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COP 26: Muito barulho por nada?

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Editorial

Editorial

Marcos Costa Lima

Much ado about nothing? William Shakespere

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Após 12 dias de conversas, especialistas do clima alertaram em carta aberta (11/11/2021) que os compromissos atuais no projeto de acordo Cop26 estão sendo seriamente prejudicados pelos compromissos insuficientes sobre os combustíveis fósseis. A conferência da ONU em Glasgow foi encerrada após conversações entre 27 Estados-membros e delegados de mais de 100 nações, mas há uma forte preocupação com o uso de uma linguagem sem força e não comprometida com a dimensão do problema. Mais de 200 cientistas de todo mundo têm dito que ações urgentes e ‘em larga escala’ são obrigatórias para manter viva a meta de 1,5°C (Germanos, 2021).

Segundo os Especialistas em meio ambiente a meta de um aumento de 1,5°C nas temperaturas globais precisa ser mantida viva para permitir que a humanidade sobreviva, mas os compromissos atuais sobre petróleo, gás e carvão na Cop26 não são suficientes.

Depois de duas semanas, a Conferência do Clima chegou ao fim no sábado 13/11 em Glasgow, na Escócia, com um resultado aquém do esperado diante da emergência climática que cobra a cada dia um preço mais alto ao planeta. Mas há vozes otimistas: “Talvez essa seja a grande beleza de Glasgow, o despertar da sociedade civil para a agenda do clima”, avalia Claudio Angelo, do Observatório do Clima.

Enquanto o grupo de centenas de cientistas instou os negociadores da COP26 a reconhecer a mais recente ciência climática, comprometendo-se a “ações imediatas, fortes, rápidas, sustentadas e em larga escala”, o chefe das Nações Unidas expressou pessimismo quanto à possibilidade das negociações terminarem com um acordo que limite o aquecimento ao limiar-chave de 1,5°C. Segundo ele, o último relatório climático do IPCC “mostra inequivocamente a extensão das mudanças climáticas induzidas pelo homem”, acrescentando que “as emissões cumulativas de gases de efeito estufa até agora já comprometem nosso planeta a mudanças fundamentais do sistema climático que afeta a sociedade humana e os ecossistemas marinhos e terrestres, alguns dos quais são irreversíveis para as próximas gerações” ( Germanos, nov,11).

Aqueles que facilitaram as negociações em Glasgow advertiram que um acordo ainda era possível, com o secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, alertando as nações a não fazerem promessas “ocas” sobre o combate às mudanças climáticas, dizendo à conferência Cop26 que os anúncios feitos estão longe de ser suficientes.

O presidente da Cop26, Alok Sharma, disse que os delegados “não têm escolha a não ser forçar cada delegado “a fazer da cúpula climática um sucesso. A Cop26 pode ser estendida à medida que as críticas aumentam sobre compromissos insuficientes com relação aos combustíveis fósseis”.

Contudo, a ativista climática ugandense Vanessa Nakate alertou que o planeta estava “à beira do abismo” e que a ciência era “inequívoca” sobre a redução das emissões de carbono. Ela disse na conferência do clima que milhares de ativistas “não veem o sucesso que está sendo aplaudido” na cúpula. “Historicamente, a África é responsável por apenas 3% das emissões globais e ainda assim os africanos estão sofrendo alguns dos impactos mais brutais da crise climática. Mas, embora o sul global esteja na linha de frente da crise climática, ele não está nas primeiras páginas dos jornais mundiais” (BBC NEWS – Brasil, 2021).

Expressando seu ceticismo quanto às promessas feitas por líderes mundiais e empresas, ela disse: “Promessas não impedirão o sofrimento do povo, promessas não impedirão o planeta de se aquecer. Apenas ações imediatas e drásticas nos tirarão do abismo.” Segundo o filósofo e religioso Leonardo Boff, o Acordo de Paris de 2015 sobre a mitigação dos gases de efeito estufa, que dava alguma esperança, não foi observado. Ao contrário, a emissão cresceu 60%. A China é o maior emissor com 30,3%, seguida pelos USA com 14,4, os europeus com 6,8%. A deterioração foi generalizada (Boff, 2021). Também Patricia Espinosa, Secretária Executiva da ONU sobre Mudanças Climática, na abertura da COP26 alertou: “Estamos a caminho de um aumento de temperatura global de 2,7 graus quando deveríamos atingir a meta de 1,5 graus. Sabemos que com este nível de aquecimento, grande parte das espécies não conseguirão se adaptar e desaparecerão. Milhões de humanos pobres e vulneráveis estarão sob grave risco”.

