 1970 de Volpi e Alexander Calder.
Técnica mista sobre madeira de Vania Mignone na Mercedes Viegas Arte Contemporânea.
26 DESTAQUE
De Belo Horizonte, Murilo Castro apresenta zinco e madeira pintada de Arthur Luiz Piza, obras produzidas em 2016, antes da morte do artista. Já a Galeria Celma Albuquerque levará obras de Beth Jobim, entre outras. De Curitiba, a galeria Simões de Assis apresenta as inigualáveis acrílicas sobre madeira de Palatnik, produzidas em 2016, e, de Salvador, a galeria Roberto Alban dá destaque para os óleos da artista baiana Isabelle Borges.
Em sentido horário: Fotografia de Pedro David na Lemos de Sá Galeria, escultura de Alexander Calder na Pinakotheke Cultural e acrílica de Antonio Maluf na Galeria Frente.
IDA Séries únicas e limitadas são selecionadas pelos 17 expositores na quarta edição da IDA (Feira de Design do Rio). O evento acontece paralelamente à ArtRio no mesmo período e local com objeto de reforçar a união e a relação de Arte e Design. Participam nomes como MEMO, Atelier Hugo França, Zanini de Zanine e Maneco Quinderé. Artwindowz e Joia Brasil valorizam a criação para o segmento de joias e a editora Olhares apresentará livros de design. Acima: Aparador Monolito de Paulo Moreira e Rodolpho Maiel. Abaixo: Peças de Marcos Costa na Galeria AWZ.
28 ARTRIO
Acima: Vasos da coleção Ghost dos designers Luiz F. Costa e Rodrigo Irffi no Estudio Iludi. Abaixo: Poltronas de Hugo França e de Luiz F. Costa and Rodrigo Irffi.
ArtRio Feira Internacional de Arte do Rio de Janeiro • 14/9 a 17/9 • Marina da Glória. 29
Radical Women NO ANO DO EMPODERAMENTO FEMININO, AS MULHERES SÃO TEMA DE VÁRIAS EXPOSIÇÕES AO REDOR DO MUNDO. SUA RELEVÂNCIA NA HISTÓRIA DA ARTE E SEU PAPEL POLÍTICO, MUITAS VEZES NÃO RECONHECIDOS EM SUA ÉPOCA, RECEBEM A ATENÇÃO MERECIDA. A DASARTES BUSCOU NESTAS EXPOSIÇÕES UMA PEQUENA AMOSTRA DE MULHERES QUE MARCARAM A ARTE DE SEUS PAÍSES EM DIVERSAS ÉPOCAS E CONTEXTOS E TRAZ UMA BREVE INTRODUÇÃO AO TRABALHO DE CADA UMA DELAS. COM ESTA MATÉRIA, O DESEJO DE QUE A HISTÓRIA NÃO PRECISE DE UMA DATA OU DE EMPODERAMENTO PARA ESTABELECER HARMONIA E IGUALDADE DE DIREITOS ENTRE OS GÊNEROS, CELEBRANDO COM RESPEITO AS DIFERENÇAS QUE TANTO ENRIQUECEM A ARTE E NOSSAS VIDAS.
30 CAPA
Sandra Eleta, Edita (la del plumero), Panamá, 1977, da série La servidumbre, 1978-1979. Cortesia da Galeria Arteconsult S.A., Panama. Artwork © the artist. A fotografia faz parte da exposição Radical Women: Latin American Art, 1960–1985 no Hammer Museum, em Los Angeles.
ZANELE MUHOLI POR RENÉE MUSSAI
Acima: Bona, Charlottesville, 2015 e Julile I, Parktown, Johannesburg, 2016. © Zanele Muholi. Cortesia de Stevenson, Cape Town/Johannesburg and Yancey Richardson, New York.
Estou reclamando a minha escuridão, que eu sinto que é continuamente percebida pelo 'outro' privilegiado. Minha realidade é que eu não simulo ser negra; é minha pele, e a experiência de ser negra está profundamente enraizada em mim. Assim como os nossos antepassados, vivemos como negros 365 dias por ano, e devemos falar sem medo.
Em sua primeira exposição individual em Londres, a ativista visual sul-africana Zanele Muholi apresenta sua série de autorretratos "Somnyama Ngonyama" confrontando as políticas de raça e representação no arquivo visual. Clicados principalmente na Europa, América do Norte e África entre 2014 e 2016, cada retrato em "Somnyama Ngonyama" levanta questões críticas sobre justiça social, direitos humanos e representações contestadas do corpo negro. Os retratos autorreflexivos e psicologicamente carregados de Muholi são despreocupados em sua arte enquanto explora diferentes arquétipos/personagens e oferece reflexões visuais inspiradas em experiências pessoais e eventos sociopolíticos. Os objetos ready-made e os materiais encontrados são transformados em adereços culturalmente carregados, fundindo o político com a estética e muitas vezes comentando eventos específicos na história recente da África do Sul, como as almofadas de limpeza e as luvas de látex que abordam temas de servidão doméstica, alocando simultaneamente a política sexual, a violência e os prismas sufocantes de identidade de gênero. Ao aumentar o contraste na pósprodução, a cor escura da pele de Muholi se torna o ponto focal de uma
interrogação multicamada em conceitos complexos de beleza, desejo e terrenos perigosos, racismos e fobias interconectadas navegadas diariamente. Muholi responde a essas narrativas constrangedoras da história, das ideologias e das realidades contemporâneas com um humor sinistro, muitas vezes tragicômico, iniciando, em suas próprias palavras, "uma jornada autocomponente desconcertante, repensando a cultura da autorrepresentação e a autoexpressão". Olhando desafiadoramente para a câmera, Muholi questiona continuamente as percepções dos espectadores ao afirmar firmemente [a sua] identidade cultural em seus próprios termos.
Renée Mussai é escritora e historiadora de arte que atua em Londres. Ela é curadora e chefe de arquivo no Autograph ABP - uma caridade das artes que trabalha internacionalmente em fotografia e cinema, abordando temas de identidade cultural, raça e direitos humanos.
Zanele Muholi: Somnyama Ngonyama • Autograph ABP • Londres • 14/7 a 28/10
Muitas das obras e textos de Schneemann se concentram no corpo feminino em seus contextos sociais e histรณricos e exploram o erotismo e o prazer sexual na perspectiva feminina.
Up to and Including Her_Limits, 1973-77 e Meat Joy, 1964. Cortesia Electronic Arts Intermix (EAI), New York.
