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Índice 4 Focus on Designers: Karl Lagerfeld 8 A Era do Feminismo 10 A Ditadura da Beleza 18 The F Word 28 Peça do Mês: Espartilho/Corpete 32 Film Review: Black Swan 38 Ver. Ler. Ouvir. 40 rtro Ir... 42 Wishlist

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Editorial

rtro.magazine rtro.wordpress.com

A RTRO já fez um ano. Mas celebremos mais tarde. Ainda

rtro.magazine@ymail.com

não atingimos as 12 edições – reflexo de que um ano de trabalho teve muitas pedras no caminho. Guardámos todas – a

Editora-chefe Margarida Cunha Redactores Margarida Cunha

ver se no futuro construímos um castelo. Ainda assim, não fugindo à tendência da massificação das intervenções plásticas, fizemos um lifting ao design. Sentimonos mais livres, mais soltas, graças às mãos cuidadosas do nosso novo “cirurgião”, Manuel Costa. Não estamos lindas?

Pedro Cunha

Este mês focamo-nos no Feminismo. Arrancando-o das limi-

Adriana Couto

tações da designação “corrente de pensamento”, resolvemos

Catarina Oliveira

mostrá-lo em diferentes manifestações. Porque o feminismo

Andreia Mandim

pode ser expresso num vestido de Karl Lagerfeld, numa cirurgia

Marlene Ribeiro

cosmética ou num conflito interior que se manifesta nos passos

Mariana Sousa Santos Catarina Ferreira Cátia Sá Mónica Dias Ana Filipa Sousa Fotografia Catarina Oliveira

ro

Adriana Couto Paginação Manuel Costa Modelos Iolanda Silva Sara Oliveira

inseguros de uma prima ballerina. Analisamos, assim, um conceito que não tem de ser espartilhado em concepções antiquadas, num sufoco que as mulheres já tiveram de suportar durante vários séculos. Com a isenção que foi possível a uma redacção esmagadoramente feminina. Aguardamos feedback. Margarida Cunha Editora-Chefe



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Focus on

Designers

Karl Lagerfeld por Catarina Oliveira

Chanel. Fendi. Karl Lagerfeld. Três marcas, um génio de 77 anos que sabe com certeza o que as mulheres querem. O designer alemão, conhecido pelo seu ar misterioso e óculos de sol, é considerado um génio no mundo da moda.


Focus on Designers

Chanel Primavera Verão 2011

As colecções para a Primavera Verão de

com evidência, no meio de vestidos fluidos.

Karl Lagerfeld variam umas das outras.

De notar as sandálias, bastante compensa-

Veremos primeiro como Karl apresentou

das, de uma forma muito original, o com-

Chanel para as estações mais quentes. O

pensado já não vai subindo para a cunha do

preto é cor predominante, contrastado

sapato. É quase todo do mesmo tamanho.

com pastéis claros, como amarelo e rosa.

Uma tendência que veremos ser duplicada

O fato clássico Chanel continua a aparecer

nas cadeias de lojas acessíveis, com certeza


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Fendi embarca ainda mais num mundo de cores suaves e primaveris, com alguns tons mais arrojados e colorblocking. Os vestidos são compridos e leves, dando a sensação de Primavera fresca e solarenga. A colecção parece deslizar com os tecidos esvoaçantes. No entanto, não perde o tom de mulher podeorsa, com a ajuda das malas e óculos de sol: acessórios importantíssimos que limam o visual. Fendi Primavera Verão 2011

A marca homónima do criador parou de mostrar visuais desde Outono/Inverno de 2010, por isso não há colecção de Primavera Verão para este ano. Mas Lagerfeld compensa com duas das mais famosas casas de moda mundiais. Os estilos são diferentes. Chanel é o clássico, e sempre será, mas com o twist arrojado do designer. Fendi é feminino e moderno, mas, ao mesmo tempo, intemporal. Todo o tipo de mulher ficará encantada com colecções que, acima de tudo, existem para a mulher e vivem para fazê-la feliz. c


A Era do Feminismo por Monica Dias

Em tempos, as mulheres eram vistas como meras donas de casa cujo poder da palavra estava reprimido pela força do papel do homem na sociedade. Esta imagem frágil e sensível espelhava-se sobretudo no seu visual. Aquando da Primeira Guerra Mundial, o movimento feminista foi determinante nas alterações da moda feminina pois, com a entrada da mulher no mercado de trabalho e a sua consequente emancipação, houve necessidade de adoptar um visual mais sério, que quebrasse a ideia de fragilidade que até então prevalecia.


