REVISTA LABORATÓRIO LABORATÓRIO ED.04 | REVISTA NOV 2017 ED.5 | DEZ 2017
PROFISSÕES DE RISCO Carlos Ratton, jornalista investigativo, já foi ameaçado de morte
ATÉ ONDE VOCÊ IRIA PARA CUMPRIR O SEU DEVER?
#VIRALIZOU
EDITORIAL
E Para conferir mais sobre esta edição acesse nosso blog viralunisanta.blogspot.com
EXPEDIENTE REVISTA LABORATORIAL DO 4º ANO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL COM ÊNFASE EM JORNALISMO DA UNIVERSIDADE SANTA CECÍLIA (UNISANTA) - DEZEMBRO 2017 DIRETOR DA FAAC PROF. HUMBERTO IAFULLO CHALLOUB COORDENADOR DE JORNALISMO PROF. ROBSON BASTOS PROFESSORES RESPONSÁVEIS HELDER MARQUES, NARA ASSUNÇÃO E RAQUEL ALVES PROJETO EDITORIAL AMANDA OLIVEIRA, ESTHER ZANCAN, JANE FREITAS, LARISSA FRANÇA, LEANDRO PEREIRA, LUNA CONCEIÇÃO E RAQUEL VASCONCELOS PROJETO GRÁFICO ORIGINAL BRUNO LESTUCHI, LUCAS RODRIGUES E MARCELO HERMSDORF
PROJETO GRÁFICO ADAPTADO ALEXIA FARIA, BENNY COQUITO, FELIPE CINCINATO, GABRIELA RIBEIRO, KARINA BLACK, VINÍCIUS TOGNETTI E VÍTOR HENRIQUE PROJETO MÍDIAS SOCIAIS LARISSA MARTINS E PAULA FREITAS PROJETO FOTOGRÁFICO DIEGO ALVES, FÁBIO PRADO, GABRIEL SOARES, LETHÍCIA GABRIELA, MAYRA RODRIGUES E REBECA DE SOUZA SITE ANA CLÁUDIA, BRUNA CAPELLA, GILSON JÚNIOR, JAQUELINE SOUZA, MATHEUS DONCEV, MICHELY ARASHIRO, PAOLO PERILLO E VICTÓRIA SILVA
As matérias e artigos contidos nesta publicação são de responsabilidade de seus autores. Não representam, portanto, a opinião da instituição mantenedora - UNISANTA - Universidade Santa Cecília.
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ntregar-se ao desconhecido, sem medo do perigo. Talvez, uma pontadinha de frio na barriga, mas que não chega aos pés da adrenalina por enfrentar o novo, um caminho que, para muitos, tem sabor de realização profissional. Seja por amor à aventura, pelo prazer de desafiar o risco ou simplesmente por fazer aquilo que muita gente não tem coragem. Nesta edição da Viral, eles se atrevem, agem, correm, investigam, deitam com o inimigo, sobem nas alturas, enfim, trabalham movidos pela paixão. Escolhemos como tema as profissões de risco, aquelas que envolvem o medo, a responsabilidade extrema pela própria vida e pela vida do outro, e também a coragem de lutar por um mundo melhor. Cada profissão retratada nesta edição tem suas peculiaridades, os bastidores, aquilo que não é visto. Foi em busca do que não está visível que a reportagem saiu às ruas para buscar histórias de vida, de gente que é capaz de realizar o que parecia impossível. Já dizia Clarice Lispector: “Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade”. Em cada matéria, fomos transportados ao universo desses heróis e heroínas que não medem esforços para que a missão de cada dia seja cumprida. Esperamos que a quinta edição da Viral conduza você, leitor, a um novo mundo de conhecimento, respeito e curiosidade. E quem sabe, possa despertar, além da admiração, o desejo de trilhar por novos caminhos, e neles, confrontar seus próprios medos
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4 Jornalismo Batalha diária pela verdade
14 Prostituta
Medo e perigo na noite
18 Estiva
Dentro e fora do navio, vigilância constante
38 Ensaio
fotográfico
A rotina de quem trabalha na Unisanta
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TRATADOR DE ANIMAIS
ELETRICISTA
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POR TRÁS
DA NOTÍCIA NA BUSCA PELA INFORMAÇÃO, POUCOS SABEM OS RISCOS QUE CORREM OS JORNALISTAS INVESTIGATIVOS
Texto: AMANDA OLIVEIRA, KARINA BLACK, LUNA OLIVA E RAQUEL VASCONCELOS Foto: RAQUEL VASCONCELOS Edição: AMANDA OLIVEIRA E KARINA BLACK
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antos, 2001 Entre quatro e cinco horas da tarde, quando o jornalista Carlos Ratton se prepara para deixar a sucursal de Praia Grande do jornal A Tribuna, um chamado no meio da redação o parou: “Ratton, vários presos acabaram de fugir por um túnel lá no Dacar 10 (Cadeia Pública Manoel Luiz Ribeiro)”. No caminho para o presídio, o jornalista avistou uma senhora carregando duas sacolas, que pareciam pesadas, seguindo na mesma direção. Num primeiro momento, o fato não lhe pareceu fugir da normalidade. Após reunir os dados para a matéria, e quando retornava para a redação, avistou novamente a mulher, que ainda carregava as sacolas cheias, indo em direção à estrada. Desta vez, ele decidiu oferecer carona à mulher. No carro, na tentativa de descobrir o mistério das sacolas, deparou-se com um segredo mais obscuro que o túnel que havia permitido a fuga dos detentos do Dacar 10. A senhora contou ao jornalista que era esposa de um preso e não havia conseguido entregar os mantimentos ao marido, pois não tinha dinheiro para pagar as “taxas” exigidas para a entrada dos produtos. Nessa conversa, ele descobriu que as sacolas eram a prova de um esquema de corrupção entre presos e policiais que consistia em cobrar um “pedágio” para a entrada de mantimentos, celulares, visitas fora de horário, drogas e até mesmo fugas. Os valores dos serviços variavam entre R$ 50 e R$ 50 mil. Contudo, o jornalista precisava de provas para desmascarar o esquema. Para isso, ele
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decidiu apostar em uma manobra arriscada: se passar por parente da fonte que havia lhe repassado aquela informação. Munido de muita coragem e alguma insensatez, que ele considera essenciais para a profissão, Ratton voltou à cadeia alguns dias depois e realmente foi impedido de entregar os mantimentos se não pagasse a propina. No dia seguinte, a manchete de A Tribuna estampava o título CORRUPÇÃO, escrito em vermelho. A publicação fez com que o jornal passasse a receber ligações intimidadoras, que ele não sabia se vinham da polícia ou dos bandidos. Mas aquela não seria a primeira vez que ele receberia ameaças de morte ou iria invadir a toca de leões para obter respostas. Para ele, vale tudo para que o jornalista cumpra seu papel de mostrar a verdade para a sociedade.