CAROLEE SCHEENMANN
POR SUSANNE GAENSHEIMER
Carolee Schneemann (1939), que em maio de 2017 recebeu o Leão de Ouro "Lifetime Achievement" na Bienal de Veneza, foi uma das pioneiras em performance na história da arte. Juntamente com outros protagonistas do mundo da arte de Nova York nos anos 1960, Schneemann questionou os limites das disciplinas artísticas tradicionais, bem como o seu contexto cultural geral. No processo, ela chegou a formas intrigantemente novas e desafiadoras de uma arte visionária e multidisciplinar. Nas obras de Schneemann sobre os papéis de gênero, a sexualidade e o uso do corpo na arte exerceram uma tremenda influência sobre as gerações subsequentes de artistas e continuam relevantes hoje. Carolee Schneemann estudou pintura no Bard College, na Universidade Columbia e na Universidade de Illinois. No início, ela começou a colocar suas pinturas em movimento usando mecanismos simples e integrando fotografias e objetos comuns em suas "Construções de Pintura". Em 1961, Schneemann se mudou para Nova York e lançou-se na cena artística, contribuindo para projetos de vanguarda de cinema, dança e eventos. Artistas como Andy Warhol, Claes Oldenburg e Robert Morris fotografaram Carolee Schneemann e a convidaram para participar de suas apresentações. Questionando o papel tradicional atribuído às mulheres na arte como espectadoras lindas e silenciosas, em 1962, ela finalmente começou a experimentar a própria coreografia. Muitas das obras e textos de Schneemann se concentram no corpo feminino em seus contextos sociais e históricos e exploram o erotismo e o
prazer sexual na perspectiva feminina. "Fuses" (1965), seu filme sexualmente explícito, retratou a si mesma e seu parceiro, o compositor e teórico da música James Tenney, em meio ao amor que revelou uma intimidade mútua e subverteu os tropos da pornografia convencional. "Interior Scroll" (1975/1977), uma de suas obras mais renomadas, postula o corpo da artista como fonte do conhecimento "interior": polegada por polegada, tira um rolo de papel da vagina e lê um monólogo dele, desencadeando o sexismo e a depreciação com os quais as mulheres se confrontam nos mundos da arte e do filme experimental. Talvez o seu trabalho mais conhecido seja a peça pioneira de teatro cinético "Meat Joy" (1964), uma celebração opulenta e extática da sexualidade, da música pop e da carne. Voltando a lançar um olhar crítico sobre a pintura dos expressionistas abstratos, ela desenvolveu "Up to and Including Her Limits" (1973-1977), uma instalação performática que destaca seu corpo como um meio de marcação artística.
Susanne Gaensheimer estudou história da arte em Munique e Hamburgo. Desde 2009, ela é diretora do Museu MMK für Moderne Kunst Frankfurt am Main.
Carolee Schneemann: Kinetic Painting • Museu MMK für Moderne Kunst Frankfurt am Main • Frankfurt • 31/5 a 24/9
YOKO ONO
Eu sou sรณ o que sou. Eu nรฃo me coloco rรณtulos.
36 RADICAL WOMEN
POR ADOLFO MONTEJO NAVAS ENTREVISTA CEDIDA A DASARTES PELA ARTISTA EM 2009
Entre os diversos nomes procedentes da música, e com quem você manteve alguma relação ou parceria, há nomes como La Monte Young (Chamber Street Series), Toshi Ichiyanagi, Anthony Cox e, além de John Lennon, há um lugar destacado para John Cage. Você foi aluna e realizou turnê com ele pelo Japão. Como foi essa experiência primeira, tão radical artisticamente? Você me chama de aluna de Cage. Você pensa nessa palavra, aluna, automaticamente, porque eu sou uma mulher? Eu era só uma amiga, nunca estudei com ele, e algumas vezes ele viajava comigo. "A mensagem é o meio. Sem uma mensagem, o meio é apenas decorativo", segundo as suas palavras. Quando seus trabalhos são nomeados "uma forma de desejo", sua obra se pauta por essa vontade de comunicação de chegar aos outros? Não. Minha vontade está focada em alcançar a mim mesma. O uso das palavras também é parte do seu trabalho mais conceitual. As frases-poemas-instruções-ação (como no livro Grapefruit, 1964) são fórmulas de comunicação quase oral, instruções de uso para fazer parte da obra: ser a obra. Não há diferença entre objeto e comportamento nesta liberdade. Liberdade sempre como conquista íntima, contra nossas resistências internas e externas? Eu não tenho nenhuma resistência com a liberdade. A resistência é dada pela força de fora. As pessoas suspeitam daquele que é livre, mesmo quando é só um pouco mais livre que elas. Você continua sendo ativista, defendendo certas causas, contra a violência com animais, entre outras coisas. A paz para você nunca foi uma palavra vazia, gasta ou um sinônimo de passividade. A Paz é um verbo.
Yoko Ono esteve em cartaz, em 2016, com a mostra “Dream Come True” no Malba, Buenos Aires, em 2016. E em 2017, com a mostra “O ceú ainda é azul”, você sabe no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo.
POR ALINE LEAL "Marca Registrada" (1975, duração: 8') é um dos trabalhos emblemáticos da carreira da artista Letícia Parente, em que se conjugam as duas linhas de força de sua obra: a vídeo-arte e a performance. A câmera de Tom Job Azulay, artista que havia trazido o "portapack" (equipamento de filmagem em preto-e-branco da Sony) para o Brasil, focaliza os pés de Letícia Parente enquanto andam até o banco. Em seguida, vemos sua mão enfiando a linha na agulha, e então ela começa a costurar a sola dos pés, essa superfície de pele morta e viva, parte do corpo degradante, mas também aquela que nos coloca de pé. Com maestria e agilidade, vemos aparecer a primeira palavra: Made. Em seguida: In. E logo depois: Brazil. Ora, a carga simbólica desse gesto, realizado em plena ditadura militar, em que a questão nacional ganha contornos dramáticos, inclusive para a questão das artes plásticas, fica latente. Letícia Parente é pioneira da vídeo-arte no Brasil, junto a um grupo ao qual estava fortemente ligada, em que se incluíam Anna Bella Geiger, Sônia Andrade, Paulo Herkenhoff, Fernando Cochiaralle, Ivens Machado, Miriam Danowsky, entre outros. A apropriação desta nova tecnologia parece colocar em questão temas centrais da arte contemporânea, como a performance, o corpo, a experimentação, o acontecimento-imagem, a participação do espectador, a arte conceitual. Outros vídeos de destaque de Letícia são: "Preparação" (1974), em que a artista se prepara para sair em frente ao espelho e cobre os olhos e a boca com esparadrapos, desenhando outros olhos e outra boca no lugar dos originais. Em "Eu armário de mim" (1975), a artista apresenta diversas imagens de seu armário, contendo roupas, alimentos, cadeiras, e até mesmo os seus cinco filhos. Em "Tarefa" (1982), a artista se deita em uma tábua 38 CAPA
Vestidos simultâneos (três mulheres, formas, cores), 1925.