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Desde que existe uma consciência co-

mulher, podemos referir nomes como

mum, existe a Moda. O que se vestia dita-

Marylin Monroe, Twiggy Lawson, Diana

va o estatuto social de cada um e o visual

a Princesa de Gales, Coco Chanel ou Grace

das grandes classes era não mais que fruto

Kelly. Figuras públicas emblemáticas que

da influência da imagem Real. Marie An-

vão desde os anos 20 aos anos 80 e que

toinette, ao que se conhece, foi das figu-

mostraram que a mulher pode não só de-

ras mais carismáticas, dotada de roupas

senvolver uma carreira profissional como

extravagantes e luxuosas e, por isso, alvo

também ser um ícone da moda. No que re-

dos comentários da Corte. Porém, foi

speita ao movimento feminista, podemos

ela quem naquele tempo ditou a moda.

assumir que grande parte da sua influên-

Hoje em dia, cabe às celebridades este

cia provém de nomes como Bertha Lutz ou

papel. A juntar às revoluções e às guerras,

Simone de Beauvoir, feministas que deram

o movimento feminista ganhou voz e as

voz aos seus ideais entre os anos 20 e 50 e

mulheres que outrora se viam subjugadas

Indira Gandhi, Golda Meir ou Evita Perón,

ao simples papel de dona de casa viram

que entre os anos 40 a 80 fizeram história

o mercado de trabalho abrir-lhes portas,

ao chegarem a cargos políticos que até

o ensino recebê-las cada vez em maior

então eram administrados por homens.

número e cargos políticos serem por si

São muitos os nomes das mulheres que

ocupados. A moda seguiu esta evolução, e

tentaram dar voz ao papel da mulher na

tal evolução foi exigindo tendências. Des-

sociedade. São muitos os nomes daquelas

de peças de roupa práticas a conjuntos ele-

que ficaram para a história por continu-

gantes, com glamour, a verdade é que hoje

arem a influenciar estilos e mentalidades.

em dia a oferta é vasta e é-nos permitido

O feminismo, mais do que um discurso

seguir as nossas próprias influências.

político ou intelectual, é um direito. c

Quando falamos na emancipação da



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A Ditadura da Beleza por Adriana Couto

Fotografa Adriana Couto Modelo Sara Oliveira

Houve uma altura em que ninguém ligava ao seu corpo. Há muito, muito tempo. Agora, a imagem que nos é passada é de que o belo é o desejado.


A Ditadura da Beleza

Nem sempre as pessoas nascem com a beleza que desejam; muitas vezes sentem-se insatisfeitas com o seu corpo e por isso recorrem à cirurgia estética. Esta está ao alcance de todas as carteiras e, pior (ou melhor, dependendo do ponto de vista), de todas as faixas etárias. O culto do corpo e da respectiva beleza nasceu nos anos 80 e, a partir daí, a nossa sociedade passou a ser narcisista, onde aquela passa a ser fundamental. A nossa época passa por uma espécie de ditadura de beleza que nos é imposta todos os dias pela televisão, publicidade ou revistas, onde imperam as modelos adolescentes em corpos de mulheres adultas ou as ditas e conhecidas socialites, que se apresentam com corpos de jovens na casa dos vinte, assim merecendo um lugar no altar de muitos homens e mulheres. Já ninguém fica indiferente aos inúmeros programas que mostram alterações gigantescas em indivíduos que recorreram a uma cirurgia estética e que aparecem ao fim de algum tempo com


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uma cara ou imagem completamente

auto-estima. As cirurgias mais procuradas

renovadas. Isto é algo cada vez mais co-

são a lipoaspiração e a prótese mamária.

mum. Mas deveria ser assim? Devería-

Apesar de haver médicos que aceitam

mos poder corrigir aquilo com o qual nas-

fazer estas operações, há quem exija que

cemos e com o qual deveríamos morrer?

os adolescentes sejam primeiro avaliados

As opiniões divergem sobre o assunto.

