Revista do Brasil nº 086

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HÁ 30 ANOS, A PRIMEIRA CENTRAL

R$ 6,00

O país melhorou nas últimas décadas, e a CUT é parte dessas mudanças. Mas não há espaço para acomodação

Exemplar de associado. Não pode ser vendido.

nº 86

agosto/2013 www.redebrasilatual.com.br

#PRESTENÇÃO Está em disputa no país e no mundo o futuro da internet. De um lado, a liberdade dos usuários. Do outro, os que controlam a informação e rastreiam sua vida


o ã ç a t n e m a m A BOM PARA A MAMÃE, MELHOR PARA O BEBÊ. O aleitamento materno é a maneira mais natural e eficiente de proteger o bebê, diminuindo o risco de mortalidade infantil e ajudando no seu desenvolvimento. Saiba mais, participando de nossas atividades.

Secretaria de Saúde

www.osasco.sp.gov.br


ÍNDICE

EDITORIAL

6. Na Rede

Assuntos que foram destaque na RBA no mês que passou

10. Saúde

16. Trabalho

1991

Os 30 anos da CUT em meio a um modelo sindical superado

PNUD-IPEA

Programa Mais Médicos causa reação adversa das entidades

2010

22. Entrevista

Sérgio Amadeu e os perigos a rondar a liberdade na internet

Em 19 anos, o mapa do Índice de Desenvolvimento Humano das cidades mudou de cores

26. Tecnologia

■ muito baixo (0.000 até 0.499) ■ baixo (0.500 até 0.599) ■ médio (0.600 até 0.699) ■ alto (0.700 até 0.799) ■ muito alto (acima de 0.800)

Espionagem: buraco da fechadura das teles é mais ao Norte

30. Comportamento Cresce preocupação de usuários do Face com os desvios da rede

Que se incomodem

A

34. História

A Catalunha recebe Neymar em meio à fervura separatista

38. Cultura

JOÃO CORREIA FILHO

Personagens da vida real dão toque interativo à dramaturgia

42. Viagem

Um passeio pelas melhores páginas de Buenos Aires

Seções Mauro Santayana Destaques do mês

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Lalo Leal

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Curta essa dica

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Conto: B.Kucinski

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expectativa de inflação para 2013 caminha às margens dos 6%. Para o governo, que segundo a presidenta Dilma Rousseff faz acompanhamento diário, está sob controle e dentro da meta. E para os historiadores não é nem sombra do que era há 30 anos. Em 1983, fecharia entre 160% (pelo IPCA) e 200% (segundo o INPC). Na ocasião, o então ministro do Planejamento, Delfim Netto, orientou o presidente-general João Figueiredo a baixar um decreto que limitava os reajustes salariais a 80% do INPC: para os gurus do mercado, Delfim entre eles, era a reposição das perdas que causava inflação. Hoje, o mercado prioriza a tese de que é preciso subir os juros. Não foram só as interpretações macroeconômicas que mudaram. Em 1983, um mês antes da fundação da CUT (não, ainda não existiam centrais), os sindicatos convocavam greve geral contra a ditadura e o arrocho. Em seus passos contra o regime autoritário, o movimento sindical também foi um dos alicerces das Diretas Já e da Constituinte, consolidando a transição democrática. Os trabalhadores conseguiram resistir à avalanche neoliberal dos anos 1990, que destroçou empregos, mas não direitos antes conquistados. Mais que melhores salários e condições de trabalho – em 2012, 99% dos acordos coletivos alcançaram aumentos maiores que a inflação ou equivalentes –, eles passaram a disputar também o poder. Nas estruturas institucionais e fora delas, nas ruas. Durante essas décadas, a CUT se inclui entre os protagonistas das mudanças, para melhor, na vida dos brasileiros. Um dos retratos mais evidentes está na divulgação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) nos municípios. De acordo com o estudo, feito pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) em conjunto com o Ipea, o índice geral do país subiu em duas décadas, desde 1991, de 0,493 para 0,727 (o índice vai de 0 a 1). Dos 5.635 municípios brasileiros, apenas 32 (0,57%) possuem IDH considerado muito baixo. Em 1991, eram 85%. E ainda há muito o que melhorar. Assim como a CUT pode melhorar, como admite seu presidente, Vagner Freitas. Diz ele: “O dirigente sindical tem de ser espelho do que é a sua base. Sempre com viés classista, pela divisão da riqueza, por um mundo em que o trabalho tenha mais valor do que a propriedade”. E os tempos, no Brasil, parecem desfavoráveis aos acomodados. REVISTA DO BRASIL

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No desktop, no notebook, no tablet ou no smartphone

nós falamos a sua língua.

www.redebrasilatual.com.br Núcleo de planejamento editorial Cláudia Motta, Daniel Reis, Paulo Salvador e Vanilda Oliveira Editores Paulo Donizetti de Souza Vander Fornazieri Editor Assistente Vitor Nuzzi Redação Cida de Oliveira, Evelyn Pedrozo, Eduardo Maretti, Fábio M. Michel, Gisele Brito, João Paulo Soares, João Peres, Nicolau Soares, Sarah Fernandes, Tadeu Breda e Viviane Claudino Arte: Júlia Lima. Iconografia: Sônia Oddi Revisão: Márcia Melo Capa A partir de foto de Wen Hui Wang/Easypix Sede Rua São Bento, 365, 19º andar, Centro, São Paulo, CEP 01011-100 Tel. (11) 3295 2800 Comercial Sucesso Mídia (61) 3328 8046 Suporte, divulgação e adesões (11) 3295 2800 Claudia Aranda e Carla Gallani Impressão Bangraf (11) 2940 6400 Simetal (11) 4341 5810 Distribuição Gratuita aos associados das entidades participantes. Bancas: Fernando Chinaglia Tiragem 360 mil exemplares

Conselho diretivo Adi dos Santos Lima, Admirson Medeiros Ferro Jr., Adriana Magalhães, Almir Aguiar, Aloísio Alves da Silva, Amélia Fernandes Costa, Antônio Laércio Andrade de Alencar, Benedito Augusto de Oliveira, Carlos Cordeiro, Carlos Decourt Neto, Cláudio de Souza Mello, Claudir Nespolo, Cleiton dos Santos Silva, Edgar da Cunha Generoso, Eric Nilson, Fabiano Paulo da Silva Jr., Fernando Ferraz Rego Neiva, Francisco Alano, Francisco Jr. Maciel da Silva, Genivaldo Marcos Ferreira, Gentil Teixeira de Freitas, Hélio Rodrigues de Andrade, Isaac Jarbas do Carmo, Izídio de Brito Correia, Jesus Francisco Garcia, José Eloir do Nascimento, José Enoque da Costa Sousa, José Jonisete de Oliveira Silva, José Roberto Brasileiro, Juberlei Baes Bacelo, Luiz César de Freitas, Magna Vinhal, Marcos Aurélio Saraiva Holanda, Marcos Frederico Dias Breda, Maria Izabel Azevedo Noronha, Nilton Souza da Silva, Paulo César Borba Peres, Paulo João Estaúsia, Paulo Lage, Paulo Roberto Salvador, Raul Heller, Rodrigo Lopes Britto, Rosilene Corrêa, Sérgio Goiana, Sonia Maria Peres de Oliveira, Vagner Freitas de Moraes, Valmir Marques da Silva, Wilian Vagner Moreira, Wilson Franca dos Santos. Diretores responsáveis Juvandia Moreira Rafael Marques Diretores financeiros Rita Berlofa Teonílio Monteiro da Costa

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REVISTA DO BRASIL

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carta@revistadobrasil.net As mensagens para a Revista do Brasil podem ser enviadas para o e-mail acima ou para o seguinte endereço: Rua São Bento, 365, 19º andar, Centro, São Paulo, CEP 01011-100. Pede-se que a mensagem venha acompanhada de nome completo, telefone e e-mail.


MAURO SANTAYANA

Uma Igreja para os pobres O papa Francisco sabe que a Igreja está sobre o fio da navalha e que sua unidade vai depender da decisão corajosa de voltar a Cristo e renunciar à adoração do Bezerro de Ouro bíblico

A

primeira viagem do papa Bento XVI, fora da Europa, foi ao Brasil, logo depois de eleito em 2007. O pontífice, conhecido por suas posições conservadoras e pela influência exercida sobre seu antecessor, João Paulo II, veio ao Brasil – o maior país católico do mundo – a fim de reafirmar a nova ortodoxia da Igreja, de firme oposição a qualquer suspeita de simpatia do clero para com a Teologia da Libertação. Naquele mesmo ano, um pouco antes da eleição de Bento XVI, Jorge Bergoglio, já arcebispo de Buenos Aires, esteve em Aparecida (SP), em encontro promovido pela Conferência Episcopal da América Latina (Celam) para discutir a revitalização das Comunidades Eclesiais de Base, surgidas no Brasil nos anos 1970 e desestimuladas pelo papa João Paulo II. Bergoglio foi vigoroso defensor das comunidades e relator da decisão aprovada pelos prelados presentes. Bento XVI, ao chegar ao Brasil, esfriou os ânimos dos bispos da região. A Igreja tinha outras prioridades. Ao optar pelo Brasil para sua primeira viagem internacional, o papa Francisco não está apenas atendendo à necessidade de participar da Jornada Mundial da Juventude, que já estava prevista durante o pontificado anterior. Ele decidiu expressar, de forma sutil, seu alinhamento à “opção preferencial pelos pobres”, do papa João XXIII, ao condenar, com firmeza, o hedonismo de nosso tempo e verberar um sistema de produção de bens descartáveis e de seres humanos igualmente dispensáveis.

É certo que ele age com inteligência política. Não lhe é prudente atuar em contraponto aberto com o papa Bento XVI, que abdicou do trono de São Pedro, enquanto não se assegurar do controle real da Cúria Romana, um centro de poder dividido em grupos rivais, no que se refere ao usufruto dos bens da Igreja e até mesmo a algumas questões teológicas. O papa conhece, e bem, a estrutura interna da Igreja, com suas dioceses espalhadas pelo mundo. Conhece, da mesma forma, a debilidade pecaminosa de sacerdotes, bispos, e até mesmo arcebispos, acusados de crimes nefandos e protegidos durante os últimos 35 anos, os dos pontificados seguidos de Wojtila e Ratzinger. Ele sabe que a Igreja está sobre o fio da navalha e que sua unidade, pelo menos formal, vai depender da decisão corajosa de voltar a Cristo – o Cristo que açoitou os vendilhões do templo e multiplicou os pães e os peixes para saciar a fome daqueles que o seguiam pelas trilhas da Palestina e não tinham o que comer. Voltar a Cristo é renunciar à adoração do Bezerro de Ouro bíblico. É relembrar o que disse Jesus a um jovem que queria acompanhá-lo: em primeiro lugar, que se desfizesse de todos os seus bens. Bento XVI chegou a afirmar que sua missão era recuperar a Europa para a Igreja Católica, livrando o continente de seitas protestantes e da presença do Islã. Enfim, pretendia voltar ao Concílio de Trento, que se reuniu em 1545 naquela cidade italiana, e durou 18 anos, até 1563, para restaurar a Inquisição e acabar com os protestantes. Seu tom de cruzada assustou até mesmo alguns setores tradicionalistas da Igreja. A abdicação era vista como inevitável, tendo em vista sua extrema debilidade física, com reflexos mentais. Observadores mais atentos acreditam que ele, ao deixar o cargo, pretendia escolher o sucessor e, por seu intermédio, continuar governando a Igreja, com o apoio da Cúria. Ele não esperava a eleição de Bergoglio, a quem derrotara na disputa de há seis anos. Bergoglio, por seu turno, vai agindo pragmaticamente, ao limpar a Cúria dos indesejáveis, ao mesmo tempo em que faz todas as homenagens a Ratzinger, chegando a assinarem juntos a primeira encíclica de seu papado. Aos poucos, Ratzinger, a cada dia mais débil, se converterá em simples pensionista do Vaticano. REVISTA DO BRASIL

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Informação diária no portal, no Twitter e no Facebook

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de longa ausência dos holofotes, pediu aos jovens que participem da política, porque continua sendo a melhor solução para os problemas do mundo. “Quando vocês estiverem putos da vida e não estiverem gostando de ninguém, ainda assim não neguem a política. E muito menos neguem os partidos. Quando você estiver puto e quiser negar as coisas, em vez de negar a política, entre na política”, disse, durante palestra na Universidade Federal do ABC, em 18 de julho. “Dentro de vocês está o político que vocês querem que os outros sejam. Fora disso não há solução.” Durante conferência sobre a política externa brasileira, ele comparou os jovens do Brasil, que lutam por mais conquistas, com os da Europa, que lutam para não perder direitos. “Não existe nenhuma experiência no mundo em que a negação da política deu melhor resultado que a podridão da política”, afirmou. O ex-presidente reagiu indignado a rumores sobre seu estado de saúde e sobre sua vida familiar. “Tenho de fazer meus exames rotineiros durante cinco anos. Não é correto que algum canalha ou algum imbecil fique pela internet contando mentiras. Jamais mentiria para vocês.” http://bit.ly/rba_lula_ufabc

Demissão: lesa-humanidade

O deputado estadual João Paulo Rillo (PT) acionou o procurador-geral de Justiça do Estado de São Paulo, Márcio Fernando Elias Rosa, para que sejam apurados desvios de recursos públicos do Metrô paulistano e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) – um suposto esquema integrado por empresas com contratos firmados com sucessivos governos tucanos, de Mario Covas a Geraldo Alckmin, passando por José Serra. Bombardier, CAF, Siemens, TTrans e Mitsui teriam formado um cartel para desviar recursos dos cofres paulistas. As denúncias partiram da própria Siemens. Segundo estimativas da revista IstoÉ, aproximadamente US$ 50 milhões teriam sido desviados para paraísos fiscais. http://bit.ly/rba_propina_no_metro_sp AGOSTO 2013

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A coordenadora da Comissão Nacional da Verdade, Rosa Cardoso, disse durante reunião com a participação das centrais sindicais, em 22 de julho, que demissões sistemáticas de trabalhadores em represália do regime a sua militância podem configurar crime de lesa-humanidade. “É uma construção que precisamos fazer. Só tendo havido crime de lesa-humanidade é que os trabalhadores poderão pedir reparação”, afirmou. Devido ao prazo curto, ela disse que a comissão trabalhará “em ritmo de campanha”. http://bit.ly/rba_ditadura_trabalho

Rosa Cardoso

LÌVIA MOTA / ASCOM - CNV

Propinoduto no metrô

EDSON LOPES JR. / WWW.SP.GOV.BR

Geraldo Alckmin

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Lula: “Dentro de vocês está o político que vocês querem que os outros sejam”

RICARDO STUCKERT/INSTITUTO LULA

Sem política, sem solução


RICARDO STUCKERT/INSTITUTO LULA

Dilma contra o ódio Seminário realizado pelo PT em Salvador, ainda na conta da celebração dos dez anos à frente do governo federal, reuniu pela primeira vez em evento público a presidenta Dilma Rousseff, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dirigentes partidários. Dilma pediu aos militantes petistas que defendam o legado dos dois governos para que se estabeleça um “pacto pela verdade histórica”, na comparação com a oposição tucana. Lula elaborou uma evolução dos primórdios da criação do PT à sua ascensão ao poder, assinalando a transformação de reivindicações de classes e movimentos populares em políticas públicas inéditas. O ex-presidente disse que assumiu o cargo sabendo que não podia errar, mas observou que o pensamento conservador “odeia” muito mais a Dilma. Ela afirmou que a oposição tenta usar os manifestantes brasileiros, mas defendeu os protestos como a essência do PT. “Sabemos que democracia gera desejo de mais democracia.” http://bit.ly/rba_dilma_lula Os acontecimentos de junho tiveram seu ápice no dia 21 daquele mês, quando Dilma assimilou a legitimidade das manifestações e, em cadeia nacional de televisão, propôs

pactos nas áreas de saúde, educação, transporte público e combate à corrupção. Algumas medidas apresentadas pelo Executivo caminharam e lideranças do Congresso, nos primeiros dias, captaram o calor das respostas, mas aos poucos o Legislativo passou a dar aos debates o ritmo de sempre, ao sabor da má vontade da base aliada com a chefe do Executivo. http://bit.ly/rba_voz_esquecida O grupo de trabalho formado para elaborar novas regras eleitorais começou com crise. Em detrimento da bancada do PT, que indicou o deputado Henrique Fontana (RS), o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDBRN), nomeou Cândido Vaccarezza (PT-SP) para coordenar o grupo. Vaccarezza assumiu dizendo-se pessimista quanto às possibilidades de algo ficar pronto para valer já em 2014. Indicado para a segunda vaga pelo PT, Ricardo Berzoini (PT-SP) disse que Vaccarezza falou “por ele mesmo, não pelo grupo todo”. Admitiu que o governo falhou ao anunciar projetos antes de dialogar, enfatizou a necessidade de um esforço conjunto para reaglutinar a base, dispersa nos últimos seis meses, e garantiu acreditar: “Ainda há tempo”. http://bit.ly/rba_reforma_impasse

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), em reunião do Conselho da Cidade, propôs o direcionamento para os municípios de uma parcela do imposto sobre combustíveis, para financiar o subsídio às tarifas e reduzir seu preço, a renegociação da dívida paulistana retroativa ao ano 2000 e a definição de um patamar máximo de 3% sobre a receita da cidade para pagamento de precatórios. “Minha proposta é que o transporte privado deve custear o transporte público, de forma a desestimular cada vez mais o uso do veículo particular no dia a dia”, defendeu. Haddad já havia anunciado, dias antes, a intenção de discutir o lucro dos empresários do transporte público, que gira em torno de 13%, 14%. Entretanto, a administração teme não conseguir tocar projeto nenhum se não mudar os termos das dívidas com a União, que era de R$ 11,3 bilhões em 2000 – embora R$ 19 milhões já tenham sido pagos, ainda restam R$ 54 bilhões. http://bit.ly/rba_haddad_conselho

HELOISA BALLARINI/SECOM PREFEITURA SP

Haddad e os ecos de junho

Haddad: privado deve custear o público

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FOTOS CARLOS MACEDO/RBA

Fabrício e Osvaldo frequentam o estúdio de música da Casa da Juventude, diariamente. Marisa se tornou colaboradora da Justiça Comunitária depois de utilizar os serviços e ter seu problema resolvido

Políticas de paz...

