ANO 1 / No 8
Direção da revista Mauricio Maia Luiz Guilherme Ourofino Leo Bindes Projeto gráfico e diagramação Fábio Brasil Fotografia Marcelo Conde Alexandre Araújo Imagens matéria Inter Tabac: divulgação Fotos CSWC 2014 extraídas da fanpage do Mareva Club Fotos Pedrinho Aguinaga: Antonio Guerreiro e arquivo pessoal Capa Gervásio Teixeira / glteixeira.com.br Editor-chefe Mauricio Maia Revisão Aline Canejo Revista voltada exclusivamente para os associados da Sociedade do Charuto Ltda. Atendimento ao cliente atendimento@sociedadedocharuto.com.br (21) 3042 4815 (21) 3042 4816
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EDITORIAL
editorial “No começo era a luz” – sábia frase bíblica da qual me aproprio para dizer que, no início, era apenas uma ideia, como tudo. Essa ideia ganhou força e fez com que decidíssemos arriscar. Experimentamos a doce tensão do risco. Quão doce ela é, e quão risco ela envolve. Arriscamos e começamos a ver os primeiros frutos nascerem daquela luz. Site, blog, conteúdo, design, loja, revista, clube – tudo foi divinamente conspirando a nosso favor. E quem diria: 500 associados. Há pouco mais de um ano estávamos nas nuvens, apenas conversando sobre esse sonho. Sobre a viabilidade e a novidade que vinha embutida nesse novo conceito. Hoje, com quase um ano de júbilo, já alcançamos a marca de 500 associados! Amém! Caríssimo amigo enfumaçado, nós, do gênero humano adulto, sabemos que as coisas não caem do céu, que é preciso muito trabalho, suor, sangue, sacrifício, lágrima, e esperança para se vencer na vida. Sobretudo quando, já ultrapassada determinada fase da vida, lançamo-nos em algo novo e inexplorado, abandonando aquela zona de conforto que tendemos a nos deixar seduzir. Esperança: às vezes, vibra como a luz do sol, noutras esmaece. Pior seria ouvir a voz dos invejosos que agem na surdina. Sabemos quem são vocês. Pessoas pequenas de alma e sem nenhuma coragem. Dê-lhes um pouco de coragem daí do céu, saudoso Cazuza. Parabéns, SDC. Parabéns a nós. Parabéns, especialmente, aos nossos maiores incentivadores. Boas baforadas, sempre! Luiz Guilherme Ourofino
sumário 05 seleçÕES do mÊS 10 entrevista Pedrinho Aguinaga — Nos anos 1970 ele foi considerado o homem mais bonito do Brasil e suas conquistas amorosas fizeram dele uma lenda 10
14 mundo do charuto Tudo o que aconteceu na grande final do Cigar Smoking World Championship 2014
18 especialista Rodrigo Ferrari conta tudo sobre o — cada vez mais raro — ofício de livreiro
22 memórias de fumaça Clayton Cordeiro 18
23 Próximas seleções Veja o que a SDC reservou para o mês de outuro
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SELEÇÕES DO MÊS
Outubro
SELEÇÕES DO MÊS Seleção
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Puro Habano
H. Upmann Coronas Major A H. Upmann é uma das marcas cubanas mais antigas ainda em produção, fundada em 1844 por dois irmãos de uma família de banqueiros alemães. Utiliza tabaco premium da região de Vuelta Abajo e tem como característica produzir charutos de força suave a média. O Corona Major é um dos grandes sucessos da marca. Longo e com anel medidor 42, agrada bastante os mais exigentes fumadores e proporciona uma fumada fantasticamente equilibrada do início ao fim, com boa queima e excelente produção de fumaça. O charuto vem em um belo tubo de alumínio, embalado com uma luva de cedro, que torna o sabor e o aroma desta madeira mais pronunciado. É um charuto leve para fumadores iniciantes e ainda tem sabor suficiente para os experientes.
Origem Marca Nome comercial Formato Vitola Apresentação
Cuba H. Upmann
Coronas Major parejo Corona Caixa com 25 unidades em tubos de alumínio e caixa com 10 unidades em tubos de alumínio
H. Upmann Magnum 48 Edición Limitada 2009 Uma nota histórica interessante é que a H. Upmann foi a marca favorita do presidente norte-americano John Kennedy. Reza a lenda que, na noite anterior à que ele assinou o embargo a Cuba, mandou seus assessores irem em todas as lojas de tabaco na área de Washington DC e comprarem todos os Petit Upmann disponíveis. Dizem que 1.200 charutos foram comprados naquela noite. O Magnum 48 tem os sabores sutis e agradáveis típicos da marca e, com anel medidor 48 e 110,00mm de comprimento, oferece uma experiência curta, mas intensa, de fumar. Um digno representante da marca, sem dúvida, e em edição limitada.
Origem Marca Nome comercial Formato Vitola
Cuba H. Upmann
Magnum 48 parejo Corona Extra
Apresentação
Caixa cabinet com 25 unidades
Medidas
132,0mm de comprimento por 16,07mm de anel calibrador
Medidas
110mm de comprimento por 19,05mm de anel calibrador
Calibre
Médio (cepo 42)
Calibre
Grosso (cepo 48)
Força
3/5 (suave a médio)
Força
3/5 (suave a médio)
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SELEÇÕES DO MÊS Seleção
H. Upmann nº 2 Outra curiosidade sobre a H. Upmann é que, embora seja uma marca pré-Revolução, até o ano de 2007 era classificada pela Habanos S.A. como multilocal, quando passou a ser considerada global. E o Upmann Nº 2 é um dos mais festejados sucessos mundiais da marca. Seu formato e sua vitola o tornam muito semelhante ao Montecristo Nº 2, diferindo apenas em um grau a menos de força, talvez. Tem queima magnífica e excelente mistura aromática, características que o levaram a figurar entre os dez melhores charutos do ano no ranking da revista Cigar Aficionado em 2010.
Origem Marca Nome comercial
Cuba Bolivar
Royal Coronas
Volta ao Mundo
Camacho Corojo Gigantes A construção do Camacho Corojo Gigantes é impecável, sem nenhum dano estrutural. Do começo até o fim, a cinza deste puro hondurenho permanece consistente e, a cada batida, cai com pelo menos três centímetros. A cor branca contrasta atraentemente com a capa escura, a combustão do charuto é perfeita e o volume de fumaça é incrível. A fumada não requer nenhum esforço e proporciona uma agradável experiência. Um charuto encorpado, mas suave.
