Revista D+ edição 15

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A sua revista de Inclusão e Acessibilidade

562003 9 772359

NÚME RO 1 • PR EÇ O R$ 13,90 ISSN 2359-5620

00015

Acesse www.revistadmais.com.br e confira todas as matérias em LIBRAS e ÁUDIO

Você conhece esse conceito? Ambientes, produtos e serviços que podem ser usados por todas as pessoas. Mais do que lei, isso é uma prova de respeito. PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Os Surdos, a Libras e o ato de falar em público

DEPRESSÃO

Na terceira idade, isolamento e perda de entes queridos são as principais causas

PARA O ALTO E AVANTE!

Intercâmbio internacional: se você tem medo, vá com medo mesmo!

AUTOESTIMA

Pole Dance, Core 360º e Sling Desk: mexa-se e saia do lugar comum



NA REDE

::::::::::::revistadmais.com.br:::::::::::::::::::::: INCLUSÃO

Todo dia é dia

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“Que show! Parabéns, equipe da Revista D+, que está cada vez melhor!” – Jane Fantacussi, pelo Facebook

:::::::::::: MAIS ACESSIBILIDADE Conteúdo em Libras No site, você conta com vários recursos para tornar sua interação com a revista cada vez mais possível e prazerosa. Além de alternar o alto contraste de cores e o tamanho da fonte, você também pode assistir às matérias em Libras.

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CONEXÃO Você vai encontrar um link no final de algumas reportagens. Ele lhe dará acesso a um conteúdo especial, com mais informações e fotos sobre aquele assunto. Alguns trazem até vídeos! Aproveite!

ESCREVA PRA GENTE:::::::::::::: Se você tem interesse em ler sobre determinado assunto na Revista D+, escreva-nos e dê suas sugestões. A redação está disponível em jornalismo@revistadmais.com.br

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Todos os dias, a Equipe da D+ traz para o site novidades importantes e curiosidades na área da inclusão social. Na página da Revista D+ na web, você fica por dentro de serviços, agenda cultural, lançamento de produtos nacionais e internacionais em benefício da pessoa com deficiência, leis e muitas outras informações úteis.

NOVIDADES DA TECNOLOGIA ASSISTIVA A 24ª edição da Hospitalar Feira + Fórum, evento na área da saúde com a finalidade de alinhar as práticas de mercado e as necessidades da sociedade para promover o desenvolvimento de novas soluções, aconteceu em maio no Expo Center Norte, em São Paulo. Durante o evento, os participantes entraram em contato com produtos de mais de 1.250 expositores, incluindo diversas novidades de Tecnologia Assistiva. Durante o evento, também ocorreu o Simpósio Latino-Americano de Reabilitação e Tecnologias Assistivas. A Revista D+ estava lá, claro!

BOLETIM TODA SEMANA Às sextas-feiras, nós enviamos uma newsletter com as principais matérias da semana. Para receber, entre no site e cadastre-se.


EDITORIAL

A sua revista de Inclusão e Acessibilidade

562003 9 772359

NÚME RO 1 • PR EÇ O R$ 13,90 ISSN 2359-5620

00015

Acesse www.revistadmais.com.br e confira todas as matérias em LIBRAS e ÁUDIO

A arte de melhorar

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al como uma pedra bruta, nosso olhar sobre a realidade também se lapida. Junto com a mudança de visão de mundo, vem a mudança de atitude. Até nossa maneira de estar – no trabalho, na família, na roda de amigos, na vida mesmo – passa por sutis e importantes transformações que vão delineando melhor os contornos do tipo de pessoa que somos.

Você conhece esse conceito? Ambientes, produtos e serviços que podem ser usados por todas as pessoas. Mais do que lei, isso é uma prova de respeito. PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Os Surdos, a Libras e o ato de falar em público

DEPRESSÃO

Na terceira idade, isolamento e perda de entes queridos são as principais causas

PARA O ALTO E AVANTE!

Intercâmbio internacional: se você tem medo, vá com medo mesmo!

Edição nº 15: arte de capa por Camila Duarte

AUTOESTIMA

Pole Dance, Core 360º e Sling Desk: mexa-se e saia do lugar comum

Ao olhar para o outro e notar que se trata de alguém que, como você, também passa por processo semelhante e intrínseco, fica mais fácil de entender que nas diferenças, somos iguais. No desejo de melhorar, nos equiparamos. O tema da matéria de capa desta edição, o Design Universal, aborda todas as mudanças que são mister para transformar a sociedade em um lugar melhor para se viver. Não para eu viver, ou para você: para todos. Um de nossos entrevistados, o professor Marcelo Pinto Guimarães (UFMG), disse: “O Design Universal pode ser entendido como uma linha de equilíbrio entre ética e estética. Como uma forma evolutiva de decisões com valores morais de inclusão e com o uso apropriado e sustentável de tecnologia”. Confira tudo isso a partir da página 44. Falando em melhorar, a participação da Revista D+ como expositora e como imprensa oficial da 15ª Edição da Reatech foi um grande sucesso na feira, que recebeu mais de 50 mil pessoas no início de junho, em São Paulo. Se você esteve por lá, certamente pôde conferir o burburinho constante em nosso estande! (Re)veja alguns dos destaques do evento na página 66. A seguir você também poderá curtir algumas novidades: estreamos o Test Drive em grande estilo, com o novo Audi A3 Attraction e o “piloto” convidado Edson Dantas, triatleta. No Espaço da Libras você confere alguns pensamentos sobre a língua visoespacial com autoria de André dos Santos Silva, especialista em Dialética da Língua Portuguesa e intérprete de Libras, que estará conosco pelas próximas edições. Você ainda confere a acessibilidade nos aeroportos, depressão na terceira idade, intercâmbios internacionais, a lei da terceirização e muito mais. Do lado de cá, buscamos fazer a nossa parte melhorando o acesso à informação de qualidade para a pessoa com deficiência. Que busquemos sempre ser a pedra lapidada, não a pedra no meio do caminho. Boa leitura!

Rúbem Soares Diretor Executivo



DO LADO DE CÁ

Nos bastidores

Edição pós Reatech é assim: muuuita foto de tudo e de todos que colaboraram para o sucesso da Revista D+ na feira! Confira também os bastidores de algumas matérias. Vem!

Não faltou criatividade na Reatech! Nossa jornalista, Audrey Scheiner, com um avatar! Haha!

Parte da equipe no estande da Revista D+, que permaneceu lotado durante todos os dias da feira!

Rúbem Soares, diretor executivo; Taís Lambert, editora-chefe e Denílson Nalin, diretor de Publicidade da Revista D+

Nossa querida revisora Eliza Padilha, que revisou matéria pra xuxu nos quatro dias

O pequeno Geovanne Amorim, personagem de capa da nossa edição 10, todo orgulhoso com a revista nas mãos!

Siiimmm, a gente amou os bichinhos da terapia assistida por animais! A repórter Mayra Ribeiro e sua Amiga Arara!

O estande da Revista D+ estava TÃO especial que até coral em Língua de Sinais nós tivemos!

As jornalistas Brenda Cruz e Taís Lambert com o sempre amável Dudé, vocalista da Banda Dudé e a Máfia


Verônica Honorato e Jessica Carecho, da equipe de audiovisual, com Dílson Nery, diretor artístico responsável por todos os curtas-metragens em Libras do projeto Porta dos Surdos

O velocista Vinícius Rodrigues foi nossa capa na edição da Paralimpíada e também prestigiou a Reatech!

PARA tudo! Cássio Dutra é a elite do crossfit! E é o único brasileiro cadeirante que representará o Brasil em competição no Canadá, em julho. Força, Cássio!

A fotógrafa Bárbara Jorge e as jornalistas Brenda, Taís, Audrey e Mayra: time D+ produziu mais de 40 reportagens durante a Reatech. Acesse e confira: www.revistadmais.com.br

Jessica Carecho, o triatleta Edson Dantas, Taís Lambert e a fotógrafa Sterfane Cardoso depois de dirigirem o Audi A3 Attraction para a matéria de test drive

Alguns de nossos intérpretes oficiais, que trabalharam muito na Reatech: Carol Gomes, Marco Antonio, Rafaella Sessenta e a professora de Libras, Joice Alves

Ele é imbatível nas piscinas e supersimpático. O recordista Daniel Dias e Taís Lambert a bordo do Volvo XC90 adaptado

Herick Palazzin, Denílson Nalin e Luciano Guastaferro, diretor comercial da Revista D+ com o atleta Fernando Aranha

A ex-atleta Laís Souza e a intérprete de Libras Rafaella Sessenta fazendo o sinal de “I love you”

Você conhece a Tina Descolada? A boneca cadeirante volta às páginas da D+ com um ensaio junto ao namorado e mais novidades!

Revista D+ número 15




revi

sta

www.revistadmais.com.br DIRETOR EXECUTIVO Rúbem da S. Soares rsoares@revistadmais.com.br REDAÇÃO Editora-Chefe Taís Lambert taislambert@revistadmais.com.br Equipe de Jornalismo Audrey Scheiner Brenda Cruz Mayra Ribeiro jornalismo@revistadmais.com.br Revisora Eliza Padilha Diagramação Estúdio Dupla Ideia Departamento de Arte Samuel Ávila arte@revistadmais.com.br Ilustrador Luis Filipe Rosa Colaboradores nesta edição Cintia Alves (texto) Sterfane Cardoso (fotografia) DIRETOR DE PUBLICIDADE Denilson G. Nalin denilsonnalin@revistadmais.com.br (11) 5581.1739 e 9-4771.7622 DIRETOR COMERCIAL Luciano Cesar Guastaferro lucianocesar@revistadmais.com.br (11) 5581.1739 e 9-4771.7621 COMUNICAÇÃO E MARKETING Rúbem S. Soares Equipe Bárbara R. Jorge Valter Ferro mkt@revistadmais.com.br RH E FINANCEIRO David Gomes de Souza Raquel Vidal de Lima CONTRATOS E LICITAÇÕES Luiz F. Mazieri Nicolini mais@revistadmais.com.br TI Herick Palazzin Ivanilson Oliveira de Almeida Jonathan Vinicius DIRETOR ARTÍSTICO Dílson Nery PROJETOS DE MÍDIA INCLUSIVA Coordenação Rafaella Sessenta CONSULTORES DE LIBRAS (SURDOS) Célio da Conceição Santana Joice Alves de Sá INTÉRPRETES DE LIBRAS Carlos Silvério Carolina Gomes de Souza Silva Marco Antonio Batista Ramos Rafaela Prado Siqueira Rafaella Sessenta Yasmin Anunciato EQUIPE AUDIOVISUAL Conteúdo do portal Jéssica Aline Carecho Verônica Honorato de Souza ATENDIMENTO AO ASSINANTE E CIRCULAÇÃO Alessandra Rodrigues dos Santos assinaturas@revistadmais.com.br (11) 5581-3182 / 5583-0298 RECEPÇÃO Jennyfer Alves (11) 5581-3182 / 5583-0298 APOIO Arianna Hermana da Silva (19) 3306-9990 Edição número 15 – Maio/Junho de 2017 REVISTA D+, ISSN 2359-5620, é uma publicação bimestral da MAIS Editora CNPJ n° 03.354.003/0001-11 Rua da Contagem, 201 – Saúde - São Paulo/SP - CEP 04146-100 Associada a:

Distribuída em bancas pela DINAP-DISTRIBUIDORA NACIONAL DE PUBLICAÇÕES LTDA. Rua Dr. Kenkiti Shimomoto, 1678 CEP 06045-390 - Osasco - SP PARCERIA: A Revista D+ não se responsabiliza por opiniões e conceitos emitidos em artigos assinados ou por qualquer conteúdo publicitário e comercial, sendo este de inteira responsabilidade dos anunciantes

Associação para Desenvolvimento Social, Educacional, Cultural e de Apoio à Inclusão, Acessibilidade e Diferença

NOSSA CAPA 44 O Design Universal é um conceito criado para beneficiar a todas as pessoas em suas mais específicas e diversas características. Todos têm os mesmos direitos: isso é lei 03 Na Rede 04 Editorial 06 Do Lado de Cá 10 Expediente & Aqui na D+ 12 Ponto de Vista Nada do que é humano me é estranho? Nunca é demais frisar que não se pode estabelecer um “modelo-padrão” de ser humano 14 Misto Quente As novidades dignas de nota 26 Psique Educação inclusiva: caminhos da afetividade. Por Emílio Figueira 28 Acontece Terceirização: nova lei afeta a pessoa com deficiência? 30 Test Drive Estreamos dirigindo o novo Audi A3 Sedan 1.4 Flex 2017, na versão Attraction, com isenção. Vem ver! 34 Perfil Conheça a história de Kenia Maria de Souza Rio, pessoa com nanismo. É advogada e mãe 38 Por Dentro das Grandes A empresa Sodexo fala dos cinco pilares que pautam a diversidade e mostra os caminhos da inclusão 56 Viver Bem Pole Dance, o Core 360º adaptado e a Sling Desk, modalidades e técnicas que fazem bem para o corpo e elevam a autoestima 60 Acessibilidade O que a pessoa com deficiência pode esperar dos aeroportos brasileiros? Conheça os recursos – e a falta deles – em algumas experiências dos leitores 66 Tecnologia Assistiva A Reatech 2017 trouxe inúmeras novidades. Conheça alguns destaques imperdíveis 72 Terceira Idade A depressão da pessoa idosa pode ser contornada com apoio profissional e carinho da família 76 Práticas na Educação Inclusiva Falar em público: uma situação envolvendo os Surdos e a Libras 82 Espaço da Libras Estreia da seção com o especialista André dos Santos Silva e o tema O Sistema Linguístico da Libras: novas perspectivas 84 Aprenda Libras Aprenda sinais do Desenho Universal 86 Rumos & Descobertas Intercâmbio para pessoas com deficiência. Confira as dicas de viagem de quem foi para o outro lado do mundo 90 Cereja! A arte e o autismo: criando sentimentos


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Maio/Junho 2017 – Ano III – nº 15

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PONTO DE VISTA

Nada do que é humano me é estranho? Homo sum: nihil humani a me alienum puto: “Sou humano e nada do que é humano me é estranho...” (Públio Terêncio Afro, dramaturgo e poeta romano, nascido entre 195-185 a.C. e falecido por volta de 159 a.C.)

Rúbem Soares

Psicólogo, mestre e doutorando em Educação (USP), diretor executivo da Revista D+

N

unca é demais frisar que não se pode estabelecer um “modelo-padrão” de ser humano no qual todos deveríamos nos encaixar. Aliás, essa teoria fora colocada em prática por filósofos do eugenismo, no século XIX, visando à melhoria genética e à homogeneização da nossa espécie. A filosofia da Eugenia teve seu apogeu com os estudos de Francis Galton (1822-1911), criador da Psicologia Diferencial, dos Testes Psicométricos (mais conhecidos como testes de Q.I.) e dos exames através de impressões digitais (hoje utilizados, principalmente, na ciência criminal). Entretanto, Galton ficou mais conhecido como o pai da Eugenia moderna, teoria biossocial, cujo principal objetivo era a evolução, aperfeiçoamento e purificação da raça humana. É claro que a ideia eugenista de Galton não era de todo original. Como se sabe, desde a Antiguidade, os hebreus implantaram regras de higienização e profilaxia que inspiraram teóricos eugenistas do final do século XIX e início do XX. Da mesma forma, padrões de beleza física e exemplo de força já eram perseguidos na Grécia Antiga, principalmente em Esparta. Contudo, foi Galton quem, em 1885, propôs o termo “eugenia” (do grego eugenes, bem nascido) que designaria o ramo da ciência biológica relacionada à melhoria da genética humana. Por meio dessa teoria, ele pretendia criar um ser humano que superasse qualquer doença ou imperfeição, ou seja, seria um homem belo, forte, saudável física e mentalmente, um “deus grego”, poderíamos dizer. Galton era primo de Charles Darwin (1872), em cuja obra se inspirou e do qual teve apoio para solidificar a teoria do eugenismo. Dessa forma, em 1884, ele fundou um laboratório antropométrico, passando a propagar a eugenia como meio de melhorar a raça humana, o que deveria ser feito por meio de uma seleção mais inteligente que a natural darwiniana. Claro que tal ideia galtoniana partia de um padrão estereotipado de beleza e perfeição incrustado na sociedade e que, lamentavelmente, ainda persiste até hoje. À época, as ideias de Galton se propagaram de tal maneira, constituindo-se uma ideologia, tornando-se quase uma religião. Essa ideologia foi denominada de eugenia negativa, já que proibia o nascimento dos “indesejáveis” biológica, psicológica e socialmente, ou seja, pretendia-se extirpar da sociedade os “inaptos” e os “defeituosos”. E quem eram os inaptos e os defeituosos? Eram: 1) os débeis mentais (termo utilizado à época); 2) os loucos (e os psicopatas); 3) os criminosos (e delinquentes); 4) os epiléticos; 5) os alcoólatras (e todos os tipos de viciados); 6) os doentes (tuberculosos, sifílicos, leprosos e todos com doenças crônicas e infecciosas); 7) os cegos; 8) os surdos; 9) os disformes; 10) os indivíduos marginais (órfãos, vagabundos, moradores de rua e indigentes). Segundo a


historiadora Pietra Diwan, essa relação de quem eram os inaptos e defeituosos foi encontrada em um documento oficial do início dos anos 20 do século passado, na cidade americana de Chicago (EUA). Desse modo, Galton pretendia criar o “haras humano”, promovendo o nascimento de gente sã, incentivando o casamento entre os “bem dotados biológica e psicologicamente”. Para isso, propunha ao poder público a criação de programas educacionais para a reprodução consciente de casais “saudáveis” e que, por outro lado, também pudessem desestimular a procriação nos casais com caracteres supostamente inferiores. Para nosso alento, cientificamente, hoje, a tese galtoniana soa ridícula e há muito já fora refutada. Isso porque, pesquisas biopsicológicas indicam que o humano não tem um padrão de igualdade. A diferença – e a deficiência dos mais variados tipos – é inerente à espécie humana. Não somos feitos em série como numa linha de produção industrial. Ser diferente significa ser humano. Entretanto, socialmente, ainda temos um árduo caminho a percorrer para superar a visão preconceituosa

A diferença – e a deficiência – é inerente à espécie humana no nosso cotidiano. A cultura social ainda se pauta por certo estranhamento em relação às pessoas com deficiência. O filósofo Mário Sérgio Cortella costuma dizer que é comum o indivíduo apreciar o cheiro de seus pets e até mesmo as fezes de alguns animais (cavalos, gado em geral). Porém, ao deparar com dejetos humanos, estes lhes causam asco, repulsa. Infelizmente, a realidade é muito pior do que essa descrita por Cortella: ao encontrar pessoas com algum tipo de deficiência – sobretudo com maior comprometimento, com uma diferença significativa – é comum sentir algum desconforto, alguma distância, como se tal condição fosse algo estranho à espécie humana. Como não o é, resta-me a provocação inspirada em Terêncio: nada do que é humano lhe é estranho? D+


MISTO QUENTE por Brenda Cruz fotos Marta Alencar

AMOR SEM FRONTEIRAS “Meu amor... Enquanto a nossa única limitação física for a distância, vamos desafiando as leis geográficas com palavras – ditas ou escritas – para encurtar esse espaço entre dois corações, em coordenadas tão distintas. Espero que sinta, através de todo o carinho que envio, o quanto me faz falta e o quanto o sentimento me impulsiona a estar sempre perto de você... A distância não desgasta o que há de mais verdadeiro nos sentimentos. Obrigada por se fazer presente na ausência! Beijo forte!” Tina Descolada Esse é o recado que Valentina, a Tina Descolada, manda ao seu namorado Herge, que mora em Lisboa, Portugal. Os dois se conheceram pela internet e vivem um romance à distância. Assim como os amores reais, esses personagens passam uma mensagem verdadeira: o amor não vê deficiência, distância, etnia ou cor da pele. Tina contou sua história na edição 10 da Revista D+ e hoje, além da linda declaração para seu namorado, também traz as novidades dos seus projetos profissionais. “Tina fará graduação em Administração no próximo semestre e desenvolverá projetos sociais com os alunos, além de tratar de temas relativos a uma vida de estudante: as dificuldades, acessibilidade física e atitudinal”, conta Marta Alencar, psicóloga que deu vida à personagem no intuito de chamar atenção para o preconceito e a discriminação contra a pessoa com deficiência. Além disso, ela participa de um projeto de moda e está previsto para este ano o lançamento de cinco livros em que ela é a protagonista. “Serão de literatura para crianças de nove a 12 anos e tratam de temas como: relação de amizade e complementariedade, morte e cidadania. Um dos objetivos é mostrar que a deficiência é apenas um detalhe na vida de uma pessoa”, adianta Marta. Acompanhe os projetos e as lindas fotos dessa personagem aventureira: www. facebook.com/tina.descolada



MISTO QUENTE

fotos Arquivo pessoal

por Brenda Cruz

Thalita e o marido com a filha Mariana: “O app facilita a organização das consultas”

UMA “SECRETÁRIA” EM FORMA DE APP Vivemos em um mundo super digital e tecnológico, cujos recursos nos deixam cada vez mais dependentes. No entanto, isso não é algo negativo se usado para facilitar nosso cotidiano, inclusive na administração do controle da saúde. Pensando nesse aspecto, o grupo de alunos e professores do ambulatório multidisciplinar de síndrome de Down da Santa Casa, após a ideia da Dra. Carla Franchi Pinto, professora do Departamento de Ciências Patológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, desenvolveu o aplicativo Elo21, que tem como função ser uma agenda virtual para administrar os cuidados com a saúde de pessoas com síndrome de Down, seguindo as diretrizes do Ministério da Saúde. “O Elo21 foi pensado para atender a todas as faixas etárias, basta colocar a data de nascimento e o sexo da criança, por exemplo, e ele já gera os protocolos que aquela faixa etária tem que seguir em consultas médicas no decorrer do ano”, explica a professora. De uso fácil e intuitivo, o aplicativo tem funções que avisam quando é necessário o agendamento

de uma consulta médica, além de enviar lembretes sobre consultas já agendadas. Quem alimenta essa agenda são os responsáveis do usuário com Down, e nela ficam armazenados o histórico de exames e o resultado de tudo o que foi feito durante todo o ano. Dra. Carla explica que quando são colocadas as anotações, o médico, o professor, o terapeuta ou qualquer outro profissional pode ter acesso a esses resultados. “Os profissionais podem ver o que faz sentido saber sobre a outra especialidade, pois isso gera interdisciplinaridade. que é a união de vários estudos, e não multidisciplinaridade, que é a separação deles. Todos têm uma visão mais ampliada daquela pessoa”.

