Título: " Janota, a guardiã do ervilhal " conto de Rosa Maria Santos Março 2021

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Janota a guardiã do ervilhal

Conto

Rosa Maria Santos 2


Ficha Técnica

Título Janota, a guardiã do ervilhal Tema Conto Autora Rosa Maria Santos. Capa Arranjo de José Sepúlveda Ilustrações Rosa Maria Santos Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda Publicado por Rosa Jasmim Edições

Editado em E-book em Março 2021 https://issuu.com/rosammrs/docs 3


Rosa Maria Santos Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de poemas e postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; Vale do Varosa: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Penna e seus familiares; Quando o Menino Chegar – Coletânea de Poesia de Natal de 2020. 4


É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas. A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018.

E-Books - Poesia Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) - Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Sinos de Natal, Natal de 2018; - Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; - Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão – pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; - Maviosa poesia, a arte de rialantero" Pintura de Silvana Violante; poesia da autora; Em Palhas Deitado – Poesia de Natal, Dezembro 2020.

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E-Books - Contos Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; - Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; - Pena Rosada, Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; - 12 Contos de Natal, capa de Madalena Macedo - imagens com arranjos da autora, Natal 2019; - O Veado Solitário, na Aldeia do Chefe Lyn - Edição bilingue (português/italiano), Janeiro 2020; - Esperança no País do Arco Íris – Edição bilingue (português/italiano), Abril 2020; - O Menino da Lagoa - Edição bilingue (português/inglês), Abril 2020; - A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido – Edição bilingue (português/espanhol), Abril 2020; - Ana Rita e o fascínio dos ovos – Maio 2020; - Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; - Contos ao Luar, Maio de 2020; - Patusca, no Reino Misterioso - Edição bilingue (português/italiano), Maio 2020;- O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020; - Sonega, o Coelho Mandrião, Julho 2020; - Rosalina e a Sombra Rebelde, Julho 2020; - O Jardim em Festa, Julho 2020; - Ritinha, salva a Sereia Serena, Julho 2020; - Ana Clara, em tempos de pandemia, Novembro 2020; - Josefina, a menina que veio do mar, Novembro 2020; - Luizinho, protetor do ambiente, Novembro 2020; - A Girafa Alongadinha e a Pulga Salomé, Novembro 2020; O Dia de Natal, Dezembro de 2020; O Natal de Afonso; Dezembro de 2020; Um Milagre na Ilha Paraíso, Dezembro de 2020; Ventos de Mudança, Dezembro de 2020; Gisela e a Prenda de Reis, Janeiro de 2021; Dany, o 6


Menino que queria sorrir – Janeiro 2021; Marquito, o menino irrequieto – Janeiro 2021; Joaninha, a menina que vendia balões – Janeiro 2021; Vicentina, uma avó aventureira – Fevereiro 2021; Juliana e os sapatinhos encarnados – Fevereiro 2021; Tomás, o Pinguim Desastrado – Fevereiro 2021; Silas e o Triunfo do Amor – Fevereiro 2021, Bogalha, a macaquinha irreverente – Março 2021; Janota, a guardiã do ervilhal – Março 2021.

Histórias da Bolachinha Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) - Capa: Glória Costa - Maio 2018; - Bolachinha vai à Hora de Poesia - Edição bilingue (português/ francês), Outubro 2018; - Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo - Novembro 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018 Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de Teresa Subtil - Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; - Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de José Sepúlveda - Edição bilingue (português/francês), Julho 2020.

Aventuras de Maria Laura Maria Laura, a Menina da Página dezasseis, Agosto 2020; - Aventura no Castelo sem nome, Agosto 2020.

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Distinções 2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017. 3º Prémio de Poeti Internazional - Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália - Maio 2019. 10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal). Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera - ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto de 2019. Jogos Florais Vale do Varosa 2019 – Concurso Literário Tarouca - “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema. Concorso di Poesia Internazionale " Gocce di Memoria" VI edizione 2020. Menzione d'onore con la poesie “Il mio quadro” – (Meu quadro). Itália julho 2020. Segunda Classificada no Prémio Poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesiavideopoesia e racconti dal titolo: Poesia Esteri “Ouve” (Ascolta) dezembro 2020. Menzione di Merito de poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia8


videopoesia e racconti dal titolo: Racconti “Esmeralda” dezembro 2020. Ebook: https://issuu.com/rosammrs/docs

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Janota, a guardiã do ervilhal