psicologicamente. Isto para evitar que

A busca pela cirurgia estética en-

sejam sujeitos a intervenções cirúrgicas

tre adolescentes tem vindo a aumentar

levados por certos momentos. A pessoa

significativamente, mesmo sendo um

deverá estar consciente de que a mudança

tema bastante controverso. Os jovens

não significa que surjam logo resultados

procuram-na como solução para proble-

na sua vida pessoal. Aliás, a cirurgia esté-

mas como as relações sociais ou a baixa

tica só é indicada aos jovens quando estes



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já não suportam conviver com a insatisfação relativa ao corpo, interferindo na sua auto-estima. Por outras palavras, apenas se tiverem a certeza absoluta de que este procedimento tenderá a torná-los pessoas mais felizes com a sua aparência e respectiva vida. No Brasil, 13% dos adolescentes já realizaram uma cirurgia estética, sendo as mais comuns a redução ou o aumento da mama, a lipoaspiração ou a

operação

às

“orelhas

de

abano”.


O aparecimento de novas técnicas

de ter um corpo de modelo, quase per-

menos agressivas e praticamente não inca-

feito, temos de ter consciência de que

pacitantes leva a uma verdadeira corrida às

em todos nós existe beleza, por vezes

clínicas de estética, muitas vezes influen-

só temos de a despertar. Haverá ca-

ciada por ideias falaciosamente transmiti-

sos em que isto demorará mais, talvez

das pela sociedade e pelos media, que lev-

por uma questão de hábito, mas se gos-

am a uma autêntica «vendedora de ilusões».

tarmos de nós, quem não gostará? c

Por mais sedutora que seja a ideia


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The F Word por Margarida Cunha

Fotografa Catarina Oliveira Modelo Iolanda Silva

Em Novembro de 2007, a revista Marie Claire britânica publicou o artigo “Can we rebrand feminism?”. Nele, a redacção pedia a 3 agências publicitárias que criassem um anúncio ou produto que revitalizasse o apelo do feminismo. Esperem. O feminismo precisa de ser revitalizado?


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The F word

Em Janeiro de 2011, Catherine Hakim causou polémica com o livro Feminist Myths and Magic Medicin, em que tenta deitar por terra várias pedras basilares do pensamento feminista. Celebra, assim, a diminuição da diferença salarial entre homens e mulheres como o grande sucesso da legislação para a igualdade de oportunidades. De resto, descarta a utilidade da mesma pelo facto de não reflectir os verdadeiros desejos das mulheres e, como tal, não possuir qualquer “base científica”. Nas palavras da professora na London School of Economics, na verdade, as mulheres prefeririam, se lhes fosse concedida a possibilidade, ficar em casa – a tratar dos filhos – a trabalhar. Desmistifica ainda a crença de que a mulher aspira à independência económica, apontando o casamento como uma “alternativa ou um suplemento das suas carreiras profissionais” – ou seja, as mulheres continuam a preferir homens com


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mais formação académica e poder económico do que elas. E nem podem, argumenta Hakim, queixar-se relativamente às dificuldades na progressão na carreira, uma vez que – se optam por trabalhar menos horas para se dedicarem à família – a culpa é delas. Perante

este

sos,

impõe-se

ainda

lugar

tipo

para

de

discur-

questionar: o

feminismo?

Desde os primórdios do pensamento humano que a mulher é retratada como um ser inferior, uma cópia imperfeita do homem, uma criatura sensível e fraca que é necessário proteger. Mesmo na Idade das Luzes – uma época em que seria expectável alguma evolução nas atitudes e nas mentalidades – os elementos do sexo feminino surgem, de forma natural, intelectualmente inferiores aos homens. Foi preciso esperar pelo período das grandes guerras para a mulher assumir um papel activo na vida laboral, demonstrando, desse modo, que podiam



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ser-lhe atribuídas exigências bem difer-

retirada a responsabilidade – afinal, nin-

entes das de mãe e esposa. Tratou-se de

guém tem culpa do sexo com que nasceu.

um período fecundo para o feminismo. Os

Independentemente dos interesses

anos 60 e as suas revoluções sociais troux-

que estas concepções possam servir, a ver-

eram consigo a pílula – que, por sua vez,

dade é que existem. Não é por acaso que

trouxe à mulher a chave para o controlo

um outro aspecto indissociável da con-

da fertilidade e da vida sexual, um aspecto

dição feminina seja o corpo. Trata-se de

que vale tanto pela sua amplitude simbóli-

uma característica que assume contornos

ca como pelo controlo da natalidade em si.