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Todo caminho é correto para realizar uma matéria investigativa. CARLOS RATTON
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“Se for algo que vai render informação, apesar do medo, eu vou lá e faço. Por exemplo, quando o cara fala assim: ‘Pô, eu vou te ferrar’. Eu falo assim: ‘Entra na fila, tem uma fila enorme. Quem sabe chega a sua vez’”, enfatiza. Os fins não justificam os meios O jornalista policial Eduardo Velozo Fuccia acredita que não vale arriscar tudo para conseguir a matéria. Para ele, o limite na busca por uma informação é imposto pelo que ele denomina “trinômio da legalidade, ética e bom senso”. Fuccia defende que não é correto corromper seu caráter e credibilidade, e principalmente colocar em risco a vida de outras pessoas por uma manchete. Ele tem ciência de que nesta área jamais conseguirá agradar a todos, por isso, se utiliza da cautela como proteção. O maior risco que o jornalismo investigativo oferece, segundo Fuccia, não está relacionado a si próprio, mas ao fato de que uma palavra equivocada pode custar a vida de alguém. Por isso, antes de publicar uma matéria, avalia todos os prós e contras. Para ele, não é uma regra matemática, mas as análises são distintas conforme o caso. “Se for algo ilegal, a gente está ultrapassando esse limite. Às vezes a coisa é legal, mas não é moral, não é ética. Também estaremos ultrapassando essa fronteira. Às vezes pode ser moral e até legal, mas o bom senso manda que a gente puxe o freio de mão”, explica.
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Das agressões contra jornalistas partem de agentes do Estado (políticos, agente público e polícia)
Dos motivos são as denúncias feitas sobre os crimes cometidos pelos agentes públicos
Meios para não chegar ao fim Entre as duas visões paralelas sobre a profissão, Luiz Linna está no cruzamento. Apesar de compartilhar da mesma crença de Ratton, que vale tudo pela notícia, ele procura não expor sua identidade. Como produtor de televisão, está habituado a ficar nos bastidores da notícia. “Fiquei mais cauteloso sobre quem aceitar nas redes sociais, até que ponto eu deixo claro onde estou ou o quanto posso me expor na internet, por exemplo. Hoje, sou muito mais cuidadoso com relação a tudo isso”, diz. O jornalista conta que nunca sofreu ameaças, mas acredita que nessa área não há muito tempo para se considerar todos os riscos. Se pensar demais, pode perder a notícia. O medo existe, mas ele nunca está acima do dever de informar.
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Paixão que arde sem se ver Para Ratton, a relação com o jornalismo foi amor à primeira vista. A paixão arrebatadora pela profissão surgiu por meio do sonho que ele sentia de mudar o mundo e torná-lo um lugar melhor. Por isso, ele acredita que os fins justificam os meios. “Todo o caminho é correto para realizar uma matéria investigativa. Eu vou até pelos incorretos se valer a pena, se for para ajudar alguém. Só não vale roubar, ser sacana, forjar documentos e afins”, explica. Manter a chama desta paixão acesa é parte de sua personalidade. Ele se descreve como uma pessoa hiperativa, então cair na rotina é algo contrário a sua própria essência. Ser repórter para ele, não é apenas um trabalho, é um estilo de vida. Ratton acredita que a relação com a profissão é uma troca equivalente. “Eu devo tudo o que sou ao Jornalismo. Entendo o ser humano de forma mais profunda e respeito a individualidade das pessoas. Minha visão de mundo mudou completamente”. Um casamento de sucesso Velozo cresceu entre as palavras. As páginas dos jornais que seu falecido avô lia assiduamente lhe encantaram desde a tenra infância. Ao longo dos anos, ele foi alimentando aquele amor gradativamente. Por fim, escolher o jornalismo como profissão foi algo natural. Quanto à área policial, ele não vê como uma escolha direta, pois acredita que o universo conspirou para que eles se encontrassem. No começo da carreira, seu coração batia forte pelo caderno de esportes, mas a chance de atuar na profissão chegou como repórter da editoria de Polícia. Desde então, o que parecia inicialmente apenas um namoro, se transformou em casamento. Apesar de gostar muito do que faz, ele sabe que o seu trabalho pode ser perigoso para si e para outras pessoas. Para minimizar riscos, se
Das investigações de violência contra jornalistas nunca foram concluídas ou sequer iniciadas
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Carlos Ratton coleciona matérias memoráveis e ameaças inesquecíveis
baseia no princípio da isenção. Diz que já sofreu ameaças e teve que lidar com a insatisfação de terceiros, mas não gosta de falar do assunto. “Coisa ruim a gente não tem que ficar dando muita divulgação, até porque é gastar vela com mau defunto”. Para ele, seu maior compromisso é com o leitor. E sua fidelidade é com a verdade. Aos seus olhos, a realidade sobre a profissão é nua e crua: “O jornalista é um profissional que trabalha bastante, mas não é remunerado à altura. Jornalismo, acima de tudo, é sacerdócio, é vocação”. Até que a morte os separe Linna sempre teve gosto por aventuras. No início da faculdade decidiu que queria ser pauteiro. Adorava escrever sobre a cidade e o comportamento social. Desta forma, ele tinha a liberdade de construir textos mais poéticos e refinados. Diferente dos seus planos, a vida lhe trouxe a oportunidade de se tornar produtor na área investigativa. Apesar de seguir para um rumo inesperado, ele conseguiu aplicar a paixão de explorar o mundo e transmitir seu conhecimento para outras pessoas. Ele acredita que a chave do sucesso para uma relação duradoura está nos detalhes, por isso, seu dia a dia inclui: pesquisa, análise e checagem minuciosa de dados. Ser responsável por enviar outra pessoa para uma situação em que ela possa estar exposta a riscos é uma tarefa que requer muito cuidado.
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Apesar de buscar segurança no anonimato, ele sabe que é inevitável esbarrar em coisas perigosas. “Eu tenho a minha família, namorada, irmãos, tudo... Com a internet, saber das pessoas é muito fácil. E a gente acaba mexendo com gente muito grande: políticos, policiais e bandidos. Hoje nas redações, é cada vez mais difícil desenvolver esse tipo de jornalismo. Os jornalistas cada vez menos quebram a cabeça, cavam a notícia, mas eu quero continuar assim”
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Minha vida pela sua
Texto: LETHICIA GABRIELA Foto: FÁBIO PRADO Edição: VINI TOGNETTI, BENNY COQUITO, LUCAS SANTOS
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FRENTE A FRENTE COM A VIOLÊNCIA: A CADA DOIS DIAS, TRÊS POLICIAIS MORREM NO BRASIL
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A gente faz o trabalho que ninguém faz. Quem dá o peito por outro cidadão? Quem troca a sua vida pela de seu semelhante?”, pergunta Alberto Mem de Sá, investigador da Polícia Civil (PC) e membro do Grupo de Operações Especiais (GOE). Ele faz parte de uma das instituições brasileiras que mais colabora para as estatísticas dos profissionais mortos em serviço. A Ordem dos Policiais do Brasil (OPB) contabilizou até o mês de agosto deste ano, 439 mortes. No ano passado, no mesmo período, foram 324. Na Baixada Santista, os números também impressionam: em apenas quatro dias do mês de setembro, quatro policiais militares ficaram feridos e dois morreram. Cada caso com sua particularidade, mas revelando que o perigo da profissão é real e próximo. Nos últimos meses a imprensa divulgou diversas mortes de PMs à paisana e em serviço no Rio de Janeiro. Em setembro, chegou-se a um total de 100 assassinatos no ano, a maior média em mais de uma década. Policiais que foram executados simplesmente porque faziam o seu trabalho.
A estatística revela a vulnerabilidade em que os profissionais se encontram. O alarmante é que 53 dessas mortes ocorreram quando os agentes estavam de folga, ou seja, há grande possibilidade de terem sido executados exclusivamente por serem policiais. Dos 47 restantes, 21 estavam em serviço, cinco faziam o percurso de casa para o trabalho e 21 eram reformados, da reserva ou licenciados.