LETICIA PARENTE
de passar roupa, enquanto mãos negras usam o ferro de passar sobre ela. Observa-se, assim, uma forte presença do universo feminino aliado a temas políticos, em que o corpo é promovido a meio e superfície das experiências sensíveis transformadas em arte. Letícia Parente nasceu em 1930, em Salvador, e faleceu em 1991, no Rio de Janeiro. Sua primeira exposição
individual teve lugar no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1976, e, em 1981, ela participou da 16ª Bienal Internacional de São Paulo.
Aline Leal é doutora em Letras pela Puc-Rio. Interessada nas variadas formas de expressão artística.
ANA MENDIETA
Seu corpo atuava como instrumento da produção artística…
POR TEREZA ARRUDA
40 RADICAL WOMEN
Quem é Ana Mendieta? Onde está Ana Mendieta? Ana Mendieta nasceu em 1948, em Cuba, abandonou o país aos 12 anos - acompanhada da irmã Raquel, dois anos mais velha -, como parte da Operação Peter Panna, qual um padre da Igreja Católica em Miami organizou a saída de 14 mil crianças de Cuba, senda essas crianças filhos de opositores ao sistema de Fidel Castro. O que parecia ser uma tentativa de liberdade, tornou-se um pesadelo para ela ao ser colocada em uma escola reformatória em Iowa e, na sequência, passar por vários lares em tentativas de custódia. Somente em 1966 pôde rever sua mãe e irmão que buscaram também asilo nos Estados Unidos. O reenconto com o pai ocorreu somente em 1979, quando ele pôde se mudar para os Estados Unidos após anos de prisão por contrariedades ao governo cubano. Logo depois, ele faleceu. Essa biografia repleta de combates, incertezas, solidão e desapego a marcou fortemente, influenciando sua vida e sua produção artística. Sua morte precoce em 8 de setembro de 1985, ao cair do 34°andar do apartamento onde morava com o artista Carl Andre, em Manhattan, após uma séria discussão em que ambos estavam alcoolizados, deixou inúmeras incertezas, lacunas e perguntas em evidência: Quem é Ana Mendieta? Onde está Ana Mendieta? Essas frases se tornaram comum e frequentes em vários movimentos feministas e perseguem Carl Andre até os dias de hoje, pois ele foi inocentado, apesar de seus depoimentos contraditórios e testemunhas dizerem que Ana Mendieta não tinha tendência suicida. A artista iniciou seus estudos de artes plásticas em 1971, em Iowa. Nessa universidade, conheceu o artista e acadêmido Hans Breder, com quem teve um longo relacionamento e também a apresentou a obras de tendências interdisciplinares como do acionista vienense Hermann Nitsch, do dadaísta e percursor da arte contemporânea Marcel Duchamp, assim como de outros representantes da vanguarda, como Hans Haacke e Vito Acconci. Apesar do fato de que as primeiras referências artísticas que a nortearam provinham de ativistas masculinos, sua obra, ação e repercussão se predestinou desde o início de sua carreira ao ativismo feminista. A artista, desde os primórdios, posicionou-se como protagonista de sua obra em performances e atuações documentadas. Seu corpo atuava como instrumento da produção artística em obras surgidas por meio de performances intituladas "body earth", a busca de um nicho na terra para se resguardar e ser preservada como parte de um ciclo orgânico - retorno à terra, primórdio da humanidade. Sua obra passou a ser comparada à monumentalidade da "Land-Art", produzida por seus contemporâneos, como Richard Long e Robert Smithson, com a distinção da fragilidade, organicidade e impacto dos detalhes corporais aí remanescentes. A silhueta de seu corpo no solo abriu precedente para uma série de obras cujo elemento central é o vestígio deixado por seu corpo impregnado na natureza - solo, folhagem, pedra. A partir de 1974, Ana Mendieta desenvolveu uma série de obras chamada "Body Tracks", onde seus vestígios foram deixados através do sangue por ela espalhado com as mãos em espaços públicos. Terra e sangue nortearam sua produção artística e precoce retorno ao seu local de origem!
Tereza de Arruda é historiadora de arte e curadora independente, vive desde 1989 entre São Paulo e Berlim. É colaboradora da Bienal de Havana desde 1997. Co-curadora da Bienal Internacional de Curitiba em 2009, 2013, 2015 e 2017.
POR ALECSANDRA MATIAS DE OLIVEIRA
Considerada uma das pioneiras da arte conceitual no Chile, Cecilia Vicuña, poeta, artista visual e cineasta, nasce em 1948, em Santiago, numa família de artistas e escritores. Entre 1967 e 1972, integra, juntamente com Claudio Bertoni, Marcelo Charlín, Francisco Rivera e Coca Roccatagliata, o grupo de poetas Tribu No. Em meados dos anos de 1970, realiza uma série de instalações e ações artísticas que aborda os signos indígenas pré-colombianos, a natureza e a mitologia sulamericana. Estuda na Universidade do Chile até 1971 e no ano seguinte, faz pós-graduação na Slade School of Fine Arts of University College, em Londres. Em 1973, a BBC realiza um documentário sobre seu trabalho poético-visual. A artista instala-se em Bogotá, em 1975, onde dá continuidade ao seu interesse por assuntos, como o xamanismo, a mitologia e as tradições orais andinas. Nesse período, é professora de História da Arte na Fundação da Universidade de Bogotá Jorge Tadeo Lozano. Em 1980, se fixa em Nova York e hoje divide seu tempo entre o Chile e os EUA. De recursos múltiplos, explora a pintura a óleo, a escultura, os vídeos e as performances. Suas obras multidimensionais podem nascer como poemas, transformarem-se em um filme, uma música, uma escultura ou uma performance. Sua linguagem gestual por meio de leituras poéticas, instrumentos musicais e roupas nativas recriam danças ancestrais e canções nativas. Ela também emprega, em seus trabalhos, objetos precários, como sementes, folhas secas e diversos materiais coletados. De modo radical, suas obras são reconhecidas por tratarem de temas, como a linguagem, a memória, a precariedade e o exílio. Elas despertam para questões críticas, tais como: a destruição ecológica, os direitos humanos, a homogeneização cultural e o desequilíbrio de recursos econômicos. Cecilia tem ainda diversas obras poéticas, livros de artista e ministra conferências sobre arte. Além de sua atividade como poeta e artista visual, ela também é editora de poetas latino-americanos e hispânicos.