SOMA DE BENEFÍCIOS O ganho desse aplicativo é para toda a família, pois a vida fica mais fácil à medida em que tudo está organizado em um só local. É o que conta Thalita Schmalz Yamasaki, 33 anos, mãe da Mariana, de um ano e cinco meses, que conheceu o aplicativo através de um grupo de mães de filhos com Down no Whatsapp.

“O aplicativo é super fácil! Facilita muito na organização das consultas, principalmente as que são a cada três meses”. Além do controle da agenda, o Elo 21 também disponibiliza semanalmente dicas úteis para as famílias. “Aceitamos essas dicas de outros serviços, contanto que o profissional mande o nome dele e a fonte, pois temos que postar coisas confiáveis. Em geral são dicas de nutrição, dentistas, sexualidade, entre outras”, conta a professora. Thalita diz que lê todas as dicas e aprende muitas coisas por meio delas. Outro benefício apontado pela Dra. Carla é com a coleta de dados dos usuários: é possível verificar se há falhas no atendimento em cada região. “Eu consigo saber se em uma determinada região não estão sendo feitos, por exemplo, os exames tireoidianose, caso não, é possível verificar o que está acontecendo, se está faltando treinamento para a equipe médica ou kit para fazer o exame. Dessa forma, podemos alertar para o serviço médico daquela região”. O aplicativo está disponível na Play Store e na Iphone Store.


Revista D+ nĂşmero 11


MISTO QUENTE por Brenda Cruz

Cássio Dutra, 30 anos, nosso personagem de capa da edição 12, sobre Moda Inclusiva, volta às páginas da Revista D+ com novidade. Morador de Itanhaém, litoral de São Paulo, ele é atleta do Crossfit Adaptado e recentemente conquistou uma vaga para disputar o Mundial da categoria no Canadá. Cássio é o único representante brasileiro na categoria Elite Masculina Cadeirante. O atleta revela que treina a modalidade há cinco meses, mas que há mais de um ano já participa de alguns campeonatos de Crossfit Adaptado no Brasil, mesmo sem treinar em um box de crossfit credenciado. Duas vezes campeão do Games Cadeirante do Brasil, entre outros eventos, esse ano decidiu participar do Open Mundial e, após passar pelas duas primeiras fases, conquistou o 6º lugar do mundo, o que o credenciou para ir ao Canadá disputar o título de Cadeirante mais bem Condicionado do Mundo. Cássio treina crossfit três vezes na semana, duas horas por dia, no CrossFit Peruíbe, na cidade vizinha. Trata-se do único box credenciado para a modalidade na região. “Estou confiante, embora não tenha tanta experiência quanto meus adversários, que têm mais tempo de treino do que eu, mas mesmo assim vou pra cima e darei o meu máximo!”, adianta Cássio. Leonardo Vida, dono do CrossFit Peruíbe, conta que o conheceu alguns dias antes de inaugurar o box e desde então o competidor vem treinando com eles. “O Cássio é

atleta exponencial. Não só pelo nível de condicionamento físico e qualidade técnica, mas principalmente pelo foco. Para um atleta de elite, esse fator é determinante. Isso, somado ao programa de treinamento e acompanhamento que temos desenvolvido com a Dra. Rúbia Vida e a Coach Jessica Matias, gera enormes chances para a conquista do título mundial”, diz Leonardo. Uma equipe multifuncional irá viajar com o atleta para a competição que acontece nos dias 7 e 8 de julho. Serão três dias de competição com as mais extremas e variadas provas de resistência, força, velocidade e explosão. “Um acompanhamento durante toda a competição é de grande importância para a prevenção de lesões e a rápida recuperação entre as baterias”, revela Leonardo. Cássio conta que não vive do esporte, treina por amor e para manter a saúde em dia. “Hoje o crossfit representa uma forma de me sentir incluso, fazendo o que gosto, que é me exercitar e ter uma qualidade de vida melhor”. O atleta está fazendo uma vaquinha virtual no site Catarse para angariar fundos que possibilitem a sua ida ao Campeonato Mundial de Crossfit Adaptado. O valor é para ajudar nas despesas da viagem e na compra de uma cadeira de rodas sob medida. Acesse o site www.catarse.me, busque por Cássio Dutra no Mundial de Crossfit no Canadá e colabore! Conheça mais sobre o atleta em sua página no Instagram: @Cassiodu

fotos Leonardo Vida

ELITE DO CROSSFIT NO CANADÁ


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MISTO QUENTE por Audrey Scheiner

BRINCADEIRA DE CRIANÇA

Projeto LIA: brincar é um direito de todos

Todas as crianças têm o direito de se divertir nos parques e nas praças. Foi com esse pensamento que o Projeto Lia – Lazer, Inclusão e Acessibilidade, em parceria com a Associação Dar a Mão, implementou na cidade de São João do Ivaí, no norte do Paraná, aplicações de brinquedos adaptados para crianças com deficiência em parques infantis. O melhor de tudo é que a ação, criada em Curitiba, é efetuada em diversas cidades atualmente. O principal objetivo da organização é reforçar a necessidade de as crianças com e sem deficiência brincarem juntas – caminho que conduz a uma sociedade sem preconceitos. “Em 2012, estava com os meus três filhos num parque – Leonardo, de 9 anos, e as gêmeas Camila e Letícia, de 7, essa última tem deficiência motora decorrente de paralisia cerebral. Letícia observava os irmãos brincando, mas não podia fazer muita coisa pela falta de acessibilidade do local”, relata Shirley Ordonio, criadora do Projeto Lia. Imediatamente, Shirley adaptou a brincadeira no parque: “Retirei as almofadas da cadeira de rodas, adaptei em um balanço, coloquei minha filha e a empurrei. Foi a primeira vez que ouvi uma gargalhada dela! Foi muito emocionante”, afirma. A partir de então, a mãe começou a pesquisar sobre brinquedos adaptados em parques públicos, que permitem interação total de crianças com deficiência com seus amigos.

Melissa Vicentini, 34, é pedagoga e mãe do Pedro, 7, com paralisia cerebral e epilepsia de difícil controle. Para ela, o projeto ajudou muito no desenvolvimento do filho. “A iniciativa mostra que o acesso e a inclusão não se fazem apenas na escola e no direito à saúde, mas também no ato de brincar. Mostra para a sociedade que todas as crianças têm direito ao lazer e a se divertirem juntas”. Segundo Geane Poteriko, presidente da diretoria executiva da Associação Dar a Mão, as crianças com mobilidade reduzida ou com alterações sensoriais e intelectuais também precisam de brinquedos seguros. “É preciso estrutura e travas para sustentar a cadeira de rodas, assim como brinquedos que ampliem as experiências motoras, cognitivas e sensoriais, que gerem sensações prazerosas que favoreçam a melhora da autoestima”, esclarece a presidente. Além disso, o Projeto Lia propõe a realização de encontros colaborativos sazonais, como o Piquenique Inclusivo, que reúne as crianças com deficiência e suas famílias em atividades lúdicas e oficinas de recreação. A iniciativa está em contato com a Prefeitura Municipal e a Câmara de Vereadores de São João do Ivaí, além do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) e o Rotary Club, para fins de parcerias na divulgação e no apoio financeiro para a execução do projeto. “Mobilizar a atenção da sociedade e do poder público sobre a necessidade da inclusão da criança com deficiência também no lazer é de suma importância”, finaliza Geane Poteriko.

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RESULTADO DO BEM



MISTO QUENTE

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por Mayra Ribeiro

TAL MÃE, TAL FILHA “Eu nunca vou esquecer a primeira vez que coloquei meus olhos nela. Estava tão assustada e apaixonada! Eu só queria subir em sua incubadora e dizer: Eu vou te proteger e prometo dar-te o mundo”, afirma Christina Smallwood em seu blog Fifi + Mo. A blogueira de Corona, na Califórnia, Estados Unidos, é mãe adotiva de Finley. A criança de três anos nasceu de forma prematura aos oito meses com a paralisia cerebral diplegia espástica. Essa condição causa rigidez nos músculos inferiores do corpo, o que interfere na mobilidade. Portanto, Finley utiliza um andador para conseguir movimentar-se. Recentemente, a pequena passou por uma cirurgia de U$ 50 mil para reduzir a contração muscular. A mãe estima que até os 15 anos a filha passe por dez cirurgias. Christina começou a desenvolver o blog porque se sentia isolada sendo mãe de uma filha com deficiência. A partir dessa iniciativa, teve como missão espalhar consciência sobre a causa, conectar-se com famílias de histórias similares e conseguir recursos para os custos dos tratamentos de Finley. Essa ação acabou migrando para as redes sociais e hoje Fifi + Mo é um sucesso no Instagram com 75,2 mil seguidores. As fotos dos registros diários de mãe e filha chamam atenção pela criatividade e estilo. Outro destaque desse dueto são camisetas e roupas iguais disponibilizadas por pequenos empreendedores. Mesmo com a visibilidade, Christina pretende ampliar essa ação e construir em conjunto com a fisioterapeuta da filha a Fundação Finley, para auxiliar famílias de crianças com deficiência. Confira a história da dupla no blog www.fifiandmo.com e acompanhe os momentos no Instagram www.instagram.com/fifiandmo.


Revista D+ nĂşmero 11


MISTO QUENTE por Mayra Ribeiro e Taís Lambert

O RESTAURANTE DA INCLUSÃO do ambiente não para por aí. O La Inclusiva pretende ampliar os serviços: o desenvolvimento de um cardápio interativo para a pessoa com autismo, esquizofrenia e síndrome de Down está sendo estudado. O restaurante é criação de Juan Munizaga, que perdeu completamente a audição do ouvido esquerdo e ficou com o direito comprometido aos dois anos de idade devido a uma meningite. “Como uma pessoa surda, eu experimentei a discriminação em todas as áreas desde pequeno. O que se sente, como ir a um lugar que não tem os requisitos necessários para cuidar de uma pessoa com deficiência. Aqui, outras pessoas não passarão pelo

mesmo que eu. Como eu também estudei gastronomia, decidi fundar o primeiro restaurante 100% inclusivo”, explica Munizaga, em entrevista à Revista D+. E finaliza: “A ideia principal é promover e divulgar a inclusão, provar que é possível ser mais inclusivo e que ter deficiência não é um problema”. Para entrar em contato, acesse a página do Facebook (@Lainclusiva) ou ligue no telefone + 56 2 2904-7751.

Serviço Local: La Inclusiva Sangucheria Endereço: Avenida Irarrazaval, 3993 – Ñuñoa Santiago Horário de atendimento: das 12h30 às 23h

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“Não há barreiras para comer bem”. Este é o lema do La Inclusiva Sangucheria, o primeiro restaurante completamente inclusivo do Chile. Estando por Santiago, você não pode perder a chance de apreciar um bom prato acompanhado de inclusão genuína: eles são a primeira iniciativa do país a não excluir ninguém. Além de uma alimentação de qualidade, o empreendimento gastronômico oferece aos clientes garçons habilitados para se comunicar pela língua de sinais, rampa de acesso, cardápios em braile e entrada de cães-guia. Vagas de emprego para a pessoa com deficiência também são disponibilizadas. Mas o caráter inclusivo e acessível


Revista D+ nĂşmero 11


PSIQUE

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: caminhos da afetividade por Emílio Figueira *

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os últimos anos tenho viajado pelo país fazendo palestras, ministrado cursos e recebido muitas mensagens referentes à Educação Inclusiva. E algo que sempre me incomoda é o fato de alguns professores quererem transferir suas responsabilidades, dizendo que muito pouco tem sido feito a respeito da inclusão por parte do governo ou dos dirigentes educacionais. Ainda há muito da cultura paternalista de esperar que tudo venha de cima, já pronto tanto no sentido de leis como de investimentos e recursos, e com a educação inclusiva não tem sido diferente. Outro ponto que noto nesse comportamento e nos discursos de várias pessoas, inclusive professores, é que falar em inclusão escolar ainda se esbarra em questões culturais e/ou até mesmo em comodismo, para não sair da zona de conforto. É comum os professores dizerem que não estão preparados para receber alunos com deficiência. Não há maldade nisso, mas sim certo estado de ansiedade e, em muitos, mesmo que seja de forma inconsciente, um mecanismo de defesa contra algo desconhecido. Para a maioria dos professores, assim como para grande parte da população, ainda há velhos conceitos referentes às pessoas com deficiência, tais como aqueles associados ao estado de doença, que não se desenvolveram ou não aprendem como as demais. Ora, o desenvolvimento e a aprendizagem humana são individuais e ninguém tem um modelo a seguir. De fato, nenhum professor estará preparado para trabalhar com a inclusão escolar até o momento em que chegue à sua turma um aluno a ser incluído. Trata-se de uma situação que ele nunca vivenciou. Será nesse momento que veremos realmente quem é o educador de verdade. O acomodado alegará não estar preparado – pois rejeitar um aluno com essa alegação será muito mais fácil e rápido para se livrar da questão. Mas o verdadeiro professor, consciente de seu compromisso e desafio ético de educar a todos que pertencerem ao seu alunado, primeiro o

receberá, o que já será o início da inclusão pela afetividade. Afetividade se constrói pela convivência. O professor disposto a isso recebe o aluno em fase de inclusão com o mesmo carinho que recebe os demais. E depois buscará formas de trabalhar com ele. Afetividade também significa sair da zona de conforto em busca de querer aprender cada vez mais dentro de sua profissão. O professor, educador, pedagogo, deve ser um eterno estudioso. Com um mundo tão dinâmico e em constantes transformações, precisamos estar sempre descobrindo e aprendendo mais. Com a educação inclusiva não deve ser diferente. Esse é o principal conceito que quero deixar: O professor precisa criar e manter o hábito de pesquisar! Detalhando, quero reforçar o dito acima ao professor: quando receber alunos inclusivos, primeiro os acolha em sua sala e comece a conviver com eles, criando laços, descobrindo um ao outro, professor e aluno, o que já será uma pesquisa de campo. Paralelamente, vá ler sobre as deficiências e reais necessidades de cada aluno inclusivo, procurar orientações de práticas pedagógicas para se trabalhar com eles e toda a turma. As possibilidades são muitas e as informações nunca estiveram tão disponíveis. E de graça. Além das publicações que devem ter na biblioteca de sua escola, basta o professor entrar no Google e achará muito material seguro. No Youtube há milhares de vídeos sobre educação inclusiva, práticas pedagógicas inclusivas e casos específicos, por exemplo.Sobre não mais transferir a missão que é do professor para o governo ou aos dirigentes da escola, defendo que o processo de inclusão escolar só terá sucesso se for realizado de baixo para cima. Das bases e com o envolvimento de todos, sendo que um dos caminhos mais certos para a educação inclusiva é a afetividade. Importante o professor se despir de seus preconceitos, abrir os braços e receber alunos a serem inclusos. Conhecimento elimina a ansiedade, trazendo segurança. E professor seguro ama o que faz, alimentado por gestos de afetividade, atingindo resultados inimagináveis! D+

Emílio Figueira é psicólogo, psicanalista, educador, autor do livro Psicologia e Inclusão: Atuações Psicológicas em Pessoas com Deficiência, publicado pela Wak Editora.

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ACONTECE

Deputada Mara Gabrilli: “Não podemos esquecer que temos uma população com deficiência que ainda luta por oportunidades iguais”

Terceirização: nova lei afeta a pessoa com deficiência? No final de março (31/03) Michel Temer aprovou a Lei 13.429, que regulamenta os serviços de terceirização no mercado de trabalho. Mas, o que isso significa na prática? Texto Mayra Ribeiro foto Rodolfo Stuckerta

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m uma empresa existem dois tipos de colaboradores: os que trabalham na produção de meio e os que participam da produção de fim. Os de meio atuam auxiliando o funcionamento da principal atividade da empresa, enquanto que os de fim trabalham na principal atividade da companhia. Digamos que a empresa é uma escola, onde a principal atividade é o ensino. Portanto, o colaborador de meio é o porteiro e o de fim é o professor. A partir da Lei de Terceirização, a empresa também pode utilizar esse formato de contratação para os funcionários de produção fim. Pensando nessa mudança no mercado de trabalho, a

Revista D+ entrevistou especialistas para verificar se a obrigatoriedade pode afetar a pessoa com deficiência por meio da De acordo com essa Lei, se a empresa tem entre 100 e 200 empregados, 2% das vagas devem ser garantidas a beneficiários reabilitados e pessoas com deficiência, habilitadas. A porcentagem varia de acordo com o número total de empregados, chegando a um máximo de 5% caso a empresa tenha acima de 1.001 funcionários. Bernardo Bassi, advogado trabalhista, afirma que “de início a Lei de Terceirização não interfere no funcionamento de cotas porque não é possível prever a forma que as empresas vão


lidar com essa mudança. As companhias podem tercei- dessa mudança de contratação. Para a deputada, uma alrizar os serviços para diminuir o número de funcionários ternativa contra os efeitos da Lei de Terceirização é as eme assim afetar a cota ou podem manter os colaboradores presas com mais de 50 funcionários passarem a contratar pelo menos uma pessoa com deficiência. Essa iniciativa está sem interferir na Lei”. Embora concorde com a terceirização e a modernização sendo apresentada no Projeto de Lei 7.239/2017. Na opinião de Tatiana Rolim, consultora de Recursos Hudas leis trabalhistas, a deputada federal do PSDB/SP Mara Gabrilli votou contra essa nova obrigatoriedade justamente manos da Trinclusão Consultoria, o problema com a Lei de por haver a possibilidade da redução do quadro de funcio- Terceirização é que as empresas terão o álibi que precisavam nários e, consequentemente, a diminuição de oportunidades para não contratar um funcionário com deficiência. “Quando se trata de diversidade, o Brasil funpara a pessoa com deficiência. “Não ciona por meio de medidas de cotas. podemos esquecer que temos uma As pessoas não são ninguém sem lei”. população com deficiência que ainDICA DO ESPECIALISTA Ao longo de seus seis anos da luta por oportunidades iguais no Nos casos de demissão em que a como consultora de RH, Tatiana mercado de trabalho e a Lei de Cotas pessoa com deficiência perceber afirma que as empresas costumam tem sido fundamental para a concreo preconceito, pode recorrer ao contratar a pessoa com deficiência tização desse direito”. Antes da Lei judiciário por meio da dispensa quando estão sendo autuadas ou de Terceirização ser aprovada pelo discriminatória solicitando uma visitadas pelas auditorias. “Temos presidente, a deputada solicitou uma indenização. Se o funcionário essa cultura de que se não mexe reunião com Temer, mas, não teve enquadrar-se nos requisitos legais de no bolso, as coisas não aconteretorno. Em compensação, Mara foi estabilidade empregatícia, também cem. Ainda assim, fui procurada por recebida por Antonio Imbassahy, mipode pedir uma reintegração ao profissionais com deficiência que, nistro da secretaria de governo, para quadro de funcionários. após a avaliação do Ministério do falar sobre o encaminhamento de um Trabalho, foram demitidos”. estudo técnico que mostre o impacto D+

Revista D+ número 14



TEST DRIVE

Superpotências Na estreia do Test Drive aqui na Revista D+, juntamos um carro e um atleta que se merecem texto Taís Lambert fotos Sterfane Cardoso vídeo Jessica Carecho


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enário: Estrada Velha de Santos, Riacho Grande, São Paulo. Ar puro e sol a pino. Máquina 1: Audi A3 Sedã Attraction 1.4 Flex 2017, que vai da imobilidade aos 100 km/h em 8,8 segundos. Máquina 2: Edson Dantas, atleta de triathlon, capoeirista, praticante de stand up padle, ouro em inúmeras provas, a caminho de seu primeiro meio Ironman, que acontecerá no dia 22 de outubro, em Miami, nos Estados Unidos. Não dava para ser melhor. O novo modelo – um dos queridinhos da marca por todo o mundo – aparece com várias novidades. Grade e para-choques, assim como faróis e lanternas foram redesenhados. As rodas, por sua vez, apresentam agora

cinco raios. De seu irmão maior, o Audi A4, herdou o volante e a alavanca de seta. Também vieram no pacote novos difusores de ar, duas entradas USB, luzes internas de LED e console central com mudança nos botões de acesso ao sistema Media Music Interface (MMI). Trocando em miúdos, tudo ficou mais bonito e intuitivo: você bate o olho no painel e no console e sabe o que fazer. O motorista pode navegar no menu da tela eletricamente rebatível de sete polegadas a partir de um botão redondo giratório. Celulares (iOS e Android) conectam-se ao carro por meio do Audi smartphone interface, o que permite que certos apps funcionem diretamente na tela do veículo.

