Ano XIII • N.º 45 • 22 de dezembro a 21 de março de 2014
3 euros
IVA incluído
Portfolio ZONAS HÚMIDAS
Portfolio World Wetlands Day
Retratos Naturais VAMOS DESENHAR
Natural Portraits Let's Draw
Entrevista ENTRE A ARQUEOLOGIA E A BOTÂNICA
Interview Between Archaeology and Botany
ACIDENTES RODOVIÁRIOS + FOTONOTÍCIAS + PARQUES DE GAIA QUINTEIRO + ESTAÇÃO LITORAL DA AGUDA + O VOO DAS AVES
EDITORIAL 3
Nuno Gomes Oliveira
Diretor da revista “Parques e Vida Selvagem”
O inverno O inverno 2013/2014 foi particularmente duro para o Homem e para a Natureza m 24 de dezembro, fortes chuvas e ventos provocaram cheias e o derrube de inúmeras árvores, um pouco por todo o lado. O “Diário Digital” desse dia dizia em título: “Sapadores de Porto e Gaia registaram cerca de 40 ocorrências”. Chuva prolongada e solos saturados de água fizeram ceder, à força do vento, a capacidade do solo “segurar” os sistemas radiculares e garantir sustentabilidade às árvores. Mas não foi só no litoral que o inverno causou moça: o “Jornal de Notícias” de 26/12/2013 registava em título: “Incêndio de verão devastou vegetação que retinha a água – Fogo do Caramulo “inundou” Águeda”. E a jornalista Salomé Filipe explicava: “Mais de 30 lojas e casas foram inundadas, na Baixa de Águeda, pela subida do rio. Foi uma noite de Natal em desespero, naquelas que foram as piores cheias desde 2001. O fogo no Caramulo foi o culpado.” Finalmente alguém deu conta do papel insubstituível da vegetação nas encostas, na luta contra a erosão e no favorecimento da infiltração das águas das chuvas, não as deixando correr livres e lamacentas, como aconteceu em Águeda e em muitos mais locais. Mas, a propósito: já se começou a reflorestar “a sério” o que ardeu no verão de 2013? Se começou não foi notícia! Notícia, sim, foi a que teve o seguinte título: “Floresta está sob a ameaça das pragas, do calor e da incúria” (O Público, 09/02/2014). A notícia explica que: “A devastação dos incêndios das duas últimas décadas e o aumento dos ataques de pragas e
E
doenças podem ser apenas um prenúncio dos perigos que ameaçam a floresta. O aumento do calor é, a prazo, o risco maior. Mas no imediato o que mais compromete a sustentabilidade dos espaços florestais é o abandono e a falta de gestão.” A habitual falta de previsão e incúria nacional... Em 5 e 6 de janeiro, e semanas seguintes, o mar, em grande agitação, causou elevados prejuízos na costa arenosa portuguesa; mas a culpa foi do mar? Não, claramente não! Todos sabemos que a linha de costa não é fixa, antes varia sazonalmente e, em prazos mais alargados, por ação de fatores naturais conjugados, nos tempos modernos, com fatores antropogénicos; quer dizer, todos sabem, ou deveriam saber, mas esqueceram-se! Instalaram-se equipamentos (legais!), desde bares
e restaurantes, a casas e hotéis, passando por passadiços e ciclovias em locais “sequinhos” no verão, mas na realidade em plena zona de rebentação de inverno e, agora, a culpa é do mar! Uma janela de esperança foi aberta pelo Ministro do Ambiente, Eng.º Jorge Moreira da Silva, em 25/02/2014, quando anunciou, para além de verbas para apoio à necessária recuperação da costa, a nomeação do Professor Filipe Duarte Santos para coordenar a avaliação da Estratégia de Gestão Integrada da Zona Costeira. “Achei relevante que Filipe Duarte Santos, um dos maiores especialistas mundiais em alterações climáticas, pudesse coordenar uma equipa que não deve apenas olhar para a questão hidrológica e hidrográfica, para a questão do ordenamento do território, mas também para a relação das alterações climáticas com o litoral”, justificou, e muito bem, o Ministro Jorge Moreira da Silva. É objetivo do Ministro do Ambiente que a revisão da Estratégia de Gestão Integrada da Zona Costeira seja tida em conta nos «novos planos de ordenamento da orla costeira, que entrarão em revisão em 2014/2015 e
T Litoral de Gaia
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4 EDITORIAL
ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS Apesar de todos os indícios, ainda há quem duvide do efeito das alterações climáticas e não queira prever as suas consequências; “Nunca vi um inverno assim”, dizia há dias um cidadão numa reportagem televisiva; pois não! À cautela, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, propôs em 14/11/2013 (“Diário da República”, 1.ª série, n.º 254, de 18/12/2013) à Assembleia da República a adoção de uma “Estratégia Nacional para a prevenção e controlo de epidemias da febre do dengue” justificando do seguinte modo: “A febre do dengue figura entre algumas das doenças que poderão ser consideradas emergentes no continente europeu. Num contexto de alterações climáticas e de intensificação dos fluxos intercontinentais de pessoas e de mercadorias, aumentam as
4 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
S Árvores caídas – Escola de Balteiros (Vilar de Andorinho), fevereiro de 2014
possibilidades de chegada ao continente europeu de diversos serótipos do vírus da febre do dengue e de mosquitos vetores. Na Europa existem já situações relativas à febre do dengue e, em Portugal, até ao momento com um surto que se circunscreve à ilha da Madeira, terá sido identificado até à data apenas um dos quatro serótipos do vírus da febre do dengue, sendo o mosquito vetor o Aedes aegypti.” Se, por cá, e para já, são chuvas e ventos, na Austrália é o calor. Em janeiro, uma onda de calor matou mais de 100 mil morcegos no Sudoeste de Queensland, em cinco colónias, causando sérios prejuízos ao ecossistema.
ALGUMAS NOTÍCIAS DA FAUNA E DA FLORA Mas no meio de todas estas “desgraças”, vão aparecendo boas notícias. Os investigadores do Museu Emílio Goeldi, em Belém do Pará (Brasil), acabam de identificar 169 novas espécies de fauna e flora na Amazónia. Entre as descobertas estão 14 plantas e 155 animais, sendo a maioria (112) aracnídeos. Há ainda 12 espécies de peixes, 10 de aves, 10 de anfíbios, 6 de répteis, 4 de dípteros (grupo Mico rondoni
Ibama/Divulgação
que vão definir os termos de referência para os novos Planos de Ação do Litoral (PAL)». O Professor Filipe Duarte Santos esteve no Parque Biológico de Gaia, em 2/4/2005, a fazer uma palestra sobre a seca e as alterações climáticas, numa altura – quase dez anos volvidos – em que já se temiam e previam muitas das coisas que agora estão a acontecer. Mas mesmo estes temporais de janeiro, e os milhões de euros de prejuízos causados, não serviram de aviso; em 30/01/2014 o “Jornal de Notícias” dava conta que um “Hotel vai ser construído em cima da praia”, e informava: “Um hotel especializado em terapias com água do mar vai ser construído em cima da praia de Labruge, Vila do Conde. [...] Um motivo de «orgulho» para Alberto Gomes, um «pequeno empresário» [um “pequeno” investimento de 8 milhões de euros] do ramo da imobiliária, que vai embarcar na «aventura» de construir «num terreno em cima do mar um hotel que apenas terá pela frente a linha do horizonte». Que é uma aventura, não temos dúvidas, que terá pela frente a linha do horizonte, também acreditamos, só esperamos que, quando começar a ruir, não tenha por trás o dinheiro dos contribuintes.
dos mosquitos e moscas) e um mamífero – um pequeno primata. O zoólogo Alexandre Bonaldo destaca o novo macaquinho, o Mico rondoni, que, como o nome dá a entender, existe somente na Rondônia, na área entre os rios Mamoré, Madeira e Ji-Paraná. Durante muito tempo foi confundido com uma outra espécie, o Mico emiliae, que ocorre no Pará. A nova espécie, ainda mal descoberta, já está ameaçada de extinção pelo intenso abate de florestas, em especial na envolvência da estrada nacional BR-364, que liga São Paulo ao Estado do Acre, bem no interior do Brasil. Mas por incrível que pareça descobrir no século XXI novos animais de dimensões apreciáveis, o certo é que a equipa do biólogo Eduardo Eizirik, do Laboratório de Biologia Genômica e Molecular da Universidade Católica do Rio Grande do Sul, descobriu recentemente uma nova espécie de felino no Sul do Brasil, o Leopardus guttulus. Foram os estudos genéticos que permitiram distinguir este gato-do-mato da espécie Leopardus tigrinus que habita o Nordeste. Em França, Franck Courchamp, investigador do Laboratório de Ecologia Sistemática e Evolução da Universidade de Paris-Sul, veio dizer-nos que classificar uma espécie como “rara” acelera a sua extinção. Franck Courchamp e a sua equipa realizaram uma experiência reveladora. Em chiques banquetes parisienses ofereceram aos convidados de altas classes socioprofissionais o mesmo caviar* apresentado sob dois nomes diferentes: “raro” e “comum”. Resultado: mesmo antes de provar, 54% dos entrevistados indicaram uma preferência pelo “raro”. Depois de provarem, a percentagem subiu para 70%. A experiência foi repetida em supermercados da região de Paris, Les Ulis, Massy, Arcueil. Mais uma vez, 52% dos provadores preferiram o “raro” antes de consumirem, e 72% depois de o terem degustado... Em 03/11/2013 o “Jornal de Notícias” dava conta de “Mais de mil acidentes provocados por animais” em Portugal, na sua maioria por cães, mas também por animais selvagens como javalis, raposas, cegonhas, corujas ou texugos.
Na realidade, só na área de policiamento da GNR foram registados 1799 sinistros em 2013. O Major Rogério Copeto, do SEPNA (Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente) da GNR, autor desse estudo, revela-nos mas detalhes nesta revista (págs. 64 a 66). Trata-se, obviamente de um problema com duas origens: no caso dos animais domésticos, más condições de contenção e, no caso dos selvagens, a fragmentação dos habitats naturais, uma das principais causas de redução da biodiversidade. S Cheias no rio Febros
A PRIMAVERA A CHEGAR Passadas as maiores chuvadas, começa a primavera a insinuar-se; os salgueiros e sabugueiros já estão cobertos de folhas novas, as azedas (Oxalis pes-caprae) já abriram as suas flores amarelas, já cantam os ralos (Gryllotalpa gryllotalpa) e regressou, em 07/03/2014, de África, onde passou o inverno, o simpático casal de Milhafre-preto (Milvus migrans) que há dois anos nidifica com sucesso no Parque Biológico de Gaia; de imediato começou a preparar o ninho, embora anda existam dois grandes eucaliptos do Parque. As garças-boieiras (Bubulcus ibis) e as garças-noturnas (Nycticorax nycticorax) selvagens que se fixaram no Parque Biológico já estão a nidificar e a Garçareal (Ardea cinerea) voltou a ocupar posição no carvalho onde, no ano anterior, tentou nidificar sem sucesso. Por todo o lado, chapins-reais, chapinsrabilongos, chapins-carvoeiros, chapins-azuis, carriças, pegas, melros, toutinegras-de-barrete-preto, pombos-
torcazes e muitas outras aves afadigamse a procurar local para o ninho ou, mesmo, já a fazê-lo. Março é, também, altura de visitar o Parque da Quinta do Conde das Devesas, cuja coleção de 118 variedades de camélias começa, agora, a exibir todo o seu esplendor. Como também é época de ir com o binóculo (se não tem, lá há) até à
Reserva Natural Local do Estuário do Douro, onde as aves migradoras mais atrasadas voam de regresso ao Norte e as residentes começam a preparar a nidificação. É um novo ciclo de vida que começa, indiferente ao inverno duro e às alterações climáticas. Nuno Gomes Oliveira
* O caviar é uma conserva gourmet feita com ovas de esturjão, nome comum usado para designar as espécies de peixes da família Acipenseridae, a maioria das quais está num estado de conservação vulnerável, em perigo ou em perigo crítico. Faz-se caviar de quase todas as espécies de esturjão, embora o mais caro (mais de 12 mil euros o kg) seja o caviar de esturjão-beluga (Huso huso), peixe que vive nos mares Cáspio e Negro e no rio Volga, e pode atingir nove metros de comprimento. O esturjão ou solho, da espécie Acipenser sturio, já existiu em Portugal, nas bacias do Douro e Guadiana, onde vinha desovar; o último entrou no Guadiana na década de 1980. A designação «caviar» pode igualmente ser utilizada para ovas de outras espécies de esturjão selvagem ou para ovas de esturjões criados em aquacultura; sucedâneos são preparados com ovas de salmão, de truta, de lumpo, etc. Em 2011 foi iniciado um projeto de aquacultura de esturjão junto ao rio Arade, no Algarve, tendo em vista a comercialização de caviar a partir de 2015.
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6 CARTOON Por Ernesto Brochado
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6 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
OPINIÃO 7
Eduardo Vítor Rodrigues Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia
O conceito de Natureza não foi sempre o mesmo á vários momentos da História da humanidade que marcam linhas de charneira na passagem entre diferentes conceitos de Natureza, a começar pela descoberta e posterior domínio do Fogo, que veio a transformar radicalmente a nossa relação com a matéria, prosseguindo no aparecimento da agricultura, no consequente declínio dos povos nómadas e na afirmação do sedentarismo enquanto manifestação primeira do impulso civilizador do Homem e do exercício de um poder, ou, pelo menos, da ilusão dele, sobre os restantes reinos da Natureza. Nos primeiros séculos da civilização grega, por exemplo, a realidade imediata e tangível do mundo exterior era uma fonte inesgotável de estímulos, cuja experiência e percepção esgotavam, por assim dizer, a capacidade de absorção dos sentidos humanos. O conceito de Physis, dominante até Sócrates, traduzia uma plenitude sensorial resultante da vivência fundada na continuidade ontológica entre o Homem e o seu meio ambiente, não permitindo que se criassem as distinções entre mente e matéria que mais tarde viriam a dominar por completo o pensamento científico. No momento da História em que à Physis grega sucedeu a Natura romana, um património filosófico inestimável perdeu-se com a verdade etimológica e simbólica, e um outro mundo, completamente novo, começou a nascer. Platão é já um dos fundadores desse novo Cosmos, uma nova Ordem que veicula a cisão primordial entre mente e matéria que viria, mais tarde, a constituir a base de toda a Ciência Positiva. A visão do mundo e o sistema de valores nos quais assenta hoje a chamada civilização ocidental, tem a sua origem mais próxima nos séculos XVI e XVII. O grande desenvolvimento
H
O conceito que temos de Natureza não foi sempre o mesmo. Ele tem variado ao longo dos tempos e dos lugares, espelhando essa variação não só a diversidade de culturas e de civilizações que foram progredindo sobre o nosso planeta, mas também as transformações que se foram operando sobre o próprio Pensamento humano, no processo evolutivo da sua experiência no mundo das Ciências da Natureza que por essa altura se deu foi precedido e acompanhado pela transformação de ideias e conceitos filosóficos intimamente ligados às bases da Ciência. O cogito cartesiano passou a privilegiar a mente em relação à matéria e, mais do que isso, estabeleceu definitivamente a separação entre ambas. Descartes baseou
o seu conceito de Natureza na divisão fundamental entre dois domínios distintos, separados e independentes: o domínio da mente, conhecido por res cogintans, e o da matéria, a res extensa. Enquanto a filosofia grega procurou a Ordem na infinita variedade dos fenómenos através de princípios unificadores fundamentais, Descartes tentou estabelecer essa Ordem através de uma divisão triangular da Unidade, cujos vértices eram Deus, o Mundo e o Homem, perdendo cada uma dessas entidades a sua essência significante quando considerada per si, separada das outras. Descartes não conferiu, na verdade, uma nova direcção ao pensamento humano, tendo-se limitado a sistematizar num método filosófico próprio, uma tendência que já se verificava desde a Renascença e da Reforma Protestante. Influenciando a estrutura conceptual da Ciência do século XVII, esta noção cartesiana de Natureza é a de uma máquina perfeita, dirigida por leis matemáticas exactas e imutáveis. Seria, contudo, Newton, nascido em 1642, quem viria a conferir realidade ao sonho do filósofo francês, completando a revolução científica que instituiria um modelo mecanicista e matemático da Natureza, sintetizando de forma completa as obras de Copérnico, Kepler, Bacon, Galileu e do próprio Descartes. Hoje vivemos o apogeu do modelo cartesiano do mundo. Longe da gramática discreta da Physis grega, que nos ensinava a unidade primordial de tudo e nos integrava de modo harmonioso no conjunto infindo de fenómenos e movimentos vitais que toma o nome de Natureza.
Parques e Vida Selvagem inverno 2014 • 7
Na produção desta revista, ao utilizar um papel com 60% de fibras recicladas (Satimat Green) em vez de um papel não reciclado, o impacto ambiental foi reduzido em:
Inverno 2013/2014
1762
kg de aterro
159
litros de água
1590
kg de CO2 (gases de efeito de estufa)
38170
kWh de energia
3804
kg de madeira
2863
km de viagem num automóvel europeu de consumo médio
FICHA TÉCNICA Revista “Parques e Vida Selvagem” Diretor Nuno Gomes Oliveira Editor Parque Biológico de Gaia Coordenador da Redação Jorge Gomes Fotografias Arquivo Fotográfico do Parque Biológico de Gaia Propriedade Águas e Parque Biológico de Gaia, EEM Pessoa coletiva 504763202 Tiragem 10 000 exemplares ISSN 1645-2607 N.º Registo no I. C. S. 123937 Dep. Legal 170787/01 Administração e Redação Parque Biológico de Gaia Rua da Cunha • 4430-681 Avintes Portugal Telefone 227878120 E-mail: revista@parquebiologico.pt Internet http://www.parquebiologico.pt Conselho de Administração Serafim Silva Martins Presidente executivo
Tiago Filipe Costa Braga Vogal executivo
José Manuel Dias da Fonseca Vogal não executivo
www.facebook.com/parquesevidaselvagem
Capa: Reserva Natural Local do Estuário do Douro, por João Luís Teixeira
8 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
28 57
64
60 SECÇÕES 6
Cartoon
portfolio
10
Ver e falar
12
Fotonotícias
24
Quinteiro
28
Dunas
51 ENTRE A BOTÂNICA
35
Espaços verdes
E A ARQUEOLOGIA
44
Recuperar
entrevista
48
Voo das aves
A arqueobotânica cativou João Pedro Tereso: investigador do CIBIO da Universidade do Porto, tem um particular interesse pelas dinâmicas da utilização humana do território nos últimos três mil anos no Noroeste da Península Ibérica.
57
Reportagem
68
Migrações
72
Atualidade
77
Crónica
82
Coletivismo
Júlio Daniel Santos
14 ZONAS HÚMIDAS Em 2 de fevereiro celebra-se em todo o mundo o Dia Mundial das Zonas Húmidas: em plena Década da Biodiversidade, preconizada pelas Nações Unidas, esta data ganha outro fôlego.
70 VAMOS DESENHAR
UMA BORBOLETA retratos naturais
Para criar uma ilustração científica torna-se imperativo educar o olhar e o modo de ver não só do sujeito que desenha como também do que lê as imagens, para depois se reaprender a observar. Esta secção é preenchida por Fernando Correia que dá continuidade à rubrica.
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10 VER E FALAR
Dizem os
leitores
A revista anterior saiu e os leitores enviam as suas mensagens... i
Vítor Carvalho
Revistas anteriores
É venenosa? Decerto com alguma preocupação, pergunta por e-mail Vítor Carvalho: «Apareceu-me um dia destes uma cobra num terreno de familiares, na Régua – aparentemente está "instalada" junto à casa. Seria possível informarem-me sobre a espécie em causa, se é venenosa ou de algum modo pode ser perigosa para as pessoas? Junto remeto foto, para identificação». Explicou-se que se trata de uma cobra-de-ferradura adulta, não possui glândulas produtoras de veneno, pelo que não representa perigo para o ser humano. Esta serpente pode atingir quase dois metros de comprimento, sendo protegida pelo Anexo II da Convenção de Berna. Alimenta-se de ratos, pequenas aves e répteis. O nome vulgar faz sentido pelo desenho que lembra uma ferradura
10 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
suscetível de ser visto na parte superior da cabeça. O comportamento normal desta cobra é o de fugir e esconder-se quando se apercebe da presença do ser humano na proximidade.
Artigos de Jorge Paiva Ane Bartlett, dos lados de Coimbra, em Loure, escreve: «Sou leitora da vossa revista desde há alguns anos e gosto muito. Não posso perder os artigos do Professor Jorge Paiva! Mas não acho o novo formato necessariamente melhor. É muito pesado — não dá para levar na mochila para ler enquanto espero pelo comboio! Pior, as páginas facilmente saem. E as fotos são boas neste papel mas quando atravessa duas páginas não é tão fácil ver a parte do meio sem descolar as folhas. Também gostava
Os pedidos de leitores no sentido de conseguirem adquirir também revistas mais antigas continuam a chegar. Como entretanto já não há exemplares em armazém para atender a essas solicitações, a alternativa de reunir uma coleção completa recai na internet: basta ir ao site www.parquebiologico.pt, procurar Recursos e aí Revistas — todas as anteriores edições da revista «Parques e Vida Selvagem» estão ali disponíveis.
de saber se o papel e o tratamento dele é tudo ecológico e de papel reciclado». Esta opinião também é importante e, como estamos atentos, já resolvemos o problema de encadernação da revista: agora em vez de prensada com cola é cosida. Na verdade, ainda não tínhamos recebido uma mensagem que não fosse no sentido de o novo formato da revista estar muito melhor, mas retemos este ponto de vista, que agradecemos. Contudo, percebe-se que se o formato fosse menor que o atual A4 a leitura agradável e atraente que a revista proporciona aos leitores tornar-se-ia acanhada. De resto, também por cá há quem use uma pequena mochila e a revista cabe lá dentro sem qualquer problema. Quanto ao papel utilizado na revista, se consultar qualquer uma destas últimas edições, próximo da ficha técnica verificará que se utiliza papel reciclado, certificado, proveniente de fontes responsáveis.
No verĂŁo passado, Fernanda Nogueira, apĂłs visitar o Parque BiolĂłgico de Gaia, enviou estas linhas manuscritas: ÂŤFui com a minha neta Maria Clara levar aĂ uma gaivota pequena que nĂŁo voava ainda e que ďŹ cou com o n.Âş 13302; aproveitĂĄmos para revisitar o Parque mais uma vez. Vimos os burros a quem ďŹ zemos festas, os cavalos bem bonitos. Com muita sorte vimos o toirĂŁo a espreguiçar-se, o caimĂŁo sĂł Ă segunda vez o vimos, todo azul, lindo. O bisonteeuropeu, corpulento, de pĂŞlo castanho. LĂĄ no alto, no meio de grandes pedras, cabras-bravas com enormes armaduras. AtrĂĄs duma ĂĄrvore um esquilo a espreitar. Grupos de gamos e corços a correr e a saltar. No gaiolĂŁo dos milhafres e dos milhanos, um milhafre todo encharcado, apĂłs ter tomado banho e uma fĂŞmea no choco, no ninho. Lamentamos o bufo que fora atingido, numa asa, por uma bala e nĂŁo pode ser solto em liberdade. Adoramos a quinta de Santo Tusso, e as suas aves de capoeira e as hortĂcolas. Na exposição de alfaias, a minha neta riu-se com o “homemâ€? a dormir na cama‌ completo! A Maria Clara encantou-se com a exposição “Vida na Terraâ€? de tal forma que a vimos Ă ida e Ă volta. Gostou imenso de todos os outros bichos, e sĂŁo tantos!... E de todas as ĂĄrvores e de conhecer os seus nomes.