Entre a grande variedade de leguminosas que havia na Quintinha das Leguminosas, estavam uns canteiros de Ervilhas de Cheiro de onde se podia exalar uma fragrância de facto singular, que tinha o condão de embriagar as restantes leguminosas ali existentes: o Grão-de-bico, o Tremoço, a Ervilha de grão, a Fava e a panóplia de Feijões que ali existia. 10


A Quintinha estava situada num terreno que pertencia ao Colégio Gomes Bento da Silva, um estabelecimento de ensino particular que acolhia muita juventude, com idades diversas, desde os cinco anos até à adolescência, já prestes a entrar no ensino superior. O Avô Malaquias – era assim que lhe chamavam carinhosamente – cuja idade poderíamos enquadrar na mediana, tratava com apego e energia aquele espaço que dedicava ao cultivo das suas leguminosas.

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- Olá, avô Malaquias, Saudava a criançada Quando no correr dos dias, Malaquias lá passava. As crianças mais pequenas Gostavam de o visitar Desde as horas mais serenas Até o sol acalmar. E ali com ele aprendiam: As ervilhinhas cuidar Enquanto se divertiam No aprazível lugar. Lá podiam respirar Essas ervilhas de cheiro E podiam ajudar Malaquias, bom parceiro. E fossem elas em grão Ou de quebrar, perfumadas, Imaginavam então Vê-las no prato estufadas. Quando em horas de lazer, Divertiam-se os meninos Pois gostavam de aprender Tudo sobre os tais grãozinhos. 12


O avô Malaquias, atencioso e sentindo um certo orgulho, ia-lhes explicando como se preparava o terreno e todo o seu ciclo de crescimento, para que em pouco tempo as pudéssemos sentir a aromatizar todo o espaço no correr da primavera, de manhã até ao entardecer. Um grupinho de crianças, com idades compreendidas entre os cinco e os oito anos - a Carolina, a Beatriz, a Maria, o José, o Luís, e o Tónio – divertiam-se a mexer 13


e remexer a terra que o avô Malaquias tinha preparado com tanto carinho, para que as pudesse ver germinarem e crescer livres e soltas ao longo de cada canteiro. Adorava vê-las irromper da terra, encher o espaço de flor, gostava de inalar aquelas fragrâncias intensas, mas suaves, qual elixir da vida que o fazia respirar com saúde. Como dizia, esse pequeno grupo era sempre o primeiro a chegar, mal o sol despontava, e já eles cantavam felizes, como que a tentar despertar a atenção de Malaquias. Como era bom aquele cheiro a terra, o manusear de cada uma das plantas. Ambiente saudável, aquele que podiam usufruir no decorrer de todo o tempo escolar.

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Saíam cedo, a correr E ao chegar, o Luís Perguntava: - Vão nascer Em breve, avô? Vá lá, diz! Malaquias, a sorrir, Dizia: - Mas que bonitas, Estão da terra a sair, Gostam das vossas visitas. - O vento sopra- Então, elas Parecem logo bailar, São como lindas estrelas Que querem no céu tocar. Como é bela esta quintinha Que tem tanto p’ra nos dar, Tanta planta pequenina, Segredos p’ra desvendar. Emoção! Cada menino Aquele avô abraçado, Lhe dizia com carinho: - Um lugar abençoado!

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Os dias foram correndo devagar. Nesse entretanto, as ervilhas, cada qual de sua espécie, cresciam a olhos vistos. O avô Malaquias, sempre zeloso, não se poupava a esforços para as cuidar. Os meninos, sempre que podiam, lá estavam para o ajudar, cheios de ansiedade, à espera que brotassem da terra os seus miraculosos frutos. Já estavam a adivinhar vê-los a saltar no prato quando chegassem as horas do almoço lá no grande refeitório da escola. Agora, já as podiam ver carnudas, quase prontas a serem recolhidas. 16


Um dia, a rádio anunciava que vinha aí um temporal. O avô Malaquias logo tomou as suas providências para proteger os seus canteiros e reforçou a estufa para que esta melhor suportasse os ventos que se adivinhavam. Logo, as crianças se abeiraram e o questionaram:

- Avô Malaquias, porque razão está a cobrir as ervilhas? - Vem aí temporal, temos que tomar algumas precauções.

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- Vai haver muito vento? O que poderá acontecer? E se a estufa não aguentar? - perguntou Carolina intrigada e mostrando preocupação. - Nunca se sabe o que vem por aí. Mas, vamos confiar, não vamos pensar em desgraças. Cá por mim, irei tomar todas as precauções. Havemos de ver o ervilhal a crescer e a amadurecer saudável. Depois, poderão apreciar o fruto deste trabalho. - Que bom, avô Malaquias. - Não nos preocupemos, há de tudo correr bem. Vá lá, regressem às aulas que está na hora.