Superpotências na Estrada Velha de Santos: Audi A3 Sedã Attraction 1.4 Flex 2017 e o triatleta Edson Dantas

Revista D+ número 15


TEST DRIVE

Tecnologia embarcada, desempenho e design esportivo fazem do A3 um dos modelos mais queridos do mundo

As lanternas também foram redesenhadas para conferir um ar ainda mais esportivo ao carro

Volante herdado do A4 e tela rebatível de 7 polegadas: esportividade e interatividade

Faróis apresentam recortes afiados na borda inferior e a grade singleframe ampliada tem contornos mais nítidos

ACELERADO Edson Dantas, 51 anos – ou Perneta, como ele gosta de dizer – tem aquele jeito que não passa despercebido. Acelerado, corre, nada, pedala, joga bola, capoeira, faz musculação e chegou para o test drive com a corda toda, como é mesmo o seu jeito de chegar a qualquer lugar nessa vida. O atleta usa prótese na perna direita, amputada um pouco para baixo do joelho, desde 1992, quando foi empurrado de um trem, sofrendo também fratura exposta no braço direito. “Na vida, a gente tem que ter essa atitude: ter vontade, querer fazer, independentemente de ser ou não atleta de alto rendimento. Eu prezo muito a vida, prezo muito ser feliz”, frisa. Com a prótese na perna direita, não teve contratempos para dirigir o A3: “Tenho bastante autonomia com a prótese e o carro é confortável, robusto e sensível ao mesmo tempo, obedecendo aos comandos sem problema nenhum”. A máquina é bicombustível e investe na segurança, com sete airbags e o controle eletrônico de estabilidade (ESP). Essa versão Attraction, a de entrada, tem motor produzido no país e seu desempenho é idêntico nos dois casos: com gasolina ou etanol puro. De série, o carro vem com ar-condicionado, direção eletromecânica, faróis bi-xenônio com ajuste automático de altura e lavadores, computador de bordo, sensor de estacionamento traseiro, bancos dianteiros com ajuste de altura, volante multifuncional e alavanca de câmbio revestidos de couro e vidros laterais e traseiro com isolamento térmico. Por ser um carro pensado para a cidade – portanto, para encarar o tráfego carregado – o sistema start-stop é bem útil. Como funciona: em congestionamentos e semáforos, quando o carro é imobilizado, o equipamento desliga o motor, dando partida novamente assim que o freio deixa de ser acionado. O start-stop, presente em várias marcas e modelos, comprovadamente fornece até 10% de economia de combustível.


QUEBRA DE PARADIGMAS Naturalmente, há elementos comuns que são levados em conta quando se trata de um veículo comprado para a pessoa com deficiência. No caso de usuários de cadeira de rodas, há que se notar a altura do carro e do banco para facilitar a transferência, assim como o tamanho do porta-malas para acomodar sem dificuldades a cadeira de rodas. Isto, só para ficar em exemplos básicos. Entretanto, além de espaço e tecnologia embarcada, todos têm o direito de curtir potência, design e prestígio de marca. A Audi do Brasil está se dedicando ao canal de venda de seus carros para a pessoa com deficiência. Além da isenção do IPI, obrigatória (11%), a marca oferece 6% de desconto nas compras do novo A3 Attraction na tabela que vale para maio/junho, totalizando 17% off. Com os descontos, o carro, que tem preço cheio em R$ 115.190, sai por R$ 95.350 para a pessoa com deficiência. Edson diz ter amado experimentar o carro: “Ele responde muito rapidamente, é superesportivo e oferece o necessário para o dia a dia”, diz o atleta, que, antes do acidente e do esporte, trabalhava como cobrador de ônibus. “Minha rotina é levantar entre 5h30 e 6h, preparar minhas coisas – minhas pernas e minha bike – e ir treinar ciclismo, natação, capoeira, musculação. É assim de segunda à sexta”. Entre uma acelerada e outra a bordo do A3 Attraction, protegidos por uma excelente acústica no interior do veículo, Dantas vai me contando sua rotina e seus planos. “De sábado e domingo, costumo dizer que essa aqui é a minha casa”, aponta ele para a Estrada Velha e para a Represa Billings, locais em que pratica suas atividades de competição. Ele pisa mais e a estrada ganha outros contornos. “Esse carro é fantástico! Macio, não se ouve barulho nenhum!”. “Meu treino aos sábados começa às 7h30 e termina às 11h. Tenho metas, afinal. Venho de provas rápidas, mas estou mudando esse perfil. Quero fazer provas longas, como a Ironman”. Edson participará de seu primeiro meio Ironman, em Miami. Trata-se de uma prova composta por 1,9 km de natação, 90 km de ciclismo e 21 km de corrida. “Estou me preparando para, em 2018, fazer o Ironman no Havaí. É meu sonho!”, adianta ele, sobre a prova completa, que exige dos competidores força física e psicológica para vencer 3,8 km de natação, 180 km de ciclismo e 42 km de corrida. O triatleta não irá para Miami nem para o Havaí de Audi, mas se depender do combustível dele – a alegria – as provas já estão no bico. D+ Confira o vídeo com o test drive em: www.revistadmais.com.br/Ed15_testdriveexclusivo

Na vida, a gente tem que ter essa atitude: ter vontade, querer fazer Edson Dantas

Edson Dantas: a alegria é seu maior combustível

Revista D+ número 15


PERFIL

Kenia Maria de Souza

não é documento A realidade de uma jovem mãe solteira não é fácil, mas é agravada quando inclui uma deficiência. Conheça a história da advogada com nanismo que conseguiu dar conta do recado texto Mayra Ribeiro

K

enia Maria de Souza Rio, 52 anos, é a segunda de sua família com nanismo. Mesmo o pai sendo anão, os médicos da década de 1960 disseram para o casal Souza Rio que os filhos não nasceriam com nanismo. Erraram as previsões. Jovial e ativa, Kenia bateu um papo com a Revista D+ para contar sua trajetória de aceitação, alegrias e muitas vitórias. “Como o meu pai nasceu anão por uma mutação genética, os médicos acharam que não tinha a possibilidade de terem filhos com nanismo. Quando o meu irmão mais velho nasceu, pensaram que foi obra do acaso. Para o meu nascimento estavam esperando que o raio não caísse duas vezes no mesmo lugar. Mas caiu. O meu irmão mais novo foi o terceiro”, revela a advogada carioca. Hoje, a família de Kenia está na quarta geração de nanismo acondroplásico – deficiência que impede o desenvolvimento do comprimento dos ossos. O filho dela, Frederico de Souza Rio, 28, trabalha como técnico de informática em uma multinacional e teve o Bernard Costa Rio, que agora está com quatro anos. Todos com nanismo. “A família está entre as principais coisas da minha vida. Ser mãe é uma grande realização. Ser avó é duas vezes mais”.

JUVENTUDE, PRECONCEITO E AMOR Durante a infância e adolescência Kenia foi acolhida tanto pela família como pelas pessoas próximas. “Naquela época a palavra nanismo não era nem muito falada. As pessoas eram educadas. Existia preconceito? Sim, mas era aquele que você não vê. Eu tinha amigos, porém, era a menininha que não namorava. Eu tinha um namorado imaginário como defesa, para não ficar de fora, e continuava chateada”. Essa situação começou a mudar aos 18, quando a advogada namorou pela primeira vez. A relação não durou, mas ainda são amigos. “Em questão de relacionamento eu me resguardo. Percebi que muitas pessoas se aproximam com outras intenções. Fetiche pela pessoa com deficiência existe e acontece. Chega a ser absurdo. Portanto, costumo me relacionar com amigos”. Quanto ao pai de Frederico, Kenia o conheceu no último ano da faculdade de direito. “Foi um amor à primeira vista que durou dois anos. Não chegamos a casar, mas moramos juntos”. Em um ano e meio de relacionamento uma gravidez inesperada foi descoberta, o que afetou o casal. “Durante o sexto mês de gestação descobri que o meu filho teria nanismo. ‘Coincidentemente’ o meu ex-marido, de

estatura padrão, disse que não estava pronto para ser pai e foi embora. Nunca me interessei em saber se esse foi o motivo para ele ter me abandonado. Mas talvez tenha sido covardia porque quem sofre mais preconceito em um casal com uma pessoa com deficiência é o sem deficiência”. A NOVIDADE DE SER MÃE Mesmo sem ter planejado a gravidez, Kenia ficou feliz com a novidade. “Todo mundo pensa em ser mãe, eu não queria naquele momento, mas aconteceu”. Apesar de o pai da criança ter ido embora, ele ofereceu ajuda financeira. A advogada se recusou a aceitar porque, aos 23 anos e com 1,25 de altura, tomou a decisão de criar o filho sozinha. “Eu não tive medo. Tenho uma vantagem sobre as outras mães que têm filho com nanismo. Além de ter também, há mais casos na minha família. Eu não tive

Ser mãe é uma grande realização. Ser avó é duas vezes mais Kenia


Kenia, aos 52 anos, com o neto Bernard, de quatro anos: jovialidade e identidade resolvida

Revista D+ nĂşmero 15


PERFIL Reunião de batizado: “A família está entre as principais coisas da minha vida”. De camiseta cinza, Frederico, o filho de Kenia, pai de Bernard

um sofrimento de primeira viagem”. Frederico nasceu em 31 de janeiro de 1989, um dia após a formatura na faculdade de direito. “Ele nasceu por cesariana com oito meses. Acho que foi por conta da emoção que eu senti ao me formar”. Durante a gestação, Kenia adquiriu diabetes gestacional e, além de acompanhamento médico, precisou fazer uma dieta rigorosa para prezar pela saúde e evitar o sobrepeso. Ao todo engordou apenas sete quilos. Outra dificuldade no período da gestação foi a de encontrar um hospital preparado para o parto de uma pessoa com nanismo. “A anestesia precisa ser dada na dosagem correta, se não, nós apagamos e não voltamos”. O hospital ideal para a advogada era a Casa de Saúde São José, em Humaitá, Rio Janeiro. Mas não era coberta pelo convênio. Como solução, Kenia vendeu o carro no valor de R$ 15.000 para pagar a assistência necessária. Com a anestesia aplicada, a mãe não conseguiu acompanhar o nascimento do filho porque acordou apenas no dia seguinte. Por ter sido uma mãe jovem, Kenia teve bastante disposição com o Frederico. “Em menos de um mês do parto, voltei a trabalhar. Sou autônoma, então, tive que trabalhar para sobreviver. A minha mãe me ajudou a cuidar dele. No pouco tempo que tínhamos conseguíamos aproveitar bastante. Íamos para praia, cinema, shopping. Fui muito amiga do meu filho”.

PARA O ALTO E AVANTE Preocupada com o desenvolvimento de Frederico, a advogada o colocou em atividades físicas como a natação e o jiu-jitsu desde criança. “A natação é um esporte sem impacto, indicado para melhorar a respiração e dar estabilidade à coluna. É uma boa forma de fazer alongamento também. Enquanto que a luta entra na necessidade que a pessoa com nanismo tem de sempre praticar exercício para evitar o sobrepeso”. Por outro lado, apesar de sempre estar ao lado do filho e prestar os cuidados necessários, Kenia diz que ser uma mãe jovem interferiu na criação de Frederico. “Eu era imatura, não tinha tanta experiência e nem bagagem para lidar totalmente com a questão da deficiência. Eu ajudava o meu filho quando ele vinha até mim, mas não o preparava para a abordagem que a sociedade poderia impor, até mesmo porque naquela época as ofensas não eram tão intensas como são agora”. Hoje, a advogada é presidente da Associação de Nanismo do Rio de Janeiro e representante nacional do movimento. “O nanismo é a deficiência que mais sofre preconceito

O nanismo é a deficiência que mais sofre preconceito porque a nossa imagem está atrelada a lendas urbanas e aos anões de histórias infantis Kenia

porque a nossa imagem está atrelada a lendas urbanas e aos anões de histórias infantis. Com o desenvolvimento da tecnologia, as formas de ofensa contra a pessoa com o nanismo aumentaram. Por essa razão, me preocupo muito com o meu neto e acompanho a sua criação”. Neste mundo de intolerância, a mãe-avó ressalta a importância do apoio familiar e aconselha: “Façam o melhor para os seus filhos. A deficiência não é nada. Eles são apenas pequenos, mas são independentes”.D+


Revista D+ nĂşmero 15


POR DENTRO DAS GRANDES

Lá no meu setor, o pessoal me chama de ‘Garoto EPI’, de tanto que eu falo da importância de usar o equipamento de proteção Charles Jeferson Moraes Vargas, oficial de serviços gerais, com deficiência intelectual


Engajamento pela inclusão Estruturada em cinco pilares que pautam a diversidade organizacional, a empresa Sodexo se empenha em buscar caminhos que tragam uma inclusão efetiva e de qualidade a todos os seus funcionários texto Brenda Cruz

“N

unca tinha trabalhado com carteira assinada, eu cuidava de crianças. Consegui pela Apae a entrevista na Sodexo. Estou há quatro anos trabalhando na cozinha da Avon; fico na rampa, tiro as comidas, limpo o balcão, depois eu coloco os talheres, conto as conchas para pegar a comida, todos os dias de segunda a sábado”, relata Fernanda Claudio, 41 anos, com deficiência intelectual. A empresa Sodexo é muito conhecida no Brasil pelo cartão de benefícios de refeição, no entanto, ela é dividida em duas categorias: Sodexo On-site e a Sodexo Benefícios e Incentivos. A Revista D+ foi conhecer o trabalho de inclusão para os funcionários com deficiência da Sodexo On-Site, que leva cozinhas industriais e serviços de limpeza, manutenção e jardinagem aos seus clientes. A multinacional francesa está há mais de 50 anos atuando mundo afora e há 35 no Brasil, tem cerca de 35 mil colaboradores em todo o território nacional. São duas mil unidades e 850 empresas/clientes onde chegam a atender quase dois milhões de pessoas por dia. Ainda longe de atingir os 5% da cota de funcionários com deficiência exigida pela legislação, a Sodexo On-site conta com 540 colaboradores com deficiência, cuja maioria é de profissionais com deficiência intelectual: 40,5%. “Temos uma meta para os próximos três anos, para conseguirmos fazer essas contratações, mas o foco é incluir de fato, reter os colaboradores. A questão não é contratar apenas pela cota”, diz Andréia Dutra, diretora de RH da Sodexo On-site. Para essa reportagem, convidamos três pessoas com deficiência intelectual que compõem o quadro de funcionários que trabalham nos clientes da Sodexo. Wellington Ferreira da Rocha, 36 anos, trabalha com Fernanda no mesmo setor da cliente Avon, é muito mais tímido e retraído. Com poucas palavras, ele apenas fala que gosta de trabalhar na empresa. “A gerente Márcia é um sonho. Não posso falar mal de ninguém, os meninos brincam com a gente. Tem o Jerônimo, que fala: Vocês estão rindo, né! Isso é um desfile de moda? Eu falo: Não, isso é uma conquista de muitos anos,

fotos Sterfane Cardoso

porque para as pessoas que não têm deficiência é diferente. Quem entra como nós entramos é outra coisa. Eu gosto do que eu faço”, explica Fernanda. Compondo ainda os funcionários que trabalham diretamente na casa dos clientes, Charles Jeferson Moraes Vargas, 35 anos, esbanja alegria com um sorriso largo. Ele é oficial de serviços gerais no Itaú. “Eu faço de tudo, fico na lavagem de caixa, de carrinho, às vezes na cozinha, na caldeira, fico no paneleiro quando precisa, na devolução... Quando eu estou na parte de prato e de bandeja, fico um pouco apavorado, porque é muita coisa e passa muito rápido. Mas dá tudo certo, a equipe é maravilhosa”, conta Charles. Há seis anos na empresa, ele se orgulha de levar os ensinamentos passados para a segurança dos funcionários. “Lá no meu setor, o pessoal me chama de ‘Garoto EPI’, de tanto que eu falo da importância de usar o equipamento de proteção”, comenta.Charles conta que tinha parentes que não acreditavam em seu potencial. “Eu fui conseguindo o meu espaço, meus objetivos, estou super feliz! Eu procuro sempre valorizar a minha mãe, pois ela fez muito pela gente”. PARA O FUTURO Recém-contratado na empresa, Djalma Scartezini, gerente do programa de Diversidade e Inclusão da Sodexo, chegou no último mês de março e está em processo de imersão na rotina, iniciando o desenvolvimento de estratégias no grupo. Com sete anos de experiência na área de RH, Scartezini, que tem deficiência física, afirma que inclusão não é algo fácil. “Você não faz inclusão sem relação. É preciso conhecer as pessoas. Inclusão não é só colocar a pessoa porta adentro, mas é buscar promover o crescimento e desenvolvimento profissional e pessoal de cada um”, comenta. Andréia Dutra, diretora de RH, afirma que diversidade e inclusão fazem parte da mentalidade da empresa em escala global. “Temos uma vice-presidente mundial de Diversidade e Inclusão que responde diretamente ao nosso CEO Global, tamanha a importância que damos à diversidade dentro da organização. Para nós, diversidade é um valor”, afirma. Revista D+ número 15


POR DENTRO DAS GRANDES Wellington, Charles e Fernanda: os funcionários com deficiência intelectual da Sodexo atuam nas cozinhas dos clientes Avon e Itaú

Andréia Dutra, diretora de RH: “Para nós, diversidade é um valor”fez surgir o detector de som através de vibrações, para deficientes auditivos

Djalma Scartezini, gerente do programa de Diversidade e Inclusão

Andréia Dutra, diretora de RH

exercem a mesma função. “Uma pessoa com deficiência não necessariamente é menos produtiva do que alguém dito normal. Ela valoriza o trabalho, dificilmente falta, então, temos um índice de absenteísmo muito menor. Se você mudar a atividade, por exemplo, de alguém que atua na área interna da cozinha, como a higienização de panelas ou de bandejas, colocando-a em contato com o cliente, ela sente como se fosse promovida, tamanho valor que dá”. Ela ainda revela um grande ganho que boas práticas realizadas nos treinamentos técnicos geraram para a companhia. “Os nossos treinamentos, que ensinam como lavar a salada ou limpar determinada área, são traduzidos para Libras, com isso, ganhamos um prêmio Global e foi considerada uma boa prática para ser aplicada em outros países”. A Libras, inclusive, é ensinada a gerentes e colaboradores de uma unidade que irá receber pela primeira vez um colega surdo, para que possam interagir com esse profissional.