Palco de guerra
Os frequentes conflitos na favela da Rocinha levaram mais de 500 homens da Polícia Militar (PM) àquela comunidade. Um verdadeiro palco de guerra é vivenciado pelos moradores do local. Balas perdidas e fogo cruzado viraram rotina, obra das facções criminosas que assumiram o controle da Rocinha, resistindo e enfrentando as tentativas de pacificação. Segundo um levantamento da PM e da PC, um policial morre a cada 40 dias em UPPs do Rio, combatendo o tráfico e quadrilhas. Na Baixada Santista, em apenas quatro dias do mês de setembro, quatro policiais militares ficaram feridos e dois morreram. Cada caso com sua particularidade, mas revelando o perigo da profissão.
Manoel Gatto Neto é delegado seccional de Santos e especialista em Direitos Humanos e Segurança. Para ele, sua profissão, além de reconhecidamente perigosa, também é insalubre. “Nós abordamos todos os tipos de pessoas. Muitas delas, armadas, reagem à abordagem, ou acabaram de cometer um crime. O índice de letalidade das polícias au3 mentou muito em decorrência dessa agressividade, tornando o nosso trabalho altamente periculoso”, explica o delegado.
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Buscar a verdade
Para ele, tem bastante a ver com uma questão cultural brasileira. “Ninguém gosta de ser fiscalizado, muito menos cobrado. É preciso ver o trabalho das polícias por outro ângulo”. Ele esclarece que a polícia existe para representar a lei, de maneira a garantir a segurança e proteção das pessoas. Não para prender. “O nosso papel constitucional é investigar e buscar a verdade dos fatos e não acusar”, diz. O investigador Alberto Mem de Sá conta que, em operações mais perigosas, toda sua família fica apreensiva. E quem fica em casa sabe da ansiedade e tensão que sofre. “Minha esposa me liga sempre para saber o que aconteceu, meu filho fica preocupado. Graças a Deus até hoje deu tudo certo. Já fui ameaçado por bandidos inúmeras vezes, vi colegas morrerem. É uma profissão em que a gente enfrenta de tudo”, conta. Mem de Sá ressalta que em todos os locais onde vai, permanece atento. Tanto para se proteger e zelar pela sua segurança, como de quem está por perto, principalmente em locais de grande aglomeração. Segundo ele, o medo fica de lado na hora em que o profissionalismo assume e a chave é ter a atenção redobrada.
MORTES DE POLICIAiS EM SERVIÇO NO PAÍS
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FONTE: Ordem dos Policiais do Brasil
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André Luís Magalhães Bonifácio, porta-voz da Polícia Militar na região, explica que, nos períodos de maior risco, como feriados e fins de semana, a polícia sabe que o combate aos criminosos é garantido, e é aí que começa o risco. “Em uma ronda comum já chegamos a abordar quadrilhas com fuzis. Esse tipo de armamento pesado causa ferimentos extremamente graves. Em 2012, nas proximidades do Canal 3, um grupo começou a disparar na direção dos agentes e a troca de tiros foi inevitável. Infelizmente, na ocasião, um policial e um munícipe que passava pela rua morreram”, relembra
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Nós abordamos todos os tipos de pessoas: armadas, que reagem ou acabaram de cometer um crime.
Manoel Gatto, Delegado
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Texto: BRUNA CAPELLA, MAYRA IGNÁCIO E PAOLO PERILLO Foto: ALEXIA FARIA E GABRIEL SOARES Edição: ALEXIA FARIA
Do lixo ao luxo
PROFISSIONAIS DO SEXO SE ARRISCAM DIARIAMENTE E ALIMENTAM A ESPERANÇA DE UMA VIDA MELHOR
* Nomes fictícios
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er prostituta no Brasil é se equilibrar entre altos e baixos. A profissão é de risco, já que expõe mulheres a situações degradantes e violentas. Mas, existe o outro lado dessa “vida fácil”. São as garotas que habitam o mundo luxuoso da prostituição, regado a festas e oportunidades de ganhar mais dinheiro. Uma pesquisa sobre o assunto, realizada em 2010 e exibida no programa “A Liga”, da Rede Bandeirantes, revelou que há no Brasil 1,5 milhão de profissionais do sexo. Desses, 78% são mulheres. As travestis correspondem a 15%. Segundo a pesquisa, 87% da prostituição acontece na rua, o restante em bordéis ou por catálogos/sites. Ao abrir o Google e digitar “garotas de programa de luxo” a diversidade de resultados é enorme. Mas, como em qualquer outra ferramenta de busca, nos primeiros tópicos surgem as referências que estão geograficamente mais próximas do pesquisador. Sites de acompanhantes de luxo não faltam na Baixada Santista. Neles é possível encontrar extensos catálogos de fotos e descrições de diversos tipos de mulheres.
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Mas por que largar uma carreira promissora, em qualquer outra profissão, para se tornar acompanhante? Elas não gostam dos termos “prostituta de luxo” ou “garota de programa”. Preferem “acompanhantes”, já que muitas vezes são contratadas por empresários que não querem aparecer desacompanhados em eventos. Mas é fato que a maioria está envolvida com prostituição. É difícil achar uma acompanhante que queira falar abertamente sobre esse mundo, que segundo elas, é muito fechado. Não mostrar o rosto nas fotos de uma reportagem, por exemplo, é unanimidade entre elas. Algumas dizem que a família não sabe a real ocupação, outras dizem se preocupar com a fidelidade dos clientes: “Imagina se chega uma foto minha ou essa entrevista pra algum dos clientes! Acaba o contrato na hora. Eles querem sigilo absoluto”, pontua Amanda*. “Morena do Sul, recémchegada a São Paulo, atendimento completo”. É assim que Viviane* se descreve em um dos sites de acompanhantes. Ela conta que veio de Santa Catarina em busca de novas oportunidades: “Cheguei para fazer faculdade em
2014, passei no vestibular e iniciei o curso de Farmácia, mas as dificuldades foram aparecendo e conheci o ramo das acompanhantes de luxo”. Viviane conta que algumas colegas de universidade apresentaram a ela as facilidades do ofício. “Algumas chegavam a ganhar 5 mil reais por semana. Era tudo o que eu precisava, pois tinha que me manter em São Paulo, onde o padrão de vida é alto e eu não conseguia emprego, muito menos estágio na área que eu estava estudando”, conta. Quando Viviane se deu conta, já estava trabalhando no ramo. Trancou a faculdade e passou a a investir em si mesma: “É uma exigência muito grande, temos que estar bonitas o tempo todo, senão não entramos em nenhum catálogo”. Ela conta que algumas vezes é contratada apenas para acompanhar, mas que é mais procurada para o “atendimento completo”, como ela gosta de falar. Os preços variam de acordo com a cidade (ela atende na Baixada Santista e em São Paulo) e o valor inclui evento, o serviço
Olhar atento à espera do próximo cliente, Alana prevê uma noite de movimento fraco no novo ponto. Ela teve que abandonar o antigo posto de trabalho por causa de brigas com uma colega de profissão
e o tempo de companhia. Ela jura que consegue tirar consegue receber, em média, R$25 mil por mês. Mas Viviane não tem a sua vida cercada só de dinheiro e luxo; infelizmente já sofreu alguns casos de violência durante o programa. Isso fez com que ela passasse a ser mais criteriosa na hora de aceitar a oferta. “Não tem muito como prevenir, às vezes a pessoa se revela outra e quando nos damos conta estamos no meio da situação. O medo é constante, porém não posso me apegar, tenho que trabalhar”, conta Viviane. Ao ser perguntada por nossa reportagem sobre algum caso de violência que viveu, ela prefere não contar uma história específica. Segundo a garota
de programa, relembrar essas coisas a deixa triste, pois nunca teve o respaldo necessário nessas questões, tanto da polícia quanto de quem convive com ela. “Prefiro não lembrar, tem horas que é melhor sofrer calada”. “Nunca me imaginava trabalhando com isso, saí de Santa Catarina com uma expectativa muito grande da minha família. Eles nem sonham que sou acompanhante, envio dinheiro pra eles e digo que estou trabalhando em uma grande empresa. Evito pensar no futuro, mas não consigo mais sair desse mundo. Gosto do meu trabalho, frequento grandes eventos e ganho o suficiente para cuidar de mim. Não é a vida ideal, mas, a que eu escolhi”, finaliza.