JoĂŁo L. Teixeira
Passeio no Parque
CaimĂŁo ĂŠ um dos nomes vulgares desta ave aquĂĄtica
Foi um passeio maravilhoso, um contacto tĂŁo direto com a Natureza, que nos empolga e nĂŁo se esquece! ParabĂŠns Parque BiolĂłgico! NĂŁo me importava nada de trabalhar nesse mundo fantĂĄstico de animais e plantas‌ No meu pequeno jardim e quintal tenho algumas ĂĄrvores, aonde nidiďŹ cam melros, rolas e pardais, todos os anos; neste, os melros tiveram vĂĄrias ninhadas. Em cima da garagem tĂŞm sempre ĂĄgua limpa e comida. É o meu pequeno contributo para o bem-estar dos animais, que adoro. Na biblioteca arranjei exemplares da vossa revista, que jĂĄ li e reli. Tenho pena de nĂŁo poder tĂŞ-las todas, pois sĂŁo uma excelente enciclopĂŠdia sobre a natureza. Os meus sinceros parabĂŠns ao sr. diretor Nuno Gomes Oliveira, pelo seu belo trabalho. Continue sempre sem desânimo. A minha neta tambĂŠm quer escrever umas palavrinhas: “Gostei muito, mas mesmo muito, de ter ido outra vez ao Parque. Adorei o Parque BiolĂłgico e aprendi muito com ele. Irei voltar lĂĄ mais vezes. Vou fazer 9 anos em agosto e queria ser biĂłloga ou exploradoraâ€?. Mais uma vez parabĂŠns e muito obrigada por tudo o que tem feito e continua a fazer no nosso Parque BiolĂłgico e nĂŁo sĂł. Bem-haja! Os meus agradecimentos a todos os que mantĂŞm o Parque impecĂĄvelÂť.
De segunda a sexta-feira
Aqu
das 10h00 Ă s 12h30 e das 14h00 Ă s 18h00
SĂĄbados, domingos e feriados das 10h00 Ă s 18h00
1SBJB EB "HVEB t 7JMB /PWB EF (BJB E 7FOIB WJTJUBS OPT Parques e Vida Selvagem inverno 2014 • 11
12 FOTONOTÍCIAS
Solde
inverno
Mordem as temperaturas baixas! É por isso que os animais ditos de sangue-frio as evitam. Um mergulho letárgico numa toca vem a jeito mas, numa série de casos, os mais ousados não desdenham espreitar o sol em hora de feição. Entre répteis, mais conhecidas são as sardaniscas, nomeadamente as que levam o nome Podarcis bocagei. Nos muros do Parque Biológico de Gaia são
12 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
Jorge Gomes
Um meio-dia mais confortável
João L. Teixeira
João L. Teixeira
A saltinhos de pardal a duração do período de luz solar aumenta, dia após dia: nesta estação do ano os animais que dependem muito da temperatura exterior para funcionarem sem problemas variam bastante entre si
S Sardanisca-de-bocage, endémica do Noroeste peninsular
S Uma malhadinha a aquecer em pleno inverno
as que mais abundam, sendo raras ou inexistentes até na maior parte do país e do planeta Terra! Outrora frequentes e abundantes em todo o Noroeste da Península Ibérica, com a destruição de habitats ficaram sitiadas em ilhas, à espera de melhores dias. Entre insetos, há que tirar o chapéu à malhadinha, Pararge aegeria. Quando o sol ensaia a utopia do seu calor invernal, abre asas como painéis solares e
aquece, até que um par de horas depois regressa a abrigo discreto, invisível, onde se guarda do frio e sonha com as brisas de primavera. Não são ambos casos únicos no nosso inverno, mas talvez se possa contar pelos dedos das mãos outras espécies tão corajosas. Entre bátegas e vento, lembram que há nuvens passageiras e que a cada passo o calendário traz dias sempre a crescer.
A água e o fogo
João L. Teixeira
João L. Teixeira
João L. Teixeira
As plantas são tão importantes para a terra como a pele é essencial ao corpo humano. Os incêndios sucessivos do estio passado deixam agora mais uma parcela da sua marca: as inundações junto de cidades no caminho da água da chuva para o mar. Os incêndios estivais da serra do Caramulo, de que resultaram várias vítimas mortais, fizeram de Águeda um palco de tragédia este inverno. É que as raízes dos bosques são os dedos da natureza que agarram a terra e a água, soltando esta por ribeiros e fontes vagarosamente, como uma esponja, ao longo do ano. Quando o fogo consome a vegetação, a terra fica exposta à erosão. Em vertentes inclinadas à chuva rapidamente o solo escorrega para os rios. Ali, sufoca por excesso de nutrientes micro e macrorganismos que zelariam pela qualidade do precioso líquido. A máquina ecossistémica encrava, e a água não demora a chegar ao mar. A terra seca. A vida padece. A diversidade biológica é também o chão vivo de que depende o ser humano. A água pode ser nossa amiga, mas sem o freio da terra vestida de vegetação, torna-se destrutiva.
Ranúnculos e prímulas Este ano, em janeiro, os primeiros ranúnculos a florir anteciparam-se a violetasbravas e a prímulas. Não parece que estas plantas, Ranunculus ficaria, com folhas verdes em forma de coração, tenham ficado ressabiadas por lhes chamarem ervas-das-hemorróidas, mas a verdade é que próximo das margens do rio Febros elas deram primeiro e em quantidade corolas amarelas!
Testemunho disso, além de fotografias datadas, dariam as diversas moscas polinizadoras, se falassem. As violetas, com pequenas folhas não roxas mas verdes de inveja, assim que se aperceberam da façanha, fizeram uma perninha e deitaram pétalas a eito. Mais tarde, por força do género de nome latino, as prímulas deram um ar de sua graça, já o mês ia a meio.
Antes que amieiros e carvalhos acordem do torpor e se apressem a deitar uma opaca folhagem que retém a chegada da luz ao chão, estas pequenas plantas abrem-se ao sol, brilham à luz, para que as suas flores atraiam obreiros alados, sempre prontos a colaborar para que haja mais e mais sementes...
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14 PORTFOLIO
Zonas húmidas Em 2 de fevereiro celebra-se o Dia Mundial das Zonas Húmidas: na Década da Biodiversidade, preconizada pelas Nações Unidas, esta data ganha outro fôlego onas húmidas são «zonas de pântano, charco, turfeira ou água, natural ou artificial, permanente ou temporária, com água estagnada ou corrente, doce, salobra ou salgada, incluindo águas marinhas cuja profundidade na maré baixa não exceda os seis metros». Reunindo habitats extremamente produtivos, tais como estuários, lagoas costeiras, ribeiros, cervunais e afins, este dia mundial evoca a Convenção de Ramsar, um documento assinado no Irão, precisamente na cidade que leva esse nome, a 2 de fevereiro de 1971. Está em vigor desde 1975. Esta convenção tem a particularidade de ser considerada o primeiro tratado intergovernamental a fornecer uma base estrutural para a cooperação internacional e ação nacional no sentido da conservação e uso sustentável dos recursos naturais, em concreto, das zonas húmidas e dos seus recursos. Hoje agrega centena e meia de países signatários de todos os continentes. Engloba ainda cerca de 1600 sítios de importância internacional e estende-se ao longo de cerca de 134 milhões de hectares de zonas húmidas. Com base no contributo de vários concorrentes do concurso nacional de fotografia PARQUES E VIDA SELVAGEM do ano passado, oferecemos-lhe esta amostra de valor acrescentado.
Z
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BANDO DE ÍBIS-PRETA, SALREU de Maria Augusta Pinto
IMPAR 15
World Wetlands Day Wetlands have to be recognized by all sectors of society as our natural infrastructure essential for the sustainable provision of water and other ecosystem services, on which everyone’s livelihood ultimately depends. Decision-makers need a better understanding of the value of wetland services when they face difficult decisions on trade-offs between maintaining wetlands and changing land and water uses.
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16 PORTFOLIO
RÃ-IBÉRICA, GERÊS de Mariana Vasconcelos
RELA, PORTALEGRE de Modesto Viegas
AÇUDE de Carlos Figueiredo
RIO FEBROS, PARQUE BIOLÓGICO DE GAIA de José Manuel Melim
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TRITÃO-DE-VENTRE-LARANJA, ENDÉMICO DA PENÍNSULA
A IBÉRICA de Júlio Daniel Santos
LIBÉLULA, OVAR de Romão Machado
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18 PORTFOLIO
GUARDA-RIOS, PARQUE BIOLÓGICO DE GAIA de Patrícia e Luís
MERGULHÃO-ANÃO, ESPOSENDE de Sérgio Esteves
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SERRA DA ESTRELA de João Luís Teixeira
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PATO-REAL de Luís Pinheiro Torres
GARÇA-BRANCA-PEQUENA, SAPAL DA RESERVA NATURAL LOCAL DO ESTUÁRIO DO DOURO de Luís Pinheiro Torres
CORVO-MARINHO de Hugo Amador
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RESERVA NATURAL LOCAL DO ESTUÁRIO DO DOURO de João Luís Teixeira
TURFEIRA, TURFEI TUR FEIRA RA PAR PARQUE QUE NA NATUR NATURAL TURAL AL DA SER SERRA RA DA EST ESTREL ESTRELA RELA A ddee JJorge orge G Gomes omes
CHARCO DE MONTANHA MONTANHA, PARQUE NATURAL DA SERRA DA ESTRELA dde JJorge G Gomes
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22 CONTRA-RELÓGIO
Diversidade biológica das
águas continentais
Concebida pelas Nações Unidas, a Década da Biodiversidade valoriza a água potável como recurso escasso: toda a vida na Terra depende da água, pelo que não restam dúvidas que a água doce é o recurso natural mais importante do planeta
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s águas continentais incluem todos os tipos de massas de águas continentais, doces ou salgadas, assim como as águas subterrâneas. Hoje sabe-se que estas massas do precioso líquido estão estreitamente interligadas com os ecossistemas terrestres. Verifica-se que a diversidade biológica dos ecossistemas de água doce está a diminuir mais rapidamente que a de qualquer outro bioma. Práticas insustentáveis conduzem a perdas de habitat devido à construção, à conversão da terra principalmente para a agricultura e à contaminação. O uso insustentável de água e as espécies exóticas invasoras também têm um impacto negativo na diversidade biológica. Os ecossistemas de águas continentais
A
proporcionam serviços vitais para o desenvolvimento humano e para reduzir a pobreza. Entre estes serviços incluem-se alimentos, fibras, medicamentos, regulação do clima, mitigação de inundações e desastres naturais, reciclagem de nutrientes e purificação da água para que se mantenha ou torne potável. Estes ecossistemas também são essenciais na produção de energia, nos transportes, na valorização dos tempos livres da população, no turismo e, claro, como habitat de animais e plantas com funções definidas nos ecossistemas. Estes serviços são tidos como garantidos, mas podem ser caros se se tentar substituir. Por exemplo, a construção e a manutenção das plantas de tratamento de água com frequência resultam numa fatura bem mais cara do que a manutenção da infra-estrutura dos
factos &números Só 0,03% da água do mundo está • disponível como água doce líquida sobre a superfície da Terra. os dias se descarregam 2 milhões • deTodos toneladas de água residual não tratada nos cursos de água e 70% dos dejetos industriais por tratar nos países em desenvolvimento. Das 29 mil espécies de peixes • conhecidas, aproximadamente 30% são espécies de água doce. e a degradação dos habitats • sãoA perda as causas principais de extinção de espécies de água doce. Os sistemas aquáticos e terrestres estão • estreitamente unidos e inter-relacionados. As turfeiras cobrem aproximadamente • 3-4% da superfície terrestre, mas
Miguel Mesquita
contêm 25-30% do carbono contido nos ecossistemas terrestres e armazenam duas vezes mais quantidade de carbono que os bosques de todo mundo.
ecossistemas naturais para proporcionarem água potável. Os principais impactos das alterações climáticas virão a sentir-se através da água, pelo que os ecossistemas das águas continentais são particularmente importantes neste contexto. Por exemplo, um uso mais correto da infra-estrutura dos ecossistemas de água doce pode ajudar as populações a fazerem frente ao aumento da frequência e à gravidade das secas e das inundações. Para deter ou inverter o declínio da diversidade biológica das águas continentais, torna-se necessário aumentar a consciencialização sobre a importância destes sistemas. É urgente atuar agora e aplicar o enfoque por ecossistemas quando se trata de gerir quer a terra quer a água. Fonte www.cbd.int
zonas húmidas, como as planícies • deAsinundação dos rios e os mangais, protegem as comunidades humanas de catástrofes naturais tal como tsunamis e inundações. Aproximadamente 70% da água que se • extrai dos rios torna-se motivo de perda de
Biological diversity of inland waters Conceived by the United Nations, for the Biodiversity Decade, the Organisation places great value on drinking water as a scarce resource. All life on Earth depends on water therefore there is no doubt that fresh water is the most valuable natural resource on the planet.
zonas húmidas em todo o mundo, devido ao desmate, à drenagem e extração de água para o desenvolvimento agrícola. Cerca de 80% da população do • mundo vive atualmente em zonas onde o abastecimento de água não está assegurado. No ano 2025 dois terços da população mundial poderá estar a viver debaixo de condições de stress hídrico, e um número similar de pessoas poderá viver sem instalações de saneamento adequadas. metade das grandes cidades • doQuase mundo obtém uma quantidade substancial, se não a maior parte de abastecimento de água potável, de áreas florestais protegidas.
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24 QUINTEIRO
Onde param os muros
s muros que bordam os campos nas aldeias tradicionais, além da sua beleza típica, recriam habitats que a natureza não regateia aproveitar. Há pequenos animais invertebrados que aceitam a oportunidade mediante uma relativa exposição ao sol. Surgem depois nesses caminhos musaranhos e sardaniscas que haja ainda pelas redondezas. Em pouco tempo já se alojaram por ali esporos de musgos e fetos, assim como sementes de plantas de contexto rochoso. Nesta altura ainda não se veem, mas depois de alguma chuva aparecem, entre outros, umbigos-de-vénus e gerânios silvestres, avenquinhas e saxífragas. Moluscos, como caracóis e lesmas chegarão a seu tempo, para se abrigarem sobre a verdura dessa folhagem. Diferentemente dos muros lisos, estéreis quanto baste, os muros rústicos sustentam uma maior diversidade de vida, com inclusão de pequenas aves selvagens, como os chapins-carvoeiros que nos orifícios podem
O
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bem esgalhar por altura de fevereiro e março um rico ninho para criar a prole. Se gosta de observar a natureza no seu jardim, a recriação de alguns metros deste tipo de muro irá adicionar ao que já existe um habitat rochoso e as espécies regionais a condizer. A diversidade de habitats não só atrai mais espécies de seres vivos como consolida as que já costumam visitar o espaço verde que segue além da sua janela preferida. Como é inverno a limpeza da caixa-ninho não ficará mal. Sabe-se que algumas aves de nidificação cavernícola reconstroem ninho em cima dos escombros do ano anterior, mas outras recusam-se terminantemente. Não precisará de fazer isso se se der o caso de não ter instalado ainda uma caixa-ninho. Neste caso, não adie. Pode haver um chapim-real, de peito amarelo e faces brancas na cabeça preta, que aguarda essa dica para o deslumbrar já na primavera vindoura. A medida da abertura tem de ficar como manda o saber, caso contrário os assaltantes farão fila para predar a descendência!
© Fotolia
Ernesto Brochado
Um jardim com vida selvagem é um espaço vivo onde ocorrem acontecimentos que engalanam a memória: se recriar um muro rústico, se instalar uma caixa-ninho e um alimentador de aves selvagens já é bom, mas e que tal pensar num lago para fazer render as suas observações já na próxima primavera?
Jorge Gomes
rústicos?
S Os pica-paus-malhados-grandes costumam acabar por alargar a entrada das caixas-ninhos
Sem querer ser má-língua, não seria de admirar que o pica-pau-malhado-grande da fotografia ao lado estivesse a premeditar a ocorrência de óbito na cadeia alimentar... Ainda sem que o calendário chegasse a essa página, em pleno inverno os alimentadores de jardim para aves selvagens são importantes no apoio à sobrevivência.
Rustic walls
João L. Teixeira
A garden with wildlife is a living space where events occur that embellish our memory. It is really good if one creates a rustic fence, perhaps install a nest box and a wild bird feeder, but what about adding a pond so that you may profit from your observations as early as next spring?
S Na primavera o pequeno lago que construir agora poderá ter um aspeto semelhante a este
O tempo frio e chuvoso exige mais calorias à avifauna e os suculentos invertebrados de que se alimentam nas próximas estações ainda são impercetíveis. Além de servirem de apoio à população selvagem, os alimentadores são vórtices de atração dos seus amigos de penas, o que lhe permite uma contagem de espécies e de
S Os verdilhões aparecem aos bandos para fruírem do grão que lhes prolonga a vida
indivíduos bastante mais ativa. Nesta altura do ano, quando a vegetação ainda está com o metabolismo em banhomaria, depara com uma boa altura para enriquecer o jardim com um lago. Os pontos de água são vitais para toda a pequena fauna selvagem que põe aí o seu pezinho.
S Os velhos muros rústicos são pontos fulcrais de diversidade biológica
Tendo em conta a exposição solar estival dos espaços do jardim, escolha um sítio recatado, onde não caia folhagem. Extraia a terra necessária e redistribua-a de forma conveniente. Aplique uma lona impermeável, disfarce-a e decore-a, evitando cortes verticais abruptos. Isso porque se uma ave ou outro animal se descuida deve contar com uma “rampa” de emersão para evitar afogamento. Isso pode ocorrer até com os sapos que ali se desloquem para desovar — se for fácil entrar na água e muito difícil sair os seus objetivos ficam aquém do pretendido. Por exemplo, em tanques de paredes verticais de repente encontram-se já afogados lagartos, ratos, aves e até coelhos juvenis. Às aves que valorizam o seu jardim, com um ponto de água deste género, consegue atraí-las pela necessidade que têm de beber e de se banharem, para manterem as penas em perfeito estado de sobrevivência. Texto Jorge Gomes Veja também: www.charcoscomvida.org
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26 QUINTEIRO
Doenças dos
mirtilos Vaccinium spp.
1.ª Parte
de Agricultura e Pescas do Norte no ano de 2013. Numa primeira parte serão apresentados os fungos que infetam as raízes e zona do colo das plantas, e na segunda parte os fungos da parte aérea. As amostras analisadas são provenientes de pomares recém-instalados, dos grupos Northern Highbush (cv. Duke, cv. Ozarkblue, cv. Drapper e cv. Darrow) e Southern Highbush (cv. Legacy e cv. Brighthwell).
A produção Doenças radiculares Tratando-se de uma cultura recente entre d de pequenos frutos, nós, importa fazer o acompanhamento Podridão Radicular fitossanitário dos pomares para que em particular mirtilos (Phytophthora spp.) possamos assinalar as principais doenças (Vaccinium spp.), A doença está presente nas principais e pragas presentes nas nossas condições zonas de produção a nível mundial, tendo edafo-climáticas, bem como a sua incidência tem despertado grande e severidade. sido identificadas várias espécies do fungo Phytophthora (P. cinnamomi, P. citrophthora, O correto diagnóstico das doenças, interesse na região P. nicotainae, P. palmivora). bem como a identificação das pragas é de Entre Douro e Minho fundamental, para que os meios de luta Solos com má drenagem são favoráveis ao desenvolvimento do fungo, cujos adotados sejam também os recomendados. nos últimos anos esporos providos de flagelos (zoósporos) A integração de meios de luta, privilegiando as práticas culturais, é um aspeto fundamental, considerando o número reduzido de substâncias ativas disponíveis para tratamento da cultura (consultar o site da DGAV – Extensões de Autorização de Produtos Fitofarmacêuticos concedidas para as Utilizações Menores – em http://www.dgv. min-agricultura.pt/portal/page/portal/DGV/ genericos?generico=4207815&cboui=420 7815). Adquirir plantas sãs em viveiros autorizados pelos serviços oficiais é o primeiro passo para o sucesso de um pomar. A preparação do terreno, efetuando previamente análises de solo, que darão as indicações para as correções a fazer, é outro aspeto a não descurar. Neste artigo iremos referir as doenças identificadas na Divisão de Apoio ao Sector Agroalimentar da Direção Regional
são transportados pela água. A dispersão da doença no terreno, a partir de um foco inicial, coincide com o caminho percorrido pela água no solo. O fungo poderá manter-se durante vários anos no solo, mesmo na ausência de hospedeiro. Plantas jovens morrem num curto espaço de tempo, enquanto as plantas adultas poderão apresentar sintomas de declínio ao longo de vários anos, acabando também por morrer.
Sintomas As plantas infetadas apresentam fraco vigor vegetativo, folhas cloróticas (amareladas) ou precocemente avermelhadas, por vezes com necrose marginal, e desfoliação prematura. As raízes apresentam-se necrosadas (cor castanha escura). A infeção progride até à zona do colo da planta, onde é visível uma necrose (cor castanha e consistência firme) sob a casca.
Meios de luta
S Planta de mirtilo
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As medidas a tomar deverão ser essencialmente preventivas: plantar em solos com boa drenagem e utilizar plantas sãs. Nos Estados Unidos têm sido realizados diversos estudos sobre os fatores com preponderância no desenvolvimento da doença. No que diz respeito às cultivares, no estado de Oregon, Bryla e Linderman (2008) concluíram que ‘Duke’ e ‘Bluecrop’ apresentavam uma incidência mais elevada da infeção. Silva, et al. (1999), delinearam
um ensaio para avaliar a influência do encharcamento do solo na severidade da infeção, tendo concluído que quanto maior a frequência a que um solo está sujeito a períodos de encharcamento, maior será a severidade da infeção. Quanto ao tipo de rega, em pomares com histórico da doença e/ou solos com má drenagem, a microaspersão é preferível à rega gota-a-gota (Bryla e Linderman, 2007). A incorporação de sulfato de cálcio ao solo reduz a severidade da doença (Yeo, et al., 2013). No Chile, Larach, et al. (2009), referem a cv. ‘Toro’ como resistente a P. cinnamomi e ‘Elliot’ e ‘Toro’ como resistentes a P. citrophthora.
Podridão agárica (Armillaria spp.)
O fungo Armillaria é parasita facultativo, e está presente na região de Entre Douro e Minho em diversas culturas arbóreas e arbustivas e plantas ornamentais, assumindo particular importância na vinha. As espécies Armillaria mellea e A. ostoyae foram identificadas nos Estados Unidos e A. mellea e A. gallica em Itália, em plantas de mirtilo. Esta doença tem uma forma de dispersão no terreno tipo “nódoa de azeite”. A disseminação ao longo de uma linha, coincidindo com plantas infetadas que foram previamente arrancadas (por exemplo, uma ramada ou oliveiras), também é frequente. Raízes infetadas que permaneçam no terreno mantêm o fungo viável ao longo de muitos anos.
vezes, podem também ser observadas no exterior das raízes os rizomorfos, estruturas miceliais semelhantes a cordões, achatados, de cor castanha escura. Os rizomorfos propagam a doença através do solo, infetando raízes de plantas suscetíveis.
Meios de luta Não há tratamento curativo, pelo que deverão ser implementadas medidas de natureza preventiva. Na preparação do terreno para instalação de um pomar, remover os cepos e restos de raízes de árvores e arbustos que aí se encontrem. Se possível, observar algumas raízes para verificar se o fungo está ou não presente. As plantas doentes devem ser arrancadas e queimadas, retirando os restos de raízes da terra. Não replantar no mesmo local. O excesso de água no solo, seja devido a má drenagem, ou à rega, é favorável ao desenvolvimento da doença, pelo que deverá ser evitado. Ensaios em laboratório e em estufa realizados em Itália com agentes de controlo biológicos (BCA), identificaram o fungo Trichoderma atroviride SC1, como efetivo no controlo de A. gallica e A. mellea. Importa avaliar se o desempenho no campo se mantém.
Fusariose (Fusarium spp.)
O género Fusarium é um fungo de solo com muitas espécies e uma vasta gama de hospedeiros. Na região de Entre Douro e Minho F. oxysporum, responsável por doenças vasculares, tem uma elevada incidência nas culturas hortícolas em estufa, causando por vezes prejuízos elevados.
Na Argentina foram identificadas as espécies F. solani e F. proliferatum em mirtilos. Este fungo pode permanecer no solo sob a forma de micélio ou esporos, mesmo na ausência de hospedeiro.
Sintomas As plantas apresentam necrose a nível do colo e das raízes. Folhas cloróticas que acabam por tornar-se castanhas, secando alguns ramos e por fim toda a planta.
Meios de luta Mais uma vez as medidas a tomar são de natureza preventiva, sendo fundamental em pomares novos, utilizar plantas sãs, adquiridas em viveiros autorizados pelos serviços oficiais. Solos com má drenagem e rega excessiva são fatores a evitar. Noutras culturas têm-se obtido resultados interessantes no controlo de algumas espécies de Fusarium através da solarização, biofumigação e utilização de BCA.