Como nos disse Naomi Klein, não se trata de aquecimento global, mas de capitalismo. A mudança climática é causada pelo caráter do desenvolvimento social e econômico predatórios, produzido pela natureza da sociedade capitalista que se mostra insustentável, no que foi instrumentalizada para a busca irrefreável de minério, de petróleo, de terras, de água. Portanto, o problema não é o clima mas o capitalismo que não conhece uma ecologia ambiental e político-social, nem tem uma política à altura. O que foi recomendado na COP 26 foi o de reduzir os gases até 2030. E quando chegarmos lá, quais serão as prospectivas?

O pacote de decisões aprovado na tarde de sábado 13/11 por mais de 190 nações foi tido como imperfeito e com muito desconforto, por não conseguir a redução urgente de emissões de gases de efeito estufa em linha com o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global em 1,5o C neste século. A salvação do clima foi adiada mais uma vez, para 2022, quando o mundo volta a se reunir em Sharm el-Sheikh, no Egito, para avaliar metas mais ambiciosas para 2030. Mas quando ouvimos as vozes que veem das ruas, como as de Greta Thumberg, a coisa fica ainda pior: “Não é segredo que a COP26 é um fracasso. Deveria ser óbvio que não podemos resolver uma crise com os mesmos métodos que levaram ao início dessa crise”. Disse ainda: “Precisamos de cortes anuais imediatos e drásticos nas emissões como o mundo nunca viu antes”. E acrescentou que “as pessoas no poder podem continuar a viver em sua bolha cheia de fantasias, como o crescimento eterno em um planeta finito e soluções tecnológicas que aparecerão de repente do nada e apagarão todas essas crises em um piscar de olhos” (BBC NEWS Brasil).

O Observatório do Clima (Planeles et al. 2021) resume bem alguns dos resultados, criticados duramente pelos ativistas, como o fracasso em Glasgow em assegurar financiamento consistente dos países ricos para os países em desenvolvimento. Por influência principalmente dos ricos, a proposta de criar um mecanismo de financiamento expresso para as perdas e danos sofridas por nações vulneráveis por conta de impactos climáticos foi descartada. O que deveria ser um mecanismo virou um “diálogo”.

A representante das Maldivas, na plenária de apresentação do texto final, resumiu a questão: “Quero notar que o que é equilibrado e pragmático para outras partes não vai ajudar as Maldivas a se adaptar a tempo (…). Enquanto reconhecemos o alicerce que este resultado provê, por favor façam-nos a cortesia de reconhecer que ele não traz esperança aos nossos corações, mas serve como uma conversa na qual nós colocamos nossos lares em risco enquanto aqueles que têm opções decidem o quão rápido

eles querem ajudar a salvar aqueles que não têm”. Ela também traduziu em tempo a tarefa gigantesca que o processo multilateral da Convenção do Clima tem diante de si: guiar o mundo para reduzir as emissões pela metade em apenas 98 meses.

Um Fracasso - Estima-se que os países africanos já gastem por ano 10% de seu PIB com impactos de eventos climáticos extremos. A sucessão extraordinária de eventos extremos em 2021 mostrou que não pode haver mais adiamento na criação de um instrumento que permita aos países vulneráveis acessar imediatamente recursos sem se endividar para ações de proteção, prevenção e reconstrução. Os países desenvolvidos não aceitaram.

