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Editorial

Heitor Rocha

Atramitação do Projeto de Emenda Constitucional dos Precatórios exibiu com todas as tintas o simulacro que colonizou o estado de direito republicano reduzindo o Brasil a mero território de pirataria desde o golpe de Dilma Rousseff em 2015, com a deplorável encenação grotesca do Congresso Nacional, do Judiciário, do Poder Executivo, da grande mídia e das elites proprietários do dinheiro.

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O Congresso Nacional protagonizou o “suborno público” através das emendas parlamentares, que sempre significaram, desde a apreciação do processo de impeachment de Temer, agora com sua ilegalidade agravada pelas emendas secretas, uma forma de corromper a representação conferida pela população brasileira aos seus representantes no Poder Legislativo, no conluio das reformas restauradoras contra a previdência social, a legislação trabalhista, administrativa e tributária, além da permanente ameaça de privatização do patrimônio nacional.

Nesta conspiração contra os interesses dos brasileiros, assumiu posição de relevo o governo miliciano de Bolsonaro que articula, além do calendário das “reformas” neoliberais e o desmonte da saúde pública incorrendo em crime de responsabilidade por omissão, mas também por ação, nas mais de 600 mil mortes, com a negligência na compra das vacinas para acobertar a corrução por dose de imunizante, os madeireiros, garimpeiros, grilheiros, milicianos e outros bandidos no assalto à Floresta Amazônica, comprometendo o meio ambiente e, também, a economia com a ameaça do boicote econômico dos países importadores contra as exportações brasileiras. Tudo isso achando que as elites dominantes vão ter que continuar apostando na barbárie posta em funcionamento pela boiada do atual Poder Executivo por conta da chantagem ideológica da ameaça comunista.

O Poder Judiciário, a despeito de algumas medidas buscando recuperar a credibilidade comprometida na condenação sem provas de Lula (quando a única evidência de crime foi a intenção corruptora das empreiteiras), a prisão em segunda instância inconstitucional para tornar o ex-presidente inelegível e evitar a sua vitória na eleição presidencial de 2018, que seria inevitável, segundo os institutos de pesquisa de intenções de votos. Desta forma, não se pode deixar de ver esta política do Poder Judiciário de “soprar e morder” uma forma de manter sua credibilidade num equilíbrio instável entre a posição de lealdade e fidelidade às elites dominantes e, por outro lado, como no reconhecimento das ilegalidades dos promotores da Operação Lava a Jato e do comportamento faccioso, parcial e político do ex-juiz Sérgio Moro, na anulação das sentenças contra o ex-presidente, para tentar contornar a sua desmo-

ralização diante da consciência jurídica nacional e, também, internacional, com manifestações de renomados juristas sobre a aberração do processo contra Lula.

A grande mídia, comandada pelo Rede Globo, também, desempenha um triste papel não só de cumplicidade e apoio na conspiração golpista neoliberal, mas até de inegável posicionamento político, até agora, quando as aberrações do presidente Bolsonaro, com suas descaradas mentiras e decisões absurdas, afrontam a sociedade brasileira e até mundial. Ao mesmo tempo que critica as barbaridades do presidente, para buscar manter uma linha de ambiguidade, a grande mídia continua fazendo a propaganda do calendário das “reformas” conservadoras do ideário neoliberal como a única maneira de tirar o país a crise. Como todo veículo de comunicação não pode se manter sem um mínimo de credibilidade junto ao público, esse malabarismo torna-se uma necessidade técnica e não só uma concessão ao “politicamente correto”. Não pode ser descartada a possibilidade de um acordo nesta briga da Globo com o governo Bolsonaro, tendo em vista que se trata de algo conveniente para as duas partes: o governo Bolsonaro faz média com a sua base de apoio evangélica e outros setores truculentos, que não aceitam as novelas globais por considera-las muito liberais em termos de costumes; por outro lado, a TV Globo faz média com as pessoas civilizadas e de cultura razoável que não aceitam a ignorância e o autoritarismo do atual chefe do Poder Executivo.

As elites proprietárias, por fim, encenam algumas posições de indignação diante das aberrações do brutamontes de plantão no Palácio da Alvorada, assinando manifestos contra a política de desmatamento e queimadas incentivada pelo governo federal, em face da possibilidade de perderem dinheiro devido ao boicote dos países importadores das exportações brasileiras. Contudo, nada mais do que essas tímidas iniciativas do pessoal da Faria Lima. Costumeiramente, repetem-se os jantares em homenagem ao presidente por empresários sempre ávidos por privilégios, como agora os dois anos de desoneração das folhas de pagamentos, a pretexto de incentivar a geração de empregos, quando se sabe que esses empresários “patrióticos” pegam esse aumento nos lucros para especular nos paraísos fiscais, como dá o exemplo o ministro Paulo Guedes.

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