Origem
Honduras
Marca
Camacho
Nome comercial
Formato
Figurado
Formato
Vitola
Pyramid
Vitola
Camacho Corojo Gigantes Parejo Toro
Apresentação
Caixa de madeira com 25 unidades
Apresentação
Caixa de 10 unidadese petaca com 5 unidades
Medidas
156,0mm de comprimento por 20,06mm de anel calibrador
Medidas
165,0mm de comprimento por 21,83mm de anel calibrador
Calibre
Grosso (cepo 52)
Calibre
Grosso (cepo 54)
Força
3/5 (suave a médio)
Força
2/5 (suave)
SELEÇÕES DO MÊS Seleção
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Nacional
Monte Pascoal Double Coronas A Monte Pascoal é a mais nova marca produzida pela Tabacos Mata Fina, uma empresa genuinamente brasileira lançada em 2007. Feitos com a seleção das melhores folhas de tabaco do fértil terroir do Recôncavo Baiano e seguindo a tradição da região no ramo, os charutos Monte Pascoal rapidamente alcançaram a preferência do exigente consumidor brasileiro. O Monte Pascoal Double Coronas é o mais suave da linha e cativa aqueles que procuram um degustação diferenciada. Queima de modo uniforme e possui boa consistência de cinza. Separe 90 minutos de intenso prazer.
Monte Pascoal Petit Robustos Outro grande sucesso da Monte Pascoal, este pequeno charuto impressiona pelo sabor e pelo equilíbrio. A mistura deixa este puro brasileiro extremamente aromático e o perfil de sabor se mantém durante toda a queima. Sua fumada suave agrada ao paladar e possibilita um belo momento de prazer em apenas 30 minutos, que fazem do Monte Pascoal Petiti Robusto uma excelente opção para aquele cafezinho do fim da tarde.
Origem Origem Marca Nome comercial Formato Vitola
Brasil Monte Pascoal
Monte Pascoal Double Corona Parejo Prominentes
Apresentação
Caixa de madeira com 25 e caixa de madeira com 10 unidades
Medidas
191,0mm de comprimento por 19,0mm de anel calibrador
Calibre
Grosso (cepo 49)
Força
2/5 (suave)
Brasil
Marca
Monte Pascoal
Nome comercial
Monte Pascoal Petit Robusto
Formato Vitola Apresentação
Parejo Petit Robusto Caixa de madeira com 25 unidades ou embalagem com 5 unidades
Medidas
102,0mm de comprimento por 19,84mm de anel calibrador
Calibre
Grosso (cepo 50)
Força
3/5 (suave a médio)
Existem charutos que são muito bons, existem grandes charutos e existem charutos Exclusivos.
Cohiba Espléndidos
Origem Cuba
Escolhido por várias vezes como o melhor charuto do mundo, o nome Espléndidos identifca perfeitamente este Cohiba. Toda a elegância, classe e porte da vitola Churchill em um puro cubano que, por sua grande riqueza de sabores, é considerado a maior referência no mundo dos charutos
A SDC tem mais uma opção de associação para você – a Seleção Exclusivos. São quatro seleções por ano: fevereiro, maio, agosto e novembro, sempre dois charutos de altíssimo padrão. No mês de novembro, a Seleção Exclusivos traz o Cohiba Espléndidos. Assim como a Seleção Puros Habanos, Seleção Volta ao Mundo e a Seleção Nacionais, para receber a Seleção Exclusivos basta inscrever-se em nosso site (www.sociedadedocharuto.com.br). Para qualquer dúvida, ligue para o telefone 0800-0206702 ou mande um e-mail para contato@sociedadedocharuto.com.br.
Todos os meses a SDC seleciona e entrega em casa os charutos para seus associados. Existem três níveis de associação mensal: Seleção Puros Habanos, composta de três charutos cubanos, Seleção Volta ao Mundo, com três charutos oriundos de qualquer parte do mundo e Seleção Nacional, constituída por quatro charutos produzidos no Brasil. Os critérios para a escolha dos charutos para a Seleção Mensal são qualidade, variedade em tipo, origem e procedência. Junto com os charutos, o associado recebe a revista da SDC. O associado sabe com antecedência qual é a próxima seleção por meio do site, da newsletter e da revista. O associado pode suspender ou cancelar o recebimento da sua Seleção sempre que desejar. Não há taxa de associação. As entregas são feitas sempre a partir do dia 20 de cada mês, podendo estender-se até a primeira semana do mês seguinte.