“Eu quero primeiro acolher essa pessoa, ver quais são as necessidades que ela tem para se desenvolver, para depois dar condições de igualdade, através de ações de equidade no todo”, diz Djalma. Andréia conta que a matriz da empresa, na França, passou por algo parecido com a Lei de Cotas da legislação do país, mas que hoje já conseguiu cumprir 110% da cota. “Isso é uma motivação para nós, pois você percebe que não é impossível, e o Djalma veio nos ajudar, trabalhar junto dos nossos parceiros para que consigamos fazer a inclusão dessas pessoas e ter a nossa empresa ainda mais diversa”, acredita ela. A diretora de RH aponta que muitas vezes ainda existe certa discriminação dos próprios clientes em receber grupos de minorias. “O preconceito não está atrelado ao pensamento de desabilidade da pessoa; é o caso claro, por exemplo, dos LGBTs. Nós ainda temos algumas resistências, que vamos trabalhando ao passo que educamos o nosso cliente”. Andréia aponta que não há na organização nenhum tipo de diferença salarial entre pessoas com e sem deficiência que

TALENTOS, INCLUSÃO E ACESSIBILIDADE Analista comercial e há sete anos na empresa, Denise Morelo, 37 anos, trabalha na área de Energia e Recursos, que atende locais muitas vezes remotos, como, por exemplo, plataformas de petróleo. “Pra que CEP, não é mesmo?”, ela brinca. Denise teve paralisia cerebral no nascimento, após complicações no parto. Sua mãe teve choque anafilático, alergia à anestesia. “A paralisia só foi descoberta mesmo quando eu comecei a engatinhar, porque eu só ficava com a mãozinha direita para dentro. Os médicos que me acompanharam a vida toda sempre falaram que a sequela foi muito pequena”, comenta. Sua experiência em alimentação vem desde a sua formação acadêmica em nutrição, com pós-graduação em administração e finanças. “Eu acho que o Djalma e o Natan têm mais dificuldade física do que eu. Meu caso é mais no equilíbrio, eu não consigo descer, por exemplo, uma escada com um copo na mão. Mas eu não sinto a necessidade de tanta adaptação ou apoio”. Sobre as adaptações necessárias para o dia a dia, Denise afirma que só o seu mouse é do lado

Nossos treinamentos técnicos são traduzidos para Libras. Ganhamos um prêmio Global e foi considerada uma boa prática para ser aplicada em outros países


Nathan Baroukh, analista de TI

Denise Morelo, analista comercial, cuida da área de Energia e Recursos

A Sodexo conta com acessibilidade em todas as suas dependências

esquerdo. Seu plano dentro da empresa é ir galgando novos desafios e crescer ainda mais. “Eu mudei para Analista de Recursos e Energia em setembro, e isso foi um ganho enorme. Eu fui para o Canadá fazer treinamento, cresci muito. Planos todo mundo tem! Como eu estou na área comercial, a próxima etapa seria ser gerente. Eu não tenho tantas pretensões em ser gerente, prefiro alguma outra coisa na área administrativa, mas se esse é o caminho, e está correndo para isso, esse é o futuro”. E é o que Manuel Azevedo, gerente comercial e gestor de Denise, acredita. “Ela é uma profissional de alta performance e que não demonstra nenhuma dificuldade. A deficiência dela nunca se mostrou um empecilho para a realização de um bom trabalho. Temos projetos para o futuro dela dentro da empresa, com a certeza de que ela está preparada e que terá pleno êxito nesses novos desafios”. Sobre o projeto de Diversidade de Inclusão na empresa, ela afirma que a organização está quebrando alguns tabus. “Não é porque a pessoa tem uma deficiência que é incapaz,

Eu fiquei surpreso aqui. Vi muitos deficientes em várias áreas: na cozinha, em operação e em cargos de gestão Nathan Baroukh, analista de TI, com espondilite anquilosante

40,5% INTELECTUAL

27,5% FÍSICA

21,8% AUDITIVA

PROFISSIONAIS COM DEFICIÊNCIA DA SODEXO ON-SITE

6,9% VISUAL

1%

2,1% REABILITADO

MÚLTIPLA

Revista D+ número 15


POR DENTRO DAS GRANDES OS CINCO PILARES DA DIVERSIDADE

MULHERES NA SODEXO

DIVERSIDADE ÉTNICA

QUATRO GERAÇÕES

a gente tem que separar isso, cada um tem sua limitação, tendo ou não deficiência”. O personagem mais novo dessa entrevista está há quase dois anos na empresa, como Analista de TI. Nathan Baroukh tem 26 anos e tem uma condição chamada espondilite anquilosante, segundo ele, em termos práticos, é uma artrite, com uma dor que caminha e todos os dias tem alguma coisa inflamada, associada com dor crônica. “Este é meu primeiro emprego, além do estágio que fiz em outra empresa. Na época eu nem tinha sido diagnosticado com a doença ainda, porque ela se desenvolve geralmente dos 17 aos 18 anos e eu só fui descobrir com 21. Eu achava que era só sedentarismo, mas começaram a me dizer que não devia doer para subir escada ou ficar de pé por muito tempo”, relembra. Nathan conta que a empresa forneceu uma cadeira diferente do padrão usado pelos funcionários, para ajudar na dor nas costas, já que sofre constantemente de inflamações na coluna. “Eu tenho uma bengala, nem sempre eu uso, mas estou sempre com ela à vista, pois existe um componente de fadiga na doença, então tem horas que começa a bater um cansaço bem forte e acaba que eu preciso dela”. O jovem conta que todo o prédio oferece recursos de acessibilidade e que isso o ajuda muito na mobilidade. As rampas, o elevador e a instalação recente de um corredor entre as escadas na entrada o ajudam bastante. “Eu fiquei surpreso aqui. Vi muitos deficientes físicos, muitos deficientes em geral em várias áreas: na cozinha, em operação, em cargos de gestão. Eu me sinto um pouco estranho de andar por aí com bengala, mas aqui realmente me fizeram sentir bem acolhido”, diz. A empresa também flexibiliza a questão de horários e, se o funcionário precisar, pode trabalhar de casa. “Como é uma doença de dor crônica, às vezes eu acordo muito ruim, e eu tenho a opção, nesses casos, de levar o notebook e trabalhar de casa”, conta Nathan. Hilario Jacob Sinkoc, gerente da Plataforma Técnica e gestor de Nathan, comenta sobre o desempenho do funcionário. “Nathan me impressionou desde a entrevista, pela sua competência e não pela sua deficiência. Todos temos nossas limitações, mas o que precisamos é focar no potencial de cada indivíduo”.

PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

ORIENTAÇÃO SEXUAL

Trabalho em equipe: Charles, Andréia, Wellington, Fernando e Djalma

Assim como Denise, Nathan ganhou uma vaga em um estacionamento conveniado. Ele que não teria direito à facilidade pelo nível do seu cargo, consegue se poupar do uso do transporte público na ida e volta do trabalho. “O estacionamento é aqui perto, tem um serviço de van, que faz o trajeto do estacionamento até aqui. Mas como parte do tratamento é o exercício, eu venho andando. São quatro quarteirões, não é especialmente perto, mas também não é uma odisseia. De qualquer forma, é bom ter o serviço disponível, porque já teve dias em que usei”. SOBRE CRESCER E ENGAJAR “Na nossa pesquisa de engajamento, nós obtivemos índices acima de 85% de satisfação no quesito diversidade. E isso não só nas áreas de suporte, mas também nas operacionais, o que nos deixa muito felizes. Pois nesse último ano aplicamos a pesquisa de engajamento para todas as 30 mil pessoas”, conta Andréia. Djalma enfatiza a importância da diversidade dentro de qualquer organização. “Isso é o pilar de um diferencial competitivo de qualquer companhia, e tem a ver com o potencial de sustentabilidade dela no futuro. Se eu não tiver um time mais diverso, eu não tenho inovação, não tenho bom relacionamento com as pessoas, não tenho engajamento. Então, quanto mais diverso for o meu time, melhor para a cultura organizacional. E isso em geral: com etnias, pessoas com deficiência, entre outras”. Se você ficou interessado, envie seu currículo para a empresa: diversidade.br@sodexo.com D+


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EU POSSO, TU PODES... ELES PODEM

O Design Universal é um conceito criado para beneficiar a todas as pessoas em suas mais específicas e diversas características, sejam elas temporárias ou permanentes. Não dar atenção a isso é desrespeitoso e ignorante – e fora da lei texto Taís Lambert colaboração Audrey Scheiner, Brenda Cruz e Mayra Ribeiro Ilustrações: Reprodução do livro Acessibilidade - Mobilidade Acessível na Cidade de São Paulo, da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida (SMPED)

“V

ocê já experimentou abrir uma porta com maçaneta de bolinha depois de usar creme hidratante nas mãos? Imagine, então, fazer isso carregando sacolas. Agora quer saber o pior? Em caso de incêndio, o metal aquece rapidamente e se torna impossível girar a maçaneta. O sujeito morre queimado porque não conseguiu abrir a porta, já pensou? As maçanetas em alavanca são muito mais democráticas e seguras. Podem ser acionadas com o cotovelo se as mãos estiverem ocupadas. Em uma emergência, qualquer objeto pode ser usado para empurrar a alavanca para baixo. Crianças, idosos, pessoas com artrite ou mobilidade reduzida nas mãos e até cães treinados podem abri-las. E elas são mais baratas”.

O exemplo acima é da jornalista Flávia Cintra, 44 anos, repórter da TV Globo, tetraplégica por causa de um acidente de carro em 1991, quando tinha 18 anos. Flávia também é coordenadora de programas da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, de São Paulo. Tudo o que ela disse encaixa-se no Design Universal, termo cunhado em 1985, nos Estados Unidos, pelo arquiteto Ronald Lawrence Mace – que teve poliomielite aos nove anos e usou cadeira de rodas até os 56, quando faleceu em 1998. Visionário, foi também designer de produto e educador, criando o Centro de Design Universal, na Escola de Design da Universidade Estadual da Carolina do Norte. Por Design Universal entende-se “a criação de ambientes e produtos

que podem ser usados por todas as pessoas, na sua máxima extensão possível”, segundo o próprio Mace. Ele influenciou tanto o conceito de desenvolvimento das coisas que acabou gerando uma transformação nos paradigmas dos projetos de design e arquitetura nacional e internacionalmente. “Design Universal é uma ideologia, uma forma de crer, agir e apreciar, na qual pessoas com deficiências na mobilidade e outras com deficiências na orientação pelo espaço construído servem de referência para soluções de acesso, uso, comunicação e participação social que atendam às necessidades de todas as pessoas, com habilidades, características e idades distintas”, explica Marcelo Pinto Guimarães, 58 anos, engenheiro-arquiteto e urbanista, professor universitário,

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pesquisador e consultor. Reconhecido na área, Guimarães dirige o Laboratório Adaptse, na Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que se dedica ao ensino, à pesquisa e aos serviços para a implantação da acessibilidade pelo Design Universal. “Mais do que um desenho, trata-se de desígnios, decisões conscientes e interligadas. O Design Universal pode ser entendido como uma linha de equilíbrio entre ética e estética. Não se pode compreendê-lo como campo específico de trabalho com minorias sociais, mas como uma forma evolutiva de decisões com valores morais de inclusão e com o uso apropriado e sustentável de tecnologia”, define ele, que também contraiu poliomielite e é usuário de cadeira de rodas, fez mestrado na Universidade de Nova York, em Buffalo, e doutorado onde Ron Mace atuava, na Universidade Estadual da Carolina do Norte, trazendo o tema com bastante profundidade para o Brasil. Para ser universal o design precisa atender com eficiência a todas as pessoas, independentemente de sua habilidade, idade, estatura ou condição física, sensorial e cognitiva. São projetos que se adequam aos diferentes indivíduos, não segregam e não carecem de adaptação. “Com essa mudança de paradigma, as soluções arquitetônicas, de produtos e tecnologia, são mais inclusivas, permitindo melhores condições de uso e percepção a todos, beneficiando diretamente aos que encontravam mais barreiras, porque suas necessidades não estavam contempladas”, explica Renata Lima de Mello, arquiteta e urbanista, educadora acadêmica com mestrado voltado aos temas da acessibilidade. O Design Universal deve ser aplicado na cidade, nas habitações, no lazer, no transporte, nos hotéis e similares, nos produtos e serviços. É vasto, abrangente e essencial, assim como a diversidade humana.

MAIS DO QUE UM DESENHO, TRATA-SE DE DESÍGNIOS, DECISÕES CONSCIENTES E INTERLIGADAS. O DESIGN UNIVERSAL PODE SER ENTENDIDO COMO UMA LINHA DE EQUILÍBRIO ENTRE ÉTICA E ESTÉTICA Marcelo Pinto Guimarães, engenheiro-arquiteto e urbanista, diretor do Laboratório Adaptse, na Escola de Arquitetura da UFMG

OS 7 PRINCÍPIOS DO DESIGN UNIVERSAL

1 2

USO EQUITATIVO - Propor espaços, objetos e produtos que possam ser utilizados por usuários com capacidades diferentes;

USO FLEXÍVEL - Criar ambientes ou sistemas construtivos que permitam atender às necessidades de usuários com diferentes habilidades e preferências diversificadas, admitindo adequações e transformações;

3

USO SIMPLES E INTUITIVO - Permitir fácil compreensão e apreensão do espaço, independentemente da experiência do usuário, de seu grau de conhecimento, habilidade de linguagem ou nível de concentração;

4

INFORMAÇÃO DE FÁCIL PERCEPÇÃO - Utilizar diferentes meios de comunicação, como símbolos, informações sonoras, táteis, entre outras, para compreensão de usuários com dificuldade de audição, visão, cognição ou estrangeiros;

5

TOLERÂNCIA AO ERRO (SEGURANÇA) - Considerar a segurança na concepção de ambientes e a escolha dos materiais de acabamento e demais produtos – como corrimãos e equipamentos eletromecânicos – a serem utilizados nas obras, visando a minimizar os riscos de acidentes;

6

ESFORÇO FÍSICO MÍNIMO - Dimensionar elementos e equipamentos para que sejam utilizados de maneira eficiente, segura, confortável e com o mínimo de fadiga;

7

DIMENSIONAMENTO DE ESPAÇOS PARA ACESSO E USO ABRANGENTE - Permitir acesso e uso confortáveis para os usuários, tanto sentados quanto em pé. FONTE: DESENHO UNIVERSAL – HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL, MANUAL DO GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO


DENTRO E FORA DO TRAÇO A ABNT NBR 9050, norma técnica de acessibilidade em sua terceira edição, revisada em 2015, estabelece critérios e parâmetros técnicos a serem observados quanto ao projeto, construção, instalação e adaptação do meio urbano e rural, e de edificações às condições de acessibilidade. “Não é uma tarefa fácil pensar em projetos modernos, que atendam às necessidades de todos os usuários com beleza e criatividade. É preciso ter pleno conhecimento das necessidades humanas, bem como de suas dificuldades, para que as soluções de projetos sejam eficientes. A acessibilidade não deve ser um apêndice, um ‘band aid’. No Brasil o uso do Design Universal é obrigatório desde 2004, pelo do Decreto Federal 5.296/04”, afirma Silvana

Cambiaghi, presidente e uma das fundadoras da Comissão Permanente de Acessibilidade (CPA), órgão colegiado da Prefeitura do Município de São Paulo vinculado à Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência (SMPED), com papel consultivo e deliberativo nos assuntos que incluem acessibilidade em edificações, logradouros, mobiliário urbano, transporte e comunicação, desde 1996. Nos últimos 13 anos, os edifícios públicos e coletivos tiveram que passar por reformas para se adequarem às exigências legais voltadas à acessibilidade. “Nesse processo”, ressalta Renata de Lima Mello, “entradas de prédios passaram a ter, além das escadas, rampas ou plataformas para vencer grandes desníveis. Também foram criados novos banheiros, com

entradas independentes e dimensões mais generosas, equipados por barras de apoio e outros acessórios que possibilitaram o uso seguro também às pessoas com restrição de mobilidade”. Autora do livro Desenho Universal: Métodos e Técnicas para Arquitetos e Urbanistas (Editora Senac), Silvana reforça que, quando se faz um projeto atendendo às necessidades espaciais, de alcance, manipulação e comunicação de pessoas com deficiência, isso também facilita a vida daqueles que não estão nessa condição. “Por exemplo, quando eliminamos um degrau da soleira da porta de um estabelecimento comercial, como bar, restaurante ou loja, pessoas com deficiência poderão entrar e também facilitará para uma pessoa idosa, além de permitir que tantas outras distraídas não tropecem

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no degrau. Essa é a ideia do desenho universal: não excluir e facilitar”. Por experiência própria, a arquiteta e mestra em Design Universal sabe do que fala. Desde os seis meses de idade Silvana tem deficiência física devido à sequela de pólio e usa cadeira de rodas. “Tenho muitas dificuldades, como, por exemplo, para entrar numa loja. Eu já comprei sapatos na calçada. Disse à atendente: ‘você vai me atender na calçada. Traga o sapato que vou experimentar aqui fora’”, conta ela sobre o degrau impeditivo na porta do estabelecimento. “Até esmola já recebi só por estar tentando transitar pela cidade, como todo mundo”. PALAVRA-CHAVE: AUTONOMIA Para Marcelo Pinto Guimarães, a prática do Design Universal implica em entender o contexto em que as pessoas utilizam o mobiliário, os espaços e equipamentos de modo que a autonomia e independência sejam respeitadas. “No Brasil, infelizmente, a inclusão de exigências legais e normativas para a prática do desenho universal não repercute em soluções eficazes e políticas efetivas. Prevalecem resistências e estigmas”, avalia o especialista. Um ambiente acessível de acordo com a norma técnica é aquele que atende a todas as obrigações previstas ali. “Temos duas normas técnicas de acessibilidade na questão da edificação: a NBR 9050, já mencionada, e a NBR 16537, que traz a questão da sinalização tátil, do piso tátil de alerta e direcional. Ser acessível hoje é seguir essas duas normas e a Lei Brasileira de Inclusão (LBI)”, esclarece Eduardo Flores Auge, 55 anos, arquiteto, engenheiro de segurança do trabalho e membro da Comissão Permanente de Acessibilidade. A equipe da CPA realiza vistorias – muitas vezes solicitadas pelo próprio Ministério Público – para checar o cumprimento das normas e oferece suporte técnico a arquitetos que estão

desenvolvendo novos projetos. É necessário que obtenham a aprovação da CPA. “O projeto chega, fazemos uma pré-análise e devolvemos indicando os possíveis prejuízos para a acessibilidade, que podem ser de vários tipos: desde um sanitário que não possui a largura correta para garantir o giro interno de uma cadeira de rodas até um piso tátil direcional, que obriga a pessoa cega a fazer movimentos robóticos em vez de permitir movimentos fluidos e naturais”, detalha Auge. Pela lei, todos os novos projetos devem apresentar acessibilidade. Os que foram construídos antes da norma necessitam de adaptação. Para Marcelo Pinto Guimarães, essa é uma das questões positivas. A exigência do desenho universal para todos os novos projetos e os investimentos em acessibilidade traz para as pessoas a necessidade de conhecerem mais sobre o assunto. No entanto, uma mudança cultural não ocorre por leis apenas, lembra Guimarães. Valores culturais positivos devem ser estimulados. “Como a visão predominante ainda separa e desvaloriza a deficiência como característica de pequenos grupos sociais, é necessário que políticas eficazes implementem processos inclusivos com forte investimento no controle de qualidade para a implantação da acessibilidade”.

“A VISÃO PREDOMINANTE AINDA SEPARA E DESVALORIZA A DEFICIÊNCIA COMO CARACTERÍSTICA DE PEQUENOS GRUPOS SOCIAIS” Marcelo Pinto Guimarães

COMO SERIA UM LOCAL COMPLETAMENTE ACESSÍVEL? • O ambiente tem espaços suficientes, mas não exageradamente grandes, para que diferentes pessoas possam encontrar conforto. • Esses espaços permitem que pessoas sentadas ou em pé possam executar qualquer tarefa sem necessidade de ajuda. • Há mobiliário variado para que cada indivíduo possa escolher o que lhe melhor agrade ou mesmo fazer pequenos ajustes com autonomia e independência, como controlar o funcionamento de equipamentos, janelas, cortinas, a regulagem de prateleiras, mesas e cadeiras. • A percepção desse ambiente é clara e nítida, além de acolhedora. As pessoas se movimentam com segurança e entendem facilmente a lógica de disposição das estruturas, instalações e mobiliário. • Nele, as pessoas sabem onde estão e como chegar onde desejam. • Há sanitários amplos, limpos e plenamente equipados com equipamentos de segurança em distâncias compatíveis com áreas de descanso e de socialização. • O ambiente totalmente acessível tem conexão direta com meios de transporte e inclui vagas de estacionamento para veículos adequados ao uso de cadeira de rodas na distância mais curta possível. • Em se tratando de espaços muito amplos, há dispositivos para o transporte interno acessível de modo que as vagas dos veículos de pessoas com deficiência na mobilidade estejam sempre disponíveis. FONTE: MARCELO PINTO GUIMARÃES (LABORATÓRIO ADAPTSE – UFMG)


CALÇADA: MISSÃO IMPOSSÍVEL Quando a pessoa com deficiência menciona a importância de uma calçada sem barreiras e em boas condições, ela aponta para algo que é, na verdade, necessário para todos. Boas calçadas beneficiam crianças que puxam mochila escolar com rodinhas, idosos, mulheres grávidas, mães e pais que empurram carrinhos de bebê, mulheres com salto alto, pessoas com mobilidade reduzida temporária – como as que estão fazendo uso de muletas ou bengala por um período, obesos, turistas puxando malas de viagem, e, também, pessoas em cadeiras de rodas ou com outras limitações.

