saramela revista quadrimestral da APAP
Tritãomarmorado O maior dos nossos tritões Codornizes de Cabo Verde Um relato de campo Alcaravão Um visitante discreto Limpeza Florestal Boas práticas e obrigações NÚMERO 6 | DEZEMBRO 2017
Editorial Nesta última saramela de 201 7 vamos olhar para um invulgar visitante que por estes dias surge nas dunas da nossa Paisagem Protegida Regional do Litoral de Vila do Conde e Reserva Ornitológica de Mindelo - o críptico Alcaravão. Como vem sendo hábito, olharemos também para um dos anfíbios que fazem parte da nossa fauna local. O Tritão-marmorado é o escolhido desta edição. Através de um relato de campo da autoria do Pedro Andrade, iniciamos uma nova rubrica da revista, que pretende dar a conhecer a biodiversidade outros locais, nacionais ou estrangeiros. Esta estreia faz-se com Cabo Verde, através do estudo das suas codornizes, cuja população ao evoluir de forma autónoma às populações de outros locais, pode ter algumas surpresas taxonómicas para nos revelar em breve. No fecho de um ano marcado por devastadores incêndios, o David Santos deixa-nos um conjunto de considerações sobre as boas práticas e obrigações associadas à Limpeza Florestal. Boa leitura! Pedro Martins Presidente da Assembleia Geral da APAP
ÍNDICE 4 6 10 18 20 16
saramela Revista da Associação Pé Ante Pé
Mensagem da Direcção Tritão-marmorado Codornizes de Cabo Verde Alcaravão Limpeza Florestal Referências Bibliográficas
Edição digital quadrimestral, gratuita Número 6 - Dezembro de 201 7
Nesta edição: Foto de Capa: Alcaravão (Burhinus oedicnemus) © Renato Bagarrão
Textos: David Santos, Pedro Andrade, Pedro Martins e Sidónio Silva
Fotos: David Santos, José Alves, Paulo Marta, Pedro Andrade, Pedro Martins, Renato Bagarrão, Rui Jorge e Sidónio Silva
Associem-se, participem, ajudem-nos a crescer! 2 | saramela
Contactos: saramela.apap@gmail.com apeantepe@gmail.com
Com uma perspectiva conservacionista, a saramela escreve-se em português, não seguindo o novo acordo ortográfico. Os artigos representam a opinião dos seus autores e não necessáriamente a da APAP / saramela.
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Carvalho-alvarinho (Quercus robur) | Foto: Pedro Martins
Mensagem da Direcção
Saida nocturna para observação de anfíbios na sequência de um workshop | Foto: Paulo Marta
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Workshop de construção de caixas-ninho com rolhas de cortiça, ministrado por Albano Silva
Caros Associados e Amigos,
A APAP ao longo deste ano de 201 7 desenvolveu o seu normal funcionamento dentro do âmbito e objectivos a que se propôs. Durante os doze meses do ano, no primeiro domingo do mês, decorreu a já habitual sessão de observação de aves no estuário do rio Ave, registando as espécies e criando empatia com as pessoas que procuram saber mais sobre as aves do nosso estuário. Na Ciência do Cidadão a APAP colaborou pelo terceiro ano consecutivo em três censos Nacionais: O censo da Águia-pesqueira, o Projecto Arenaria (contagem das aves costeiras) e também o Projecto Noctua (censo das rapinas nocturnas). Estas actividades estão abertas ao público. Se tiver curiosidade e quiser participar informe-se através da nossa página. Na vertente do pedestrianismo, desenvolvemos varias caminhadas ao longo do ano de 201 7. Relativamente à Educação Ambiental, foram várias as actividades desenvolvidas com Escolas do Primeiro Ciclo e Centros de Estudo. Guiando e dando a conhecer às crianças a importância de conhecermos e preservarmos a fauna e a flora da PPRLVCROM. O Viveiro da APAP é uma actividade à qual temos dedicado parte do nosso tempo. O resultado é positivo, dezenas de Árvores estão prontas para serem plantadas brevemente. Com o final do ano a aproximar-se a Associação Pé Ante Pé lança mais uma edição da sua revista digital saramela. Abordando como habitualmente vários temas, desde a fotografia de vida selvagem, a fauna e a flora, artigos científicos, entre outros. A revista é o espelho da Associação. Vale a pena ler! Não esquecendo a palavra Associativismo, apelando a que se associem à APAP para que nos tornemos uma Associação cada vez mais forte , resta desejar a todos um Próspero Ano de 201 8! Sidónio Silva Presidente da Direcção da APAP saramela | 5