Alecsandra Matias de Oliveira é doutora em Artes Visuais - ECA USP/ Pós-doutorado no Instituto de Artes/UNESP e membro da ABCA (Associação Brasileira dos Críticos de Arte).
Leticia Parente, Ana Mendieta e Cecilia Vicuña fazem parte da mostra coletiva Radical Women: Latin American Art, 1960–1985 • Hammer Museum • Los Angeles-CA, EUA • 15/9 a 31/9 42 CAPA
CECILIA VICUĂ‘A
Cabeza amarrada (Bound head), 1970. Foto: Claudio Bertoni. Cortesia da artista e England & Co Gallery, London.
MÁRCIA X POR MÁRCIA X
Essa carta escrita pela artista aos 7 anos de idade faz parte do livro da sua recente exposição individual: Geologia Doméstica • Casa Triangulo • São Paulo • 12/8 a 16/9
46 DO MUNDO
Afro-Luso-Brasileiro
Aspecto de Katie Ishtar ¥o-landi. Foto: Prudence Cuming Associates.
EXPOSIÇÃO NO MUSEU AFRO BRASILEIRO RELEMBRA O BARROCO COMO UM DOS PRIMEIROS MOVIMENTOS ARTÍSTICOS NOS QUAIS O BRASIL SOUBE IMPRIMIR SUA IDENTIDADE TÃO PARTICULAR
POR EMANOEL ARAÚJO A alma tropical do Brasil proporcionou ao barroco português o aparecimento de um estilo vibrante, colorido, exibicionista, voluptuoso e sensual nas esculturas, talhas e pinturas parietais de centenas de igrejas construídas no período colonial dos séculos 17, 18 e começo do 19. As igrejas barrocas são ornadas de belas talhas e têm altares revestidos de ornatos de muito ouro, com santos e santas, anjos e querubins, púlpitos exuberantes, azulejos com cenas sagradas, tetos pintados e sacristias com arcazes e pinturas parietais de grandes mestres pintores. Nessa atmosfera surgem as composições dos nossos maestros e compositores mestiços, como é o caso do Padre Maurício Nunes Garcia, regendo Acima: Credência D. João V, Século 18. À esquerda: Manuela Pimentel, A terra que nos foge debaixo dos pés, 2017. (Detalhe)
Acima: Anjo Tocheiro, Século 18 e Manuel Inácio da Costa, Cristo na Coluna, Século 18.
partituras dos sons sagrados vibrantes e gloriosos nas suas missas e novenas. É tempo da chegada do século 18 e da saída dos austeros séculos 16 e 17, em que o início da colonização portuguesa se beneficiou da riqueza do pau-brasil e dos engenhos de açúcar. Perseguiam-se agora os caminhos do ouro e do diamante. As ordens religiosas erguiam seus templos com o mister do batismo e da evangelização. Primeiro os jesuítas, depois os irmãos São Bento, os franciscanos e as ordens terceiras, envolvendo a todos: índios, negros e sobretudo os portugueses, com seus mestres na construção dessa magia que subverteu toda a América atlântica do sul. Mas, no Brasil, nem 48 FLASHBACK
tudo corria em paz no final do século 18, como demonstram as conjurações reprimidas na Bahia e em Minas Gerais. A sedição baiana de 1798 se voltou contra a monarquia portuguesa e a sociedade escravagista. O extraordinário movimento artístico do barroco se alastrou pelos países de colonização portuguesa e espanhola de cultura cristã, sendo importantíssimo para a hegemonia católica no novo mundo. De certa maneira, ele se vale do Concílio de Trento (1545-1563), que instaurou novos dogmas e decretos disciplinares. Porém, em vez de uma ruptura, o barroco assinalou uma evolução. Buscava renovar a vida
cristã e a espiritualidade, como a Reforma preconizara, mas, desta vez, no âmago, através de uma igreja romana depurada nas transformações das igrejas e dos cultos pomposos. A adoração aos santos nos altares majestosos criava, portanto, a divinal presença de Deus nas alturas. Depois dos mestres portugueses, os artistas africanos, afro-brasileiros e mestiços, filhos de portugueses com negras africanas, serão os responsáveis por construir o barroco brasileiro. São eles pintores, escultores, entalhadores, douradores, ourives e prateiros, arquitetos e construtores. As corporações de ofícios serão responsáveis por todo esse batalhão de homens no trabalho da edificação e construção dos templos do Brasil.
O barroco assinalou uma evolução. Buscava renovar a vida cristã e a espiritualidade, como a Reforma preconizara…
Abaixo: Obras de terracoto e madeiras policromadas do Século 18.
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Há uma grande presença negra e mulata nesse magnífico espetáculo de ornamentação, com a profusão de querubins, além de elementos da fauna e flora, e os dourados de máscaras profanas de sereias e de faunos.
A exposição "Barroco Ardente e Sincrético - Luso-Afro-Brasileiro" mobiliza artistas definidores desse movimento artístico em nosso país, a exemplo de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730-1814), Mestre Valentim da Fonseca e Silva (1745-1813), Manuel da Cunha (1737-1809), Francisco Xavier de Brito (?-1751), José Joaquim da Rocha (1737-1807), Joaquim José da Natividade (?-1841), Leandro Joaquim (1738-1798), José Patrício da Silva Manso (1753-1801), Frei Jesuíno de Monte Carmelo (1764-1819), José Teófilo de Jesus (1758-1847) e Antônio Joaquim Franco Velasco (1780-1883), Francisco Xavier das Conchas e Francisco das Chagas, o "Cabra". Os africanos e seus descendentes se apropriaram do movimento barroco, 50 LUSO-AFRO-BRASILEIRO
Acima: Cristo Morto, Século 18. À esquerda: Xavier das Conchas (Francisco Xavier dos Santos), Nossa Senhora da Conceição.
sobretudo porque as corporações de ofícios mecânicos contribuíam para a ascensão social. Há uma grande presença negra e mulata nesse magnífico espetáculo de ornamentação, com a profusão de querubins, além de elementos da fauna e flora, e os dourados de máscaras profanas de sereias e de faunos. Ardente em sua tropicalidade e sincrético no lado profano das festas religiosas - no bumba-meu-boi do Maranhão, na cavalhada de Goiás, na coroação dos reis do Congo, nos reisados de Alagoas e nos cortejos dos maracatus de Pernambuco - o barroco é um movimento contínuo na cultura brasileira.