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A ACESSIBILIDADE É COMO O SANGUE QUE CORRE NAS VEIAS, NÃO PODE HAVER INTERRUPÇÃO. VOCÊ ATRAVESSA NUMA GUIA REBAIXADA E, DO OUTRO LADO DA RUA, NÃO TEM RAMPA Silvana Cambiaghi, arquiteta presidente da Comissão Permanente de Acessibilidade

AQUI E ACOLÁ São Paulo foi uma das primeiras cidades do Brasil a trazer a questão da acessibilidade para o centro do debate. Logradouros, edifícios, endereços de lazer e cultura e o próprio transporte, incluindo os táxis acessíveis, são exemplos de inclusão pelo Design Universal. Há muito (m-u-i-t-o) para se fazer, levando em consideração que a acessibilidade não é só a rampa, o elevador, a calçada livre de barreiras, mas também passa por inúmeros outros aspectos, como a comunicação. Silvana Cambiaghi cita o exemplo do semáforo sonoro, ideal para pessoas cegas e com deficiência visual e que simplesmente não deslanchou na cidade. “É tão necessário e, ainda assim, raríssimo. Auxilia pessoas cegas, idosas, inclusive, quem anda olhando o celular. Um monte de gente já caiu no meu colo! Sério! Vão andando pelo meio da rua com os olhos na tela, não me veem lá embaixo, na cadeira e... bum!”. No Brasil ainda não existem processos, objetos, edifícios e cidades pensados de modo sistêmico com o Design Universal. Quem aponta para essa realidade é Marcelo Pinto Guimarães. “Complexos comerciais como shopping centers podem hoje ser mencionados como bons ambientes de acessibilidade para pessoas que usam veículos assistivos individuais, como cadeiras de rodas e carrinhos de bebê, mas podem ser problemáticos para pessoas com pouco equilíbrio e resistência física sobre o piso liso ou para pessoas com deficiência visual, perdidas entre aromas e sons variados”. Partindo para espaços particulares, o entrave é similar. “Há muito para ser feito em moradias construídas para a venda, como apartamentos e condomínios. As pessoas vivem presas em suas residências inacessíveis”, aponta Guimarães. Silvana Cambiaghi concorda: “É impraticável


O RETRATO DO INACESSÍVEL Eu precisei tirar uma foto para documento. Optei pela alternativa que sempre parece a mais rápida e acessível: o shopping! Depois de percorrer todos os andares, só encontrei o serviço instalado em cabines onde não é possível entrar com cadeira de rodas. A cadeira não entra e a câmera não pode sair! Então descobri que perto dali havia uma gráfica que oferecia o serviço de fotografia sem cabine. Três quarteirões esburacados depois, cheguei ao lugar e confirmei o serviço. Estaria tudo ótimo se a entrada não tivesse três enormes degraus. Resultado: voltei ao shopping, comprei papel fotográfico e imprimi em casa. FLÁVIA CINTRA, JORNALISTA, COM TETRAPLEGIA comprar ou alugar apartamentos. E todos nós podemos passar por algo: ficar doente, receber um parente idoso, quebrar uma perna. Essa preocupação com a acessibilidade deveria ser de todos. Afinal, qualquer pessoa pode passar por qualquer coisa ao longo da vida”, pontua. Alguns países avançaram muito no conceito do Design Universal; mas infelizmente essa referência não é para todas as regiões desses países, como explica Marcelo. “Algumas áreas rurais ou históricas ainda mantêm muitos problemas. O país com maior destaque é os Estados Unidos, principalmente pela grande escala de seu território. Países nórdicos como

Noruega e Suécia têm ótimos exemplos de inserção do Design Universal nos processos construtivos de edifícios e mobiliário. Países como Alemanha e Inglaterra têm histórica evolução do conceito juntamente com a prática de normas técnicas de acessibilidade. Japão pode ser citado como um dos poucos países em que o conceito de Design Universal foi absorvido como filosofia de suas empresas, como Toyota e Panasonic”. Para Silvana, que também já teve experiências fora do Brasil, o que mais a encantou foi a presença contínua da acessibilidade. “Não há interrupção, a acessibilidade existe nos edifícios, nas calçadas, no transporte. É como

veias: se você tem um êmbolo, o sangue para de correr. Na questão da acessibilidade acontece o mesmo: você está andando numa calçada e, de repente, acabou a acessibilidade. Como atravessar numa guia rebaixada e, do outro lado da rua, não haver rampa”, exemplifica. “Nos Estados Unidos, no Canadá e em vários lugares da Europa você consegue ter uma vida mais integrada e sanar todas as necessidades. Há também tecnologias melhores, com mais soluções”, finaliza. Na Irlanda e Espanha, segundo Renata Mello, também há trabalhos relevantes. “Lá, o Design Universal é aplicado em todas as escalas da vida”. Na opinião de Marcelo, no Brasil como no mundo, a evolução tecnológica de equipamentos assistivos deve ser promovida desde que tais equipamentos sejam inseridos de modo sistêmico com a evolução tecnológica dos equipamentos de uso geral. “Por exemplo, de nada adianta criar cadeiras de rodas inteligentes se os ônibus e os metrôs ainda funcionam como veículos obsoletos, as plataformas elevatórias são mantidas trancadas ou desligadas, ou ainda, os sanitários têm dimensões insuficientes e segregam os usuários”.

É PRECISO TER PLENO CONHECIMENTO DAS NECESSIDADES HUMANAS PARA QUE AS SOLUÇÕES DE PROJETOS S EJAM EFICIENTES. A ACESSIBILIDADE NÃO DEVE SER UM APÊNDICE, UM ‘BAN AID’ Silvana Cambiaghi Revista D+ número 15


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A (IN)FORMAÇÃO QUE DESENHA O FUTURO Há que se dizer: o Design Universal, seus conceitos e aplicações estão envoltos, ainda, por desconhecimento. Embora o Design Universal embase as soluções para a acessibilidade, o termo que ganhou notoriedade foi este último e não o primeiro. Na opinião de Marcelo Pinto Guimarães, que também é professor universitário, o conceito e suas aplicações devem ser tratados na escola, na formação do futuro cidadão. Já na formação de futuros arquitetos, a questão merece ainda maior apreço. “Infelizmente, nas escolas, o Design Universal é muitas vezes visto como simplesmente o desenho universal exigido em normas e leis”, afirma ele. Para Renata Lima de Mello, a incorporação do tema nas universidades avançou nos últimos anos, mas continua restrito aos conteúdos de normas técnicas. “Na busca por soluções mais criativas e inclusivas, observa-se alguns docentes refletindo sobre o tema de maneira mais aprofundada, mas é de forma pontual”. Outro profissional que a Revista D+ ouviu foi o arquiteto e urbanista Paulo Marcos Paiva de Oliveira, 68 anos, professor no Centro Universitário Planalto do Distrito Federal. Em Brasília, o que o professor nota como obstáculo que impede o Design Universal de ser mais trabalhado no ambiente acadêmico é “aquele presente em todo processo de mudança cultural de uma comunidade, de grupos profissionais e demais agentes envolvidos: precisa de tempo, elaboração de políticas e conscientização, além de divulgação e cobrança, que virão sempre aprimorar esse processo”. Para o professor, aprimorar a democratização dos espaços urbanos e inserir cada vez mais este conceito em sala de aula ajudará na construção de uma sociedade mais justa.

NO MEIO DO CAMINHO TINHA UMA PEDRA No geral, essa cidade não é acessível para a pessoa com deficiência. Para a pessoa cega, um degrau não é um problema, já que temos a bengala e conseguimos identificar. Mas às vezes estou andando e tem um degrau tão grande, mas tão grande no meio da calçada, que eu não sei se eu é que fui um pouco na diagonal e estou encontrando um muro. Além disso, os orelhões: com a bengala não é possível identificar aquele volume. Por outro lado, há algumas ruas, como a própria Avenida Paulista, que oferecem piso tátil, que é nosso referencial. Daí vem a educação das pessoas para não ficarem no meio disso, porque você está caminhando e acaba trombando com alguém que está parado lá, ou um ambulante que montou a barraca dele bem no caminho. Tem poucas coisas positivas na questão arquitetônica das ruas, cada esquina é um desafio. O que tem melhorado muito é a questão da atitude das pessoas. Eu estou na calçada para atravessar a rua e as pessoas ajudam, e isso é um fator positivo”. GUILHERME MAC NICOL BARA, 39, CEGO DESDE OS 15 ANOS POR RETINÓIDE PIGMENTAR. É GERENTE DE RELACIONAMENTO, DIVERSIDADE E SELEÇÃO NA FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO


PISADA NA BOLA Em um banheiro lindo, todo acessível para cadeirantes e ricamente decorado, eu não encontrava o botão de descarga do vaso sanitário. Procurei acima, abaixo, dos lados e nada. Pensei que poderia haver sensores e fiquei movimentando as mãos em torno do vaso. Nada. Intrigada, procurei até decifrar o enigma. O botão estava no chão. Sim, no chão. Era necessário pisar nele para disparar a descarga. Incrédula e sem alternativa, deixei o meu xixi lá parado e fui embora”. FLÁVIA CINTRA, JORNALISTA, COM TETRAPLEGIA

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DILEMAS DA COMUNICAÇÃO Quando eu vou ao apartamento de um amigo, lá estão o porteiro numa cabine escura de vidro filmado e um interfone. Sou surdo! A dificuldade de comunicação nesse momento é grande. E quando a pessoa moradora do apartamento é surda? Naturalmente, ela não atende ao interfone, então o porteiro liga para o zelador e, ele podendo, vai ao apartamento da pessoa para avisá-la. Enquanto tudo isso acontece, eu estou lá na portaria, aguardando... No cinema também há problemas, principalmente com filmes brasileiros, já que não há legendas. Eu nunca fui ao cinema assistir a um filme nacional. Também as crianças surdas carecem de intérpretes de Libras para o caso de animações. No caso de espetáculos: quero muito assistir ao Les Misérables, mas simplesmente não há acesso para o surdo ainda. Cresci assistindo aos musicais sem acessibilidade. Por outro lado, alguns pontos culturais na cidade, como museus e instituições, estão investindo em surdos e exigindo acessibilidade em toda a programação”. LEONARDO CASTILHO, 29, SURDO, EDUCADOR DO MUSEU DE ARTE MODERNA (MAM)

HÁ QUE SE PAVIMENTAR O CAMINHO Conscientização, valorização e respeito: o Design Universal aponta para uma direção óbvia e muito necessária à fomentação da igualdade de direitos. Ele é base e diretriz que confere às pessoas sua devida importância, por conseguinte, deve ocupar um lugar compatível com sua grandeza na educação, na formação cidadã, nas políticas públicas e na sociedade como um todo. “O Design Universal afetou minha vida durante meus estudos de pós-graduação no exterior. Tive poliomielite quando criança e cresci considerando normal que as barreiras existissem à minha volta. Nessa época, todos me afirmavam e eu acreditava que o problema estava em mim”, conta Marcelo Pinto Guimarães, que complementa: “Na dissertação de mestrado ficou evidente que era necessário à sociedade atuar sobre o que chamei de “paradoxos do acesso”, situações em que as soluções tecnológicas para acessibilidade obedeciam às exigências normativas, mas preservavam o preconceito e tornavam as barreiras ainda existentes simplesmente imperceptíveis”. Flávia Cintra, que citou o exemplo da maçaneta no início da reportagem, concorda e acrescenta outro fator: o custo. “O principal argumento para a falta de acesso sempre foi esse. Com a exigência do cumprimento das leis e a cada vez mais frequente presença das pessoas com deficiência em todos os setores da sociedade, transformações positivas vêm acontecendo diante dos nossos olhos. Mas é necessário aperfeiçoar o olhar e incorporar a inclusão na vida prática”, salienta. As populações estão envelhecendo – portanto, a demanda por acessibilidade será cada vez maior também –, e as novas gerações, por sua vez, “ganham” a oportunidade de não repetirem os enganos largamente já cometidos. “Tal transformação é cultural e


envolve uma mudança de valores para que o avanço da tecnologia ocorra com parâmetros de humanização das relações”, ressalta Marcelo. Na opinião do professor, “à medida que a deficiência que uma pessoa vivencia deixa de definir sua identidade, mais e mais pessoas perdem o medo e alcançam uma referência positiva sobre a humanização da existência em sociedade. Prevalece, então, a gentileza, o respeito, o amor ao próximo como a si mesmo”. De nada adianta a acessibilidade de calçadas, banheiros, pisos e barras. De nada adianta a acessibilidade de elevadores, transportes e rampas. De nada adianta acessibilidade arquitetônica sem o respeito e a empatia. O sentimento humano é parte fundamental desse traçado: sem ele, não adianta mudar a maçaneta, pois não haverá porta que se abra. D+

O PROBLEMA ESTÁ FORA, NÃO EM VOCÊ Fui muitas vezes tratado como inferior em situações vexatórias simplesmente porque a deficiência era evidente pela cadeira de rodas. O equipamento de mobilidade no espaço de uso público planejado para acessibilidade parcial e imperfeita parecia retirar de mim o essencial para o reconhecimento e o respeito como homem inteiro. Fui tratado como objeto; fui infantilizado como um ser passivo e assexuado. O conceito de Design Universal surgia naquela época. Procurei aprender onde e como poderia ser aplicado. Vi uma transformação no meu modo de agir e de pensar. Finalmente, entendi que o problema estava fora de mim, estava no contexto do desajuste entre meu desempenho e os recursos do meio. MARCELO PINTO GUIMARÃES

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VIVER BEM

Você já tentou algo novo Pole Dance, Core 360º adaptado e Sling Desk são modalidades e técnicas que fazem bem para o corpo, estimulam a prática da atividade física e elevam a autoestima texto Brenda Cruz fotos Divulgação e Arquivo pessoal

A

atividade física é necessária para todas as pessoas. Faz com que, além de se manter saudável, o corpo libere a endorfina, hormônio que dá uma sensação de bem-estar. Hoje, diversas modalidades e técnicas diferentes vêm se popularizando em escolas e academias e essas novidades são apreciadas por todos os tipos de pessoas. Nesta edição, traremos três delas pouco conhecidas que oferecem benefícios para o corpo, tanto de bem-estar quanto de elevação da autoestima, além de proporcionarem o bom desenvolvimento de atividades do dia a dia.


Entre giros e pernas para o ar “Agora eu tenho mais força e conheço mais pessoas por fazer aula com outras mulheres, além de ter a saúde melhor pela prática de uma atividade física”, afirma Jessica Pereira, 26 anos, que faz aulas de pole dance. Jessica é cega e pratica a modalidade desde o final de 2016 e, após ficar afastada devido a uma cirurgia no olho, retomou as aulas este ano. Ficou muito surpresa quando recebeu o convite da Federação Brasileira de Pole Dance para participar em uma apresentação na 5ª edição do Arnold Classic South America, evento que promove a saúde e qualidade de vida por meio do esporte, que contou com mais de 30 modalidades esportivas e 10 mil atletas. Ainda não reconhecida no Brasil como atividade física, a pole dance vem ganhando cada vez mais adeptas. Vanessa Costa, fundadora e presidente da Federação Brasileira de Pole Dance, diz que o objetivo da Federação, criada em 2009, é justamente legitimar a prática no país. “Tem que desmistificar a coisa da roupinha curtinha: a gente usa pouca

“Agora eu tenho mais força e uma saúde melhor” Jessica Pereira,dançarina de Pole Dance, cega

roupa porque precisa da pele para aderir na barra. A pole dance é uma atividade em que você vai desenvolver força, velocidade, destreza e flexibilidade trabalhando o seu peso corporal o tempo inteiro”, esclarece. A Arnold Classic South America é do ator hollywoodiano Arnold Schwarzenegger, que esteve no Brasil no último mês de abril para o seu lançamento. A assessoria do ator confirmou que ele assistiria a apresentação de pole dance e Vanessa avisou que ele teria uma surpresa. “Falei que tínhamos uma atleta com deficiência visual. Foi fantástico! Ele assistiu à apresentação e, logo depois, todos os seguranças já o estavam direcionando para a saída da arena, quando ele falou: ‘Não, eu vou para o palco!’. Por vontade própria, ele subiu no palco para cumprimentar a Jessica”, conta Vanessa. “Eu estou feliz, pessoas como você inspiram milhões de nós. Você foi uma das melhores coisas que eu assisti e quero que você volte todos os anos na minha feira”, disse o ator à atleta. Em 2016, Vanessa foi uma das organizadoras e participou do comitê de arbitragem no Campeonato Mundial, que foi realizado em Florença, na Itália. “Lá tinham duas atletas com deficiência: uma amputada e a outra com deficiência intelectual. Foi incrível!”. Ela afirma que o movimento paratleta já existe e é bem grande na Federação Internacional (International Pole Sports & Arts Federation). “Sabemos

da dificuldade que é para atletas sem deficiência realizarem as acrobacias e uma pessoa com deficiência chama muita atenção, deixa a gente consternado com a situação e querendo fazer alguma coisa para apoiar a fim de que evolua cada vez mais”. Amanda Zaidan, 31 anos, é formada em educação física, faz pole há seis anos e é professora de Jessica na cidade de Limeira, em São Paulo. Ela afirma que a pole dance pode ser praticada por crianças e adultos e que não há nenhuma restrição específica. “É uma atividade física bem completa, todos os músculos do corpo são trabalhados, melhora a coordenação motora, força muscular, flexibilidade, sem contar que faz muito bem para nossa autoestima por ser um esporte de superação, pois a cada aula é um novo desafio, e é isso que nos motiva”. A professora conta que teve receio no início, pois pensava que seria difícil adaptar as atividades à pessoa com deficiência, no entanto, percebeu logo na primeira aula que estava enganada. “A Jessica consegue executar os movimentos com mais facilidade que a maioria das alunas, ela tem uma coordenação incrível”. Amanda explica como realiza a aula: “Eu faço o movimento e fico parada na posição, e ela vai tocando enquanto vou explicando. Agora, quando há apresentações, eu faço marcações no chão com barbante em volta da barra para ela se localizar em relação ao público e à barra”, finaliza. Revista D+ número 15


VIVER BEM

Independência com treinamento funcional “A minha lesão é na altura da torácica, t4 e t5. O Core ajudou a estimular a musculatura que estava adormecida, fortalecer, melhorar o equilíbrio e a postura” Matheus Sampei, praticante do Core 360º adaptado Fazer a transferência do corpo para a cadeira de rodas, cama, carro ou ainda transpor pequenos obstáculos, como, subir e descer de rampas íngremes não são tarefas simples para a pessoa cadeirante. Pensando nisso, Artur Hashimoto, professor de educação física e personal trainer, desenvolveu o Core 360º adaptado, que é um sistema de treinamento funcional para cadeirantes, criado com base nos primeiros quatro dos nove pilares do Core 360º, fases 1/2/3/4, que podem ser classificadas respectivamente como: Preparação de Movimento, Agilidade e Velocidade, Preparo Muscular e Treinamento de Potência. Artur conta que o treinamento proporciona total independência para o cadeirante, além de ser eficaz em termos estéticos e na potencialização da performance esportiva. “Aqui temos cadeirantes que treinam para ganhar autonomia, uns para o controle da pressão arterial, outros para ter um corpo atlético ou, ainda, para

potencializar o desempenho no esporte, como por exemplo, na handbike, no basquete e golf sobre cadeira de rodas”. Em sua academia, que fica em São José dos Campos, no interior de São Paulo, os equipamentos e acessórios que utiliza para a realização do Core 360º adaptado são os mesmos de uma academia comum. Ele conta que prioriza a utilização dos pesos livres (barras, anilhas e halteres), alguns elásticos, fit ball, estações de cabo (Cross Over), entre outros. Hashimoto atenta sobre o treino em si: “Temos que tomar cuidado para não sobrecarregar os músculos e as articulações dos ombros, além, é claro, de ter conhecimento das complicações que um cadeirante pode ter no seu dia a dia”. Matheus Sampei, 38 anos, treina na academia de Hashimoto desde 2009 e conta como o treino o ajudou no cotidiano, após a lesão medular decorrente de um acidente de carro. “A minha lesão é na altura da torácica,

t4 e t5, ela é relativamente alta, então o controle de tronco ficou muito prejudicado. O Core ajudou a estimular a musculatura que estava adormecida e, através desse bombardeio de estímulos, conseguimos recuperar e dar mais fortalecimento, melhorar o equilíbrio e a postura”. O personal Artur ainda conta que qualquer cadeirante que tenha encerrado ou esteja encerrando o tratamento fisioterápico pode utilizar a técnica. Ele criou um curso para compartilhar seu trabalho com outros profissionais, além de postar semanalmente alguns vídeos que mostram partes do treino dos cadeirantes. “Acredito que cada vez mais, as pessoas com deficiência que utilizam cadeira de rodas buscam uma forma de se exercitar fora de uma modalidade esportiva. O Core 360º adaptado trouxe essa possibilidade: praticar uma atividade física dentro de uma academia ou estúdio sem vínculo com algum esporte”.


foto Taís Lambert

Ganchos e cordas para o alívio do corpo O Sling Desk é um método de origem alemã, muito utilizado na Europa, que consiste em suspender algumas partes ou todo o corpo do paciente através do auxílio de um conjunto de alças e cordas. A suspensão anula a força da gravidade, gerando uma grande sensação de relaxamento e bem-estar ao paciente, aliviando automaticamente a espasticidade, ou es -pasmos, as dores musculares, articulares e da coluna.