…e de retrocessos

Mudar a realidade de segurança pública de uma comunidade a partir de ações sociais que valorizem a cidadania. Com esse princípio, a implementação do projeto Território de Paz, no bairro Guajuviras, em Canoas (RS), vem mudando a vida dos moradores nos últimos quatro anos. Com uma queda de 53,6% nos homicídios, em uma região que chegou a ser chamada de “Bagdá gaúcha”, e várias ações sociais com jovens e mulheres, o local é uma demonstração de que o Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) foi um avanço no enfrentamento da violência urbana. O projeto é composto de um conjunto de políticas, que vão de medidas preventivas como monitoramento por câmeras e vigilância a investimentos em áreas sociais de modo a reduzir a vulnerabilidade dos jovens e seus familiares à criminalidade. A reportagem da Rede Brasil Atual visitou a região, ouviu moradores, autoridades e especialistas, que revelaram a eficácia da integração das políticas sociais na construção da qualidade de vida e da paz. http://bit.ly/rba_territorios_de_paz

Nos últimos três anos, o governo federal inverteu as prioridades no campo da segurança pública. O Pronasci, que atua na prevenção à violência com projetos sociais, vem sendo esvaziado em termos orçamentários. A ponto de a experiência bem-sucedida de Canoas ter sido assumida com recursos próprios do município. Ao mesmo tempo, ampliam-se as verbas destinadas à construção de presídios e à política antidrogas, ações marcadas pelo modelo repressivo de atuação. http://bit. ly/rba_pronasci

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MARCOS DE PAULA/AE

O Brasil deu adeus a dois craques em um dia, 23 de julho: Djalma Santos e Dominguinhos. A lateral direita do campo, dizem os historiadores, jamais foi pisada por alguém melhor do que Djalma, que fez história no Palmeiras, Portuguesa, Atlético Paranaense e na seleção brasileira. Foi um dos poucos a atuar como titular em quatro Copas do Mundo (de 1954 a 1966). http://bit.ly/ rba_dois_craques Dominguinhos, que aos 13 anos ganhou de Luiz Gonzaga um apelido e uma sanfona, de lá pra cá vestiu-a como um uniforme e nunca mais tirou. No instrumento, compôs clássicos que hoje são parte da alma musical brasileira. Seu primeiro disco é de 1964, e a fama veio quase dez anos depois, quando Gilberto Gil gravou Eu só Quero um Xodó, parceria de Dominguinhos e Anastácia, com quem foi casado. Com Gil, fez também Lamento Sertanejo. http://bit.ly/rba_dominguinhos

ARQUIVO/AE

Djalma e Domingos


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Ana Paula

LUCIANA WHITAKER/RBA

Hesha e Mario, da Indonésia

Uma fé e muitas crenças Peregrinos que se aventuraram pela cidade do Rio de Janeiro não deixaram a bandeira de seu país em casa. Para além de diversas nacionalidades, a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) reuniu jovens de diferentes correntes religiosas e com posições divergentes sobre a moral cristã. O casal de namorados da Indonésia Hesha, 20 anos, e Mario, 25, levou quase três dias para chegar ao Brasil. Eles fazem parte de uma minoria de 3% de católicos em um país com cerca de 250 milhões de habitantes, 88% islâmicos. “Somos discriminados. Recentemente a nossa igreja foi queimada. O responsável não foi punido. Isso só aumentou a nossa fé”, disse Mario, que mostrou ponderação em relação a assuntos tratados como tabu pela Igreja. “A Igreja não pode escolher com quem cada um quer casar e, se a pessoa quer ficar com alguém do mesmo sexo, é um direito

dela, mas, como conservador, não apoio.” Contra a vontade da mãe, Ana Paula, 26 anos, deixou o conforto de casa aos 18, em Barra Mansa, no interior do Rio, para fazer voto de castidade, pobreza e obediência. “Desde criança quis ser religiosa. Decidi seguir os passos de São Francisco e Santa Clara de Assis. Hoje trabalho com educação de crianças pobres em Mateus Leme (MG).” Ela afirma que, se a igreja decidisse apoiar o casamento homoafetivo, “como cristã também apoiaria”. Sobre o aborto, acredita que “cabe à Justiça ver o que é certo ou errado”. A Jornada Mundial da Juventude recebeu 375 mil inscritos de 175 países, 220 mil deles brasileiros. A reportagem da Rede Brasil Atual tentou acompanhar e descrever a diversidade de opiniões e de posturas dos jovens perante o país, o mundo e sua própria religiosidade. http://bit.ly/rba_peregrinos

Depois do 11 de julho

GERARDO LAZZARI/RBA

O dia nacional de luta marcado pelas centrais sindicais no mês passado, que alguns órgãos de imprensa tentaram transformar em “greve geral”, não conseguiu unificar plenamente as maiores entidades de trabalhadores nas manifestações marcadas para o 11 de julho. Mas conseguiu cravar entre as bandeiras da sociedade os pontos que mais as unificam, como a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais, o fim do fator previdenciário e a rejeição ao Projeto de Lei nº 4.330, de 2004, sobre terceirização. As batalhas pela reforma política com participação popular e pela democratização dos meios de comunicação têm maior aderência na CUT e na CTB. A Força Sindical, por empenho de seu presidente, Paulo Pereira da Silva, tentou colar causas como “Fora Dilma”. Além disso, noves fora as divergências e interpretações, a data criou um calendário mais persistente contra o PL da terceirização. No dia seguinte, em entrevista coletiva, as centrais sindicais anunciaram novas manifestações para 6 de agosto contra o projeto. E outras no dia 30, dessa vez pelas demais bandeiras, que incluem, além da jornada, previdência, saúde, educação, transporte... “Essa pauta é o que unifica as centrais sindicais”, disse o presidente da CUT, Vagner Freitas. http://bit.ly/rba_11_de_julho REVISTA DO BRASIL

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SAÚDE

Persistem os sintomas Entidades que representam médicos – aqueles que juram trabalhar pela vida e a saúde da população – fazem oposição feroz a programa criado para atendimento a regiões que mais precisam Por Cida de Oliveira 10

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caivera é um bairro carente de Betim, quase na divisa com Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. O serviço público é a única opção para mais de 95% de seus 20 mil habitantes. Desde o começo deste ano, porém, a Unidade Básica de Saúde (UBS) local conta com apenas dois médicos. Um deles atende diariamente por quatro horas; o outro trabalha por oito horas, sozinho, à frente de duas equipes do Programa Saúde da Família (PSF). Não há pediatra nem ginecologista. O jeito é buscar atendimento na cidade vizinha ou tomar três conduções até o centro de Betim, a 35 quilômetros.


SAÚDE

conta, referindo-se a outro bairro da região. “Todo mundo que chegava voltava com as crianças, porque eles já iam avisando, da porta mesmo, que não tinha pediatra e não tinha como atender.” Na mesma localidade, a vendedora Maria Fabiana dos Santos Costa espera para fazer uma ressonância magnética. “Estou doente há quase três anos, piorando. Fico em cima da cama sem poder andar.” Pela consulta com o ortopedista que pediu o exame ela esperou mais de dois anos. “Enquanto isso o caso só piora, não ando mais e estou com depressão porque não posso nem sair da cama sem ajuda.”

Muitas situações que poderiam ser prevenidas e cuidadas ali acabam sobrecarregando o pronto atendimento em outras localidades. “Houve concurso, mas os médicos optam por vagas em bairros mais próximos, de fácil acesso”, diz o farmacêutico Rilke Novato Públio, integrante do Conselho Municipal de Saúde. Nas periferias de São Paulo, maior cidade do estado mais rico, a população mais pobre também sofre com a falta de médicos. “Das nove consultas de pré-natal que eu deveria fazer, fiz só cinco. E nunca tinha pediatra para atender meu filho de 3 anos. Até hoje, se ele passou por seis consultas, foi muito”, reclama a dona de casa Cirlene dos Santos, moradora do Jardim Cocaia, no extremo sul da cidade, a 31 quilômetros do centro. “Temos três vagas de clínico geral e estamos sem nenhum. Dois estão de licença, um foi embora e não há previsão de quando serão repostos. Eles são a base do atendimento”, lamenta um funcionário de um complexo de saúde na região, que prefere não se identificar. Na sala de espera, usuários reclamam que a falta de clínico geral já dura um ano. A história é semelhante em Itaquera, na zona leste, a 22 quilômetros do centro. Ao procurar pediatra para sua filha de 4 meses, a dona de casa Maria Aparecida da Silva foi em vão a duas unidades de Assistência Médica Ambulatorial (AMA), Santa Marcelina e Hospital Planalto. “Disseram que não tinha e era possível encontrar lá para os lados do Belém”,

Atendimento à deriva

TÂNIA RÊGO/ABR

DANILO RAMOS/RBA

PERIFERIA SEM MÉDICOS Cirlene dos Santos, do Jardim Cocaia: “Das nove consultas de pré-natal que eu deveria fazer, fiz só cinco”

LINHA DURA Conselhos e Associações de médicos colocam obstáculos à ação do governo

A falta de médicos, que deixa unidades de saúde ociosas e crianças, adultos e idosos sem atendimento, ou amontoados em corredores, é um dos maiores problemas dos gestores de saúde no Brasil. Especialmente daqueles de cidades pequenas do interior do país ou de periferias mais distantes e carentes das regiões metropolitanas. Tanto que foram pedir ajuda ao Ministério da Saúde, que no final do ano passado criou o Programa de Valorização dos Profissionais na Atenção Básica (Provab). Supervisionado por uma instituição de ensino, o médico participante recebe bolsa federal de R$ 8 mil mensais por 12 meses e bônus para os exames de residência médica com o compromisso de se especializar em saúde da família. Mas a adesão não supriu a necessidade. Conforme o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), mais da metade dos 2.867 municípios que recorreram ao Provab não conseguiu sequer um médico. A adesão foi mínima no Acre, onde a carência é maior. A pequena Capixaba, a 77 quilômetros de Rio Branco, na divisa com a Bolívia, com 8.800 habitantes, pediu quatro médicos e atraiu um. Pior sorte teve Epitaciolândia, a 243 quilômetros da capital acreana, 15.200 habitantes, também na divisa: tem três vagas e não conseguiu ocupar nenhuma. Conforme o Ministério da Saúde, o Brasil tem, em média, 1,8 médico para cada mil habitantes, menos que Venezuela (1,9), México (2,4), Argentina (3,2) e Cuba (6). Faltam clínicos, REVISTA DO BRASIL

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SAÚDE

pediatras, anestesiologistas, psiquiatras, neurologistas, neurocirurgiões, cardiologistas, radiologistas e nefrologistas. Em maio passado, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, anunciou que negociava com Cuba um acordo para trazer ao país 6 mil de seus médicos. Logo se manifestaram entidades como o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Federação Nacional dos Médicos (Fenam), segundo as quais não faltam profissionais – eles estariam mal distribuídos, concentrados em regiões mais ricas, em centros bem equipados, com melhores condições de trabalho. O posicionamento contou com apoio de 63 outras entidades regionais e de âmbito nacional de diversas especialidades e áreas da saúde, além da Ordem dos Advogados do Brasil e da Força Sindical. Meses antes, as corporações médicas tinham criticado mudanças no exame de revalidação do diploma de médicos formados no exterior, o Revalida. Segundo analistas, o decreto que o criou determina provas teóricas abrangentes e práticas conduzidas com pacientes simulados.

Reprovação anunciada

Na realidade, a prova elaborada sempre pela mesma elite do corporativismo

médico brasileiro, sem avaliação de conflitos de interesse, reprova mais de 90% dos candidatos já no teste de múltipla escolha, a primeira etapa. “Por que brasileiros passam em exames nos Estados Unidos e americanos não passam no Revalida brasileiro? É porque tem alguma coisa errada”, diz o conselheiro consultivo do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) Heleno Rodrigues Correa Filho, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Com as manifestações de junho, que reivindicavam também melhorias na saúde, a presidenta Dilma Rousseff foi à TV e propôs a contratação de médicos como medida emergencial para reduzir o déficit. Sem a pretensão de resolver, numa canetada só, todos os problemas do setor – marcado sobretudo pelo financiamento insuficiente –, o governo anunciou no começo de julho o Programa Mais Médicos. Previsto para durar três anos, podendo ser prorrogado pelo mesmo período, vai pagar bolsa mensal de R$ 10 mil, mais ajuda de custo e passagens para a instalação do médico inscrito. Para aproximar o estudante de medicina da comunidade, melhorando o treinamento em serviço, exclusivamente na atenção básica e urgência e emergência, com supervisão, pro-

Especialistas em debate na TVT O prós e contras do “pacto pela saúde”, convocado pela presidenta Dilma Rousseff como resposta às manifestações de junho, e as virtudes e os defeitos do Programa Mais Médicos, proposto em seguida pelo governo federal, foram tema de debate levado ao ar pelo programa Melhor e Mais Justo, da TVT, em 18 de julho. Participaram da discussão o presidente da Associação dos Médicos Residentes do Estado de São Paulo, Pablo Kokay Valente, o coordenador dos médicos de Urgência e Emergência da Secretaria de Saúde de Mauá (região do ABC paulista), Vagner Gilioti Júnior , a presidenta da Associação Paulista de Medicina – Regional Santo André, Alice Lang, e a professora da USP Lúcia Christina Iochida, diretora da Associação Brasileira de Educação Médica. A íntegra do programa, de 40 minutos de duração, pode ser vista no site da emisso12

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Como sintonizar Canal 48 UHF (NGT) ABC e Grande São Paulo Canal 46 UHF Mogi das Cruzes e Alto Tietê NET no ABC ECO TV: canais 96 (analógico) e 9 (digital) TV a cabo em São Paulo Canais 9 e 72 TVA analógico e 186 TVA digital Na internet www.tvt.org.br

ra: www.tvt.org.br/melhor-e-mais-justo. Os desafios do exercício da medicina e a consistência da prova de avaliação do Conselho Regional de Medicina de São Paulo também foram temas de reporta-

gem especial do ABCD em Revista em 10 de julho. O programa entrevistou médicos, professores, estudantes, entidades, população e governos. E também pode ser acessado no site www.tvt.org.br/abcd


DANILO RAMOS/RBA

SAÚDE

POSTOS OCIOSOS sem atendimento, a principal queixa da população é a falta de clínico geral

põe mudanças na graduação. Além disso, prevê a criação de 11.400 novas vagas até 2017, das quais 3.600 em universidades públicas e 7.800 na rede privada. Médicos estrangeiros, para trabalhar nos locais de maior demanda, só serão contratados para vagas não preenchidas pelos brasileiros. Saíram em defesa da iniciativa o Conselho Nacional de Saúde, a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e prefeitos e secretários da área que sentem na pele a dificuldade para contratar médicos. Consideraram as medidas coerentes com resoluções e recomendações da Opas à cobertura universal, fortalecimento da atenção básica e primária e equidade na atenção à saúde da população. Usuários do sistema público de saúde também apoiam o programa. “É cla-

ro que precisamos de mais infraestrutura para melhorar o atendimento, mas não adianta inaugurar hospital todo equipado se não tiver profissionais para trabalhar. Além disso, muitos dos estudantes de medicina não entendem bem o que significa saúde pública, são formados para uma medicina curativa, e não preventiva, como deve ser o SUS”, diz o coordenador dos movimentos populares de saúde de São Paulo, Frederico Soares de Lima.

Longe do necessário

Uma pesquisa do professor da Universidade Federal do Tocantins (UFTO) Neilton Araujo de Oliveira, para conhecer o pensamento e expectativas dos alunos que se formam, constatou que apenas 5% desejam trabalhar em cidades peque-

nas do interior do país, onde a carência é maior; somente 20% querem atuar em clínica geral, como no Programa Saúde da Família; e 63%, serem especialistas. Outro dado interessante é que, embora 60% tenham informado haver aulas práticas em UBS e hospitais do SUS, somente 21% declararam a existência de atividades comunitárias durante sua formação. Durante debate sobre o tema no programa Melhor e Mais Justo, da TVT, que foi ao ar em 18 de julho, a médica e diretora da regional paulista da Associação Brasileira de Educação Médica Lúcia Christina Iochida criticou o governo. “Colocar médicos em regiões carentes sem condições adequadas para trabalhar não vai resolver o problema. E como vão mexer nos cursos sem consultar os que formam médicos?”, questionou. Dois dias antes, enquanto médicos, em protesto, faziam o enterro simbólico da presidenta e do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, anunciou a criação de uma comissão formada por diretores de faculdades federais e coordenadores de cursos de medicina para aprimorar pontos do programa. As reações da corporação foram além, com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) que argumentam “falta de urgência e relevância do programa” e questionam a vinda de médicos estrangeiros. E, pela primeira vez, partiram para o confronto direto. No dia 19, anunciaram a saída de seus integrantes de postos ocupados em comissões e câmaras do Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e do Conselho Nacional de Saúde (CNS). “O rompimento é lastimável, um erro político. O CNS não é governo, e sim um órgão representativo da sociedade brasileira, com 144 integrantes, que debate a saúde pública. Os médicos deixam esses fóruns num momento em que deveriam ficar ao lado da sociedade que vai às ruas para defender melhorias na saúde pública”, avaliou a presidenta do Conselho Nacional de Saúde, Maria do Socorro de Souza, por telefone, direto de uma aldeia Xavante que visitava. A principal queixa que se ouvia ali: falta de médico. Colaboraram Sarah Fernandes e Júlia Rabahie REVISTA DO BRASIL

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NA RÁDIO

ELZA FIÚZA/ABR

ELEMENTAR Padilha: “Estamos falando de atenção básica, não estamos falando de hospitais altamente completos, e a atenção básica salva vidas”

Sobram ataques, falta proposta Em entrevista à Rádio Brasil Atual, ministro da Saúde cobra entidades médicas que combatem o programa criado para solucionar a carência no setor

O

ministro da Saúde, Alexandre Padilha, afirmou que não admitirá “ataques pessoais” e “boatos” vindos de entidades médicas que protestam contra as medidas anunciadas pelo governo, em especial o Programa Mais Médicos. “Nesse debate de divergências, propostas são importantes. O que eu não admito e lamento muito são debates de ataques pessoais ou de boatos. Circulou boato por aí, com ações de entidades, que o Ministério da Saúde não teria executado R$ 17 bilhões do orçamento em 2012. Não é verdade. O ministério empenhou todo o volume de recursos autorizados pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento”, disse Padilha, em entrevista à Rádio Brasil Atual. Em julho, a Associação Médica Brasilei14

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ra (AMB) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) entraram com ações no supremo Tribunal Federal (STF) contra a proposta. O presidente em exercício do STF, Ricardo Lewandowski negou o pedido de liminar da AMB. No total, foram cinco ações proto-

Sintonize O Jornal Brasil Atual vai ao ar diariamente, das 7h às 9h, com reprise às 12h30. Ao longo do dia, a Rádio Brasil Atual toca música brasileira, com flashes de noticiários e prestação de serviços.

93,3 FM Litoral paulista 98,9 FM Grande São Paulo 102,7 FM Noroeste paulista Na internet www.redebrasilatual.com.br/radio

coladas contra o Mais Médicos. O ministro disse esperar das entidades a apresentação de propostas alternativas às do programa do Executivo. “O governo apresentou um conjunto de ações que vão da infraestrutura, aumento de recursos e de vagas para formação ao chamamento que prioriza médicos brasileiros. Precisamos debater propostas, que sejam apresentadas.” Uma das maiores críticas levantadas pelas entidades médicas é em relação à falta de infraestrutura em saúde para atendimento adequado à população nas regiões periféricas das grandes cidades e em municípios do interior do país. Segundo as entidades, de nada adianta levar médicos se os equipamentos de saúde não forem adequados. O presidente da AMB, Murilo Rezende de Melo, acusou o Mais Médicos de “populista”. Padilha afirmou que, apesar de certas localidades não possuírem a estrutura adequada, a presença de médicos é fundamental no atendimento em atenção básica de saúde à população. “Há lugares que não têm infraestrutura, verdade, mas esses lugares têm pessoas que precisam ser atendidas, e o médico, junto com a equipe multiprofissional, do lado do paciente, em qualquer situação, faz a diferença. Estamos falando de atenção básica, não estamos falando de hospitais altamente completos, e a atenção básica salva vidas.” O Mais Médicos prevê contratações em municípios do interior e na periferia das grandes cidades com o objetivo de diminuir a carência desses profissionais nas regiões prioritárias para o Sistema Único de Saúde (SUS). Prevê ainda fortalecer a prestação de serviços na atenção básica em saúde no país e ampliar a inserção do médico em formação nas unidades de atendimento do SUS. De acordo com o governo, a prioridade é contratar profissionais formados no Brasil. Caso as vagas não sejam preenchidas, contratará brasileiros formados no exterior e estrangeiros, nessa ordem. A estimativa é abrir cerca de 10 mil vagas, mas o número pode mudar, já que os municípios ainda vão se inscrever no programa. Ouça a entrevista completa em http://bit. ly/rba_ministro_padilha


LALO LEAL

As falanges em ação

Meios de comunicação promovem a censura, com noticiários seletivos sobre manifestações, reforma política, sonegação da Globo ou democratização da mídia. Temas que ou omitem, ou distorcem

F

inal de tarde no Rio de Janeiro. Dia da chegada do papa ao Brasil. No Largo do Machado, reduto histórico de manifestações políticas, entre o Catete e as Laranjeiras, o clima assemelha-se a um happening. Em cantos diferentes da praça reúnem-se jovens católicos de várias partes do mundo, militantes do PSTU, ativistas dos movimentos LGBT (algumas moças com seios à mostra), outros com bandeiras anarquistas e, claro, os policiais em trajes de guerra. Mas cada um no seu canto, com suas armas, cartazes e palavras de ordem. Sem confrontos. Caminho sem preocupações entre os grupos quando outro tipo de gente chama a minha atenção: homens fortes, com idade entre 30 e 40 anos, camisetas justas, circulam pela praça. Um está de luvas, outro se enrola na bandeira da CTB, uma das centrais sindicais brasileiras. Muito estranho. Os jovens católicos continuam a cantar nas escadarias da igreja. O grupo com as bandeiras do movimento gay aproxima-se e depois segue com os demais manifestantes rumo ao Palácio Guanabara, onde Francisco é recebido. Perco-os de vista. Mais tarde soube dos tumultos às portas do palácio. Uma bomba caseira foi atirada contra os policiais. Claro que a culpa é logo atribuída pela mídia conservadora aos manifestantes. O desmentido chega num vídeo postado na internet que revela a ação de agentes policiais à paisana provocando tumultos. A maior surpresa vem a seguir. Lá estava em frente ao palácio, sendo dobrada por um policial, a bandeira da CTB vista por mim horas antes no Largo do Machado.

