Título: «Pipinha, um resgate atribulado», conto de Rosa Maria Santos, agosto 2021

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Pipinha um resgate atribulado

Conto

Rosa Maria Santos 2


Ficha Técnica

Título Pipinha, um resgate atribulado Tema Conto Autora Rosa Maria Santos Capa Arranjo de José Sepúlveda Ilustrações Rosa Maria Santos Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda Publicado por Rosa Jasmim Edições

Editado em E-book em Agosto 2021 https://issuu.com/rosammrs/docs 3


Rosa Maria Santos Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de poemas e postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; Vale do Varosa: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Penna e seus familiares; Quando o Menino Chegar – Coletânea de Poesia de Natal de 2020. 4


É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas. A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018.

E-Books - Poesia Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) - Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Sinos de Natal, Natal de 2018; - Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; - Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão – pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; - Maviosa poesia, a arte de rialantero" Pintura de Silvana Violante; poesia da autora; Em Palhas Deitado – Poesia de Natal, Dezembro 2020.

E-Books - Contos Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; - Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; - Pena Rosada, Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; - 12 Contos de Natal, 5


capa de Madalena Macedo - imagens com arranjos da autora, Natal 2019; - O Veado Solitário, na Aldeia do Chefe Lyn - Edição bilingue (português/italiano), Janeiro 2020; - Esperança no País do Arco Íris – Edição bilingue (português/italiano), Abril 2020; - O Menino da Lagoa Edição bilingue (português/inglês), Abril 2020; - A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido – Edição bilingue (português/espanhol), Abril 2020; - Ana Rita e o fascínio dos ovos – Maio 2020; - Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; - Contos ao Luar, Maio de 2020; - Patusca, no Reino Misterioso - Edição bilingue (português/italiano), Maio 2020;- O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020; - Sonega, o Coelho Mandrião, Julho 2020; - Rosalina e a Sombra Rebelde, Julho 2020; - O Jardim em Festa, Julho 2020; - Ritinha, salva a Sereia Serena, Julho 2020; - Ana Clara, em tempos de pandemia, Novembro 2020; - Josefina, a menina que veio do mar, Novembro 2020; - Luizinho, protetor do ambiente, Novembro 2020; - A Girafa Alongadinha e a Pulga Salomé, Novembro 2020; O Dia de Natal, Dezembro de 2020; O Natal de Afonso; Dezembro de 2020; Um Milagre na Ilha Paraíso, Dezembro de 2020; Ventos de Mudança, Dezembro de 2020; Gisela e a Prenda de Reis, Janeiro de 2021; Dany, o Menino que queria sorrir – Janeiro 2021; Marquito, o menino irrequieto – Janeiro 2021; Joaninha, a menina que vendia balões – Janeiro 2021; Vicentina, uma avó aventureira – Fevereiro 2021; Juliana e os sapatinhos encarnados – Fevereiro 2021; Tomás, o Pinguim Desastrado – Fevereiro 2021; Silas e o Triunfo do Amor – Fevereiro 2021, Bogalha, a macaquinha irreverente – Março 2021; Janota, a 6


guardiã do ervilhal – Março 2021, Zâmbia, a macaquinha que queria casar – Março 2021; Tuly e o cavalinho de baloiço – Março de 2021, Maria, a menina que não conseguia dormir – Abril 2021; A Lenda da Menina Lua – Abril 2021; Estrela Silente, a Princesa cativa – Abril 2021, Marly, a pequenina duende – Abril 2021; Mariana no País do trevo Dourado – Maio 2021; Esperança e o sorriso do Palhaço – Maio 2021; Uma Aventura na Floresta Encantada – Maio 2021; Esmeralda, umas férias diferentes – Junho 2021; Raitira no Planeta Ricoicoi – Junho 2021; A lição do Dente-de-Leão – Julho 2021; Lino, o menino que sonhava ser astronauta – Julho 2021; Bia, Mitra e o Tufão Esperança – Agosto 2021; Sericaya, a Ponte Misteriosa – Agosto 2021; Timo, um ratinho irreverente; Pipinha, um resgate atribulado – Agosto 2021.