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ENTREVISTA
pedrinho aguinaga Por Mauricio Maia
Ele foi o mais memorável conquistador brasileiro. Aos 64, o eterno “fino que satisfaz” lembra seus tempos de homem mais bonito do Brasil – e de algumas de suas namoradas, numa lista que inclui mulheres como Liza Minelli, Bianca Jagger, Demi Moore, Marisa Berenson, Vera Fisher, Rose di Primo e Monique Evans. Provavelmente, você não sabe quem ele é, mas há uma grande chance de ele ter feito sua mãe suspirar. Nos anos 1970, Pedrinho Aguinaga foi considerado o homem mais bonito do Brasil, título ganho numa eleição televisiva no Programa Flávio Cavalcanti, da extinta TV Tupi. Foi modelo, garoto-propaganda de cigarro, astro de bailes de debutantes e protagonista de uma das cenas mais tórridas da história do Cinema brasileiro. Bom de papo, antes mesmo de ligarmos os gravadores, Pedrinho já nos contava histórias deliciosas sobre seu convívio com astros da cena pop mundial daquela década – e sobre a impressionante lista de conquistas amorosas que fizeram dele uma lenda. Nosso encontro ocorreu na charmosa Tabacaria Gullo de Copacabana. Cabelos e barba grisalhos, camisa esportiva listrada em azul e branco, aberta e com as mangas arregaçadas, camisa básica preta, calça jeans, tênis esportivo, na hora marcada Pedrinho estava lá. Aos 64 anos, exibe excelente forma física. Mantém os mesmos 68 quilos há anos, bem distribuídos em seu 1,80m de altura. “Durmo cedo, caminho todos os dias, como pouco, bebo muita água. Meu único vício ainda é o cigarro”, diz Pedrinho, que
hoje acorda na hora em que ia dormir. Neto de um dos fundadores da Casa de Saúde São José, no Rio de Janeiro, Pedro é filho de um dentista “que nunca exerceu a profissão, mas que era muito bem relacionado”, conta ele. Passou o primeiro ano de vida no Alabama, nos Estados Unidos, terra de sua mãe – “uma linda oficial da Marinha norte-americana de quem herdei os olhos verdes”, acrescenta. Foi criado em Copacabana, onde hoje mora em um dos apartamentos que herdou no prédio antigo construído pela avó paterna. “Não saio de Copacabana por nada nem para nada. Aqui, sou amigo de todo mundo, todos me conhecem e cumprimentam”, diz o ex-modelo, que jura estar sozinho. “Tenho algumas amigas, mas namorada, não. Nem cachorro, que sempre tive, quero mais”, afirma. Na infância, Pedro estudou em um internato para meninos em São João del-Rei, em Minas Gerais, para onde foi mandado aos 11 anos por seu avô paterno, por causa das travessuras que fazia. “Sofri um pouco no início lá. Eu era franzino, muito pequeno, e os outros moleques implicavam comigo. Até que fiz amizade com
Pedrinho em três momentos: com Liza Minelli, Rose di Primo e com Monique Evans, mãe de seu único filho. Lá em cima, à direita, a inesquecível propaganda do “fino que satisfaz”
ENTREVISTA
Ao lado de Sarah Kubitschek, do Presidente Juscelino e da filha do casal, Marcia, que parece não conter a alegria de estar na foto com o Homem Mais Bonito do Brasil
um cara grandão, mais velho. E meus problemas acabaram”, conta ele, revelando um dos seus maiores talentos: a capacidade de fazer amigos. Quando retornou ao Rio, aos 15 anos, estudou no Colégio Pedro II, do Humaitá. “Um colégio misto! Aquilo era o paraíso”, diz, sorrindo. Passou para a PUC-Rio e tudo levava a crer que seria advogado. Mas a vida do jovem Pedro Aguinaga começa a mudar quando, em uma noite chuvosa, pegou o Gordini de uma tia emprestado e acabou batendo com o carro. Precisando de dinheiro para pagar a dívida com a oficina, decidiu se inscrever em um concurso de beleza. Era a primeira disputa de beleza masculina da TV brasileira, no programa do Flávio Cavalcanti. “A premiação era exatamente o valor do conserto”, lembra. Doze semanas depois, acabou sendo eleito o homem mais bonito do Brasil. Passou a ser convidado para desfiles, campanhas publicitárias, festas, viagens. “Mas o que eu mais gostava de fazer eram os bailes de debutantes”, afirma. Entre esses convites, surgiu aquele que mais marcou sua história e sua imagem pública: a propaganda do cigarro Chanceller. Naquela época, os comerciais de cigarro tinham produções milionárias. O que Pedrinho estrelou, contudo, prezava pela simplicidade – e talvez seja justamente por isso que tenha feito tanto sucesso. O Chanceller era um cigarro fino e longo, formato que não havia caído no gosto dos fumantes brasileiros ainda. “A grande sacada foi associar o Chanceller à elegância, ao luxo e à sofisticação”, lembra ele. “Minha última fala era assim: “Aí você diz: ‘Se Chanceller é tão bom e tão fino, onde estão os carros maravilhosos, os aviões, iates, helicópteros de todo comercial de cigarro?’. Então, viro o rosto, olho para a outra câmera e respondo: ‘E precisa?’”. O slogan da campanha publicitária era “O Fino que Satisfaz”, o qual acabou associado à imagem de Pedrinho. TV, jornais, revistas, outdoors... Até
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nas propagandas que passavam antes dos filmes nos cinemas, logo após o Canal 100 (quem tem mais de 40 anos, sabe o que é), o rosto de Pedrinho Aguinaga estava em toda parte. Com a beleza abrindo portas e sua capacidade de fazer amigos, Pedrinho acabou usufruindo de tudo aquilo que faltava na propaganda. “Nunca tive o melhor carro, mas sempre andei no melhor carro. Nunca tive iate, mas sempre andei nos melhores e mais luxuosos iates. A vida foi boa para mim”, conta ele. “Eu era um cara agradável, as pessoas gostavam da minha companhia. Mas nunca utilizei minha beleza para abrir qualquer porta. Porém, se a porta estava aberta e eu fosse convidado, entrava”, diz Pedrinho. “Minha vida foi fantástica pelos encontros que tive. Por isso, digo sempre que meu grande patrimônio são as histórias que vivi”, afirma. E Pedrinho saliva ao contar estas histórias. Sem muito esforço, este simpático sexagenário relembra o passado como se o tivesse acabado de viver, tamanha sua facilidade – e felicidade – de se referir a pessoas, lugares e fatos. Elegantemente, dá sempre o nome e o sobrenome de cada personagem que cita. “Tenho histórias fascinantes com gente fascinante. Maria Callas cantou para mim acompanhada de quatro Chihuahuas na suíte do Hotel Pierre, na Quinta Avenida, em Nova York! Isso mesmo! Quem você conhece no mundo que pode dizer isso?”, pergunta ele, com entusiasmo. “Mas jamais tivemos nada. Ela ainda era apaixonada pelo Aristóteles Onassis, que tinha acabado de deixá-la para ficar com a Jackeline Kennedy. Fomos apenas bons amigos”, jura.