gigantescos, quando analisada à luz de

Ainda assim, as concepções tradicion-

uma sociedade em que o sexo vende e que

ais dos géneros continuam a traduzir-se,

se sobrealimenta de imagens. Exemplo

em termos de trabalho, em tarefas mais

disso mesmo são as campanhas publici-

expressivas para as mulheres e instru-

tárias que enchem as revistas femininas.

mentais para os homens. Esta dicotomia

Em 2003, a partir de uma análise de pub-

presente no discurso científico tradicion-

licações portuguesas dessa especialidade,

al atravessa ainda hoje todos os suportes

a investigadora Silvana Mota-Ribeiro con-

mediáticos, culminando numa série de

cluiu que existem 3 tipos de mulher no

expectativas cada vez mais irreais e em

discurso publicitário: a mulher-visão (um

catalogações cada vez mais fixas. Assim,

objecto para observação); a mulher bela

comportamentos e formas de pensar não

(ideal de juventude e magreza) e a mulher-

são fundamentados por experiências cul-

erótica (a mulher sensual e sexualmente

turais e vivências individuais diferentes,

disponível). Em todos os retratos a inves-

mas pelo facto de se ter nascido homem

tigadora realça a passividade das mesmas,

ou mulher. Não só se filtra toda a hu-

reforçando o seu carácter decorativo. As

manidade das nossas acções, como nos é

mulheres limitam-se a estar nos anúnci-


The F word

os, não sendo nem fazendo coisa alguma. Como se o feminismo não tivesse já dores de cabeça que chegassem, tem ainda de lidar com uma nova geração de mulheres – as actuais adolescentes e jovens adultas que, fruto já de uma sociedade consumista e pós-moderna, rejeitam o feminismo, descartando-o como antiquado e, como tal, desadequado à realidade contemporânea. Tratam-se de mulheres que cresceram no seio daquilo a que a autora feminista Susan J. Douglas designa por “enlightened sexism” (sexismo iluminado) – e que dá título ao seu livro Enlightened Sexism – The Seductive Message That Feminism's Work Is Done. Esta concepção incute nas mulheres a ilusão de que os objectivos feministas estão já alcançados. Douglas exemplifica, recorrendo a uma série de produtos da cultura popular, tais como séries em que a mulher assume protagonismo (Buffy, Caçadora de Vampiros; Xena, a Princesa Guerreira ou A Vingadora), para afirmar que este suposto novo poder assumido pelas mulheres não passa de uma fantasia – um mecanismo


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para as manter satisfeitas e afastadas daquilo que realmente lhes confere poder e autonomia. Utilizando um exemplo bem mais real, destaca a figura da mulher afroamericana, muitas vezes olhada com inveja pelas congéneres caucasianas, uma vez que é capaz de afirmar a sua sexualidade, vontade e opinião sem qualquer medo de ser catalogada como ridícula ou desbocada. Pelo menos, este é o retrato que a ficção americana traça. Contudo, a realidade, segundo Susan, é bem mais complicada, revelando uma série de estatísticas – maior taxa de pobreza; maior probabilidade de morrer de, por exemplo, doenças cardíacas e SIDA; maior probabilidade de ser assediada sexualmente, presa ou violada – que atestam que a plena igualdade dos géneros é ainda um produto do imaginário colectivo associado à televisão. Por todas as adversidades enfrentadas e pelas que ainda hoje subsistem, parece fazer algum sentido que o Dia Internacional da Mulher – que já ultrapassou o 100º aniversário – continue a ser record-


ado. Afinal, não pode ser descredibilizado

como uma estrada com muitos quilómet-

como mais um capricho feminino um capí-

ros percorridos ou com mais ainda por

tulo histórico que foi escrito com as cin-

percorrer. Sabendo nós que as celebrações

zas de mais de uma centena de mulheres

se reservam a feitos excepcionais, e não a

que tiveram a ousadia de expressar que a

rotinas práticas do quotidiano, talvez seja

igualdade é um direito. Se deve ser celeb-

um bom sinal quando o Dia da Mulher

rado ou não, dependerá – mais do que do

não for celebrado. Talvez nesse dia tenha

género com que nos identificamos – da

chegado uma mulher estúpida ao poder.