A ação dos policiais infiltrados, os chamados P2, não aparece na TV. Esta, além disso, dá proteção total aos fardados. A GloboNews afirmou que um repórter da agência de notícias France Presse, visto com a cabeça sangrando em frente ao Guanabara, havia sido atingido por um coquetel molotov. O jornalista fora vítima, porém, de uma cacetada desferida por um policial. O canal reconheceu o erro muitas horas depois, quando o estrago já estava feito. Pude ouvir pessoas nas ruas atribuindo essa violência aos manifestantes, sem saber da verdade. A reação do governo do Rio foi a pior possível. Por decreto instituiu a Comissão Especial de Investigações de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas, com poderes até para exigir das empresas de telefonia e de servidores da internet a entrega de dados das comunicações feitas por qualquer pessoa. Recuou diante das reações desfavoráveis. O advogado Técio Lins e Silva chegou a comparar o decreto com as comissões de inquérito criadas na ditadura. “Está entre o delírio e o abuso de poder. É caso de impeachment, há uma violação clara de direitos constitucionais.” A comissão foi mantida e admite investigar a ação dos infiltrados. No entanto, dada sua composição, fica difícil acreditar que a verdade venha à tona. Formam o grupo representantes do Ministério Público do Rio, da Secretaria de Segurança Pública e das Polícias Civil e Militar. Diante do histórico dessas polícias só resta chamar o ladrão, como dizia a música do Chico Buarque na época da ditadura. Mídia e governo do Rio parecem saudosos daqueles tempos. A censura opera agora através dos próprios meios de comunicação, com a seletividade dos seus noticiários não só sobre as manifestações de rua, mas também diante de temas como a reforma política, a proposta do governo para ampliar o atendimento médico, a denúncia de sonegação fiscal cometida pela Globo e o debate em torno da democratização da mídia, por exemplo. Temas que, quando não omitem, distorcem. A desinformação associa-se ao autoritarismo do governo estadual, fazendo lembrar – com um arrepio na espinha – do incêndio do Reichstag, o Parlamento alemão, ocorrido há exatos 80 anos. Ação isolada de um indivíduo ou articulada por um grupo nazista serviu de pretexto para milhares de prisões, garantindo apoio popular a um governo que levou a humanidade a um dos seus períodos mais aterradores. Há seguidores por aqui. REVISTA DO BRASIL

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TRABALHO

A CUT, O TEMPO Central nasceu enfrentando o poder. Cresceu, aproximouse dele e ainda o disputa. Trinta anos depois, reflete sobre seu papel institucional Por Vitor Nuzzi

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CUT nasceu na tarde de 28 de agosto de 1983 sob clima político e econômico tumultuado. E completa 30 anos com o ambiente ainda agitado pelas manifestações realizadas em junho. Três décadas atrás, o objetivo era claro: o fim da ditadura. Hoje, os inimigos não estão no poder, mas a relação com o governo central é objeto de questionamentos. Com a democracia reconquistada, levou tempo para que a central se firmasse institucionalmente. Consolidada, faltou chegar à tão falada mudança da estrutura sindical brasileira. O atual presidente, Vagner Freitas, faz a autocrítica, mas antes busca enfatizar a relevância histórica da entidade. “Estamos falando da central que tem 40% dos trabalhadores sindicalizados no Brasil, teve um de seus fundadores eleito presidente da República, que esteve na resistência à ditadura, tem representação em todos os setores da atividade econômica, participação nos fatos históricos da vida nacional, como a luta contra a carestia e pelo fim da ditadura. A participação política na Diretas Já, o impeachment de Fernando Collor, a preocupação com a formação do cidadão participativo, não só reivindicativo”, enumera. Como fator negativo, em sua avaliação faltou uma crítica “mais contundente” em relação ao papel do Estado. Em 16

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Presidente da CUT destaca importância histórica da central, mas identifica certo descrédito na sociedade em relação ao movimento sindical e pede mudanças em estrutura “arcaica”


TRABALHO

E AS RUAS

um governo dito de coalizão, representantes do empresariado e dos trabalhadores ganharam assento em postos importantes da República, e disputam como podem para que lado pendem as decisões dos poderes. Para Freitas, ainda pendem mais para o do capital. O dirigente lamenta também a não reformulação da atual (e antiga) estrutura sindical, que em sua visão facilita a acomodação dos dirigentes e desestimula a militância dos jovens. Ele mesmo diz que pensaria duas vezes se tivesse 18 anos hoje.

RAIMUNDO PACCÓ/FOLHAPRESS

Fora do prédio

Em fevereiro deste ano, parecendo adivinhar o que aconteceria quatro meses depois, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse à direção da CUT que ela deveria atuar mais próximo dos movimentos sociais com pouca estrutura, não poderia se limitar à luta corporativa. “Faça todas as brigas que tiver de fazer, internamente, mas quando terminar a CUT tem de ir pra rua. A CUT não nasceu para ficar dentro de um prédio.” Mas não se pode dizer que o movimento sindical ficou para trás. O sociólogo Adalberto Cardoso, diretor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj), faz uma leitura crítica da cobertura das manifestações de rua pela mídia tradicional, que identificaria os jovens como o moderno e os trabalhadores como o atraso. “É uma leitura adversária ao mundo do trabalho, uma posição contrária ao trabalho organizado”, observa. “A minimização do movimento sindical interessa a uma elite conservadora.” Segundo o pesquisador, o sindicalismo representa hoje “a principal fonte de elites governantes de estrato popular”. “É contra isso que a mídia no Brasil se bate. É má-fé dizer que esse sindicalismo não existe.” Mas ele também lembra que esse movimento, CUT incluída, não fez a reforma para, por exemplo, acabar com o imposto sindical. “Sempre fui contra essa forma de financiamento, mas sou obrigado a reconhecer que foi com ela que mantivemos sindicatos com alguma capacidade de mobilização. Se não fosse essa estrutura, não teríamos tido Lula na Presidência”, diz REVISTA DO BRASIL

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TRABALHO

Outro mundo

Alguns dados podem soar inverossímeis para a geração posterior à dos fundadores da CUT. Em 1983, endividado, o país recorria ao Fundo Monetário Internacional. A inflação chegaria a mais de 160% pelo IPCA e superaria os 200% pelo INPC, ambos calculados pelo IBGE. A pretexto de combatê-la, o governo, por meio do então ministro Delfim Netto, o czar do Planejamento, apresentou, entre outros, o Decreto-Lei nº 2.045: os reajustes salariais se limitariam a 80% do INPC. Em julho daquele ano, o movimento sindical – que ainda não tinha uma central – organizou uma greve geral contra o arrocho e a ditadura. Alguns dias antes, os petroleiros organizaram uma paralisação. A resposta do governo, habitual no regime autoritário, foi intervenção em sindicatos. Categorias como bancários, metalúrgicos e petroleiros tiveram suas direções cassadas. Nos últimos 30 anos, o país teve três períodos claros em relação às greves. Em 1986 e 1987, fase imediatamente pós-ditadura e marcada pelos primeiros planos 18

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A inflação pelo IPCA foi de 164,3%

As linhas telefônicas eram tão caras que tinham de ser declaradas no Imposto de Renda

O presidente-general João Figueiredo (PDS) governava desde 1979, quando recebeu 355 votos no colégio eleitoral. A última eleição direta acontecera em 1961

19832

Bruna Lombardi fazia par romântico com Fábio Jr. na trama das 8 Louco Amor

Apenas 5 partidos políticos tinham registro no TSE

CLÍCIO BARROSO/DIVULGAÇÃO

Cardoso. “A CUT sobreviveu, passou pelo furacão dos anos 90, pela grande crise do mundo do trabalho, com essa estrutura”, lembra o pesquisador, para observar que o sindicalismo “foi dizimado no México, enfraquecido na Argentina e destruído no Chile”. Pode-se acrescentar o caso dos Estados Unidos, onde o índice de sindicalização no setor privado fica nos 7%. Cardoso faz a demarcação histórica. “Quando a CUT nasceu, o Brasil era uma ditadura. Tinha um general na Presidência. Isso significava lutar contra o poder de intervenção, o poder da Justiça do Trabalho, com decisões em geral contrárias aos trabalhadores. Toda a estrutura era autoritária e, no limite, impedia que os trabalhadores se organizassem de maneira autônoma.” E considera que, com Lula, a central chegou ao poder. “A CUT forneceu quadros para várias instâncias do governo. É uma estreiteza de compreensão política dizer que é chapa-branca. Outra coisa são os sindicatos de base, que fazem greve para melhorar as condições de trabalho de seus representados.”

Ritchie, embalado por Menina Veneno, vendia mais LPs que Michael Jackson com sua Billie Jean. Nosso Louco Amor, da Gang 90 & As Absurdettes, abria a novela das 8. Neusinha Brizola esculachava com Mintchura. Nesse ano surgiram os Titãs e Os Paralamas do Sucesso lançaram Cinema Mudo

O país tinha 4.500 sindicatos e não existiam centrais sindicais

Apple Lisa Christopher Reeve vestia mais uma vez o uniforme em Superman III.Também em cartaz nas telonas estavam Zelig, O Selvagem da Motocicleta, Star Wars – O Retorno de Jedi, Pra Frente, Brasil, Flashdance, E la Nave Va, O Dia Seguinte e Gabriela, Cravo e Canela

A lista dos livros mais vendidos abria com A Velhinha de Taubaté, de Luis Fernando Verissimo, atrás vinham O Ponto de Mutação (Fritjof Capra) e Christine (Stephen King)


TRABALHO

Dilma Rousseff (PT) recebeu 55,7 milhões de votos em 2010. Foi o quarto presidente eleito desde o fim da ditadura Além de milhares de linhas fixas, o país tem quase 270 milhões de celulares, a maioria capaz de acessar a internet

32013 O IPCA projeta inflação de 6%

Matheus Solano é destaque como Félix, em Amor à Vida

30 partidos políticos participam das eleições

O Brasil tem 10.200 sindicatos e 5 centrais sindicais reconhecidas

Remake do remake, Homem de Aço voa nos cinemas ao lado de Django Livre, O Lado Bom da Vida, Guerra Mundial Z, Lincoln, O Cavaleiro Solitário, Faroeste Caboclo e O Grande Gatsby

O norte-americano Dan Brown volta ao topo com Inferno, seguido por A Culpa É das Estrelas (John Green), Casagrande e Seus Demônios (Casagrande e Gilvan Ribeiro) e Cinquenta Tons de Cinza (E.L. James)

Apple MacBook

Entre um funk carioca e um hino religioso, nas rádios se ouve Luan Santana (foto) cantando Te Esperando. Toca também Amiga da Minha Irmã, de Michel Teló, Desencana, de Thiaguinho, Amor de Chocolate, de Naldo, 93 Milion Miles, com Jason Mraz, Girl on Fire, na voz de Alicia Keys, Diamonds, de Rihanna, e When I Was Your Man, com Bruno Mars

*Dados sobre desemprego não são tecnicamente comparáveis, por diferença de metodologia. **O PIB de 2013 é uma projeção.

econômicos, em geral adversos aos trabalhadores, o número de paralisações ficou perto de mil por ano. No biênio 19891990 – fim do governo Sarney, hiperinflação, desemprego em alta, oposição a Fernando Collor –, houve o maior número de greves da série histórica organizada pelo Dieese: 1.962 e 1.773, respectivamente. O terceiro vai de 1994 a 1996, pós-Plano Real. Segue-se uma longa fase de retração que só muda, em parte, a partir de 2008, ano da crise internacional. Em 2012, com inflação mais alta e crescimento menor, a incidência de paralisações chegou aos maiores níveis desde 1996, aponta o Dieese: 873. Nos últimos tempos de ditadura, politicamente, o Brasil dava passos à frente e para trás. Em 1979, quando assumiu o último general-presidente, João Figueiredo, foi aprovada a Lei de Anistia, a anistia “possível” – após negociação com um regime autoritário do outro lado da mesa –, hoje contestada pelas representações de direitos humanos. Em 1980 e 1981, bombas em bancas de jornais, no Riocentro e na OAB do Rio de Janeiro testavam os limites da “abertura”, que passaria a admitir mais partidos, em vez dos dois únicos até então permitidos. No ano seguinte, a oposição cresce nas eleições estaduais, especialmente nos grandes centros urbanos, e no Congresso. Os partidos se reorganizam, assim como os sindicatos, força social mais encorpada depois das greves que desafiaram o período de exceção no final dos anos 1970. Foi nesse ambiente que surgiu a CUT, durante um congresso no Pavilhão Vera Cruz, em São Bernardo do Campo, com mais de 5 mil delegados. Ali foi aprovada a proposta e formada uma direção provisória, tendo à frente Jair Meneguelli. O então metalúrgico da Ford e presidente do sindicato de São Bernardo e Diadema está hoje à frente do Conselho Nacional do Sesi. Não foi uma decisão unânime. As correntes políticas que haviam participado da 1ª Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), em 1981, começavam a se articular cada qual em seu bloco. Tanto que em 1986 surgiria a CGT, que três anos depois se dividiria em duas. REVISTA DO BRASIL

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TRABALHO

Em 1991, viria a Força Sindical. Seguiu-se um período de recomposição de forças, até chegar ao reconhecimento formal das centrais, por uma lei aprovada em 2008, no governo Lula – hoje são cinco reconhecidas e pelo menos dez em atividade. Foi um período de maior abertura, como observa Cardoso. “Lula chamava todo mundo para negociar. É uma abertura que reduz o nível de conflito. Ele era mesmo aberto ao diálogo com o movimento sindical, que também participava do poder.” Houve uma mudança com a posse de Dilma Rousseff. “Com menor receptividade, as pessoas vão mais para as ruas. Os sindicalistas não se sentem tão representados com Dilma.” Pelo menos uma das bandeiras daquele período, relativa ao poder normativo da Justiça do Trabalho, não faz tanto sentido hoje, na opinião do pesquisador, para quem esse setor tem “papel residual” nas relações do trabalho. “São 30 mil negociações coletivas por ano. Quem acha que nosso sindicalismo é só burocracia está enganado. Ou faz que não vê”, acrescenta. Outras pautas das centrais não podem ser consideradas apenas trabalhistas, segundo Cardoso, que cita em artigo a redução da jornada e a mudança de regras na aposentadoria. “Trabalhar menos e se apo-

A CUT hoje

3.806

entidades filiadas

23.981.044

trabalhadores na base

7.847.077 sindicalizados

sentar com decência são conquistas civilizatórias universalizadas no século 20 nos países mais ricos, mas permanecem uma promessa no Brasil. E são demandas históricas do nosso sindicalismo.”

Institucionalização

“O ressurgimento da ação operária e sindical na segunda metade dos anos 1970, bem como a ação de outros setores sociais e políticos no Brasil, nesse período, foi importante para o fim da ditadura e a consolidação democrática”, observa o sociólogo Iram Jácome Rodrigues, professor livre-docente do Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da USP. “De outra parte, o processo de institucionalização da CUT, que começou, principalmente, a partir do 4º Concut (congresso nacional da central, em 1991), quando a posição

majoritária do congresso resolveu apostar na CUT-organização, em vez da CUT-movimento, ampliou o crescimento da central no interior da estrutura sindical e, paulatinamente, afastou os setores das oposições sindicais dos centros decisórios da estrutura cutista. A pergunta que poderíamos fazer é se esse processo era

Acomodação é alerta O presidente da CUT, Vagner Freitas, observa certo descrédito da sociedade em relação ao movimento sindical. Mas não considera as recentes manifestações um “sinal de alerta” de que os desorganizados estejam questionando os organizados. O alerta, segundo ele, é a sensação de descrédito sobre uma estrutura sindical que possibilita a acomodação dos dirigentes e precisa ser reformulada.

Os sindicatos foram questionados? Hoje há um certo descrédito da sociedade em relação ao movimento sindical. Isso acontece em razão de uma estrutura que possibilita a acomodação dos dirigentes. Não é concebível 20

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ROBERTO PARIZOTTI/CUT

Qual é o desafio atual? Agora, os desafios passam pela renovação do sindicalismo brasileiro, com o sindicato organizado a partir da vontade dos trabalhadores. Este é realmente o grande desafio: mudar a estrutura sindical brasileira, que é arcaica. A CUT tem de intensificar ainda mais a luta pela mudança da estrutura sindical, para um sindicalismo não voltado aos interesses dos sindicalistas e tutelado pelo Estado.