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- Vamos, avô Malaquias. - Façam por ser bons meninos. - Sim, hoje e todos os dias, Pois já somos crescidinhos. Seis anos tinha a Maria E sete tinha o Luís, Carolina mais teria, A gémea da Beatriz. José era o mais velhinho E do grupo era o guia O Tónio era o mais novinho, Era o irmão da Maria. Foram prá sala a correr E gritaram ao chegar: - Bom dia “stora” Ester, Já nos podemos sentar?

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A professora Ester estava apreensiva com as notícias. - Sentem-se, sim. Vamos ter que usar de grandes cautelas, vêm aí mau tempo. Mas, não é caso para estarmos receosos. Temos, sim, que ser cuidadosos. Na manhã seguinte, o dia nasceu sem sobressaltos. O vento, no entanto, já se fazia sentir. O avô Malaquias esteve o dia todo a reforçar as estruturas das estufas do ervilhal. Puxou o oleado, amarrou bem forte todos os suportes e, já noite dentro, regressou ao seu quartinho, junto às instalações do Colégio.

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Com o coração contrito Sentia o vento a soprar. - Tudo é muito esquisito, É o mau tempo a chegar. A chuva em fontes caía O vento tornou-se forte Em casa, Tónio e a Maria Já temiam a má sorte.

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- Parece tudo seguro, Pelo menos nos parece. Um relâmpago, no escuro, E sobe ao céu uma prece. O vento sopra redio E fustiga a estrutura Logo, um longo calafrio Se sente na noite escura Olham o céu com tristeza, Perscrutando pela janela, - A vida é incerteza. Lamentava a Anabela. - Vou-vos contar uma história Da Janota, a ervilhinha. Registei-a na memória, Sentem-se na carteirinha.

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E logo, atentos, escutavam Anabela, a querida professora, que os cuidava com tanto carinho: - Um dia, ao entardecer, já o sol se punha no horizonte, Similar, orgulhoso olhava o seu ervilhal. As ervilhas estavam já suculentas, apetitosas, quase prontas para serem colhidas. Tudo parecia prever que a produção naquele ano ia ser muito generosa. Similar, o agricultor lá da herdade, tinha outros canteiros espalhados ao longo da quinta com outras plantas. Mas era o tempo da colheita das ervilhas que Similar logo mercava junto das escolas das cidades vizinhas. 23


Similar andava então no meio do ervilhal, não fossem aparecer os caracóis ou as lagartinhas para de repente lhe darem conta da sua colheita. No meio de todos esses cuidados, reparou estupefacto numa vagem, diferente de todas as outras, que se escondia junto de um pé do ervilhal. Retirou o chapéu da cabeça coçoua, como que interrogando-se e disse: - Mas que vem a ser isto? Que vagem é esta? Olhou o pé da ervilha e continuou: - Que estranho, é da mesma espécie, igualzinho aos demais. Como pode ter acontecido? 24


- Não entendo tanta estranheza – ouviu – É simples, sou a Ervilha Janota, a guardiã do ervilhal! - Ervilha Janota? – Quem está para aí a falar? Olhou para cima, para cada um dos lados, mas não conseguia enxergar vivalma.

- Quem é que falou? – questionou – Quem é que anda por aí? - Fui eu, tonto. Achas-te tão esperto e afinal…. Pareces um tontinho a olhar para o céu. Fecha essa boca de espantado que ainda te entra um mosquito na boca, homem! 25


- Não estou a gostar nada da brincadeira! - Olha aqui em baixo, homem. Sou eu, estou mesmo aqui ao teu lado! - Ao meu lado? - Sim, criatura, Sou a Ervilha Janota, ainda agora me tocaste. Porquê tanto espanto, por ser diferente? - Acho que estou a ficar mesmo doido. As ervilhas não falam! Se calhar, foi esse sol quente que venho a apanhar desde manhã. Mexeu comigo. - Isso pensas tu! Nós falamos e sentimos tudo, como vocês! - Não me acredito. Então, porque razão nunca falaste antes? Pois olha, eu cá pelo contrário, ao longo de todo este tempo, sempre vou dialogando convosco. E vós nunca me respondestes.