nossa capacidade de vermos o copo meio

Ou talvez não tenha chegado uma mul-

cheio ou meio vazio, ou seja, da nossa per-

her nem um homem. Apenas um líder. c

spectiva em encarar a luta pela igualdade


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LEITURAS DE APOIO Douglas, S. J. (2010) Enlightened Sexism – The Seductive Message That Feminism's Work Is Done, Nova Iorque: Times Books. Mota-Ribeiro, S. (2003) ‘Corpos Visuais – imagens do feminino na publicidade’ in Macedo, A. & Grossegesse, O. (eds.) (2003) Re-presentações do Corpo, Colecção Hispérides – Literatura, Braga: Centro de Estudos Humanísticos da Universidade do Minho, pp. 115-132. Nogueira, C. (2001) 'Feminismo e Discurso do Género na psicologia Social' [Online], Psicologia & Sociedade : revista da Associação Brasileira de Psicologia Social, 13:1 (2001) 107-128.[http://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/4117/1/feminismo%20e%20discurso%20do%20 g%C3%A9nero%20na%20psicologia%20social.pdf, acedido em 30/03/11].


Peça do Mês:

Espartilho/Corpete por Mariana Sousa Santos

Num mês em que o tema da RTRO é o feminismo, vamos falar de uma peça que durante anos foi vista como opressora da classe feminina e cujo abandono foi um símbolo de luta pelos direitos das mulheres. Hoje em dia já não faz muito sentido falar em espartilho, mas sim em corpete e, apesar de ser uma peça mais usada no mundo da lingerie, ainda vai surgindo na moda de anos a anos.


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Muito popular nas cortes europeias do

obrigatório o uso desta peça. Vários são os

século XIX, o espartilho tinha como fun-

mitos das doenças causadas por esta peça

ção encolher ao máximo a cintura da mul-

de roupa, desde problemas respiratóri-

her, realçando assim as suas curvas, nome-

os, passando por fracturas de coste-

adamente os generosos decotes (ou que

las, e contam-se mesmo casos de morte.

pelo menos assim pareciam graças ao es-

A sua origem é francesa e era usado

partilho). Todos temos cenas na memória

debaixo dos vestidos, contudo os ves-

de filmes de época em que as criadas pas-

tidos tinham também um modelo não

savam horas tentando apertar os espar-

muito diferente destes. Nesta altura che-

tilhos das suas patroas, uma árdua tarefa

garam a ser usados também por homens,

mas que tinha de acontecer, pois era quase

porém nunca apertados como o da mul-

Vivien Leigh - E Tudo o Vento Levou (1939)


Peça do Mês

her, pois a sua função era apenas estilizar um pouco a figura, disfarçando a barriga. Era lógico que o espartilho condicionava os movimentos da mulher, obrigandoa manter uma pose quase sempre rígida, já para não falar no desconforto causado. Estava então implícito que esta peça a reduzia à condição de objecto decorativo, já para não falar de homogeneizar o aspecto da generalidade das mulheres. O espartilho foi evoluindo de forma conforme a

o uso de espartilho uma ideia inconcebível.