“Além de a suspensão anular a ação da gravidade, dessa forma reduzimos muito os espasmos dos indivíduos com lesões neurológicas” Ana Paula Abela, fisioterapeuta, sobre o Sling Desk

Dra. Ana Paula Abela é fisioterapeuta e explica que a técnica é facilitadora para profissionais da área da fisioterapia. “A própria suspensão do Sling Desk já é uma técnica por si só, podendo ser aplicada de forma isolada. Mas ela também complementa várias outras como: massagem, RPG e ATM, por exemplo, facilitando essas”. A suspensão permite ao profissional realizar, de forma mais eficaz e com menos esforço, manipulações articulares, musculares, na coluna vertebral e nos membros superiores e inferiores, através de descompressões, trações, mobilizações e alongamentos. “Além de a suspensão anular a ação da gravidade, dessa forma re -duzimos muito os espasmos e a espasticidade dos indivíduos com lesões neurológicas. Consegue-se trabalhar a parte posterior do paciente permitindo assim uma série de outras terapias”, conta Ana Paula. A atleta paralímpica Elizabeth Rodrigues Gomes, 52 anos, faz o uso do Sling Desk há um ano e aponta que os benéficos da técnica são excelentes. “É nítida a melhora na questão do equilíbrio, da mobilidade do tronco e principalmente o alívio na compressão

“É nítida a melhora na questão do equilíbrio, da mobilidade do tronco e principalmente o alívio na compressão da coluna” Elizabeth R. Gomes, atleta paralímpica, com paraplegia, sobre o Sling Desk da coluna”, diz a paratleta com paraplegia devido à esclerose múltipla. A fisioterapeuta ainda aponta: “O Sling Desk é muito indicado em casos de hérnia de disco da coluna, cervicalgias, dorsalgias, lombalgias, dores do nervo ciático, síndromes dolorosas de membros superiores e inferiores, quadril e mobilização em pacientes que apresentam espasticidade”, detalha, e reforça que pessoas com e sem deficiência podem fazer, não havendo nenhum tipo de restrição de idade ou público. D+ Revista D+ número 15


ACESSIBILIDADE

Apertem o cinto: transtornos à vista Nem sempre as situações estressantes em aeroportos são simples de resolver. Para as pessoas com deficiência, os transtornos podem vir embalados com muito mais “emoção” texto Audrey Scheiner

C

fotos Divulgação e Arquivo pessoal

orre-corre, checagem de embarque, informações equivocadas, voo perdido. Fazer uma viagem aérea pode ter seus momentos estressantes. Às vezes, resolver alguns problemas no momento da viagem é relativamente fácil, outras, mais complicado do que deveria. Mas, e as pessoas com deficiência? Como lidam com os imprevistos nos aeroportos? E as questões relacionadas à acessibilidade? Vamos especificar os questionamentos: como uma pessoa surda pode ser informada se os avisos do aeroporto são sonoros? Como uma pessoa cega pode se localizar imersa em tanta poluição sonora? As pessoas com pouca mobilidade têm ajuda disponível a qualquer momento? Aliás, todas as pessoas com deficiência recebem o mesmo tipo de apoio que pessoas sem deficiência? De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), desde 2009 existe uma regra que define os direitos dos passageiros com deficiência no Brasil, que era a Resolução nº 09 e foi alterada por uma mais moderna em 2013, a Resolução nº 280. Ela deve ser base para que tanto os aeroportos quanto as empresas aéreas tenham

uma estrutura que atenda as pessoas com deficiência. A esses passageiros, são garantidos todos os direitos que são conferidos aos usuários em geral. As empresas aéreas e os aeroportos devem ter um funcionário com ponto focal para atendimento das pessoas com deficiência, que deve receber treinamento especial e estar preparado para tirar dúvidas e auxiliar os clientes e também os funcionários da empresa. Porém, os contratempos com acessibilidade continuam corriqueiros. “O MAIOR PROBLEMA FOI A COMUNICAÇÃO” Com deficiência auditiva, a auxiliar administrativa Daniela Yamamoto, 32, tem o costume de viajar bastante. Em todas as suas passagens por aeroportos, o principal problema de acessibilidade que tem é a comunicação com os funcionários e a falta de avisos em relação a mudanças inesperadas dos voos. Um desses embaraços ocorreu em uma viagem que fez com um amigo Leonardo Castilho, 29, também deficiente auditivo, para a Holanda, em 2015. “O embarque era de noite no Aeroporto de Guarulhos e houve um atraso. Estávamos esperando para embarcar,


ACESSIBILIDADE NAS COMPANHIAS Em aviões, é extremamente necessário que tenha as seguintes acessibilidades: • Cadeira de rodas de bordo para locomoção nos corredores das aeronaves; • Toaletes adaptados para pessoas com deficiência, contendo barras para apoio; • Assentos com braços retráteis para facilitar a acomodação de cadeirantes; • Normas de segurança em braile destinadas aos que têm deficiência visual; • Filme autoexplicativo para pessoas com deficiência auditiva; • Treinamento das equipes de solo e voo para que possam atender em Libras. Fonte: Azul Linhas Aéreas

mas o portão não abria”. Daniela comenta que esperou por um determinado tempo e o portão continuou fechado. “Então, resolvemos perguntar a um atendente o porquê disso estar acontecendo e se houve algum problema. Ele nos informou que eles já tinham avisado sonoramente e que o voo seria cancelado. Como poderíamos ouvir?”, destaca Daniela. A companhia os levou a um hotel e eles receberam um e-mail informando que o voo seria pela manhã. “No final, o problema foi resolvido. Triste foi o funcionário da companhia não nos comunicar o transtorno antes”, comenta. Apesar de o caso em questão ter sido resolvido, Daniela diz que é preciso que tenham intérpretes de Libras e que estejam dispostos a ajudar de qualquer forma possível. “É necessário mais cuidado e preocupação das empresas, pois pode haver situações que não serão solucionadas tão facilmente, como por exemplo, um deficiente auditivo não estar atento ao horário, só ser chamado por alto falantes e perder o voo”, finaliza Daniela.

“Ele nos informou que a companhia já tinha avisado sonoramente sobre o cancelamento do voo. Como poderíamos ouvir?” Daniela Yamamoto, auxiliar administrativa, surda EXPERIENTE DOS ARES Ricardo Shimosakai, 49, morador de São Paulo (SP), cadeirante devido a um tiro que levou em um sequestro relâmpago em 2001, é diretor da empresa Turismo Adaptado. Desde 2004 nessa área, já voou para todos os estados brasileiros e para mais 25 países, embarcando e desembarcando em diferentes aeroportos, sendo passageiro de inúmeras companhias aéreas, conhecendo-as, além de discernir equipamentos e métodos de acessibilidade variados nesses locais. Experiente em viagens aéreas, Shimosakai afirma ter passado por vários problemas em aeroportos, um deles foi quando retornou de uma viagem que fez para a Argentina. “No aeroporto de Guarulhos (SP), fiquei esperando mais de Revista D+ número 15


ACESSIBILIDADE

HÁ MUITO O QUE MELHORAR O paulistano Adelino Ozores, 60, jornalista e consultor de acessibilidade, tetraplégico há 42 anos devido a um mergulho, comenta que, quando começou a voar, há 40 anos, não existiam equipamentos específicos e que as pessoas com mobilidade reduzida eram carregadas no colo pela escada. Com a inauguração do Aeroporto do Galeão (RJ), o embarque e desembarque utilizando o finger ficaram mais fáceis, e o equipamento foi instalado posteriormente nos principais aeroportos. Mesmo com aparelhos e tecnologias assistivas para ajudar na mobilidade – finger, ambulift, rampas etc – Ozores diz que uma “peça” continua falhando: a experiência dos agentes de solo. Ele enfatiza a necessidade de que os funcionários do aeroporto tenham um treinamento adequado para atender as pessoas com deficiência. “Em 2013, desembarcando no Aeroporto de Ribeirão Preto (SP), o condutor da cadeira de transbordo desequilibrou e a cadeira virou de lado, mas consegui segurar no corrimão evitando a queda lá de cima”. Segundo ele, a resposta da empresa é sempre a mesma: “Um monte de desculpas, afirmando que imprevistos acontecem, mas que irão comunicar os responsáveis para que tal situação não se repita”. O jornalista diz ser necessário os aeroportos adotarem maior fiscalização das companhias aéreas, além de incluir práticas e procedimentos internacionais. Também dispor de sistemas automáticos que, ao fazer o check-in, acione os setores responsáveis, avisando que há uma pessoa com deficiência naquele voo, priorizando assim os sistemas de embarque e desembarque.

Aeroporto de Congonhas: corredor de acesso para pessoas com mobilidade reduzida embarcarem nos voos, tradução de Libras para surdos e o ambulift para cadeirantes

uma hora o ambulift [carro-elevador], pois o avião parou na pista. Quando finalmente chegaram, disseram que a demora foi devido a haver mais oito cadeirantes na minha frente para desembarcar de outros voos”, relata. Por causa do problema, o transtorno perante os outros passageiros foi ainda pior. “Essa mesma aeronave voltaria para Buenos Aires, então prejudicou a todos que iriam pegar esse voo. Sem contar as altas taxas que a companhia aérea paga para ocupar a pista do aeroporto. Ou seja, todos saíram perdendo”. O diretor afirma que a falta de planejamento é o que mais causa problemas como esse. “A acessibilidade é feita sem profissionalismo, ou então com profissionais de baixa qualificação. No novo terminal do Aeroporto de Guarulhos, por exemplo, os pisos táteis são interrompidos por vários obstáculos, como, paredes e totens”. Ele diz também que contratar uma empresa ou profissional que não tenha experiência em resolver tais ocorrências resulta, na maioria das vezes, em soluções incompletas ou erradas. “Dessa forma, o serviço não terá função, pois o problema continuará existindo. Ser um arquiteto, por exemplo, não é garantia que ele conheça de acessibilidade”, comenta o diretor. Shimosakai também conta que já viu aeroportos contratarem serviços específicos para melhorar a acessibilidade do local. “Já vi alguns casos em que tiveram a preocupação de contratar uma organização de pessoas com deficiência para realizar esse tipo de adequação, porém a ONG entendia de acessibilidade e não de aeroportos, e o local não é um simples estabelecimento”, enfatiza. DE ACORDO COM A LEI Segundo informações da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), é disponibilizado aos passageiros com deficiência piso tátil direcional até o balcão de informações, piso tátil de alerta, sinalizações


Santos Dumont: ambulift por dentro, onde as cadeiras são fixadas para a segurança do transporte para embarque. Ao lado, banheiro acessível para pessoas com deficiência visual e seus cães-guias e ambulift preparado para transportar os passageiros cadeirantes.

táteis, elevadores, escadas rolantes, rampas de acesso, banheiros e bebedouros acessíveis. Ainda de acordo com a Infraero, informação de voos em Libras, sistema de som, monitores com informações atualizadas pelas empresas aéreas, equipes do aeroporto capacitadas no curso de acessibilidade e Libras, vagas exclusivas nos estacionamentos e no meio fio de acesso ao terminal de passageiros, longarinas reservadas, entre outras facilidades e serviços para promover uma viagem mais acessível, segura e confortável estão à mão de todos os tipos de passageiros. Randall Sáenz Agüero, diretor de Operações Aeroportuárias da Gol Linhas Aéreas, ressalta que são realizados treinamentos constantes para as equipes de tripulação e também atendentes de aeroportos. “Esses treinamentos contam com conteúdo abrangente sobre o assunto, além de instrutores capacitados e com conhecimento aprofundado do tema. De forma contínua, destacamos a prioridade à segurança e apoio aos clientes com necessidade de assistência e atendimento especial, para que nossos colaboradores atuem nas mais diversas situações nos aeroportos e aeronaves”, destaca Agüero. Cidikley Barbosa, assessor da superintendência de Gestão da Operação da Infraero, afirma que, durante os embarques e desembarques o aeroporto precisa além de estruturas físicas adequadas, também oferecer serviços, equipamentos, profissionais capacitados e tecnologias que promovam a acessibilidade durante todo o processo. “No aeroporto Santos Dumont (RJ), por exemplo, a Infraero recebeu da prefeitura municipal do Rio de Janeiro, em 2014, o selo Diamante de participação no projeto Rio Acessível”, comenta Barbosa. O assessor superintendente destaca que o terminal foi o único entre os 250 pontos analisados na cidade que obteve o certificado com esse grau, que significa mais de 90% de acessibilidade. “A iniciativa faz parte do projeto da Prefeitura do Rio que avaliou o nível de acessibilidade de pontos turísticos e museus, além dos locais de embarque

“A acessibilidade é feita sem profissionalismo, ou então com profissionais de baixa qualificação” Ricardo Shimosakai, diretor da empresa Turismo Adaptado, cadeirante e desembarque dos diferentes modais de transporte. O objetivo é facilitar o acesso a pessoas com deficiência”. É importante ressaltar que, para ter acesso a todas as facilidades disponíveis, o passageiro com deficiência precisa avisar com antecedência à companhia aérea as assistências necessárias para sua viagem. Dessa forma, a empresa poderá solicitar ao operador aeroportuário apoio, por exemplo, para priorizar uma posição de estacionamento da aeronave mais acessível, com acesso ao terminal por ponte de embarque, conector Elo, ou ambulift, dependendo do aeroporto de origem ou destino do voo. OUVIDOS ATENTOS Para uma pessoa com deficiência visual, os ouvidos são os próprios olhos. E quando se tem um cão-guia, a segurança torna-se mais vigente. O engenheiro de Revista D+ número 15


ACESSIBILIDADE

Aeroporto de Guarulhos: ambulift preparado para facilitar o deslocamento de cadeirantes para o embarquevibrações, para deficientes auditivos

SALAS SENSORIAIS PARA CRIANÇAS COM AUTISMO Todos sabem como é o ambiente de um aeroporto: altofalantes, luzes, pessoas correndo, falando alto. Agora imagina todos esses fatores sendo absorvidos por uma criança autista. Isso pode causar estresse e agitação. Pensando em evitar casos como esse, o aeroporto de Shannon, na Irlanda, produziu uma “sala sensorial” para crianças e adultos com deficiências intelectuais, como o autismo. A sala fica próxima ao salão de embarque e foi confeccionada para ser um lugar tranquilo, com parede ondulada e sistema de iluminação que muda de cor. Outros aeroportos também estão fazendo o mesmo, como em Myrtle Beach, Carolina do Sul, Atlanta e Geórgia. Em Londres, o aeroporto de Heathrow abriu uma sala calma em 2013, para famílias. Na Pensilvânia, o Aeroporto Internacional de Harrisburg oferece o programa Asas para todos (Wings for All em inglês), que permite às crianças com autismo e transtornos de processos sensoriais a simularem procedimentos de embarque para que saibam o que esperar quando fizerem uma viagem de verdade.

SERVIÇO Infraero: Possui um canal de ouvidoria para reclamações, sugestões, solicitações de informação ou elogios por meio do site www.infraero.gov.br ou telefone 0800 727 1234. O contato pode ser feito ainda por formulários que poderão ser preenchidos e entregues nos balcões de informações. Anac: O passageiro deve abrir uma reclamação com a empresa aérea e solicitar o ressarcimento de seu dano. Além disso, pode fazer uma denúncia para a Anac pelo telefone 163, pelo site www.anac.gov.br ou presencialmente nos principais aeroportos do Brasil.

“Os brasileiros sempre estiveram mais bem preparados para me guiar” Lucas Radaelli, engenheiro de software, cego software Lucas Radaelli, 25, curitibano, mas morador de Belo Horizonte, costuma viajar sempre para o exterior, principalmente América do Norte, na companhia de seu fiel labrador Timmy. Em relação ao cão, Radaelli afirmou nunca ter passado por algum problema. Porém, precisa ficar de ouvidos afiados às informações sobre seus embarques projetadas nos aeroportos por vias sonoras. “Recentemente, diminuíram propagandas nas informações, para o nosso conforto acústico”, comenta. Radaelli relata um problema que aconteceu algumas vezes, como em 2012, no Aeroporto Internacional de Miami e no de Newark, em Nova York. “Os funcionários esqueceram de me pegar na sala de embarque para ir até o avião, e, por pouco, não perdi o voo. Por isso, gosto de ficar atento às informações dos portões de embarque e horários dos voos. Eu preciso manter uma atenção redobrada nesse tipo de informação”. Em relação aos aeroportos brasileiros, o engenheiro diz não ter do que reclamar. Sempre teve o melhor atendimento. Esteve nos aeroportos dos Estados Unidos, de Portugal, da Alemanha e outros, mas os melhores atendimentos que teve foram aqui. “Os brasileiros sempre estiveram mais bem preparados para me guiar. O pior, na minha opinião, é nos EUA, por conta da insistência na cadeira de rodas para cegos, que não é necessária”. Radaelli afirma que os funcionários brasileiros, principalmente os que trabalham nos balcões das companhias aéreas, frequentemente têm experiência em guiar pessoas cegas. “Sempre me acompanharam muito bem. Mais de uma vez eu me impressionei com a qualidade do auxílio prestado”, finaliza. Tomara que em breve os cidadãos não precisem mais se surpreender com leis cumpridas. D+


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TECNOLOGIA ASSISTIVA

Entre lançamentos e personalidades A maior feira de tecnologia, reabilitação e acessibilidade aconteceu no mês de junho. Venha conferir os destaques da Reatech 2017 texto Audrey Scheiner, Brenda Cruz e Mayra Ribeiro

fotos Bárbara Jorge e Murilo Cosenza

A feira recebeu mais de 50 mil pessoas durante os quatro dias

O desfile de moda inclusiva encheu a quadra de brilho e novas propostas

Estandes charmosos e informações preciosas foram uma constante na Reatech


A ex-atleta Laís Souza fez muito sucesso pelos corredores do São Paulo Expo

O recordista das piscinas, Daniel Dias, no estande da Cavenaghi

A atleta de vela, Marinalva Almeida, testou o joelho biônico da Ottobock

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sporte adaptado, carros de última geração, tecnologia assistiva, cadeiras de rodas motorizadas, próteses e órteses, aparelhos auditivos e muito mais fizeram parte da vasta programação e das atividades oferecidas pela Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade (Reatech). Em sua 15º edição, ela se firma em mais um ano como a maior feira do gênero de toda a América Latina. Os quatro dias de evento reuniram mais de 300 expositores nacionais e internacionais, com foco nas inovações de tecnologia para pessoas com deficiência. Os mais de 50 mil visitantes também tiveram a oportunidade de fazer test drive em veículos adaptados, além de mais de 50 palestras de 30 diferentes temas que se dividiram nos espaços da Reamed, Reashow, Reasem e do Workshop Equoterapia. A Reamed tratou de temas ligados à medicina tradicional e terapias complementares em prol da qualidade de vida e socialização do paciente. Já o Reashow foi um espaço destinado ao acesso de conhecimento técnico,

Clodoaldo Silva, nadador campeão, no estande da Nissan

novas tecnologias e oportunidades de negócios; a Reasem foi a junção entre profissionais da saúde, idealizadores de tecnologia, educadores e administradores públicos, em prol da inclusão. O público ainda teve a oportunidade de cadastrar seus currículos para as vagas oferecidas às pessoas com deficiência em diferentes empresas, como Banco Bradesco e Senac, que contou com uma sala de entrevistas para os interessados. A feira foi muito animada e agraciada por presenças ilustres de paratletas, como os nadadores Clodoaldo Silva e Daniel Dias, que movimentaram o lugar. Além deles, diversas personalidades causaram frenesi nos presentes, como a Deputada Mara Gabrilli e a ex-atleta Laís Souza, que foram bem recebidas por todos. A Revista D+ foi a mídia oficial e realizou, durante os quatros dias de feira, o total de 42 reportagens para o portal e mais de 90 postagens no Facebook. Confira alguns dos destaques da Reatech: Revista D+ número 15


TECNOLOGIA ASSISTIVA

Quando a fofice torna-se auxílio Você sabia que jabuti, coelho, cachorro, coruja, arara e até mesmo bicho-pau são capazes de auxiliar o desenvolvimento motor e psicológico da pessoa com deficiência? Essa atividade é conhecida como terapia assistida por animais (TAA) e pode ser realizada tanto com animais domésticos quanto com os exóticos. Todos esses bichinhos encantaram o público na Reatech em um espaço diário chamado Fazendinha. Os cavalos na equoterapia também foram disputadíssimos. Estandes como o da Gati Equoterapia, Texas Ranch e Hípica Santa Terezinha enfatizaram o quanto os bichinhos são capazes de contribuir para a melhoria da qualidade de vida da pessoa com deficiência.

Clodoaldo Silva no lançamento do Nissan Kicks Clodoaldo Silva, 38, é nadador paralímpico aposentado e ícone do esporte, nacional e internacionalmente. Ele esteve presente no estande da Nissan e fez parte do lançamento do Nissan Kicks S Direct para a pessoa com deficiência. O carro, que antes era fabricado no México, passou a ser produzido no país, na planta de Resende, no Rio de Janeiro. Outros modelos também foram expostos na feira, como o March e o Versa, compactos, e o sedã médio Sentra. Para conhecer seus atributos e opções de adaptações, o público pôde fazer um test drive na pista da feira.

Acessibilidade e mercado de trabalho A principal divulgação feita durante os quatro dias da Reatech no estande do banco Bradesco foi o lançamento oficial do saque em Libras, para que clientes surdos possam usar o autoatendimento com autonomia e independência. Além disso, o banco promoveu a atualização de cadastro dos clientes com deficiência. O Bradesco também cadastrou currículos de visitantes que queriam participar dos processos seletivos, além de divulgar os diferentes serviços de acessibilidade ao cliente, como extrato e gabarito de cheque em braile e aplicativo de celular totalmente acessível.