Histórias da Bolachinha Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) - Capa: Glória Costa - Maio 2018; - Bolachinha vai à Hora de Poesia Edição bilingue (português/ francês), Outubro 2018; Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo Novembro 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018 Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de Teresa Subtil Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de José Sepúlveda - Edição bilingue (português/francês), Julho 2020.

Aventuras de Maria Laura Maria Laura, a Menina da Página dezasseis, Agosto 2020; - Aventura no Castelo sem nome, Agosto 2020. 7


Diferentes mas iguais Tomás e o infortúnio de não ter mãos – Junho 2021; Lolita, a menina que não tinha pés – Junho 2021; Duda, o Menino que queria mudar o Mundo – Julho 2021.

Distinções - 2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017. - 3º Prémio de Poeti Internazional - Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália - Maio 2019. - 10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal). - Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera - ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto de 2019. - Jogos Florais Vale do Varosa 2019 – Concurso Literário Tarouca - “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema. - Concorso di Poesia Internazionale " Gocce di Memoria" VI edizione 2020. - Menzione d'onore con la poesie “Il mio quadro” – (Meu quadro). Itália julho 2020. 8


Segunda Classificada no Prémio Poeti Internazionali - 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Poesia Esteri “Ouve” (Ascolta) dezembro 2020. - Menzione di Merito de poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Racconti “Esmeralda” dezembro 2020.

Ebook: https://issuu.com/rosammrs/docs Blog: https://romyflor.blogspot.com/p/blog-page.html 9


Pipinha, um resgate atribulado

A Savana Guylar era considerada um pequeno paraíso, um refúgio do reboliço da civilização. A poucos quilómetros existia uma pequena aldeia de colonos que apren-

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deram com o tempo a respeitá-la e a tratá-la com carinho, protegendo-a e não perturbando o habitat dos animais que ali viviam. Olimpia – Pipinha, como era carinhosamente chamada pelos pais, era uma menina de oito anos, bela e muito meiga. Os pais eram Arena, médica, e Viriato Dantas, veterinário lá da pequena aldeia. Oh, como adorava brincar com os animais e cuidar deles quando os encontrava mais débeis, feridos, sedentos ou famintos. Com todos os cuidados, encaminhava-os ao gabinete do pai que logo os cuidava e providenciava para que nada lhes faltasse.

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Arena e o marido tinham um laboratório de pesquisa, aonde desenvolviam experiencias com ervas que encontravam nas suas caminhadas nas horas de lazer. Quanto almejavam contribuir para salvar os animais, muitas vezes presos nas armadilhas que os caçadores furtivos iam espalhando ao longo da Savana Guylar

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- Mãezinha posso sair? – Pedia-lhe ansiosa Com o seu belo sorrir E a sua face airosa. Diz que sim, minha, mãezinha? Impaciente pedia. Como a resposta não vinha, Uma vez mais requeria 13


- Não digas não, por favor, Juro que me porto bem! E ouvia com candor A mãe dizer: - Vem cá, vem! Ainda é cedo, Pipinha, É hora de descansar - Tu deixas-me ir, mãe minha? Apenas quero brincar.

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Arena sabia bem o quanto a filha gostava de vaguear por ali, procurar passarinhos e pequenos animais, divertir-se com eles e, se os encontrasse tombados, ajudá-los. Além disso, era tempo de férias e na verdade a filha tinha que aproveitá-lo para poder usufruir da natureza, era muito bom para ela. Pipinha não frequentava a escola da aldeia para que pudesse ter melhores condições. Ali, a escola era mais irregular. A professora deslocava-se à pequena escola apenas duas vezes por semana. Nos dias em que não vinha, o apoio às crianças era proporcionado por Dona Angélia, uma senhora culta que lhes ia transmitindo todos os segredos que sabia sobre a vida lá na aldeia. Só quando estas atingiam os dez anos de idade, iam estudar para além da pequena Aldeia Guylândia. A mãe acabou por aquiescer e a menina lá foi feliz e contente ao encontro dos seus amigos animais.

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- Bom dia, senhor ratinho, Como vai sua Alteza? - Para o ribeiro caminho, Beber água da represa A água lá é fresquinha Queres fazer companhia? - Vou, sim - responde Pipinha Começa bem este dia!