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- Eu falo convosco sempre, Nunca falaram comigo! - Porque nós não somos gente Mas temos-te por amigo. A olhos vistos crescemos, Gostas de nos observar E como nós merecemos, Vens aqui p’ra nos cuidar. O ervilhal está maduro, Pronto para se apanhar. Sou diferente, te asseguro, Eu nunca irei germinar. - Mas, afinal, tu quem és? - Sou a Ervilha Janota! Igualzinha, tenho pés, Sou grande e algo marota. - P’ra que serves, afinal? Se não serves para nada… - Eu sou muito Especial Gritou ela arreliada.

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Aconteceu que nessa noite deu-se um temporal. Foi então que Janota, a Ervilhinha diferente, fez toda a diferença. Vigilante, atenta a tudo o que se passava ao redor, logo que se apercebeu do primeiro relâmpago que cruzou o céu e iluminou toda a Herdade, acordou todas as ervilhas que, assustadas, tremiam como varas verdes. Janota, a Ervilha Especial, disse-lhes: - Amigas, não temam, estou aqui para vos proteger das intempéries. Fiquemos alerta. Agora, todo o ervilhal a ouvia atentamente e logo trataram de tomar todas as precauções. Bem aconchegadas nas suas vagens, tinham agora uma missão a cumprir. Quando o vento mostrasse a sua violência, deixar28


se-iam voar com ele até onde ele as levasse. Nesse, entretanto, Janota, a Ervilha Especial lançou umas guias muito fortes, quais lianas na selva, às quais todo o ervilhal se segurou. Assim, Janota prendeu-se fortemente à estrutura da estufa, e quando o vento passou, lá estavam elas firmes e salvas de toda aquela intempérie.

No seu quarto, Similar espreitava ainda pela janela, desesperado, e via o perigo que corria o seu ervilhal. O que fazer? - Ó Virgem Santíssima, o que fazer? 29


Era muito perigoso sair debaixo de toda a intempérie. Então, lançou um olhar sobre a estufa do ervilhal sentiu que um milagre estava a acontecer. A extensa lona branca estava coberta de guias da ervilha que ali se seguravam para que o forte vento não as levasse pelo ar. Dentro da estufa, as ervilhas saíram das vagens e amparavam com todas as forças as lonas ali existentes. A estrutura mostrou-se assim coesa e segura e as ervilhas pareciam cantar alegremente.

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- Nós aqui no ervilhal Somos grupo solidário Porque juntos, afinal, Fazemos o necessário. Em cada grão, um amigo Com quem podemos contar E ultrapassar o perigo Que o vento pode causar. Todas juntas, muito unidas, Nada nos vai fazer mal, Não nos damos por vencidas, Cada uma, especial. Nesta estufa tão cuidada Da Herdade do Similar Não iremos sofrer nada, Vamos o vento enfrentar. Com Janota, diligente, No seu posto a vigiar, Iremos seguir em frente, Sempre juntas, caminhar. Pequenos grãos a dormir Nem deram p'lo sucedido Relâmpagos a surgir E eles calmos, no abrigo. 31


Ribombavam pelos céus, A estrutura estremecia. Similar, orava a Deus A Jesus e a Maria.

De manhã bem cedo, a tempestade amainou. Similar, que quase não tinha dormido, saiu de casa para se tentar aperceber dos estragos causados. Qual não foi o seu espanto quando chegou e viu a estrutura da estufa das Leguminosas intacta. Apercebeu-se então das 32


ervilhas numa grande azáfama a tentar limpar o seu território. Janota, a Ervilha diferente, tinha ainda estendidas as suas guias sobre os fortes tubos de metal da estufa. Similar entrou e viu algumas das suas ervilhas assustadas, fora das vagens, a correr como loucas de um lado para o outro, quase se atropelando. Com a voz entorpecida, cheio de emoção, disse-lhes:

- Minhas doces amigas, nada receiem, sei que esta noite foi terrível e que a todos nós provocou grandes 33


receios. Mas já tudo passou. Como vos estou grato por terem tomado conta da estufa no meio de tão grande provação. Até ontem, não sabia que havia uma guardiã no ervilhal, a Janota, uma Ervilha sem dúvida muito Especial. Talvez não tivesse sido com ela tão cordial como devia. Mas, a forma como a conheci, causou-se na verdade uma grande confusão. Pensei que alguém ou algo muito estranho se tinha introduzido no ervilhal e isso preocupou-me. Penitencio-me pela minha atitude. Agora, é tempo de arregaçar as mangas. Vamos repor a calma no lugar. E vós, ervilhas queridas, ireis voltar às vossas vagens aonde encontrareis de novo o conforto de que precisais para crescerdes em harmonia, para que mais tarde possam fazer parte dessa Roda Alimentar que nos faz viver.