Barroco Ardente e Sincrético – Luso-Afro-Brasileiro • Museu Afro Brasil • São Paulo • 3/8 a 3/12
Emanoel Araujo é diretor-curador do Museu Afro Brasil e artista plástico. Foi diretor da Pinacoteca do Estado de São Paulo (1992-2002) e fundador do Museu Afro Brasil, em 2004.
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GUERRILLA GIRLS POR ELAS MESMAS
52 REFLEXO
“Há tanto descontentamento no mundo neste momento. Por isso, decidimos dar a todos que vão ao FRESTAS o direito de se queixar de tudo o que quiserem. Essa instalação interativa irá gravar, documentar e arquivar …decidimos dar a todos o suas queixas como uma direito de se queixar… cápsula do tempo sobre o que os brasileiros estão preocupados em 2017.”
Departamento de Reclamações, FRESTAS (2017).
“Este é o nosso cartaz favorito de todos os tempos sobre como as mulheres são mais propensas a ser o objeto do que o assunto da arte. Essas estatísticas são de uma contagem que fizemos no Metropolitan Museum of Art, em Nova York em 2011. Atenção para a nossa versão mais recente, em setembro, que incluirá estatísticas sobre a coleção do Museu de Arte de São Paulo (MASP) e fará parte da nossa retrospectiva que acontecerá lá. ” 54 REFLEXO GUERRILA GIRLS
A mulher tem que estar nua para entrar no Metropolitan Museum? Atualização (2012). (Menos de 4% dos artistas nas seções de Arte Moderna são mulheres, mas 76% dos nus são do sexo feminino).
…mulheres são mais propensas a ser o objeto do que o assunto da arte.
Solar System: How far from Ridley Road is Earth, 2015-17
Projeto Riqueza e Poder, cartaz e adesivo, 2016. (Não permita que os museus reduzam a arte ao pequeno número de artistas que ganharam uma disputa de popularidade entre os grandes marchands, curadores e colecionadores. Se os museus não mostram a arte tão DIVERSA quanto as culturas que eles afirmam representar, DIGA A ELES que não não estão mostrando a história da arte, estão apenas preservando a história da riqueza e do poder.)
56 REFLEXO
“Nós achamos que isso já diz tudo.”
…isso já diz tudo.
A desigualdade de renda é uma praga mundial e o mercado de arte atua nela.
Frestas Trienal de Artes • SESC Sorocaba • 12/8 a 3/12 Guerrilla Girls: Gráfica, 1985-2017 • MASP • São Paulo • 29/9 a 14/2/2018 Bienal de Curitiba • Curitiba • 30/9 a 25/2/2018
58 GUERRILHA GIRLS
“A desigualdade de renda é uma praga mundial e o mercado de arte atua nela. Muitos colecionadores de arte ricos investem enormes quantidades de dinheiro na arte, enquanto não pagam seus empregados.”
Querido colecionador de arte. Billboard e adesivo, 2015. (A arte é tããão cara! Mesmo para bilionários! Compreendemos totalmente por que vocês não podem pagar a todos os seus empregados um salário digno).
RODRIGO SASSI POR ELISA MAIA A obra do paulista Rodrigo Sassi traz evidentes as marcas de sua experiência com a cidade: "são reflexos de uma vida influenciada visualmente por referências provenientes da cidade de São Paulo". O início de sua trajetória foi marcado pela prática de intervenções urbanas, muitas vezes em um âmbito coletivo, mas, com o tempo, a cidade foi deixando de ser usada como suporte para servir de inspiração e fonte da matéria-prima que leva para o ateliê. Para compor suas esculturas e instalações, Rodrigo se apropria de materiais coletados em ambientes de 60 GARIMPO
construções civis madeiras, mangueiras, cimento, metais, vidros de lâmpadas de postes de rua e compensados descartados em caçambas de demolição. O olhar que precede a criação das obras é caracterizado por um impulso de garimpar o grande e perpétuo canteiro de obras que é São Paulo, "existe uma oferta muito grande de materiais, basta olhar o que a cidade te oferece". A escala dos trabalhos é ditada pelas dimensões da construção civil, das vigas e colunas com as quais Rodrigo cria suas bem acabadas formas sinuosas. Esse material traz uma memória impressa em sua estrutura, sinais de uso e desgaste,
À esquerda: In between the way I see it and how it could have been. Acima: Você consegue sentir o peso dos seus ossos.
vestígios de outros tempos, como marcas e pregos que são conservados e integrados aos novos objetos em que se transformam. Privados de seu caráter utilitário de "material de construção", esses elementos passam a se impor não mais por sua função original, mas por suas características imanentes - sua forma, peso, cor, volume. Contudo, é justamente essa imanência da matéria-prima que Rodrigo se propõe a subverter por meio de uma prática que desafia as especificidades e limitações dos materiais sobre os quais se debruça. Em seu ateliê, a rigidez das estruturas de concreto armado dá lugar a contornos que sugerem dinamismo e flexibilidade. A matéria inerte e
enrijecida, manipulada com rigor e destreza, ganha movimento e se torna maleável, traça caminhos inusitados, desenhando linhas e curvas no espaço habitado pela ambivalência entre a brutalidade e a leveza.
Mesmo com dias maiores que o normal • Centro Cultural São Paulo • 16/9 a 26/11
Elisa Maia é doutoranda do programa de Comunicação e Cultura da ECO-URJ..
LIVROS lançamentos
Fábio Magalhães Além do visível, aquém do intangível Organização: Mundo Arte e Eventos - 120 p. - Distrib. gratuita. O livro reúne a produção do artista Fábio Magalhães ao longo de 10 anos (2007-2017), criando um panorama com todas as séries, na integra, produzidas neste período (“O grande Corpo” - “Retratos Íntimos” - “Fronteiras do Devoluto” - “Superfícies do Intangível” - “Latências Atrozes” e “Limites do Intospecto”), com mais de 80 imagens entre obras e aos processos criação que antecedem as pinturas no atelier, o livro conta ainda com reflexões dos curadores Alejandra Muñoz, Marcelo Campos e o Crítico Jorge Coli. O livro foi lançado paralelo a abertura da mostra na Caixa Cultural São Paulo, "Além do visível, aquém do intangível", em cartaz até 24/9.