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E foram em cantilena P’la ladeira a caminhar Viram a lebre Serena: - Posso vos acompanhar? - Claro que sim, minha amiga É bom ter-te aqui connosco. E chegou-se a formiguinha: - Eu também posso ir convosco? E todos, ladeira acima Foram numa cavaqueira. A lebre chega e se anima, Abre a boca e sai asneira.

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Corriam devagar os dias lá na aldeia. Os dias passavam e a temperatura aumentava gradualmente. Os lavradores, com receio de incêndios, ocupavam-se na limpeza das matas. Não faltava muito e lá vinham os dias de canícula. Tudo tinha então de estar bem limpo a tempo e horas, para que não tivessem de assistir a qualquer tragédia. Nesses dias, o receio espreitava em cada árvore, em cada arbusto. Desde que os terrenos circundantes da Savana Guylar tinham sido invadidos pelas armadilhas dos caçadores, estes movimentavam-se no seu espaço como sinistras sombras e destruíam tudo por onde passavam. Nenhum animal estava agora livre de perigo. A caça era 18


proibida naquela zona, mas pouco adiantava pois os caçadores furtivos irrompiam pela calada da noite ou durante as horas mortas do dia. Num ápice, se não se acautelavam, surgiam quais sombras ocultas pela calada da noite destruíam famílias completas dos pobres animais por onde passassem

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- O perigo sempre à espreita Na Savana de Guylar, A ribeirinha era estreita Pandala estava a observar. Aprendera a Panguila Artes p’ra se defender E ela, muito reguila, Estava pronta a correr - Cuidado, filhinha minha, Ainda há muito que aprender Há perigo em cada esquina, Não te quero ver sofrer. E Panguila, irrequieta, Saltitava sem parar. - Para aí, fica quieta, Para um pouco de saltar.

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Pandala, a mãe ursa, era muito apegada a Panguila. Superprotegia-a a cada momento de tudo e de todos. Era essa a atitude própria de cada mãe, pensava. Depois, Panguila, não tinha já um progenitor que a protegesse. O Pai Urso fora aprisionado no dia do nascimento de Panguila. Por isso, uma mãe - segundo a sua forma de ver - tinha que proporcionar o melhor que podia a sua filha, amá-la e protegê-la, com a sua própria vida, se preciso fosse. Sigas, o pai de Panguila, fora apanhado numa dessas sinistras armadilhas, para infortúnio de Pandala.

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O tempo foi passando. Tinham decorrido dois anos e do seu amado nunca mais nada soube. Felizmente, ela escapara. Não fora o parto da filha e também ela não estaria ali agora.

- Seguimos nosso caminho Com a semente do amor Este nosso rebentinho Há de nascer pelo alvor. 22


Vê no alto aquela estrela Que ali brilha para nós, É tão bom olhar e vê-la E ela a ver-nos juntos, sós! Vamos segui-la, querida, Vai nos levar a um lugar Aonde irás dar vida A uma filha de encantar. Logo nossa linda cria, Num cantinho abençoado Há de ver a luz do dia Nesse momento almejado. Foi grande a felicidade Por Panguila haver nascido E nessa cumplicidade Abraçou-a enternecido.

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Fatídica madrugada. Aos primeiros sinais do parto, Sigas andava já a procurar um lugar cómodo e seguro e logo que o encontrou, ele mesmo assistiu no parto e logo partiu a procurar um pouco de alimento para Pandala. As horas que se seguiram passaram lentas… e Sigas não mais deu sinal de vida. Anoitecia na Savana Guylar. As corujas, os morcegos, as águias e outras aves de rapina, transformaram o céu numa nuvem viva em movimento.

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No terreno, os pequenos roedores escondiam-se rapidamente. A noite e a sua magia trazia o medo, o receio. Os animais sabiam que o perigo espreitava a cada milésimo de segundo. Pandala não receava o perigo que andava no ar. Temia, sim, as armadilhas dos caçadores, essas sim, eram perigosas e mortíferas.