Pedrinho com seu filho Armando e um dos vários cães da raça Dogue Alemão que o ex-modelo teve
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ENTREVISTA
Na época, a mítica revista Interview, de Andy Warhol, publicou um perfil do modelo brasileiro. E as portas se abriram. Passou a ser habitué da badalada boate nova-iorquina Studio 54. Era também visto em famosas boates europeias. “Eu era viciado na noite”, conta. Pergunto sobre as mulheres. Começo por Liza Minelli. “Para falar dela, tenho que falar primeiro de Marisa Berenson”, conta ele,sorrindo. Explica que Marisa Berenson era a modelo mais bem paga do mundo na década de 1970. “Quando a conheci, ela era casada com o homem mais rico da Europa. Quem me apresentou a ela foi o Valentino, o estilista italiano, que era meu amigo. Nossa química foi imediata. Passamos quatro dias no seu quarto de hotel, sem sair para nada, conta Pedrinho, com o olhar distante. “Liza, eu conheci no Rio, numa festa”, conta ele, acrescentando que ela e Marisa Berenson atuaram juntas no filme “Cabaret”. “Pedi para que me apresentassem a ela. Segurando sua mão, eu disse: ‘Boa noite, nós temos uma amiga em comum’. Ela quis saber quem era. ‘Marisa Berenson’, respondi. Ela não soltou mais minha mão. Ficamos juntos por cerca de um ano. Aquela mulher era uma espoleta!”, conta. Dono de uma segurança surpreendente, Pedrinho conta que jamais precisou fazer muito esforço para conquistar uma mulher. “Ficava parado, olhava, dava um sorriso. Por isso, sempre digo que eu tive uma vida sexual feminina”, explica. Ele garante que, como podia escolher, procurava preservar as que tinham compromisso. Mas já teve problemas com alguns ciumentos. “Porque algumas, buscando promoção, mentiam por aí, dizendo que tinham saído comigo. Aí os caras ficavam putos, né? Mas nunca aconteceu nada sério. Eu sempre tive jogo de cintura. Uma vez, um fortão me disse: ‘Vou te dar uma porrada!’. Eu respondi: ‘Isso é fácil. Quero ver é me dar uma televisão em cores!’, diz ele, rindo. Além de Liza Minelli e Marisa Berenson, na lista de mulheres que ele admite ter se relacionado, estão ainda Vera Fisher, Rose di Primo, Bianca Jagger e Demi Moore. “A Bianca Jagger correu atrás de mim em Londres, com a perna engessada. Foi hilário. Mas rolou, assim mesmo”, relata. “Demi Moore tinha 18 aninhos, desconhecida, ninfeta. Veio ao Brasil para fazer o primeiro filme dela, chamado ‘Blame it on Rio’. Fomos apresentados numa boate, conversamos um pouco e eu perguntei a ela: ‘Você conhece o paraíso? É um lugar com 365 ilhas, uma para cada dia do ano. E fica a duas horas daqui’. Passei dois dias e meio com ela em Angra dos Reis”, conta ele. Em 2011, quase se reencontraram na São Paulo Fashion Week. “Ela estava acompanhando o
Em Paris, no RollsRoyce de Aristoteles Onassis e ao lado de Elsa Martinelli e de Marisa Berenson, última à direita; abaixo, com Vera Fisher e Monique Evans em algumas das várias capas de revistas da época
namorado, o Ashton Kutcher, que desfilou para uma grife paulista. Eu ia desfilar pela Reserva, mas minha mãe faleceu na véspera do desfile e acabei não indo para São Paulo. Mas fiquei sabendo que ela declarou que, quando esteve no Brasil pela primeira vez, conheceu um lugar maravilhoso que tinha 365 ilhas...”, diz ele, com um sorriso no canto da boca. Pedrinho também atuou em alguns filmes. Entre eles, um dos mais polêmicos do Cinema nacional, “Rio Babilônia”, de Neville D’Almeida. “’Rio Babilônia’ foi uma filmagem digna de Fellini. Havia 300 pessoas, bebida, drogas, sexo, todo mundo pelado. Eu considero esse filme o melhor retrato da sociedade carioca da década de 1970: as drogas, o sexo, a roubalheira”. No filme, ele participa da clássica cena de ménage à trois com Joel Barcelos e Denise Dumont, em uma piscina. Nela, Joel e Denise aparecem transando de verdade. Na TV, fez apenas aparições pontuais em alguns programas e novelas. Ele recorda que, em uma delas, seu personagem fumava charuto. “Durante toda a trama, a mocinha estava prometida a um grande amigo do pai que nunca aparecia. Apenas a mão do cara aparecia, sempre com um charuto aceso. E ela sofria porque achava que o amigo do pai devia ser um velho. No capítulo final, eu apareço, com o charuto na mão. E a mocinha tem um final feliz”. Do seu relacionamento com a ex-modelo Monique Evans, nasceu Armando Aguinaga, seu único filho. “Como filho, nunca me deu qualquer problema. E hoje é o meu maior amigo. Totalmente responsável, ele hoje cuida de mim, cuida dos imóveis que herdei dos meus avós e me dá uma mesada. Não sou muito responsável com dinheiro, essa é a verdade”, confessa ele, sem medo de ser julgado pela sinceridade. “E me deu a maior alegria que tenho hoje na vida, minha netinha Vitória”, orgulha-se. Quando as badalações terminaram, Pedro foi trabalhar nos Estados Unidos, onde chegou a vender esmeraldas. Em Minas Grais, teve um restaurante e um ateliê de bordados. Prestes a completar 64 anos, pergunto se ele se arrepende de alguma coisa. “Talvez eu devesse ter dado mais atenção a algumas pessoas. Perdi alguns momentos”, diz ele. “Mas vivi minha vida exatamente do jeito que quis vivê-la”, completa. A vida do homem mais bonito do Brasil daria um livro, sem dúvida. E Pedrinho pensa em escrever sua história. Mas como ficção, para evitar problemas. “Se fosse autobiográfico, só poderia sair depois que eu morresse...”, brinca ele, dando uma sonora gargalhada.