Tritãomarmorado Triturus marmoratus
Apresentando em média cerca de 1 6 cm, o Tritão-marmorado é o maior dos tritões da Península-Ibérica. Em 2001 o seu congénere do Sul do país, de menores dimensões e considerado uma subespécie, foi descrito como uma espécie autónoma – Tritão-marmorado-pigmeu, ganhando Portugal mais uma espécie de anfíbio. Tal como as salamandras, os tritões integram o grupo dos urodelos, ou seja, os anfíbios que na vida adulta possuem cauda (por oposição aos anuros, nomeadamente sapos, relas e rãs). 6 | saramela
Uma vez que na nossa Paisagem Protegida não ocorre o Tritão-pigmeu, o Tritão-marmorado é inconfundível, com a sua pele granulosa verde e inúmeras manchas escuras. Os olhos são proeminentes na cabeça pequena e possuem pupila arredondada com íris dourada. A espécie apresenta dimorfismo sexual, sendo que a fêmea apresenta tipicamente uma lista dorsal avermelhada. O macho durante a época de reprodução desenvolve uma característica crista dorsal alta. Durante a época reprodutiva, que varia consoante a meteorologia, os tritões entram na chamada fase-aquática, concentrando-se em massas de água como charcos, tanques, poços, lagoas e rios de pouco caudal. No resto do ano é uma espécie terrestre, que habita os vários biótopos nas imediações das massas de água onde se reproduz. Tal como a generalidade dos anfíbios, os seus hábitos são predominantemente nocturnos e durante o dia refugia-se sob pedras e troncos, podendo também passar por um período de inactividade, em épocas de temperaturas muito elevadas e baixa humidade. Texto e Fotos - Pedro Martins
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DisponĂvel em apeantepe@gmail.com
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As Codornizes de Cabo Verde A Codorniz (Coturnix coturnix) é uma das aves mais curiosas do Paleárctico. Dentro dos grandes grupos de aves pertence aos galiformes, e dentro destes aos fasianídeos – é assim parente de outras aves conhecidas como as galinhas, pavões, faisões, perdizes e perus. Os fasianídeos são aves típicamente sedentárias, ocupando os mesmos territórios ao longo do ciclo anual. As codornizes são uma notável excepção, já que várias populações desta espécie euroasiática abandonam os seus locais de reprodução no final do Verão para viajar centenas ou mesmo milhares de quilómetros em busca de condição mais amenas em África, no Sul da Europa ou no continente indiano. Esta capacidade de migrar longas distâncias provavelmente favoreceu a colonização de outros locais onde podemos observar codornizes, nos arquipélagos da Macaronésia. Ao contrário da maior parte das populações migradoras do continente, as codornizes dos Açores, Madeira, Canárias e Cabo Verde são essencialmente sedentárias, presumivelmente tendo perdido a capacidade de migrar já que se reproduzem em locais onde o clima é ameno ao longo de todo o ano. 10 | saramela
De acordo com uma série de naturalistas antigos, dos quais o alemão Ernest Hartert (1 859-1 933) foi o pioneiro, estas populações têm uma série de características que justificam a sua classificação em subespécies distintas. Nos dias de hoje, isso deverá traduzir-se em medidas especiais de conservação para proteger estas aves endémicas. Mas, tendo-se recolhido muito pouca informação sobre todas estas populações desde o início do século XX até aos dias de hoje, será realmente justificado dizer que se tratam de entidades biológicas distintas? Conhecer melhor a biologia das populações insulares de Codorniz é assim objectivo de uma colaboração mantida entre o CIBIO e investigadores da Universidade de Barcelona. Tendo-se já realizado expedições às Canárias, Madeira e Açores, faltava a mais distante e exótica peça do puzzle: o arquipélago de Cabo Verde. Não tendo participado nas expedições anteriores, foi com muito prazer que fui chamado a assegurar a representação portuguesa nesta missão! A acompanhar-me tinha o Domingo Teijeiro, da Universidade de Barcelona e um dos maiores especialistas na espécie. Cabo Verde seria uma estreia para ambos.
