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A POESIA MARGINAL PAG

A POESIAMARGINAL

Era também chamada “geração do mimeógrafo” pois a maioria dos poetas marginais recorriam ao mimeógrafo para copiar e imprimir suas obras. Com esse processo, quase artesanal --e sem vínculo com editoras-- os jovens poetas driblavam a censura imposta pela ditadura militar e sentiam-se mais livres para contestar os valores tradicionais, assim como o formalismo dominante, imposto pelos grupos de vanguarda que reinavam nos anos 60 e 70. Deixaram como legado uma maneira mais livre, leve e solta de escrever, agir artisticamente e viver. Como disse Chacal, “a última flor do lácio, inculta e bela,

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ganhava as páginas alcoolizadas dos mimeó-

grafos.” Esses poetas irão ocupar espaços pre dominantemente nos anos 70 e 80. Poderiam estar em um anexo, mas resolvi posicioná-los aqui porque eu mesmo e outros poetas fizemos livros mimeografados na década de 60.

Chacal é poeta e letrista brasileiro. Aluno de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foi um dos primeiros poetas da década de 1970 a se utilizar do mimeógrafo para divulgar sua poesia, com o livro Muito Prazer, Ricardo (1971) e desde então colabora em antologias, revistas impressas e eletrônicas, em performances, como autor e editor de livros. Tem parcerias célebres com Lulu Santos, 14 Bis, Blitz e outras bandas e compositores de sucesso, Alguns livros: Preço da Passagem(1972), Amárica(1975), Olhos Vermelhos(1979).

RÁPIDO E RASTEIRO vai ter uma festa que eu vou dançar até o sapato pedir pra parar. aí eu paro, tiro o sapato e danço o resto da vida

CAMARIM adentrei o camarim como um encouraçado potenkin com mil marinheiros sublevados fazendo algazarra dentro de mim

ANATOMIA pego a palavra no ar no pulo paro vejo aparo burilo no papel reparo e sigo compondo o verso

PAPAGAIO estranho poder o do poeta. escolhe entre quase e cais quais palavras lhe convêm. depois as empilha papagaio e as solta no céu do papel

UMA PALAVRA uma palavra escrita é uma palavra não dita é uma palavra maldita é uma palavra gravada como gravata que é uma palavra gaiata como goiaba que é uma palavra gostosa

ANATOMIA pego a palavra no ar no pulo paro vejo aparo burilo no papel reparo e sigo compondo o verso

Antônio Carlos de Brito, o Cacaso, foi um dos nomes mais importantes da década de 1970, era da geração mimeógrafo, que imprimia seus próprios poemas ou se mobilizava em pequenas editoras. Cacaso era professor, poeta, crítico, desenhista, letrista da MPB. Bem informado, levou para a universidade a discussão sobre essa nova poesia que surgia no Rio de Janeiro. Abriu discussão contra o estruturalismo, a linha teórica do momento, e se insurgiu contra a poesia concreta, depois de ter se mostrado simpático a ela.

Poesia Eu não te escrevo Eu te/ Vivo E viva nós!

JOGOS FLORAIS Minha terra tem palmeiras onde canta o tico-tico. Enquanto isso o sabiá vive comendo o meu fubá. Ficou moderno o Brasil ficou moderno o milagre: a água já não vira vinho, vira direto vinagre. Minha terra tem Palmares memória cala-te já. Peço licença poética Belém capital Pará. Bem, meus prezados senhores dado o avançado da hora errata e efeitos do vinho o poeta sai de fininho. (será mesmo com dois esses que se escreve paçarinho?) ESTILOS DE ÉPOCA Havia os irmãos Concretos/ H. e A. consanguíneos e por afinidade D. P., um trio bem informado: dado é a palavra dado E foi assim que a poesia deu lugar à tautologia (e ao elogio à coisa dada) em sutil lance de dados: se o triângulo é concreto já sabemos: tem três lados. HAPPY END o meu amor e eu nascemos um para o outro

agora s[o falta quem nos apresente

DESCARTES Nada há no mundo mais bem distribuído do que a razão: até quem não tem tem um pouqu8inho

AS APARÊNCIAS REVELAM Afirma uma Firma que o Brasil confirma: “Vamos substituir o Café pelo Aço”. Vai ser duríssimo descondicionar o paladar. Não há na violência que a linguagem imita algo da violência propriamente dita?