Marrocos Fotografias do coletivo Gringo Editora Gringo Coletivo - 132 p. - R$ 100,00 O livro "Marrocos", é resultado de uma imersão fotográfica dentro de uma das maiores e mais emblemáticas ocupações sem-teto de São Paulo. Um registro documental das consequências das crises urbana, habitacional e migratória pela qual passa a maior cidade da América Latina. Durante o ano de 2016, o coletivo Gringo foi testemunha da disputa entre a porprietária do móvel, os moradores e a polícia em meio ao processo judicial na luta por esse gigante decadente. Em paralelo a esse conflito o coletivo acompanhou os últimos meses de vida da ocupação até a reintegração de posse e a expulsão total de seus moradores. 62
RB40 - Ronaldo Barbosa 40 Anos de Arte e Design Produção: Adélia Borges e Élida Gagete Projeto realizado por meio da Lei Rouanet - 360 p. - R$ 100, 00 O livro contempla fotos, desenhos, projetos e depoimentos de várias personalidades nacionais, como os artistas plásticos Shirley Paes Leme e Hilal Sami Hilal; as empresárias Maria Alice e Letícia Lindenberg, da Rede Gazeta; Fábio Brasileiro, diretor da Vale; os designers Verônica Teicher e Flávio Lins de Barros, entre outros. Pioneiro do design no Estado do Espírito Santo e uma das principais referências na arte contemporânea, o artista, designer e gestor cultural, celebra as quatro décadas do seu percurso profissional com um pacote de homenagens preparado em parceria com um time formado por grandes nomes do cenário cultural do Brasil.
Chiharu Shiota - Under the Skin Textos de Tereza de Arruda, Pascal Hess e Olaf Reis Editora Kunsthalle Rostock - 240 p. - EUR 48,00 Chiharu Shiota é um das artistas mais procuradas do mundo, depois da apresentação de sua instalação no Pavilhão do Japão na Bienal de Veneza, em 2015. Objetos diários, lembranças e “objets trouvés” caracteriza a linguagem pictórica do artista e defende o assunto em sua obra lembrança, pátria, migração, morte e vida. As figuras-chave em suas expansivas instalações são fios de lã, velhas malas e sapatos, chaves, peças de vestuário, móveis e letras, que ela encaixa entusiasmadamente em suas obras e performances. Nessa publicação, fotografias, alambiques de filmes, desenhos, impressões e objetos do arquivo do artista documentam de forma abrangente as estações na obra de Shiota e ilustram suas instalações temporárias, principalmente em locais específicos. 63
RESENHAS exposições
Miguel Gontijo: Babel Palácio das Artes • Belo Horizonte • 19/5 à 20/8 POR MICHELE BETE PETRY Visceral - a exposição é corpo e as obras são alimento. A curadoria de Augusto Nunes-Filho convida o público a percorrer entranhas, deglutindo a produção artística de Miguel Gontijo. "Da Guela à Merda" (2016), painéis sobre a instalação "Uma Dúzia que é Igual a Treze; ou A Santa Ceia; ou Symposium; ou Os Doze Trabalhos de Hércules" (2017) nos levam do banquete ao lixo. No último espaço do labirinto construído na Grande Galeria Alberto da Veiga Guignard, sentimos o refluxo, chegamos a uma rua sem saída e somos obrigados a retornar constipados, retendo o desafio da linguagem que a arte de Gontijo impõe. Ela é Babel: torre, desejo de comunicação interrompido; "Intertexto" (2017), "Linguagem Universal" (2017), "Ossos do Ofício" 64
(2016), "Contos da Carochinha" (2005), "Reconstituição dos Símbolos" (1990). Séries novas se misturam com outras antigas, acrescentando mais camadas aos resíduos do tempo e do artista. Diante de suas obras, "idiotas" - "Idiota Paradoxal", "Idiota Indizível", "Idiota Esfomeado", "Idiota Mass Media", "Idiota com Retórica" -, atribuímos sentidos para o que ele próprio adverte: "Não somos traduzíveis, somos interpretáveis". Gontijo é texto e imagem, ar prendido, soco no estômago, "pico na veia", pulsão de vida: silêncio.
Michele Bete Petry é historiadora, doutora em Educação pela UFSC e realiza pesquisas na área de artes visuais.
COLUNA DO MEIO Fotos: Denise Andrade
Quem e onde no meio da arte
Alessandra, Marcelo e Andrea Rehder
Andrea e Alessandra Rehder
Eduardo Oliveira, Cesar Fraga eEnock Gina Sacramento Elimelek
Alessandra Rehder Centro Cultural Correios São Paulo Alessandra Rehder
Marcelo, Alessandra Rehder e Gilberto Kassab e Andrea Rehder
Fotos: Paulo Jabur
Vista da exposição
Ascânio MMM, Milton Machado e Vandinha Klabin
Carlos Zílio, Milton Machado, Ângelo Venosa e Everardo Miranda
Antonio Manuel Cassia Bomeny Galeria Rio de Janeiro Cássia Bomeny e Carlos Vergara
Neville D'Almeida e Antonio Manuel
Ana Holck e Suzana Queiroga
Thereza Miranda, Antonio Manuel e Wanda Pimentel
Fotos: Paulo Jabur
Viviane Teixeira e Ricardo Kimaid
Xico Chaves e Laís Santana
Viviane Teixeira Galeria Movimento Rio de Janeiro Eduardo Oliveira, Cesar Fraga Queiroga e Ivair Reinaldim eSuzana Gina Elimelek
Luciana Lyrio e Eloá Carvalho
Maria Mattos e Raul Leal
Sophia Forbes e Ursula Tautz
Fotos: Paulo Jabur
Atherino, Flávia Tamoyo, Rona e Gilberto Buffara Jr
Patrícia Peltier de Queiroz, Cesário Buffara e - Andréa Buffara
Atherino e Rona Galeria Teste Rio de Janeiro Tereza Xavier e Amelinha Azeredo
Atherino e Belita Tamoyo
Gustavo Carvalho, Mika Chermont de Britto e Cláudio Gomes
Daniela Chaves, Atherino e Bia Niz
NOTAS DO MERCADO Fatos, valores, curiosidades e tendências
ARTRIO, como sempre, movimenta as expectativas do mercado para o mês de setembro. A feira vem sofrendo críticas nos últimos anos por parte dos expositores, que querem maior presença de colecionadores, e muitos abandonaram o barco, reduzindo o número de galerias de 120, na 2ª edição, para pouco mais de 50. Em meio a esse cenário desfavorável, foi obrigada a deixar o Píer Mauá, bem quando ele terminou sua transição de gueto embaixo da ponte para cartão postal da cidade. Mas isso pode se transformar em uma bênção disfarçada: a ArtRio agora ocupa a Marina da Glória, que dispõe de amplo estacionamento, visual privilegiado, localização conveniente e restaurantes de primeira linha. A maior parte das grandes galerias manteve seu apoio à feira e promete uma bela e variada exposição e, nos bastidores do mercado, fala-se em edição da virada. A diretoria parece ter ouvido as críticas: "Este ano, a organização convidou um grupo de 50 colecionadores e curadores, brasileiros e estrangeiros, para o evento", declarou a presidente Brenda Valansi por meio de sua assessoria. Resta torcer! A Dasartes participa da ArtRio com um estande e trará um balanço dela em nossa próxima edição.