Vagner em manifestação na Av. Paulista: “O sindicato existe para que o trabalhador melhore de vida e para transformar a sociedade”


ROBERTO PARIZOTTI/CUT

TRABALHO

ATUAL Protesto contra projeto sobre terceirização tem unido as centrais

inevitável ou se haveria outras possibilidades. Acredito que, naquele momento, a maioria escolheu – em que pesem algumas diferenças – um modelo de central, afeita mais à negociação, de defesa da democracia, menos conflitiva.” Passados 30 anos, o pesquisador identifica vários desafios. “O primeiro é a necessidade de uma ligação mais estreita

com as suas bases. À exceção de alguns grandes sindicatos, que têm forte enraizamento nos locais de trabalho, como o dos Metalúrgicos do ABC, Bancários de São Paulo e Apeoesp (professores da rede pública estadual paulista), parcelas significativas de seus sindicatos não conseguiram organizar os empregados no interior das empresas.” Essa organização no local

que sindicatos da CUT sejam defensores do imposto sindical. Ser cutista não significa apenas ter uma bandeira da central, é defender suas concepções. Sobre as manifestações... Não acho que as manifestações de junho possam ser um alerta para nós. Alerta é a acomodação dos dirigentes, chapas cutistas enfrentando chapas cutistas em eleições, sem limitação de mandato, sem transparência na prestação de contas. E precisamos de investimento em formação. O dirigente sindical, para ser representativo, tem de ser espelho do que é a sua base. Qual é o trabalhador que temos hoje, quais são suas aspirações? Mas sempre com viés classista, de enfrentamento ao capital, pela divisão da riqueza, por um mundo em que o trabalho tenha mais valor do que a propriedade. Muitos que eram da CUT foram para o governo. A relação ficou confusa? Realmente há uma certa confusão de papéis no processo, não no enfrentamento de campanhas, mas na cobrança para mudar a estrutura do Estado, que continua conservador e

de trabalho, observa, “é a única maneira de mudar a estrutura sindical”. Outro desafio, em sua opinião, é atrair a juventude. “As manifestações recentes no Brasil demonstraram um descolamento entre as demandas das camadas médias e o sindicalismo”, afirma. Embora até certo ponto difusos, os protestos têm um aspecto central, segundo Iram, relacionado às políticas públicas. “Em outras palavras, é possível dizer que um dos sentidos mais significativos dessas manifestações tem sido a reivindicação por ‘desmercadorização’, por menos mercado e mais políticas públicas. Essa agenda, certamente, é também uma agenda cara ao sindicalismo. Nesse sentido, é importante os sindicatos irem às ruas, defenderem suas demandas mais específicas – como fizeram em 11 de julho – e, ao mesmo tempo, construírem pontes com as manifestações de junho.” Ele considera que um desafio fundamental, para todo o movimento sindical e a CUT em especial, é se reciclar. “Há uma nova geração pedindo passagem...” De 28 a 30 deste agosto, o Pavilhão Vera Cruz receberá novamente um evento sindical da CUT. Momento de lembrar acontecimentos históricos e avanços conquistados. De refletir e planejar estratégias de ação, diante de uma nova conjuntura e em um momento político bastante diferente do original.

defendendo o capital. É preciso uma crítica mais dura em relação à convivência com o Estado conservador, compromisso com políticas públicas de saúde, educação e transporte. Tinha de fazer uma reforma tributária... Faltou fazer essa crítica mais contundente. Há uma crítica sobre a central ter se tornado chapa-branca. Seria inevitável essa conclusão dos nossos opositores. Mas nos últimos dez anos tivemos a política de valorização do salário mínimo, aumento real dos salários, maior participação no PIB. Não temos pleno emprego, mas não temos desemprego (alto), embora a qualidade dos empregos não seja a que desejamos. A comparação é favorável com o que acontece no mundo. Foi a CUT que fez a maioria das greves, inclusive de categorias ligadas ao governo. Nem central, nem sindicato fizeram afrouxamento. O enfrentamento é parecido (com o ocorrido em outros governos), a diferença é o resultado. Minha função não é me sentir feliz e vanguardista por xingar o governo e o patrão. O sindicato existe para que o trabalhador melhore de vida e para transformar a sociedade. REVISTA DO BRASIL

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ENTREVISTA

Para Sérgio Amadeu, pela liberdade plena na rede e contra a intrusão na vida dos usuários, é preciso defender o Marco Civil da Internet da forma como foi construído pela sociedade, sem o lobby das teles Por Paulo Donizetti de Souza e Vander Fornazieri

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JAILTON GARCIA/RBA

A liberdade é coletiva


ENTREVISTA

O

sociólogo Sérgio Amadeu da Silveira tem sido um dos especialistas mais acionados para ajudar a explicar a força das redes sociais na articulação das recentes formas de manifestação política no Brasil e no mundo. Amadeu combina sólida formação em Ciência Política e em Tecnologia da Informação. E é ativista da democracia. No governo de Marta Suplicy na prefeitura de São Paulo (2001-2004), trabalhou pela implementação de mais de uma centena de telecentros, até então uma das mais inovadoras políticas públicas de inclusão digital. No governo Lula, presidiu o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação da Casa Civil da Presidência da República, posto em que ajudou a elaborar ações nacionais de inclusão digital e de estímulo ao uso de softwares livres – outra área em que milita – na máquina federal. Ele afirma ter acompanhado, nos últimos anos, o crescimento da insatisfação de diversos coletivos sociais com as ações governamentais na área ambiental, da cultura e das comunicações. Representante da sociedade civil no Comitê Gestor da Internet, é defensor rigoroso do Marco Civil, que está próximo de ser votado no Congresso Nacional. O projeto, porém, depois de ser elaborado com ampla participação da sociedade, sofre com um lobby das grandes empresas de telecomunicações, que ameaçam, segundo ele, a liberdade, a criatividade e a privacidade dos usuários da rede. Amadeu critica a atuação do ministro Paulo Bernardo, por ter se tornado “um lobista” das teles de uns tempos para cá. E chama a atenção dos movimentos sociais e dos cidadãos não organizados para que fiquem atentos e defendam o Marco Civil tal como foi democraticamente elaborado. E que entendam melhor as redes em seu papel na mobilização e na tomada de decisões da sociedade. Você notou uma atuação forte de grupos identificados como Anonymous nas redes sociais durante as recentes manifestações, confere?

É um dos vários grupos que têm grande relevância nas conversas a respeito das manifestações e na divulgação das convocações. Mas são vários os “nós” da rede, perfis que foram criados. “Nós” são os “entroncamentos” onde as pessoas se encontram, compartilham ideias. “O Gigante Acordou” é outro “nó”, uma página que posta conteúdos e permite comentar e compartilhar. O interessante é que nenhum perfil das instituições mais tradicionais – sindicatos e tal – naquele período de junho foi relevante. Na rede, essas estruturas mais tradicionais e consolidadas dos grandes movimentos sociais não tiveram relevância para efeito de convencimento de outras pessoas.

Há núcleos de inteligência interpretando os tipos de nós que estão sendo criados, curtidos, e trabalhando de maneira mais estratégica?

Se você quiser, pode tentar fazer isso, mas não necessariamente vai funcionar. Em certos momentos, acho que as grandes corporações de mídia agiram com inteligência, desse jeito que você está dizendo. Chamaram aquele segmento da sociedade que cultivaram durante muito tempo, com bandeiras conservadoras e moralistas, e levaram essas pessoas para a rua, para disputar com o crescimento do que era, no início, de forças de esquerda. Os autonomistas, movimentos anarquistas e de partidos menores, de ultraesquerda, estavam chamando essas manifestações em São Paulo, no Rio. Mas no dia 17 de junho o olhar sobre as redes representou uma grande mudança no padrão. O fator repressão policial (na semana anterior) não explica tudo, mas explica a gigantesca solidariedade em torno da ideia da democracia. As pessoas têm o direito de protestar. A TV passou a agir sobre os não conectados.

E a agir na classe média reacionária, que foi para a rua, mas não se mantém tanto na rua. No Rio é um pouco diferente. É um erro achar que, por gostar de novela, as pessoas estão sob o domínio da Globo. Agora, as grandes corporações de mídia vêm tendo, há muito tempo, uma pauta moralista, de despolitização, que não pode ser subestimada. Não de um dia, mas de vários. De desconstrução até. Para enfrentar uma pauta despolitizadora, o deputado do Psol Jean Wyllys fez um artigo muito interessante em que diz: “Eu ganho tanto, mas veja como é o meu gasto”. Quem lutou para ter salário para deputado foi o movimento operário inglês, no século 19. Senão o operário nunca poderia ser representante, porque iria viver do quê? Não está aí o grande problema. Ronaldo Caiado (DEM-GO), da bancada ruralista, não é deputado por causa do salário...

Não mesmo. É essa a questão da política, a questão da privatização de espaço público. E o jogo que se faz dentro do Congresso. E na minha opinião as forças políticas estão desgastadas e ainda não entenderam a indignação que explodiu a partir de 13 de junho, quando houve aquela grande repressão em São Paulo. Você consegue identificar indignação, insatisfação, antes dessa explosão?

Conseguia. Sou sociólogo, e também ativista de vários movimentos. Um dos primeiros embates que a gente teve de descontentamento com uma política pública que vinha sendo importante no país foi na cultura. A política de cultura tinha invertido a lógi-

As forças políticas estão desgastadas e ainda não entenderam a indignação que explodiu a partir de 13 de junho, quando houve aquela grande repressão em São Paulo

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ENTREVISTA

O Marco Civil é uma lei para garantir que a internet continue funcionando do jeito que funciona hoje. A internet está sob ataque. Grandes corporações e aparatos conservadores querem mudar o jeito como ela funciona

ca: não tem de levar cultura para a periferia, a cultura está na periferia, você tem de dar condições para que ela avance. Essa foi a política dos ex-ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira, e que foi fuzilada pelo grupo do Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), que se acastelou no Ministério da Cultura por dois anos. Se você for ver a política ambiental, também, vão dizer: “Eu preciso do Brasil desenvolvimentista”. O Brasil de desenvolvimento não pode fazer como o Japão, estudar alternativas? Depois daquela crise nuclear com o maremoto eles passaram a ter um plano de em 30 anos mudar a matriz energética (hoje altamente dependente da energia nuclear). E nós temos uma série de possibilidades que não desenvolvemos. Ficamos presos ao velho modelo industrial. É uma política equivocada que gera uma excrescência como Belo Monte e uma política equivocada com as nações indígenas. Foram mais de 100 mil pessoas na rede, talvez a maioria de classe média, que trocaram seu sobrenome para Guarani-Kaiowá, uma forma de dizer: “Eu estou descontente”. E tem também a área de comunicação.

Na comunicação, o ministro é um ministro das operadoras de telecom. Isso já é um descontentamento brutal. Ele quer quebrar a neutralidade da rede. No Brasil, as operadoras não querem controlar a rede como na Europa e nos Estados Unidos, de maneira aberta. Querem regulamentação das exceções ao princípio da neutralidade, jogando para a Anatel, que não tem nenhuma condição de controlar e fiscalizar nada. Vou dar um exemplo: um dos grandes problemas no Brasil é a qualidade da banda larga. Você paga por 100 e recebe 20. O Comitê Gestor da Internet fez toda uma ação de construir um medidor de qualidade de banda larga, que é o Simet (Sistema de Medição de Tráfego de Última Milha). E as teles não querem fiscalização. A pressão era tão grande que a Anatel disse: “Vou fiscalizar o que é vendido de banda larga”. E o que fez? Chamou o Comitê Gestor para dizer “vamos tornar a medida de vocês oficial”? Não. Entregou a tarefa de fiscalizar as empresas de telecom para o sindicato dos donos das empresas de telecom (Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviços Móveis Celular e Pessoal, Sindtelecombrasil)... Em qualquer país do mundo isso é um escândalo. No Brasil tem internet funcionando há duas décadas. Por que só agora um marco civil?

Excelente questão. Olha só: o Marco Civil é uma lei para garantir que a internet continue funcionando do jeito que funciona hoje. A internet está sob ataque. Essas grandes corporações e os aparatos conservadores querem mudar o jeito como a internet funciona. 24

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Por exemplo?

Hoje, 52% dos brasileiros com acesso à internet baixam música. A maioria, na verdade, compartilha músicas. Dizer que essa prática é criminosa... Faça o favor! Você não tem cadeia suficiente para colocar essa moçada toda. A rede permite a troca. A rede é troca. E a troca não destrói o original, e estamos falando de bens imateriais. Internet é compartilhamento. E a chamada Lei Azeredo (proposta pelo então deputado Eduardo Azeredo, do PSDB-MG, e apelidada de AI-5 digital pela restrição de liberdades que propunha) parou. Quando o ex-presidente Lula foi ao Fórum Internacional de Software Livre, ele viu uma faixa escrita “Presidente, vete o AI-5 digital” e disse: “Não vou vetar, porque não será aprovado”. E chamou o então ministro da Justiça, Tarso Genro, e determinou: “Tome uma providência em relação a isso”. E a providência adotada foi correta: construir um processo de montagem de uma lei que não fosse feita em gabinete, mas pela própria internet. Houve uma rodada de contribuições, uma síntese, depois uma segunda rodada, e aí foi entregue ao presidente Lula. Como estava no final do segundo mandato, ele disse que não ia mandar ao Congresso. Ficou para a Dilma tomar essa providência. A Dilma demorou para enviar, mas enviou, respeitando o que foi encaminhado pela sociedade civil. Esse é o projeto para o qual foi nomeado relator o deputado Alessandro Molon (PT-RJ)?

Isso. E, além de ter sido uma construção coletiva para defender os direitos dos internautas na rede, teve ainda outras sete audiências públicas feitas pelo Molon. Depois disso é que ele fez o relatório final. Só que aí entra o Ministério das Comunicações... Em que momento?

Foi no segundo semestre de 2012. Quando ele apresentou o relatório, parou... As empresas entraram forte com interesses básicos. E seu argumento é muito claro: “Estão usando cada vez mais a internet, então eu tenho de interferir para gerenciar o tráfego”. É um negócio em que você sabe que já tem de aumentar a capacidade de transformar bits em sinais de luz, nas fibras ópticas. É como se nós estivéssemos falando de energia elétrica. Quando chega 5 da tarde, todo mundo usa mais energia. Se você agisse como as operadoras de telecom, a energia ia começar a falhar, ficar cada vez menos intensa, até você ter uma luz fraca. E é o que as teles fazem. Não aumentam a disponibilidade para você navegar bem. A gente não critica o modelo de negócios nem impõe limites. Mas o negócio deles é o negócio de TI, transferência de dados, com demanda cada vez maior. Eles querem resolver o problema quebrando a neutralidade de rede, filtrando o tráfego.


ENTREVISTA

Que é outra coisa que a proposta do Marco Civil atrapalha: eles querem copiar nossa navegação para poder fazer análise e entregar publicidade dirigida para os internautas. Aí eles dizem: “O Google já faz”. Aí eu digo: “Problema de quem usa o Google”. Eu posso navegar, de manhã até a noite, sem usar uma única empresa do grupo Google, mas sou incapaz de navegar sem usar uma telecom. Se a operadora puder me filtrar da minha casa até a nuvem da internet, estou perdido. É intrusão. Então, o que precisamos é de uma lei para garantir que a internet continue livre – e isso inclui o princípio da neutralidade – e que quem controla a infraestrutura não controle o fluxo de informação. E para garantir que nós possamos criar conteúdos de tecnologia sem autorização de ninguém, seja Estado, seja operadora de telecom. Se quebrar o princípio da neutralidade, quando a minha universidade criar um protocolo de internet 3D, vai passar um pacote que quem controla não sabe o que é, e daí o computador dele destrói. Existe essa briga nos Estados Unidos?

Tem uma briga lá. E tem um movimento muito forte em relação à neutralidade chamado Save the Internet, do qual participava até o Obama, antes de ser presidente. Na Holanda, foi aprovada uma lei em defesa da neutralidade, no Chile também. Aqui, estávamos prestes a aprovar. Mas o ministro das Comunicações, infelizmente, é um dos lobistas das teles. Temos de defender o Marco Civil porque querem transformar a internet em uma grande rede de TV a cabo, prejudicar quem usa a internet livremente e poder copiar os seus dados sem que você saiba. Hoje não tem lei que regulamente scripts e ferramentas que os bancos vão jogando no meu computador? “Você precisa atualizar...”

Não. Se ele instalar uma coisa estritamente para a sua seção e você concordar, ótimo. Mas e se ele instalar algo que acompanha toda a sua navegação sem você saber? Não existe uma fiscalização, mas a lei do Marco Civil vai permitir que você tenha de autorizar qualquer coisa que viole a sua privacidade. O Marco Civil não é criminal, é direito civil, declara uma série de direitos que a gente passa a ter. Entrar na sua máquina e copiar seus e-mails e vender sem que você saiba, isso tem de ser considerado crime, mas é uma outra discussão. Primeiro precisamos garantir os direitos, que a internet continue funcionando como funciona, o que descontenta muitos governos e corporações, principalmente do mundo do copyright, e as teles, que não querem conviver com a criatividade intensa da rede.

O lobby dos direitos autorais criou uma frente de ação no ambiente da cultura, outra na Justiça e agora entra também no Marco Civil?

Entra. Porque a ideia é que você só possa remover um conteúdo com ordem judicial. Nós sabemos que, mesmo entrando na Justiça, a disputa, muitas vezes das ideias, é feita em torno da propriedade intelectual. Por exemplo, o site Falha de S. Paulo. A Folha não barrou (o site que satirizava o nome e a política editorial do jornal) na Justiça por calúnia, injúria ou difamação, mas por “uso indevido da marca”. O parágrafo 2º do artigo 15 do Marco Civil, que foi posto depois das consultas todas, faz o que a Globo quer: autoriza a remoção de conteúdo sem ordem judicial. Então, temos solicitado que o relator tire ou pelo menos deixe claro que não há remoção de conteúdos. Existe um mapeamento dos parlamentares com quem se pode contar?

A maioria dos parlamentares tende a cair para o lado democrático. O problema é o lobby das teles, que têm um poder de financiamento de campanha muito grande, que tentam manipular o argumento. Elas tentam, têm agências de publicidade e fazem cafés da manhã com deputados, atuam diretamente. E a gente também atua, temos do nosso lado o funcionamento livre da internet, que é uma grande coisa. Elas que estão querendo mudar. Então, por que o Marco Civil? Porque estavam vindo vários ataques e precisamos de uma lei que assegure nosso direito de ter uma internet livre, com diversidade cultural, privacidade e neutralidade da rede. A extrema-direita está descontente e quer um vigilantismo forte. Você tem governos que não gostam dessa liberdade de compartilhar na rede, de convocar manifestações. Então, tem uma tensão por censura. E tem uma grande pressão dos jovens, da periferia e da classe média, para que a internet continue livre. Por isso essa batalha não é perdida.

FOTOS JAILTON GARCIA/RBA

E filtrar a personalidade do usuário.

Na Holanda, foi aprovada uma lei em defesa da neutralidade da internet, no Chile também. Aqui, estávamos prestes a aprovar. Mas o ministro das Comunicações é um dos lobistas das teles

O escritor José Saramago afirmava não confiar na internet, porque quando virem nela algo de revolucionário tratarão de controlá-la. “Nada há que seja verdadeiramente livre nem suficientemente democrático”, dizia.

A internet em si não muda, mas as pessoas podem usar a internet para mudar. Já perceberam isso e querem transformar a internet em TV a cabo, reduzir a interatividade, controlar a criatividade. Por incrível que pareça, para garantir esse caráter da rede, que é transnacional, precisamos aprovar leis nacionais que a façam funcionar do jeito que foi criada. Tudo muito complexo, mas muito real. A internet comporta o mercado, mas ela não é o mercado.

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TECNOLOGIA

Enquadrar o Big Brother

Com o domínio de corporações e do governo dos EUA no tráfego de dados via internet, não haverá proteção contra espionagem e bisbilhotagem sem um novo tratado sobre a gestão da rede Por Tadeu Breda

A

s denúncias de que os Estados Unidos espionam pessoas, empresas e governos ao redor do mundo com a ajuda de corporações como Google, Microsoft ou Facebook não surpreenderam especialistas brasileiros. Tampouco as revelações de que Washington monitora comunicações digitais e telefônicas no Brasil. Os documentos vazados pelo ex-técnico da CIA Edward Snowden no início de junho apenas ratificam suspeitas e convicções de 26

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quem conhece o funcionamento da internet. “A grande novidade é que alguém de lá de dentro tenha decidido denunciar”, observa o ativista Marcelo Branco, 56 anos, que trabalha com computação há mais de 30. “Nós, da comunidade de hackers e software livre, já vínhamos denunciando essas possibilidades de espionagem há bastante tempo.” O sociólogo Sérgio Amadeu, professor da Universidade Federal do ABC e membro do Conselho Gestor da Internet, lembra que já nos anos 1990 surgi-

ram evidências de que um sistema chamado Echelon fora utilizado por Estados Unidos, Grã-Bretanha, Austrália, Canadá e Nova Zelândia para monitorar conversas telefônicas, e-mails e sinais de satélite da antiga União Soviética e dos países do Leste Europeu. “Já se havia denunciado a existência do Carnivore, que era um sistema de escaneamento de mensagens com palavras-chave, manipulado pelo FBI”, conta. “Pouco antes das denúncias de Snowden, era sabido que a Agência de Segurança Nacional (NSA) estava fi-


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Tecnologia do Estado de São Paulo (Fatec) e pesquisador da USP. “Hoje, quando falo com você pela internet, quase toda a informação vai até os Estados Unidos e volta”, afirma Marcelo Branco.