O poeta, letrista, cineasta e jornalista Torquato Neto nasceu em Teresina e cursou Jornalismo no Rio de Janeiro. Fez parte do Tropicalismo e compôs inúmeras letras, como “Geléia Geral”, “Mamãe, Coragem” e “Pra Dizer Adeus”, musicadas por Gilberto Gil, Caetano Veloso e Edu Lobo, respectivamente. Entre 1970 e 1972, atuou em alguns filmes e também criou e redigiu a coluna “Geléia Geral”, no jornal carioca Última Hora. Editou a Navilouca, revista emblemática da época. Em 1973, é publicado, postumamente, o livro “Os Últimos Dias de Paupéria”.

COGITO eu sou como eu sou pronome pessoal intransferível do homem que iniciei na medida do impossível

eu sou como eu sou agora sem grandes segredos dantes sem novos secretos dentes nesta hora

eu sou como eu sou presente desferrolhado indecente feito um pedaço de mim

eu sou como eu sou vidente e vivo tranquilamente todas as horas do fim ANDARANDEI não é o meu país é uma sombra que pende concreta do meu nariz em linha reta não é a minha cidade é um sistema que invento me transforma e que acrescento à minha idade nem é o nosso amor é a memória que suja a história que enferruja o que passou não é você nem sou mais eu adeus meu bem (adeus adeus) você mudou mudei também adeus amor adeus e vem LITERATO CANTABILE Agora não se fala mais toda palavra guarda uma cilada e qualquer gesto é o fim do seu início:

Agora não se fala nada e tudo é transparente em cada forma qualquer palavra é um gesto e em sua orla os pássaros de sempre cantam nos hospícios. Você não tem que me dizer o número de mundo deste mundo não tem que me mostrar a outra face face ao fim de tudo: só tem que me dizer o nome da república do fundo o sim do fim do fim de tudo e o tem do tempo vindo: não tem que me mostrar a outra mesma face ao outro mundo (não se fala. não é permitido: mudar de idéia. é proibido. não se permite nunca mais olhares tensões de cismas crises e outros tempos. está vetado qualquer movimento

É mineiro, filho e neto dos também poetas Alphonsus de Guimaraens Filho e Alphonsus de Guimaraens. Formou-se em Direito pela UnB em 1966 e retornou ao Rio de Janeiro em 1972. Participou do movimento da poesia marginal, conhecida também como “geração mimeógrafo”. Estreou em 1972 com O misterioso ladrão de Tenerife. Desde então, é considerado um ícone da poesia marginal. Lançou vários livros de poemas.Os mais recentes são Cidade vertigem (2005) e Uma cerveja no dilúvio (2011). É professor do Instituto de Artes e Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense.

TEXTO

Oh espina clavada em el hueso Hasta que se oxiden los planetas! Federico García Lorca

O texto, escura escama, pesadelo de eternidade, Máscara densa do universo vomitando. O texto, mas não a energia que o pensou, Interrogando a simultaneidade absoluta. Há uma esperança nas ruas, nas pedras, no acaso de tudo,uma esperança, uma forma suspensa entre o aparente e a essência, entre o que vemos e a substância, uma esperança, uma certeza talvez de que o rio não se dissolva no mar, de que o ínfimo, o precário, a voz, a sombra, o estalar das carnes na explosão não se dispersem no todo, impensável medusa da inexistência. Há uma luz qualquer sonhando integração, o suposto destino dos ventos, das energias globais, a suposta sabedoria com o que homem fecundou a crosta envenenada do planeta, há uma luz qualquer ensaiando águas pensadas no eterno esvair-se, abstrato expansionário, há uns olhos além da frágil realidade, da terrível matança, a cruel carnificina entre seres pestilentos aquém da fronteira do sonho, um texto além do texto, uma esperança talvez, enquanto somo e nos cumprimos, enquanto somos e nos oxidamos, enquanto somos e prosseguimos.