Teclado Inteligente A Geares Tecnologia Assistiva tornou o ato de teclar mais simples para as pessoas com mobilidade reduzida e deficiências motoras mais severas. Além de possuir teclas grandes, o teclado inteligente Tix substitui todas as funções de teclados e mouses. Outro benefício da inovação é o fato de que o equipamento pode ser utilizado apenas com o piscar de olhos.


Montadoras promovem tests drive A maior sensação da feira foi com certeza os estandes das montadoras, que tomaram conta da São Paulo Expo. Volkswagen do Brasil, Chevrolet, Honda, Ford, Fiat, Hyundai, Toyota, Nissan, Renault e Jeep promoveram aos motoristas com e sem deficiência tests drive durante toda a feira.

Pegasus no estande da Cavenaghi No estande da Cavenaghi, uma novidade automotiva foi apresentada: o Pegasus Ecosport. O carro é a primeira solução de veículo acessível totalmente desenvolvida no Brasil. Direcionado a usuários de cadeira de rodas motorizada, oferece autonomia total ao possibilitar a entrada com a cadeira pela porta traseira, no grande corredor que se forma dentro do carro. Por meio de um controle remoto sem fio, o motorista opera os sistemas de abertura automática da porta traseira e da rampa de acesso ao interior do veículo, possibilitando que ele chegue até o volante e dirija sentado em sua própria cadeira.

Campeonatos esportivos O espaço esportivo da feira proporcionou diversas atrações. Uma das principais foi o jogo de basquete em cadeira de rodas. O time Magic Hands, da Associação Desportiva Para Deficientes (ADD), competiu com a AEDREHC CAY (Associação Esportiva da Divisão de Reabilitação do Hospital das Clínicas). A Magic Hands ganhou de 89 contra 31. Durante a feira, a quadra proporcionou gincanas com bicicletas, jogos de vôlei sentado e futebol.

Alternativa para a pessoa com deficiência visual Lysa, conhecida também como a cão-guia robô, foi uma das surpresas da Reatech. O equipamento é capaz de identificar os obstáculos terrestres e aéreos durante o trajeto. De acordo com Neide Sellin, diretora-executiva da Vixsystem, o aparelho de 33 cm de comprimento, 26 de largura e peso de 2,7 kg veio para somar aos modelos existentes no mercado.

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TECNOLOGIA ASSISTIVA

Mobilidade de última geração A Mobility Brasil, especializada na importação de cadeira de rodas e produtos para esse segmento, foi um dos destaques da Reatech por conta da variedade de equipamentos apresentados para todas as faixas etárias. O que mais chamou atenção no estande da empresa foi a cadeira de rodas motorizada. O equipamento tem um sistema de condução via cabeça, sopro e fibra óptica. Além dessa funcionalidade, a cadeira pode acionar comandos externos em sistemas eletrônicos e residenciais.

Inclusão e acessibilidade ao alcance das suas mãos Durante os quatro dias da Reatech você deve ter encontrado uma das repórteres da Revista D+ pelos corredores da feira, pois a mídia foi a escolhida para cobrir o evento oficialmente. Além de trazer ao leitor as últimas tendências em inclusão e acessibilidade, a D+ também foi expositora. Aproximadamente 7 mil visitantes conferiram produtos personalizados em Libras, ganharam brindes e assinaram a Revista, além de fazer lindas fotos em nosso totem.

Mais perto de você Água não é problema Já é possível que o joelho biônico entre em contato com a água e mantenha suas funções de movimento. Essa novidade trazida pela Conforpés – empresa especializada em soluções para próteses –, chama-se Genium X3 e foi desenvolvida pela Ottobock. Para testar o joelho biônico, a paratleta da vela e ex-BBB Marinalva foi a personalidade convidada pela marca.

A Tecassistiva, especializada no segmento da pessoa com deficiência visual e baixa visão, esteve na Reatech com produtos para esse segmento. O diferencial da empresa é o fato de que pode ser encontrada em plataformas populares de compras como Extra, Ponto Frio e Casas Bahia. Durante a Reatech, o seu destaque foi uma impressora que permite desenhar e imprimir a imagem em alto relevo.

Para mais informações sobre outras novidades apresentadas na Reatech 2017, entre em nosso site: www.revistadmais.com.br


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TERCEIRA IDADE

O silêncio e a sutileza

da depressão

Isolamento, perda de entes queridos e o abandono dentro da própria casa. A depressão, doença do século que atinge também a maioria da população idosa do país, pode ser contornada com apoio profissional e carinho da família texto Audrey Scheiner

R

etrair-se, isolar-se e calar-se. As décadas se passam à frente dos olhos e a solidão se assola enquanto se vive um capítulo marcante da vida. A depressão na terceira idade é um dos fatores mais recorrentes na vida dos idosos, residam eles em casas de repouso ou com seus familiares. Em idades avançadas, a maioria deles fica aos cuidados dos filhos ou parentes mais próximos. Porém, mesmo assim, a depressão pode se manifestar de uma maneira sutil e silenciosa. No Brasil, 5,8% da população sofre com a depressão, que afeta um total de 11,5 milhões de brasileiros. Segundo os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), este é o país com maior prevalência de depressão da América Latina e o segundo nas Américas, ficando atrás somente dos Estados Unidos, que têm 5,9% de depressivos. Segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD 2010), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de idosos no Brasil cresce em ritmo consistente e em um número maior do que o de pessoas que nascem.

SINTOMAS DA DEPRESSÃO • Tristeza duradoura; • Falta de interesse pelas atividades cotidianas; • Falta ou excesso de sono; • Agitação ou apatia; • Sensação de perda de energia; • Sentimentos ruins sobre si mesmo e sobre o futuro; • Alterações de humor; • Alterações de apetite.

Com isso, aumenta o índice de doenças no grupo de 21 milhões de brasileiros que têm mais de 60 anos. De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais, quase metade dos idosos do país (48,9%) sofre de mais de uma doença crônica. E uma das mais graves é a depressão, queixa de 9,2%. A notícia boa é que esse problema tem controle, podendo-se amenizar os sintomas e ter qualidade de vida. A psicóloga Vanessa Coutinho, escritora do livro Arteterapia com Idosos – Ensaios e Relatos (Editora Wak), diz que existem diversos fatores específicos para desencadear a doença em uma pessoa da terceira idade, como o abandono da família, diminuição dos compromissos sociais, sensação de improdutividade, perdas de pessoas queridas, e crescentes limitações físicas e/ou psíquicas. “A depressão na terceira idade tende a ser mais grave, com recuperação lenta. Em geral, o idoso toma muitos remédios, que podem gerar interações medicamentosas com os antidepressivos. Por isso, é muito importante estar atento aos primeiros sinais de que algo não vai bem”, enfatiza a psicóloga.

48,9% DOS IDOSOS sofre de mais de uma DOENÇA CRÔNICA. A depressão é a queixa de 9,2% Fonte: OMS e Síntese de Indicadores Sociais


Sinto falta do meu marido. Ele era maravilhoso, mas escondeu que tinha câncer na próstata. Não resistiu e faleceu. Foi isso que bagunçou a minha vida Maria de Lurdes, a Lurdinha

É muito importante estar atento aos primeiros sinais de que algo não vai bem Vanessa Coutinho, psicóloga

RAÍZES DO DIAGNÓSTICO Maria de Lurdes Rezende, 80, mais conhecida como Lurdinha, é residente da casa de repouso Viva Bem há um ano. A casa, que abriga apenas mulheres, é localizada no bairro Sumaré, na cidade de São Paulo. Ela, que tem início de Alzheimer, foi para lá depois do falecimento de seu marido, o ex-treinador de futebol Paulo Emílio (1936-2016). Maria comentou, em poucas palavras e comunicação lenta, que estava sentindo uma tristeza repentina. “Estou me sentindo triste hoje. Estou sozinha aqui e meu irmão vem me visitar um dia sim e um não...”. O quarto em que Maria de Lurdes fica é espaçoso e arejado. Tem um armário, duas cabeceiras e uma televisão embutida na parede em frente à cama, onde ela estava deitada, apoiada em dois travesseiros. “Tenho fibromialgia, sabe? Dói tudo em mim”, disse ela, em relação à dor que

11,5 milhões DE BRASILEIROS sofrem de depressão Fonte: OMS e Síntese de Indicadores Sociais

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TERCEIRA IDADE

“VIVA A VIDA! OS DIAS SÃO BONITOS E ALEGRES” Dentre as 26 senhoras residentes na Casa de Repouso Viva Bem, uma delas se destaca. Ao completar 104 anos em janeiro, Nair Costa Corrêa não tem o que reclamar da vida, a não ser uma coisa: querer voltar para casa. Devido a um acidente doméstico em setembro, Dona Nair, como é conhecida na casa, ficou estabelecida na casa de repouso para se recuperar. “Fui levantar a janela da sala e me desequilibrei. Caí e bati com o peito em uma cadeira que estava ali perto. Me cortei, mas já sarou, ficou apenas uma cicatriz”, conta a senhorinha. Quanto a ficar de vez na Viva Bem, Nair foi sincera. “Não gostaria de ficar por aqui, pois quero voltar para a minha casa. Meu filho quer que eu more com ele e a esposa, mas eu quero a minha casa”. Apesar do desejo, a centenária gosta muito do lugar onde está. “Aqui eu converso bastante com as outras pacientes. Conto muitas histórias da minha vida”, relata. Para Dona Nair, não existe tempo ruim. Diz que nunca teve depressão e que só tem por agradecer a tudo o que viveu na vida. “O que eu tenho a dizer é: jogue fora a sua depressão e viva a vida! Os dias são bonitos, faça da vida um dia alegre! Sem mágoas e sem nada, não é mesmo?”, enfatiza a senhorinha, com um sorriso largo no rosto.

BRASIL: 2º LUGAR (5,8% de depressivos) nas Américas, ficando atrás somente dos ESTADOS UNIDOS (5,9%) Fonte: OMS e Síntese de Indicadores Sociais

ATIVIDADES QUE MOTIVAM • Ensinar atividades na internet ou no celular; • Estimular leituras e jogos; • Sugerir tricô, crochê e pintura; • Incentivar para o exercício físico; • Delegar responsabilidades, para que se sintam úteis.

José Paulo e a filha Letícia: fortalecimento junto da família ameniza o quadro depressivo


Reunir todos em casa e incluir os mais velhos nos afazeres ajuda na atividade motora e cerebral deles Sofia Bauer, psiquiatra ocorre nos tecidos fibroso e muscular de diferentes partes do corpo. Ao relatar sobre o que mais sentia falta da vida fora da casa de repouso, a senhora foi enfática: “Sinto falta da minha casa e do meu filho, que mora no Canadá”. Após uma longa pausa, contou o que realmente a deixava melancólica, sem conter as lágrimas. “Sinto falta do meu marido. Ele era maravilhoso, mas escondeu que tinha câncer na próstata. Ele gritava muito de dor. Foi isso que bagunçou a minha vida. A gente se amava muito. Iríamos fazer 50 anos de casados. Ele não resistiu e faleceu. Eu fico muito triste. Tenho fé que vou me encontrar com o meu marido quando eu morrer”. AMENIZANDO AS FERIDAS Segundo a enfermeira chefe Vanessa Almeida dos Santos, 31, da Casa Viva Bem, o principal motivo para os idosos ficarem em casas de repouso é a falta de disponibilidade dos familiares de lidarem com eles. “A pessoa tem dificuldade de dar remédios e comida, e muitas vezes o idoso fica com receio de o parente lhe dar banho. Isso faz com que ele seja abandonado dentro da própria casa. É preciso fazer uma intervenção profissional de imediato”, enfatiza. Lurdinha chegou à casa muito reservada, não se comunicava com ninguém. “Eventualmente, ela gosta de ficar sozinha no quarto dela. Mas, com jeitinho, a gente a insere no grupo de senhoras da casa e ela fica no convívio com todas”, afirma Vanessa. A enfermeira comenta que, para amenizar os sintomas de depressão nas idosas do local, a instituição abriga uma equipe multiprofissional, com 19 funcionários. “Temos fisioterapia, terapia ocupacional, musicoterapia, e enfermeiros. Todo dia os pacientes lidam com um profissional diferente, além de tomarem os medicamentos devidamente prescritos. Isso estimula as senhoras a participarem de tudo, mesmo que elas não tenham o costume de interação. Esse ato ajuda bastante na comunicação”. Após a morte do marido, Lurdinha se sente melhor ao ficar na casa de repouso, pois a ajuda a esquecer um pouco a tristeza. “Aqui sou tratada muito bem. Faço ginástica, dança, canto e muitas outras atividades. Gosto de ficar no quarto rezando baixinho também”, relata a senhora.

FAMÍLIA: A BASE DE TUDO A depressão na terceira idade pode ser abrandada com paciência, respeito e apoio emocional da família. Entender o tempo e as limitações de um idoso é o essencial para que haja harmonia entre as relações dele com os parentes. A psiquiatra Sofia Bauer, autora do livro Cartilha do Otimismo (Editora Wak), afirma que o amor e a participação familiar são a base de tudo. “Reunir todos em casa e incluir os mais velhos nos afazeres que se sintam responsáveis ajuda na atividade motora e cerebral deles. Ou seja, que deem tarefas para os idosos, assim, se sentirão incluídos. Ensinar atividades na internet ou celular, estimular leituras, jogos, tricô, crochê, pintura, exercícios físicos é extremamente importante”, enfatiza a psiquiatra. A empresária Letícia Oliveira, 39, mora com o marido, um filho de quatro anos e o pai dela, José Paulo da Silva Paranhos, 74, cuja depressão afeta um pouco a família emocionalmente. “Apesar de ser um quadro complicado, a gente se fortalece em conjunto”, relata Letícia, contando que o pai tem depressão desde jovem, por motivos de irritabilidade, cansaço extremo e falta de vontade de realizar atividades comuns. Paranhos afirma que a doença foi diagnosticada há dois meses. “O que mais me deixou pra baixo foi a distância que meus amigos tomaram. Eles se isolaram”. Por morarem juntos, a ajuda no tratamento da depressão se torna mais eficaz. “Hoje ele toma remédio, ajuda em atividades domésticas, como passear com o cachorro, lavar a louça, a roupa e brincar com o netinho de quatro anos. Damos o suporte necessário para ele melhorar”, comenta Letícia. Ao dizer o que mais deseja para o futuro, Paranhos foi enfático: “Quero estar vivo e com saúde”. D+ Revista D+ número 15


PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Falar em público: uma situação envolvendo os Surdos e a Libras Ampliando a capacidade dos alunos no uso das práticas de linguagem e nas habilidades de leitura, escrita e oralidade texto Silvana Zajac* fotos Shutterstock


P

ensar em uma apresentação oral quando estão envolvidos alunos Surdos que usam somente a língua de sinais para se comunicar é algo desafiador, para não dizer quase impossível. Pois, nesse texto vamos ver que esses alunos também são capazes de aprender não só a fazer uma apresentação oral, como também a organizá-la. Primeiramente, precisamos definir que entendemos a expressão oral não simplesmente através da verbalização de ideias pelo aparelho fonador, mas também como um conjunto de elementos que colocará o corpo em funcionamento com o intuito de produzir um discurso que não seja pela via do sistema de escrita. Assim, entendemos que um discurso construído na língua de sinais também pode ser chamado de expressão oral. Então, o Surdo que se expressa em Libras fala! Para entendermos melhor como trabalhar com a expressão oral com Surdos, vamos apresentar um projeto que foi realizado no curso de leitura e escrita para Surdos, no Instituto Santa Terezinha, em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) - Diadema. O principal objetivo do projeto é ampliar a capacidade dos alunos no uso das práticas de linguagem, de modo que se tornem mais competentes nas habilidades de leitura, escrita e principalmente oralidade. Para que isso aconteça é importante que os alunos

estejam envolvidos em algo que gere certa responsabilidade e estímulo para que se dediquem ao aprendizado do que for proposto. Por isso, a possibilidade de participar de um evento no qual precisam fazer uma apresentação da história da escola é a alavanca para que os objetivos sejam alcançados. Assim, é importante garantir a realização de atividades com diversos tipos de gêneros textuais e que se alinhem ao tema proposto no projeto, que no caso são: registros históricos, resumos, fotografias, tópicos em slides, apresentação oral, dentre outros. Também é fundamental que sejam realizadas, permanentemente, “Rodas de leitura” nas quais o professor precisa permitir que os alunos escolham qual texto lerão e farão a exposição da leitura para a classe entre vários oferecidos. Essas são atividades pertinentes para garantir a prática da leitura, da organização de tópicos por meio da escrita e da exposição oral. No desenvolvimento das atividades, a discussão temática sobre a apresentação oral é fundamental para a recuperação do contexto de produção da exposição e, em especial, dos sentidos que o discurso veicula. Além disso, é importante que o planejamento das atividades fique claro para os alunos, de modo que eles possam compreender tanto os conteúdos com os quais vão lidar no projeto, quanto as suas responsabilidades em cada etapa do processo. Revista D+ número 15


ENTREVISTA PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Organização da sequência de trabalho As atividades são planejadas semanalmente, tendo como base uma avaliação diagnóstica que tem a função de nos fornecer informações sobre os conhecimentos, aptidões e competências dos estudantes com vista à organização das sequências didáticas que farão parte do projeto. Assim, levando em conta o objetivo do projeto, citado anteriormente, precisaremos propor atividades que nos permitirão avaliar as habilidades de leitura, de escrita e de produção oral dos alunos. (Ver quadro)

HABILIDADES DE LEITURA • Identificar o provável público-alvo de um texto, sua finalidade e seu assunto principal; • Identificar os principais elementos constitutivos da organização interna do gênero; • Identificar o sentido do texto; • Localizar itens de informação implícita e explícita no texto.

HABILIDADES DE ESCRITA • Demonstrar domínio da modalidade escrita formal da língua portuguesa; • Conhecer a estrutura do gênero; • Aplicar conceitos das várias áreas de conhecimento para desenvolver um tema; • Selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista.

HABILIDADES DE EXPRESSÃO ORAL • Contar e recontar textos oralmente usando a norma padrão; • Usar registros linguísticos adequados à situação de comunicação; • Expor temas variados e debater sobre temas controversos; • Reconhecer e usar adequadamente recursos expressivos não linguísticos (gestos, postura corporal, expressão facial, entonação, direcionamento do olhar), de acordo com a situação comunicativa.

Ao fazer o levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos é possível saber quais gêneros textuais eles conhecem. É importante que, ao longo do trabalho, se continue levantando e avaliando o que os alunos já aprenderam e em que se deverá investir nas situações didáticas posteriores. Para que o projeto tenha sentido e propósito, os alunos devem compartilhar dos objetivos e fundamentos que o justificam. Assim, dividir o projeto com o grupo implica socializar com os alunos a proposta do projeto, bem como suas etapas de realização e tarefas necessárias para se chegar ao produto final escolhido. Sabendo-se quais são os conhecimentos que os alunos têm sobre gêneros textuais e tendo partilhado o trabalho com eles, é importante ampliar o repertório que possuem. Além disso, essas atividades também pretendem se tornar situações de apreciação de textos bem escritos, em que os alunos possam identificar os acertos do escritor ao escolher determinados recursos linguísticos. Assim, realizada a avaliação diagnóstica, o planejamento da sequência didática deverá respeitar o nível da turma, lembrando que as atividades precisam ser organizadas a fim de propor boas situações de aprendizagem. Segundo Telma Weisz, os alunos precisam pôr em jogo tudo o que sabem e pensam sobre o conteúdo trabalhado; têm problemas a resolver e decisões a tomar em função do que


se propõem produzir; a organização das tarefas precisa garantir a máxima circulação de informação possível, por isso, na maior parte das vezes precisam ser realizadas em grupos e o conteúdo trabalhado precisa manter as características de objeto sociocultural real, sem se transformar em objeto escolar vazio de significado social. Considerando e ampliando os propósitos já descritos, esse projeto tem duração prevista aproximada de seis meses, levando em conta que serão ministradas quatro horas semanais de aula. Está organizado em momentos específicos, os quais podem compreender mais de uma atividade, por estarem vinculadas a um mesmo objetivo. SÃO ELAS: 1. Avaliação diagnóstica inicial/levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos; 2. Compartilhamento do projeto com a classe; 3. Ampliação do repertório dos alunos a respeito dos gêneros textuais; 4. Apreciação e reflexão sobre a língua a partir de diversos textos; 5. Produção escrita dos resumos, tópicos e slides; 6. Revisão dos textos; 7. Edição dos slides; 8. Apresentação oral; 9. Realização do produto final e avaliação.