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“SE NÃO QUISER USAR CAMISINHA, TOˆ FORA!” Continuando a incessante procura por novas personagens para a matéria, decidimos seguir para o Centro de Santos, talvez a mais conhecida zona do baixo meretrício da Baixada Santista, onde se misturam bares, drogas e muita oferta de sexo. É comum encontrarmos moças e travestis disputando a atenção dos clientes e o espaço nas calçadas e “portinhas” . Em um dia de semana, com as ruas vazias e escuras, encontramos na esquina das ruas Itororó e Amador Bueno, Alana*, cerca de 25 anos, loira, alta, com o olhar atento aos carros que passavam. Quando a abordamos, Alana estava um pouco receosa com a entrevista, mas não demorou muito para conquistarmos sua confiança e iniciar o papo sobre sua vida nas ruas. Sua história começou há seis anos, após a
Segundo o pesquisador da Universidade de São Paulo (USP), Alexandre Grangeiro, de cada dez prostitutas, uma é soropositiva para HIV
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saída de casa por uma briga com os pais. Logo foi acolhida em um cortiço perto do local onde trabalha atualmente. No início, resistiu a entrar nesse mundo, mas as dificuldades foram aumentando até que não restava mais saída, Alana precisava de dinheiro, e dinheiro rápido. “Precisava da grana para conseguir fazer uma faculdade e me manter com um mínimo de dignidade em uma cidade grande, de custo de vida alto”, afirmou. Aprendeu o ofício com as colegas do cortiço. Por exemplo, o que precisaria para chamar a atenção dos clientes. Aos poucos, Alana ficou conhecida no ramo e já atendia mais de três clientes por noite, cobrando R$ 200 por hora. Mas a rotina nunca trouxe felicidade, muito pelo contrário. “Sempre que entro em um carro para fazer um programa fico angustiada, com medo de não voltar mais ou de pegar alguma outra doença”, explicou. Após essa declaração, perguntamos como funcionava a prevenção com o risco mais aparente da profissão, as DST´s. A resposta foi simples e direta: “Usamos praticamente todas as vezes camisinha, o problema é quando o cliente vira ´fiel´“. A palavra fiel é utilizada para o cliente que paga o programa toda semana com a mesma prostituta. Alana conta que uma de suas colegas de trabalho tinha um “fiel” há cerca de um ano e, por isso, não usavam mais preservativo. Até que um dia, sua amiga começou a sentir fortes dores abdominais, mal-estar, febre e fadiga, todas pensavam que não passava de uma gripe comum. Na ida ao hospital, a colega foi diagnosticada com o vírus HIV e logo depois descobriu que o seu cliente fiel havia-lhe passado a doença. “Depois disso, de ver ela nesse estado, comecei a tomar muito mais cuidado. A partir de agora é exame todo ano, se bobear, de seis em seis meses. E falo mais: não é só ela quem tem essa doença, muitas prostitutas têm e não contam para os clientes”, comentou Alana. “As condições são precárias, nosso chefe não nos oferece nem a camisinha de graça, muitas vezes o cliente também não leva, então temos que andar sempre com ela para que não haja desculpa na hora H. E para mim não existe mais desculpa de cliente fiel não, se não quiser usar camisinha, tô fora”, finalizou.
“A POLÍCIA FICA SEMPRE CONTRA A GENTE” Ainda no Centro de Santos, encontramos pelas ruas desertas da noite santista, Jenniffer, de 21 anos. Antes da abordagem, era possível sentir a tensão no ar. A equipe da Revista Viral foi avistada de longe por ela, que conversava com uma colega na esquina da rua Itororó com a Amador Bueno. Olhares desconfiados e atentos a tudo. Aos possíveis clientes que transitavam de carro e diminuíam a velocidade perto delas, aos carros de polícia que, hora ou outra, se faziam presentes. E, obviamente, o receio de conversar com pessoas estranhas que não
estavam ali para fazer programa. Jenniffer não quis revelar seu nome de batismo, porém, disse que começou a trabalhar na rua há um ano. Sem muitas oportunidades na vida, abraçou a chance que lhe foi oferecida e desde então, faz do ofício seu ganha-pão. Com pouco tempo de conversa e mais relaxada, ela conta algumas situações que passou durante o trabalho. “Uma vez um homem foi comigo pro quarto, pediu programa completo e no final, ao invés de me pagar, tentou roubar meu celular. Dei logo um soco na cara dele e ele revidou. Rolamos
no chão e deu até polícia. E sabe o que é pior? A polícia fica sempre contra a gente.” Perguntamos a ela se já tinha corrido risco de morte e a resposta foi positiva. “Um cliente não quis pagar o programa, que, aliás, nem desfrutou. Ficou cheirando cocaína o tempo todo e me oferecendo. No final, quando cobrei, ele começou a me espancar e me deu uma facada no ombro.” Jenniffer diz que a vida na rua é dura. Atualmente, ela tem um local próprio para atendimento, e que lá tem escondido um taco de beisebol. “A gente nunca sabe quando vai precisar, né?”
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Casos de violência física são frequentes, mas, segundo as garotas que trabalham nas ruas, a polícia quase não dá atenção
PRINCIPAIS PONTOS DO MERETRÍCIO
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Um grito vindo dos
porões Maior porto da América Latina abriga uma atividade repleta de desafios e perigos: a estiva
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esmo em pleno século XXI, a força física ainda é a responsável por mover uma das engrenagens mais importantes do país: o porto, por onde passa boa parte das exportações que trazem a riqueza e o desenvolvimento. Estamos falando dos estivadores. Essa categoria de trabalhadores tem como palco de seu labor exclusivamente os conveses e porões. Eles respondem por toda a atividade de retirada e arrumação nas embarcações dos mais diversos tipos de carga, como granéis, contêineres e veículos. Operam também todos os equipamentos para a movimentação, como esteiras, guindastes e empilhadeiras. O estivador ainda é preparado para agir em momentos de acidente a bordo. Antigamente, eles dependiam apenas de sua força física. Hoje a modernidade trouxe a tão almejada ajuda, mas por outro lado, se tornou a principal inimiga da profissão, porque novos equipamentos estão tomando o lugar de postos de trabalho. Fora isso, ainda lidam diariamente com o perigo e a insalubridade inerentes à atividade. Em cada navio o estivador encontra um ambiente diferente. Há embarcações envelhecidas, sem equipamentos modernos, e os que resistiram estão corroídos pela maresia.