MUNDO DO CHARUTO
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Cigar Smoking World Cha O americano Darren Cioffi foi o vencedor da 5ª edição da majestosa competição anual de fumadores de charutos organizada pelo Mareva Club, da Croácia, estabelecendo um novo recorde mundial. Split (CRO) – Com atividades deslumbrantes, foi realizado entre os dias 5 e 7 de setembro de 2014 o Cigar Smoking World Championship (CSWC 2014), celebrado pela quinta vez consecutiva em Split, a cidade costeira da Croácia onde havia a residência de verão do Imperador Diocleciano. O evento foi criado a partir da paixão pelos puros de Marko Bilić, presidente do primeiro clube de charutos da Croácia – o Mareva Club. A cada ano, o evento reúne pessoas proeminentes de todo o mundo, tornando-se a melhor promoção internacional da belíssima cidade de Split, com suas praias de águas cristalinas. A competição anual reúne os melhores fumadores de charuto do mundo,
Participantes durante o Jantar de Gala no Hotel Radisson Blu
Marko Bilić, presidente do Mareva Club, saúda os participantes do CSWC-2014, no já tradicional Welcome Cognac
que se classificam em torneios regionais organizados em vários países de todos os continentes. As atividades do fim de semana iniciaramse ao cair da tarde de sexta-feira, dia 5, com o já tradicional Cognac Boas-Vindas no deck vip do luxuoso Hotel Radisson Blu, onde também foi oferecido um jantar. No sábado, dia 6, houve um lauto almoço na espetacular adega do palácio de Diocleciano, no centro histórico da cidade,
onde os convidados puderam participar de uma festa temática cujo anfitrião foi um ator vestido como o imperador, regada a muito champanhe e, lógico, charutos. A noite de sábado estava reservada para a grande final da competição, realizada nos salões do Hotel Radisson Blu, e contou com a participação de representantes de 20 países, com um total de 74 concorrentes. As regras estabelecidas são rígidas, mas, em resumo, o desafio consiste em
Almoço na adega do Palácio do Imperador Diocleciano
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MUNDO DO CHARUTO
mpionship - 2014 Croácia
Visão geral da competição no salão principal do Hotel Radisson Blu
Competidores no momento de escolha e acendimento de seus puros
fumar o charuto previamente selecionado pela organização o mais lentamente possível, sem reacender. Este ano, o charuto escolhido foi o Montecristo No 04, e o grande vencedor foi o americano Darren Cioffi, fundador da Principle Cigars. Este, além de obter a primeira colocação, ainda bateu o recorde mundial de 1h52min27seg que era do austríaco Reinhold Wildmayer, um dos fundadores do Cigar Journal. Cioffi fumou seu Montecristo em exatos 1h55min35s, deixando todos os outros 74 adversários pelo caminho. O segundo lugar ficou com o ex-campeão Reinhold Wildmayer, com 1h52min10seg, e a terceira colocação coube ao russo Igor Korovin, com 1h48min38seg. Além do belíssimo troféu, o grande campeão ainda recebeu uma garrafa de Chivas Whisky Edição Especial e um cruzeiro de luxo ao redor da Croácia. Na sequência do evento, foi oferecido aos participantes o já tradicional Jantar de Gala, em que se distribuíram aos presentes os festejados charutos Rocky Patel, encerrando a incrível competição.
Já campeão, Cioffi é observado por todos na expectativa da quebra do recorde mundial. Abaixo, é acompanhado por um juiz enquanto se mantém concentrado na competição
Darren Cioffi, grande vencedor do V Cigar Smoking World Championship, no momento de sua premiação
MUNDO DO CHARUTO
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Cesar Adames Responde Envie sua dúvida para sdc@sociedadedocharuto.com.br A resposta poderá ser publicada aqui Cesar Adames é especialista em charutos e bebidas. Foi jurado do concurso Habanosommelier em Cuba por 10 anos e nominado Hombre Habano en las Comunicaciones em 2010. Professor do WSET de Londres e do Senac em Destilados.
Olá Cesar Adames. Tenho uma curiosidade. É público e notório que outros países, em especial a República Dominicana, que acolheu diversos refugiados cubanos, passaram a produzir charutos com as mesmas marcas já consagradas em Cuba, como Montecristo, Partagás, Romeo y Julieta, Cohiba, dentre outros. Sei que isso se deu em razão de uma desproteção de patentes, em razão dos embargos impostos à Ilha. Você sabe dizer por que razão a Marca Davidooff, que também era produzida em Cuba, deixou de ser produzida em solo cubano, ao contrário das demais, que continuam lá sendo fabricadas? Carlos Alberto Cardiano, Rio de Janeiro. Prezado Carlos, A história de Zino Davidoff e sua marca cubana começa logo após a revolução cubana entre 1964 e 1967. Fidel Castro queria acabar com todas marcas e criar apenas uma que iria se chamar Siboney. Foi Che Guevara quem convenceu Fidel a escutar um especialista no assunto, Zino Davidoff que disse que o diferencial e sucesso dos charutos cubanos estava na diversidade de marcas e formatos. Castro ficou satisfeito com a resposta e pediu a Zino o que ele queria como recompensa pelo conselho. A resposta veio imediatamente: “Comandante, gostaria de ter minha marca de charutos sendo produzida em Cuba”. Fidel aceitou e determinou que os charutos Davidoff fossem produzidos na recém inaugurada fabrica El Laguito, que na época produzia o Cohiba exclusivamente para Fidel e como presente diplomático. Já ouvi comentários que os charutos Davidoff tinham o mesmo blend do Cohiba só mudando a capa, que era mais clara. É interessante notar que o Cohiba Lanceros é igual ao Davidoff No1, o Cohiba Esplendidos (no formato Churchill) é igual ao Davidoff Dom Perignon entre outros. Este acordo foi mantido até inicio da decada de 1990 quando Davidoff ampliou sua produção para Republica Dominicana e entrou em conflito com a Cubatabaco, estatal que controlava toda produção de charutos na epoca (hoje Habanos S.A.). Foi determinado entre as partes que os charutos seriam produzidos até 1991 e só poderiam ser vendidos até 1992. De lá para cá só temos Davidoff na República Dominicana e os cubanos só aparecem de tempos em tempos em algum leilão em Londres. Boas baforadas.
INTER–TABAC 2014 Dortmund (ALE) - Tradicional ponto de encontro da indústria tabaqueira mundial, a Inter-Tabac é uma feira especializada em produtos de tabaco e acessórios, realizada anualmente em Dortmund, Alemanha, nos pavilhões de Westfalenhalle. Após o número recorde de visitantes e expositores na edição de 2013, a edição deste ano da maior feira de charutos, cachimbos e acessórios para fumar da Europa foi realizada entre os dias 19 e 21 de setembro e foi um grande sucesso, com mais de 450 expositores de 60 países, atraindo mais de 10.000 visitantes. A Habanos S.A. marcou presença na feira e, entre as novidades que foram oferecidas em seu estande, o destaque foi o Le Hoyo de San Juan, da Hoyo de Monterrey. Os puros foram oferecidos aos convidados no jantar de gala que a estatal cubana ofereceu para comemorar os 20 anos de sua criação.