Pensando nos princípios e tendo em vista o produto final do projeto – apresentação da história do colégio em um evento –, uma das primeiras atividades da sequência didática é a pesquisa e leitura de textos que relatem aspectos históricos da escola. Nessa etapa, são trabalhadas diferentes estratégias para o desenvolvimento das mais variadas habilidades de leitura, levando em consideração a estrutura textual do gênero e suas características. Após propor a leitura da coletânea de textos, bem como seu estudo, é preciso trabalhar alguns aspectos do gênero resumo, pois, é assim que o aluno fará o levantamento de tópicos para organização da apresentação em slides. PARA ISSO, O PROFESSOR DEVERÁ ORIENTAR OS ALUNOS NAS SEGUINTES ATIVIDADES: 1. Releitura do texto, destacando as ideias principais (o uso de um marcador de texto é ideal); 2. Organização de uma síntese, eliminando expressões desnecessárias para a compreensão global; 3. Reescrita das principais informações sobre o assunto, usando frases curtas; 4. Organização das informações em tópicos e blocos de sentido. Outra sequência didática interessante é a proposta da confecção de um cartaz a ser construído coletivamente sobre as etapas e dicas para a produção dos slides. Essa Revista D+ número 15


PRÁTICAS NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA listagem será útil no momento de criação. Ainda nessa etapa, pode ser realizada uma pesquisa de fotos e imagens no arquivo da escola que podem ser estudadas e selecionadas em conjunto com a professora de Arte. Nos momentos de produção escrita pretende-se que os alunos observem como os escritores procedem durante as situações de escrita. Assim, cabe ao professor ajudá-los a se organizar para a escrita de textos, apontando-lhes as características da variação linguística que se usa para escrever e ajudando-os a controlar o que já escreveram, bem como o que ainda falta. Entendendo-se que as etapas descritas não precisam ser necessariamente estanques e podem integrar-se para atingir os objetivos maiores de um projeto de linguagem, podemos vincular, em alguns momentos, atividades de ampliação do repertório de gêneros textuais, possibilidades de reflexão sobre a língua e situações de produção escrita, circunstanciais, a fim de atingir metas mais amplas em uma mesma situação didática. Os momentos de revisão dos resumos podem ocorrer durante a própria escrita , mas é interessante promover também situações posteriores de revisão, em que os alunos possam distanciar-se do que escreveram, alternando as condições de produtor da escrita e leitor. Para que a revisão seja produtiva é preciso eleger focos específicos, uma vez que os alunos não têm condições de examinar e aprimorar várias questões ao mesmo tempo. Assim, pode-se escolher, por exemplo, focar a revisão ora no discurso escrito, ora nas questões de ortografia, pontuação e paragrafação. Vale também lembrar que, para auxiliar os alunos a desenvolver bons procedimentos de revisão de texto, a natureza dessa tarefa exige que ela se dê em vários e diferentes momentos, bem como com diversos textos. Feito isso, chega o momento de passar para a edição do material produzido, visando sempre à conclusão do

produto final escolhido. Nessa etapa os alunos devem observar portadores como os que elegeram para ser o produto final, analisando como se organizam graficamente, como são ilustrados, que informações contêm além do texto, em que formatos se apresentam. Após os slides estarem finalizados é a hora de colocar o foco na apresentação oral. Para isso, os alunos precisam conhecer aspectos da fala que exigem uma construção diferente do discurso daquela empregada no bate papo com os amigos. A princípio, os trabalhos de expressão oral incluem o incentivo à manifestação espontânea e frequente dos alunos em qualquer tarefa. As atividades partem de situações simples, como a disposição para ouvir e expor ideias. ALÉM DISSO, É FUNDAMENTAL QUE O PROFESSOR DISPONIBILIZE BONS MODELOS DE COMUNICAÇÃO ORAL AOS ALUNOS, DEPOIS É PRECISO CRIAR SITUAÇÕES DIDÁTICAS QUE POSSIBILITEM EXPERIÊNCIAS SIGNIFICATIVAS DA COMUNICAÇÃO PELA FALA, POR EXEMPLO: • Conhecer o conteúdo a ser apresentado; • Ter ideia de quem é o público-alvo da apresentação; • Não falar muito rápido; • Olhar para o público usando a triangulação; • Posicionar-se estrategicamente para que todos possam visualizar a apresentação; • “Sinalizar” com clareza articulando bem as ideias; dentre outras. O encerramento do trabalho se dá na socialização do produto final com os destinatários previamente determinados. Nesse caso, a culminação do projeto se dará na apresentação da história do colégio em um evento. D+ * Silvana Zajac é professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Depto. Ciências Exatas e da Terra, doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (Lael/PUC-SP) e mestra em Educação (Unimep)

SAIBA MAIS: SCHNEUWLY. B; DOLZ, J. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado de Letras, 2004. SOLÉ, I. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artmed, 2008. WEISZ, Telma. O diálogo entre o ensino e a aprendizagem. São Paulo: Ática, 1999.


Revista D+ nĂşmero 15


ESPAÇO DA LIBRAS LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

O Sistema Linguístico da Libras: novas perspectivas Pensamentos sobre uma língua visoespacial

André dos Santos Silva

Especialista em Dialética da Língua Portuguesa (UnG), Bacharel em Letras/Libras (UFSC/Unicamp), Graduado em Letras-Português/Inglês (UnG), Professor e Orientador de cursos (IST) e Intérprete de Libras (FIRB)

* Para participar com perguntas e sugestões, escreva para silzajac@revistadmais.com.br

O

lá, caro leitor. Seja bem-vindo a um espaço reflexivo sobre o sistema linguístico da Língua Brasileira de Sinais. Pretende-se, aqui, produzir discussões sobre as estruturas componentes da Libras de uma maneira dialética, esperando, assim, que nossas conversas auxiliem a comunidade surda e ouvinte no uso, produção e interpretação de construções visoespaciais. Para que consigamos caminhar nessas análises, há de se retomar conceitos já consolidados nos estudos de língua e refletir sobre sua aplicação em um sistema um tanto “diferente” de comunicação, cujo espaço usado pelo indivíduo que sinaliza, a posição dos membros de seu corpo e o deslocamento feito pelas mãos são responsáveis pela transmissão de informações. Pensar em uma forma de comunicação diferente daquela a que estamos acostumados é tentar entender um instrumento com o qual não temos afinidade, é imaginar como se dá a produção dos sentidos por meio dele e especular o funcionamento dos elementos que o compõem sem a experiência de tê-lo usado. Assim, conhecemos várias linguagens pelas quais uma mensagem pode ser passada: a música, o teatro, a língua... mas, por quais delas somos capazes de nos comunicar? Quanto dominamos ou o que conhecemos de cada uma? Quando observamos a comunicação entre duas pessoas que utilizam uma língua de sinais, talvez não paramos para pensar no quão complexo é o sistema linguístico que envolve o “dançar” das mãos e do corpo na constituição dos conhecimentos ali presentes. A língua enquanto sistema formado por unidades que são funcionais para a comunicação, conforme descrita pelo autor Fernandes Jr (2010), é complexa e entender o funcionamento do mecanismo linguístico é um grande desafio a todos aqueles que se propõem a compreendê-la. Reconhecida como língua em 24 de abril de 2002 pela Lei 10.436, a Libras tem, hoje, o status pelo qual


muitos surdos e ouvintes lutaram e são relativamente recentes os estudos feitos sobre seu sistema linguístico. Stokoe (1978), realizou em seu livro Sign language structure (Estrutura da língua de sinais) o estudo dos parâmetros que compõem a sinalização: Configuração de Mão, que é a forma tomada pela mão no momento da execução de um sinal; Ponto de Articulação, que é o local em que a mão configurada se articula e o Movimento, que, como o próprio nome explica, é o movimento que a mão faz em contato ou não com determinadas partes do corpo. A composição do sinal ainda pode ser acrescida de um parâmetro cuja expressão pode surgir de outras partes do corpo, conhecido como Expressão Não-Manual, e da direção para a qual a palma se encontra virada, denominada Orientação da Palma. É importante que essas unidades componentes do sinal sejam conhecidas para estudos posteriores. Sabe-se que as Línguas de Sinais são diferentes em cada país e que o interesse por esse sistema de comunicação vem aumentando e trazendo novas inquietações à medida que se percebem incoerências ou lacunas nas

explicações que achávamos ter para problemáticas superadas na Língua. Isso requer de nós um tempo para refletir sobre o que há e o que não há de equivalência entre uma Língua Oral e uma Língua de Sinais. Seria a disparidade entre a modalidade oral-auditiva e a visoespacial a responsável pela dificuldade de escrita da pessoa surda e pela sinalização conhecida como “português sinalizado” (sinalizar acompanhando a ordem das palavras na estrutura da Língua Portuguesa, ignorando as diferentes construções que são próprias de uma Língua de Sinais) da pessoa ouvinte? Como enxergar esse “mundo virtual” em que os sinais representam conceitos no espaço da sinalização e aprender a trabalhar com a relação entre eles na elaboração de conceitos complexos? Há questões diversas a se fazer, trabalhando com um sistema que é estático e finito ao qual se aplica um raciocínio que é dinâmico e infindável. Esse complexo sistema sobre o qual dialogaremos nos será um instrumento cujo estudo e domínio nos auxiliará também nas reflexões acerca da educação de surdos. D+

Revista D+ número 15


APRENDA LIBRAS por Célio da Conceição Santana e Joice Alves de Sá ilustrações Luis Filipe Rosa Colaboração Carolina Gomes de Souza Silva

Aprenda sinais do Desenho Universal O Desenho Universal respeita as diferenças, unifica a sociedade e inclui a todos. Pensando no tema de nossa reportagem de capa, escolhemos sinais que colaborarão ainda mais para a inclusão. Aprenda com a gente!

Acessibilidade

Arquitetura

Adaptação

Diversidade

Mobilidade

Rampa

Piso tátil


Desenho Universal

Segregação

Urbano

Revista D+ número 11


RUMOS & DESCOBERTAS

Preparar decolagem Quem nunca pensou em viajar o mundo, conhecer novas culturas e mergulhar no universo da diversidade? Para muitos, esse seria o maior desafio. Claro que para desvendar lugares, texturas, cheiros, sons e sabores é preciso coragem! (E sem dúvidas, uma boa dose de planejamento financeiro). A seguir, revelamos o quão desafiador – mas possível – pode ser para pessoas com deficiência darem início ao plano de realizar um intercâmbio. Escolhemos dois viajantes que decolaram rumo à independência ao viver experiências únicas no exterior. Inspire-se! texto Cintia Alves fotos Arquivo Pessoal


Fernando Campos: ônibus e calçadas acessíveis e a ajuda de companheiros fizeram a diferença em sua viagem para o Reino Unido

Sem medo de ser feliz Este Diário de Viagem pertence a: Fernando Campos, 23 anos, jornalista, cego. O que eu aprontei: fui de Natal, no Rio Grande do Norte, para Bournemouth, no Reino Unido. Quanto tempo passei lá: seis meses, de janeiro a julho de 2014.

fotos arquivo pessoal

Como tudo começou: nunca pensei em estudar no exterior, até minha prima me contar sobre o curso de inglês que faria durante um semestre pela agência Student Travel Bureau (STB). Resolvi então visitar a agência e, durante um ano, pesquisamos a melhor opção para atender às minhas necessidades. Apesar de a minha prima ter viajado para o mesmo destino que eu, foi fundamental ficarmos em casas separadas, e mesmo que ela tivesse desistido, com certeza, eu faria o intercâmbio. Acessibilidade no destino: apesar de não ter sinal sonoro em Bournemouth, nas outras cidades em que visitei, como Dublin, Praga e Londres, a acessibilidade era evidente. Como faço uso da bengala, só o fato dos ônibus estarem em melhores condições e as calçadas lisas já fez toda diferença. Foi horrível... Por ser o primeiro intercambista cego da agência local, tomamos todo cuidado possível, principalmente para que eu sentisse o máximo de segurança durante a viagem. Mesmo sendo a melhor experiência da minha

vida, durante o período de pesquisas fui recusado logo na primeira escola, por ela não ter acessibilidade – apesar de as únicas adaptações necessárias serem a disposição e a paciência dos professores. Me senti no direito de questioná-los e obrigá-los, de alguma maneira, a me receberem, mas o meu agente foi muito cauteloso e me sugeriu que escolhesse outra escola para que não tivesse problemas com o tratamento ao chegar lá. Foi o que aconteceu, fui para a Eurocentres, que me recebeu de maneira acolhedora. O que trouxe na bagagem: éramos quatro intercambistas – entre brasileira, colombiana, turco e árabe – na minha casa, em Bournemouth. Por conta das minhas necessidades específicas, minha hostmother (mãe hospedeira, em tradução livre), sempre os orientou a fazer barulho onde estivessem para que eu pudesse encontrá-los pela casa, e consequentemente não esbarrar em ninguém. Como era de costume, íamos todos juntos às aulas, mas certo dia, ninguém, além de mim e da árabe, chegaríamos no primeiro horário. Apesar de sua cultura não permitir ser tocada por um homem que não fosse seu pai ou seu marido, vendo a minha situação, ela abriu mão e me perguntou se poderia me guiar. No momento, pensei que não seria justo fazê-la passar por cima de sua cultura, religião e crença para me ajudar... Por isso, apesar de achar o gesto surpreendente, sugeri que cada um segurasse em uma ponta da minha bengala – por ser dobrável, dessa forma não nos tocaríamos. Foi perfeito! Ela aceitou e fomos até a escola. Mesmo cada um tendo suas limitações, nos compreendemos e foi um momento inesquecível. Revista D+ número 14 15


COMPORTAMENTO

DICAS PRÉ-INTERCÂMBIO:

DESCOBRINDO TALENTOS

• Pense em destinos que gostaria de conhecer, mas também dê chances àqueles que você jamais pensou em visitar! Hoje, com a internet, é possível conhecer mais sobre a cultura e a cidade antes mesmo de visitá-la, por isso pesquise antes.

O pequeno sonho de Jorge Paulo Lemann, que começou em uma gaveta de escritório com fichas de jovens brasileiros promissores e suas futuras bolsas informais no exterior, transformou-se em uma alavanca para a educação e a carreira de universitários e recém-formados. A Fundação Estudar, que além de oferecer bolsas nas modalidades de graduação, intercâmbio acadêmico durante a graduação, duplo-diploma durante a graduação e pós-graduação, tudo isso no exterior, conta também com a oportunidade de graduação no Brasil. Para Tiago Mitraud, 30 anos, diretor executivo da Fundação Estudar, a inclusão deve ser realizada desde o processo seletivo. “Durante a seleção não se leva em consideração nenhum tipo de deficiência. Pois, apesar de não termos bolsas exclusivas para pessoas com deficiências, todos são elegíveis no nosso processo de bolsas, não havendo restrições”. Se interessou? Então fique de olho nas inscrições para seleção, disponível em bolsas.estudar.org.br

• DEIXE QUE AS PESSOAS SONHEM JUNTO VOCÊ. Apesar de a sua família e seus amigos não irem à viagem, compartilhe sempre as novidades. O apoio e a participação deles são fundamentais para desenvolver confiança de ambos os lados. • QUESTIONE TUDO E UM POUCO MAIS. Definir a agência não é uma tarefa fácil, para isso é necessário tempo na busca por indicações de intercambistas e consultas do melhor programa que atenda as suas necessidades. • PLANEJAR É EVITAR SURPRESAS INEVITAVELMENTE VOCÊ PRECISARÁ DE UMA PLANILHA DE CUSTOS PARA O PRÉ, DURANTE E PÓS-INTERCÂMBIO. Os gastos com passagens áreas, vistos, seguro saúde, moeda local, dinheiro de emergência, viagens etc. devem estar na ponta do lápis, sempre que possível.

NA REDE EDUFINDME A plataforma disponibiliza informações sobre programas de cursos no exterior para o Ensino Médio, a Graduação, Pós-graduação, o MBA, idiomas, cursos profissionalizantes, entre outros. Para conhecer acesse: br.edufindme.com. UNIVERSIA A maior rede de universidades em países ibero-americanos promove e compartilha a mudança e a inovação entre estudantes e empresas pelo mundo. Para conhecer mais sobre os países, acesse www.universia.com.br/estudar-exterior ou confira as bolsas de estudo no exterior pelo link bolsas.universia.net/#.


Daniel Augusto: a experiência em Madri rendeu o aprendizado de uma nova língua, independência e raciocínio crítico sobre o mundo

Uma vez viajante, sempre viajante Este Diário de Viagem pertence a: Daniel Augusto Correia Nunes, 31 anos, representante de serviços ao cliente, cadeirante (paraplégico). O que eu aprontei: fui de São Paulo, capital, para Madri, na Espanha. Quanto tempo passei lá: seis meses, de fevereiro a julho de 2007. Como tudo começou: mesmo já tendo morado fora da casa dos meus pais em 2003, tive a curiosidade de buscar uma experiência acadêmica no exterior. A oportunidade surgiu com a indicação de uma professora para cursar um semestre na Universidad Europea de Madrid, no meu curso de Turismo. Acessibilidade no destino: na época em que visitei a cidade, não existiam tantos lugares acessíveis por ser uma cidade do Velho Continente, mas todas as escolas e universidades eram plenamente acessíveis e foram previamente avaliadas pelos responsáveis na organização antes do meu intercâmbio. Foi horrível... No feriado da Páscoa resolvi conhecer Amsterdã e Londres. Ainda no aeroporto em Madri, o funcionário da companhia aérea ficou com o meu cartão de

embarque para me dar assistência, mas ele esqueceu-se do meu horário e não pude embarcar – consequentemente derrubando todos os trechos seguintes. Ao chegar ao destino, descobri que não embarcaram minha cadeira e tive de pegar uma cadeira emprestada da companhia, daquelas enormes e pesadas. Somente no dia seguinte minha cadeira chegou ao aeroporto, me fazendo perder um dia da viagem. Foi uma situação completamente desconfortável, já que estava com todos os dias planejados. O que trouxe na bagagem: aos 18 anos não tinha noção de coisas básicas, como lavar roupa, fazer comida etc. Por causa disso, o meu primeiro intercâmbio para Toronto, no Canadá, foi um tremendo desafio! Tive que aprender a me virar sozinho e adquirir o máximo de independência, assim como é para pessoas sem deficiência. A partir daí é que fui superando as dificuldades do dia a dia. Já em Madri, na Espanha, aprender outro idioma – além do inglês – fez toda a diferença no meu currículo profissional. Hoje trabalho na área comercial de uma indústria química e respondo para a América Latina, usando bastante o espanhol; além de ter na bagagem um semestre cursado em uma universidade estrangeira. Acho que qualquer pessoa que dispõe de um mínimo de condições deveria se dar essa oportunidade na vida: de voltar outra pessoa para o seu país; com um raciocínio mais crítico sobre o mundo. Valorizamos mais as coisas boas que temos aqui. D+ Revista D+ número 15


CEREJA!

Criando sentimentos texto Mayra Ribeiro fotos Divulgação

“E

u sabia que enfrentaríamos uma sociedade difícil, mas que conseguiríamos passar por cima dos obstáculos. Sempre acreditei em seu potencial. Ele é diferente, só que a diferença não é ruim”, afirma Alice de Oliveira, 55 ao lembrar-se do momento em que descobriu a deficiência do filho do meio. Victor Vieira, 26, nasceu com a síndrome de Asperger – leve grau de autismo. A dona de casa desconfiou da deficiência do filho quando ele tinha quatro anos de idade, porém, a confirmação veio apenas aos dez. “O meu filho tinha dificuldades no aprendizado. Aos oito anos, levei-o em psiquiatra e psicólogo. Na época, não se falava do autismo que não tivesse o grau elevado, então, os profissionais desconfiaram de problemas emocionais, dislexia e esquizofrenia até oficializarem o diagnóstico”. Hoje, o jovem tornou-se artista plástico e, em janeiro deste ano, passou a comercializar suas obras de arte abstrata, cubista e pós-moderna. Vieira entrou ainda criança para aulas de pintura e desenho a fim de desenvolver as habilidades sociais. “O Victor pediu para entrar nessas atividades, pois eram uma paixão. Durante as aulas, a única dificuldade que tinha era o bloqueio criativo, o que é normal para qualquer artista!”,

afirma a mãe. A partir do envolvimento com a arte, o jovem melhorou o contato visual em conversas e as formas de se expressar e interagir socialmente. O artista estudou as áreas de pintura e desenho por quatro anos e formou-se em artes plásticas em 2014 na Escola Panamericana de São Paulo. “A pintura é a capacidade de expressar-se sem usar palavras. É emoção bruta, desejo, paixão. Mostra o interno da pessoa”, revela Victor Vieira. Os estilos preferidos de pintura do jovem são o cubismo e a pintura em ação. “Eu gosto de praticar o gotejo, ou, simplesmente gotejar para expressar sentimentos e não uma história em si. Essa é a beleza da arte, você não precisa criar uma história ou um movimento, precisa criar um sentimento, passar uma emoção”. As obras de Vieira são produzidas de acordo com inspirações em artistas como Pablo Picasso, Salvador Dalí e, principalmente Jackson Pollock, em um pequeno ateliê localizado em Santo André, na região do ABC. O valor das peças varia em relação ao tamanho, mas o preço médio está entre R$ 100 e R$ 500. Os interessados podem entrar em contato via celular, no número (11) 9961-85071 ou Facebook (@victorvieiraart). D+




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