Por Gisela Chicau, DRAPN – Divisão de Apoio ao Setor Agroalimentar
Bibliografia Agrios, G. N. (2005) Plant Pathology (Fifth Edition). ELSEVIER Academic Press, USA.922 pp. Bryla, D. R. & Linderman, R. G. (2007) Implications of Irrigation Method and Amount of Water Application on Phytophthora and Pythium Infection and Severity of Rot in Highbush Blueberry. HortScience 42(6):1463-1467. Bryla, D. R. & Linderman, R. G. (2008) Incidence of Phytophthora and Pythium Infection and the Relation to Cultural Conditions in Commercial Blueberry Fields. HortScience 43(1):260-263. Chicau, G., Figueiredo, F., Campos, P., Bacelar, S. & Inglez, M. (2004) Avaliação da incidência de Armillaria spp. em três concelhos da região de Entre Douro e Minho. In Actas do 4º Congresso da Sociedade Portuguesa de Fitopatologia, 4-6 de Fevereiro, Universidade do Algarve, Faro, pp. 165-170. Horst, R. K. (2008) Westcott’s Plant Disease Handbook (Seventh Edition). Springer, New York. 1317 pp. Larach, A., Besoain, X. & Salgado, E. (2009) Crown and root rot of highbush blueberry caused by Phytophthora cinnamomi and P. citrophthora and cultivar susceptibility. Cien. Inv. Agr. 36(3):433-442. Pérez, B. A., Murillo, F.; Divo de Sesar, M. & Wright, E. R. (2007) Ocurrence of Fusarium solani on Blueberry in Argentina. Plant Disease 91(8):1053
Sintomas Inicialmente observa-se fraco desenvolvimento vegetativo, folhas pequenas, cloróticas e precocemente avermelhadas. As plantas poderão morrer alguns meses após o aparecimento dos primeiros sintomas ou secarem subitamente. Nas raízes infetadas, é visível o micélio do fungo (massa branca, nacarada, em forma de leque), entre a casca e o lenho. Por
– Abstract. Pérez, B. A., Berretta, M. F., Repetto, N., Carrión, E. & Wright, E. R. (2011) First Reporto f Root Rot Caused by Fusarium proliferatum on Blueberry in Argentina. Plant Disease 95(11):1478 – Abstract. Prodorutti, D., Pellegrini, A. & Pertot, I. (2009) Biocontrol of Armillaria root rot on highbush in Italy. IOBC/WPRS Bulletin Vol. 43:207-210 (Abst.) Prodorutti, D., Vanblaere, T., Gobbin, D., Pellegrini, A., Gessler, C. & Pertot, I. (2009) Genetic Diversity of Armillaria spp. Infecting Highbush Blueberry in Northern Italy (Trentino Region). Phytopathology 99(6): 651-658. Silva, A., Keith, P., Rothrock, C. & McNew, R. (1999) Phythophthora Root Rot of Blueberry Increases with Frequency of Flooding. HortScience 34(4):693-695. Yeo, J., Weiland, G. E., Sullivan, D. M., Bryla, D. R. (2013) Management of
S Aspeto de raiz de mirtilo infetada com o fungo Fusarium spp.
Phytophthora cinnamomi root rot disease of blueberry with gypsum and compost. Meeting Abstract.
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28 DUNAS
Cordão dunar A dinâmica do mar, sabem os antigos, é caprichosa: ora avança ora recua
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por isso que sobre qualquer construção humana no litoral pendem ameaças que, no inverno, são incontornáveis. Marés vivas, mau tempo em geral, agitam essa enorme massa de água, que avança sobre a terra. «O litoral não é uma linha como os mapas mostram, mas sim uma faixa. A elevação do nível do mar, a diminuição dos sedimentos transportados pelos rios, a destruição das dunas e arribas e os enrocamentos e paredões são os principais fatores que afetam o litoral, de acordo com a generalidade dos investigadores», escreve Nuno Oliveira no «Jornal de Notícias» de 2014-1-13. No litoral de Gaia «é bem patente o papel
É
que tiveram nos recentes temporais essas técnicas, podendo ver-se grandes extensões de regeneradores dunares, bem carregados de areia, a constituírem barreira eficaz ao avanço da ondulação. Com o objetivo de proteger as dunas do pisoteio dos veraneantes, criaram-se, a partir dos anos 80, passadiços sobrelevados de madeira, perpendiculares ao mar, que permitem o acesso às praias. Mas a recente moda de instalar passadiços paralelos ao mar é responsável, agora, por uma das maiores faturas das destruições feitas pelo mar. Os passadiços perpendiculares são muito menos afetados, enquanto que dos segundos o mar “cobrou” quilómetros. Embora sejam muito agradáveis para
Dunes
A colonização das dunas por espécies exóticas pode levar à extinção local das espécies autóctones
Parque de
Dunas da Aguda s dunas não protegem só o ser humano das ondas mais agressivas. Ambientes dinâmicos, consolidam-se ao juntar dezenas de espécies de plantas nativas amigas deste solo caprichoso, feito de areia. Funcionam ali, por isso, os chamados corredores verdes que sustentam a diversidade da vida. É também isso que o Parque de Dunas da Aguda diz a quem o visita. Através do Parque Biológico de Gaia, e com a colaboração do Programa LIFE da União Europeia, estes habitats protegidos por lei surgem explicados e percebe-se o baixo custo e a importância destas estruturas naturais. As plantas estabilizam as dunas com longas raízes. Viabilizam também abrigo e alimento a muitos animais, como invertebrados, pequenos répteis e mamíferos, embora sejam as aves selvagens que mais prendem a atenção de quem ali passa para apreciar a paisagem. A brisa que viaja pelo litoral traz a boa nova: as dunas já chamam a primavera. Durante as migrações, pousar ali proporciona repouso, renova forças e, não havendo aflição, até permite, em tempo útil, desagregar o bando e fazer ninho. À medida que os dias ficam maiores, mais será assim.
A
João L. Teixeira
passear, é altura de corrigir os erros, e retirar esses passadiços paralelos ao mar para zonas menos vulneráveis, sob pena de anualmente se gastarem milhões. A faixa litoral deve constituir uma almofada que amorteça o impacto do oceano; isso sabe o povo desde há muito e, por isso, as cidades e vilas costeiras, sempre se estabeleceram no interior dos estuários, como foi o caso do Porto ou Vila Nova de Gaia até ao século XIX. É o hábito de ir à praia, que se desenvolveu entre nós na segunda metade do século XIX, que faz aparecer casas de veraneio na Granja ou na Foz, não mais parando o crescimento urbanístico. Agora estamos a ver as consequências que no futuro poderão ser piores se não soubermos agir preventivamente face às alterações em curso».
João L. Teixeira
The dynamics of the sea, where the tides are capricious: sometimes forwards; sometimes receding. That is why there are constant threats upon any human construction along the coastline which in winter, are unavoidable. The coast is not a line as the maps show, but rather a range of constant activity.
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30 LITORAL
O Aquário da Estação Litoral da Aguda
O Aquário da ELA é dedicado à fauna e flora aquáticas locais, mostrando sobretudo os peixes e invertebrados marinhos mais importantes para a pesca artesanal, estabelecendo assim uma continuidade pedagógica com o Museu 1 das Pescas m 15 aquários de 1200 até 6700 litros foram reconstruídos os biótopos mais característicos do mar da Aguda e de uma ribeira adjacente. Os tanques são habitados por mais de mil animais de 60 espécies diferentes e por algumas algas e plantas aquáticas. A exposição, dedicada exclusivamente à fauna e flora locais, foi concebida como um passeio subaquático autoguiado. Começa na zona intertidal, prolonga-se até aos 25 metros de profundidade e volta para a praia, entrando numa pequena ribeira de água doce que atravessa as dunas. Este trajeto é associado às atividades de promoção, divulgação, programa pedagógico de educação ambiental e de investigação científica da ELA, através de painéis iluminados que expõem desenhos, folhetos e cartazes. A visita ao mar da Aguda inicia-se pelas poças-de-maré da zona eulitoral, caracterizada por bancos de mexilhões (Mytilus galloprovincialis), (aquário 1) e «recifes» de barroeira (Sabellaria alveolata), (aquário 2), com a fauna e flora que lhes estão associadas, como anémonas (Actinia equina), camarões (Palaemon serratus) e peixes adaptados a este meio em constante mudança (Lipophrys pholis, Parablennius gattorugine, Diplodus annularis). Entrando na zona sempre submersa do sublitoral, a exposição desce aos três metros de profundidade, apresentando o habitat das laminárias. Estas colónias de macroalgas
E
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9 castanhas (Laminaria spp.) albergam um cardume de robalos juvenis (Dicentrarchus labrax) e várias espécies de bodiões (Labrus bergylta, Crenilabrus spp.), (aquário 3). Com a profundidade a aumentar, de cinco em cinco metros, e ao passar na zona rochosa característica do mar da Aguda, encontram-se as fanecas (Trisopterus luscus), as douradas (Sparus auratus) e os pargos (Sparus pargus), (aquários 4, 5 e 6). A exposição chega à profundidade máxima de 25 metros, onde começam os bancos de areia. Aqui foi montado um pequeno recife artificial que é frequentado por espécies de grande porte como peixe-porco (Balistes capriscus), pata-roxa (Scyliorhinus canicula), raia (Raja clavata), congro (Conger conger) e moreia (Muraena helena), (aquário 7). Subindo em intervalos de cinco metros, o cenário mostra novamente uma zona rochosa, albergando o polvo (Octopus vulgaris), a lagosta (Palinurus elephas) e um cardume de gorazes (Pagellus bogaraveo),
8 (aquários 8, 9 e 10). No aquário 11 é exibido um mero (Epinephelus marginatus), robalos e tainhas adultos e um lavagante (Homarus gammarus) com mais de quatro kg de peso, uma espécie ameaçada no mar da Aguda, cujo cultivo e repovoamento estão a ser estudados na ELA desde 2006. De regresso à terra, a exposição termina com a fauna e flora de uma pequena ribeira da zona dunar, em cujo estuário habitam gambúsias (Gambusia affinis) e a solhadas-pedras (Platichthys flesus). No troço inferior da ribeira encontram-se as espécies migradoras, a enguia (Anguilla anguilla) e a truta marisca (Salmo trutta). No troço médio vivem a carpa (Cyprinus carpio) e o achigã (Micropterus salmoides) e na parte da nascente as trutas arco-íris (Oncorhynchus mykiss), (aquários 12, 13, 14 e 15). Os peixes e invertebrados marinhos em exposição foram capturados com técnicas e cuidados adequados, na sua maioria em
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1 Sala pública do Aquário 2 Aquário com 5 metros de comprimento 3 Tainhas (Mugil spp.) 4 Camarão (Palaemon serratus) 5 Rascasso-vermelho (Scorpaena scrofa) 6 Polvo (Octopus vulgaris) 7 Gorazes (Pagellus bogaraveo) 8 Peixe-porco (Balistes capriscus) 9 Lavagante (Homarus gammarus)
colaboração com os pescadores da Aguda. A seguir a uma observação inicial, ficaram cerca de duas semanas em quarentena para um eventual despiste de doenças, ectoparasitas e adaptação alimentar. Depois foram distribuídos pelos aquários de exposição, conforme critérios etológicos e ecológicos, respeitando comportamentos territoriais, preferências ambientais e ciclos de vida. Toda a informação necessária para a compreensão dos biótopos está sintetizada em painéis iluminados. Estas legendas, colocadas por cima dos aquários, mostram pequenos textos que caracterizam o habitat, as respetivas imagens das espécies expostas, com indicações como os nomes vulgar e científico, peso e comprimento, características biológicas, preferências ambientais e métodos de pesca. A alimentação dos habitantes de cada aquário é assegurada com produtos
3 congelados como miolo de mexilhão, pequenas sardinhas e lulas, mas também com zooplâncton vivo, algas verdes e granulados secos. Para a decoração dos aquários foram utilizados materiais naturais como rochas, pedras, areão e areia mas as volumosas paredes rochosas posteriores e laterais foram construídas com poliéster revestido de areia pigmentada, e aplicado sobre estruturas de tubos plásticos envolvidas por telas plásticas, fixadas com abraçadeiras plásticas. Tentou-se, assim, recriar uma imagem realista do ambiente marinho da praia da Aguda. As estruturas montadas permitem que a água circule livremente por trás. Foram colonizadas tão rapidamente por algas, esponjas, anémonas e poliquetas que só um olhar atento descobre a sua origem artificial. Por Mike Weber e José Pedro Oliveira
ESTAÇÃO LITORAL DA AGUDA Rua Alfredo Dias, Praia da Aguda 4410-475 Arcozelo Vila Nova de Gaia Tel.: 227 536 360 fax: 227 535 155 ela.aguda@mail.telepac.pt www.fundação-ela.pt
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32 DUNAS
Estuário do Douro
Uma águia-de asa-redonda, entretanto reabilitada pelo Centro de Recuperação de Fauna Selvagem do Parque Biológico de Gaia, foi devolvida à natureza em 5 de dezembro na Reserva Natural Local do Estuário do Douro
João L. Teixeira
T No centro de interpretação da reserva natural local os alunos compreenderam, entre outras coisas, por que razão a natureza, representada pela águia, deve ser preservada
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João L. Teixeira João L. Teixeira
Estreia de espécie rara
S Após a explicação do contexto desta libertação aos alunos, a vereadora Maria Elisa Oliveira libertou o animal selvagem
o abrigo do projeto Animais Felizes, que consiste na devolução de animais selvagens à natureza, foi libertada nessa manhã esta ave de rapina, também protegida por lei, no estuário do Douro sob o olhar atento de numerosas crianças da Escola EB1/JL da Afurada de Baixo. O projeto foi criado através de uma parceria entre o Pelouro de Educação do Município de Vila Nova de Gaia e o Centro de Recuperação de Fauna do Parque Biológico de Gaia, tendo por objetivo aliar a preservação da natureza à educação ambiental nos estabelecimentos de ensino gaienses. As aves de rapina são espécies protegidas por convenções internacionais, dada a importância da sua função na saúde dos ecossistemas.
A
O Halloween de 2013 trouxe do outro lado do Atlântico para a Reserva Natural Local do Estuário do Douro um pequeno pilrito de uropígio branco, de rara observação na Europa: trata-se do pilrito-de-sobre-branco, designado também de pilrito-de-bonaparte (Calidris fuscicollis). É uma ave neártica, ou seja, que tem o seu ciclo de vida entre a tundra Ártica da América do Norte e a zona costeira atlântica da América do Sul. É uma espécie migratória de longa distância. Uma grande parte da sua população permanece durante o período não reprodutivo nas zonas costeiras da Patagónia. Esta pequena limícola realiza uma das mais longas migrações conhecidas entre as aves. O facto das áreas de nidificação desta espécie serem zonas costeiras da tundra torna-a vulnerável a persistentes alterações hidrológicas no Ártico que se têm sentido nos últimos anos devido às alterações climáticas. Será interessante referir que esta pequena limícola foi certamente uma das primeiras espécies a ser observada por Darwin durante a sua viagem no “Beagle” pela costa sul-americana, nomeadamente em Buenos Aires, durante as primeiras semanas de novembro de 1832. Texto Paulo Faria
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Francisco Saraiva
34 MUSEU
Afurada artesanal
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S A exposição abriu em 7 de dezembro, sábado, pelas 16h00
Francisco Saraiva
A exposição incluiu igualmente trabalhos oriundos de mãos femininas: «Delicadezas que os dedos dedilham nas agulhas de croché, quadros e colares num enfeite que se quer bonito». A rotatividade das exposições em torno do núcleo permanente de informação sugere decerto a renovação da sua visita.
Francisco Saraiva
Barcos em miniatura construídos ao pormenor, entre outras obras, estiveram expostas aos visitantes do Centro Interpretativo do Património da Afurada entre 7 e 22 de dezembro. Os visitantes deste centro interpretativo contemplaram uma mostra especial centrada nas obras de artesãos do lugar. «Nem só do trabalho do mar vive o pescador. Prova disso é esta exposição de artesanato, com forte ligação ao mar e à pesca», lia-se no cartaz da mostra. «A obra nasce da memória e da imaginação daqueles que, com a sua mestria, transformam a matéria em arte e beleza». Réplicas de barcos feitos à escala, representando por exemplo bateiras antigas, traineiras e bacalhoeiros, ordenam materiais centrados na madeira e em alguns metais, agregados por cola e coloridos com tintas sintéticas.
ESPAÇOS VERDES 35
Parque do Conde das Devesas
Devesa, segundo o dicionário, são campos limitados por linhas de árvores. O cariz agrícola da localidade que leva esse nome, e são mais que muitas por este país fora, é incontornável. O Parque das Devesas engloba uma velha quinta abandonada. As camélias centenárias existentes sugeriram
que fossem ali plantadas algumas dezenas de variedades. Estas árvores de crescimento lento, com origem asiática, fazem flores no inverno. Um estudo da autoria de Frederick Gustav Meyer (1959), do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos da América, aponta as camélias de Vila Nova de Gaia
como sendo os mais antigos exemplares até agora registados na Europa, plantados em 1550. Com as portas abertas para si todos os dias, das 10h00 às 18h00, este espaço verde encontra-se perto do Cais de Gaia. O portão de entrada situa-se na Rua D. Leonor de Freitas.
Parque da Ponte de Maria Pia
A partir dos antigos estaleiros dos caminhos-de-ferro, junto à ponte de Maria Pia, que se encontravam desativados há anos, surgiu este espaço verde: o Parque da Ponte de Maria Pia. O mais recente parque de Vila Nova de Gaia. O espaço da antiga linha de caminho de ferro Porto/Lisboa, desativada com a construção da nova ponte ferroviária,
ganhou um novo uso com vista a servir o interesse público. Investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Exeter demonstraram que quem se mudou para áreas urbanas com espaços verdes usufrui de uma melhor saúde mental. «Estas conclusões são importantes para que os gestores políticos pensem em introduzir novos espaços verdes nas cidades, já que existem dados que indicam que tais
espaços podem providenciar benefícios sustentáveis a longo prazo para as comunidades locais», disse o coordenador do estudo, Ian Alcock. Esta pesquisa, publicada no jornal «Environmental Science & Technology», seguiu ao longo de cinco anos 1064 pessoas. Localizado na Alameda da Serra do Pilar, na freguesia de Santa Marinha, em Vila Nova de Gaia, está aberto aos visitantes todos os dias entre as dez e as 18h00.
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36 ESPAÇOS VERDES
João L. Teixeira
“Arqueologia no Parque Botânico do Castelo”, em Crestuma, foi o assunto sobre o qual Gonçalves Guimarães dissertou em 24 de novembro, domingo, pelas 14h00, quando se celebrou o Dia Nacional da Cultura Científica. Esta efeméride foi instituída em 1997, com vista a homenagear o nascimento de Rómulo de Carvalho e divulgar o seu trabalho na promoção da cultura científica e no ensino da ciência. Professor, metodólogo, investigador, historiador, autor de manuais escolares, de livros de divulgação científica e de poesia, estes últimos sob o pseudónimo de António Gedeão, Rómulo de Carvalho afirmava que o “Universo é feito essencialmente de coisa nenhuma”. Revelou-se como poeta apenas em 1956, com a obra “Movimento Perpétuo”, a que se juntaram outras. O programa deste dia iniciou às 10h00 na Reserva Natural do Estuário do Douro. Paulo Faria, técnico do Parque Biológico de Gaia, conversou sobre ornitologia com os visitantes deste sítio protegido.
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João L. Teixeira
Parque Botânico do Castelo
Jorge Gomes
Às 17h00, no Parque Biológico de Gaia, Nuno Gomes Oliveira apresentou o tema “Conversas sobre História Natural”, versando o contexto da obra “Flore Portugaise”, de Johann Centurius Graf von Hoffmannsegg (conde de Hoffmannsegg) e Johann Heinrich Friedrich Link, resultado de uma expedição feita por aqueles naturalistas a Portugal entre 1779 e 1801. À noite, pelas 20h00, houve ainda lugar à “Astronomia no Parque”, com Henrique Alves.
S Paulo Faria, técnico do Parque Biológico de Gaia, conversou sobre ornitologia com os visitantes
S Arqueologia no Parque Botânico do Castelo, em Crestuma, com Gonçalves Guimarães
Parque da Lavandeira Em Oliveira do Douro, orientado essencialmente para o lazer, este Parque é um espaço verde cada vez mais procurado pela população. O Parque da Lavandeira proporciona a quem ali se desloca várias vertentes recreativas, nomeadamente percursos pedestres, zonas de merendas e jardins temáticos. Apesar do inverno não ser visto pela maioria como a época mais adequada ao passeio, não desperdice, se possível, pelo menos os dias de sol, altura em que poderá ver este parque com novos olhos. Existe até uma cafetaria disponível a acolher quem ali se desloca e que apoia as vertentes de lazer específicas deste espaço verde. Também pode visitar o Parque da Lavandeira através de computador, no modo Street view/Google maps, mas é sempre preferível olhar este espaço presencialmente. W O Parque da Lavandeira acolherá diversas iniciativas culturais ao longo do ano
Agenda Yoga A orientação é da responsabilidade da Dr.ª Luísa Bernardo, que proporciona a atividade em regime de voluntariado. Quartas e sextas-feiras às 9h45.
Tai Chi Às segundas e às quintas-feiras, aulas às 9h30.
As mulheres do campo vêm à vila Aos sábados de manhã, venda de legumes sem pesticidas. Entrada grátis. Participação nesta última atividade sujeita a marcação por e-mail: lavandeira@parquebiologico.pt
Pode seguir o Parque da Lavandeira no Facebook, no site www.parquebiologico.pt (botão Parque da Lavandeira), ou telefonar para 227 878 138
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Presidente
O presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, orientou um debate no auditório do Parque Biológico de Gaia na noite do passado dia 29 de janeiro
«
magino que as pessoas estejam habituadas à atitude do quero, posso e mando — mas comigo não é assim», disse Eduardo Vítor Rodrigues. «Penso que quanto mais pontos de vista nos chegarem para serem analisados mais eficaz será uma decisão quando for altura de a tomar». Eduardo Vítor Rodrigues deslocou-se ao Parque Biológico para reiterar a sua
I
João L. Teixeira
aberto ao debate
confiança no diretor deste equipamento de educação ambiental com mais de 30 anos de vida, Nuno Gomes Oliveira, e falar das suas expectativas para o futuro. No uso da palavra, reconheceu a importância do trabalho desenvolvido, inclusive fora do Parque, concretamente no cordão dunar, e adiantou a sua perspetiva de «dar condições de dignidade ao Centro de Reabilitação Animal de Vila Nova de Gaia, canil e
gatil, incorporando-o no espaço do Parque Biológico», que hoje funciona junto das oficinas da Câmara. Para isso, sem colidir com os terrenos já sob a alçada do Projeto de Sequestro de Carbono, um compromisso do Município, existe a hipótese de edificar essa instalação nos terrenos junto ao nó da auto-estrada, em Vilar de Andorinho. Contudo, explicou que deve ser analisada a questão a vários níveis, inclusive na vertente jurídica.
O livro dedicado à infância que se intitula “Mauro e Emília os nossos cágados estão em perigo, vamos ajudá-los” foi convertido em peça de teatro. A apresentação desta peça decorreu no auditório da Biblioteca Municipal de Vila Nova de Gaia, mas há uma versão convertida em teatro de fantoches que já tem sido vista pelos alunos de várias escolas, em colaboração com o Departamento de Educação do Município. Uma das personagens, Emília, foi a primeira fêmea de cágado-de-carapaça-estriada a integrar o programa de criação em cativeiro do Parque Biológico de Gaia. A história desenrola-se numa lagoa costeira no Algarve, uma das áreas de ação do projeto LIFE-Trachemys, de que o Parque é parceiro. O final da história é feliz: os filhos da fêmea de cágado
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Teatro: Mauro e Emília
chamada Emília, nascidos em outubro de 2011, foram cuidados durante quase um par de anos, tornando-se menos vulneráveis aos perigos da vida selvagem. Foram libertados no verão do ano passado na mesma lagoa em que vive a sua família. Mas esta história não acaba aqui. Em 2012 e 2013 mais cágados-
Direitos Reservados
Histórias de natureza na investigação da leitura
A mesa que presidiu ao debate foi constituída por Silva Martins, administrador da Águas e Parque Biológico de Gaia, EEM, Mercês Ferreira, vereadora com diversos pelouros nomeadamente o de Jardins e Espaços Verdes e coordenação da atividade do Parque Biológico, Eduardo Vítor Rodrigues, presidente do Município gaiense, e Nuno Gomes Oliveira, diretor do Parque Biológico de Gaia.
de-carapaça-estriada como a Emília passaram pelo Parque, depositando os seus ovos e mais recém-nascidos serão libertados nos próximos anos, continuando a tentar fortalecer esta espécie em perigo de extinção. Uma das razões para esta ameaça é o abandono de tartarugas domésticas na natureza, tais como os irmãos americanos Tracy e Tod. Se tiver uma tartaruga e não a conseguir manter, o melhor é entregála num centro de recuperação oficial como o RIAS (Algarve) ou o Parque Biológico. O ambiente e os cágados da fauna ibérica, como o Mauro e a Emília, agradecem.