Os pais de Pipinha, sempre atentos às notícias, esperavam temerosos a tormenta e reforçaram as portadas do 25


consultório e do laboratório, alertando Pipinha para os redobrados cuidados que precisava ter, a tempestade previa-se ameaçadora. Pipinha saiu de casa e foi alertando os animais que encontrava para que se mantivessem alerta pois o que vinha aí não era nada bom. A noite estava muito quente, as chuvas não tardaram a dar sinais de precipitação e de um momento para o outro o vento soprou furioso, ribombaram os trovões e o céu lançou impiedoso uma tempestade impetuosa que logo arrastou tudo à sua frente.

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- Minha mãezinha, que horror! Dizia ela assustada - Não temas, não, meu amor, Vai durar p’la madrugada. - Não percamos a esperança, A noite é de invernia Mas logo chega a bonança No alvor de um novo dia. O sol no céu vai brilhar, As crianças vão correr, E nos vai proporcionar Algo novo a aprender. Após uma tempestade A bonança há de surgir E duma calamidade Um viver novo há de vir Na Natura vão brotar Plantas com maior vigor E as chuvas vão-nos mostrar Na frescura o seu candor.

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Um arco-íris nos céus Com tanta cor e alegria É a Aliança de Deus No seu mundo de harmonia .

Quanta ansiedade vivia Pipinha ao assistir à revolta dos céus. Pensava nos frágeis animais, como poderiam eles sobreviver a uma intempérie assim? A chuva caía impiedosa, o vento fustigava as árvores, quase as arrancando pela raiz.

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- Mãezinha, como vão os animais sobreviver com este tempo tão mau? Paizinho, o que vai ser das famílias dos animais mais pequenos? - Não te assustes Pipinha, estas tempestades sempre as houve, não estejas inquieta, eles irão sobreviver, tudo vai regressar ao normal bem depressa, vais ver. Vamos descansar, querida, amanhã vai surgir um novo dia. Como diz o povo, «Depois da tempestade, vem a Bonança». - Pois sim, mãezinha, mas como vou dormir sabendo que pode haver animais em perigo lá fora? - Os animais sabem bem o que fazer nestas ocasiões. Um ou outro pode ser apanhado desprevenido no meio das enxurradas, mas a vida é mesmo assim

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- Como posso eu dormir, Minha mãezinha querida, Só me apetece sair? - Sair p’ra onde, Pipinha? Sabes o que iria acontecer Se saísses para a rua? Nada à frente ias ver Nem terra, nem mar, nem lua 30


Eles sabem como agir, São lestos por natureza, Vão certamente fugir E abrigar-se, com certeza. Descansa, minha princesa, Amanhã é um novo dia E então sua beleza Vai mostrar sua alegria. Tu não podes fazer nada Nem tu, nem eu, nem ninguém, Vem, e fica descansada Que tudo vai ficar bem.

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Durante toda a noite, Pipinha permaneceu desperta e vigilante, enquanto o vento fustigava as frágeis portadas de ferro e madeira. Os trovões não paravam de se ouvir. Por fim, cansada, adormeceu. Amanheceu na Aldeia Guylândia. Os primeiros raios de sol atravessavam agora as portadas da casa. Pipinha despertou agitada e correu até à cozinha aonde a mãe preparava já um bom pequeno almoço. - Então, Pipinha, que tal dormiste? - Mal, muito mal, mãezinha. 32


- Imaginava que sim. Vem daí, vais tomar o pequeno almoço e a seguir vais descansar mais um pouco. - Não posso, mãezinha, tenho que ver se há por aí animais feridos. Se calhar, a intempérie desfez alguns dos seus frágeis abrigos, coitados. - Não, querida, pode ser perigoso. Vais ficar aqui em casa. Eu e o paizinho encarregamo-nos de ver como está a Aldeia e a Savana Guylar e tratamos de tudo, não te preocupes. És ainda pequenina para isso. Pipinha sabia bem que quando a mãe dizia não, era mesmo não… e ela não queria desobedecer aos pais. Mais tarde veria o que fazer para ajudar os animais. Os pais que tivessem paciência, mas não podia ficar ali sem nada fazer.