ESPECIALISTA/LIVREIRO
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rodrigo ferrari Por Mauricio Maia
“O livreiro, basicamente, é o cara que conhece bem os livros que existem na loja e por isso atende o leitor de forma diferenciada” O carioca Rodrigo Ferrari dedica-se há mais de duas décadas à leitura. Começou a tomar gosto pela arte de ser livreiro trabalhando em uma das mais tradicionais livrarias cariocas, a extinta Dazibao, onde criou uma sessão especializada que chamou de “temas cariocas”: futebol, música popular e história do Rio de Janeiro. Apaixonado pelos assuntos, acabou abrindo sua própria livraria especializada, a Folha Seca, cujo nome é uma homenagem ao chute do ex-jogador Didi, ao samba do Nelson Cavaquinho com Guilherme de Brito e à folha de um livro. Nesta entrevista, ele nos fala da importância das pequenas livrarias e dos livreiros independentes, explica a diferença entre livreiro e editor e conta como a Folha Seca teve papel determinante na revitalização da Rua do Ouvidor, uma das mais cariocas das do Rio. SDC – Vamos começar perguntando sobre sua escolha de ser livreiro. Como e quando ocorreu? RF – Sempre li muito. Além disso, meu pai é advogado; minha mãe, professora; minha ex-mulher, também professora. Então, sempre tive muitos livros por perto. Aí, na época de faculdade, precisando de grana, acabei arrumando emprego em uma livraria tradicional que existia aqui no Rio na década de 1980, a Dazibao, que depois se transformou na Livraria da Travessa. E me identifiquei com aquele universo. Foi ali que tive, inclusive, minha primeira experiência editorial. Quando surgiu a oportunidade de ter minha própria livraria, abracei a ideia e fui em frente. E sempre com a ideia de ser um livreiro especializado, trabalhar com os temas nos quais me especializei e que chamamos de “temas cariocas” –o futebol, a música popular e a cultura geral do Rio de Janeiro.
SDC – Você disse que foi na Dazibao, onde você era empregado, que teve sua primeira experiência editorial. Como foi isso? RF – Como eu conhecia vários músicos de choro e samba, eu e um amigo resolvemos fazer uma revistinha, de brincadeira, para homenageá-los. Acabou se tornando num fanzine superconceituado, com vários nomes consagrados escrevendo, como Maurício Carrilho, Pedro Amorim, Luciana Rabelo, Nei Lopes, Hermínio Bello de Carvalho. Depois, a gente compilou tudo e ficou superlegal. SDC – Editor e livreiro são a mesma coisa? RF – Essa pergunta é interessante. Quando me perguntam o que faço, eu digo que sou livreiro e editor. Tradicionalmente, o cara que editava também era o cara que vendia. E essa tradição vem do primeiro livreiro carioca, Francisco de Paula Brito. Pouca
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ESPECIALISTA/LIVREIRO
gente sabe, mas ele era um negro que nasceu livre, em 1809, e foi o primeiro brasileiro a romper o monopólio dos franceses no comércio de livros. Começou como aprendiz de tipógrafo e depois teve sua própria lojinha, onde passou a editar livros e vendê-los. Daí a tradição. O livreiro, basicamente, é o cara que conhece bem os livros que existem na loja e atende o leitor de modo diferenciado, tentando assimilar o que o leitor está buscando. Por isso, precisa estar sempre atualizado, pois é quem faz a ponte entre a editora e o leitor. Mas a profissão de livreiro não é regulamentada. Então, na realidade, eu sou um comerciante. SDC – Como as pequenas livrarias sobrevivem a
esse mercado globalizado, em que concorrem com as grandes redes? RF – Nas grandes cadeias, os livros de pequenas editoras costumam ser mais difíceis de encontrar. É bem difícil achar um livro de uma pequena editora na Saraiva, por exemplo. Você pergunta e eles informam que não trabalham com aquela editora. Você não encontra. Mas existe uma demanda que precisa ser atendida e, por isso, as livrarias independentes e as especializadas sobrevivem. As pessoas vêm aqui porque sabem que eu sou uma livraria especializada, que vendo livros que não vão achar nas grandes livrarias. SDC – Então, pode-se dizer que numa grande livraria não existe livreiro? RF – É mais difícil ter. Nas gôndolas, você só encontra best-sellers, que não precisam de livreiros para serem vendidos. Você não encontra livros de autores ou editoras pouco conhecidos, que exigem conhecimento de quem os vende. Essa é a importância das pequenas livrarias e dos livreiros independentes: a preservação de pequenos editores, da diversidade de títulos, da pluralidade de ideias.
ESPECIALISTA/LIVREIRO
SDC – Você acha que a profissão de livreiro está acabando? RF – Acabando, eu não acho. Mas é um tipo cada vez mais raro. SDC – Vamos falar sobre a sua livraria, a Folha Seca. De onde veio a ideia do nome? RF – Bom, quando eu ainda trabalhava na Dazibao, criei uma sessão dentro da loja que chamei de “Temas Cariocas”, um espaço em que eu colocava os livros que falavam sobre futebol, música popular e história do Rio de Janeiro, assuntos sobre os quais sempre li muito e acabei me especializando. Ali já sabia que, se um dia eu tivesse uma livraria, ela seria especializada nesses temas. E já naquela época tinha escolhido o nome Folha Seca, que remete ao chute do Didi, ao samba do Nelson Cavaquinho com Guilherme de Brito e à folha de um livro. Mas só fui registrar o nome depois de dez anos de livraria (risos). SDC – E quando surgiu a Folha Seca? RF – A Folha Seca surgiu quando a Dazibao iniciou uma onda expansionista que se mostrou boa no início, mas depois foi descaracterizando a livraria. Eles tinham uma loja pequena na Praça Tiradentes, no local onde que era o antigo conservatório de música da época do Império e que a prefeitura transformou no Centro Municipal de Artes Hélio Oiticica. A loja não ia muito bem e o Jorge Bastos, que era o meu patrão, me perguntou se eu não queria ficar com ela. Então, chamei uma amiga que é historiadora para tocar o negócio comigo, a Daniele Duarte. E aí começamos nessa lojinha, que chamamos de Dazibao Folha Seca. Isso foi em 1997. Em 2007, transferimo-nos para a Rua do Ouvidor. A Dani se mostrou muito mais editora e eu, muito mais livreiro, e fazíamos uma parceria muito legal. Mas o comércio é um sacerdócio, ela não aguentou e acabamos nos separando. Hoje, ela é editora-chefe da Objetiva. SDC – E a Folha Seca já nasceu como livraria especializada? RF – Sim, eu dei continuidade ao que eu já fazia em uma pequena sessão da Dazibao. Meus livros são todos de futebol, de música popular e de história do Rio de Janeiro. E aqui pude desenvolver ainda mais essa ideia. Faço lançamentos de livros, com a presença do autor, coloco uma roda de samba ou de choro, mais ou menos como eu já fazia, e que virou uma característica da Folha Seca. SDC – A Rua do Ouvidor tem tudo a ver com a temática da sua livraria. Foi coincidência?