Leis e negócios

A segunda razão pela qual os norte-americanos conseguem acessar informações que circulam pela internet é jurídica. A rede tem uma lista de endereços administrada pela Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números (Icann, na sigla em inglês), empresa com sede na Califórnia. “A Icann é responsável pela coordenação global do sistema de identificadores exclusivos da internet”, diz o site da companhia. O problema é que a Icann está sujeita à legislação norte-americana, e a Lei de Auxílio das Comunicações para a Aplicação do Direito (Calea) permite às autoridades realizar vigilância eletrônica ao exigir dos fabricantes de equipamentos acesso livre às informações que circulam pela rede. Os aparelhos de internet fabricados ou vendidos nos Estados Unidos possuem um dispositivo chamado backdoor –

KAY NIETFELD/EFE

nalizando a construção de uma enorme base de intrusão, coleta e rastreamento de informações digitais no interior dos Estados Unidos.” Os especialistas enumeram basicamente três razões pelas quais os órgãos de inteligência dos Estados Unidos – FBI, NSA e CIA – gozam de tamanho controle sobre as trocas de informações pela internet dentro e fora de suas fronteiras. A primeira guarda relação com a infraestrutura física da rede, que nasceu no país com propósitos militares, floresceu ao cair nas mãos de cientistas e, mais tarde, explodiu ao entrar na rotina de empresas e cidadãos. De acordo com o ministro brasileiro das Comunicações, Paulo Bernardo, nos Estados Unidos ficam dez dos 13 servidores-raiz existentes no mundo. São essas máquinas que decodificam os endereços www, que inserimos em nossos navegadores. “Toda vez que você acessa um endereço na internet, sua máquina precisa fazer uma requisição ao servidor-raiz para poder traduzir esse endereço para um número”, explica Dalton Martins, professor de análise de rede na Faculdade de

HERÓI DO MUNDO TECNOLÓGICO Para o governo norte-americano, Snowden é tido como traidor, mas pelo mundo manifestantes pedem que seus países lhe deem asilo

porta dos fundos –, que possibilita aos órgãos de inteligência invadir e acessar dados sem o consentimento dos usuários. “O backdoor é apenas o mais conveniente dentre os vários meios possíveis de interceptação”, diz o professor de segurança de rede Pedro Rezende, da Universidade de Brasília. “Os backdoors exigidos pela Calea nos roteadores de grande porte homologados nos Estados Unidos estendem o vigilantismo para quase todas as rotas de fibra óptica, centralizadas na arquitetura transcontinental. Isso praticamente cobre todos os meios de transmissão digital a longa distância hoje em uso.” A vantagem jurídica obtida pelos Estados Unidos na administração da internet se completa com a terceira razão que possibilita a vigilância de dados privados pela rede: a empresarial. O sistema de troca de informações entre computadores é praticamente monopolizado por companhias norte-americanas, sejam fabricantes de programas e aplicativos ou de equipamentos. Se a Calea obriga a indústria a deixar uma porta dos fundos aberta para a intrusão do governo, empresas como Microsoft, Apple, Google, Yahoo e Facebook, entre outras, também mantêm caminhos abertos à bisbilhotagem. “É uma parte da programação que permite que os dados do seu computador e da sua conexão sejam enviados para fontes externas sem seu consentimento”, explica Marcelo Branco. “É intencional, não é falha de segurança.” As empresas dizem usar as informações que escapam pelo backdoor para fins estritamente comerciais. No caso de Apple e Microsoft, por exemplo, detectar padrões de comportamento dos usuários para melhorar constantemente seus programas, vender mais e manter-se na liderança do mercado. Facebook e Google usam as portas dos fundos para montar perfis de interesse dos internautas e vender anúncios. Esse é um dos motivos pelos quais construíram impérios bilionários.

Difícil proteção

As medidas anunciadas pelo governo para defender o Brasil da espionagem REVISTA DO BRASIL

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brasileiras estarão asseguradas. “Construir e colocar em órbita um satélite brasileiro pode ser muito bacana para o desenvolvimento científico nacional, mas não resolve o problema da espionagem”, observa Marcelo Branco, para quem satélites são a versão tecnológica da promiscuidade. As ressalvas se confirmam com as declarações do ministro da Defesa ao Congresso. “Não temos um sistema brasileiro que possa proteger as redes por onde circulam as informações”, reconheceu Amorim. “As ferramentas que existem são todas estrangeiras.” De acordo com o ministro, a empresa responsável por administrar o satélite brasileiro chama-se Visiona Tecnologia Espacial, uma fusão entre a estatal de telecomunicações Telebrás e a Embraer. Apesar disso, o aparato que brevemente entrará em órbita não será 100% brasileiro. “A maior parte dos equipamentos e softwares usados no país não é nacional”, diz Amorim. “Nossa ideia é que, no momento seguinte, possamos ter equipamentos brasileiros também dentro do satélite.”

“A DEMOCRACIA ESTÁ ESPIANDO VOCÊ” Não existem segredos dentro da internet

GERARDO LAZZARI/RBA

cibernética são importantes para o desenvolvimento de nossa tecnologia, mas dificilmente poderão deter a bisbilhotagem internacional. Lançamento de satélite próprio, instalação de servidores, construção de cabos submarinos e novas redes de fibra óptica ampliariam a autonomia em telecomunicações, mas nada disso seria, por si só, capaz de frear o monitoramento de dados pelos órgãos de inteligência dos Estados Unidos. O vigilantismo continuaria sendo possível pela própria natureza da rede, globalmente interligada à maciça presença de empresas estrangeiras operando no mercado brasileiro de internet e aos hábitos dos internautas, que priorizam programas, aplicativos e equipamentos norte-americanos. Entre outras, a revelação trazida a público por Snowden de que a NSA espionou 2,3 bilhões de telefonemas e mensagens de pessoas residentes ou em trânsito no Brasil pegou as autoridades de calça curta. Os ministros das Relações Exteriores, Antonio Patriota, da Defesa, Celso Amorim, e das Comunicações, Paulo Bernardo, foram ao Congresso prestar esclarecimentos sobre o nível de preparação do país para enfrentar a interceptação de dados. Reconheceram a vulnerabilidade brasileira e anunciaram medidas, como o “breve” lançamento de um satélite geoestacionário para substituir o atualmente em uso. Outrora administrado pelo Estado, o aparato acabou sendo vendido em 1999 a executivos norte-americanos na onda de privatizações do governo Fernando Henrique Cardoso. Hoje, pertence a uma empresa de capital misto chamada America Movil, propriedade do homem mais rico do mundo, o mexicano Carlos Slim. “Isso traz um desconforto, que as Forças Armadas sempre alegam, pois todas as comunicações estratégicas do país são viabilizadas por empresas privadas estrangeiras”, disse Paulo Bernardo aos parlamentares. “Nosso satélite deve ser lançado em 2016 e vai operar em banda X, de uso exclusivo da defesa, e banda K, para comunicações em banda larga em todo o território nacional.” O ministro admite, porém, que o mero lançamento de um satélite não garante que as informações

SOBERANIA EM XEQUE As medidas anunciadas pelo governo brasileiro para defender o país da espionagem dificilmente poderão deter a bisbilhotagem internacional


TECNOLOGIA

BORIS ROESSLER/AFP/GETTY IMAGES

Governança

E as operadoras?

A presença predominante de multinacionais na operação das telecomunicações brasileiras é outro problema na proteção dos dados produzidos pelo país. Vivo, Claro, Oi, Tim, Sky, Net, Embratel, Nextel e GVT são todas estrangeiras – ou têm participação. “Essa é a grande questão”, afirma Dalton Martins, da Fatec. “Apesar de ter sede em nosso território e estar sob nossa legislação, elas tendem politicamente a favorecer seus proprietários ou países de origem.” O professor lembra ainda que as linhas telefônicas usadas pelo governo pertencem às operadoras. “Estamos nas mãos de empresas que não têm interesses apenas no Brasil.” Bernardo informou que o Brasil está construindo redes de fibra óptica até Assunção, no Paraguai, a exemplo do que já foi feito com o Uruguai. “Vamos, com a Telebrás, chegar ao Acre até setembro e de lá poderemos nos conectar com o Peru. Estamos também discutindo conexões com a Guiana, pelo Amapá. Assim poderemos fazer tráfego regional diretamente, sem

passar pelos Estados Unidos ou Europa. Isso significa maior rapidez e menos custos.” Ele mesmo sinaliza, porém, que as medidas de infraestrutura visam a resolver um problema de saturação das redes – e pouco têm a ver com segurança. “São medidas muito focadas na visão telecom dos anos 1980, que é a visão do ministro Paulo Bernardo: cabo, estrutura, satélite. Colocou-se um discurso nacionalista, que é bom, mas não para resolver o problema da espionagem. A segurança está mais embaixo”, observa Marcelo Branco. Mesmo que linhas, cabos e satélites utilizados fossem todos nacionais, e que todas as empresas de telecom em operação no país fossem administradas por capital brasileiro, nem assim seria possível impedir que os dados circulassem por redes estrangeiras. “Isso não evita que nossas informações trafeguem pelos bancos de dados de Microsoft, Apple, Google ou Facebook”, diz Dalton Martins. “Nós e o mundo usamos sistemas de informação majoritariamente norte-americanos.”

As providências tomadas pelo governo brasileiro que podem surtir efeito sobre a espionagem de dados pela internet foram anunciadas pelo ministro das Relações Exteriores, de modo a defender, no âmbito da União Internacional de Telecomunicações (UIT), em Genebra, o aperfeiçoamento de regras multilaterais sobre segurança. “Lançaremos nas Nações Unidas iniciativas para proibir abusos e impedir a invasão de privacidade dos usuários das redes virtuais, estabelecendo normas claras de comportamento dos Estados na área de comunicações para garantir uma segurança cibernética que preserve o direito dos cidadãos e a soberania dos países,” disse Patriota. As declarações do chanceler sugerem que o Itamaraty está disposto a comprar uma briga com os Estados Unidos e seus aliados ao advogar por uma governança compartilhada da internet. “É uma questão que enfrenta resistências consideráveis para ser multilateralizada”, avalia Patriota, acreditando que as revelações de Snowden desgastaram Washington. “Agora temos novos elementos e uma alteração no quadro político em função das denúncias que afetaram países da Europa e América Latina.” A posição vai ao encontro dos alertas dos ativistas em mídias digitais: todos os países precisam adotar um conjunto de ações que reduza a força e influência das empresas de telecomunicação, cujo poder econômico é tão desigual quanto o poder político e militar dos Estados Unidos. Para o analista de sistemas Sady Jacques, da Companhia de Processamento de Dados do Estado do Rio Grande do Sul (Procergs), atuante em tecnologia da informação há 26 anos, a internet deve ter outro espaço jurídico. “Levantar essa bandeira na ONU coloca o Brasil numa posição de liderança e pode vir a trazer mudanças importantes. Quem sabe dentro de alguns anos poderemos ter uma internet mais democrática.”

Leia mais

No site, reportagem completa sobre insegurança na web e http://bitly/rba_espia Nesta edição, entrevista com Sérgio Amadeu à página 22. REVISTA DO BRASIL

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COMPORTAMENTO

Valentina: “Parece que agora precisamos mostrar como estamos nos vestindo, nossos sentimentos, como se isso criasse uma identidade”

Laura: “Uma hora percebi que teria de abrir uma conta nova. Voltei com uma atitude nova, com mais cuidado para não expor minha vida”

O fim da inocência Perto de seus dez anos, o Facebook já não é mero espaço de encontro, mas um fenomenal depósito de informações, uma potente ferramenta de negócios e uma triste vitrine de felicidade ilusória Por Miriam Sanger 30

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ssim como política, religião e futebol, Facebook não se discute. Cada um do cerca de 1 bilhão de usuários enxerga essa rede social com forma e propósitos diferentes. Ninguém pode discordar que ela flutua a favor da maré e cresce exponencialmente, para a felicidade de seu jovem proprietário e dos acionistas da empresa. Essa expansão, no entanto, não necessariamente representa benefícios para aquele que deveria ser seu bem mais precioso: o público, cada vez mais ressabiado, como apontam pesquisas, com a falta de privacidade. Nem isso, porém, parece ter diminuído o ímpeto de compartilhar informações, atitudes cotidianas ou se envolver em algumas das tribos que deixaram


JAILTON GARCIA/RBA

SERGIO AMARAL/RBA

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o sofá e foram às ruas protestar contra os problemas nacionais. Muito se tem investigado a respeito do usuário dessa mídia, que vem mudando junto com ela. Esse assunto é ainda mais relevante no Brasil, onde está o povo que mais gasta tempo em redes sociais e cada vez mais é instigado a um novo comportamento: a superexposição voluntária. “Comparo as novas mídias sociais a uma grande festa, um lugar acolhedor e descontraído onde euforicamente nos sentimos livres para nos exibir. Ali, agimos como se estivéssemos sonhando com os olhos abertos, em um estado alterado de consciência que reduz nossas defesas e nosso senso crítico”, acredita a psicóloga Katty Zúñiga, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática (NPPI) da Clínica Psicológica da PUC de São Paulo. “A pessoa entra na rede social e ‘cresce’ de acordo com o estímulo que recebe de amigos e conhecidos. Esse fato então se mescla à sua bagagem cultural: se o brasileiro é por natureza mais expansivo, com certeza vai se expor mais que um boliviano, por exemplo”, explica a professora Beth Saad, coordenadora do curso de pós-graduação em Comunicação Digital na Escola de Comunicações e Artes da USP. Quem é usuário sabe do que Beth fala, e boa parte do que hoje se vê ali postado deixa evidente a sensação de liberdade do autor, que muitas vezes escreve o que não diria cara a cara e mostra imagens que “ao vivo” não exibiria – ou, pior, exibe uma agressividade que não costuma pessoalmente expressar. “Esse me parece o lado complicado do Facebook. Acho que, ali, as pessoas se tornam mais agressivas. A questão do anonimato, também permitido no mundo virtual, é outro aspecto que pode levar a situações desagradáveis. Mas não tem jeito: tudo isso faz parte desse movimento”, considera Joel Bueno, bancário aposentado que viu no Facebook uma forma de divulgar mais amplamente seu blog.

Eliane: “Uso o Facebook para acompanhar as novidades de meus amigos. Mas a minha intimidade eu não publico”

Espiral da felicidade

Talvez a euforia descrita por Katty também explique o fenômeno chamado “espiral da felicidade”. A tendência aparece em pesquisas: o usuário vê seus amigos felizes e, por isso, evita postar mensagens “pra baixo”. “De forma geral, a rede é como uma onda, na qual quando um está feliz o outro precisa dizer que também está e, mais ainda, precisa ‘curtir’ a felicidade alheia”, afirma Beth Saad. Essa permanente festa de um mundo irreal, no entanto, traz sofrimento. Segundo um estudo recente realizado pelas universidades alemãs Humboldt, de Berlim, e de Ciências Aplicadas de Darmstadt, mais de um terço dos usuários do Facebook enfrenta sentimentos negativos como frustração e tristeza depois de visitar o perfil dos “amigos”. E aí entra uma questão sobre conceito de amigo do ponto de vista da rede social. “Já está claro que não segue o mesmo conceito da vida real. Na rede, você se torna amigo de quem é celebridade, de quem posta ideias interessantes, de quem é amigo de um amigo”, diz Beth. Ou seja, a construção de uma rede de relacionamento não segue, a rigor, nenhum critério, e amigos podem ser clientes, colegas de trabalho e até o chefe, lado a lado com a tia-avó e os filhos da melhor amiga. Haja confusão. “Já levei bronca dos meus amigos porque na minha página estão meu network profissional, minha família e meus amigos. Eu não deveria ficar expondo o mundo de um aos outros, mas não consigo ainda dividir minha página. Assim, como posto muito, sei que me exponho e deveria ser mais comedida”, descreve a assessora de eventos Carolina Birenbaum. Com mais de 2.700 amigos em sua página, ela utiliza o Facebook também com fins profissionais e armazena o portfólio de sua empresa. Já a secretária Eliane Ferraz de Souza Morales, usuária há cerca de um ano, vai ao extremo oposto. “Uso o Facebook para acompanhar as novidades de meus amigos. Mas a minha intimidade eu não publico – não vejo por que tornar públicos assuntos que são somente meus.” REVISTA DO BRASIL

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Carolina: “Como posto muito, sei que me exponho e deveria ser mais comedida”

Mas nunca foi tão difícil separar alhos de bugalhos: a divisão do que é pessoal daquilo que é profissional, em vez de se tornar clara, é cada vez mais tênue, assim como a distinção entre o que é de interesse comum e o que é puramente merchandising. “O Facebook nasceu com o intuito de ser um lugar onde as pessoas poderiam compartilhar suas experiências. No entanto, o que vemos agora? Mil adds, apps e praticamente um canal de propaganda de todos os centros comerciais do mundo”, afirma a fotógrafa Solange Benasulin, que utiliza a ferramenta para divulgar seu trabalho. Essa face mercantilista está cansando usuários – e já há quem esteja se afastando. A alteração do perfil do Facebook soa, para Sérgio Basbaum, como o fim de uma época mais “inocente” da ferramenta. “Quando entrei, em 2007, achei 32

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o Facebook interessante. A sensação que tinha ao navegar ali era a mesma de quando eu, no passado, ia à praia no Rio de Janeiro. Encontrava uma amiga aqui, um grupo ali, um amigo antigo que não via há tempos. Ainda existe essa dinâmica interessante. O lado esquisito é que virou um espaço utilitário e perdeu, com isso, sua ingenuidade inicial”, avalia ele, que é pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital (TIDD) na PUC-SP. A ilustradora Valentina Fraiz decidiu “voltar à vida analógica”. Usuária por anos, ela sempre foi questionadora do nível de exposição ao qual as pessoas pensadamente se propõem: “Não entendo de onde vem esse prazer. Parece que agora, o tempo todo, precisamos mostrar como estamos nos vestindo, nossos sentimen-

tos, nossos gostos, como se isso criasse uma identidade. Sempre provoquei as pessoas: ‘Ei, galera, prestem atenção no que vocês estão postando!’ E, quanto mais eu questionava, mais as pessoas me bloqueavam”. A motivação final para sair dessa rede surgiu quando as páginas de algumas amigas foram bloqueadas em função de fotos postadas. “Elas participaram de um evento público, a Marcha das Vadias, que acontece no mundo inteiro, e apareciam nas fotos com os seios pintados, uma situação absolutamente não sexual. Foi censura. Como assim? Você tem de se ajustar, dar todas as suas informações e, em troca, levar para casa um patrulhamento moral?”, questiona Valentina. O que não estava no script era deparar com uma espécie de crise de abstinên-

JAILTON GARCIA/RBA

COMPORTAMENTO


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cia. Semanas depois de ter ‘morrido’ no Face, ela abria o computador e mecanicamente começava a digitar o endereço dele. “Minha filha Laura, que curtiu minha iniciativa, também saiu durante seis meses. Sofreu muito, pois ficou em um tal grau de isolamento em relação aos amigos que era impossível suportar. E fui eu mesma que a aconselhei a voltar.” Laura explica que tinha mudado para uma cidade nova, não tinha amigos, e estar fora da rede atrapalhou. “Eu ficava sabendo de uma festa só depois, e percebi que não estava sendo chamada porque os convites eram publicados só no Face. Uma hora percebi que teria de abrir uma conta nova. Voltei com uma atitude nova, com mais cuidado para não expor minha vida como antes. Sou discreta sem ser ausente.”

Quem usa quem?