moda das alturas que atravessou, contudo

Hoje em dia não faz sentido falar em es-

nos anos 20 já tinha caído em desuso na

partilho, a maioria das marcas nem o fab-

Europa e também na América. Com as

rica mais, mesmo que volte a

transformações sociais que se verificaram

por vezes estar na moda em

nos anos a seguir no papel da mulher na

forma de corpete (como

sociedade, seria impossível que este con-

se verificou no verão pas-

tinuasse a subsistir. Embora até aos anos

sado com o estilo pin-

50 ainda se tenham evidenciado as volup-

up). Uma vez que não

tuosas curvas no ideal da mulher perfeita,

é, nem nunca foi,

com a década de 60 e surgimento da mul-

uma peça de

her andrógena, mais moderna e de certa

vestuário con-

forma maria-rapaz (como Edie Sedgwick e

fortável, hoje

Twiggy), a tendência foi para que não vol-

em dia o cor-

tassem mais a estar na moda, sendo logo aí

pete

aparece


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só na lingerie, com ou sem soutien incluído, ou então mais ligado ao estilo gótico, onde por vezes volta mesmo a ser usado apertado como os tradicionais espartilhos. Neste caso é bastante frequente também tatuar-se as cordas do espartilho nas costas ou, mesmo com a ajuda do body piercing, recriar esse mesmo efeito de uma forma mais real. Mas qual a relação entre o espartilho/corpete e o feminismo? Podemos considerar que o espartilho era uma forma de repreensão da mulher uma vez que, devido à pouca possibilidade de movimentos que permitia, não a deixava ter um papel mais activo na sociedade. A mulher nesta altura estava limitada pela sociedade tal como estava pelo seu espartilho. O abandono deste foi um passo importante na emancipação feminina tal como foi o uso de calças. c

Megan Fox - Jonah Hex (2010)

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Film Review:

Black Swan O lado negro do bailado por Andreia Mandim

Se, para um comum mortal, fazer um filme sobre balĂŠ seria algo bastante banal - no que diz respeito Ă perspectiva adoptada - para o realizador Darren Aronofsky fazer um filme sobre o mesmo tema pode revelar-se bem complexo e avassaladoramente emotivo.

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Film Review

“Black Swan” espelha o que de mais pro-

são algumas das artimanhas que con-

fundo e sombrio pode existir dentro de

ferem ao filme um ambiente único; par-

alguém, mesmo que este alguém seja belo,

tilhando então da dicotomia já referida.

jovem e quase inocente. O filme mostranos isso e muito mais. O argumento não é dos mais imprevisíveis ou originais, pelo menos no que toca ao twist e à temática do ‘amigo imaginário’ ou alter-ego. Contudo, o impulso dado pela realização de Aronofsky consegue conferir força a cada momento da história e torná-la interessante do início ao fim. Consegue tornar ao mesmo tempo algo assustador e quase demoníaco em algo belo, atractivo e hipnotizante. A música e espelhos


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A cada passo, aproximamo-nos mais

tentou ser o que a mãe não foi. Alguém

da personagem principal, Nina, que per-

que tenta a todo o custo ser ‘perfeita’, mas

sonifica alguém cuja vida esteve até então

acaba por descobrir que até isso é algo

‘presa’ a uma potencial carreira como baila-

relativo. Alguém que ainda procura o seu

rina. Alguém que provavelmente nunca

verdadeiro ‘eu’ e que acaba por não en-

teve uma adolescência normal, que esteve

contrar, reflectindo-se então em terceiros

sempre à mercê de um número infindável

para contrariar o medo que sente da sua

de regras e rigidez maternal. Alguém que

realidade. Assim, a personagem a que dá


Film Review

vida Natalie Portman acaba por ser a base de toda uma história bastante intrigante, que passa por um thriller bem conseguido e ardilosamente esquematizado ao longo de 108 minutos. A verdade é que desempenha na perfeição um papel que sugere muita versatilidade, pois também no desempenho a actriz tem de conseguir ser o “White Swan” e o “Black Swan”, um desafio bastante complicado, mesmo para um actor. A vitória do Óscar foi realmente merecida. Todavia, existe apenas uma crítica que pode fazer-se, uma vez que parece tratar-se de um pormenor que passou ao lado de muitas pessoas. Supostamente a personagem Nina não deveria ter mais de 20 anos, pois fica escandalizada quando a mãe fala de ter tentado ser profissional perto dos 25. Visto isto, mesmo Portman sendo excelente no desempenho do seu papel, e dona de uma beleza bastante particular, já lá vai o tempo em que parecia ter 20 anos. Portanto, aí existe uma falha de cast, que em nada afectou o sucesso do filme, mas que não tem muita lógica num projecto


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deste tipo, onde todo o cuidado é pouco. A nível técnico é difícil negar que é estonteante a cada segunda que passa, assim como o restante elenco, desde a mãe Erica (Barbara Hershey), a Lily (Mila Kunis) e Leroy (Vincent Cassel). Não esquecendo Winona Ryder no papel de Beth. Esta última parecia ser, talvez, a mais promissora do elenco, a seguir a Natalie. Contudo tal acabou por não acontecer, sendo dada mais relevância às duas restantes actrizes. Darren conseguiu tornar a “Dança dos Cisnes” numa obra-prima em película absolutamente arrasadora, misteriosa e dramática. Onde nos confrontamos com várias dúvidas, nos confundimos e acabamos por reflectir a nossa própria existência, personalidade e caminho que seguimos para chegar até lá. c