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RF – Mais ou menos. Quando a gente veio para cá, embora a Rua do Ouvidor seja uma das mais tradicionais do Centro, esse pedaço dela era mais identificado com o mercado de peixe, pela proximidade com o porto. Quando chegamos aqui, os bares sequer abriam aos sábados. Era tudo muito deserto. Passei a abrir aos sábados e, durante muito tempo, só eu abria. De vez em quando, fazia uma roda de samba, sempre aos sábados. SDC – Então a Folha Seca é uma das responsáveis por este movimento atual na Rua do Ouvidor? É... Acho que posso dizer que sim (risos). No início, era uma luta, porque eu não conseguia convencer os bares a abrirem aos sábados e, quando eu fazia uma roda de samba, precisava deles, pois eu não tinha estrutura de cozinha, muito menos de bar. Aí o Bar Antigamente, que é aqui ao lado, topou a ideia. E passamos a fazer a roda de samba quinzenalmente, sempre aos sábados, que se transformou no “Samba do Ouvidor”. A roda acontecia em frente à livraria. Só vinha o pessoal que gostava, um público que também comprava livros. Mas a coisa cresceu muito e acabou ficando meio incontrolável. Aí, resolvi parar. Hoje, o Bar Antigamente continua fazendo, mas agora não é mais na minha porta. SDC – Para finalizar, qual o livro que todo carioca ou quem goste da cultura do Rio deveria ler, um dia? RF – Tenho vários livros de que gosto muito, mas sempre indico um chamado “Passeio pelacidade do Rio de Janeiro”, de Joaquim Manoel de Macedo, autor de “A Moreninha” e “O Moço Loiro”. É um livro sensacional, que retrata a história da cidade pela ótica de um escritor, e não de um historiador, em que fatos e lendas maravilhosas da história do Rio se misturam. Um livro imperdível!
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ONDE FUMAR
Canela Do frango ao chocolate, a canela aromatiza e realça sabores dos mais variados As especiarias são utilizadas pelos chefs para enriquecer seus pratos e proporcionar aos degustadores uma experiência que vai além do paladar. Com o poder de aromatizar e realçar sabores, elas estão desde sempre ligadas à arte da culinária. A canela, em específico, pode ser facilmente encontrada em mercados comuns e é capaz de transformar o que seria uma simples receita em uma iguaria digna de aplausos. Nativa do Sri Lanka, no sul da Ásia, era comercializada a preço de ouro no século XVI e chegava ao Brasil por meio de comerciantes portugueses e, depois, por holandeses. Hoje em dia, encontramos o ingrediente a preços baixíssimos, se comparado à época das grandes navegações, mas, gastronomicamente falando, seu valor continua grandioso. Capaz de realçar tanto os pratos salgados quanto os doces, pode ser utilizada para condimentar frango, borrego ou legumes estufados. Neste caso, a especiaria deve ser utilizada no formato rústico, em pau. “Cozinhar o frango na canela em pau dá uma
O Hrisse, prato cri ado por Vivian Arab
textura e um sabor diferente ao prato, além de dar maciez e cor à carne”, explica a chef Vivian Arab, do restaurante Arab, especialista em cozinha árabe-judaica e marroquina. Já a canela moída é muito utilizada em sobremesas. Doces de maçã, pera ou chocolate fazem uma ótima harmonização com o ingrediente. Para os confrades que têm mais apreço pela cozinha e possuem, entre seus acessórios, um moedor, a dica para realçar o aroma é moer a especiaria na hora. Vivian também conta que o uso da canela fornece equilíbrio entre o doce e o salgado. “Segundo estudos, os semitas, o povo árabe em geral, têm uma taxa alta de glicose. E a canela na comida serve para equilibrar esse açúcar no sangue, pois os compostos de extrato da especiaria combatem alta taxa de glicose nas células”, conta. Vivian passou com exclusividade para a SDC sua receita especial de hrisse, prato à base de trigo, frango cozido, canela e manteiga. Confira a seguir!
Ingredientes
Modo de preparo
• 1 a 2 peitos de frango • Cebola a gosto • Alho a gosto • Sal a gosto • Cominho a gosto • Pimenta síria a gosto • 4 pedaços de canela em pau • 2 xícaras de trigo grosso • 3 a 4 colheres de sopa de manteiga
Refogue 1 ou 2 peitos de frango com cebola e alho a gosto. Depois de refogado, coloque água para cobrir o frango, não deixando a água secar, já que será usada para cozinhar o trigo. Coloque cominho a gosto, 4 pedaços de canela em pau e sal a gosto. Deixe cozinhar até ficar macio. Após cozinhar o frango, desfie-o e separe-o. Refogue 2 xícaras de trigo grosso com alho, cebola, sal, cominho, canela e pimenta síria. Depois de refogado, acrescente a água do frango e mexa até cozinhar. Quando estiver quase no ponto, acrescente o frango desfiado e mexa até ele se homogeneizar com o trigo. Em seguida, derreta 3 a 4 colheres de sopa de manteiga e acrescente o cominho. Despeje a mistura quente sobre o frango com trigo. Sirva com o pauzinho da canela para enfeitar. Se quiser, reserve alguns pedaços de frango para decorar o prato.
SERVIÇO: Arab – Avenida Atlântica, 1.936, Copacabana. Tel: 2235-1884. Capacidade: 200 lugares. Segunda-feira, das 17h à 1h; Terça a domingo, das 9h a 1h. Cc: todos; Cd: todos; Cr:VR no almoço de segunda a sexta-feira.