S Eduardo Vítor Rodrigues, presidente do Município de Vila Nova de Gaia, disse: «Imagino que as pessoas estejam habituadas à atitude do quero, posso e mando — mas comigo não é assim»
Ficha técnica “Mauro e Emília - os nossos cágados estão em perigo, vamos ajudá-los”: peça para crianças adaptada do conto homónimo de Ana Mafalda Alves, com dramatização de Alexandra Cruz (técnicos do Parque Biológico de Gaia), encenada por Pedro Miguel Dias, da associação Ilha Mágica.
Envolvendo cerca de 15 mil alunos, uma equipa de investigadoras do Instituto de Investigação da Leitura centrado na Universidade do Minho foi distinguida com o Prémio Cegoc 2013, entregue em 17 de janeiro no auditório multimédia do Instituto da Educação dessa universidade. Apreciadas mais de uma dezena de candidaturas, o júri internacional deste prémio decidiu distinguir a qualidade excecional da obra Bateria de Avaliação da Leitura (BAL), proposta por uma equipa de investigadoras coordenadas pelas professoras doutoras Iolanda Ribeiro e Fernanda Leopoldina Viana. Tendo como autoras Alina Galvão Spinillo (Universidade Federal de Pernambuco), Ana Paula Vale (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro), Fernanda Leopoldina Viana, Iolanda Ribeiro, Irene Cadime, Sandra Santos e Séli Chaves-Sousa (Universidade do Minho), a BAL permite avaliar a compreensão de textos e a leitura de palavras em crianças do 1.º ciclo do Ensino Básico. A equipa recorreu a textos originais e apelativos de autores como Ana Maria Magalhães, Carla Maia de Almeida, Isabel Alçada, Isabel Minhós Martins e Jorge Gomes. Às primeiras pedia-se textos de natureza literária, ao segundo que escrevesse sobre temas de natureza, pelo que pirilampos e observação de aves selvagens, sardaniscas e bugalhos foram alguns dos assuntos trabalhados: "Esta temática é muito bem aceite pelos alunos", disse Fernanda L. Viana. Uma parte deste trabalho tem a publicação em livro prevista para o primeiro semestre de 2014. a restante prevê-se que fique on-line. O projeto foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia.
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Oficinas de
Primavera De 7 a 11 e de 14 a 17 de abril, o Parque Biológico de Gaia abre as suas Oficinas de Primavera. Destinadas a crianças e jovens dos seis aos 14 anos, funcionam das 9h00 às 18h00. As oficinas privilegiam atividades de descoberta da natureza, de contacto com alguns animais e outras experiências de ar livre. São espaços lúdicos e formativos criados para os seus filhos.
João L. Teixeira
Nas férias da Páscoa, os mais novos podem inscrever-se nestas oficinas cheias de atividades que ninguém quer perder
No Parque Biológico de Gaia a breve prazo decorrerão iniciativas que podem Sábado no Parque Dia 5 de abril o Parque prepara algumas atividades especiais para os seus visitantes. Com início às 11h00, há lugar ao atelier “Iniciação à fotografia da natureza”. Às 15h00 decorre a abertura da Exposição de Fotografia da Natureza «Mosaicos de Biodiversidade» de Albano Soares, dentro do espírito da Década da Biodiversidade lançada pelas Nações Unidas. Às 15h30 haverá uma visita guiada por técnicos do Parque e, simultaneamente, percurso ornitológico. Em 3 de maio, às 11h00, o atelier é preenchido com a “Paparoca da bicharada” e depois do almoço a conversa do mês será sobre os animais do Parque. Nestes dias, à noite, às 22h00, há observações astronómicas, se as condições meteorológicas o permitirem.
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Anilhagem científica de aves selvagens Nos primeiros e terceiros sábados de cada mês, das dez ao meio-dia, os visitantes do Parque podem assistir a esta atividade na Quinta do Chasco de passagem pelo percurso de descoberta da natureza, se não chover. Está em causa o bem-estar animal. Orientada por anilhadores credenciados, há uma dúzia de formandos que prosseguem no objetivo de aprenderem sempre mais nesta iniciativa útil para um melhor conhecimento da população de aves da região.
Oficinas de Carnaval Para crianças e jovens dos 6 aos 14 anos. Dias 3 a 5 de março com entrada às 9h00 e saída às 18h00. Saiba mais no Gabinete de Atendimento do Parque.
Buçaco, com saída e chegada em autocarro a partir do Parque Biológico de Gaia. Em 12 de abril, também sábado, há um novo percurso de descoberta, desta vez no Parque Natural do Alvão. Em 17 de maio há também um outro percurso, centrado no Parque Natural de Montesinho, com regresso previsto às 21h00.
Noites dos Pirilampos Nas noites de 6, 7, 9 a 14, 16 a 21 e 25 a 28 de junho o Parque Biológico de Gaia recebe visitas às 22h00 para observação de pirilampos e outros animais noturnos (reserva obrigatória). Nessas noites, das 23h00 até às 23h30, há observações astronómicas. O self-service serve jantares (reserva obrigatória).
Observação de aves selvagens Percursos de descoberta Sábado, dia 15 de março, há um percurso no
Nos primeiros domingos de cada mês, das 10h00 às 12h00, leve, se tiver, um guia
Fotografia avifauna de estuário
Francisco Bernardo
Em 1 de fevereiro o salão de fotografia da natureza do Parque Biológico de Gaia acolheu a exposição “Vida Selvagem na Reserva Natural Local do Estuário do Douro”, com imagens da autoria de Francisco Bernardo, Maria Rego e Paulo Leite. A mostra pode ser visitada até fim de março, sendo depois substituída por outra exposição temática em 5 de abril.
ser do seu interesse...
Paulo Leite
de campo de aves europeias e binóculos à Reserva Natural Local do Estuário do Douro. Com telescópio, estará um técnico do Parque para ajudar os presentes a identificar as aves do litoral a partir dos observatórios ali instalados.
Receba notícias por e-mail Para os leitores saberem das suas atividades a curto prazo, o Parque Biológico sugere uma visita semanal a www.parquebiologico.pt A alternativa será receber os destaques, sempre que oportunos, por e-mail. Para isso, peça-os a newsletter@parquebiologico.pt
Jorge Gomes
Mais informações Gabinete de Atendimento atendimento@parquebiologico.pt Telefone direto: 227 878 138 4430-861 Avintes - Portugal
S Momento da abertura da exposição, da esquerda para a direita: Francisco Bernardo, Maria Rego,Paulo Leite, Nuno Oliveira e vereador José Pinto Miranda
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42 ESPAÇOS VERDES Fauna
Flora
Tortula muralis Hedw.
Musgo-parafuso-das-paredes sta é uma das briófitas do grupo dos musgos que cresce em tufos com menos de um centímetro de altura. A cor dos tufos é castanha-grisalha quando o musgo está seco por causa dos abundantes pelos hialinos (transparentes) na parte terminal de cada filídeo (órgão análogo a uma folha); quando este musgo está húmido sobressaem os tons verdeacastanhados que as células dos filídeos possuem graças aos pigmentos presentes nos cloroplastos e no citoplasma celular. Os filídeos, em forma de língua com um longo pelo na ponta, têm entre dois a 3,5 mm de comprimento, margem recurva (enrolada para o exterior) e ficam muito encaracolados quando secos. Os esporófitos (estruturas onde se formam os esporos) desenvolvem-se desde a primavera ao outono e são compostos por cápsulas cilíndricas alongadas, de cor castanha-avermelhada, com perístoma (dentes da cápsula) torcido em espiral, daí o nome de “musgo-parafuso”. Este musgo pode tolerar alguma sombra e é muito comum em todos os muros e paredes de tijolo, cimento e pedra, daí o nome científico “muralis”. Também cresce em telhas e outras estruturas estáveis construídas pelo homem, bem como em afloramentos rochosos e rochas ricas em bases, sendo muito menos comum em troncos de árvores. No Parque Biológico de Gaia surge um pouco em todos os muros rústicos e telhados mais antigos.
E Jorge Gomes
Anax ephipigger
tira-olhos migrador
Novidades
À
hora de almoço do passado dia 16 de dezembro, no percurso do Parque Biológico de Gaia, junto ao lago da Ponte Coberta, uma libélula grande
saiu a voar. Estranho! Nesta altura do ano? Assim que pousou foi possível o registo de imagem e, depois, depressa se confirmou: Anax ephipigger (Burmeister, 1839). Consultada a lista de biodiversidade do Parque Biológico de Gaia, verificou-se que esta espécie ainda não estava na lista de observações, no grupo em pauta, Odonata, constituído já por 19 espécies das cerca de 65 que são dadas para o nosso país. Feita uma consulta ao guia de campo «As libélulas de Portugal», de Ernestino Maravalhas e Albano Soares, percebe-se que se trata de uma espécie migradora, tanto que leva o nome vulgar de tira-olhos migrador. Esta libélula distribui-se pela África tropical e pelo Sudoeste asiático. Na Europa pode chegar à Islândia, dependendo dos anos.
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Encontrada nova população de planta endémica É uma planta da família das Brassicáceas que tem a particularidade de ser endémica do litoral Norte de Portugal, Minho e Douro Litoral. Habita areais marítimos, geralmente de modo disperso, podendo no entanto localmente ter populações relativamente grandes. A espécie já era conhecida desde longa data no Parque de Dunas da Aguda, onde evidencia
Cristiana Vieira
O crescimento em tufos densos desta espécie permite-lhe uma taxa de retenção de água superior à que seria conseguida pela absorção conseguida por cada indivíduo que compõe o tufo – uma estratégia de “grupo” para reservar água e sobreviver num muro exposto ao sol e onde a água não se infiltra. A relação dos musgos com a água é muito forte – precisam da água para se reproduzir, realizar fotossíntese e crescer. O aspeto dos musgos – cor, tamanho, arranjo do tufo e textura – também varia muito conforme a hidratação dos tufos e com apenas uma gota de água podemos ver (a olho nu e no espaço de segundos) grandes transformações no aspeto do musgo e até movimentos repentinos dos filídeos e caulóides. Esta rapidez de transformação é possível porque os musgos não possuem cutícula na parede celular das células e são autênticas “esponjas” que podem absorver até 20-30 vezes o seu peso seco em água: poderá comprová-lo com um aspersor no seu jardim ou muro – verá magia vegetal a ocorrer diante dos seus olhos!
uma excelente população. Este inverno foi observada numa outra duna do litoral da Madalena, onde apresenta uma população de umas dezenas de pés. Trata-se de um planta de pequeno porte com caules prostrados híspidos. As folhas são basais de penatissetas a lirado-penatissetas, híspidas e coriáceas em roseta basal ou quase. A inflorescência é laxa e geralmente prostrada, muito mais comprida que os caules e folhas, as flores têm pétalas amarelas com nervuras purpúreas bem marcadas.
Texto Cristiana Vieira e Helena Hespanhol (CIBIO – InBIO)
Coincya johnstonii (Samp.) Greuter & Burdet [Coincya monensis (L.) Greuter & Burdet subsp. cheiranthos (Vill.) Aedo, Leadlay & Muñoz Garm. var. johnstonii (Samp.) Leadlay, Bot. J. Linn. Soc. 102: 378 (1990)].
Por Henrique N. Alves
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44 ESPAÇOS VERDES
Centro de
recuperação Diversas ações de libertação de aves selvagens têm sido levadas a efeito também junto do público escolar m mocho-galego reabilitado pelo Centro de Recuperação de Fauna Selvagem do Parque Biológico de Gaia regressou à vida selvagem em Amarante, na Escola de Freixo de Cima, no passado dia 13 de dezembro. A professora Maria Emília Taveira agradece a iniciativa proporcionada: «O mocho tem o nome de Kiko e com toda a certeza vai ficar na memória das crianças da nossa escola, assim como a sensibilização para preservação e cuidado de todas as espécies que forem encontradas feridas ou órfãs. Muito obrigada!». Depois da libertação as crianças regressaram à sala de aula e fizeram os respetivos desenhos. O mocho-galego é uma pequena ave de rapina de hábitos noturnos amplamente distribuída no território português. Alimenta-se de insetos e de pequenos ratos.
U
O Parque Biológico de Gaia é parte integrante de um projeto LIFE que visa a proteção das duas espécies de cágados autóctones de Portugal. No passado dia 8 de junho foi entregue no Centro de Recuperação do Parque Biológico de Gaia um macho de cágado-de-carapaçaestriada adulto encontrado nas instalações do CIBIO-UP em Vairão. O mais provável é ter sido abandonado por alguém que o tinha em cativeiro ilegal. Feita a análise genética a uma amostra de sangue do cágado concluiu-se que este
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Grávida de risco
pertenceria à população de Boticas, perto de Chaves. Estando de perfeita saúde e boa condição corporal, foi marcado para futuro seguimento e devolvido ao seu habitat em 21 de setembro, sob o olhar atento de miúdos e graúdos preocupados com o futuro desta espécie em perigo. Esta ação teve a colaboração de Guillermo Velo-Antón, Paulo Pereira e Sónia Magalhães (investigadores CIBIOUP) e de João Pargana (ICNF-Alvão). Por Ana Mafalda Alves Foto Célia Santos
Em junho do ano passado fomos passar uns dias a Portalegre. Sábado, dia 11, quando regressávamos ao hotel, vindos de Mora, aconteceu-nos uma coisa fantástica: o meu pai travou de repente e saiu do carro muito apressado pois tinha visto uma tartaruga a começar a atravessar a estrada. Que perigo! Saímos todos do carro e qual não foi o nosso espanto quando vimos que era mesmo uma tartaruga, e bem grande. Peguei nela e a sua cabeça começou a espreitar da carapaça. Foi muito emocionante. Por momentos ficámos sem saber o que fazer mas o meu pai decidiu levá-la para o hotel. Tivemos de lhe arranjar comida e água e ficou muito bem instalada no nosso quarto. Entretanto tentámos identificá-la pois não sabíamos de que espécie se tratava. Um amigo nosso disse que não era uma tartaruga mas sim um cágado. Decidimos trazê-la para o Porto e pusemos-lhe o nome de Migas. Pelo caminho fomos pensando o que fazer com a nossa tartaruga. A minha mãe achou que não podíamos tratar dela porque entretanto disseram-nos que era anfíbia. Decidimos então levá-la a um zoológico mas lá não a aceitaram. Ainda tentámos convencer os nossos pais a adotar esta nossa amiga mas acabámos por perceber que esta não era a melhor opção. Fomos então deixá-la ao Parque Biológico de Gaia. A despedida foi muito triste e ainda tivemos tempo de tirar fotografias com a Migas. Passados alguns dias a técnica Ana Mafalda telefonou e disse-nos que a nossa tartaruga ia ter filhinhos. Foi uma notícia
espetacular – a Migas estava grávida e se calhar estava a atravessar aquela estrada tão perigosa para pôr os seus ovos. Ficámos radiantes e fomos ao Parque para saber notícias dela e ver os ovos. Aprendemos muito sobre as tartarugas e ficámos a saber que a Migas era afinal um cágado-de-carapaça-estriada, uma espécie nativa da nossa península e que está ameaçada pelas espécies exóticas que são importadas de outros países. Lemos tudo isto no livro que a Ana escreveu. Neste momento os filhos da Migas já nasceram e estão bem. Quanto à nossa Migas está à espera para regressar a Portalegre (só quando houver mais água no seu lago). Esta aventura ensinou-nos muitas coisas sobre a natureza. Temos muitas saudades da nossa Migas mas sabemos que ela estará muito melhor no Alentejo junto dos da sua espécie. Até à próxima! Texto Joana, Clara e Matilde
Já libertada
Em 7 de outubro, vigilantes da Natureza do Parque Natural da Serra de São Mamede, Glória Gaspar, Carlos Franco e Conceição Conde, libertaram a Migas no seu habitat natural: «O local foi selecionado tendo em consideração a proximidade ao local de captura e a qualidade do habitat na bacia hidrográfica do rio Sorraia/rio Tejo», informam.
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46 ESPAÇOS VERDES
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Jorge Silva
Um rouxinol viajado
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O grupo de anilhagem cientĂďŹ ca de aves selvagens em serviço hĂĄ meia dĂşzia de anos no Parque BiolĂłgico de Gaia, coordenado por Rui Miguel Brito e AntĂłnio Cunha Pereira, estende a sua atividade a outros sĂtios: o paul do Coura regista casos como o de um interessante rouxinol-pequeno-dos-caniços‌ a manhĂŁ de 7 de agosto do ano passado foi aplicada a anilha n.Âş D209970 a um rouxinol-pequeno-dos-caniços, Acrocephalus scirpaceus, na GrĂŁ-Bretanha, em Norfolk, no Holme Bird Observatory. A ave estava no seu primeiro ano de vida, segundo a anĂĄlise da plumagem da asa.* Nesse mesmo mĂŞs, dia 28, foi recapturado no paul do rio Coura, no Norte de Portugal: ÂŤEste rouxinol-pequeno-dos-caniços voou 1433 km em 21 dias! Deve ter sido por isso que a asa cresceu 4 mm em igual perĂodoÂť, diz AntĂłnio Cunha Pereira. Escusado seria dizer que este pĂĄssaro foi analisado do ponto de vista biomĂŠtrico e novamente libertado. Esta espĂŠcie migradora nidiďŹ ca em Portugal e em territĂłrio europeu. A ĂŠpoca fria do ano passa-a em Ă frica, alĂŠm do deserto do Sara. Os registos indicam que costuma chegar ao nosso paĂs durante o mĂŞs de março. Partem no ďŹ nal do verĂŁo, havendo por vezes indivĂduos de passagem atĂŠ princĂpios de novembro. O seu habitat ĂŠ especĂďŹ co: os caniçais prĂłprios das zonas hĂşmidas, onde constrĂłi o seu ninho. HĂĄ vĂĄrias espĂŠcies de rouxinol no patrimĂłnio natural portuguĂŞs. Ao todo, contam-se quatro, alĂŠm do jĂĄ referido:
o rouxinol-grande-dos-caniços, Acrocephalus arundinaceus, o nolrouxinol-bravo, Cettia cetti, o rouxinol-comum, Luscinia megarhynchos, e o rouxinol-do-mato, Cercotrichas galactotes. As sessĂľes de anilhagem cientĂďŹ ca no Parque BiolĂłgico de Gaia decorrem nos primeiros e terceiros sĂĄbados de cada mĂŞs, se nĂŁo chover, da parte da manhĂŁ, e estĂŁo abertas Ă formação de voluntĂĄrios. O Parque BiolĂłgico de Gaia colabora com a Central Nacional de Anilhagem, coordenada pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas, num projeto europeu de Estaçþes de Esforço Constante, para monitorização das aves selvagens. No parque os habitats sĂŁo basicamente orestais, portanto, bastante generalistas. Se imaginar uma ave em migração, por exemplo, vai encontrar uma maior ĂĄrea de habitats deste gĂŠnero do que na
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46 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
Jorge Gomes
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estreita distribuição das zonas hĂşmidas, que ocupam na Terra territĂłrios muito mais escassos. NĂŁo ĂŠ de estranhar, por isso, que centrando os grupos de anilhagem atividade continuada em zonas hĂşmidas, o nĂşmero de aves anilhadas recapturadas seja bastante maior do que em habitats generalistas. Ă&#x2030; curioso notar que, apesar dos poucos anos de trabalho deste grupo de anilhagem cientĂďŹ ca no Parque BiolĂłgico de Gaia, jĂĄ ocorreu a anilhagem de um pisco-de-peito-ruivo, Erithacus rubecula, que foi encontrado em Tavira, no extremo Sul de Portugal, e com anĂĄlise em curso, hĂĄ poucos meses uma ferreirinha, Prunella modularis, anilhada no Algarve foi recapturada no Parque BiolĂłgico. Entretanto, jĂĄ sabe: quando um destes sĂĄbados for passear no parque, na quinta do Chasco poderĂĄ encontrar o grupo e fazer as perguntas que quiser. Texto Jorge Gomes
S Rouxinol-pequeno-dos-caniços
* É possível ter informação sobre a idade desta espécie pelo seguinte, explica Pedro Andrade, do grupo de anilhagem: «Sobretudo pelas penas da asa. Geralmente nesta espécie os adultos fazem uma muda completa em África durante o inverno, antes de voltarem aos territórios de nidificação, mas na migração pós-nupcial, quando o indivíduo foi capturado, a muda nos adultos restringe-se sobretudo a penas do corpo. Por isso no final da época de reprodução um adulto tem as penas bastante desgastadas (elas cresceram em África no inverno, aguentaram uma migração para Norte e estarão nesse momento a aguentar uma segunda migração), enquanto um juvenil tem as penas mais "frescas" (têm poucos meses e sofreram menos desgaste, apesar de tenderem a ter pior qualidade que penas de um adulto)».
Jorge Gomes
Nos primeiros e terceiros sábados de cada mês o grupo de anilhagem científica está na quinta do Chasco, no percurso de descoberta da natureza do Parque Biológico de Gaia
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48 BATER DE ASA
aves O voo das
Abel Barreto é fotógrafo da natureza e escreve-nos depois das imagens obtidas numa salina em Aveiro
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Abel Barreto
Deparei no passado dia 14 de abril com um flamingo anilhado, pelo que envio em anexo duas imagens para que possam identificar a origem do mesmo. As imagens foram captadas nas salinas de Aveiro. Se puderem enviarme a informação com o historial do flamingo, agradecia: só por curiosidade e porque é interessante conhecer os caminhos seguidos por essas aves que são agora uma presença constante na laguna de Aveiro. Cumprimentos e continuação de bom trabalho». Sem dúvida que sim! O interesse de quem aplica anilhas é esse mesmo, o de seguir o voo destas aves selvagens. Estamos ainda dependentes de entidades que têm esses dados, mas assim que nos forem comunicados a resposta será enviada.
João L. Teixeira
Tordos
Toutinegra morta por gato
Esta anilha foi aplicada na Bélgica, na localidade de Laplaigne/Hainaut, em 28 de setembro de 2011 e levava o número 12107324. A ave selvagem em causa era uma toutinegra-de-barrete, Sylvia atricapilla, na verdade um macho adulto. A recaptura deste pássaro, morto por um gato, ocorreu em 31 de março de 2012, em Santa Bárbara de Nexe, em Faro. A distância entre ambos os pontos, o de anilhagem e o do encontro fatal com o felino, foi de 1534 km.
48 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
Em 3 de setembro Diamantino Ribeiro informa: «Só agora me foi possível comunicar o número de uma anilha que acompanhava um tordo», tordo este «abatido por caçador (eu mesmo), na penúltima jornada de caça, em fevereiro de 2013, na zona de caça associativa de Parada em Sendim da Ribeira, concelho de Alfândega da Fé, distrito de Bragança. O número da anilha é 22Z85055 – Museum sc. nat. 1000 Brussels. Tenho todo gosto em saber a história da ave», adianta. Na resposta agradeceu-se e explicou-se que só poderemos enviar novidades quando recebermos os dados pedidos à entidade que centraliza a informação. Entraremos em contacto quando isso acontecer. Uma outra anilha, esta marcada pelo código alfanumérico 22Z01924, foi recuperada por outro caçador que abateu um tordo, Turdus philomelos, em Póvoa da Isenta, Santarém. A distância entre ambas as localidades aponta 1693 km. Esta ave evidenciava plumagem própria do primeiro ano de vida quando foi anilhada em Messelbroek, Vlaams Brabant, na Bélgica, em 5 de outubro de 2012. Esta informação foi dada pelo Instituto Real de Ciências Naturais da Bélgica que agradece o contacto, pois permite «obter mais informação sobre a migração e outros hábitos próprios das aves selvagens».