Difícil traçar um padrão para todos os usuários, pois há de tudo um pouco: o reclamão, que percebe a propagação que o Face tem; o solitário, que posta madrugada adentro e lança bom-dia e boa-noite para o mundo inteiro; o voyeur, que não posta nada, mas acompanha tudo; o ideólogo de plantão; o comentarista esportivo; o espalhador de confete. Há de

se considerar também a tribo dos que não estão no Facebook, como a diretora de teatro Inês Saldanha, que há anos alimenta, segundo ela, uma preguiça imensa de participar. “Acho que é invasivo e chato. Por vezes é profundamente poderoso, por outras, leviano. Ainda prefiro me relacionar com algo que seja tridimensional”, brinca. Quanto ao padrão de uso, há referências claras, que dividem os brasileiros em três grandes grupos. O maior deles o utiliza com postura de entretenimento e relacionamento pessoal, e em geral dá muito ‘curtir’ em propagandas e marcas. Frequenta aplicativos, jogos e dissemina muitas mensagens genéricas, de estilo de vida, saúde, religião. O segundo privilegia a construção de um grupo de contatos bem estudado, normalmente motivado por um interesse específico, seja intelectual, seja profissional. Já o último grupo costuma visitar “fan pages” de empresas, fazendo um uso mais mercadológico e publicitário da ferramenta, que por trás o incentiva a disseminar esse conteúdo para uma rede de pessoas. Uma vez ali, as empresas passam a ter acesso aos perfis e, assim, a trabalhar conteúdos direcionados. Um estudo realizado em 2012 pela Hi-Mídia, empresa de mídia on-line, e a M.Sense, especialista em pesquisa sobre

LUCIANA

Joel: “Acho que no Facebook as pessoas se tornam mais agressivas. Mas não tem jeito: tudo isso faz parte desse movimento”

R/RBA

WHITAKE

o mercado digital, mostrou o que o Facebook representa a partir do ponto de vista mercadológico: foi considerado como mídia de “elevada penetração junto ao público” devido à sua alta frequência de acesso (75% dos entrevistados o visitavam ao menos uma vez por dia); 72% discutiam em suas páginas sobre produtos e estavam familiarizados com compras on-line; e 12% já compraram diretamente no Facebook, percentual considerado elevado. “Eu já fiz compra pelo Face, é uma ferramenta importante e diária. Mas precisa saber usá-lo, filtrando os conteúdos que chegam até você – percebo, pela página de alguns amigos, que nele é possível desperdiçar tempo sem nenhum benefício. Depende de cada um definir como quer usá-lo”, diz o assistente financeiro Thiago Eráclito. Seja como for, é evidente que o Facebook está a “dois palitos” de se transformar na mais potente ferramenta de vendas do globo, por meio da qual as empresas conseguem fazer ofertas de uma forma tão orientada quanto nunca foi possível antes – e isso graças ao próprio usuário, que oferece tantas informações pessoais em troca de... nada. Quanto tempo cada usuário gasta na internet, quais empresas visita, quantas vezes viaja a lazer e qual seu programa de TV favorito são apenas migalhas do imenso arsenal de conhecimento concentrado ali. Impossível prever quão mais longe o Facebook vai chegar. Sérgio Basbaum o vê como um “boteco da moda”: na hora que aparecer um mais descolado, todo mundo vai migrar. Mas esse outro ainda não apareceu. “Toda plataforma de relacionamento tem um ciclo de vida, basta lembrar do Orkut ou do My Space. Nesse momento, o Face está entrando em um patamar em que ou ele se reformula, ou outras poderão tomar seu lugar. É um ciclo de amadurecimento natural”, acredita Beth, enquanto Valentina imagina que o pior ainda está por vir: “Dentro de alguns anos, o Facebook será tão dono de nossas informações que teremos de pagar para poder mantê-las em privacidade”. Tudo dito, nada concluído, talvez não dê mesmo para saber que rumo a coisa vai tomar – mas há de se perder, e já, a inocência. REVISTA DO BRASIL

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HISTÓRIA

A independência por

Região rica da Espanha e sede do clube mais popular do mundo, a Catalunha recebe a estreia de Neymar neste agosto, em meio à fervura separatista Por Paulo Nogueira 34

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ove horas da noite de 30 de junho. Estádio do Futebol Club Barcelona, que em 2001 adotou, por referendo, o nome de Camp Nou (Campo Novo, em catalão). Não cabe nem um alfinete na maior arena da Europa, com lugares numerados e confortáveis para 99 mil pessoas. Tremulam bandeiras com as efígies de Puyol, Xavi, Iniesta, Messi – e Neymar. Parece tudo nos trinques para o início de um dos mais carismáticos clássicos planetários – entre o Barça e o Real Madrid.

Mas, nessa noite, quem adentra o gramado é a cidade de Barcelona, em nome de toda a Catalunha. Uma versão catalã da pátria de chuteiras. Isso é que é jogar em casa. Os culés (como são chamados os torcedores do Barça, desde que o estádio ainda estava em construção e eles se sentavam nos muros, sobressaindo os culos – traseiros, em catalão) cantam, dançam, ficam com pele de galinha e fazem biquinho de pura emoção. Na tribuna de honra, os presidentes do Barça e do governo da Catalunha riem de orelha a orelha, que


HISTÓRIA

“CATALUNHA LIVRE” Concerto pela Liberdade, realizado em junho passado em apoio à soberania da Catalunha no estádio do Barça, clube que agora conta com o craque Neymar

MIGUEL RUIZ\ FCBARCELONA

ANDREU DALMAU/EFE

hábito

nem se Messi tivesse marcado o enésimo gol de placa nas redes do merengue Casillas. Em uníssono, anônimos e VIPs professam fervorosamente a soberania da Catalunha. O clamor ruge em ponto de bala às 23h, quando um mosaico humano compõe a frase “Freedom Catalonia 2014” (Liberdade para a Catalunha 2014) – em inglês, para pedir ao mundo solidariedade com a causa. Nos telões, desponta um vídeo do secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, apelando ao respeito pela vontade dos povos. Nas cadeiras, são erguidos cartazes como “Catalonia, Europe’s next State” (Catalunha, o próximo Estado europeu), ou “Catalonia is not Spain” (A Catalunha não é a Espanha). Nesse ambiente – uma paella política, social e esportiva, regada a muita malagueta tipo pólvora –, Neymar jogará as próximas temporadas. Uma cidade, uma região/nacionalidade, um clube – todos com a mesmíssima alma. Cerca de 5 milhões de pessoas vivem na área metropolitana de Barcelona. O porto da cidade é o mais importante do Mediterrâneo em tonelagem de mercadorias e contentores. A esfera cultural também pinta e borda: Museu Dalí, Fundação Joan Miró e Antoni Tàpies, o parque temático de Gaudí. Quando era o técnico do time, Pep Guardiola papeava semanalmente com escritores como Javier Cercas, Manuel Vázquez Montalbán, Vila-Matas – todos culés roxos.

Nariz empinado

A Catalunha possui instituições financeiras tentaculares, como La Caixa ou o Banco Sabadell. Sua indústria também deita e rola: é a área com maior participação no PIB espanhol, 25%. Daí que o governo de Madri tenha um piti a cada vez que ouve falar da independência catalã, sobretudo em época de crise galopante. É bem verdade que a própria economia da Catalunha já não está com essa bola toda. No fim do ano passado, as dívidas regionais bateram nos € 42 bilhões. O que levou os adversários da independência a esgrimir outro argumento: que graça teria o Barça disputar um campeonato exclusivamen-

PERSEGUIÇÃO Nas primeiras semanas da Guerra Civil Espanhola (1936-1939), o então presidente do Barça, Josep Sunyo, que era republicano, acabou assassinado por partidários do general Franco, cujas tropas ocuparam e detonaram Barcelona na última fase do conflito

te catalão? Dada a disparidade de pedigree, os títulos consecutivos seriam uma baba insípida. Tudo bem: a Catalunha não é uma ovelha negra num Estado nacional coeso e centrípeto. A Espanha tem 17 comunidades autônomas, com suas capitais de nariz empinado. Entre elas, a Andaluzia (capital Sevilha), Aragão (Zaragoza), Galícia (Santiago de Compostela). E, claro, o País Basco (Vitória), cujo anseio de independência degenerou no terrorismo da ETA, quase a ponto de implodir o regime democrático que sucedeu ao franquismo (1936-1976), suscitando inclusive uma tentativa de golpe militar. Nos últimos anos, com a perda de popularidade local e uma repressão eficaz, a ETA sossegou o facho. O estatuto das Comunidades Autônomas está na Constituição de 1978, que varreu o bolor autoritário do generalíssimo Franco. O artigo 2º estabelece que uma Comunidade Autônoma é uma entidade territorial dotada de autonomia legislativa e competência executiva, bem como da faculdade de administrar a si própria mediante representantes eleitos. A Catalunha, por exemplo, dispõe de um governo regional (a Generalitat), um Parlamento e uma Suprema Corte. Para não mencionar a língua catalã, falada por 12 milhões de pessoas em todo o mundo, e incompreensível para os demais espanhóis (o mesmo caso dos idiomas basco e aragonês). Mas a maioria dos catalães bate o pé por uma independência completa. REVISTA DO BRASIL

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HISTÓRIA

Entrou de sola

Como muitas das sagas do futebol, a história do Barcelona alterna pisadas de bola e triunfos épicos. Tanto os jogadores como os torcedores são também chamados de blaugranas, ou azul-grená em catalão, as cores do clube. Que por um triz não foram outras: as primeiras escolhas – há mais de 100 anos – recaíram no azul e vermelho. Só que o vermelho tinha acabado na paleta do desenhista do escudo e, como quem não tem cão caça com gato... Hoje o grená e o azul são as cores mais icônicas do esporte catalão. Em 2011, o Barça alcançou 180 mil sócios (para se ter uma ideia, o Flamengo – teoricamente o clube mais popular do Brasil – não chega a 30 mil). É a segunda agremiação futebolística com mais associados do mundo (a primeira é o Benfica, de Lisboa, e a terceira o Manchester United). Existem mais de 1.800 Casas do Barcelona espalhadas pelo planeta. O FCB é um dos quatro únicos clubes profissionais espanhóis que não configuram uma sociedade anônima – assim, a propriedade continua com os sócios (os outros são Real Madrid, Atlético de Bilbao e Osasuna). Entre os times espanhóis, só Barça e Real Madrid nunca caíram para a segunda divisão. E, durante muito tempo, o FCB se orgulhou de ser o único colosso do futebol a não usar marcas de patrocinadores em seu uniforme. Apenas em 2006 um logotipo assomou na parte abdominal das camisas, e ainda assim por uma causa nobre: o clube paga, em vez de receber, para estampar o emblema do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). A partir da temporada 2011-2012, a crise econômica europeia deu um tranco na tradição e rolou o maior contrato de patrocínio da história, pelo qual o Barça passou a embolsar € 30 milhões anuais para exibir a marca da Qatar Foundation. Há dois meses, uma pesquisa da empresa alemã Sport+Markt indicou que a torcida do Barça é a maior da Europa, com cerca de 60 milhões de devotos. Segundo as estatísticas da Federação Internacional de Futebol (Fifa), a equipe é a melhor do futebol mundial da primeira 36

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AMBIÇÃO Além de independência, a Catalunha almeja se tornar mais um Estado da Comunidade Europeia. Ao todo, a Espanha tem 17 comunidades com autonomia

década do século 21 e sua marca, uma das mais midiáticas. Paradoxalmente, esse clube tão cioso de seu DNA regional foi fundado por um... suíço. Em 22 de outubro de 1899, Hans Gamper, um ex-jogador, pôs um anúncio no jornal – e a coisa nunca mais parou de bombar. O dia 14 de junho de 1925 se transfigurou num dia santo para os culés: em reação à ditadura fascista de Primo de Rivera, a torcida catalã vaiou a plenos pulmões o hino da Espanha. Como represália, o clube foi fechado por seis meses. Nas primeiras semanas da Guerra Civil Espanhola (1936-1939), o então presidente do Barça, Josep Sunyo, que era republicano, acabou assassinado por partidários do general Franco, cujas tropas ocuparam e detonaram Barcelona na última fase do conflito. Com a vitória dos nacionalistas, Francisco Franco proibiu oficialmente o uso da língua catalã. Durante os 36 anos

de ditadura, a vida do clube e dos culés descambou numa urucubaca lascada. O único reduto em que ainda se falava catalão era o estádio do Barça – fundindo ainda mais clube e região. O general Franco era tiete do Real Madrid, o que atiçou as saias-justas entre os dois times. Um episódio – protagonizado por um dos maiores craques de todos os tempos – radicalizou aquele antagonismo. O nome da fera era Di Stefano, para muitos um jogador da estirpe de Pelé. Em 1953, o Barça contratou o argentino, depois de Di Stefano ter comido a bola numa excursão pela Espanha de seu time, o Milionários da Colômbia. Mas aí o Real Madrid meteu o bedelho. Enquanto os blaugranas negociavam com o portador do passe do craque (o clube River Plate), o Real foi direto ao Milionários. Di Stefano já tinha até disputado três amistosos com a camisa do Barça. No entanto, com o franquismo entrando de so-


HISTÓRIA

os sucessivos fiascos da seleção brasileira minaram a cotação dos craques canarinhos na Europa. Além disso, a crise econômica europeia bagunçou o cacife dos clubes de futebol. Com exceção do Barcelona e do Real Madrid (e, mesmo assim, malemá...), os outros times espanhóis estão numa pindaíba danada, com poder de investimento menor do que os principais clubes brasileiros. Por outro lado, Neymar vai encontrar o barcelonismo a seus pés. As reticências que subsistiam em relação ao talento do moicano ruíram com as pirotecnias dele na Copa das Confederações – incluindo um golaço na final contra a Espanha. Já a apresentação de Neymar no Camp Nou arrastou 65 mil culés, a troco de coraçõezinhos feitos com as mãos – e umas meras trocentas embaixadinhas. Proliferou no ato uma legião de neymaretes desde criancinhas. Assim, a palavra tatuada na nuca que ele fez de propósito para seu ciclo blaugrana pode muito bem ser profética: “Blessed” (em inglês, abençoado). Se a Catalunha sabe dar um bico nas tradições mais sacrossantas da Espanha (como a recentíssima proibição das touradas pelo parlamento catalão), também sabe mimar seus xodós. Se jogar o que sabe, Neymar, que já troca juras de amor eterno com Messi, tem tudo para pegar o touro a unha – e evitar que a vaca vá pro brejo.

FC BARCELONA

Neymar terá de brilhar num momento em que o futebol espanhol tem baixa presença de jogadores brasileiros. No total, 24, espalhados por 12 clubes, participaram da temporada 2012-2013. No campeonato de 2006-2007 eram 56. Parece remoto o tempo em que Romário, Rivaldo, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho foram eleitos o melhor jogador do mundo, arrebentando pelo Barcelona com uma baciada de gols. Essa erosão tem dois motivos. Até o título recente da Copa das Confederações,

JULIAN MARTIN/EFE

WWW.WHOATEALLTHEPIES.TV

la a favor do time da capital, o melhor que o clube catalão descolou foi uma proposta absurda: o astro argentino faria temporadas alternadas em cada equipe – começando pelo Real. O Barcelona mandou-os catar coquinho, mas nunca engoliu aque-

Abençoado

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DAVID RAMOS/GETTY IMAGES

le sapo. Daí que atropelar os merengues na corrida pelo passe de Neymar teve um gostinho todo especial. Ao contrário da maioria dos clubes espanhóis, o Barcelona jamais solicitou reconhecimento pela monarquia nem tratamento de “Real”. Para numerosos escritores, como Manuel Vázquez Montalbán (autor de Autobiografia do General Franco), o Barça cumpre na Catalunha o papel da seleção catalã. Ainda assim, nos últimos anos o clube patrocinou vários amistosos entre um combinado catalão e seleções de outros países – entre os quais o Brasil. Atestando que separatismo não implica provincianismo, em 2005 organizou no Camp Nou um amistoso contra uma seleção de jogadores palestinos e israelenses, que pela primeira vez partilharam uma mesma equipe.

PARCERIA VITORIOSA A relação dos brasileiros com o Barça vem de longe. Romário, Rivaldo, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho foram eleitos o melhor jogador do mundo pelo clube ao longo dos últimos 20 anos AGOSTO 2013

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CULTURA

Rua é palco, cidade é plateia Grupos de teatro desenvolvem no meio do passeio urbano uma dramaturgia contemporânea, que liga vida real e imaginário Por Leonardo Fuhrmann 38

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barbeiro Miguel Arcanjo, de 62 anos, se tornou ator em seu salão em pleno horário de trabalho. A estreia foi no espetáculo teatral Barafonda, da Cia. São Jorge de Variedades, em que ele representa a si mesmo e conta histórias do bairro onde vive há mais de 40 anos. Em sua participação, faz citações ao pintor e escultor Raphael Galvez, que morou no bairro paulistano da Barra Funda e era cliente da barbearia. “O Galvez costumava contar de quando ele ia aos táxi-dança com o Mário de Andrade, que também morava no bairro”, conta, repetindo uma de suas falas. Ele também aponta a casa em

que morou a atriz e cantora Inezita Barroso, em frente ao seu salão. Miguel se orgulha de ter ajudado o grupo a montar uma dramaturgia sobre a Barra Funda. Ao lado de outros moradores, ele esteve em conversas na sede da companhia para falar sobre memórias do bairro. “A gente ia lá falar com eles e não pensava que ia sair um sucesso. Tem gente que vem de outros estados para ver a peça, que foi indicada para vários prêmios”, comenta. O barbeiro diz que a encenação ajuda as pessoas a conhecer mais e valorizar o lugar. “Aqui foi o berço do samba de São Paulo, lembro do carnaval na Avenida São João. Era uma região bonita, as famílias


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CULTURA

vinham passear. O problema foi a construção do Minhocão (o Elevado Costa e Silva, construído em 1968)”, lembra. Foi para decifrar pessoas como Miguel que, há pouco mais de um século, o cronista carioca João do Rio descreveu no livro A Alma Encantadora das Ruas a personalidade de certos locais da cidade e os tipos que os frequentam. Está certo que o lugar em questão era o Rio de Janeiro de 1908. Mas o que importa é como essa alma foi abundantemente captada pela literatura e pela dramaturgia, uma das linguagens que melhor se apropriou dela, sobretudo na segunda metade do século 20. As encenações de rua eram usadas tradicionalmente para um teatro de roda, de origem na cultura popular, e no chamado agitprop (abreviatura de “agitação e propaganda”) – como as que eram feitas durante os anos 1960 pelo Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes. Ainda hoje essa busca pela “alma encantadora” das ruas tem movido grupos de teatro a desenvolver pesquisas e transformá-las em encenações em cidades como Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Goiânia e São Paulo. O diretor e professor de teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) André Carreira desenvolve em seu livro mais recente a ideia de “teatro na cidade”. O conceito inclui o tradicional teatro de rua e acrescenta grupos que pesquisam temas relacionados ao espaço urbano. “Essa aproximação com a arte da performance construiu uma modalidade cênica que dialoga diretamente com as regras de funcionamento da cidade, por isso já não podemos nos satisfazer com a expressão ‘teatro de rua’”, escreve. Como diretor, André aplicou a teoria em espetáculos com os grupos Teatro Que Roda, de Goiânia, e Experiência Subterrânea e Núcleo ÁQIS, de Florianópolis. “Nas minhas peças, a cidade não é apenas um cenário. Ela e seus habitantes se tornam parte do desenvolvimento de uma dramaturgia”, diz. André está em turnê pelo Brasil com o espetáculo Marias da Luz, primeiro trabalho junto com o grupo paulistano As Graças. O texto foi criado a partir de depoimentos de frequentadores do Jardim da Luz, no centro de São Paulo. O local também foi usado para as primeiras apresentações. “A gente reúne frequentadores habituais do parque com um público que

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LINGUAGEM FÍSICA O Voo das Fêmeas e Despedida de Palhaços, do grupo Falos & Stercus, de Porto Alegre

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PAULO PEPE/RBA

CACÁ BERNARDES/DIVULGAÇÃO

CULTURA

APLAUSOS E RISOS Barafonda, da Cia. São Jorge de Variedades, percorre as ruas da Barra Funda, bairro da região central de São Paulo, e tem no elenco o barbeiro Miguel Arcanjo: “Quando eu vi a rea­ção das pessoas aqui na porta, passei a achar que estava tudo bem”

vem para cá em razão da apresentação. É emocionante conversar com pessoas que viveram ou conhecem histórias parecidas com as dos personagens”, afirma. Para o diretor, os espetáculos na cidade funcionam como uma ruptura poética com o cotidiano, que, no entanto, não quebra o fluxo da cidade. Por isso, as apresentações são abertas para uma troca com os espectadores – moradores ou frequentadores da região ou não – e muitos organizadores optam por não fechar o trânsito dos locais onde fazem suas “montagens”. Preferem conviver com o tráfego de pessoas e veículos, que podem alterar o andamento do espetáculo. “A peça se torna permeável, como a cidade”, comenta André.