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Segundo o Sindestiva (Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Cubatão e Guarujá), no que tange à insalubridade, desde o momento em que o estivador entra na área portuária ele já se depara com essa condição. O pó das cargas manuseadas, a poluição dos caminhões e fezes de pombos são comuns. Depois, existe o risco com as operações de embarque e desembarque de cargas perigosas, como amônia, enxofre e outras substâncias explosivas. Há ainda o problema com a altura. Muitas vezes eles sobem o equivalente a um prédio de 15 andares para destravar os contêineres. Em outras vezes também descem abaixo do nível do mar para fazer a limpeza dos porões. Cicatrizes Ser estivador é quase sempre ter uma triste história para recordar. João Edison Ferreira Vasconcelos é um exemplo disso. Estivador há 44 anos, ele relembra o acidente que sofreu em 1978. “Levei 38 pontos na cabeça e sofri um traumatismo encefálico depois que um feixe de madeira que estava subindo no guincho caiu após bater na lateral do porão”. João não estava utilizando EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), pois essa obrigatoriedade no Porto de Santos só passou a valer a partir de 2007. Além disso, a parte
TexTo: esTher Zancan, PaTrícia DanTas e LeanDro Pereira FoTo: GabrieLa ribeiro eDição: GabrieLa ribeiro, rebeca De souZa e PaTrícia DanTas
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Levei 38 pontos na cabeça e sofri traumatismo encefálico depois que um feixe de madeira que estava subindo no guincho caiu após bater na lateral do porão”
João Edison Ferreira Vasconcelos, estivador
em que ele se encontrava era refrigerada e utilizava apenas um macacão aflanelado para se proteger do frio. Os primeiros socorros foram realizados pela própria tripulação do navio, de bandeira grega. O resgate do porto demorou muito. João ficou hospitalizado por 14 dias e afastado das funções por oito meses. Essa não obrigatoriedade de EPIs também facilitou o acidente de Luiz Antônio Almeida, 20 anos de profissão. Em 1997, ele não usava os óculos de proteção e, quando teve início uma forte ventania, que levantou muita poeira da carga que ele manuseava, Luiz escorregou no convés, caindo por cima do joelho. Isto provocou uma grave lesão irreversível, com rompimento de ligamentos. “Fiquei afastado por sete anos e não tive nenhuma visita da assistência social.”
Sergio Coelho - Codesp
A estiva é repleta de riscos. Trabalho em altura e poluição são alguns deles
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Luiz Fabiano da Silva, 25 anos de estiva, bisneto, neto e filho de estivadores, ilustra também essa triste realidade de perigos. Em 1999, ele teve a perna esquerda esmagada entre um contêiner e a base de estrutura do navio. O acidente aconteceu no terminal da Santos Brasil que, segundo o trabalhador, naquela época não possuía uma brigada de emergência. Dessa forma, o socorro se transformou em um pesadelo dentro do pesadelo. Bombeiros de fora dos limites do porto tiveram que ser acionados, e estes não possuíam os acessórios adequados para realizar o resgate. Luiz teve que ser retirado de dentro do navio de forma improvisada em um contêiner flat rack (espécie de contêiner aberto). A operação de socorro acabou se estendendo por cerca de duas horas. Ele levou 70 pontos na perna, e, por sorte, não teve o fêmur atingido. Período negro Hoje em dia, os riscos de acidentes foram reduzidos. Mas o cenário era bem diferente no início da década passada, pelo que conta Sandro Olímpio, diretor beneficente do Sindestiva: “Por volta de 2002, houve um período seguido de mortes, logo quando se iniciou a automatização do porto, pois não havia cursos. Os trabalhadores vinham de uma metodologia manual, já estavam habituados a uma certa velocidade de trabalho. Mas o porto foi se modernizando, e o OGMO (Órgão Gestor de Mão de Obra), que deveria ser o órgão competente para implementar os programas de treina-
mento, não o fez de forma adequada. Por isso houve uma série de acidentes que ocasionaram muitos óbitos. Na época, houve alguns movimentos na Cidade e, com isso, conseguimos ter mais segurança dentro das embarcações e treinamento para os trabalhadores.” Ainda segundo Olímpio, de vez em quando acontece algum tipo de acidente, mas não são fatais. “Todo ano temos cursos de aperfeiçoamento voltados para a área portuária, adequações ao novo sistema. Mas ainda há muito por fazer. Estamos sempre em busca de melhorias para o trabalhador, mas infelizmente os órgãos competentes não acompanham as nossas exigências.” O outro lado O presidente do OGMO, Querginaldo Camargo, explica um pouco como funciona o órgão: “Temos duas categorias de estivador, uma que é o vinculado e outra que é o avulso. O OGMO tem uma função específica, ele fiscaliza o trabalhador portuário avulso. A partir do momento que ele ingressa no regime de CLT, sai da nossa alçada, e essa é a reclamação dos sindicatos. Muitas vezes nos acionam para fiscalizar uma função de trabalhador vinculado e não temos essa competência”. Quando ocorre um acidente, Querginaldo explica que o OGMO possui um sistema de ambulâncias para os resgates e faz acompanhamento com uma estrutura de psicólogos e assistentes sociais pós-acidente. O engenheiro coordenador do Serviço Especializado em Segurança e Saúde no Trabalho Portuário (SESSTP), ligado ao OGMO, Ricardo de Deus Carvalhal, acrescenta que existe um Curso de Capacitação em Segurança no Trabalho Portuário, ministrado por técnicos de segurança do trabalho do SESSTP, que promovem diariamente orientações e intervenções paraaumentar a percepção dos estivadores. Conjuntamente, são realizadas campanhas e cursos em parceria com importantes instituições da região, como a Universidade Santa Cecília (UNISANTA), onde o trabalhador adquire conhecimentos que, direta ou indiretamente, fomentam o comportamento seguro
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Texto: LARISSA MARTINS Fotos: LARISSA MARTINS, JESSICA SOUZA E PAULA FREITAS Edição: GILSON SANTOS, VITOR HENRIQUE, PAULA FREITAS E JESSICA SOUZA
BEM-VINDO À VIDA SELVAGEM RISCOS, SUSTOS E RECOMPENSAS NA VIDA PROFISSIONAL DE QUEM AMA OS ANIMAIS
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Q
uando se pensa em cuidados com animais, a primeira profissão que vem à cabeça é a de médico veterinário, não é mesmo? Afinal, quem ama bichos, com certeza já cogitou a possibilidade de seguir essa carreira. Mas, além dos veterinários, há biólogos, tratadores, cuidadores, montadores, adestradores e muitos outros profissionais que também lidam com as mais variadas espécies de animais, e que muitas vezes têm o risco como parte da rotina de trabalho. Em fevereiro de 2015, um tratador foi morto por um leão ao entrar na jaula, no Zoológico Children’s Grand Park, na Coreia do Sul. Em 2016, um domador morreu após ser atacado por um leão durante uma apresentação circense, em Alexandria, no Egito. Nesse mesmo ano, uma mulher foi morta e outra ficou ferida em um ataque de tigres no zoológico Beijing Badaling Wildlife, em Pequim, na China. Um dos últimos casos de ataque a tratadores ocorreu em maio deste ano, durante um espetáculo circense em Doullens, norte de França, quando um leão atacou o seu tratador. E não para por aí. Engana-se quem pensa que apenas esses animais são os maiores causadores de mortes. Por trás da aparência dócil e preguiçosa do hipopótamo, se esconde a personalidade agressiva de um dos mamíferos mais perigosos do planeta. Aproximadamente 500 pessoas morrem anualmente devido aos ataques dos hipopótamos, que apesar de serem totalmente herbívoros, não pensam duas vezes ao investir contra humanos, pelo simples fato de preservar o território
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Cada leão come cinco quilos de carne por dia. Na vida selvagem comeriam até 20 quilos de uma vez e ficariam dias sem comer