Codorniz na Ilha do Fogo. Presentemente e enquanto ainda decorrem estudos, a nĂvel taxonĂłmico considera-se para o local a subespĂŠcie Coturnix coturnix inopinata. Foto: Pedro Martins
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Ao chegar a Praia, a capital de Santiago e do país, o calor abafado do final de Novembro assinalou o primeiro contraste com o final de Outono português. Depois foram as cores, o solo e a rocha escuros de basalto vulcânico, as acácias a dominarem a paisagem em volta da capital. Algumas aves familiares como a Garça-boieira, outras estranhas como o endémico Pardalda-Terra (Passer iagoensis), ou a Passarinha (Halcyon leucocephala), um grande guarda-rios de cabeça branca. E as codornizes, onde estavam elas?
Passarinha (Halcyon leucocephala) Foto: Pedro Martins
Pardel-de-Terra (Passer iagoensis) Foto: Pedro Martins
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Não era a primeira vez que fazíamos trabalho de campo com o objectivo de capturar e anilhar codornizes, mas é sempre difícil adivinhar o que se vai encontrar quando se visita um novo local. As nossas primeiras tentativas de contacto foram em volta da cidade da Praia, e tiveram pouco sucesso. A época das chuvas tinha acabado há cerca de uma mês, e por isso a vegetação estava muito seca, em especial do lado Sul da ilha de Santiago. Teríamos chegado tarde demais? Será que a época de reprodução já tinha acabado?
Codorniz (Coturnix coturnix inopinata) Foto: Pedro Andrade
No entanto, foi preciso esperar apenas pelo dia seguinte para termos sucesso – nos campos das montanhas do interior de Santiago, ainda húmidos e frescos, as codornizes eram comuns. Para a captura de codornizes usamos um aparelho para emitir regularmente sons de fêmea, o que atrai de forma muito eficaz os machos nãoemparelhados desejosos de encontrar uma parceira disponível. À nossa frente é estendida uma rede, na qual a codorniz fica depois presa. Por cada macho capturado foram registadas várias informações sobre a morfologia, cor e recolhidas
amostras para análise genética. E depois repetir mais uma vez. Chamariz. Macho a aproximar-se. Macho fugiu. Repetir mais uma vez. Chamariz. Macho a aproximar-se. Muita paciência, silêncio, a “fêmea” chama, o macho aproxima-se eU é capturado! Macho anilhado e informação recolhida. Macho devolvido à liberdade. Repetir mais uma vez. É tentador pensar que esta rotina será algo aborrecida, mas a verdade é que há algo no nosso lado mais primitivo que anseia pelo desafio destes jogos do gato-e-dorato. saramela | 13
É por isso que tanta gente gosta da fotografia ou observação de fauna selvagem, em particular de aves e outros animais que teimam em dificultar a tarefa de se deixarem observar. Para além deste aspecto de desafio, há também o prazer de estar em contacto íntimo com uma espécie de ave que é notoriamente difícil de observar, quanto mais tocar e dela tirar informação antes de regressar à liberdade. Mesmo para os biólogos que estudam a Natureza, os dias em que não estamos em frente a um computador a escrever, a analisar dados ou em reuniões são uma minoria, por isso estes momentos dificilmente se tornam aborrecidos.
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Embora continuássemos a visitar vários locais onde não se escutava qualquer codorniz, ao longo da visita a Santiago fomos gradualmente encontrando alguns locais promissores, sobretudo nas zonas de altitude intermédia onde ainda se encontravam as condições mais adequadas de temperatura e humidade para a ocorrência da espécie. Apesar de toda a zona costeira da ilha continuar bastante seca, do outro oriental da ilha foi possível encontrar alguns campos na periferia da cidade costeira de Pedra Badejo onde ainda se concentrava uma grande quantidade de machos à procura de fêmeas.
Codorniz (Coturnix coturnix inopinata) Foto: Pedro Martins
Após cinco dias em Santiago, foi altura de rumar ao nosso segundo destino nesta viagem, a ilha do Fogo. Esta ilha ganhou o nome pelo seu enorme vulcão ainda activo (a última grande erupção, em 201 4, engoliu até o recém-construído centro de interpretaçãoU). A curta distância para Santiago (cerca de 90 quilómetros) permite que a viagem seja feita numa agradável travessia de ferry por um mar que parece quase plano, acompanhados constantemente por cagarras e peixes-voadores. Ao fundo, lado-alado com o pôr-do-Sol, a majestosa vista do vulcão incentivou uma grande parte dos viajantes a manterem-se em pé junto ao mar durante a maior parte da viagem. Em São Filipe, a capital do Fogo, juntaram-se a nós membros da equipa do Parque Natural do Fogo, cuja ajuda foi preciosa para rapidamente encontrarmos locais onde a codorniz era abundante – ao contrário de Santiago, que percorremos de forma bastante extensiva, no Fogo praticamente não saímos das imediações da capital. Para isto ajudou a elevada abundância da espécie nos campos da ilha do grande vulcão, que localmente será tão elevada como em alguns dos locais onde ocorre com maior frequência nas áreas continentais.