MEMÓRIAS DE FUMAÇA
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seu walter Por Clayton Cordeiro Uma das pessoas mais queridas no mundo dos charutos e cachimbos, com certeza, foi Walter Stumm, o “Seu Walter”, sócio da Gryphus junto com Dona Marli, sua irmã. Os dois eram figuras caríssimas, de educação primorosa, e grandes conhecedores de tudo o que se relacionava a charuto, cachimbo e fumos. Todos que frequentaram a Old Gryphus no Mercado das Flores, como ficou conhecida, sabem do que estou falando. O “Seu Walter” era incapaz de falar alto, tamanha era a sua principesca educação. Eu tinha um bom relacionamento com ele, mas um fato aparentemente corriqueiro fez com que me aproximasse muito dele. Ele tinha uma foto do pai, fixada em um quadro na tabacaria, e dizia que era uma foto muito importante, pois que possuía poucas fotos do pai, e esta tinha sido tirada pouco antes de seu falecimento. Era o início do Photoshop e eu estava querendo desvendar os mistérios deste novo programa que prometia maravilhas. Assim, propus recuperar a foto que estava no quadro, muito desgastada, se ele me confiasse o quadro único. Depois de mais de um mês trabalhando na foto, concluí o trabalho e mandei fazer um outro quadro, igual ao que ele me havia confiado. Quando entreguei o “serviço”, aconteceu uma coisa que me maravilhou. Seu Walter ficou olhando a foto, chorou, me abraçou e agradeceu muito, dizendo que eu não imaginava a emoção que ele estava sentindo. Nesta época, passávamos várias horas na tabacaria jogando conversa fora, bebendo e fumando. Lembro-me bem que, em uma data que não sei determinar, quando normalmente promovemos um almoço de fim de ano, foi criada uma brincadeira entre os frequentadores da Gryphus, capitaneada pela figura folclórica do Marquinhos (Dr. Marco Antônio Ferreira Macedo). Marquinhos é uma figura muito querida no meio charutófilo e deu apelido para quase todos os frequentadores da época. Aproveitando a dica de que tinha um pessoal que frequentava a hora do almoço e outro o fim da tarde, criou o nome de “Ricos e Famosos” para o pessoal da hora do almoço, pelo comportamento aristocrático, e o de “Pobres e Desconhecidos” para o pessoal da tarde, obviamente de comportamento mais chegado à “bagunça”. Geralmente, a casa não tinha hora para fechar, e o Eduardo, filho do Seu Walter normalmente tinha esta incumbência. Ficava bebendo e fumando com o pessoal. Quase no fim da existência da Old Gryphus, Seu Walter, já bastante debilitado em virtude dos problemas que tinha de circulação
sanguínea, ficou até mais tarde para fechar a tabacaria, em razão de Eduardo ter um compromisso. Na hora de fechar a porta de aço, o Eduardo tinha uma “manha” , pois a porta tinha um defeito. Obviamente, Seu Walter” não sabia, e ficaram os cinco últimos frequentadores ajudando o “Seu Walter” a travar a porta. Ele estava exausto, porque não conseguia fazer normalmente o movimento de abaixar para colocar o cadeado. Depois de aproximadamente meia hora tentando, conseguimos. Eu, a título de brincadeira, depois de tudo fechado, com a cara mais séria do mundo, cheguei ao Seu Walter e disse que teríamos que abrir novamente, pois eu tinha esquecido uma coisa muito importante lá dentro. Vi a angústia do olhar dele, mas sem reclamar ele se propôs abrir a porta. Um dos que estavam no grupo, sabendo que logicamente eu estava fazendo uma brincadeira de mau gosto, me perguntou o que de tão importante eu havia esquecido lá dentro. Eu, com a maior cara de pau, disse que era o meu isqueiro. Foi a primeira vez que eu vi o Seu Walter perder a compostura. Na frente de todos, me mandou “tomar naquele lugar”. Todos caíram na gargalhada. Ele, quando viu que era só uma brincadeira, ficou vermelho como acontecia quando ele estava nervoso. Por uns 10 minutos, pediu desculpa a todos pela perda da compostura. Muito marcante para mim foi outro fato acontecido com o Seu Walter no Hospital São Lucas, onde ele havia sido internado para ser operado de um problema de circulação, pouco antes de falecer. No dia da operação, saímos eu e o Eduardo mais cedo da tabacaria para irmos ao hospital acompanhar a operação. Como eu moro bem perto do hospital, fomos para casa e aproveitei para relaxar com o Eduardo, tomando uns aperitivos. Depois de terminar a operação, quando o Seu Walter já estava no quarto em companhia da esposa, do Eduardo e de mim, o médico com quem nós já havíamos conversado veio fazer uma visita. Então, aproveitei para fazer uma brincadeira com o Seu Walter, que ficou muito feliz com a minha presença, para relaxar um pouco o ambiente. Disse assim para ele: “Seu Walter, aconteceu um pequeno problema na operação e o pessoal que está aqui, inclusive o médico, pediu que comunicasse ao senhor que, por um erro, tiveram que amputar o seu bilau! Seu Walter, muito apreensivo, levantou o cobertor e enfiou a mão por dentro das roupas, com todos muito sérios. Ao constatar a brincadeira, e de ter sido pego em outra das minhas piadas, gargalhou e me disse: “Clayton, só você para me fazer rir numa hora desta”. Foi a última vez em que conversei com o Seu Walter.
Clayton Cordeiro de Souza é Presidente da ABAC - Associação Brasileira dos Apreciadores de Charuto
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A Sociedade do Charuto (SDC) nasceu do desejo de os amantes do charuto se manterem bem informados sobre o fascinante mundo do charuto. Aliado a isso, sempre existiu a necessidade de se estar tranquilo quanto à procedência daquilo que se adquire. Com este pensamento, ousamos construir mais e além. Somos seguramente o primeiro grande portal de informações voltado exclusivamente para os aficionados, pessoas que gozam de um estilo de vida singular e, até agora, inexplorado. Na Sociedade do Charuto esses aficionados tornamse membros, passam a compartilhar suas experiências e conhecimentos com os demais e conhecem novos produtos e lugares, ouvindo especialistas e interagindo entre si. Tudo isso no ambiente seguro de um verdadeiro clube voltado para os apreciadores de charutos. A SDC foi desenvolvida para nós, fumadores de charutos, que temos como hábito e princípio apreciar as boas coisas da vida.