A FEIRA DA SEMANA DE ARTE de São Paulo passou na prova da estreia. Ainda que tenha atraído um público pequeno, garantiu a presença das "figurinhas carimbadas" do circuito - incluindo o simpático "paredão da Phillips", Cândida Sodré e Clara Choveaux, que vieram do Rio especialmente para o evento. O clima foi positivo, as vendas nem tanto: muitos expositores não fizeram nenhuma, mas ainda assim se mostraram satisfeitos com as negociações iniciadas e pretendem participar na próxima. Ponto negativo para uma falha diplomática: os galeristas que não participaram sequer receberam convite para visitar o evento, somado a uma entrevista dada por Luisa Strina, que fala em elitização do que já é um mercado extremamente elitista e do ingresso a R$ 80 para um evento financiado por verba pública, caiu mal. Caiu mal também a data escolhida, uma semana antes da SP-Arte Foto, atrapalhando a vida das galerias que participam das duas e criando rinha desnecessária com os poderosos irmãos Feitosa. Mas não é nada que não possa ser reparado na próxima edição com "jeitinho", tempo e consciência social. Ficamos torcendo!
SP-ARTE FOTO fechou sua 11ª edição no shopping JK Iguatemi com sucesso. Além dos colecionadores de sempre, passaram por lá os curadores de fotografia do Guggenheim e Tate, fazendo a alegria das galerias. Os Talks, patrocinados pela Fundação Marcos Amaro, focaram no colecionismo e lotaram o auditório. Ivan Grilo foi um dos artistas em destaque, com individual no estande da Triângulo e obras negociadas para o Guggenheim na Luciana Caravello. 68
ALGUNS FALSIFICADORES são nomes conhecidos no mercado de arte e mantêm por décadas casas de leilão e galerias vendendo obras "ruins" de forma constante. O nome de um deles inspirou até um verbo, pelo qual agentes do mercado se referem ao processo de pintar a óleo uma obra sobre papel e colar sobre uma tela, transformando um papel em um óleo sobre tela e multiplicando assim muitas vezes seu valor, tudo isso sem perder a assinatura legítima do artista. Quando um comprador descobre o golpe, recebe seu dinheiro de volta e um pedido de desculpas e tudo fica por isso mesmo. Quando um artista identifica uma obra falsa oferecida sendo de sua autoria e entra em contato, a obra desaparece e o artista recebe um afável agradecimento. Na maioria dos casos, nem uma coisa nem outra acontece e, assim, criminosos ganham a vida às custas dos desinformados, que não conhecem suas reputações e convivem com falsificações por anos sem ter ideia de que foram vítimas. Mas rumores de Brasília levam a crer que isso está prestes a mudar: dizem que o Ministério Público prepara uma ofensiva investigativa para identificar e penalizar falsificadores e intermediadores de obras de arte falsas. Certamente, não será necessário premiar delações nesta investigação: muitos "marchands" corretos desejam livrar o mercado dessas figuras e aguardam apenas uma oportunidade para apontar dedos.
FORA DO BRASIL, o mercado de arte segue seu curso e já aquece os motores para os leilões de novembro. A Phillips, no entanto, resolveu fazer diferente: investiu em vendas curadas e reuniu destaques em arte contemporânea no leilão New Now, em 19 de setembro, em Nova York, com uma seção dedicada à coleção do designer e colecionador japonês Masamichi Katayama. Entre as obras oferecidas, um delicado "picture of wire" de Vik Muniz (imagem à esquerda), estimado em US$ 5-7 mil, e um fotografia de Candida Höfer, estimada em US$ 8-12 mil, menos do que o valor pedido por muitas fotos de artistas emergentes na SP-Foto. A obra mais comentada é um desenho de Andy Warhol (imagem à direita), não por sua qualidade, mas por seu tema tão em voga: a Trump Tower. Nos anos 1980, Trump teria comissionado obras para o "lobby" do prédio a Warhol, que criou vários desenhos e "silkscreens" a partir de fotografias dele. Trump acabou não comprando nenhum porque não combinavam com a decoração, ganhando o eterno desprezo de Warhol e seus seguidores.
ALTO FALANTE
Por Alexandre Sá e Vitor Ramalho
Arte contemporânea também cansa?