Para ter alguma comparação, em 1 5 minutos em São Filipe apanhamos mais codornizes do que as que se apanham num bom dia de capturas no Sul de Portugal, onde elas são mais abundantes no nosso paísU Pelo meio tivemos algumas oportunidades de falar com agricultores e recolher algumas impressões sobre as codornizes do Fogo, nomeadamente os contactos com ninhos e a ainda comum (apesar de já ilegal) prática de capturar codornizes com armadilhas artesanais.
Habitat de Codorniz na Ilha do Fogo Foto: Pedro Andrade
Vulcão do Fogo Foto: Pedro Martins
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Nephila senegalensis Foto: Pedro Andrade
Infelizmente só passamos dois dias no Fogo, e rapidamente voltámos a Santiago (a visita ao maior vulcão activo do Atlântico fica para outra alturaU). Nesta segunda ronda à maior ilha do arquipélago aproveitamos para procurar codorniz noutras zonas da ilha, aproveitando para conhecer zonas como a Serra da Malagueta ou o planalto da Assomada, e continuar a recolher a informação sobre a população de codorniz. Pelo meio dos dias de trabalho do que foi uma semana e meia muito focada deu também para conhecer um pouco do que mais a pequena parte de Cabo Verde que visitamos tem para oferecer: a simpatia dos cabo-verdianos, as gigantes aranhas do género Nephila, a imponente omnipresença da Passarinha, as simples mas deliciosas cachupa e moreia frita, o ritmo de vida bem mais descontraído, os impressionantes vales de SantiagoU Muito para explorar numa próxima visita! Texto - Pedro Andrade
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Cidade Velha - Ilha de Santiago | Foto: Pedro Martins
Alcaravão Burhinus oedicnemus
Foto: Renato Bagarrão
Tal como já tinha ocorrido no Inverno do ano anterior, tivemos por estes dias na Paisagem Protegida a visita de uma espécie invulgar pelas nossas paragens - o Alcaravão. No nosso país é uma espécie residente e ainda que nidifique em baixo número no interior Norte e Centro, a grande percentagem da sua população encontra-se a Sul do Tejo. No Inverno observam-se algumas movimentações da espécie, que forma bandos e existe um reforço da população, com indivíduos que fogem aos rigores do Inverno no Norte e Leste da Europa. 18 | saramela
Ao contrário da maioria das limícolas, o Alcaravão não está associado às massas de água, mas antes a zonas relativamente planas e de vegetação rasteira, com poucas ou nenhumas árvores, onde exista boa visibilidade e poucos obstáculos para a corrida. Na Paisagem Protegida, as dunas interiores correspondem ao local mais propício para a observação desta espécie. Com hábitos crepusculares, sobretudo fora do período de nidificação, possui mesmo durante o dia uma apurada visão. Paralelamente a sua plumagem acastanhada permite-lhe uma excelente camuflagem, pelo que é uma ave esquiva que escapa com facilidade ao olhar do observador menos atento, o que acentua ainda mais a sua aparente raridade.