Ler. Ver. Ouvir. por Marlene Ribeiro

Livro O Segundo Sexo Autora Simone de Beauvoir Editora Quetzal Editores Ano 2008

O texto foi escrito há mais de 60 anos, mas mantém-se actual. A primeira edição de Segundo Sexo data de 1949 e versa, diz a sua autora, um tema “irritante, principalmente para as mulheres”: o feminismo. Este ensaio de Simone de Beauvoir é um dos mais importantes de sempre. É uma análise detalhada da organização da sociedade, do masculino como referencial e da condição feminina. Um discurso claro e lúcido numa mensagem que se pretende universal.


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Filme Vera Drake Direcção Mike Leigh Ano 2004 Género Drama Com Imelda Staunton, Jim Broadbent e Heather Craney

Londres, final dos anos 50. Vera Drake é uma mulher da classe baixa, mãe de família, que se guia pela sua própria moral, agindo à margem das leis estabelecidas/do sistema. Sobre o fosso entre ricos e pobres, os valores morais, o aborto e a importância da família, Vera Drake é uma história muito completa e com uma interpretação muito interessante, repleta de improviso que é palavra de ordem nos filmes de Leigh cuja intenção é retratar o real com o máximo de fidelidade.

Disco James Blake Artista James Blake Editora A&M / Atlas Ano 2011

Um trabalho muito esperado. Depois de ter lançado em 2010 os três EPs The Bells Sketch, CMYK e Klavierwerke, James Blake cravou a sua marca na música e garantiu o sucesso do longa duração homónimo. James Blake (o álbum) é melancolia, é dubstep, é entrega. A voz por vezes frágil e a arquitectura do som revelam que não houve medo da experimentação. Apesar da pressão das editoras, foi composto, gravado e produzido pelo jovem britânico de 22 anos numa atitude de grande genuinidade que prova que o indie ainda vive aí algures. Quem não se sentir no quarto dele ao ouvir o disco, provavelmente não ouviu bem.


rtro Ir... por Marlene Ribeiro

L谩szl贸 Moholy Nagy


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BRAGA

GUIMARÃES

Exposições

Teatro

O quê? Recollection, exposição de mix media

O quê? Rua Gagarin

Por quem? Diogo Landô

Quem? Teatro Oficina

Quando? De 1 Abril a 4 Maio

Quando? 30 Abril, 16h00

Onde? Velha-a-Branca

Onde? Espaço Oficina do Centro Cultural

www.velha-a-branca.net

Vila Flor

Música

www.ccvf.pt

Quem? Júlio Resende 4teto Quando? 24 Abril, 22h00 Onde? Espaço Cultural Pedro Remy

PORTO

pedroremy.com Teatro

Música

O quê? Radiation

Quem? Patrick Watson

Quem? The Polish Theatre of Toronto

Quando? 23 Abril

Quando? 14 Abril, 21h30

Onde? Teatro Sá da Bandeira

Onde? Theatro Circo

www.teatrosadabandeira.com

www.theatrocirco.com Outros

O quê? Apresentação do livro Zapping sobre as madrugadas idênticas, de Eugénia Brito Quando? 29 Abril, 18h00 Onde? Livraria Centésima Página www.centesima.com

O quê? Feira do Livro de Braga Quando? 30 Abril a 8 de Maio Onde? Parque de Exposições de Braga www.peb.pt


Wishlist Aqui ficam as sugestões da redacção da rtro para o mês de Abril!

Vestido H&M (shop.hm.com) - Este é uma solução rápida e prática para uma ocasião mais formal. Sendo uma peça bastante fresca, favorece formas mais femininas. Simples mas vistoso. por Mariana Sousa Santos


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Verniz H&M (shop.hm.com) - Uma cor arrojada e perfeita para o verão. O ideal é combinar com um conjunto de roupa igualmente primaveril. por Catarina Oliveira

Creme Facial Total Moisture Benefit (benefitcosmetics.com) - Útil. Simples. Bem desenhado. Contém o essencial. Perfeito. por Margarida Cunha



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