EXERCÍCIO empurre as mãos lentamente através da pele do rio at[e tocar o coração da beleza (ruína do tempo impenetrável) depois as retire lentamente como se puxasse do infinito a respiração da criança nascendo

Nasceu em Cuiabá, estudou em colégio jesuíta e mudou pra Brasília em 1974. Ali descobriu a poesia marginal e começou a publicar seus próprios livros que viraram best-sellers. Seu primeiro livro feito em mimeógrafo--Iogurte com farinha, em 1977 - vendeu 8.000 cópias de mão em mão pelos bares e outros locais públicos da Capital Federal. Tornou-se uma das principais vozes da Poesia Marginal, ao lado de Chacal e Chico Alvim.Já foi preso por causa de seus poemas e proibido de publicar entre 1978 e 1979.

RECEITA Ingredientes: 2 conflitos de gerações 4 esperanças perdidas 3 litros de sangue fervido 5 sonhos eróticos 2 canções dos beatles Modo de preparar dissolva os sonhos eróticos nos dois litros de sangue fervido e deixe gelar seu coração leve a mistura ao fogo adicionando dois conflitos de gerações às esperanças perdidas corte tudo em pedacinhos e repita com as canções dos beatles o mesmo processo usado com os sonhos eróticos mas desta vez deixe ferver um pouco mais e mexa até dissolver parte do sangue pode ser substituído por suco de groselha mas os resultados não serão os mesmos sirva o poema simples ou com ilusões

O MENINO QUE FUI EXISTE ONDE NÃO ESTOU o menino que fui não sou eu, é outro menino, mais antigo, que veio antes de mim o menino que fui nenhum poeta imagina, nenhuma palavra recria o menino que fui não foi ..................................................................................................... eu sei que errei mas prometo nunca mais usar a palavra certa EU TE AMO e daqui pra frente tudo será decepção

Poeta carioca, crítica literária, professora e tradutora, é considerada um dos principais nomes da geração mimeógrafo, conhecida também como a poesia marginal da década de 1970. Licenciada em Letras pela (PUC-Rio) em 1975, sua dissertação de mestrado na Escola de Comunicação da UFRJ resultou na publicação, em 1980, do livro Literatura não é documento, importante levantamento de documentários sobre escritores e movimentos literários do Brasil.

CONTAGEM REGRESSIVA Acreditei que se amasse de novo esqueceria outros pelo menos três ou quatro rostos que amei Num delírio de arquivística organizei a memória em alfabetos como quem conta carneiros e amansa no entanto flanco aberto não esqueço e amo em ti os outros rostos.

AVENTURA NA CASA ATARRACADA Movido contraditoriamente por desejo e ironia não disse mas soltou, numa noite fria, aparentemente desalmado; - Te pego lá na esquina, na palpitação da jugular, com soro de verdade e meia, bem na veia, e cimento armado para o primeiro a andar. Ao que ela teria contestado, não, desconversado, na beira do andaime ainda a descoberto: - Eu também, preciso de alguém que só me ame. Pura preguiça, não se movia nem um passo. Bem se sabe que ali ela não presta. E ficaram assim, por mais de hora, a tomar chá, quase na borda, olhos nos olhos, e quase testa a testa.

OLHO MUITO TEMPO O CORPO DE UM POEMA Olho muito tempo o corpo de um poema até perder de vista o que não seja corpo e sentir separado dentre os dentes um filete de sangue nas gengivas.

Poeta mineiro, nascido em Belo Horizonte, é escritor, compositor, letrista, tradutor e roteirista. Estreou em poesia em 1974 com o livro Na Busca do Sete-Estrelo, momento em que a poesia marginal estava mostrando sua cara irreverente. Cursou filosofia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e letras na Pontifícia Universidade Católica (PUC/RJ). É parceiro de vários craques da música como Francis Hime, Egberto Gismonti, Wagner Tiso. E é o mais novo imortal da Academia Brasileira de Letras.