Sobre as mitigações necessárias, a COP 26 reconhece que: 1.as emissões terão de cair 45% em 2030 em relação a 2010 e para zero líquido “por volta do meio do século” para estabilizar o aquecimento global. 2. Decide estabelecer um plano de trabalho para acelerar a ambição da mitigação e da implementação nesta década, a ser adotado na COP27, em 2022. 3.Requerer às partes que atualizem e reforcem até o fim de 2022 suas metas nacionais (NDCs) para 2030 de forma a alinhá-las com a meta de estabilização do Acordo de Paris. 4. Propõe a realização de reuniões ministeriais anuais para tratar de ambição pré2030 — a partir da COP27. 5. Exorta as partes a “acelerar os esforços” para reduzir gradativamente (phase down) o carvão mineral “sem abatimento” e os “subsídios ineficazes” a combustíveis fósseis.

Com relação ás florestas e ao

metano, duas novidades da COP26 foram os acordos, assinados logo na primeira semana, para reduzir as emissões globais de metano em 30% em 2030 em relação a 2020 e para zerar e reverter a perda de florestas no mundo até 2030. São objetivos externos à negociação, mas que podem dar um impulso importante para o cumprimento das metas de Paris. O acordo sobre florestas é especialmente importante para o Brasil, que em 2020 tinha 46% de suas emissões advindas de desmatamento. Mesmo que o atual governo brasileiro não tenha intenção de cumpri-lo, os três principais compradores de commodities do Brasil — China, Estados Unidos e União Europeia — aderiram ao pacto, e a China anunciou que considerará a legislação para barrar importações de produtos advindos de desmatamento.

No tocante ao Financiamento, o documento “Nota com profundo pesar” que os países ricos não cumpriram a meta de mobilizar US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020 para bancar adaptação e mitigação nos países em desenvolvimento. Exorta os países ricos a prover clareza sobre a entrega e a cumpri-la com urgência até 2025. Decidiu ainda estabelecer um programa de trabalho entre 2022 e 2024 para estabelecer a meta de financiamento climático que valerá após 2025 e que, segundo o Acordo de Paris, terá de ser

substancialmente maior que US$ 100 bilhões por ano.

Para concluir é preciso registrar as constrangedoras cenas produzidas pelo Ministério do Meio Ambiente do Brasil quando, além de buscar “tapar o sol com peneira” sobre a destruição da Amazônia, o assassinato dos indígenas, alugou um amplo pavilhão, com patrocínio da indústria, para mostrar o que chamava de “Brasil real”, credenciando um grande número de representantes dos lobbies do agronegócio (9) e da indústria (6), além de 25 empresários ou executivos de empresas. Não convenceu muita gente, a julgar pelo pavilhão pouco movimentado. Sem contar que um funcionário do Ministério do Meio Ambiente, no perfeito estilo Bolsonaro, protagonizou uma das cenas mais revoltantes da COP ao agredir verbalmente a estudante de direito Txai Suruí, única voz brasileira na Cúpula de Líderes no dia 1o/11, que denunciou as ameaças aos povos indígenas no país. Finalmente, dizer que o Brasil cortou 93% da verba para pesquisa em mudanças climáticas.

Referências

BOFF, Leonardo, A COP26 não respondeu à emergência climática https://leonardoboff.org/2021/11/11/a-cop26-nao-respondeu-a-emergencia-climatica/

BBC NEWS – Brasil, “Greta Thunberg e COP26: as duras críticas da jovem ativista à cúpula sobre mudanças climáticas”, https://www.bbc. com/portuguese/internacional-59190477 , 6 novembro 2021 Acessado em 14/11/2021

Germanos, Andréa, “200+ Global Scientists Say Urgent and ‘Large-Scale Actions’ Mandatory to Keep 1.5°C Goal Alive”. In:https://www.commondreams.org/news/2021/11/11/200-global-scientists-say-urgent-and-large-scale-actions-mandatory-keep-15degc-goal nov. 11/2021

Observatório do Clima, “Glasgow adia novamente a salvação do clima”. in:https://www.oc.eco. br/glasgow-adia-novamente-a-salvacao-do-clima/ 13.11.2021, Acessado em 15/11.

PLANELLES, MANUEL / ÁLVAREZ, CLEMENTE “Balance de la cumbre de Glasgow”, in El País, https://elpais.com/autor/manuel-planelles/ Acessado em 14/11/2021

Marcos Costa Lima é Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade

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