Foto: José Alves
Foto: Rui Jorge
Em Portugal a espécie apresenta um estatuto de conservação desfavorável (VU – Vulnerável) sendo a principal ameaça a perda de habitat, sobretudo decorrente da intensificação das monoculturas cerealíferas, da conversão da agricultura de sequeiro em regadio, mas também da construção de vias rodoviárias e grandes empreendimentos hidráulicos. Texto - Pedro Martins saramela | 19
Carvalho-alvarinho (Quercus robur) | Foto: Pedro Martins
Limpeza Florestal
Acerca dos fogos florestais ouviu-se falar muito em limpezas de matos e limpeza de terrenos e, até mesmo de limpeza de áreas florestais. O conceito de limpeza pode depender de um padrão que pode ter pequenas variações; a limpeza de um bloco operatório de um hospital e a limpeza de uma cozinha não são exactamente a mesma coisa. Quando se fala de limpeza de matas ou terrenos florestais não se imagina a mesma coisa que os dois exemplos acima. 20 | saramela
Limpeza de matos
A Direcção Geral de Florestas em nos seus Boletim de Estudos nº 31 8 e nº 322 de 2002 e 2003 definia limpeza de matos como o “(U) controlo da vegetação arbustiva e herbácea espontânea (U)” e fazia o alerta para que “(U) A vegetação espontânea integra a flora natural, fornecendo abrigo e alimento a uma grande diversidade de fauna, contribuindo deste modo para a riqueza (U) Este aspecto deve ser tomado em conta, limitando as intervenções ao mínimo indispensável. (U)” Este documento visava a informação dos proprietários e com o fim de enriquecer todas as vertentes florestais, sejam as ambientais, sejam as económicas. É ainda no mesmo documento que se pode ler mais em detalhe algumas técnicas de limpeza. Sendo elas manuais, ou mecanizadas, mas nunca recorrendo a herbicidas. Na preparação de um terreno para uma arborização é referido que não se deve destruir a totalidade da vegetação sob pena de expor o solo ao arrastamento de matéria orgânica e a alterações nas camadas do solo tornando-o infértil; e numa primeira fase após a plantação, não proteger as plantas novas. Depois de arborizada a área devemse proceder a limpezas apenas em
arborizações destinadas à produção intensiva de madeira, e apenas o indispensável para que as plantas jovens possam desenvolver – o que corresponde aos primeiros anos. É feito a salvaguarda sobre o risco de incêndio e neste caso defende-se que a limpeza seja feita apenas nas periferias da área. Os métodos sugeridos para a limpeza destas áreas arborizadas por intervenção humana são a sacha junto do pé da árvore; o pastoreio controlado por gado bovino após a altura das árvores atingir os 1 ,20 m; o desrame – retirada de ramos vivos ou mortos da parte inferior da copa, criando um descontinuo entre a vegetação herbácea e arbustiva, e a copa; a poda com objectivos diferentes do desrame; o desbaste – abate de algumas árvores para permitir reduzir a densidade e facilitar o crescimento de outras, privilegiando o crescimento em largura. É ainda sugerido que a época ideal para efectuar as limpezas é após a passagem do período chuvoso entre o Outono e a Primavera de acordo com o local.
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Obrigações do Sistema Nacional incêndio tenha dificuldade em se de Defesa da Floresta Contra propagar, para criar oportunidade Incêndios para o combate, e de reduzir a À data deste texto o Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios está descrito na Lei nº 76/201 7 de 1 7 de Agosto de 201 7, que é uma alteração a uma série de Decretos-lei anteriores. Do seu texto resultam algumas definições dos quais se destaque a gestão de combustível – é a criação e manutenção da descontinuidade horizontal e vertical da carga combustível nos espaços rurais, através da modificação ou da remoção parcial ou total da biomassa vegetal; e rede de faixas de gestão de combustível – o conjunto de parcelas lineares de território, estrategicamente localizadas, onde se garante a remoção total ou parcial de biomassa florestal, com o objetivo principal de criar oportunidades para o combate em caso de incêndio rural e de reduzir a suscetibilidade ao fogo. A modificação e remoção de biomassa vegetal pode ser interpretada como limpeza. Como também se pode ler esta pode ser parcial ou total. O que é preciso é criar uma descontinuidade, ser óbvio onde as plantas estão muito próximas e onde estão afastadas de forma a que a chama de um 22 | saramela
vulnerabilidade ao fogo. Para esse objectivo pode ser usado o pastoreio, corte, e a remoção, empregando as técnicas mais recomendadas com a intensidade e frequência adequadas. Como acima foram referidas algumas das técnicas recomendadas não vale a pena repetir. Da mesma lei vem as faixas de gestão de combustíveis definidas ao longo da rede viária, ferroviária, de transporte e distribuição eléctrica e de transporte de gás natural (gasodutos). Nestes deve haver limpeza numa faixa de 1 0 m a partir do limite exterior, para a rede viária, ferroviária e distribuição eléctrica de alta tensão, 7 m para a rede de média tensão e 5 m para os gasodutos. As faixas de gestão de combustíveis para os donos dos terrenos, arrendatários, usufrutuários dos mesmos, que tenham edifícios em espaços rurais correspondem a uma largura não inferior a 50 m, medida a partir da alvenaria exterior do edifício, sempre que esta faixa abranja terrenos ocupados com floresta, matos ou pastagens naturais e numa largura entre 1 0 e 50 m para terrenos agrícolas, pomares ou similares.
com outras tipologias (e.g. terrenos agrícolas e pomares). Os trabalhos nestas devem decorrer entre o final do período crítico do ano anterior, usualmente 30 de Setembro e 30 de Abril de cada ano.