OBSERVATÓRIO 49
Lua a nossa companheira cósmica Fonte de inspiração de poetas proporcionando noites românticas à luz do luar, a Lua é o astro que mais se evidencia no céu noturno e tem uma importância vital no desenvolvimento da vida na Terra
ua vem do latim Luna, e do grego, termo menos conhecido, Selene (Selhnh) que era a deusa da lua, filha dos titãs Hiperião e Teia e irmã do deus do sol, Hélio e de Eos, deusa do amanhecer. A sua origem permanece incógnita e é fonte de controvérsia, mas a hipótese mais consensual pela comunidade científica é que tenha sido formada por detritos resultantes de um impacto de proporções gigantescas entre a Terra e outro corpo do tamanho do planeta Marte, pouco depois da formação da Terra há mais de 4000 milhões de anos. Na sua constituição o nosso satélite possui um núcleo ferroso e é composto por sílica e alumina entre outros compostos em menor proporção. A Lua é o único satélite natural da Terra e é o maior do Sistema Solar em relação
L
ao planeta principal, a Terra. Tem 1/4 do diâmetro do nosso planeta e 1/81 da sua massa, por isso o sistema Terra-Lua por vezes é considerado como um planeta duplo. Uma das características marcantes e visíveis do nosso satélite é o facto de a vermos sempre com a mesma face virada para nós, isto deve-se ao facto desta ter uma rotação sincronizada com a Terra, por isso demora o mesmo tempo a completar uma órbita em torno da Terra e a rodar sobre o seu próprio eixo, dia lunar; se fosse possível observar a Lua a partir do Sol, iríamos vê-la a rodar sobre si própria e a completar uma rotação ao mesmo tempo que completava uma revolução em torno da Terra. Com uns simples binóculos, ou um pequeno telescópio, é possível vislumbrar na superfície lunar zonas mais escuras e planas conhecidas por mares, crateras de impacto
proeminentes e montanhas cristalinas. Devido à sua relativa proximidade ao nosso planeta, a Lua produz efeitos gravitacionais na Terra, o que está na origem das marés oceânicas, mas numa proporção menos evidente também aumenta o dia sideral da Terra, como que está gradualmente a “travar” a rotação da Terra. Até hoje, este é o único astro em que seres humanos caminharam à sua superfície para além do nosso planeta. Seis das missões Appolo da NASA concluíram com êxito as únicas alunagens tripuladas ao nosso satélite nos locais assinalados na foto do eclipse lunar: a primeira foi a 20 de julho de 1969 com a Apolo 11. Quem olha para o céu e contempla o nosso satélite, verifica facilmente que a porção iluminada varia ao longo do tempo, são as fases lunares. Como todos o corpos do
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50 OBSERVATÓRIO
Figura 1: esquema do sistema Terra-Lua com tamanhos e distâncias à escala Distância da Terra à Lua com a Lua no afélio = 406680 km Comprimento médio do cone de sombra da Lua = 373 410 km
sistema solar a Lua é iluminada pelo Sol e, sendo um corpo esférico, a metade virada para o Sol fica iluminada e a outra metade fica na sombra. No seu movimento de translação em torno da Terra, um observador na superfície do nosso planeta vê-a em posições diferentes da sua órbita. A fase da Lua Nova acontece quando esta passa entre o Sol e a Terra, assim vemos apenas a parte que fica na sombra. De seguida surge a fase do Quarto Crescente, ao longo do tempo no seu movimento de translação, vê-se a deslocar de Oeste para Este e quando atinge a posição em que a linha que une a Lua e a Terra e a linha que une a Terra e o Sol forma um ângulo de 90º vemos a metade direita iluminada e a metade esquerda na sombra. A fase da Lua Cheia acontece quando a Terra fica entre esta e o Sol e os três astros ficam alinhados, observamos todo o disco do nosso satélite iluminado. O Quarto Minguante surge na continuidade do seu movimento e uma nova quadratura acontece, ou seja a linha Lua-Terra e a linha Terra-Sol volta a formar um ângulo de 90º, mas desta vez no lado oposto e assim a parte iluminada visível a partir da Terra é a metade esquerda enquanto a metade direita fica na sombra. Todo este processo é repetido em cada 29 dias e 13 horas. Este período de tempo era usado pelos nossos antepassados para dividir o tempo em meses: era o mês lunar. Na verdade a utilização da astronomia para calcular datas e contar tempo remonta à Antiguidade e a Lua, para além de permitir a contagem das semanas através de cada fase lunar e os meses a cada lunação, permite também determinar os feriados volantes tais como a Páscoa. Como? De uma forma sucinta, é assim: o dia de Páscoa ocorre sempre no primeiro domingo após a primeira Lua cheia a seguir ao equinócio da primavera, como exemplo este ano, 2014 o equinócio da Primavera é no dia 20 de março, quintafeira, pelas 16h57, a Lua cheia a seguir a esta data é a 15 de Abril, terça-feira, assim no domingo seguinte
50 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
Lua no Afélio Lua no Periélio Distância da Terra à Lua com a Lua no periélio = 356 410 km
FIGURA 2: esquema da órbita da Lua à escala, representação da precessão dos nodos Órbita da Lua
Lua
Ecliptica
Terra
Nodo descendente
Nodo ascendente
Lua Ecliptica Ecliptica
Nodo ascendente e descendente
Terra
Órbita da Lua
Figura 3: geometria do sistema Terra-Lua
Ecliptica
Inclinação do eixo da Terra em relação à ecliptica 23.44º
Plano da órbita
órbita da Lua Inclinação da ecliptica 5,14º em relação à
da Lua
Distância do baricentro ao centro da Terra 4641 km Raio da Terra 6378 km
Inclinação do eixo da Lua em relação à sua órbita 6.68º
Distância da Terra à Lua 384405 km
20 de abril será o dia de Páscoa. Graças à geometria e posição relativa da Terra e da Lua, cuja distância entre os dois astros é aproximadamente 30 vezes o diâmetro da Terra, o diâmetro aparente do nosso satélite no céu é aproximadamente o mesmo que o do Sol. Isto significa que se a Lua se interpõe entre o Sol e a Terra, consegue tapar completamente a nossa estrela; caso aconteça, dá-se um eclipse do Sol, como se pode verificar na figura 1: pode constatar-se que o cone de sombra que o nosso satélite projeta no espaço tem um comprimento de cerca de 373400 km e a distância mínima entre a Terra e a Lua é de 356400 km, no periélio. Nestas condições o cone de sombra atinge a Terra como é visível no esquema de baixo da figura 1. Também a Terra projeta um cone de sombra no espaço e à distância em que se encontra a Lua, a secção circular desse cone é bem maior que o diâmetro aparente do nosso satélite; assim se esta passar pelo cone de sombra da Terra na fase da Lua Cheia, «mergulha» por completo na sombra da Terra originando um eclipse lunar. Mas porque é que não se observa sempre eclipses nas luas novas (eclipses do Sol) e nas luas cheias (eclipses lunares)? A resposta a esta pergunta está nos esquemas da figura 2 e figura 3. Como se pode ver nestas imagens, o plano
da órbita lunar não coincide com o plano da órbita terrestre, esta tem uma inclinação relativamente à Eclíptica, plano da órbita terrestre, de cerca de 5º. Devido a esta geometria os eclipses só serão possíveis se houver a coincidência de alguns fatores: é necessário que o satélite natural da Terra esteja localizado num ponto de intersecção da órbita lunar com o plano da órbita da Terra – esses pontos são conhecidos por nodos e existem dois, um no movimento ascendente da sua órbita lunar e o outro no movimento descendente, como se vê nos esquemas da figura 2. Devido a estas condicionantes, existem apenas dois períodos por ano em que estas condições ocorrem, são as estações dos eclipses. O Observatório Astronómico do Parque Biológico de Gaia organiza sessões de observação no primeiro sábado de cada mês para além de outras atividades onde são expostos de forma mais detalhada todos estes temas. Venha conhecer o observatório e explorar o espaço connosco. Siga-nos em www.facebook.com/ observatorioastronomicopbg, e informe-se das atividades desenvolvidas pelo OAPB através do telefone 227878138 ou pelo e-mail atendimento@parquebiologico.pt. Por Joaquim Gomes
Sol
ENTREVISTA 51 51 ENTREVISTA
S João Pedro Tereso: «As sementes são identificadas com recurso a lupa binocular; por sua vez os carvões são identificados com o microscópio de luz refletida, como o que se usa na geologia, para ver superfícies opacas»
Rever o passado entre
arqueologia botânica
a ea
A arqueobotânica cativou João Pedro Tereso: investigador do CIBIO da Universidade do Porto, tem um particular interesse pelas dinâmicas da utilização humana do território nos últimos três mil anos no Noroeste da Península Ibérica
s grãos escuros amontoam-se no vidro da placa-de-petri. Há grãos mais pequenos que o arroz, a maioria longilíneos: «Aquele maior e redondo é de gramínea?», salta a pergunta. João Pedro Tereso explica: «Não! É uma fava carbonizada colhida em contexto castrejo». Bem, na minha experiência, a fava é uma espécie de feijão gigante que as cozinheiras fazem caprichar na ementa. O arqueobotânico elucida: «As favas atuais são maiores e mais espalmadas. Há cerca de 3 mil anos o tamanho real seria este ou pouco mais».
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52 ENTREVISTA
S Um castanheiro assilvestrado tenderá a voltar a gerar castanhas de menor dimensão
É assim porque «os agricultores ao longo dos anos exploraram variações, como fizeram com os animais e as respetivas raças. Temos variedades diferentes de plantas cultivadas». Em vez de se alimentarem delas, selecionavam as melhores sementes para semear e, geração após geração, «aumentavam, por exemplo, o tamanho do fruto». Indaga-se: «Parecem sementes de gramíneas, aquelas longitudinais...». Desta vez bate certo: «São principalmente cevada, mas há algum trigo também». Estamos agora num laboratório da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, com meia dúzia de técnicos absorvidos por microscópios, lupas e crivos. Nesta visita, João Pedro Tereso ilustrava a conversa que tínhamos acabado de ter na sala ao lado. A primeira pergunta fora inevitável. O que é a arqueobotânica? João Pedro Tereso – A palavra decompõe-se facilmente. Arqueo significa antigo ou arcaico. E botânica, como toda a gente sabe, é o estudo das plantas. Dá para perceber que é o estudo das plantas do passado. Portanto, plantas associadas a sítios arqueológicos. Como se preservam plantas com milhares de anos? João Pedro Tereso – Há várias formas de preservação. O que é mais comum em Portugal – ou seja, no nosso clima e com os nossos solos – é a preservação por carbonização, tal como acontece na lareira lá de casa. Quando a apagamos restam carvões. Se enterrarmos esses carvões no nosso quintal
S Fava carbonizada colhida em contexto arqueológico da Idade do Ferro
daqui a dois mil anos em princípio eles estão lá. Conseguimos perceber qual foi a espécie que foi queimada. Às vezes é possível identificar ao nível da espécie, outras vezes do género, outras só da família, embora a maior parte das vezes isso não tenha a ver com preservação mas sim com o facto de as madeiras de um carvalhoalvarinho e de um negral não se distinguirem uma da outra carbonizada ou não. São muito próximas… João Pedro Tereso – São parecidas. No fundo, a carbonização é uma forma de fossilização que permite conservar as características anatómicas até hoje, seja de madeira, seja de sementes ou de frutos, como grãos de cereais, algo que é relativamente comum aparecer em contexto arqueológico. Às vezes aparecem ossos, mas isso já é zoologia, não é? João Pedro Tereso – Sim, isso é a zooarqueologia, que já é outra área. Os ossos não precisam de carbonizar para se preservarem. Se os solos não forem muito ácidos, à partida os ossos conseguem preservar-se vários milhares de anos. A sua investigação liga-se também aos furos que se fazem nas turfeiras para análise de elementos de séculos anteriores? João Pedro Tereso – Também. Esse é outro tipo de preservação. As turfeiras são ambientes muito particulares por causa da presença do Sphagnum, um musgo que altera quimicamente esse ambiente de tal forma que potencia a preservação de matéria orgânica. E o que acontece por exemplo em turfeiras do Norte da Europa?
São turfeiras bastante diferentes das nossas. São maiores, mais profundas, onde se preservam por exemplo carroças! Carroças com dois mil anos, da Idade do Ferro. Preservam-se inteiras, intactas. Acontece o mesmo com corpos de pessoas, o homem de Tollund é dos mais conhecidos. Descobriram-no com capuz na cabeça e uma corda ao pescoço, sem mais roupa nenhuma, assim intacto. Parecia até que tinha sido morto se calhar duas semanas antes. Era da Idade do Ferro, anterior à época romana. Teria sido executado? João Pedro Tereso – É uma grande discussão… mas em princípio foi executado. Não sabemos porquê. Naquela altura qualquer razão servia. João Pedro Tereso – Sim, mas o que interessa é que estes casos revelam um nível de preservação excecional. As nossas turfeiras não têm essas características, não são tão profundas, não são tão desenvolvidas e, por isso, são bons contextos para colheita de pólenes e de outros elementos orgânicos, exatamente porque se criam condições anaeróbicas que potenciam a preservação desses materiais. Os poços também. Imagine-se um poço romano – pode encontrar-se lá restos de lixo, de sementes. São situações excecionais: a maior parte das vezes resta o carvão, das fogueiras, dos fornos… Se pensarmos que as sociedades rurais até à utilização da eletricidade dependiam do fogo para muita coisa, para se aquecerem, para iluminar o local em que viviam e para se alimentarem... Tudo isso produz resíduos. João Pedro Tereso – Esses resíduos são
Paleolítico
Mesolítico
Neolítico
Calcolítico
Idade do Bronze
Idade do Ferro
800000 - 10000 a. C.
9000 - 5500 a. C.
5500 - 3000 a. C.
3000 - 2200 a. C.
2200 - 500 a. C.
Século V a século II a.C.
Pré-história
S Sementes de consumo humano retiradas de escavações arqueológicas
S Pequenos bocados de carvão colhidos em escavações arqueológicas
Direitos reservados
identificados e servem vários objetivos: por exemplo, perceber que vegetação existiria à volta daquele sítio, quando essas pessoas viviam lá, embora aí seja só o que eles selecionavam para queimar – aquilo que eles não selecionavam para queimar não aparece, isso é um problema para as nossas interpretações, mas permite-nos saber o que comiam. Por exemplo, se se torrar grãos, se há um acidente, ou se se torrar bolotas ou castanhas, se estas torraram demasiado, já não as vamos comer. O que acontece? Carbonizou-se, como as nossas castanhas. Quando nos esquecemos delas ficam pretas e já não as comemos. É isso que detetamos. Conseguimos perceber um pouco o que seria a alimentação daquelas comunidades, que agricultura é que faziam. A arqueobotânica permite muitas abordagens. É uma disciplina científica recente? João Pedro Tereso – A arqueobotânica em Portugal é relativamente recente. É triste dizermos isto em relação a muitas áreas científicas, mas de facto também não é sempre assim. Embora haja estudos anteriores, só na década de 1980 é que Pinto da Silva, que foi um grande botânico, fez estudos de arqueobotânica, embora não os fizesse de forma sistemática. Produziu alguns estudos a pedido de arqueólogos, isto antes da década de 80. Deve-se citar a professora Isabel Figueiral no estudo dos carvões. Ela foi a primeira pessoa que começou a fazer investigação efetivamente em arqueobotânica. Os estudos de palinologia da serra da Estrela são históricos, inauguraram a disciplina,
Época Romana
Idade Média
Idade Moderna
Idade Contemporânea
137 a.C. a 411 d.C.
Século V a século XV
Século XV a século XVIII
Século XVIII em diante
História
54 ENTREVISTA
com boas amostragens, com metodologia correta. Estes trabalhos não ficaram isolados, conseguiram juntar-se a um conjunto de pesquisas, inclusive da Universidade de Santiago de Compostela, o que dá uma coerência que não encontramos noutras regiões. Permite acumular dados de diferentes origens. Destaca-se aí também o papel da Universidade do Porto e da Universidade do Minho. Neste momento temos um défice de informação acerca dos vários temas que temos abordado em investigação. Infelizmente há muito poucas pessoas a trabalhar em Portugal na arqueobotânica. Diria que, a trabalhar em instituições portuguesas, são meia dúzia de pessoas só. No nosso laboratório temos dois terços das pessoas que trabalham nesta área em Portugal. São projetos que quando terminam é difícil manter as pessoas, mas por enquanto vamos trabalhando. Que chamamento sentiu para se dedicar a esta disciplina científica? João Pedro Tereso – Sou arqueólogo de formação. Como tal, o que me motivava era a curiosidade. Não sei se sou bom cientista, mas eles têm isso em comum. Nunca se falou tanto como hoje em tornar a ciência rentável, mas a verdade é que o que move as pessoas que fazem grandes descobertas é essencialmente a curiosidade. A minha curiosidade veio de saber como as pessoas viviam no passado e tentar tirar alguma lição daí. Estamos num mundo de grandes mudanças. Mudanças do ponto de vista ambiental mas também do ponto de vista social e acredito que é útil ter-se uma perspetiva temporal mais ampla para nos conseguirmos enquadrar melhor nesta dinâmica. A arqueobotânica é um dos elementos, uma dessas peças. A arqueologia, a história, cada vez mais são ciências multifacetadas que exigem várias disciplinas a trabalhar ao mesmo tempo sobre realidades diferentes para, no final, juntar muita informação e ter uma perspetiva do que é que se passava ali, como evoluíram, como chegamos ao que existe hoje. É como um puzzle: enquanto não estiverem lá as peças todas não está completo. O cidadão comum dirá decerto, muito bem, mas para é que isso serve? João Pedro Tereso – Se é uma oposição à ignorância é sempre útil. Se produz
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conhecimento é sempre útil. O que fazem as pessoas com o conhecimento? Depende em parte de nós mas não totalmente. Por exemplo, nem sempre vemos o conhecimento gerado pela investigação refletir-se nos manuais escolares. Todos temos de participar nesse debate, mas não é minha responsabilidade atualizar manuais escolares. Temos de pensar que quem atualiza os manuais escolares tem de estar a par do que se está a fazer na investigação científica. No sentido de que a ignorância é sempre pior que o conhecimento, quem produz conhecimento está a produzir algo que é útil, mesmo que não produza diretamente um bem, mesmo que esteja relacionado com áreas que se consideram mais úteis, como a medicina, e outras que acabam por verter para o mundo empresarial. Nem só de pão vive o homem e a ciência não é só isso. Temos de saber o que somos e temos de saber como evoluímos. O conhecimento é uma coisa fascinante! É possível então, por exemplo, saber de que se alimentavam os povos castrejos antes das invasões romanas? João Pedro Tereso – No âmbito do meu doutoramento abordei principalmente a época castreja, o Bronze Final e a Idade do Ferro, alturas em que se desenvolvem grandes castros e que engloba também a época romana. De facto, temos hoje uma ideia mais clara da sua ementa. É difícil perceber como é que comiam, mas alguns dos alimentos que eles comiam, isso sabemos na parte daquilo que se preservou até hoje. Usavam trigo? João Pedro Tereso – Os vestígios da utilização de trigo na Península Ibérica mais antigos são de há cerca de 7 mil anos, é portanto anterior aos castrejos. A agricultura desenvolveu-se no Próximo Oriente e, a partir daí, disseminou-se pela Europa e foi relativamente rápida a sua chegada ao nosso território. Por isso, desde cedo que temos agricultura. Quando chegamos ao auge dos grandes castros, que é no final do século II a.C., temos uma agricultura bem desenvolvida, com uma certa diversidade de espécies. Estamos a falar de pelo menos duas ou três espécies de trigo, duas espécies de cevada, estamos a falar de algo que se chama milhomiúdo… Milho?
João Pedro Tereso – Não confundir com o milho americano. Este milho-miúdo veio dar depois o nome a esse milho de além-mar. O milho-miúdo chegou na Idade do Bronze à Península Ibérica, por volta de 1800 a.C., é asiático. Também se vende hoje para consumo humano, chamam-lhe agora millet. Parece que o que antigamente era a comida dos pobres hoje é gourmet. O centeio era o pão dos pobres! Comiam o centeio e vendiam a farinha de trigo. Atualmente, o pão de centeio é mais caro. Nesse tempo o centeio ainda não tinha chegado cá, mas temos a fava – era a mais cultivada e mais adaptada a este clima atlântico –, a ervilha. A lentilha está cá desde o início da agricultura… Temos pouca informação sobre as leguminosas, mas juntando outra informação que temos da Península Ibérica sabemos que o grão-de-bico era cultivado, assim como a ervilhaca. Depois há o linho, que produz fibras, mas também as suas sementes são comestíveis, é uma oleaginosa. E a bolota consumida, era sobretudo a de carvalho-alvarinho? João Pedro Tereso – A bolota era um dos alimentos consumidos, sim, quer a de carvalho, quer a de sobreiro, quer a de azinheira, mas distinguir as bolotas dessas épocas é difícil. É certo que ao olharmos para uma bolota de sobreiro vemos que é maior, mas é
Between Archaeology and Botany João Pedro Tereso is an Archaeobotanist. He is interested in the study of the evolution of the landscape in the Holocene 12,000 years ago to the present time - and how rural Communities lived in those days. He collaborates with CIBIO of the University of Porto, on a Ph.D. subject called «Interaction between climatic variations, landscape evolution and dynamics of human land use in the last three millennia in North Western Iberia».