EROS & CIVILIZAÇÃO se você diz eu te amo meu coração se mira no espelho e faz piruetas de circo se você diz eu te quero meu coração distraído lixa as unhas e diz: não se comova, baby se você diz eu te quero meu coração faz versos como quem sonha demais e não se abala nunca

se você diz eu não te amo meu coração tristonho acende as luzes porque as noite é negra como a asa da graúna A PROSA DO OBSERVATÓRIO o poeta esquadrinha a natureza em busca de indícios: eclipses o grafismo das garças no lago estrelas cadentes e outros sinais da língua de deus. e deus, crupiê do acaso, foi passar o verão noutra galáxia deixou no céu uma guirlanda de enigmas e mais meia dúzia de coincidências pra orientar o frenesi dos tolos e as especulações da astronomia OS FOGOS DA FALA a fala aflora à flor da boca às vezes como fogos de artifício fulguração contra os terrores do silêncio só espada espavento espelho ou pedra ficção arremessada ou canção pra cantar as graças as virilhas as maravilhas da amada a deusa idolatrada de amor: essa outra voz quase jazz que subjaz ventríloqua de si mesma ROMÂNTICA o poeta se enfastia da lua e a compara à amada depois se enfastia da amada e vice-versa

Paranaense, é um dos mais expressivos poetas de sua geração. Foi escritor, poeta, crítico literário, tradutor e professor. Influenciado pelos irmãos Augusto e Haroldo de Campos deixou uma obra vasta que, passados mais de 30 anos de sua morte, continua exercendo forte influência nas novas gerações Tinha uma poesia marcante, alicerçada num jeito próprio de escrever, com trocadilhos, brincadeiras com ditados populares. Nota-se a influência do haicai. Usou e abusou de gírias e palavrões, tudo de modo bastante original e instigante.

INCENSO FOSSE MÚSICA isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é ainda vai nos levar além

AVENTURA NA CASA ATARRACADA Já disse Já disse de nós. Já disse de mim. Já disse do mundo. Já disse agora, eu que já disse nunca. Todo mundo sabe, eu já disse muito. Tenho a impressão que já disse tudo. E tudo foi tão de repente... PARADA CARDÍACA Essa minha secura essa falta de sentimento não tem ninguém que segure, vem de dentro. Vem da zona escura donde vem o que sinto. Sinto muito, sentir é muito lento.

SEM TÍTULO Eu tão isósceles Você ângulo Hipóteses Sobre o meu tesão

Teses sínteses Antíteses Vê bem onde pises Pode ser meu coração

Poeta mineiro, nascido em Araxá, sua carreira literária como poeta teve início em 1974, com o lançamento de Passatempo, pela coleção Frenesi, nome adotado pelo primeiro grupo da Poesia Marginal, que teve projeção na década de 1970 e foi representado por intelectuais como Roberto Schwarz, Cacaso, Chacal e Geraldo Carneiro. Recebeu o Prêmio Jabuti, em 1982 e 1989, e o Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte, em 2011. Depois de se tornar embaixador na Costa Rica, aposentou-se em 2008.

ARREPENDIMENTO Eu não devia ter nascido. DESCARTÁVEL Vontade de me jogar fora ACONTECIMENTO Quando estou distraído no semáforo / e me pedem esmola / me acontece agradecer MUITO OBRIGADO Ao entrar na sala cumprimentei-o com três palavras boa tarde senhor Sentei-me defronte dele (como me pediu que fizesse) Bonita vista pena que nunca a aviste Colhendo meu sangue: a agulha enfiada na ponta do dedo vai procurar a veia quase no sovaco Discutir o assunto fume do meu cigarro deixa experimentar o seu (Quanto ganhará este sujeito) Blazer, roseta, o país voltando-lhe no hábito do anel profissional Afinal, meu velho, são trinta anos hoje como ontem ao meio-dia Uma cópia deste documento que lhe confio em amizade Sua experiência nos pode ser muito útil não é incômodo algum volte quando quiser

REVOLUÇÃO Antes da revolução meu era professor Com ela veio a demissão da Universidade Passei a cobrar posições, de mim e dos outros (meus pais eram marxistas) Melhorei nisso --Hoje já não me maltrato Nem a ninguém.