Exemplo de boa limpeza para gestão de faixas de combustível
Adaptado de Esquema de faixa de gestão de combustível em casas isoladas – Fonte ICNF
Adaptado de Esquema de faixa de gestão de combustível em aerogerador – Fonte ICNF
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Limpeza de margens de rios
Os cursos de água, rios, ribeiros, regatos, linhas de água temporárias podem ou não estar dentro da floresta. A vegetação das suas margens é de preservar. A largura das margens pode variar, nas zonas onde se sente a influência das marés a margem é de 50 m, no troço médio do rio é de 30 m e nas zonas mais próximas da nascente é de 1 0 m. Os rios Douro e Minho mantém a margem nos 50 m em território nacional, por serem navegáveis. A autoridade que actua na conservação e reabilitação da rede hidrográfica (rios e linhas de água) é a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), através dos Departamentos da Administração da Região Hidrográfica, com excepção dos rios Minho e Douro que são da competência da Autoridade Marítima e Portuária. Da documentação da APA sobre a limpeza e desobstrução das linhas de água vem que a limpeza da vegetação das margens não deve ser completa, não devem ser realizadas podas devastadoras e não deve haver corte total da galeria da vegetação ribeirinha e corte total do substrato arbustivo e herbáceo. Segundo estes documentos as limpezas têm como objectivo manter árvores e arbustos, não infestantes, nas margens; manter a vegetação 24 | saramela
As práticas acima descritas estão pensadas para a manutenção e preservação de habitats, de forma a tornar sustentável e menos vulnerável ao fogo as florestas. A lei não foi transcrita na integra e foram acrescentados exemplos que penso estarem dentro do espírito da lei. A publicação Princípios e Boas Práticas Florestais da Direcção Geral de Florestas tem muitos detalhes para a aplicação das técnicas aqui nomeadas e não dispensa consulta. Existe ainda um manual Gestão de Combustível para a Protecção de Edificações – Manual da responsabilidade da Autoridade Florestal Nacional que se aconselha consulta. Todos as fontes aqui citadas e compiladas estão disponíveis ao público por pesquisa simples na internet.
Exemplo de ausência de limpeza, com excesso de combustível associado a espécies exóticas
Exemplo de má limpeza florestal, com corte integral de vegetação
As práticas acima descritas estão pensadas para a manutenção e preservação de habitats, de forma a tornar sustentável e menos vulnerável ao fogo as florestas. A lei não foi transcrita na integra e foram acrescentados exemplos que penso estarem dentro do espírito da lei. A publicação Princípios e Boas Práticas Florestais da Direcção Geral de Florestas tem muitos detalhes para a aplicação das técnicas aqui nomeadas e não dispensa consulta. Existe ainda um manual Gestão de Combustível para a Protecção de Edificações – Manual da responsabilidade da Autoridade Florestal Nacional que se aconselha consulta. Todos as fontes aqui citadas e compiladas estão disponíveis ao público por pesquisa simples na internet. Texto e Fotos - David Santos
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Referências Bibliográficas
- Almeida, N. Ferrand et all. Anfíbios e Répteis de Portugal. Guias FAPAS. 2001 . - Cabral, M.J. et al. 2006. Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. Instituto da Conservação da Natureza, Lisboa, Portugal. - Direcção Geral de Florestas. Boletim de Estudos nº 31 8. 2002. - Direcção Geral de Florestas. Boletim de Estudos nº 322. 2003. - Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas. Disponível em icnf.pt - Lei nº 76/201 7, de 1 7 de Agosto de 201 7. Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios. - Mullarney, K., Svensson, L., Zetterström, D. & Grant, P. J. (2003). Guia de Aves. Assírio & Alvim, Lisboa. 400pp. - Portal Aves de Portugal. Disponível em avesdeportugal.info 26 | saramela
Observação de aves no Estuário ou na ROM sempre ao primeiro Domingo do mês!
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