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- Não posso fazer barulho, Vou sair às escondidas, Há por aí muito entulho E sarjetas entupidas. Ainda estão recolhidos, Quiçá, mesmo amedrontados, Sentem-se mais protegidos, Com cuidados redobrados. 34


E enquanto caminhava Na Savana de Guylar, A Ursa Panda gritava Não parava de chamar. E Pipinha, condoída Com essa situação, Correndo riscos de vida, Foi acudir na aflição. - O que se passa, Mãe Ursa, Porque choras tu assim? - O meu coração mal pulsa, Que vai ser feito de mim? Está envolta em perigo, Quero senti-la feliz, Foi esse vento agressivo, O que vou fazer, me diz?

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A força do vento tinha levado a sua filhinha Panguila e ela estava inconsolável. - Acalma-te. Entrar em pânico não te vai levar a nada. Ela é ainda pequenina, precisa de ajuda, havemos de a encontrar. Realmente, ela sabia bem o que era sofrer por quem se gosta. Um dia a avó partiu e ela ficou muito tristes e com muita saudade, mesmo sabendo que a avozinha estava no além com o avozinho que nunca conheceu. Depois, 36


foi o Saldanha, o cãozinho que adorava. Um dia, encontrou-o inerte, sem que nada o fizesse prever e viu-o adormecer para sempre. Foram tantos os dias que passou com os olhos banhados em lágrimas. Ainda hoje, parece que o vê a correr para ela, com a pequena bola entre os dentes para brincarem juntos. Os paizinhos disseram que Saldanha estava velhinho e precisava descansar, mas ela não aceitava isso, como poderia estar velho se ainda corria muito? Uma coisa era certa, um dia deitou-se a dormir e ficou no mundo dos sonhos para sempre. Neste momento, o que mais queria era consolar aquela pobre mãe que chorava pelo estado da filha.

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- Não fiques triste, Mãe Ursa, Iremo-la procurar Tu não tiveste culpa Havemos de a encontrar. - Levou-a e eu nada fiz! - O que podias fazer? - Sinto-me triste, infeliz! - Ela vai aparecer.

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E resolveram ir em busca da pequena Panguila, ainda sem estratégia de como a procurar. Foi então que Pipinha teve uma ideia. - Vamos seguir o trilho de destruição e a direção tomada pelo vento. Certamente vamos encontrar Panguila, mas antes vou passar no laboratório de meu pai para apanhar algumas coisas que nos podem vir a fazer falta. Espera aqui por mim que não me vou demorar. E logo entrou no laboratório, para pegar alguns comprimidos. Ela não sabia muito sobre os resultados dos mesmos, mas duma coisa tinha a certeza, não iriam ser nocivos ao organismo da Ursa Panda. Com redobrada cautela, entrou e logo se apercebeu de que os pais não se encontravam no lugar. Procurou e guardou na mochila algumas coisas que pensou lhe poderiam ser úteis. E lá foi de novo ao encontro da Ursa Panda que, impaciente, a esperava.

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- Cá estou de novo. Tenho comigo aquilo que preciso. Vamos procurar a ursinha Panguila. E puseram-se a caminho. Durante o percurso, Pipinha procurava consolar a ursa Pandala, mas em vão, ela parecia não se perdoar pela sua negligência, de ter deixado a filha, por escasso tempo que fosse. Caminharam durante alguns minutos. O chão encontrava-se agora cheio de lixo e de destroços. Depois duma longa caminhada, depararam-se de fronte a um enorme portão que se 40


abria para um caminho que se afigurava muito estreito. Pipinha olhou a Mãe Ursa e disse: - Minha amiga, como podes ver, não vais conseguir passar, o caminho é demasiado estreito para ti! O melhor é permaneceres deste lado. Eu tratarei de procurar Panguila e trazê-la até ti. - Oh, não! Vou contigo. Quero encontrar a minha filha e fazê-la sentir que ela é a coisa mais importante da minha vida, que me lancei nesta odisseia para a salvar. Se é essa a tua vontade, iremos juntas.

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- Como entrar no paraíso Se o caminho é tão estreito? Penso ter o que é preciso, Veremos se faz efeito. Comprimido natural Que preparou meu paizinho, Toma que não te faz mal, Mas vamos ter cuidadinho. - Tomo um, ou dois, ou três? P’ra que servem, afinal? - Foi o meu pai que os fez, São remédios sem igual! O comprimido ingeriu, Esperou só um pouquinho. E o corpo se reduziu Para entrar no portãozinho.