complicado: as bolotas que encontramos em contexto arqueológico estão descascadas. Classificar ADN em material carbonizado não resulta bem e é caro. Tiram-se sequências incompletas, o que torna difícil a interpretação. Viviam principalmente de bolota, dizia-se. Confirma? João Pedro Tereso – Durante décadas foi isso que se pensou das populações castrejas. Era assim porque um escritor grego, Estrabão, no final da conquista romana da Península Ibérica, escreveu sobre o que ele chamava os povos da montanha, os montanheses do Norte. Dizia que viviam dois terços do ano de bolota. O que é que acontece? É algo comum. Os romanos pretendem minimizar as populações que são conquistadas para dar aos próprios romanos um papel mais relevante do que uma simples conquista militar, ou seja, os romanos são aqueles que trazem a civilização à barbárie. Por isso tem de se retratar os invadidos como menos desenvolvidos. Para os romanos era importante a tríade mediterrânica: o trigo, o azeite e o vinho. Chegam a uma região em que provavelmente não se cultivava a oliveira, em que o vinho era consumido – há ânforas que atestam que há comércio, que o vinho era trazido para cá – mas se era cultivado, e não era totalmente claro que o fosse, se era seria
em quantidade muito pequena. Alega-se que eles beberiam uma bebida semelhante à cerveja. É possível: Estrabão também fala disso. Dois dos elementos importantes na sua cultura aqui na península teriam pouco relevo, o vinho e o azeite. Para inferiorizar as comunidades peninsulares descrevem-nas como vivendo principalmente de bolotas, de um recurso silvestre: mais uma vez associase a agricultura a civilização. De facto, verifica-se que nos primeiros trabalhos arqueológicos feitos no Noroeste de Portugal apareciam as bolotas. Também apareciam outras coisas sem ser bolotas, mas apareciam mais estas do que tudo o resto. Hoje em dia o panorama mudou: há muito mais do resto do que bolotas! É assim porque se começou a trabalhar de outras formas. A bolota é um fruto grande. Quando se escava sem recolher amostras de forma adequada para os estudos de arqueobotânica, só se recolhe aquilo que se vê. Isso restringe-se a objetos grandes como as bolotas. O milho-miúdo de que falei estou convicto que era um dos principais cultivos desde o início do período castrejo, mas são grãos que têm um milímetro. As pessoas consumiam-no sem casca. Os arqueólogos não viam isso durante a escavação. Acontecia o mesmo com o trigo e demais cereais: como se escavava antigamente,
com pouca atenção, viam-se só os objetos maiores. Parecia que a arqueologia confirmava Estrabão. Quando se começaram a fazer escavações com as metodologias atuais começouse a perceber que não seria assim. Pelo contrário, tinham uma agricultura bastante desenvolvida. Os estudos palinológicos têm sido feitos abundantemente no Noroeste peninsular, principalmente na Galiza, que é um local com contexto mais propício a esse tipo de estudos. Esse trabalho tem vindo a demonstrar que, mesmo antes do auge dos grandes castros, já tinha havido grandes fases de desflorestação. Quando os romanos chegaram, o território não estava coberto de amplas florestas. Nessas épocas usava-se lenha para tudo… João Pedro Tereso – E não só: precisavam de abrir áreas grandes para pastagens. Usava-se fogo. Desde o Neolítico que tinham cabras, ovelhas, vacas e porcos por cá. Agora não temos por hábito pastá-los, mas eram levados a pastar. Por isso grandes castros juntam muitas pessoas e estas implicam muitos campos agrícolas, muitas pastagens, muita lenha. Tudo isso leva a uma grande desflorestação. Se há uma coisa que os estudos arqueobotânicos que temos vindo a realizar evidenciam – sejam estudos de carvões sejam estudos das sementes para
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56 ENTREVISTA W Separar as sementes dos carvões é moroso, tem de se ver partícula a partícula, e por exemplo um grão milho-miúdo pode medir apenas 1 mm
perceber que agricultura é que as pessoas tinham, juntamente com os tais estudos de palinologia que demonstram melhor a evolução da paisagem na região – é que o sistema produtivo que foi evoluindo desde a Pré-história até aos dias de hoje nunca foi sustentável. Na Pré-história andava-se nos limites da sustentabilidade pela circunstância de haver poucas pessoas, de haver ainda pouca produção. A partir do momento em que há um aumento de população os problemas surgem ou tornam-se mais agudos. É por isso que os sistemas agrícolas nunca foram sustentáveis na região. Baseavam-se num sistema de queima e de roça. Sabemos que o fogo pode ser usado de forma inteligente para renovar a fertilidade dos solos, mas o seu uso frequente leva a um desgaste grande dos solos. Como acontece ainda hoje, não é? João Pedro Tereso – Sim. Outro tipo de estudos, os sedimentológicos, têm demonstrado que, associado a esses fogos que começam logo na Pré-história e que se vão agravando ao longo do tempo, associado a essas grandes desflorestações há grandes fases erosivas. Os solos vão-se perdendo. É por isso que acredito que os sistemas nunca foram sustentáveis. E mais uma vez voltamos ao tema inicial, para que é que isto serve? Põe-nos um pouco em perspetiva. Não quer dizer que nos desculpe. Permite-nos compreender como chegamos até aqui e quando ouvimos o discurso do «antigamente é que era bom, antigamente é que as pessoas viviam em harmonia com natureza», isso não é verdade. Portugal é uma mina de dados
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arqueobotânicos a ser explorada? João Pedro Tereso – O próprio mundo é uma mina de dados e Portugal, sim, sem dúvida, principalmente porque há tão poucos estudos, tanto por fazer. Isto também dificulta muito. Às vezes obtemos dados e é difícil enquadrá-los. Mas isso também só aumenta a nossa responsabilidade porque, quem vier no futuro, vai adquirir dados e vai ter de enquadrá-los com os nossos e, nesse sentido, têm de ser bem divulgados. Isso é uma responsabilidade nossa, aqui no laboratório, e é uma responsabilidade dos arqueólogos que vão escavar no campo e que têm de obter esses dados. A verdade é que, mesmo que não tenham condições para montar um projeto para se conseguir estudar tudo, devem fazer, pelo menos, recolhas. Porque estas podem ser estudadas naquele ano, ou dois anos, ou dez anos depois, até que alguém consiga pegar nesses materiais para serem estudados. Mas se não recolherem… Podem desaparecer? João Pedro Tereso – Desaparecem. A escavação é um ato de destruição. Se quem está a escavar não recolher amostras... está escavado. Não volta a ser escavado! A terra desapareceu. Meteram os muros à mostra, as estruturas, mas a terra que estava a cobri-los, que tinha os dados – estes estavam na terra – desapareceu. Por isso apelo a que façam recolhas. Não têm dinheiro para pagar o estudo, não há problema. Façam as recolhas. Não há dinheiro agora, se calhar daqui a uns anos há. E daqui a uns anos alguém estuda. Estamos na década da biodiversidade. A
arqueobotânica enquadra-se no espírito desta década? João Pedro Tereso – Sim. Os resultados destes estudos permitem-nos equacionar todos os conceitos que tínhamos, por exemplo, acerca do que é exótico e do que não é. Questiona-se se o homem é um agente disseminador como outro qualquer ou não. Isso diz respeito à nossa evolução. Costumamos pensar no presente como se fosse o auge deste processo, desligado do passado e do futuro. Muitos destes processos começaram há milhares de anos. Só estamos a conseguir medir de há seis décadas para cá. Os processos ecológicos do presente estão entre o passado e o futuro. A arqueobotânica demonstra esta realidade. Já se esclareceram algumas dúvidas. Um dos primeiros casos foi o do pinheirobravo, Pinus pinaster, que agora se sabe não ser exótico. Não se distribuía decerto por todo o país, como os pinhais que temos hoje em dia. É uma monocultura, cultivada. João Pedro Tereso – Exatamente, a espécie é autóctone, apesar da formação florestal que existe hoje em dia dominada por essa espécie não o ser. Outro caso paradigmático é o castanheiro. De facto, é autóctone. Há uns anos dizia-se que tinham sido os romanos a introduzi-lo... João Pedro Tereso – Já não é assim. Quando apareceram em estudos palinológicos e foi identificado o seu pólen em épocas mais antigas que a romana, começou-se a dizer que eram os povos castrejos quem o tinha introduzido. É certo que houve grandes extinções. É por isso que classificar o que é autóctone do que não é pode ser problemático. Se houvesse maior comunicação entre disciplinas científicas não veríamos, como acontece por vezes, em contexto periférico, artigos científicos a referir o castanheiro como introduzido. Esta falta de contacto é uma ameaça à ciência... Texto Jorge Gomes Fotos João Luís Teixeira
IMPAR 5757 REPORTAGEM
Famalicão
Parque da Devesa
ufos de plantas aquáticas, emergem do espelho de água e sinalizam-no. São as âncoras visuais que cativam o olhar de quem passeia no mais recente e maior parque público de Famalicão, o Parque da Devesa. «Tem havido muita chuva, a terra está encharcada», refere Manuela Araújo, a arquiteta coordenadora de uma equipa multidisciplinar que tem a seu cargo a gestão deste espaço verde. De facto, a superfície líquida do lago rasteja sobre o prado quando nos abeiramos da margem. Um teste às botas: aguentar-seão? O lago «é uma atração enorme para os visitantes, sobretudo no verão». Do céu atulhado de nuvens vêm agora a voar meia dúzia de patos-bravos que rodam e aterram no lago: «Tudo o que aqui está veio cá parar», aves, coelhos e, atenção, no rio Pelhe que atravessa o parque «há lontra», claro, difícil de ver. O rio Pelhe, depois de nascer no próprio concelho famalicense, em Portela, atravessa o parque, e depois há de desaguar no Ave. «A parte da biodiversidade vai ter de ser cuidada», adianta Manuela Araújo. «Vamos ter de criar nichos e pequenos abrigos»,
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C Com pouco mais de d um ano de idade, o Parque da Devesa conta 27 hectares e fica em plena cidade de Vila Nova de Famalicão
S Moinho transparente
isolados dos visitantes para melhorar essa mais-valia. A chuva miúda não afasta toda a gente da Devesa, há quem ali corra. Em país habituado a muito sol, parece estranho ir a um parque com chuva molhatolos, como se dizia quando era pequenito, mas no Norte da Europa isso é habitual. De qualquer das maneiras, o certo é que «as pessoas apropriaram-se do parque, adotaram-no imediatamente, e nós queremos que a população faça parte dele, é necessário envolver as coletividades e desenvolver voluntariado», diz. Quem projetou este espaço foi o arquiteto Noé Diniz, sob a égide do Município famalicense. O trilho junto do rio aproxima o visitante de uma estrutura transparente, que poderia ser confundida ao longe com uma pequena estufa: «Aqui no rio havia um moinho de água que entretanto já estava muito degradado». Noutro tempo, o engenho servia a população que ia ali moer milho e centeio. Com base nisso, «o arquiteto Noé Diniz fez um moinho pedagógico, transparente». Reunidas diversas quintas que já não estavam a ser exploradas, foi necessário arrancar vegetação infestante: «Havia muitas
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S O anfiteatro serve a vertente cultural e chega a juntar cerca de três mil pessoas
acácias e outras espécies sem interesse» que foram retiradas. Aproveitada a flora útil, incluindo arvoredo ornamental e espécies autóctones, como o carvalho-alvarinho, uns poucos sobreiros, amieiros, freixos e salgueiros, plantaram outros tantos. Agora, estão a crescer. Ao longo do passeio que ali der vai encontrar várias obras de Gonçalo Mabunda, um escultor moçambicano. Granítico, um velho arco faz uma tangente ao caminho calcetado: era «a porta de entrada da quinta de Vilar», onde hoje existem vários edifícios com funções variadas, nomeadamente um restaurante. Na verdade, são a «reconstrução de casas rurais que já existiam». Acolhem no seu interior desde exposições a, no setor da educação ambiental, ateliers pensados para todo o ano letivo. A maior procura chega das escolas, do ensino pré-escolar, sem esquecer também o ensino especial e a participação de grupos de idosos. Passo a passo, um estorninho traça uma trajetória no céu plúmbeo enquanto se ouve ao longe um tordo a cantar.
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Já antes um rabirruivo tinha pousado a poucos metros, perto de um tentilhão. No parque há também um anfiteatro ao ar livre, que no verão tem muito movimento na área cultural: «Chegam-se a juntar ali cerca de três mil pessoas, uma parte delas fica de pé, claro», diz Manuela Araújo que confidencia ter uma «grande paixão pela área ambiental», porém, «mais dos meus tempos livres do que por vínculo profissional». Num vidoeiro próximo há uma mão-cheia de chapins. No relvado, apesar da chuva miúda, um melro está de olho nas minhocas mais descuidadas. Um cenário destes já deveria ser antigo nas redondezas, até mesmo na época pré-romana: «Temos aqui serviços de arqueologia: entre outros motivos de interesse, existe uma reconstrução do balneário de origem castreja». Noutro ponto do passeio passa-se por pequenos talhões de cultivo: «Temos as hortas biológicas também». Deseja-se «dar a conhecer métodos amigos do ambiente. Estas hortas são cultivadas por famílias, embora também haja as hortas solidárias».
Nas últimas, o produto é oferecido a instituições de solidariedade social. A curto prazo, o Parque da Devesa vai lançar a Semana das Camélias. Orgulha-se também de abrigar no seu recinto algumas camélias centenárias. No programa preveem-se iniciativas variadas, desde um concurso de fotografia
S Antiga porta da Quinta de Vilar
cujo prazo termina em 28 de fevereiro, passando por uma competição entre montras comerciais da cidade e arranjos de camélias, até uma mostra de produtos manufaturados à base de camélias. Aberto ao público em 28 de setembro de 2012, verificou-se uma grande adesão». Não admira, «este espaço verde responde
a expectativas antigas da população, já com cerca de 50 anos». Além disso, desempenha uma «função importante no lazer das pessoas, quer para atividades de passeio a pé ou de bicicleta, quer unicamente para desfrutar da natureza» e assim reduzir o stress tão premente nos dias que correm.
Este espaço verde «veio valorizar a cidade, apesar de ter outros jardins e parques públicos, mas não tão grandes». Por isso, quando for a Famalicão, já sabe: o Parque da Devesa espera também por si. Texto Jorge Gomes Fotos João Luís Teixeira
T As casas rurais existentes foram adaptadas para espaços de exposição e trabalho
Parque da Devesa Rua Fernando Mesquita-Antas, n.º 2685 4760-034 Vila Nova de Famalicão Horário Verão (22 de Março - 31 de Outubro) 6h00 - 24h00 Inverno (1 de Novembro - 21 de Março) 6h00 - 22h00 Telefone (351) 252 374 184 Correio eletrónico parquedadevesa@vilanovadefamalicao.org
www.parquedadevesa.com www.facebook.com/parquedadevesa
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Parque Natural da
Arrábida Criado em 1976, este parque natural cobre cerca de 17 mil hectares distribuídos entre os concelhos de Palmela, Sesimbra e Setúbal: o seu património natural engloba «valores geológicos, florísticos, faunísticos e paisagísticos locais, bem como testemunhos materiais de ordem cultural e histórica»
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Parque Natural da Arrábida This Park is one of the rare examples of Mediterranean bush in Portugal. Near Setúbal and the fishing town of Sesimbra, the Arrábida Natural Park has incomparable natural beauty, with its chalk cliffs and the depth of the green vegetation that cover the mountain range.
O Convento da Arrábida ganha forma no século XVI pela vontade de monges franciscanos
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á do alto, a serra espreita o Atlântico. Parece prisioneira de uma paixão telúrica. Altaneira, vestida de matagal mediterrânico, desliza encosta abaixo e abraça o mar. Este território com estatuto de proteção é uma unidade geomorfológica – a cordilheira da Arrábida – assente em três eixos: «o primeiro, composto por pequenas elevações nos arredores de Sesimbra, pelas serras do Risco e da Arrábida e pelas colinas existentes entre o Outão e Setúbal; o segundo é formado pelas serras de São Luís e dos Gaiteiros; e o terceiro formado pelas serras do Louro e de São Francisco», lê-se em informação cedida pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). Com a altitude máxima de 500 metros, esta cordilheira tem um comprimento de cerca de 35 mil metros e uma largura média de seis quilómetros. Basicamente moldada em calcário, convergem neste parque natural três elementos florísticos: «o euro-atlântico, mais fresco, húmido e sombrio nas vertentes a norte; o mediterrânico, mais quente, seco e luminoso nas vertentes expostas a sul; e o macaronésio nas arribas marcadamente marítimas». Moldada essencialmente em calcário, tornase um local rico em orquídeas selvagens: estão cerca de 30 espécies desta família referidas para a área. Em boa parte coberta por matagais arborescentes mediterrânicos, onde pontua o carrasco, Quercus coccifera, a serra da Arrábida distingue endemismos peculiares. É isso que ocorre com uma eufórbia em particular, a Euphorbia pedroi, e com uma chapeleta, a Convolvulus fernandesii. Abriga matas como a do Solitário, a da Coberta e a do Vidal, nas encostas abrigadas voltadas a sul. O porte arbóreo que as caracteriza está salvaguardado pelo estatuto de Área de Proteção Total. Além destas florestas da Europa temperada outros habitats constantes da diretiva europeia estão contemplados neste espaço. É o caso dos habitats rochosos e grutas, espaços naturais vitais para espécies de morcego ameaçadas. Há também no parque prados naturais e dunas marítimas e interiores. A esta variedade de coberto vegetal associase uma vastidão de pequenos animais invertebrados.
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S Orquídea selvagem, Barlia robertiana
Atraída pelas sementes e frutos, tornase um ponto fulcral de biodiversidade na Europa, sobretudo se tivermos em conta as migrações da avifauna. Este parque natural é um excelente local para a observação de aves e junta recursos importantes para a realização de pesquisas sobre interações entre aves migradoras e plantas mediterrânicas. Rapinas diurnas como a águia-de-bonelli, Hieraaetus fasciatus, a águia-de-asaredonda, Buteo buteo, o peneireiro-comum, Falco tinnunculus, e demais rapinas
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T Carrasco, Quercus coccifera
ameaçadas que nidificam nas falésias merecem destaque na avifauna do parque natural. Estes habitats são também local para a ocorrência de um vasto grupo de outras aves, concretamente da águia-pesqueira, Pandion haliaetus, o bufo-real, Bubo bubo, do corvo-marinho-de- crista, Phalacrocorax aristotelis, e do pombo-das-rochas, Columba livia. O cabo Espichel, situado neste território, revela ser um dos troços mais relevantes entre as rotas preferenciais de migração de aves selvagens. Os habitats marinhos que se estendem nas faldas da serra, imersos no mar, «contribuem para que este seja um hotspot de biodiversidade – local excecional do ponto de vista dos índices de biodiversidade à escala europeia com mais de 1400 espécies registadas». Trata-se da reserva criada em 1998, o Parque Marinho Prof. Luiz Saldanha, área em que se encontram numerosas espécies de plantas e animais marinhos. Embalada pelas ondas do Atlântico, só de
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João L. Teixeira
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W Euphorbia characias
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W Campainhas Narcissus bulbocodium
W Phlomis purpurea
algas, contam-se cerca de 70 espécies, e o seu património ictiológico, que se refere aos peixes do sítio, é reconhecidamente valioso. Ao longo dos séculos perdeu lobos, javalis e veados, mas quando aquecer não será difícil ver em voo uma eventual representante da biodiversidade do
parque: uma borboleta amarelada de nome vaidoso, a cleópatra, Gonepteryx cleopatra. Sem perigo de divórcio para quem for casado, se seguir atrás dela, encontra no parque natural algumas destas paisagens de sonho à sua espera.
MUSEU OCEANOGRÁFICO ver por favor reportagem publicada na revista PARQUES E VIDA SELVAGEM n.º 36, páginas 42/44, verão de 2011
Parque Natural da Arrábida Centro de Interpretação Praça da República 2900-587 Setúbal
Telefone (351) 265 541 155
www.icnf.pt
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animais
Acidentes rodoviários com Análise aos acidentes ocorridos no ano de 2013 na área da GNR
A Guarda Nacional Republicana registou no ano de 2013, 1799 sinistros rodoviários em todo o país, envolvendo colisões ou atropelamentos de animais, tendo resultado desses acidentes, a morte de cerca de dois mil animais domésticos ou silvestres
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da morte do animal e danos nas viaturas e raramente ferimentos nos ocupantes das mesmas. Também não foi esse acidente que motivou a elaboração do presente estudo, cujas conclusões, apresentamos neste artigo. O estudo deste tema surgiu da necessidade, verificada por parte do Comando Territorial de Évora, em analisar os acidentes rodoviários com animais, registados na sua zona de ação, tendo em outubro de 2013 procedido á análise de todos os acidentes, concluindo-se nessa altura que o assunto pouco ou nada tinha sido estudado, quer no pais ou fora, não existindo também qualquer estudo científico que revelasse, aquilo que aqui apresentamos. Como corolário das conclusões conhecidas na altura, pretendeu-se também apresentar um conjunto de comportamentos, que os condutores poderão adotar na estrada, de
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erca de metade dos animais mortos foram cães, onde também os animais silvestres se encontram em grande número, na sua maioria javalis, raposas e veados. Infelizmente as consequências a lamentar não são só a morte dos animais, apesar de na sua grande maioria, não ir para além dos danos nas viaturas, temos também a lamentar em 4,5% dos 1799 acidentes que ocorreram na área da GNR, ferimentos ligeiros em 77 condutores e/ou passageiros e ferimentos graves em três, não tendo sido registada qualquer vítima mortal. Mas na mente do leitor está certamente o acidente ocorrido no dia de Natal de 2013 na Estrada Nacional nº 114, entre Évora e Montemor-o-Novo e que envolveu a colisão de dois veículos ligeiros de passageiros, após um deles ter colidido com um cavalo à solta, provocando quatro mortos e quatro feridos graves. No entanto este acidente não foi incluído no presente estudo, uma vez que não foi registado pela GNR, tendo ocorrido na área á responsabilidade da PSP de Évora. O acidente atrás referido foi o de maior gravidade ocorrido em todo o ano de 2013 e possivelmente as suas trágicas consequências, terão resultado da colisão entre as duas viaturas envolvidas e não em consequência do embate de uma das viaturas com o cavalo. Este acidente é a exceção à regra, uma vez que os acidentes com animais, conforme atrás referido, não provocam outras consequências, para além
modo a evitar os acidentes com animais e evitar as consequências resultantes, quer para os animais, quer para as pessoas e viaturas, informação essa que também verificámos, na altura, não existir, sendo por isso as mesmas fruto da experiência e da análise, por analogia, dos embates de viaturas com obstáculos nas vias. Conforme já referido o presente estudo agora divulgado teve como objetivo analisar todos os acidentes ocorridos em Portugal no ano de 2013, na área da GNR. Assim e como primeira conclusão, verificouse que o período do dia onde existe maior probabilidade de ocorrerem acidentes com animais é entre as 18h00 e as 24h00, por ser o período do dia em que há um aumento na circulação do trânsito rodoviário, com a maioria da população a regressarem a casa depois de um dia de trabalho, sendo também a altura do dia em que os animais estão mais ativos, especialmente os animais silvestres, tendo neste período ocorrido 44% da totalidade dos acidentes. Como segunda conclusão, constatou-se que as estradas nacionais são aquelas onde ocorrem 38% dos acidentes, seguido dos itinerários principais com 31%. No entanto nem todos os distritos apresentam estes resultados, existindo distritos onde é nas autoestradas, que ocorreram a maioria dos acidentes, por terem uma maior rede desse tipo de vias. Esses distritos são o de Lisboa com cerca de 66%, o distrito do Porto com cerca de 62% dos acidentes com
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animais a ocorrerem nas autoestradas e o de Braga com 55%. Estes dados podem ser influenciados pelo facto da GNR não ter jurisdição no interior das cidades e por isso não estarem contabilizados os acidentes ocorridos no interior das mesmas. Também se concluiu que no que diz respeito aos meses do ano, o mês de janeiro foi o que registou maior número de acidentes com cerca de 13%, mas a diferença para os restantes meses não é significativa, verificando-se o mesmo com os dias da semana, sendo a sexta-feira o dia com mais acidentes, representando 16%, variando os restantes dias da semana entre 12% e 14%. Os animais que provocaram os acidentes de maior gravidade foram os cães, com 45% dos feridos, seguido dos javalis e dos bovinos, ambos com 18%, sendo que dos acidentes com cavalos, resultaram 11% dos acidentes com feridos.
Os distritos com maior probabilidade de se encontrarem javalis na estrada são os distritos de Setúbal, Castelo Branco e Évora, com mais de metade do total dos acidentes (52%) e de encontrar equídeos são os distritos de Faro, Beja, Braga, Setúbal, Viana do Castelo e Vila Real, sendo que nestes distritos aconteceram cerca de 80% dos acidentes com estes animais. Também as ovelhas podem ser encontradas com maior probabilidade nos distritos de Castelo Branco e de Évora, sendo estes distritos responsáveis por 37% de todos os acidentes provocados por ovelhas. Assim e especialmente nos períodos e locais atrás indicados e que apresentam maior probabilidade de se encontrar um animal na estrada é recomendável que se circule com precaução redobrada, reduzindo a velocidade e cumprir a sinalização indicadora de perigo de travessia de
animais, domésticos ou silvestres. No entanto quando se encontra um animal na estrada deve-se proceder do seguinte modo: – Evitar buzinar ou fazer sinais de luzes, porque ou assustam o animal ou encadeiamno; – Evitar os desvios bruscos (guinadas) que podem fazer com que a viatura se despiste; – Quando se avista um animal, deve reduzirse a velocidade gradualmente até que se possa contorná-lo em segurança; – Se não puder evitar o choque, no momento do embate não trave nem se desvie, já que com a travagem, a frente do carro baixa e se for um animal de grande porte pode ser projetado para o vidro parabrisas; – Sempre que avistar um animal na estrada deve imediatamente comunicar esse facto à GNR, mesmo que o animal se encontre à
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beira da estrada, para que seja recolhido; â&#x20AC;&#x201C; TambĂŠm deve ser contactada a GNR sempre que encontre um animal morto na estrada, para que seja retirado da mesma. No caso dos animais domĂŠsticos os proprietĂĄrios dos animais incorrem numa coima prevista no nÂş 6 do artÂş 97Âş do CĂłdigo da Estrada de 30 a 150 euros, por permitir que o animal vagueie pela via pĂşblica fazendo perigar o trânsito. Para alĂŠm da infração atrĂĄs indicada e de acordo com do DL 155/2008 de 7 de agosto que altera o Decreto-Lei n.Âş 64/2000, de 22 de abril, o proprietĂĄrio ou detentor dos animais deve garantir a segurança dos mesmos e velar para que estes nĂŁo causem danos em pessoas, bens e ou outros animais. O incumprimento destas obrigaçþes constitui contraordenação punĂvel com coima cujo montante mĂnimo ĂŠ de â&#x201A;Ź1250 ou â&#x201A;Ź3750 e o mĂĄximo de â&#x201A;Ź3740 ou â&#x201A;Ź44890, consoante o agente seja pessoa singular ou coletiva. No caso dos animais silvestres, nĂŁo existe qualquer sanção, em virtude dos animais nĂŁo serem propriedade de ninguĂŠm. NĂŁo tendo como principal preocupação, a
Jorge Gomes
66 PESQUISA
eventualidade de serem autuados pelas infraçþes cometidas, devem antes de mais os proprietårios de animais domÊsticos providenciar para que os mesmos não vagueiam pela via pública, para que desse modo não provoquem acidentes rodoviårios, nem que os mesmos sejam mortos em resultado desses acidentes, lamentando depois a morte do seu animal domÊstico, se outras consequências mais graves, não advierem desse comportamento, mesmo que negligente,
tal como a responsabilização pelos danos e ferimentos ou mesmo a morte de pessoas.