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Sempre mostro para a equipe quando acontece no mundo algum caso de morte de tratadores, para que fiquem cientes que os animais têm um instinto selvagem, mesmo em recintos controlados. Carla Cerqueira, bióloga
ANIMAIS QUE MAIS MATAM PESSOAS NO MUNDO 1º
Mosquitos 1 milhão de mortes
3º
2º
Mosca Tsé-Tsé 10 mil mortes
Cobras 57 mil mortes
4º
5º
Escorpiões 3.250 mil mortes
Crocodilos 1.000 mil mortes
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Hipopótamos 500 mortes
7º
Elefantes 100 mortes
8º
Leões 100 mortes
* Dados da média anual de vítimas humanas fatais . Fonte: Organização Top10+
onde vivem. Em 2013, um guia turístico foi engolido por um hipopótamo e levou 40 mordidas. O caso ocorreu na fronteira entre Estados Unidos e Canadá, onde Paul Templer estava acostumado a levar os turistas. Ele já conhecia o animal e apesar de evitar aquela área, um dia resolveu descer o rio usando seu caiaque, e de repente, sentiu algo avançar sobre ele e seus três colegas de trabalho. Mesmo com a violência e a gravidade do ataque, o guia sobreviveu, mas teve o braço esquerdo amputado. No Níger, um país da África Ocidental, 13 pessoas se afogaram quando o barco em que viajavam foi virado por hipopótamos, em 2014. Viral entrevistou profissionais, que além da paixão pelo que fazem, sentem frio na barriga e um misto de emoção e adrenalina ao lidar com ani-
mais selvagens. Acompanhamos a rotina dos funcionários do Parque Ecológico Voturuá, o antigo Horto de São Vicente, e assim que a nossa equipe chegou ao local, avistou a estagiária de Biologia, Beatriz Cardoso, de 22 anos, caminhando em direção ao recinto de Ramón, o hipopótamo. Era a hora de alimentar o animal, que ama frutas. Bastou Beatriz chamá-lo pelo nome e, como se fosse em câmera lenta, ele colocou os olhos para fora e foi saindo da água. A aparente “fofura” do animal, de aproximadamente três toneladas, encanta os visitantes, principalmente as crianças, que vibram a todo momento. Simpático, o morador está no zoo há 13 anos e é uma principais atrações do local. Quem o vê assim, obediente e atendendo aos comandos, não imagina que Ramón preci-
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Carla é bióloga do Parque Voturuá há 15 anos
sou da ajuda do veterinário Alexandre Rossi, do quadro Dr. Pet do SBT, para ser adestrado. “Ele parece dócil, mas não é. Ramón age assim apenas com os funcionários que ele já conhece. O animal precisa se acostumar com a pessoa e isso leva tempo. Se um estranho entrar no recinto, ele pode atacar, sem dúvida”, diz a bióloga Carla Cerqueira, que trabalha há 15 anos no Voturuá. Todos os estagiários e profissionais precisam estar com a carteirinha de vacina atualizada, além de treinados e adaptados ao local para começar a ter contato direto com os animais. Esse é o período de adaptação, fase do reconhecimento visual da aparência e do uniforme, do cheiro da voz de comando do treinador. Esse processo é fundamental para que Ramón atenda e obedeça às ordens. “Na idade entre 9 e 10 anos de idade, fase da adolescência, os hormônios dos hipopótamos ficam à flor da pele e isso deixou Ramón mais agressivo. Só pelo jeito dele nos olhar, já sabíamos que não era um bom dia para brincar e se aproximar”, lembra Carla sobre uma das fases de rebeldia do hipopótamo, que é seu “xodozinho”. Papo vai, papo vem, e logo escutamos um forte rugido. Era de Nanji, um dos leões mais antigos do parque. Para quem ouvia, a impressão era de que o som vinha de um alto falante muito potente, mas logo descobrimos o porquê: o rugir de um leão alcança nove quilômetros de distância em uma
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savana e é a forma de o animal marcar território. Afinal “não é a toa que ele é conhecido como o ‘Rei da Selva’”, brinca a bióloga, que começou a trabalhar no parque logo que se formou e recorda a primeira vez que teve contato com animais selvagens. Ela descreve uma sensação de medo, e ansiedade: “Sentir medo é normal, mas isso é bom, porque o medo nos protege”, explica Carla. Segurança Atualmente, o Parque Ecológico Voturuá conta com mais de 120 animais, entre eles dois leões (Nauê e Nanji), duas leoas (Kyara e Naja) e um hipopótamo (Ramón). Para lidar com essas espécies, todos os profissionais devem seguir um protocolo de contato para evitar riscos e acidentes. A bióloga acompanhou o nascimento de Nanji e recorda quando ele era apenas um bebê e era possível pegá-lo no colo, fazer carinho e até amamentá-lo com mamadeira. Essa fase durou oito meses e terminou quando o leão desenvolveu seu instinto felino e, por precaução, Carla passou a evitar a proximidade com o animal: “Uma vez ele veio brincar comigo, me derrubou e aí percebi que não dava mais pra entrar na jaula”. Os anos de experiência trouxeram a certeza para a bióloga: “Quando se lida diariamente com animais de alta periculosidade, se deixarmos de sentir medo podemos nos tornar imprudentes, relaxar e sofrer um acidente”.
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Quando se lida diariamente com animais de alta periculosidade, se deixarmos de sentir medo podemos nos tornar imprudentes, relaxar e sofrer um acidente” Carla Cerqueira, bióloga
Contato Os funcionários só entram na jaula quando os leões estão anestesiados, o que acontece aproximadamente a cada dois anos, e é uma das últimas opções utilizadas pelos veterinários e biólogos, devido aos riscos à vida do animal. A limpeza dos recintos acontece após os leões serem transferidos por corredores gradeados até o cambeamento, uma área em que são confinados de forma segura. Já os exames de rotina são realizados no dia a dia, durante a alimentação, quando os funcionários ficam entre a grade e a área de afastamento do público. Os estagiários, veterinários e biólogos alimentam os bichos com pedaços de carne, passados pela grade. É nessa hora, que eles têm a oportunidade de brincar, tocar o animal e examinar os dentes, a pele e, caso necessário, a medicação é dada diluída nas carnes e miúdos. É um dos momentos mais esperados pelos visitantes e pelos estagiários de Biologia e Medicina Veterinária. Durante a alimentação, os visitantes podem tirar dúvidas com os profissionais, além de ouvirem uma breve explicação sobre a rotina dos bichos. “Eu e minhas colegas gostamos muito desse momento. Poder colocar em prática o que estamos aprendendo e ter contato com esses animais é a certeza de que escolhemos a profissão certa”, diz uma das aprendizes, enquanto nos mostra o cardápio do dia. Por sua vez, dona Isaura Nunes, uma turista
Apesar de serem totalmente herbívoros, os hipopótamos não pensam duas vezes em avançar, pelo fato de serem territorialistas
em sua primeira visita ao parque, fica encantada e surpresa com a interação: “Eu não teria coragem de colocar a mão na jaula. Só de ouvir o rugido dá um frio na barriga, imagina ficar perto assim. São profissionais muito corajosos!”. Carla explica que quando as leoas estão no cio, os machos ficam agressivos e irritados, e podem avançar contra a equipe. “Durante esse período, evitamos qualquer tipo de contato, não fazemos treinos e nem brincamos com eles. Já levamos sustos do tipo: eles avançarem repentinamente na grade, rugindo muito”. Riscos existem sim, mas agindo com cautela, conhecimento e muito treinamento, a atividade se torna bem segura e recompensadora. “Trabalhar com os animais é muito gratificante: O fato deles serem adestrados, facilita o contato, a alimentação e os cuidados básicos com a saúde deles. Conseguimos acompanhá-los mais de perto e fazer um trabalho conjunto com as veterinárias. São 15 anos de convivência, passamos mais tempo com eles do que com a nossa própria família. Impossível não amar!”