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Destemida, Pipinha seguia na frente no comando das operações. Medo? Até podia ter, mas nada que afetasse a sua vontade. Além disso, tinha que mostrar ser valente, como uma mulher crescida. - Brrrrrr, brrrrrr brrrrrrr, quem anda aí? – Gente de bem, por favor, vimos numa missão de salvação – disse temerosa. - Pois bem, porque vieram aos domínios do Vento do Norte, pergunto? Porque ousais perturbar o meu tempo de descanso?

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- Vimos por bem, Senhor Vento do Norte, não o queremos perturbar. Procuramos Panguila, a pequena Ursa Parda, desapareceu. - Brrrrr, brrrrrr, não querem incomodar mas estão a fazê-lo. Só o facto de invadirem os meus domínios já é razão para isso. Mas já que estão aqui, vou atender-vos. Mas assim que o fizer, abandonam de imediato este lugar! Essa Ursinha que procurais, levou-a o meu mano, o Vento do Sul. E agora, abandonem este lugar. Preciso descansar. Vão-se daqui. - Aonde poderemos encontrar o Senhor Vento do Sul? - Quando atravessarem essa porta estreita de saída, fechem os olhos e contem até três… e num instante se verão nos domínios do Vento do Sul.

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- Ó Vento do Sul, aparece, Longa é nossa jornada, A Mãe Ursa te agradece Permissão para a entrada. E ouve-se um vozeirão: - Já nem os perigos medem? O vento as lança no chão, Em súplica as duas pedem: 45


- Ó Vento do Sul, por favor, Devolve-nos a Ursinha, Como é grande a sua dor Tem dó da sua mãezinha! Foi durante o temporal Que veio a sua filhinha, Não queiras levá-la a mal - Devolve-a, a filha é minha! Tua filhinha não está, No alto tem mais valor, Bem cedinho, pela manhã, Levou-a a Ursa Maior. - Sem ela não vou ficar! Pipinha, amiga querida, Nem consigo acreditar, É o amor da minha vida! Nada mais podes fazer, Já tomaste o teu lugar! Dizia a Ursa a sofrer É minha, vou-a buscar!

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E logo partiram com o vento, em direção à Via Látea. Eram muitas as estrelas a acenar, cada uma sorria para elas muito feliz. Como era bom brilhar lá no alto, iluminando cada estrada daquele firmamento sem fim. Mas os olhos da Mãe Ursa Panda apenas buscavam Panguila que, no meio daquele labirinto, gritava:

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- Que bom, minha mãe, chegaste, Vem buscar-me, por favor, Por sorte me encontraste! - Não te deixaria, amor! - A filha da Ursa Maior Esta doente, mãezinha, Está febril e com dor, Ainda morre, coitadinha! 48


Ao ouvi-la, Pipinha logo reagiu. - Quem sabe eu possa fazer algo por ela! Tenho aqui comigo alguns comprimidos de meu pai, qual remédio milagroso para a sua recuperação. Falaram então com a Ursa Maior e de imediato lhe ministraram a medicação. Em pouco tempo, aperceberamse que a pequena reagiu tão bem ao medicamento que de imediato pulou para a cauda da Ursa Maior cheia de energia.

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Grata por tanta generosidade, a Ursa Maior devolveu a pequenina Ursa à mãe que, feliz e contente, com o coração cheio de alegria, irrompeu dali com a filha e logo se dirigiu à Savana Guylar. Quando ali chegaram, a Mãe Ursa readquiriu o seu tamanho natural.

Ao vê-las de regresso ao lar, Pipinha correu para casa e logo contou aos pais, que estavam já em grande aflição por não saberem do seu paradeiro, de toda a sua aventura e o modo como conseguiu resgatar a pequena ursinha. - Pipinha filhinha minha, porque nos desobedeceste? 50


- Como podem entender, pais queridos, foi por uma boa causa. A ursinha Panguila, está de novo em casa, na companhia de sua mãe. Depois… - Bem, depois, os comprimidos por vós produzidos surtiram efeito, passaram no teste - sorriu. - Menina travessa! Como foste capaz? – disseram, envolvendo-a num apertado abraço.

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