Poeta baiano, produtor cultural, diretor artístico e letrista de música popular. Distingue-se na poesia por uma estética de excesso e de ruptura. Estudante de Direito na UFBA, participou do Centro Popular de Cultura (CPC), junto com outras figuras como o compositor Tom Zé. Daí sua proximidade com o tropicalismo conforme evidenciam suas poesias e letras de música. Como outros poetas pertencentes à poesia marginal, seus trabalhos primam pela irreverência, coloquialidade e temática urbana.

EXTERIOR Por que a poesia tem que se confinar às paredes de dentro da vulva do poema? Por que proibir à poesia estourar os limites do grelo da greta da gruta e se espraiar em pleno grude além da grade do sol nascido quadrado? Por que a poesia tem que se sustentar de pé, cartesiana milícia enfileirada, obediente filha da pauta? Por que a poesia não pode ficar de quatro e se agachar e se esgueirar para gozar -CARPE DIEM!fora da zona da página? Por que a poesia de rabo preso sem poder se operar e, operada, polimórfica e perversa, não poder travestir-se com os clitóris e os balangandãs da lira? NOVELHA COZINHA POÉTICA Pegue uma fatia de Theodor Adorno Adicione uma posta de Paul Celan Limpe antes os laivos de forno crematório Até torná-la magra-enigmática Cozinhe em banho-maria Fogo bem baixo E depois leve ao Departamento de Letras Para o douto Professor dourar.

POEMA JET-LAGGED (trecho final) Escrever é se vingar da perda. Embora o material tenha se derretido todo, igual queijo fundido. Escrever é se vingar? Da perda? Perda? Embora? Em boa hora.

Poeta baiano, jornalista, publicitário, médico e letrista de várias canções populares, inclusive Ponteio que ganhou o 3º Festival da Música Popular Brasileira, da TV Record. É considerado um dos maiores letristas da nossa música. Participou do movimento Tropicálista e são célebres aas canções Miserere Nobis e Soy Loco por Ti, América.Publicou dois livros de poemas: Inquisitorial (1966) e Confissões de Narciso.

MUDANDO DE CONVERSA Não me venham falar de éticas Prefiro locomotivas Ou motivos loucos para ser feliz Prefiro vagões de urânio e feijão Atravessando o país Vendo o povo acenando lenços brancos (Campos férteis) Aos que vão sul a norte Leste oeste Trilhos novos, outros brasis E eu menino outra vez a dar adeus aos tempos da antihistória Quero sorrir das janelas de trens supersônicos Em trilhos magnéticos E novamente pensar que podemos alcançar as estrelas

MADRUGADAS DE NARCISO Encalho nas madrugadas as minhas velas em farrapos Sou eu mesmo os marinheiros Sou eu mesmo a cabotagem Sou eu quem traça os portos do roteiro E torna em desespero a bússola da viagem Naufrago nas madrugadas Mas eu mesmo me faço nadar em vão até as mais longínquas praias Sou eu a maresia, a calmaria e a tempestade Sou eu mesmo a terra à vista Inalcançável

OUTRAS CONFISSÕES Narciso se despe, é noite, estão ladrando os cães Os cães provavelmente ladrarão inteiramente a noite Enquanto a lua cheia obtura os dentes podres das canções Um traficante boliviano Diz alô de Amsterdã Um fracassado governante Diz alô num telegrama Tudo é ópio, para um ex-marxista Para um ex-espiritualista, tudo é transe. Tudo é provisoriamente eterno para os poetas Tudo é eternamente provisório para os amantes E o poema apenas a configuração do instante

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