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CONTRA O RELÓGIO E A SEGURANÇA NA CORRIDA DE ENTREGA, O PREÇO DA GORJETA É A PRÓPRIA SEGURANÇA
Texto: LARISSA FRANÇA E MICHELY ARASHIRO Fotografia: VICTÓRIA SILVA Diagramação: ANA CLAUDIA; LARISSA FRANÇA; MICHELY ARASHIRO E VICTÓRIA SILVA
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O
s pés nem chegaram ao pedal do câmbio quando o som da buzina completa a sinfonia do caótico trânsito de uma típica noite de sexta-feira, em Santos. O motor saí do ponto neutro e, praticamente direto, vai parar na quarta marcha em uma acelerada só. O corredor entre os carros, parados na avenida Francisco Glicério, se torna uma passarela para a motocicleta que, apesar das 50 cilindradas, vai da origem do destino em poucos minutos. Na corrida contra os ponteiros do relógio, não há limite de velocidade, placas ou semáforos; a única preocupação é chegar e completar a entrega a tempo de pegar a próxima pizza, que estava no forno quando essa saga começou. A cena é comum em todo o Brasil, um dos países com a maior quantidade de motoboys no mundo. Somente em São Paulo são mais de 500 mil, de acordo com dados do Superior Tribunal do Trabalho. Apesar do índice elevado, ele pode ser ainda maior se levarmos em consideração os motoboys
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Investi o que tinha e comprei uma moto Wanderson Almeida
Pressionados pelo tempo motociclistas se arriscam com manobras perigosas em alta velocidade
que recebem pelo serviço, mas que não possuem registro na carteira de trabalho. Wanderson Almeida, que estacionou a moto em frente ao estabelecimento onde trabalha exatamente quando a caixa de pizza era fechada, é um deles. Há três anos nessa função, o jovem de 28 anos faz entregas de terça-feira a domingo, na parte da noite. “Investi o que tinha e comprei uma moto, queria levar um dinheiro para casa sem deixar a família preocupada. Comecei a procurar um lugar e meu patrão foi ‘sangue bom’, me deu uma chance”. Nas manhãs, quando não está fazendo nenhum ‘bico’, ele passa as horas sentado na areia da praia enquanto aprecia o som das ondas e admira a imensidão azul à frente. Quem o vê nessa situação não imagina que Wanderson é, na verdade, mais um dos muitos brasileiros que arriscam a vida para fazer o serviço de delivery funcionar perfeitamente. Prevenção Aproximadamente 65% dos acidentes de trânsito ocorridos no Brasil envolvem motocicletas. Para se ter uma ideia da dimensão do problema, o custo para o Sistema Único de Saúde (SUS) com internações envolvendo estes veículos, nos últimos três anos, foi de R$ 96 milhões. Na tentativa de driblar este cenário, o Governo do Estado de São Paulo implantou, desde 4 de agosto de 2012, determinações previstas na Resolução nº 356 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) que estabelece regras de segurança para o transporte de cargas e passagei-
Para driblar a situação de risco, o Estado implantou em 2012 tornou obrigatório o uso do capacete reflexivo
ros, nas quais estão o uso de capacete com dispositivos retrorrefletivos, proteção para motor e pernas, além de aparador de linha, também chamada de antena corta-pipa, responsável por impedir que o motociclista sofra qualquer tipo de lesão com o cerol da linha. Tais medidas têm a intenção de evitar acidentes como o que Gabriel Alvarez dos Santos de Carvalho, 23 anos, sofreu logo que entrou na mesma profissão que Wanderson. Sem experiência alguma, começou a efetuar entre-
65% dos acidentes trânsito ocorridos no Brasil envolvem motociclistas
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gas, sempre em alta velocidade e sem pensar nas consequências de utilizar somente o capacete como item de segurança. Hoje, trabalhando no setor há cerca de três anos, já sofreu diversas quedas e visitas à mecânica para consertar os danos ocasionados pela imprudência. “Quando comecei, eu não sabia nada. Só o básico que era pegar e entregar, mas nem tinha ideia de como se colocava uma caixa nas costas. Acho essa profissão muito arriscada. Participo de um grupo de whatsapp que
tem motoboys do Brasil inteiro e lá eles postam de tudo o que acontece e o que mais vejo são mortes, principalmente em São Paulo. Depois do acidente, passei a ficar mais atento, mas não depende só de mim”, diz. Um dos motivos que contribuem para a negligência dos motoboys é a corrida contra o tempo. Por isso, profissionais que atuam em outros segmentos têm a sensação de segurança maior, justamente por não desrespeitarem as leis de trânsito. Esta é a opinião do motociclista Marcos
Vinicius Bonfim Gomes, 21 anos, que presta serviços a uma empresa de contabilidade. “Hoje trabalho nessa área, mas já trabalhei em pizzarias, onde o esquema é assim: quanto mais rápido você entregar, melhor. Aí entra o desrespeito pela profissão, já que muitos motoboys acabam levando multa por avanço em sinais vermelhos e excesso de velocidade, sem falar no risco de quedas. Na contabilidade, apesar de entregar documentos importantes, é um serviço mais programado e não tem
Números de mortes de motociclistas no Brasil O País é 5º no mundo em acidentes no trânsito
444 mil vítimas
191 mil 2014
2013
vítimas
Veja as principais causas de acidentes
Veículo que muda de pista sem sinalizar e atinge a moto lateralmente
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Desrespeito da preferencial, como semáforo ou sinalização de “Pare”
Moto que bate atrás de outro veículo por não manter distância
essa implicância com o tempo de duração do percurso”, explica. Cuidados Segundo o Minstério da Saúde, em 2015 foram registrados 37.306 óbitos relacionados a acidentes com moto e 204 mil pessoas ficaram feridas. O Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre (DPVAT) pagou, em 2015, 42.500 indenizações por morte no país e 515.750 pessoas receberam amparo por invalidez. Para o supervisor de segu-
rança da Guarda de Trânsito de Praia Grande, Wanderlei Vivaldo de Souza Neto, a realização de manutenções regulares na moto é indispensável para a prevenção de ocorrências. “A manutenção é essencial, principalmente para os motociclistas que estão com o corpo mais exposto. É preciso verificar os pneus para que tenham condições mais seguras. Além disso, o que é primordial para reduzir todos esses acidentes é o respeito às regras de trânsito”, conclui o profissional
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“
Acho essa profissão muito arriscada. Participo de um grupo de whatsapp que tem motoboys do Brasil inteiro e lá eles postam de tudo o que acontece e o que mais vejo são mortes Gabriel Alvarez
380 mil
306 mil
vítimas 2016
2015
vítimas
Atualmente existem no mercado diversos equipamentos para preservar a segurança do motociclista, que são exigidos por lei como o capacete e vestuário adequado (sem definição específica), pelo CTB e pelas resoluções 20/98 e 203/06 do Contran. O capacete precisa ter o selo de certificação do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) e faixas refletoras nas laterais e atrás. Porém, a grande maioria dos profissionais não os utiliza.