RogĂŠrio Copeto Major da GNR Chefe da Secção do Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente do Comando Territorial de Ă&#x2030;vora Mestre em Direito e Segurança e Auditor de Segurança Interna
Concurso de Fotografia AstronĂłmica 2014 ObservatĂłrio AstronĂłmico do Parque BiolĂłgico de Gaia
Encontre o regulamento e boletim de inscrição em: www.parquebiologico.pt/userdata/OAPB_2014.pdf ou em www.facebook.com/observatorioastronomicopbg
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ObservatĂłrio AstronĂłmico do Parque BiolĂłgico de Gaia Parque BiolĂłgico de Gaia 4430 - 812 Avintes XXX QBSRVFCJPMPHJDP QU t BTUSPOPNJB!QBSRVFCJPMPHJDP QU
BLOCO BLOCODE DENOTAS NOTAS 67 67
Avifauna do Estuário do Cávado Quem nunca experimentou sentimentos contraditórios diante de uma criatura sacrificada em nome dos nossos benefícios ou até de conhecimentos científicos que contribuem para a preservação da sua própria espécie? a juventude habituei-me a ver as expedições dos primeiros naturalistas numa perspetiva romântica. As suas proezas por mundos novos em busca de espécies botânicas e zoológicas desconhecidas da ciência fizeram-me inscrevê-los no elenco dos meus heróis de aventuras e até sonhei um dia vir a ser um deles. Entretanto desencantei-me ao descobrir que os seus métodos de estudo se caracterizavam pelo uso generalizado de armadilhas, armas de caça e de tantas outras práticas mais próprias das atividades cinegéticas e que hoje consideramos atrozes. Mas sem acesso aos meios tecnológicos atuais, de que outra forma teria sido possível àqueles pioneiros demarcarem os habitats das espécies encontradas e descrevê-las com rigor? Mais tarde, quando me propus inventariar a avifauna do estuário
N
do Cávado e das áreas adjacentes, acabei por perceber que só através do infortúnio de determinados espécimes os conseguiria observar. Longe de querer contribuir para tal, cedo aprendi que os temporais poderão ser bons aliados dos arroladores de aves. Foi assim, sob dias consecutivos de mar e ventos agitados, que em março de 2001 aqui registei um pato-fusco (Melanitta fusca), raridade de hábitos marinhos difícil de avistar a partir de terra. Se por um lado lamentei a má sorte da ave, por outro entusiasmou-me o desvio da sua rota até mim. De certa forma senti-me próximo daqueles naturalistas mas sem o peso de ter “pecado”. No ano seguinte, porém, já não foi tão pacífico resolver o paradoxo. O naufrágio do navio “Prestige” haveria de afetar com hidrocarbonetos toda a costa Norte da península e de arrojar para as praias inúmeras aves moribundas, sobretudo os alcídeos que naquele outono passavam ao largo da nossa
costa mas muito para lá do alcance útil dos meus binóculos. Num ápice inscrevi na minha lista os airos (Uria aalge), as tordas-mergulheiras (Alca torda) e até os papagaios-do-mar (Fratercula arctica). Só que, então, a satisfação que senti por ser testemunha da presença de tais espécies nesta região não foi suficiente para me aliviar a mágoa. Mais do que as forças da natureza, foi a nossa incúria que fatalmente alterou o destino àquelas aves. Ainda assim, independentemente da dimensão da tragédia, não será mais censurável a nossa ação quando temos como seguro que a sua concretização causará danos ambientais evitáveis? A distribuição do mocho-d’orelhas (Otus scops) no nosso país é de tal forma mal conhecida que o seu grau de ameaça nem está determinado no respetivo Livro Vermelho. Desse modo, quando em setembro de 2013 me deparei com a carcaça de um indivíduo desta espécie sob as linhas elétricas recentemente instaladas numa grande extensão de ambas as margens do Cávado não pude ignorar a relevância do “achado”, para mim inédito. É certo que a energia elétrica é-nos indispensável face às exigências da vida que queremos ter e que, por tal, é desejável a implementação de uma ampla rede de distribuição. Mas se estão já sobejamente estudados os impactos negativos das linhas de alta e de média tensão sobre a avifauna e se já existem soluções técnicas que atenuam aquelas ameaças, porquê cercar um parque natural pejado de aves com estas barreiras? Desta vez senti-me envergonhado. Por Jorge Araújo da Silva www.verdes-ecos.blogspot.com
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68 MIGRAÇÕES
Gaivota-de-asa-escura Larus fuscus Linnaeus, 1758
Andam aos bandos, com frequência pousadas na areia da praia – gaivota de espécie pouco distinta de outras, consolida no nosso litoral um corredor migratório de elevada expressão «Para as gaivotas-de-asa-escura, Portugal é a rota mais importante do mundo», dizia-nos há uns anos Peter Rock, um conhecido investigador britânico especializado em gaivotas.* «Já contei 40 mil espécimes, em outubro», completa. «Vêm das ilhas britânicas, da Noruega, da Dinamarca, da Alemanha, da Polónia... de todas as partes da Europa». Este impressionante número de gaivotas-de-asa-escura percorre essencialmente dois trajetos migratórios, explica: «Uma grande deslocação pelo litoral oeste da Europa, da Noruega, França, Portugal, África; e outra que interessa mais, por exemplo, as aves que se veem em Itália — estas passam pelos Alpes na primavera». A velocidade da migração difere: «Quando se deslocam no outono, a sua velocidade média é de 3 km por dia», ri-se. «Devem pensar — Gosto disto aqui, vou ficar mais uns dias. É muito lento! Na migração primaveril a velocidade média já é de 29 km por dia». Peter Rock reviu uma das suas gaivotas num país africano, a Gâmbia: «Levei o telescópio de observação de aves, uma vez que sabia que havia gaivotas nesse país». A 20 minutos do hotel encontra-se uma bonita praia. Ao olhar pelo telescópio tive o prazer de ver uma das minhas aves», a anilha não enganava. Mais tarde «soube que ela fez essa viagem entre Bristol e a Gâmbia várias vezes, através dos registos de outros observadores». Peter baseia a sua análise de dados a partir do registo de
anilhas através de telescópio e binóculos basicamente: «Quanto mais antiga a anilha mais informação proporciona». Outras tecnologias no entanto têm vindo a ser utilizadas mais recentemente, mas mais caras, que permitirão fazer o acompanhamento detalhado das aves. Na opinião de Peter Rock, a gaivota-de-asa-escura é provavelmente a espécie mais importante entre as migradoras que existem em Portugal, dado o seu grande número e visibilidade. Há muito para aprender a partir daqui. É uma via importante de informação», conclui. O British Trust for Ornithology (BTO) divulga no seu site o acompanhamento de uma dúzia de gaivotas desta espécie ao longo dos últimos anos. Segundo essa informação obtida por registos GPS, todas as aves seguidas regressaram ao Norte durante o mês de março. Há um caso que merece destaque, a gaivota n.º 395, com dispositivo GPS aplicado em 2010 e com dados divulgados até ao ano passado, logo, o registo de movimentação ao longo de três invernos. Na sua migração outonal a ave em causa deslocou-se através do Golfo da Biscaia, seguindo para a Galiza e litoral português a caminho do Estreito de Gibraltar, rumo a África. No regresso ao Norte da Europa, a primeira paragem fê-la em Almeria, no extremo Sul de Espanha. Daí, o seu voo traçava praticamente uma linha reta pelo meio do território peninsular, passando por Madrid e chegando depois à Grã-Bretanha. Os investigadores afirmam que o conjunto dos dados analisados sugerem que as aves conhecem as suas rotas migratórias com bastante propriedade e avançam na intenção de atingirem os locais concretos que pretendem alcançar, apesar de poderem fazer ajustes face a alterações de diversa ordem que se registam ano a ano. Uma parte destas populações de gaivota-de-asa-escura deixou de migrar, em Inglaterra, possivelmente pelas alterações do clima e porque há pessoas que lhes deitam restos alimentares e as ancoram nos telhados em que se estão a reproduzir. Texto Jorge Gomes * Revista «Parques e Vida Selvagem», inverno de 2009
Algumas gaivotas parecidas
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A gaivota-de-patas-amarelas, Larus michahellis, é a única que nidifica em telhados em Portugal
O gaivotão-real, Larus marinus, é bastante maior mas à distância, sem referência, é parecido com a gaivota-de-asa-escura Parques e Vida Selvagem inverno 2014 • 69
70 RETRATOS NATURAIS
Vamos desenhar...
uma borboleta Borboleta-caveira (Acherontia atropos)
A ilustração entomológica é um dos campos da ilustração científica dedicada aos invertebrados que mais adeptos reúne em praticamente todo o mundo científico – algo que não é de estranhar, pois os insetos são os animais mais abundantes e diversificados à face deste planeta 70 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
stas e outras razões levam a que sejam profusamente estudados e, consequentemente, representados. Como já tivemos oportunidade de referir (cf, Vamos desenhar... um grilo; PVS n.º 38, p. 50-1), neste domínio da ilustração subordinada à ciência, existem certas particularidades que devem ser observadas e respeitadas. A pose, como se viu, tem como principal propósito conferir familiaridade na observação do espécime, ou seja, deve ser tida em conta em que vista (de topo, ou lateral) ele é mais frequentemente encontrado. Ora isso leva-nos à máxima que todos aqueles que são terrestes serão predominantemente desenhados em vista dorsal (de topo) — se bem que existam muitas exceções, como sejam a título de exemplo, os gafanhotos e os louva-a-deus. Ora todos aqueles que têm a capacidade de voar acabam também por cair, curiosamente e na sua grande maioria, nesta tipologia de figuração. Um destes casos paradigmáticos são os lepidópteros (significa “asas com
E
escamas”), grupo taxonómico este que inclui as mais coloridas borboletas (diurnas; Rhopalocera) e as mais discretas traças (noturnas; Heterocera). E se bem que as primeiras conseguem, quando em repouso, dobrar as suas asas verticalmente, as segundas não optaram por essa estratégia e sempre que pousam mantêm as suas asas abertas ou ligeiramente fechadas, mas na horizontal. Ora sendo ambas incluídas no mesmo grupo e tendo em conta que as borboletas diurnas também optam por estirar as asas horizontalmente quando poisam para recolher o néctar das flores, através do desenrolar da sua espirotrompa espiralada, então é lógico que a pose de representação mais uniforme para todos os lepidópteros adultos (imago) deve ser a dorsal, de asas abertas. Além disso, desta forma visualizam-se com facilidade não só o padrão, nervação e forma/ silhueta das asas anteriores e posteriores, mas também a forma e grossura do abdómen, a cabeça e, particularmente, as antenas —
Macho
Fêmea Borboleta-da-couve (Pieris brassicae)
geralmente filiformes nas diurnas, e pectinadas ou denteadas, nas noturnas. As patas são as estruturas que geralmente são remetidas para um segundo plano de importância, ficando geralmente tapadas pelas asas, com exceção do primeiro par de patas. Por outro lado, a multitude de formas, cores e soluções anatómicas de adaptação aos diferentes nichos ecológicos, que mais facilmente se observam nas borboletas diurnas no decorrer de um qualquer passeio pelo campo ou jardim urbano, acaba por nos surpreender e maravilhar. Mais que pela graciosidade do seu voo, ou a elegância do seu corpo, são os padrões coloridos que tipificam as asas de cada espécie, aquilo que mais tem atraído os colecionadores desde sempre — não existe nenhum insetário amador que não possua algumas borboletas — já que as escamas que lhes dão origem se mantêm ao longo de décadas, se bem conservadas. As borboletas foram assim desenhadas e pintadas com fervor e admiração, desde os frescos egípcios há longínquos 4000 a.C., até à contemporaneidade. O cinema e os escritos dos mais famosos autores literários também a elas não são alheios — como é o caso da traça de nome borboleta-caveira (Acherontia atropos), que graças ao padrão do seu tórax (relembrando uma caveira) deu identidade ao filme “O silêncio dos inocentes”, de Jonathan Demme (1991), ou ainda a uma referência visual na capa e outra descritiva, no próprio texto da obra de José Saramago “As intermitências da Morte” (2005, p. 173): ” …, a caveira é uma borboleta, e o seu nome latino é acherontia atropos. É nocturna, ostenta na parte dossal do toráx um desenho semelhante a uma caveira
humana, alcança doze centímetros de envergadura e é de coloração escura, com as asas posteriores amarelas e negras. E chamam-lhe atropos, isto é, morte.” E se a representação correta da sua anatomia externa é muito importante, convém não esquecer que estes animais podem exibir dimorfismo sexual, como é o caso das borboletas-da-couve (Pieris brassicae). Por outro lado, é importante relembrar que sendo bastante especializados na sua dieta (direcionada para fontes ricas em açúcar, como o néctar ou alguma seiva elaborada), estes evoluíram de forma a acompanharem a evolução das plantas angiospérmicas (co-evolução inseto-planta), de cujo néctar dependem. Em alguns casos e graças a esta co-evolução tornaram-se mutuamente dependentes. Assim, é também importante representar a planta de que depende ou se alimenta, na fase de alimentação da lagarta (que antecede a crisálida, onde se dá a metamorfose em imago). A expressiva borboleta-cauda-de-andorinha (Papilio machaon) é uma das mais bonitas entre as 135 espécies de borboletas que ocorrem, com frequência, em território português. Não é por acaso que esta foi uma das borboletas que mais cativou o escritor russo Vladimir Nabokov, autor do célebre romance “Lolita” (1955). Esta, obstinadamente, costuma fazer a postura dos ovos em folhas da arruda ou do funcho, pelo que a representação desta planta só acrescenta uma mais-valia na diagnose e caracterização figurativa desta espécie, reunindo assim e numa única estampa, quer os amantes da ilustração botânica, quer aqueles outros da ilustração entomológica, num célebre dois em um. A metodologia deste tipo de figuração passa pelos mesmos passos de sempre e já descritos noutros artigos desta rubrica — elaboração de uma lista de verificação dos carateres diagnosticantes que devem ser o obrigatoriamente ilustrados, elaboração de um desenho preliminar visualmente credível e cientificamente correto e posterior colorir segundo a técnica de expressão plástica que mais se adequa ou que é mais familiar para o ilustrador.
Borboleta-cauda-de-andorinha (Papilio machaon)
Funcho (Foeniculum vulgare)
Texto e ilustrações
Fernando Correia Biólogo e ilustrador científico Dep. Biologia, Universidade de Aveiro
fjorgescorreia@sapo.pt www.efecorreia-artstudio.com
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72 ATUALIDADE
S Cobra-bastarda juvenil, Malpolon monspessulanus
Fobia cultural ou anatómica? Há qualquer coisa inata no cérebro dos primatas que despoleta alerta vermelho perante a iminência do contacto com uma serpente. Na cultura ocidental este pavor invariavelmente reforça-se a vários níveis. No final do ano passado foi publicado na revista "Proceedings", da Academia Nacional de Ciências norte-americana, o resultado de um estudo realizado com macacos que traz consigo dados muito interessantes: o cérebro tem radar específico para cobras. Dispondo de células específicas para esse efeito, quando surge a visualização de uma serpente, estas dão imediatamente o alerta. Mais: chegam a responder seletivamente a imagens de cobras e tomam a dianteira comparativamente a neurónios que reagem a imagens de rostos, mãos ou figuras geométricas. A pesquisa centrou-se em dois macacos juvenis nascidos numa reserva de primatas no Japão e os cientistas sublinharam estar convictos de que ambos os animais não tiveram hipótese de encontrar serpentes antes dos testes realizados. Em laboratório aparecia uma resposta de medo no cérebro, muito rápida e distinta das respostas a outras imagens. É provável que na espécie humana ocorra algo semelhante. Com os conhecimentos que hoje existem, quem se informar melhor sobre esta fatia de biodiversidade da Terra, conseguirá substituir o medo por respeito e perceber que também os ofídios desempenham papéis ecológicos importantes no puzzle da vida.
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Uma dezena de associações ambientalistas – entre as quais se contam a Associação Portuguesa de Guardas e Vigilantes da Natureza, a ALDEIA e a Quercus – lançaram em novembro passado um comunicado de imprensa, face à situação de ameaça da espécie. O objetivo foi denunciar a necessidade de uma maior proteção e fiscalização, pedindo punições exemplares. «O recente caso do abate da loba “Bragadinha” dentro do Parque Nacional da Peneda-Gerês reflete a impunidade com que se está a matar ilegalmente o lobo-ibérico em Portugal», afirmam. As organizações subscritoras juntam-se «num apelo público à ação contundente em relação aos crimes contra esta espécie ameaçada e protegida na legislação nacional e internacional». A fêmea adulta “Bragadinha” foi encontrada morta a 30 de outubro de 2013 e os resultados da sua necrópsia foram claros: abatida a tiro de caçadeira e simultaneamente atacada por uma matilha de cães. Este episódio, ocorrido dentro da Zona de Caça Associativa da Gavieira, Arcos de Valdevez, no Parque Nacional da Peneda-Gerês, é o quinto abate ilegal de lobo-ibérico de entre os 15 lobos seguidos por telemetria no Alto Minho. Esta fêmea era uma jovem reprodutora da alcateia existente na área, tendo tido a sua primeira ninhada em maio». O Sistema de Monitorização dos Lobos Mortos, implementado pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), indica que para os 80 registos de mortes de lobos identificados entre 1999 e 2011, 71% tiveram como causa a ação humana, muitas das vezes em circunstâncias de perseguição ilegal, como por exemplo tiro, laço e veneno. Esta mortandade «levará, se não for travada, ao rápido desaparecimento dos 300 exemplares que ainda sobrevivem em Portugal».
Buçaco: morcego novo e musaranho-de-água Foram descobertas o ano passado mais duas espécies na Mata Nacional do Buçaco. Os investigadores do departamento de Biologia da Universidade de Aveiro, que trabalham no terreno, registaram pela primeira vez o morcego-de-ferraduramediterrânico (Rhinolophus euryale), espécie em vias de extinção, e ainda o musaranho-de-água (Neomys anomalus), um mamífero sobre o qual existe pouca informação. Esta espécie de morcego encontra-se em vias de extinção, estando classificada no “Livro Vermelho dos Vertebrados de
direitos reservados
Jorge Gomes
Lobo-ibérico
IMPAR 73
Portugal” como “criticamente em perigo”. A mesma obra atesta a raridade da espécie, indicando que no território continental deverão ocorrer menos de mil indivíduos. Este morcego é maioritariamente cavernícola, podendo, no entanto, também abrigar-se em edifícios. Alimenta-se em áreas de floresta de folhosas e autóctone, motivo que o terá atraído à Mata do Buçaco. Este registo eleva assim para 15 o número de espécies de morcegos confirmadas na Mata do Buçaco; número impressionante, atendendo a que em Portugal continental ocorrem 25 espécies. Entretanto foi também identificada mais
direitos reservados
João L. Teixeira
Dados do CIBIO, da Universidade do Porto, obtidos por telemetria no Noroeste de Portugal, revelam que anualmente 45% dos lobos da região – espécie ameaçada e protegida na legislação nacional e internacional – são mortos por ação humana
S Musaranho-de-água
uma espécie de mamíferos na Mata do Buçaco pela equipa da Universidade de Aveiro. Trata-se do musaranho-de-água (Neomys anomalus), espécie na verdade pouco conhecida, tímida e com estatuto de conservação "informação
insuficiente", precisamente por ser de difícil observação/captura e assim existir pouca informação sobre a sua abundância e requisitos ecológicos. Estas duas descobertas vêm mais uma vez revelar o oásis de biodiversidade que é a Mata Nacional do Buçaco, que ocupa 105 hectares e possui uma das melhores coleções dendrológicas da Europa. Esta mata nacional providencia alimento, abrigo e refúgio para mais de centena e meia de espécies de vertebrados, algumas de grande valor conservacionista, como endemismos ibéricos ou espécies protegidas.