A cena é o momento

Colocar-se na contramão do cotidiano é o conceito usado pelo grupo Falos & Stercus, de Porto Alegre. Para seu diretor, Marcelo Restori, o teatro pode refletir a história e o momento da cidade quando consegue dar outro significado ao cotidiano, em que a realidade e o ambiente simbólico interagem. “Vemos a rua como um espaço de fluxos. A realidade pode ser invadida pela poesia e pela ficção”, diz. “Por isso, articulamos o diálogo com a cidade a partir de seu significado simbólico e nos inserimos em seu imaginário.” O Falos & Stercus desenvolve um trabalho que rompe com a palavra e concentra sua narrativa numa linguagem física, investe numa estética que aproxima o teatro da dança, reforça a linguagem simbolista e o choque estético. 40

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A pesquisadora Beth Néspoli acompanhou o grupo Vertigem, de São Paulo, na montagem do espetáculo Bom Retiro 958 Metros. E chegou a escrever um artigo que teve o bairro como tema e território da pesquisa. “Reconsiderei um pouco a questão, porém. Penso que o tema é o capitalismo representado naquele grande shopping e no abandono do Teatro Taib. O texto retrata memórias que não estão na arquitetura nem nas pessoas. É uma região em que todo o movimento à noite é de seguranças e de reformas das lojas”, afirma. A pesquisadora aponta uma forma de pensar a relação entre o tempo e a cidade. Beth cita também o Teatro de Narradores e a Cia. São Jorge de Variedades como exemplos de companhias preocupadas com a maneira de tratar o espaço urbano. A primeira fez uma montagem recente de A Irresistível Ascensão de Arturo Ui, do dramaturgo alemão Bertolt Brecht – encenada nas ruas do tradicional bairro do Bixiga, região central de São Paulo. A segunda apresentou recentemente Barafonda, criação própria, que percorre as ruas da Barra Funda, na região central, onde fica a sede do grupo. “Eles não só dialogaram com os moradores da região no momento de criar a encenação como colocaram as pessoas do bairro para falar sobre suas memórias e histórias locais”, destaca. Patrícia Gifford, da Cia. São Jorge, diz que a rua impõe novos desafios ao artista por ser um espaço de relações, tensões e desejos. “A dramaturgia é aberta e só se efetiva de fato ao se comunicar com a situação posta ao seu redor”, afirma. Segundo ela, moradores e trabalhadores do bairro e os espectadores que


ESPETÁCULO DE RUA Circus Negro, do grupo ÁQIS, de Florianópolis

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CULTURA

são de fora acabam desenvolvendo diferentes camadas de significado para o espetáculo. “A encenação desnaturaliza o olhar da cidade sobre ela própria e obriga as pessoas a lidar concretamente com o outro. Tudo isso no momento em que a rua está acontecendo.” O trabalho da companhia é desmistificador. “As pessoas nos viam na rua durante o desenvolvimento do processo de criação, acompanharam o começo com poucos figurinos e equipamentos e a evolução toda”, lembra. Um dos desafios agora é viajar com a peça. “Acho que é possível, mas temos de ir antes para a cidade em que vamos nos apresentar para criar essa interação.” A própria relação da companhia com os vizinhos influencia seu teatro. O barbeiro Miguel Arcanjo, da Barra Funda, ainda não pensa em viajar, mas entendeu bem o seu papel na montagem. “O Pascoal da Conceição, um dos atores, me disse que vida de ator é feita de conquistar aplausos e risos. Quando eu vi a rea­ção das pessoas aqui na porta, passei a achar que estava tudo bem.” Aos risos, ele brinca sobre a possibilidade de continuar na carreira. “Se aparecer uma oportunidade tão boa quanto essa, por que não?” REVISTA DO BRASIL

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VIAGEM

Bons ares, bons livros Livraria frequentada por Borges na Galería del Este, próxima à Plaza San Martín

Conhecida por sua veia cultural, a capital argentina é lugar perfeito para quem quer unir viagem e literatura. Poucas cidades no mundo podem se gabar de ter tão profunda relação com seus escritores Texto e fotos de João Correia Filho

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ntre os muitos caminhos possíveis a trilhar numa cidade com a riqueza histórica e cultural de Buenos Aires, estão os roteiros inspirados na vida e na obra de mestres como Julio Cortázar, Jorge Luis Borges e Ernesto Sábato, ou ainda de estrangeiros como Federico García Lorca e Antoine Saint-Exupéry, ambos com passagens marcantes pela capital argentina. A geografia literária de Cortázar inclui locais como a Plaza de Mayo, a Galería Güemes e as grandes avenidas do centro, presentes em livros como Bestiário, Histórias de Cronópios e de Famas e O Jogo da Amarelinha, este tido como sua obra-prima. Uma das grandes joias arquitetônicas da cidade, a Güemes é o cenário do conto “O Outro Céu”, lançado em 1966, no livro Todos os Fogos o Fogo. Nele, o

personagem entra pela bela galeria portenha e é lançado à Galeria Vivienne, em Paris, cidade que também foi morada do escritor por muitos anos. Inaugurada em 1915, no número 165 da Calle Florida, a Güemes é um dos notáveis exemplos de art nouveau da cidade, e foi bastante frequentada por Cortázar durante as décadas de 1930 e 1940, a ponto de ele dizer que era “sua pátria secreta”. A Güemes é também marcante na história do famoso escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, autor do best-seller O Pequeno Príncipe. Exupéry morou no sexto andar do edifício, entre 1929 e 1930, e foi ali que escreveu Voo Noturno, livro publicado em 1931, inspirado em suas aventuras como aviador da Companhia Geral Aeropostal, empresa francesa pioneira no ramo de correio aéreo com filial em Buenos Aires.


VIAGEM

Café da livraria El Ateneo Gran Splendid

Bem próximo dali está outro lugar secularmente ligado à literatura. Inaugurado em 1858, o Café Tortoni ainda preserva o clima dos grandes cafés literários, que durante o final do século 19 e meados do 20 abrigaram reuniões de grupos de escritores e artistas. Além da decoração requintada, que divide espaço com obras de arte e homenagens a frequentadores famosos, o Tortoni preserva uma programação de shows de tango que estão entre os mais tradicionais da capital. Seguindo na toada literária, valem a visita dois edifícios localizados na Avenida de Mayo, na região central. Um deles é o Hotel Castelar, no número 1.152, que teve como hóspede o poeta espanhol Federico García Lorca, quando visitou Buenos Aires para conferências, de 1933 a meados de 1934. O hotel ainda preserva o quarto tal como estava quando recebeu um dos

Livraria El Ateneo Gran Splendid

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VIAGEM

maiores nomes da literatura e da dramaturgia espanhola. O outro é o Palazzo Barolo, construído em 1923, cuja arquitetura remete ao livro A Divina Comédia, de Dante Alighieri. Construído pelo arquiteto italiano Mario Palanti, divide-se em três partes – inferno, purgatório e céu –, tal como o grande clássico italiano do século 14, além de muitas outras referências à obra. Localizado no número 1.370 da Avenida de Mayo, está aberto apenas com visitas guiadas e somente à noite. O percurso literário termina no alto de um farol construído no topo do palácio, que ilumina a cidade de forma inspiradora.

Literalmente importantes

Alguns bairros também são literalmente importantes na capital argentina. É o caso de Palermo, na região nordeste da cidade, que tem Jorge Luis Borges como seu grande representante. “As imagens podem ser cordilheiras, pantanais com andaimes, escadas em caracol que desaparecem em porões, areais cujos grãos devo contar, mas qualquer dessas coisas é uma embocadura precisa para o bairro de Palermo”, escreveu Borges no livro Atlas, lançado em 1985, um ano antes de sua morte. Um passeio pelo universo borgiano pode começar no coração desse bairro que hoje é sinônimo de cafés, restaurantes e livrarias, muitas destas com bons cafés e extensa programação cultural. Dois bons exemplos são a Libros del Pasaje e a Eterna Cadencia, que merecem ser visitadas mesmo que você não leia nada em espanhol. Ambas possuem atividades culturais, saraus e ambientes aconchegantes, onde você pode ler seu autor preferido e passar horas rodeado de livros e de gente interessante. Ficam bem perto da antiga Calle Serrano, hoje Jorge Luis Borges, em homenagem ao morador do número 2.135, onde há uma placa discreta que indica ter passado ali sua infância. Com uma obra arrebatadora, que inclui clássicos como O Aleph, Ficções e Livro dos Seres Imaginários, Borges escreveu poemas antológicos sobre sua cidade, como “Fundação Mítica de Buenos”, no qual declara em sua última estro44

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Galería Güemes


VIAGEM

Livraria Eterna Cadencia

Livraria Clássica y Modern

fe “Para mim só na lenda começou Buenos Aires: entendo-a tão eterna como a água e como o ar”. Seguindo pela Calle Borges, chega-se ao coração verde de Palermo, o Parque 3 de Febrero, uma grande área com lagos e jardins que costumava ser visitada pelo escritor. Ele era visto principalmente no Rosedal, um pitoresco jardim com cerca de 18 mil roseiras, de centenas de espécies diferentes, de várias partes do mundo. Fica ali também o Jardim dos Poetas, com estátuas de escritores como Shakespeare, García Lorca, o cubano José Martí, Alfonsina Storni e, claro, Jorge Luís Borges. Já o bairro de San Telmo pode ser visitado sob o olhar de Ernesto Sábato, autor de Sobre Heróis e Tumbas, lançado em 1961. Uma caminhada ao Parque Lezama pode seguir os passos de Martín e Alejandra, personagens dessa intrigante novela que se encontravam num banco defronte

à estátua de Ceres, no centro do parque. Sábato também leva ao bairro do Retiro, mais precisamente na Plaza San Martín, cenário importante em seu livro O Túnel. Descreve com maestria lugares como o edifício Kavanagh e o Relógio Inglês, que se destacam na paisagem urbana da região. Nos arredores da Plaza San Martín, na Calle Maipu, o número 994 marca o local onde Borges viveu durante 41 anos. Há apenas uma placa no lugar, mas você pode aproveitar para visitar a livraria La Ciudad, localizada na Galería del Este, número 971. Era frequentada por Borges e por seu grande amigo Adolfo Bioy Casares, autor do antológico A Invenção de Morel. Hoje a livraria funciona também como antiquário e mantém exposta a pequena mesa usada pelos nobres frequentadores. Buenos Aires é exemplar, aliás, em

ofertas de livrarias. Em meio a tantas opções, uma dica é 50 Livrarias de Buenos Aires, da jornalista Adriana Marcolini, com uma excelente seleção das mais representativas. Entre elas está a El Ateneo Gran Splendid, no bairro Recoleta, considerada uma das mais belas do mundo. Foi montada num antigo e luxuoso teatro, cujos lugares destinados ao público foram tomados por estantes de livros. Onde antes havia o palco, há um charmoso café, para deleite dos visitantes. A imponência da El Ateneo é um símbolo da real importância das livrarias na vida cultural da capital argentina. Formam uma teia literária que envolve o leitor, tal como um livro bom.

Serviço Cortázar em destaque. Este ano, uma vasta programação toma conta de Buenos Aires para comemorar os 50 anos de lançamento de O Jogo da Amarelinha, um dos livros mais importantes do escritor argentino Julio Cortázar. Ao mesmo tempo, iniciam-se os preparativos para a comemoração do centenário do escritor, em 2014, que promete sacudir a vida cultural da cidade. Ao pé da letra. Um livro que pode ajudar muito os aficionados por literatura que têm um pouco mais de intimidade com o espanhol é Al Pie de la Letra – Guía Literaria de Buenos Aires. Escrito pelo jornalista argentino Álvaro Abós, é bastante organizado e completo (com mapas e gráficos), abordando um grande número de escritores, dos mais variados estilos e época. Eterna Cadencia Calle Honduras, 5.574, Palermo www.eternacadencia.com Libros del Pasaje Calle Thames, 1.762 www.librosdelpasaje.com.ar El Ateneo Gran Splendid Avenida Santa Fe, 1860 www.tematika.com.ar REVISTA DO BRASIL

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curtaessadica

Por Xandra Stefanel

Preços, horários e duração de temporadas são informados pelos responsáveis pelas obras e eventos. É aconselhável confirmar antes de se programar

Memórias do Cárcere

São Bernardo

Vidas Secas

Sessenta anos sem o Velho Graça A fuga da seca, o sofrimento na prisão, a angústia de uma vida vazia. Os temas de Vidas Secas, Memórias do Cárcere e São Bernardo, clássicos de Graciliano Ramos, foram transformados em filmes há alguns anos. E relançados em DVD pelo Instituto Moreira Salles, em homenagem ao autor, que completaria 120 anos em 2013. Os três evidenciam uma das principais características do Velho Graça: o forte conteúdo social. Vidas Secas, publicado em 1938, teve sua versão para o cinema lançada em 1963 por Nelson Pereira dos Santos. Conta a saga de uma família de retirantes que

foge da seca e enfrenta a fome, a pobreza e todas as emoções que essa condição miserável traz. Memórias do Cárcere, de 1953, também foi adaptado por Nelson Pereira para o cinema, 30 anos depois. Carlos Vereza interpreta o próprio Graciliano no período em que ficou preso, vítima da ditadura estado-novista. Em 1971, Leon Hirszman dirigiu São Bernardo, baseado no livro de 1934, cujo protagonista, Paulo Honório, ao sair da miséria, deixou que o dinheiro arruinasse sua vida. Os filmes podem ser adquiridos separadamente (R$ 48) ou em conjunto (R$ 120).

Vida em comunidade Nos anos 1980, os moradores do Vale do Capão, na Chapada Diamantina (BA), viram chegar à região pessoas de várias partes do mundo que, em comum, tinham a vontade de mudar radicalmente de vida: quebrar laços com a sociedade de consumo e viver em contato com a natureza. O documentário Pra Lá do Mundo, dirigido por Roberto Studart, mostra a exuberância da natureza que rodeia essas comunidades e seu convívio social, baseado na valorização da solidariedade, em experiências associativas de educação, trabalho, saúde e lazer e na proteção do meio ambiente. Junto a tudo isso, é claro, todos os conflitos – inclusive ideológicos – que fazem parte da vida em comunidade. Disponível em DVD.

Era uma vez uma loba

A lobinha ruiva ia visitar sua vovozinha doente quando, de repente, encontrou pelo caminho um bicho bem estranho que andava sobre duas pernas e quase não tinha pelos no corpo. O que ele quer é caçar a pequena loba, por isso a engana para chegar antes na casa da vovó. A autora de A Lobinha Ruiva (Cia. das Letrinhas, 32 pág.), Stela Greco Loducca, inverteu os papéis do conto dos Irmãos Grimm, ou seja, aqui é o homem que ataca o bicho. Mas, nesse caso, ele acaba se arrependendo. A reflexão que Stela propõe às crianças é: será que existe um mau que é só mau e um bom que é só bom? O livro tem ilustrações de Renato Moriconi. R$ 30. 46

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REVISTA DO BRASIL


Centenário A mostra interativa Rubem Braga – O Fazendeiro do Ar, em cartaz até 1º de setembro no Museu da Língua Portuguesa, proporciona uma imersão na vida e obra do “inventor da moderna crônica brasileira”, que comemoraria seu centenário neste ano. Seu jeito envolvente, simples e acessível de escrever pode ser conferido em seis módulos temáticos: Retratos, Redação, Guerra, Passarinho, Cobertura e Cachoeiro. A exposição mostra a infância do autor, em Cachoeiro do Itapemirim (ES), passa pela sua vida de repórter, pela paixão por passarinhos, e chega ao “mundo rural” recriado por ele em sua cobertura em Copacabana. Terça, das 10h às 22h; de quarta a domingo, das 10h às 17h, na Praça da Luz, em São Paulo. R$ 3 e R$ 6. Informações: www.centenariorubembraga.com.br.

Grandes do rap

Eles explodiram na cena do rap nacional, cada um com sua carreira. Agora estão juntos no CD e DVD Criolo e Emicida ao Vivo, gravado em setembro de 2012 e lançado agora em julho. Os dois dividem o palco em 18 faixas, entre as quais os sucessos Triunfo e Rua Augusta, de Emicida, e Não Existe Amor em SP, Grajauex e Lion Man, de Criolo. Mano Brown, dos Racionais MC’s, participa em Capítulo 4, Versículo 3 e Vida Loka I. Evandro Fióti e Rodrigo Campos também estão no disco, que foi produzido pela Oloko Records, pelo Laboratório Fantasma e por Paula Lavigne. O CD pode ser baixado gratuitamente pelo site www.dvdcrioloemicida.com. Nas lojas, o álbum custa R$ 19 e o DVD, R$ 24. REVISTA DO BRASIL

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FUNDAÇÃO PROJETO TRAVESSIA C.N.P.J.(MF) nº 01.044.756/0001-03 Balanço patrimonial dos exercícios findos em 31 de dezembro (em R$) A

T

I

V

O

2012

CIRCULANTE Caixa e Bancos Aplicação Financeira Outros Créditos TOTAL DO CIRCULANTE

2011

7.959,52 312.063,44 835.939,15 1.155.962,11

5.961,70 496.309,39 27.869,09 530.140,18

1.180.000,00

1.180.000,00 1.180.000,00

278.538,81 79.937,30 170.255,90 33.900,00 218.664,60 1.780,73 -515.588,86 277.488,48

278.538,81 79.937,30 169.916,90 33.900,00 206.272,41 11.780,73 -466.403,56 313.942,59

TOTAL DO NÃO CIRCULANTE

1.457.488,48

1.493.942,59

TOTAL DO ATIVO

2.613.450,59

2.024.082,77

NÃO CIRCULANTE Realizável a Longo Prazo Crédito de Instituidores 1.180.000,00 PERMANENTE Edifícios Máquinas e Equipamentos Móveis, Utensílios e Instalações Veículos Computadores e Periférico Marcas e Direitos 1 (-) Depreciação Acumulada TOTAL DO PERMANENTE

Demonstração de resultados dos exercícios findos em 31 de dezembro (em R$) DESCRIÇÃO ARRECADAÇÃO ATIVIDADE FIM Contribuições, Doações, Convênios e Eventos De Mantenedores Patrocínio Órgãos Privados Convênio Órgãos Públicos (-) Devolução Convênios não Aplicado Contribuições e Doações Eventual Promoções e Eventos Institucionais (-) Custo Eventos Promocionais

NÃO CIRCULANTE Outras Obrigações TOTAL DO NÃO CIRCULANTE PATRIMÔNIO LÍQUIDO Fundo Patrimônio Social Doações 0,00 Deficit Acumulado Superavit / Deficit do Exercício TOTAL DO PATRIMÔNIO LÍQUIDO TOTAL DO PASSIVO

742.000,00 249.744,40 0,00 0,00 30.865,50 5.498,50 -747,95

1.645.529,44

1.027.360,45

CUSTO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL Custo Com Pessoal Encargos e Contribuições Sociais Benefícios Com Pessoal Depreciação Impostos, Taxas e Contribuições Serviços Profissionais Externo Atendimento e Atividade Social Manutenção, Conservação e Reparos

-784.913,26 -278.456,86 -251.996,30 -49.185,30 -4.252,20 -68.354,57 -162.944,13 -24.994,00

-522.700,53 -190.665,65 -178.646,96 -46.651,14 -4.554,95 -48.221,89 -84.893,49 -55.063,46

TOTAL DO CUSTO PROJETO SOCIAL

-1.625.096,62

-1.131.398,07

38.943,99 -4.070,87

47.921,70 -3.324,97

TOTAL DO RESULTADO FINANCEIRO

34.873,12

44.596,73

OUTRAS ARRECADAÇÕES SOCIAIS LÍQUIDA DÉFICIT DO EXERCÍCIO

4.269,93 59.575,87

30.224,03 -29.216,86

DOAÇÕES E SUBVENÇÕES

SUPERÁVIT/ DÉFICIT

TOTAL ACUMULADO

296.685,78

292.352,00

-2.102.646,63

-1.513.608,85

AUMENTO DO PATRIMÔNIO Tranferência Superávit

0,00

0,00

0,00

0,00

DÉFICIT ACUMULADO Déficit do Exercício

0,00

0,00

-29.216,86

-29.216,86

DE 2011

296.685,78

292.352,00

-2.244.741,61

-1.655.703,83

AUMENTO DO PATRIMÔNIO Tranferência Superávit Ajuste Exercícios Anteriores

292.352,00 -240.061,60

-292.352,00 0,00

0,00 0,00

0,00 -240.061,60

0,00

0,00

59.575,87

59.575,87

348.976,18

0,00

-2.214.382,60

-1.865.406,42

DE 2012

885,00 3.908,88 8.244,42 1.220,00 53.441,57 67.699,87

3.842.858,45

3.641.303,59

3.842.858,45

3.641.303,59

348.976,18 -2.273.958,47 59.575,87 -1.865.406,42

296.685,78 292.352,00 -2.244.741,61 -29.216,86 -1.684.920,69

2.613.450,59

2.024.082,77

2012

2011 -29.216,86

Aumento (diminuição) dos itens que não afetam o caixa: Depreciação e amortização Perdas (ganhos) na alienação sobre o ativo investimentos Perdas (ganhos) na alienação sobre o ativo imobilizado