Fonte: DataFolha
Equipamento de Proteção Individual
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Texto: RAFAEL HENRIQUE Fotos: DIEGO ALVES E BÁRBARA BARRETO Diagramação: DIEGO ALVES, BÁRBARA BARRETO E RAFAEL HERIQUE
UMA INIMIGA SILENCIOSA Inimiga invisível, a eletricidade desafia os profissionais a manterem o equilíbrio no território de alta tensão
E
la não tem cheiro, barulho, cor ou formato. Está em todas as casas e é aliada e, ao mesmo tempo, inimiga das pessoas. A eletricidade é assim: basta um simples descuido e, dependendo da força, as consequências podem ser fatais. Quem nunca viveu a apreensão de um apagão? Você espera a luz voltar quando, de repente, ela volta. Ou não. A apreensão pelo reacender de uma lâmpada ou pelo retorno do ronco do motor de um refrigerador podem durar segundos ou dias, em casos complexos. Operadores do milagre da luz, os eletricistas movimentam cabos e circuitos para iluminar e movimentar vidas durante 24 horas por dia e 365 dias por semana. “Eu nunca soube o que é Natal ou Ano Novo em família porque eletricista de alta tensão é assim, né? Trabalha sem folga enquanto todos desfrutam da luz, do ar-condicionado, da televisão e da festa”, pontua Julio Alves, eletricista de alta tensão da Codesp, hoje aposentado. Ele dedicou 24 anos de sua vida ao manuseio das caixas elétricas e subestações subterrâneas do cais santista. De janeiro de 2016 a março deste ano, o país tem 782 mortes relacionadas à eletricidade, o que inclui choques, raios e incêndios por curto-circuito. Os dados são da Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade (ABRACOPEL). Os números são reveladores: a profissão do inimigo silencioso cala em média duas vidas por dia no Brasil. A energia que acende e aquece pode ser a mesma que tensiona e apaga o sopro da vida. Julio Alves já presenciou a força do invisível interromper a vida de um colega de trabalho em uma tarde de trabalho. “Em uma fração de segundos ,ele encostou na caixa de alta tensão e caiu duro ali na hora. Ficamos todos em choque. A vida é um sopro, mas para quem trabalha com energia elétrica, é pior ainda. ” Outros choques fatais também ocorrem com gente que trabalha perto da rede elétrica tentando fazer ligações clandestinas em postes. A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) contabiliza, apenas no ano de 2016, 592 mortes. Sem a habi-
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Ele acionou a tensão enquanto eu passava um cabo. Senti o choque, caí, acordei no hospital. Pensei nos meus filhos, na esposa, e desde então, redobrei a atenção no meu trabalho e no da equipe também” JULIO ALVES, ELETRICISTA
lidade, o treinamento e os equipamentos adequados, mexer com eletricidade é assumir o risco de morte e de um acidente com sequelas, seja por baixa tensão (127V / 220V) ou alta tensão (acima de 1000V). Segurança no trabalho A profissão de eletricista de alta tensão representa a sexta em número de mortes por acidente de trabalho no Brasil. A Companhia Piratininga de Força e Luz (CPFL), gerencia a distribuição de energia na região da Baixada Santista e gera milhares de empregos diretos e indiretos na área de energia. Carlos Alberto, 27 anos, e Luiz Lima, de 33 -há quatro anos na companhia-, eles trafegam pelas ruas do litoral nos caminhões da empresa atendendo desde ocorrências pequenas, como corte no fornecimento de energia nos domicílios, até explosões de geradores que deixam quarteirões na apreensão no escuro.
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Carlos conta que, nos dias de hoje, é mais difícil evitar ações desse tipo ocorrerem, principalmente nas áreas mais urbanizadas, porque a instalação e manutenção das redes elétricas é realizada com materiais novos. Já nas favelas o risco de acidentes é mais frequente por causa dos “gatos” (ligações clandestinas), semelhantes a grandes varais feitos de fios e cabos elétricos nos becos e vielas das comunidades. O contato com o perigo e a possibilidade de morte e acidentes confere aos eletricistas prudência misturada a segurança no exercício da profissão. Julio Alves lembra com detalhes do dia em que o erro de um colega de jornada quase resultou em um acidente fatal. “Ele acionou a tensão enquanto eu passava um cabo. Senti o choque, caí, acordei no hospital. Pensei
nos meus filhos, na esposa, e desde então, redobrei a atenção no meu trabalho e no da equipe também.” Prevenir para iluminar Para o exercício da profissão é necessário curso profissionalizante, além de capacitação técnica oferecida pelas empresas contratantes. Luiz Lima explica que o eletricista passa por rigorosos treinamentos, mas nas ruas as coisas acabam não acontecendo exatamente como a teoria indica. Apesar de nunca ter sofrido acidente, ele sabe que o perigo é companheiro iminente. “O eletricista tem que sempre zelar pela sua segurança por meio da utilização dos EPIs (equipamentos de proteção individual) e EPCs (equipamentos de proteção coletiva). “Infelizmente vivemos sob essa pressão todos os dias, mas é o trabalho
que escolhemos”. O eletricista aposentado Maurício Patrício, 55 anos, e há 29 atuando como eletricista, entende que a maior parte dos riscos não é causada por descuido dos eletricistas, mas das organizações onde eles atuam. Ele supervisionava mais de 40 profissionais e conta que, em várias ocasiões, a empresa não fornecia equipamentos que garantissem a total integridade dos funcionários. “Muitos dos acidentes fatais foram negligência dos chefes. A empresa até dá alguns equipamentos, mas não todos os que são necessários e faz muita pressão no controle da produção.” Patrício foi quem ministrou o treinamento de Carlos Alberto e Luiz na CPFL durante seu último ano de atuação no mercado. Sempre preocupado com a questão de segurança, o aposentado conta que a experiência ajuda muito o eletricista na prevenção de acidentes, mas causa excesso de confiança e até acidentes por algum detalhe não observado. “O cuidado tem que ser constante, mas o treinamento que estão dando hoje para o pessoal que está entrando é muito fraco. Alguns dos monitores nunca tiveram o trabalho na prática e quem tem experiência sai na frente nessa questão. É preciso passar todos os cuidados, dos mais simples aos mais complexos, porque esse nosso inimigo é silencioso”. Todo cuidado é pouco na queda de braço com a escuridão
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Manutenção da rede elétrica no bairro Naútica III, em São Vicente
800 700
NÚMERO DE MORTES RELACIONADAS À ELETRICIDADE
782 627
600 592 500
590
400 300 200
295
278
100 0 2011
2012
2013
2014
2015
2016
Fonte: Abracopel
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#VIRALNAUNISANTA
RETRATOS DE PROFISSIONAIS E DETALHES QUE FAZEM PARTE DA ROTINA DO CAMPUS PELO OLHAR DA VIRAL
RISCO
#PROFISSÕESDE