"Todo mundo é artista" Joseph Beuys No texto "O universalismo fraco", Boris Groys defende que haveria um modo dominante de produção em arte contemporânea, definido por ele como uma vanguarda tardia academizante. Muitas questões podem surgir por meio dessa afirmação. A primeira e mais óbvia é que seria impossível pensar uma forma norteadora da produção, já que todos sabemos que a arte contemporânea é diversa, plural, instável e atmosférica. Por outro lado, essa afirmação, se observada com toda a distância que lhe é imprescindível, talvez provoque um ligeiro tremor no subsolo; e em virtude de toda a herança filosófica que a modernidade erigiu, lance-nos, então, novamente em uma área de dúvida e indeterminação. Será que, de fato, não haveria um eixo que atravessa de maneira generosa e nada clara as produções recentes? Mesmo que não seja especificamente um elo atávico, a ideia de uma vanguarda tardia pode ainda ser útil se considerarmos que um inquestionável desejo dos artistas era o de demolir o passado histórico (tendo-o inevitavelmente como referência) e construir novas rotas que abrissem janelas e provocassem algum vento. Então, não seria tão obsoleto afirmar que, apesar de tudo e de todos, ainda há, na produção contemporânea, um desejo, talvez bastante angustiado, de produção de efeito, encarnando inconscientemente, alguma revolução. Por outro lado, e aqui correndo o risco de fazermos afirmações extremamente dúbias, o desejo de reestruturar linhas de ação, reinventar rotas, promover alguma reconciliação entre arte e artista (mesmo que o público precise ser exilado do processo de compreensão) e reencontrar formas de conjugação entre arte e política precisaram, para que fossem estabelecidas enquanto tal, um eixo primeiro, talvez extremamente tradicional, ao qual negaram veemente, construindo novas cartas de navegação e redescobrindo pequenas ilhas semânticas que não estavam descritas nos mapas conceituais, pictóricos, históricos e sociais anteriores. A história da arte foi se construindo através de tais movimentos de cheganças e partidas, de encontros e abandonos; com todo o drama que lhe é peculiar, além de suas respectivas paixões. Apesar disso, desse movimento inquestionável entre a permanência e o rompimento, havia um exercício de duração que, mesmo efêmero, sintomático e fantasioso, se revelava fundamental para a sua eleição, ativação e fé enquanto proposta; apesar de todo processo excludente e parcial que fundamenta grande parte das narrativas históricas. 70
O século 20 trouxe um devir inevitável: a contração do tempo. A isso podemos aliar a consciência retumbante da presença de uma ausência (da duração, da satisfação, da efetividade da ação) que foi discutida fortemente pela psicanálise e fundamentada na realidade das tragédias, catástrofes e guerras que atravessamos. A decorrência direta desse conjunto foi um desejo quase fantasmático e incessante de busca pelo novo, em um ritmo extremamente fugaz que se justificava pela sensação agoniante de desconforto que era amenizada pelos processos tecnológicos, pela indústria cultural e pelos infinitos adventos da ciência que, logicamente, também se revelavam obsoletos em uma velocidade enorme. Por certo, é impossível não pensar em tais prolongamentos para a subjetividade, para o universo das relações íntimas e no deslizamento do privado para o público. Em certo sentido, nosso tempo de processo, análise, investigação, prazer e desconstrução daquilo que não nos interessava mais enquanto sujeito-objeto/objeto-sujeito terminou também sendo suprimido; e, de acordo com o centro do movimento de degenerescência (que atende a uma demanda outra), não nos restou um pouso específico para a sublimação da angústia. Eis a preparação para o dedo em riste que não aponta para lugar algum e se esquece de si. Ao artista, principalmente no final do século passado, coube a sensação concreta de um universo solitário e da ainda urgente necessidade de busca de soluções para alguns dramas que, por sua vez, passaram a ser mais individuais e gradativamente distantes de um processo político coletivo. Sua relação com o sistema, a partir dos anos 1980, começa a ser estreitada de maneira contundente e a supressão temporal termina por esbarrar em outro campo semântico de tensionamento e de luta íntimas: o da liberdade. Já no século 21, tais heranças são potencializadas e a figura do artista termina sendo mais um elemento de operacionalização de um sistema e cabe a essa figura, dependendo do caso, orquestrar formas de desconstruir tais lógicas ou mesmo de fraturar tais processos de equiparação entre sistema econômico e processo criativo/crítico, por meio de um conjunto diverso de experimentações. Aqui merece atenção a possibilidade de percepção de tal poética de funcionamento que, em vez de ser compreendida como um processo dominante, pode ser observada como um elemento estrutural que, por sua lógica utópica e por sua vontade de desconstrução, termina sendo veiculado nas escolas de arte como uma possibilidade inconteste de produção e frutificação de uma "pseudo-originalidade" que talvez nunca nos chegará (mais); comprimida por um conjunto diverso de conceitos complexos e falas imbricadas na encruzilhada entre o dito e o não dito. Se tais processos ainda são extremamente presentes nas universidades, por mais antiquado que já soe, o movimento também parece pertinente para os espaços culturais e museus. E talvez não haja mal algum nisso.
…e a figura do artista termina sendo mais um elemento de operacionalização de um sistema… 71
Existe alguma possibilidade de suspensão de um iminente declínio e desaparecimento? A questão é que tais situações descritas anteriormente também podem ser deslocadas e alocadas para o sujeito submetido do século 21. Humano comum. Artista por ter sobrevivido e por tentar conseguir sobreviver. Como em uma relação amalgamada de desconhecimento mútuo entre artista-humano; arte-vida; humanosubumano. Então tal poética-política de produção em série de uma neoneovanguarda ansiosa, um pouco "hype" e não menos conjunta, insuflada por pequenas competições e seleções sem fim, termina por minar vagarosamente aquilo que, talvez, outrora, chamávamos presença, por meio de uma lógica fugidia de operacionalização, esvaziamento, tempo messiânico enquanto clausura, imagens fracas, consumo e autopromoções. E antes que pareçamos sempre os mesmos, talvez reste ainda as perguntas: existe algum refluxo possível? Existe alguma possibilidade de suspensão de um iminente declínio e desaparecimento? Talvez seja bom lembrarmos que uma das outras heranças produzidas pelas vanguardas do século 20 é a produção de um determinado tipo de arte que era, em sua maioria, produzida para artistas. Será que hoje ainda não nos sentimos confortáveis em uma relação que pretende atender a uma demanda específica feita por nós mesmos? Quem nos vê? Quem nos lê? Quem nos lê até agora? Seria muito difícil provocar uma dobra no tempo contraído e encontrar ali, em uma pequena reentrância perdida, um furo, um abismo e alguma duração? Seria impossível voltarmos nossos interesses e nossas pesquisas para um público, talvez ainda perdido, mesmo que ainda em nós? Revendo um pouco da história da arte no Brasil e de um conjunto corajoso de artistas, lutadores, militantes e políticos, não nos sobraria alguma inspiração crua para uma transformação conjunta e nada romântica que já tenha sido capaz de perceber a impossibilidade de qualquer revolução em tempos de cólera e oco? Haveriam pequenas ações, micropolíticas, que ainda sejam capazes de devolver ao privado o que lhe cabe, e ao público o que, de fato, ele merece? Hárte? Alexandre Sá é pós-doutor em Estudos Contemporâneos das Artes pela UFF; Doutor e mestre em Artes Visuais pela UFRJ; Diretor do Instituto de Artes da UERJ; Coordenador do curso de Artes Visuais da Unigranrio; Professor do Programa de Pósgraduação em Artes da UERJ; Editor-chefe da revista
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Vitor Ramalho é licenciado em Artes Visuais e Habilitado em História da Arte pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É produtor e professor de Artes Visuais. Trabalhou durante 20 anos como Coordenador Técnico do Sesc Rio de Janeiro, concebendo e realizando exposições de diversos artistas relevantes para a cena brasileira.
Lançada em 2008, a Dasartes é a primeira revista de artes visuais do Brasil desde os anos 1990. Em 2015, passou a ser digital, disponível mensalmente em seu aplicativo para tablets e celulares e no site dasartes.com.br, o portal de artes visuais mais visitado do Brasil. Para ficar por dentro do mundo da arte, siga a Dasartes.
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