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74 PROJETO PAR Cada dia que passa há mais empresas e cidadãos a confiarem ao Parque Biológico de Gaia o sequestro de carbono Ajude a neutralizar os efeitos das emissões de CO2, adquirindo área de floresta em Vila Nova de Gaia com a garantia, dada pelo Município, de a manter e conservar e de haver em cada parcela a referência ao seu gesto em favor do Planeta
Para mais informações pode contactar pelo n.º (+351) 227 878 120 ou em carbono@parquebiologico.pt Parque Biológico de Gaia, Projeto Sequestro do Carbono 4430-681 Avintes • Vila Nova de Gaia
Sequestro de Carbono Agrupamento de Escolas Ovar Sul - Curso EFA B3 • Agrupamento Vertical de Escolas de Rio Tinto • Alice Branco e Manuel Silva • Alunos do 9.º ano (2012/13) da Escola Secundária do Castelo da Maia • Amigos do Zé d’Adélia • Amigos do Zé d’Adélia e Filhos • Ana Filipa Afonso Mira • Ana Luis Alves Sousa • Ana Luis e Pedro Miguel Teixeira Morais • Ana Miguel Padilha de Oliveira Martins • Ana Paula Pires • Ana Rita Alves Sousa • Ana Rita Campos, Fátima Bateiro, Daniel Dias, João Tavares e Cláudia Neves do 11.º A (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Ana Sofia Magalhães Rocha • Ana Teresa, José Pedro e Hugo Manuel Sousa • António Miguel da Silva Santos • Arnaldo José Reis Pinto Nunes • Artur Mário Pereira Lemos • Bárbara Sofia e Duarte Carvalho Pereira • Bernadete Silveira • Carolina de Oliveira Figueiredo Martins • Carolina Sarobe Machado • Carolina Birch • Catarina Parente • Cipriano Manuel Rodrigues Fonseca de Castro • Colaboradores da Costa & Garcia • Cónego Dr. Francisco C. Zanger • Convidados do Casamento de Joana Pinto e Pedro Ramos • Cursos EFA Básicos (2009/10) da Escola Secundária Dr. Joaquim Gomes Ferreira Alves • Deolinda da Silva Fernandes Rodrigues • Departamento Administrativo Financeiro da Optimus Comunicações, SA DAF DAY 2010 • Departamento de Ciências Sociais e Humanas da Escola Secundária de Ermesinde • Departamento de Matemática e Ciências Experimentais (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Dinah Ferreira • Dinis Nicola • Dulcineia Alaminos • Eduarda e Delfim Brito • Eduarda Silva Giroto • Escola Básica da Formigosa • Escola Dominical da Igreja Metodista do Mirante • Escola EB 2,3 de Valadares • Escola EB 2,3 Dr. Manuel Pinto Vasconcelos, Projecto Pegada Rodoviária Segura, Ambiente e Inovação • Escola EB 2,3 Escultor António Fernandes de Sá • Escola Secundária Almeida Garrett - Projecto Europeu Aprender a Viver de Forma Sustentável • Escola Secundária Augusto Gomes • Escola
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Secundária do Castelo da Maia • Família Carvalho Araújo • Família Lourenço • Fernando Ribeiro • Francisco Gonçalves Fernandes • Francisco Saraiva • Francisco Soares Magalhães • Graça Cardoso e Pedro Cardoso • Grupo ARES - Turma 12.º B (2009/10) da Escola Secundária dos Carvalhos • Grupo Ciência e Saúde no Sec. XXI - Turma 12.º B (2009/10) da Escola Secundária Dr. Joaquim Gomes Ferreira Alves • Grupo de EMRC da Escola Básica D. Pedro IV - Mindelo • Guilherme Moura Paredes • Hélder, Ângela e João Manuel Cardoso • Inês, Ricardo e Galileu Padilha • Joana Fernandes da Silva • Joana Garcia • João Guilherme Stüve • João Monteiro, Ricardo Tavares, Rita Mendes, Rita Moreno, e Sofia Teixeira, do 12.º A (2011/12) da Escola Secundária Augusto Gomes • Joaquim Pombal e Marisa Alves • Jorge e Dina Felício • José Afonso e Luís António Pinto Pereira • José António da Silva Cardoso • José António Teixeira Gomes • José Carlos Correia Presas • José Carlos Loureiro • José da Rocha Alves • José, Fátima e Helena Martins • Lina Sousa, Lucília Sousa e Fernanda Gonçalves • Luana e Solange Cruz • Manuel Mesquita • Maria Adriana Macedo Pinhal • Maria Carlos de Moura Oliveira, Carlos Jaime Quinta Lopes e Alexandre Oliveira Lopes • Maria de Araújo Correia de Morais Saraiva • Maria Guilhermina Guedes Maia da Costa, Rosa Dionísio Guedes da Costa e Manuel da Costa Dionísio • Maria Helena Santos Silva e Eduardo Silva • Maria Joaquina Moura de Oliveira • Maria Manuela Esteves Martins Alves • Maria Violante Paulinos Rosmaninho Pombo • Mariana Diales da Rocha • Mário Garcia • Mário Leal e Tiago Leal •
Marisa Soares e Pedro Rocha • Marta Pereira Lopes • Mateus de Oliveira Nunes Miranda Saraiva • Miguel Moura Paredes • Miguel Parente • Miguel, Cláudia e André Barbosa • Nuno Topa • Paula Falcão • Pedro Manuel Lima Ramos • Pedro Miguel Santos e Paula Sousa • Professores (2010/11) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Professores e Funcionários (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Protetores do Ambiente Professores e Alunos da Escola Básica de Canidelo • Regina Oliveira e Abel Oliveira • Ricardo Parente • Rita Nicola • Sara Pereira • Sara Regueiras, Diana Dias, Ana Filipa Silva Ramos do 11.º A (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Serafim Armando Rodrigues de Oliveira • Sérgio Fernando Fangueiro • Tiago José Magalhães Rocha • Tiago Pereira Lopes • Turma A do 6.º ano (2010/11) do Colégio Ellen Key • Turma A do 8.º ano (2008/09) da Escola EB 2,3 de Argoncilhe • Turma A do 9.º ano (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Turma A do 11.º ano (2010/11) da Escola Secundária de Ermesinde • Turma A do 10.º ano e Professores (2010/11) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Turma A do 12.º ano (2010/11) da Escola Secundária de Ermesinde • Turma C do 10.º ano (2010/11) da Escola Secundária de Ermesinde • Turma D do 10.º ano e Professores (2010/11) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Turma D do 11.º ano (2010/11) da Escola Secundária de Ermesinde • Turma E do 10.º ano (2008/09) da Escola Secundária de Ermesinde • Turma E do 12.º ano (2010/2011) da Escola Secundária de Ermesinde • Turma G do 12.º ano (2010/11) - Curso Profissional Técnico de Gestão do Ambiente do Agrupamento de Escolas Rodrigues de Freitas • Turma IMSI do Curso EFA - ISLA GAIA (2008/09) • Turmas A e C do 10.º ano (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Turmas A e C do 11.º ano; A e B do 12.º ano e Professores (2010/11) da Escola Secundária de Oliveira do Douro •Turmas B e C do 12.º ano - Psicologia B (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Turmas B e D do 11.º ano (2009/10) da Escola Secundária de Oliveira do Douro • Turmas A, B e G do 12.º ano; G e H do 11.º ano e F do 10.º ano (2010/11) da Escola Secundária de Ermesinde • Vânia Rocha
Colégio Luso-Francês
Posto de Abastecimento de Avintes
Para aderir a este projeto recorte o seguinte rectângulo e remeta para: Parque Biológico de Gaia • Projeto Sequestro do Carbono • 4430 - 681 Avintes • Vila Nova de Gaia O regulamento encontra-se disponível em www.parquebiologico.pt/sequestrodocarbono
Pretendo/Pretendemos aderir à Campanha Confie ao Parque Biológico de Gaia o Sequestro do Carbono apoiando a aquisição de
m2 de área florestal X € 50 =
Junto se envia cheque para pagamento
euros.
1 m2 = €50 - 4 kg/ano de CO2
Procedeu-se à transferência para o NIB 0033 0000 4536 7338 05305
Nome do Mecenas Recibo emitido à ordem de Endereço N.º de Identificação Fiscal
Telefone
O Parque Biológico pode divulgar o nosso contributo
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Iconografia da flora portuguesa São três as obras iconográficas exclusivamente da flora portuguesa: “A Flore Portugaise” de Hoffmannsegg e Link, a “Phytographia Lusitaniae” de Brotero e a “Iconografia Selecta da Flora Portuguesa” de Gonçalo Sampaio A “Flore Portugaise”, in-fólio, publicada de 1809 a 1840, com texto em latim e francês, representa 112 plantas em gravuras coloridas, que, devido à maneira de serem executadas, dão a impressão de que o artista, Voelker, ilustrou as plantas vivas. As gravuras são acompanhadas de desenhos dos pormenores ampliados, embora sem indicação de escala. O realismo do traço, a elegância da disposição, a fidelidade do colorido colocam esta iconografia entre as melhores da época, e até hoje feita. O artista procurou, no entanto, suprimir nos seus desenhos aquilo que na planta viva poderia esteticamente “comprometer” a ilustração. Os dois volumes in-fólio menor da “Phytographia Lusitaniae”, Felice Avellar Brotero, de 1816 e de 1827, com texto em latim, reproduzem 192 plantas em 180 estampas, não coloridas. As gravuras são representações fiéis e realísticas das plantas vivas, sem preocupação de embelezamento exagerado com sombreado executado a traço dando boa ideia de volume e perspetiva. São também acompanhadas de pequenos desenhos dos pormenores ampliados, sem escala. A “Iconografia Selecta da Flora Portuguesa” de Sampaio, I vol. In-fólio, publicado em
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S Phytographia Lusitaniae Selectior; Brotero
W A Iconografia Selecta da Flora Portuguesa de Sampaio
S Thymus caespititius, (pintada por Voelker); da Flore Portugaise de Hoffmannsegg e Link
1949, depois da morte do autor, é uma coleção de 150 desenhos da autoria de Sara Cabral Ferreira. Só um pequeno número das gravuras apresenta desenhos dos pormenores. As estampas não são acompanhadas de qualquer texto descritivo ou explicativo. Juntando estas três obras, temos ao todo 454 desenhos, mas são apenas uns 350 os que representam espécies ou subespécies diferentes, portanto muito aquém do vastíssimo número de espécies da flora portuguesa. Estas obras e suas estampas podem ser consultadas em muito poucas bibliotecas nacionais, ou então em bibliotecas da especialidade, como é o caso da biblioteca do Parque Biológico de Gaia (sob marcação). Por Filipe Vieira
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Jorge Paiva Biólogo
Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra jaropa@bot.uc.pt
Uma sociedade opressiva e a
opressão publicitária A sociedade de consumo em que se transformou a designada “civilização ocidental”, tornou-se opressiva, violenta e demolidora. Este tipo de sociedade exige imenso das pessoas, a tal ponto que os atuais jovens casais, ambos a terem de trabalhar para conseguirem sobreviver, mal têm tempo de estar com os filhos e até de os terem e manhã, apressadamente, preparam-nos para os levar às escolas ou às creches, onde eles vão passar o dia inteiro. Ao fim da tarde vão buscá-los, também apressadamente, ou estão com eles, depois de saírem dos empregos, normalmente já de noite. A seguir preparam, sempre apressadamente, um jantar para os deitar não muito tarde, pois no dia seguinte os garotos têm de se levantar cedo. Em todas estas situações, o diálogo é curto, apressado e com muitas palavras de ordem e, algumas vezes, ralhetes, acabando as crianças por irem mal humoradas para a escola e os pais aborrecidos para o emprego. Assim, passaram um dia inteiro sem terem tempo sequer para conversar um pouco com os filhos, quanto mais educá-los ou conferir-lhes um pouco de instrução cívica, que, normalmente, não lhes é ministrada nas escolas que frequentam. Muitas vezes, os pais podem querer aproveitar o exíguo tempo que têm antes ou depois do jantar para dialogarem ou brincarem com os filhos e eles, já não “aguentam”
D
S Angola - exemplo de inacreditável aproveitamento da Natureza
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por estarem esgotados depois de um dia repleto de aulas (muitas vezes, algumas extra-escolares) e de outras atividades que tiveram naquilo a que se pomposamente se designa por OTL (ocupação de tempos livres). Assim, ou adormecem a ouvir os pais ou se impacientam com eles. Uma sociedade assim é destruidora da família e é, simultaneamente, demolidora da pessoa, que acaba por não ter tempo para estar com os amigos ou para se descontrair divertindose um pouco ou praticando algum desporto de manutenção. Além disso, é também uma sociedade que está a concentrar a espécie humana em agregados populacionais, com a consequente desumanização do campo. As pessoas passaram, assim, a viver concentradas em agregados populacionais que não são mais do que “gaiolas” de betão armado, sem convívio humano e com ar poluído. Além disso, como andam sempre a correr num vai e vem casa-trabalho-casa, nem sequer conhecem os vizinhos do prédio onde habitam. Vivem “engaiolados”, num isolamento total. Desta maneira, tem vindo a aumentar o número de pessoas com problemas do foro psiquiátrico e salutar. Como se isto não bastasse, somos “bombardeados” por todo o lado e a toda a hora com publicidade, que nos entra pela casa dentro através da rádio, televisão, por baixo da porta da entrada e através da caixa de correio. Enfim, uma publicidade que não olha a meios para atingir os seus fins. É uma publicidade sem escrúpulos. Explora as pessoas sem elas darem por isso. Um exemplo é a compra de determinados produtos, como alguns jornais, produtos alimentares, ou outras compras, que nos são fornecidos dentro de um invólucro de plástico, repleto de anúncios. Ao transportarmos o referido jornal, ou outro produto qualquer, em sacos com anúncios, estamos a ser agentes publicitários grátis ao serviço de outros (a empresa publicitária e a empresa produtora ou a vendedora do produto) que auferem lucros dessa publicidade e, simultaneamente, agentes poluidores, pois o plástico dos sacos é um dos graves problemas dos resíduos sólidos com que estamos a emporcalhar a “gaiola”
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S Macau: nem se vislumbra o edifício
global (Planeta Terra) em que vivemos. Como já referimos (Revista “Parques e Vida Selvagem” 35: 62-64; 2011), o plástico é terrível, pois demora dezenas de anos a ser reciclado naturalmente. Como é leve, é arrastado pelo vento e pelas águas fluviais, indo parar aos oceanos, onde, levados pelas correntes, formaram cinco ilhas enormes de lixo flutuante (80% de plástico), com mais de 3,5 milhões de toneladas e centenas de quilómetros cada uma (duas no Atlântico, uma a Norte e outra a Sul; uma no Índico; duas no Pacífico, uma a sul e outra a norte, esta com uma superfície superior a oito vezes a área de Portugal Continental). Há países onde as instituições e o comércio já substituíram os referidos
sacos de plástico por sacos de papel, que são facilmente recicláveis e há outros países (poucos) em que não é permitida a entrada de invólucros de plástico. Todos nós devemos recusar os sacos de plástico que nos fornecem com anúncios; todos devemos recusar roupa com anúncios visíveis; todos devemos recusar placas de matrícula dos automóveis com anúncios das casas que comercializam os respetivos veículos, etc. Devemos evitar que se utilizem de nós sem nosso prévio consentimento. Esta publicidade sem escrúpulos utiliza todos os meios (imprensa, rádio, televisão, paredes, tetos, pavimentos, árvores das artérias urbanas, jardins, etc.) e, finalmente, utiliza-nos a todos. Utiliza, ainda, o trabalho
S Hong Kong: exemplo de “opressão” habitacional
infantil. Basta ver televisão. Está repleta de anúncios com utilização de crianças “escravizadas” pelas empresas publicitárias ou pelos respetivos familiares. É trabalho infantil no geral gratuito ou mal remunerado. Ainda por cima, grande parte das crianças utilizadas não vê sequer o dinheiro que ganham. Isto é diário e público, pois a maioria dos portugueses vê diariamente televisão. E afirmam os nossos governantes que penalizam os utilizadores de trabalho infantil em Portugal!... Eles próprios são testemunhas desta exploração diária das crianças, pois são habituais espectadores dos nossos programas televisivos. Essas crianças, no geral, nunca recebem a respetiva remuneração, usufruindo-a os respetivos familiares. Mas não é só na televisão; é por todo o lado esta abusiva exploração do trabalho infantil. Infelizmente, não é só a criança que é explorada. Somos todos nós. Uns inconscientemente, como o caso dos produtos vendidos em sacos de plástico com anúncios; outros porque não olham a meios para ganharem dinheiro, como mulheres desnudadas, exploração
publicitária do sexo, da família, etc. É uma publicidade que não olha a meios, inclusive a meios de corrupção. Há pessoas que se prostituem por dinheiro, pois, para mim, um corrupto não é mais do que um prostituto do dinheiro! Este tipo de publicidade sem escrúpulos é opressiva e até altera hábitos, comportamentos e idiomas. Apontamos apenas alguns exemplos do vasto leque de testemunhos que existem. Quando peço um pirolito ou uma gasosa, dizem-me sempre que não têm ou já não se fabrica. Eu digo que têm e aponto para a respetiva garrafa (ou lata) exposta nas prateleiras do estabelecimento. Então, informam-me que aquilo é uma “seven up” e eu respondo que aquilo é uma gasosa. “Seven up” é o nome da marca dessa gasosa e em inglês. Estão a habituar-nos a designar tudo pelas respetivas marcas, como, por exemplo, as “jeans” (calças estreitas, em português), as “barbies” (bonecas, em português), as “sprite” (gasosas), as “fantas” (laranjadas, limonadas, etc.), as sagres (cervejas), etc. A tal ponto que muitos jovens já não
conhecem os verdadeiros significados dos termos corretos com que se designam algumas coisas. Assim, por exemplo, no estado de Nova Iorque (EUA) os jovens americanos não sabem que “chicken” significa frango. Nos restaurantes, quando eles querem comer frango, pedem um “knor”, que é a marca que ali comercializa os frangos. Assim, eles julgam que “knor” significa frango. Cá também vejo muita gente pedir uma “knor”, em vez de pedir um caldo de frango!... Às vezes dá-me pena ver a figura patética que fazem alguns treinadores e jogadores, quando estão a ser entrevistados ou a fazerem declarações televisivas, em estúdio ou nos balneários, onde não há sol, mas com a cabeça coberta com um gorro qualquer, só porque estão a ganhar uns “cobres” por mostrarem o nome de uma marca inscrita no barrete. O pior é que, muitas vezes, o operador de câmara também recebe alguma coisa para não se esquecer de focar o entrevistado de modo a ser bem legível o nome da referida marca que ele traz inscrita no vestuário ou no barrete e até a que está por trás gravada na
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parede do local onde decorre a entrevista. É por causa desta publicidade que, em Portugal, os treinadores e um jogador de cada uma das equipas intervenientes num jogo de futebol dos campeonatos desportivos da I ou II divisões (agora também já não se chamam assim, mas têm o nome de uma marca de um produto comercial ou de uma instituição bancária qualquer) tem que dar uma entrevista cada um. Chamamlhe entrevista, mas mais não é do que um interrogatório “pidesco” e opressivo feito por um indivíduo que não só não sabe o que é uma entrevista, como não sabe o que é ser jornalista. Como já referimos, as nossas caixas de correio são invadidas e cheias com propaganda, que enchem a nossa casa de um lixo, que, na maioria das vezes, nem lemos. É uma invasão diabólica ao nosso domicílio. Este processo é também utilizado pelos partidos políticos, religiões, laboratórios farmacêuticos, etc. Durante algum tempo eu devolvia essa propaganda ao remetente, para serem eles a tratar tal lixo que eu nem sequer lia. Mas ficava-me muito caro. Então como reagir? Uma das soluções que temos é recusarmo-nos a ler. É o que faço quando não consigo evitar que esse tipo de publicidade abusiva me chegue a casa. Nem abro os sobrescritos. Outro processo é utilizarmos a Lei n.º 6/99 de 27.01.99 para, pelo menos, não nos encherem a caixa do correio com publicidade não enviado por correio. Para isso, basta solicitarmos numa Estação de Correio (agora parece-me que é à DECO) um autocolante “oficial” proibindo a colocação na nossa caixa de correio de publicidade distribuída ao domicílio. Colocase esse autocolante, de modo bem visível, na nossa caixa de correio. Assim, podemos atuar judicialmente contra os infratores. Eu tenho esse tipo de aviso na minha caixa de correio e, devo confessar que, praticamente, não recebo publicidade distribuída ao domicílio (não enviada por correio). As ruas dos agregados populacionais estão repletas de anúncios, que chegam a tapar monumentos, cobrem os abrigos das paragens dos transportes públicos, ocupam passeios, desfeiam táxis e outros
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S Coimbra
S Dubai; um exemplo do “inabitável”
automóveis, cobrem paredes, molestam as árvores, etc. É uma poluição visual, muitas vezes agressiva, como são, por exemplo, os anúncios em enormes “placards” colocados no meio da paisagens lindíssimas ou em jardins públicos, como muitos dos que vi durante as últimas eleições autárquicas. Há vários exemplos desses nos nossos campos e nas nossas cidades e vilas. Em alguns destes nossos agregados populacionais até há publicidade na via pública, o que coloca em risco a vida dos automobilistas e peões, como é a presença de veículos automóveis estacionados em determinados
pontos com grande afluência de tráfego (exemplo, cerca das rotundas), repletos de publicidade e com um boneco com movimentos articulados. Não só têm a culpa disso as autarquias, que autorizam tal estupidez, que só serve para dispersar a atenção dos automobilistas podendo levar a despistes, que até poderão molestar transeuntes pedestres, como também tem a culpa a Polícia, pois isso é uma questão de prevenção rodoviária. A não ser que queiram tomar medidas após algum grave desastre provocado por esses estúpidos anúncios! É por isso, que não se veem anúncios ao
longo das auto-estradas e das estradas no geral. É uma questão de prevenção rodoviária. Porém, nas artérias urbanas continua-se a assistir ao emporcalhar das artérias urbanas e monumentos com “montanhas” de publicidade. Isto porque os autarcas deste país, desta “república das bananas”, fizeram com que a lei não tenha aplicação dentro dos agregados urbanos. É que aos autarcas não interessa o bem-estar dos munícipes, mas sim as receitas que a referida publicidade confere. Eu e outros já denunciámos isso publicamente, mais do que uma vez, mas continua tudo na mesma. A publicidade é, atualmente, uma grande fonte de receita das autarquias e alguns autarcas preferem isso do que o bem-estar dos munícipes. A publicidade e a corrupção desta sociedade de consumo fazem com que todos os produtos (inclusive os essenciais) fiquem mais caros para todos nós, como, por exemplo, os alimentos, o vestuário e os medicamentos. Nós, consumidores, é que pagamos todas essas despesas de publicidade. Não podemos continuar a colaborar neste processo que é contra nós próprios. Eles interrompem filmes; eles interrompem transmissões diretas; eles molestam-nos com sons estridentes chegando a ultrapassar os limites legais de decibéis; eles utilizam cores fosforescentes (radioativas); eles utilizam raios “laser”; eles utilizam ultra-sons; eles utilizam aromas; eles utilizam produtos químicos tóxicos, etc. O abuso é de tal ordem que eu vejo-me aflito para encontrar vestuário, particularmente camisas e calças, e calçado sem ter a respetiva marca à vista. Enfim, a publicidade atual é extremamente agressiva, opressiva e perigosa e nós, consumidores, não só somos quem a paga, como quem sofre todos os incómodos que ela nos causa, como também somos, ingenuamente, colaboracionistas. Abramos os olhos e eduquemos as nossas crianças de modo a não se deixarem iludir por esta enganosa publicidade, altamente colaboracionista na corrupção generalizada desta sociedade de consumo em que vivemos atualmente.
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82 COLETIVISMO
Cegonha-branca ajuda a sensibilizar Em 2014 a Ave do Ano escolhida pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves foi a cegonha-branca (Ciconia ciconia). Acarinhada por todos os portugueses, esta espécie faz parte da nossa cultura e dia a dia. É certamente uma das aves que todos nós conhecemos ou já vimos pelo menos uma vez na vida. Devido à boa relação que existe entre animal e humano, é muito comum ver os seus ninhos em chaminés de zonas habitacionais e fabris. Este ano terá também a possibilidade de apoiar a SPEA a desenvolver atividades de educação ambiental alusivas à cegonha-branca ao ligar o 760 455 155 (0,60 € + IVA por chamada). Espécie migradora na Europa, a sua chegada na primavera, a nidificação próxima a populações ou mesmo em edifícios e os conhecidos rituais nupciais tornaram esta ave num símbolo de boa sorte e fertilidade. A cegonha-branca é uma ave protegida, associada aos habitats de água doce,
pastagens e prados, onde se alimenta. A evolução da sua população em Portugal tem sido irregular. Já foi beneficiada devido à desflorestação e ao aumento de campos abertos, mas com a revolução industrial, a intensificação da agricultura e o uso massivo de inseticidas sofreu uma regressão importante, chegando a ficar com estatuto de ameaça ou mesmo a desaparecer de vários países europeus. Hoje em dia a população europeia recuperou ligeiramente, embora se mantenha
escassa nos países do Norte da Europa: a título de exemplo registou-se um casal no Luxemburgo, pela primeira vez em 2013, e na Bélgica é conhecido apenas um casal nidificante. Na Península Ibérica, após uma regressão acentuada desde os anos 50, a população recuperou e tem-se mantido estável. A título de curiosidade, a cegonha-branca forma casais monógamos que mantêm o mesmo ninho ano após ano, compondo e aumentando o ninho em cada ano, podendo este atingir 800 kg de peso e 225 cm de diâmetro. Na costa alentejana, apresenta a única população a nidificar em rochedos costeiros, no mundo. Mais informações em www.spea.pt Texto Joana Domingues Foto Domingos Leitão
Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves Avenida da Liberdade, n.º 105 - 2.º - esq. 1250 - 140 Lisboa Tel.: 21 322 0430 / Fax: 21 322 04 39 spea@spea.pt • www.spea.pt
Exposição para jogar com animais de seis patas A experiência transmite a satisfação e o desafio da descoberta em ciência. E é divertido identificar insetos. O que é que está à espera? MARIA CRUZ, SCIENCE 29.10.10
“Insetos em Ordem” é uma exposição que propõe um jogo-de-pista para todas as idades, desafiando os visitantes a serem biólogos por uma hora Cada visitante recebe à entrada da exposição um inseto conservado em resina. O objetivo é identificar a ordem do inseto (borboletas, libélulas, besouros, gafanhotos, etc.) e conhecer as suas características. Para o conseguir, os visitantes têm de seguir uma chave de identificação dicotómica construída no espaço expositivo. Deste modo, a área expositiva assemelha-se a um grande labirinto constituído por caminhos que ligam as mesas de identificação aos módulos das maiores ordens de insetos. No final, é possível conhecer as características de 82 • Parques e Vida Selvagem inverno 2014
cada ordem, o nome específico do inseto e outras curiosidades sobre o grupo. Insetos em Ordem abriu pela primeira vez ao público em 2010 no Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC). Com o apoio do programa “O Mundo na Escola” do Ministério da Ciência e Educação, a exposição está em itinerância pelo país desde outubro de 2012. Após sete exibições de norte a sul, com mais de 30 mil visitantes, os insetos voam em fevereiro até Castelo Branco, onde estarão em exibição todos os dias até 6 de abril.
Mais informações: www.mundonaescola.pt www.facebook.com/MundoNaEscola Por Patrícia Garcia-Pereira
Tagis - Centro de Conservação das Borboletas de Portugal Museu Nacional de História Natural Rua da Escola Politécnica, 58 1250-102 Lisboa Tel. + Fax: 213 965 388 info@tagis.org • www.tagis.org
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