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Ervilhas apetitosas, Quer em vagem, ou em grão, Tenrinhas e saborosas P’ra nossa alimentação. Um grão lançado na terra Que logo, logo germina, Quanto mistério se encerra Nesta senda peregrina.

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Anabela, a querida professora, terminava assim a sua história. Algumas das crianças, bocejavam já de cansaço. Com todo o cuidado, levantou-se e apagou a luz. Fechou a porta do dormitório e recolheu-se também. Apesar de tudo, o temporal acabara de passar sem que algo de grave tivesse ocorrido. No dia seguinte, havia tempo para se avaliarem os estragos lá na estufa. Amanheceu. Os alunos acordaram cedo e logo correram à janela para dali se tentarem aperceber do que tinha acontecido nas estufas. Para seu espanto, viram 36


as longas guias que, como por milagre, se entrelaçaram na estrutura metálica. E logo se lembraram da linda história de Janota, a Ervilhinha Especial, que a professora lhes contara e que na presença deste espetáculo lhes parecia agora tão real. E saíram a correr para cumprimentar o avô Malaquias que, dentro da estufa, tratava agora de a manter limpa e arranjava toda a estrutura. E logo lhe disseram:

Avô, este temporal Nos ensinou a lição: Há sempre algo especial Disposto a estender a mão. 37


A professora Anabela Uma história nos contou, Janota fora a “estrela” Que o ervilhal ajudou. Uma ervilha diferente Que nessa estufa passou E ao ver perigo eminente O seu ervilhal salvou. Vamos procurar Janota, Pois temos que agradecer Não tem grão, mas bem se nota O bem que pode fazer. - Ei-la ali, grita Maria E Luís lhe respondeu Nesse caule, que alegria, De cansaço, adormeceu. O Tónio, emocionado, Por ver Janota a dormir, A Beatriz, a seu lado, Com Carolina a sorrir. José ajuda a apanhar As ervilhas do chão, E pensava: Que jantar, Vão dar bela refeição! 38


As ervilhas, tenrinhas, Para casa são levadas E logo ficam fresquinhas, Para serem cozinhadas.

Sentindo certa agitação por ali, Janota acabou por despertar. Abriu os olhos e viu-se rodeada de crianças, que a olhavam como alguém muito especial. E interrogou-as: - O que fazem por aqui, crianças lindas? Não está na hora de irem para as vossas aulas? Vamos lá que se faz tarde! 39


- E fala! – exclamou Luís com os olhos arregalados de espanto – Tal como dizia a professora Anabela! - Claro que falo, porque não havia de falar? Sou a guardiã deste ervilhal conheço-os um a um. Quantas vezes, quando das vossas vindas a este lugar, me apeteceu conversar convosco! Mas não vai tardar a oportunidade, prometo-vos. Agora não vai dar porque se faz tarde e tendes as aulas à vossa espera. Mas oportunidades não vão faltar, prometo. - Nesse caso, daqui nos vamos. – e virando-se para o lado - Até logo, avô Malaquias! - Vão na graça de Deus, meninos, obrigado por terem vindo. - Até logo, Janota, que gosto tivemos em te conhecer. Sei que daqui vai nascer uma grande amizade. Janota acenou-lhes com um sorriso e os meninos lá foram às suas vidas.

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- Uma amizade diferente Diz Carolina à Maria A Janota não é gente Mas dá-nos muita alegria. Tónio acenava contente Quando na frente corria E Beatriz, alegremente, Mostrava sua euforia. 41


O Luís para e lhes diz: Ouçam bem, com atenção... Logo a seguir, o petiz Se exprimiu com emoção. Um segredo em todos há, Não contar nada a ninguém, Assim, Janota terá Mais sossego. E tudo bem.

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A partir desse dia, a vida na estufa nunca mais foi igual. As surpresas sucediam-se e aquela pequena comunidade de alunos vivia uma nova vida cheia de aventuras. Janota era agora não apenas a guardiã do ervilhal mas também o Anjo da Guarda de cada um. E no ervilhal, crianças e leguminosas viveram felizes para sempre.

A Ervilhinha Janota Vai ficar na nossa mente: Guardiã, Anjo - que importa? Uma amiga para sempre!

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