49.185,30 0,00 0,00

46.651,14 0,00 0,00

Redução (aumento) do ativo Contas a receber Outros Créditos

0,00 -808.070,06

0,00 -4.615,26

Aumento (redução) do passivo Fornecedores Obrigações sociais e fiscais Provisão de férias Outras obrigações

12.086,21 -1.241,99 33.036,96 725.972,37

-6.243,08 40,94 -7.885,16 144.011,63

Geração (utilização) de caixa das atividades operacionais

70.544,66

142.743,35

ATIVIDADES DE INVESTIMENTOS Aquisições de ativo imobilizado Aquisições de ativo intangível

-12.731,19 0,00

-35.320,04 0,00

Geração (utilização) de caixa das atividades de investimentos -12.731,19

-35.320,04

ATIVIDADES DE FINANCIAMENTOS Recebimento de empréstimos e financiamentos Pagamento Devolução de Convênio Recebimentos e doações integradas ao PL Geração (utilização) de caixa das atividades de financiamentos

Aumento (diminuição) no caixa e equivalentes

PATRIMÔNIO SOCIAL

DÉFICIT ACUMULADO Déficit do Exercício

12.971,21 2.666,89 8.244,42 525.637,51 86.478,53 635.998,56

59.575,87

Caixa e equivalentes no início do período Caixa e equivalentes no fim do período

Demonstração das mutações patrimoniais dos exercícios findos em 31 de dezembro (em R$)

DE 2010

2011

ATIVIDADES OPERACIONAIS Superávit (Déficit) do período

Aumento (diminuição) no caixa e equivalentes

DESCRIÇÃO

2012

2011

712.000,00 786.626,23 140.830,21 0,00 4.189,43 2.028,37 -144,80

RESULTADO FINANCEIRO Receitas Financeiras (-) Despesas Financeiras

CIRCULANTE Fornecedores Obrigações Fiscais, Tributárias Obrigações Sociais Outras Obrigações Provisão Para Férias e Encargos TOTAL DO CIRCULANTE

Demonstração do Fluxo de Caixa para os exercícios findos em 31 de dezembro (em R$)

2012

TOTAL ARRECADAÇÃO ATIVIDADE FIM

P A S S I V O

0,00 -240.061,60 0,00 -240.061,60

0,00 0,00 0,00 0,00

-182.248,13

107.423,31

502.271,09 320.022,96

394.847,78 502.271,09

-182.248,13

107.423,31

Nota 01 – Contexto operacional de entidade A “FUNDAÇÃO PROJETO TRAVESSIA” é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos e de natureza filantrópica, fundada em 1995, com os seus atos constitutivos registrados no “3º Registro Civil das Pessoas Jurídicas de São Paulo” em janeiro de 1996, conforme microfilme nº. 258.727. Conforme preceitua o artigo 5º, do Capítulo III, do Estatuto Social, a “FUNDAÇÃO PROJETO TRAVESSIA” tem por objetivo: “I) eleger as crianças e os adolescentes, especialmente aqueles que estiverem em condições sociais e econômicas desfavoráveis, como segmento prioritário de sua ação; II) fazer respeitar os direitos assegurados à criança e ao adolescente referentes a: i) ensino obrigatório; ii) atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência; iii) atendimento em creches e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade; iv) ensino noturno regular adequado às condições do educando; v) programas suplementares de oferta de material didático-escolar, transporte e assistência à saúde do educando de ensino fundamental; vi) serviço de assistência social visando a proteção à família, à maternidade e à adolescência, bem como o amparo às crianças e adolescentes que deles necessitem; vii) acesso às ações e serviços de saúde, tudo conforme prevê a Lei 8.069 de 13.07.1990”. De acordo com o Estatuto Social da Entidade, todo benefício e promoção de seus assistidos, “crianças, adolescentes e seus familiares”, é inteiramente gratuito. A origem da arrecadação financeira da Entidade está fundada em doações de pessoas físicas e jurídicas, e de parcerias com o setor público e privado que comungam com os objetivos sociais, assistenciais, da promoção da pessoa humana e filantrópicos da Entidade.


INFORME PUBLICITÁRIO

Nota 02 – Apresentação das demonstrações contábeis As Demonstrações Contábeis foram elaboradas em conformidade com as práticas contábeis adotadas no Brasil, especialmente aquelas contidas na Norma Brasileira de Contabilidade Técnica – NBCT nº. 10.19, que trata dos aspectos contábeis das entidades sem finalidade de lucros, e demais disposições complementares e fiscais, adequando-se às necessidades específicas das instituições sociais privadas sem fins lucrativos ou econômico e de natureza filantrópica. A Entidade, por ser sem fins lucrativos, bem como por estar desobrigada segundo a legislação fiscal, não adotou a prática de reconhecer os efeitos da inflação nas demonstrações contábeis desde 31 de dezembro de 1995. A Depreciação do Imobilizado é calculada pelo método linear.

PROJETO PRATES - Convênio firmado com a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social - SMADS, da Prefeitura do Município de São Paulo. c). Patrocínio com órgãos privados PATROCÍNIO ÓRGÃOS PRIVADOS 2012 2011 – Petrobrás 786.626,23 249.744,40 Total patrocínio órgãos privados 786.626,23 249.744,40 PROGRAMA DE EDUCAÇÃO NA RUA – Patrocínio firmado com a Petrobrás, visando a reintegração familiar, escolar e comunitária de crianças e adolescentes que habitam e sobrevivem nas ruas do Centro da Capital de São Paulo.

Nota 03 – Resumo das principais práticas contábeis As práticas contábeis mais significativas adotadas na elaboração das demonstrações contábeis são: a). as receitas e as despesas são reconhecidas pelo regime de competência. As receitas são apuradas através dos comprovantes de recebimento, entre eles, avisos bancários, recibos e outros. As despesas são apuradas através de Notas Fiscais e recibos, em conformidade com as exigências fiscais e legais; b). as doações e contribuições destinadas ao custeio dos Serviços Sociais da Entidade, foram contabilizadas em contas de receitas. As despesas de custeio da Assistência social, são apuradas através de documentos hábeis, em conformidade com as exigências fiscais e legais e estão registradas no grupo “Custo da Assistência Social”; c). ativos e passivos circulantes – os ativos são demonstrados pelos valores de realização, incluindo, quando aplicável, os rendimentos e as variações monetárias auferidos; os passivos registrados, são demonstrados por valores conhecidos ou calculáveis, incluindo, quando aplicável, os correspondentes encargos e a variação monetária incorrida; d). a entidade não mantém Provisão para Devedores Duvidosos em decorrência de suas finalidades filantrópicas e assistenciais; e). o Ativo Permanente se apresenta pelo custo de aquisição ou valor original, visto que a entidade não procedeu à Correção Monetária de Balanços em exercícios anteriores. A Depreciação do Imobilizado é calculada pelo método linear; f). a Provisão de Férias e Encargos foi calculada com base nos direitos adquiridos pelos empregados até a data do balanço, incluindo os encargos sociais correspondentes; g). em razão de sua finalidade social, assistencial, filantrópica e sem fins lucrativos, a Instituição não está sujeita ao recolhimento de impostos calculados sobre o superávit do exercício, e nem distribui qualquer parcela de seus resultados a associados, parceiros, dirigentes, conselheiros ou mantenedores.

Nota 08 – Exigível e Realizável a longo prazo A administração da entidade avalia a natureza dos casos, as ações existentes e as possibilidades de êxito ajustando a provisão para passivos contingentes conforme requerido. Em 31 de dezembro de 2012 as contingências estavam relacionadas à ação judicial de ordem previdenciária, relativa à questão com o INSS sobre a imunidade da cota patronal. A opinião dos assessores jurídicos é que o risco de perda é remoto, sendo que a administração da entidade, em uma postura conservadora, mantém registrada em 31 de dezembro de 2012 provisão no montante de R$ 3.842.858,45l (em 31 de dezembro de 2011 – R$ 3.641.303,59) considerado suficiente para fazer face às contingências.

Nota 04 – Títulos e Valores Mobiliários Histórico / Conta – Em reais Certificados de Depósito Bancário – Banco Bradesco S.A – CDB Fácil – Banco Bradesco S.A – CDB DI – Banco Bradesco S.A – POUPANÇA – Banco do Brasil - CDI Totais

2012

2011

35.727,43 259.655,28 16.680,73 0,00 312.063,44

822,24 387.370,49 31.512,59 86.64,07 496.309,39

Nota 05 – Outros Créditos Histórico / Conta – Em reais – Cheques em Cobrança – Adiantamento de Férias e Salários – INSS a Recuperar – Patrocínio PETROBRAS Total

2012 255,00 28.222,16 20.835,76 786.626,23 835.939,15

2011 255,00 6.778,33 20.835,09 0,00 27.869,09

Nota 06 – Imobilizado Histórico / Conta

Em reais Edifícios Móveis e utensílios Direitos de uso Máquinas e equipamentos Veículos Computadores Instalações Totais

Custo

Depreciação acumulada

2012 2011 2012 2011 278.538,81 278.538,81 (102.770,59) (91.628,95) 148.418,03 148.079,03 (130.181,80) (117.312,59) 11.780,73 11.780,73 (1.813,00) (1.813,00)

Líquido

2012 175.768,22 18.236,23 9.967,73

Taxas anuais de depr. 2011 -% 186.909,86 4 30.766,44 10 9.967,73 20

79.937,30 79.937,30 (60.393,73) (53.999,41) 19.543,57 25.937,89 33.900,00 33.900,00 (18.080,00) (11.300,00) 15.820,00 22.600,00 218.664,60 206.272,41 (184.356,88) (174.018,99) 34.307,72 32.253,42 21.837,87 21.837,87 (17.992,86) (16.330,62) 3.845,01 5.507,25 793.077,34 780.346,15 (515.588,86) (466.403,56) 277.488,48 313.942,59

10 20 20 10

Nota 07 – Doações, contribuições, patrocínios, convênios e parcerias com órgãos privados e públicos a). Contribuições de órgãos privados A Entidade recebe doações e contribuições de pessoas físicas e jurídicas. Nos exercícios de 2012 e 2011, as doações e parcerias com órgãos privados estão assim representadas: MANTENEDORES 2012 2011 – Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de São Paulo 540.000,00 520.000,00 – Banco Fibra S/A 10.000,00 60.000,00 – APEOESP – Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado e São Paulo 6.000,00 6.000,00 – FETEC Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito de São Paulo 120.000,00 120.000,00 – AFUBESP Associação dos Funcionários do Grupo Santander/Banespa, Banesprev e Cabesp 36.000,00 36.000,00 Total mantenedores 712.000,00 742.000,00 b). Convênio com órgãos públicos Histórico / Conta – Em reais 2012 2011 – PMSP - SMADS - PRATES 140.830,21 0,00 Total convênio órgãos públicos 140.830,21 0,00 No exercício de 2012 a Entidade manteve convênio com órgãos públicos no desenvolvimento dos seguintes Programas Sociais:

Francisco Fernandes C. Silva CRC/SP 1CE 003489/T-5

Nota 09 – DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO Neste exercício de 2012, a Entidade desenvolveu seu trabalho de assistência social nas seguintes áreas: DEFESA E PROMOÇÃO DE DIREITOS 1. PROGRAMA DE EDUCAÇÃO NA RUA – objetiva a reintegração familiar, escolar e comunitária de crianças e adolescentes que fazem das ruas do Centro da Capital de São Paulo seu espaço de moradia e sobrevivência. São realizadas atividades pedagógicas no próprio espaço das ruas visando a reflexão sobre a situação em que se encontram e a construção de novas e concretas possibilidades e, posteriormente, firmadas parcerias nas comunidades de origem e com serviços da rede pública a fim de garantir a permanência daquela criança ou adolescente no local e o seu desenvolvimento satisfatório. No ano anterior foi iniciado um trabalho na região do M’Boi Mirim, visando evitar a saída das crianças e adolescentes para as ruas, com continuidade durante esse ano. O número de atendimentos varia de acordo com fatores como composição da equipe e público. 2. PROGRAMA DE EDUCAÇÃO E ACESSO AO DIREITO – objetiva garantir e promover os direitos das crianças e adolescentes atendidos pelos demais programas e projetos da Fundação Projeto Travessia que têm seus direitos cotidianamente violados por aqueles que deveriam assegurá-los (família, sociedade e Estado) através do atendimento direto ao público-alvo e da instrumentalização dos demais profissionais da Fundação vinculados ao programa de educação na rua, aos serviços conveniados e às parcerias privadas para que possam defender os direitos das crianças e adolescentes que atendem de forma ampla, a partir de uma prática educativa que atribua significado ao texto da lei, contribuindo para o exercício pleno da cidadania e a inclusão social, a partir dos preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente e da atuação multidisciplinar. 3. PROJETO PRATES – objetiva acolher e garantir proteção integral à criança e ao adolescente em situação de risco pessoal e social, em situação de rua e com uso indevido de drogas. Região de abrangência da Sub-Prefeitura da Sé. Nota 10 – Imunidades, isenção, gratuidade e aplicação de recursos em obras e programas sociais Em face de seu caráter exclusivamente beneficente, filantrópico e assistencial, sem finalidade de lucro ou econômico, a entidade usufrui de imunidade para o Imposto de Renda – IRPJ sobre o Lucro, a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido – CSLL, e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS. A Contribuição ao Programa de Integração Social – PIS é de 1% sobre os proventos da folha de pagamento. Benefícios com imunidades e isenções 2012 2011 – Imunidade da COFINS 46.437,39 33.165,19 – Imunidade do PIS (excedente ao pago s/folha pagamento) 2.595,70 1.422,61 – Imunidade do IRPJ 14.893,97 0,00 – Imunidade da CSLL 5.361,83 0,00 As gratuidades concedidas por meio das obras e programas de assistência social, nos termos do artigo 3º., inciso VI, do Decreto nº. 2.526/98, foram aplicados em suas finalidades institucionais, conforme estabelecido no Estatuto Social da Fundação Projeto Travessia, a seguir apresentada: Histórico / Conta – Em reais 2012 2011 – Arrecadação bruta (excluído convênios) 1.547.913,15 1.105.506,18 – Gratuidade aplicada (excluído convênios) 1.484.266,41 1.131.398,07 A gratuidade oferecida e aplicada pela Entidade totalizaram um montante de R$ 1.484.266,41 no exercício de 2012, e R$ 1.131.398,07 no exercício de 2011, excluído convênio com órgãos público, encontra-se registrada no grupo “CUSTO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL”, respaldada em documentação hábil, e escriturada em livros próprios revestidos das formalidades legais. Nota 11 – Serviços de terceiros Refere-se, principalmente, a serviços prestados por consultores e educadores contratados para desenvolver os programas e atividades da fundação. Nota 12 – Patrimônio Social Está demonstrado pelo montante dos superávits apurados, líquidos dos eventuais déficits, a valores históricos, que vêm sendo destinados integralmente à manutenção e ao desenvolvimento dos objetivos sociais da entidade. A Fundação vem apresentando déficits circunstanciais, devido à ação judicial de 2002 em face do INSS, no sentido de assegurar seu direito constitucional de imunidade de recolhimento da quota patronal. Devido a essa questão, conforme mencionado na nota 08, há a apropriação de R$ 3.842.858,45, referente ao provisionamento da divída e um ativo de R$ 1.180.000,00 referente a cartas de garantias de instituidores. Quando essa situação for regularizada, esses valores serão revertidos, gerando Patrimônio Líquido positivo, conforme simulação abaixo: D E S C R I ÇÃ O SALDO DIVIDA CARTA DE QUOTA FUNDO CONTÁBIL PROVISIONADA INTENÇÃO PATRONAL PATRIMONIAL 2012 AJUSTADO Saldo Fundo Patrimonial 348.976,18 0,00 0,00 0,00 348.976,18 Déficit Acumulado -2.273.958,47 3.842.858,45 -1.180.000,00 201.554,86 590.454,84 Superávit do Exercício 59.575,87 0,00 0,00 0,00 59.575,87 PATRIMONIAL LÍQUIDO -1.865.406,42 3.842.858,45 -1.180.000,00 201.554,86 999.006,89 A entidade não concede remuneração, vantagens ou benefícios aos seus associados, membros da diretoria, conselheiros, instituidores, benfeitores ou equivalentes, nem distribui resultados, lucros, bonificações, dividendos, participações ou parcela de seu patrimônio.

Carlos Miguel Barreto Damarindo Diretor Financeiro

Juvandia Moreira Leite Diretora Presidente


B. KUCINSKI

A lição

– Nunca mais ajudo, pode ser um ceguinho atravessando a rua que eu não ajudo. – Mas, Márcia, que coisa feia... Estávamos as três tomando o chopinho de fim de tarde. Três mulheres esclarecidas, três mulheres politicamente corretas, daí o espanto com a fala da Márcia. – É que vocês não sabem o que me aconteceu no mês passado, quando viajei para Floripa. – Conta, conta – pedimos as duas de uma vez. – Tenho até vergonha de contar, idiota que eu fui de ajudar aquela velhinha. – Não vá dizer que você caiu no conto do bilhete premiado? Perdeu dinheiro? – perguntou a Lurdes. Márcia é boa gente, mas dinheiro a tira do sério, na hora de dividir a conta sempre reclama que só tomou dois chopinhos e nós tomamos três, coisas assim. – Não caí em golpe nenhum, não sou trouxa. – O que foi então? – perguntou de novo a Lurdes. – O voo saía de Cumbica, tem aquele saguão de embarque comprido, Asa A, Asa B, Asa C... de uma ponta a outra acho que dá um quilômetro. – Não exagere, Márcia, no máximo 400 metros. – Que seja, quando eu vi aquela velhinha miúda tentando subir a escada com a mala maior que ela, deu dó. Fui ajudar. Puxa aqui, empurra ali. A velha vencia um degrau, parava, tomava fôlego, me agradecia, subia outro, agradecia de novo; eu, de tão concentrada naquela tarefa, esqueci que não tinha muito tempo

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AGOSTO 2013

REVISTA DO BRASIL

para fazer o check-in. – Perdeu o voo? – perguntei. – Calma, vou chegar lá. Terminada a subida, a velhinha me agarrou no braço, emocionada, e disse “eu viajo todo mês para ver meus netos e nunca algum filho meu veio me ajudar”. Nessa altura eu lembrei do meu embarque e cortei a choradeira da velha, perguntei “a senhora que viaja sempre, sabe onde é o balcão do check-in da Gol?”, e ela disse “claro, você desce a escada e segue para a direita até o fim”. – E não era lá – disse a Lurdes. – Exatamente, e como eu estava em cima da hora não parei para conferir, fui seguindo, seguindo, atravessei as três alas, perdi um tempo precioso para descobrir que não era onde a maldita velha disse. – E perdeu o voo... – Calma, gente, vou chegar lá. Dessa vez conferi bem. Era no extremo oposto ao indicado pela velhinha. – Ela já devia estar esclerosada – eu disse. – Esclerosada ou não, detesto quem dá informação sem ter certeza. – E o que você fez? – O que eu podia fazer? Voltei correndo feito louca, imagine a cena, igual naquele filme Corra, Lola, Corra, a valise balançando na mão, o salto do sapato ameaçando rachar; fiz o check-in transpirando. – Então você não perdeu o voo? – O voo eu não perdi, só faltava essa, mas na afobação esqueci de mostrar meu cartão fidelidade e perdi os pontos desse trecho, tudo por causa daquela velhinha. – Mas então foi só isso? – Como “só isso”? Você acha pouco? Nunca mais ajudo ninguém, pode ser até criança se afogando na piscina do clube que não me mexo, não quero nem saber, que se danem.


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Mais Médicos para o Brasil, mais saúde para você.


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