saramela revista quadrimestral da APAP
Cucocanoro O traje do charlatão Áreas estuarinas Um olhar subaquático Um retrato histórico A floresta primitiva da Península Ibérica Pedestrianismo A trilhar pelos Açores NÚMERO 7 | ABRIL 2018
Editorial Em regra, na manhã do primeiro Domingo de cada mês reunimos-nos no Estuário do Ave para observarmos as aves que nos visitam. Apesar da poluição e da falta de cuidado com que o estuário é tratado por alguns, perante a passividade das entidades responsáveis, é inegável o seu valor ecológico, mas também histórico, com importantes registos que em muito enriquecem a ornitologia nacional, como os de Reis Júnior, sobretudo no produtivo ano de 1 931 . Quando a maré faz recuar as águas e expõe os bancos de vaza é a altura das aves se concentrarem para buscarem alimento, mas e o que se esconde sob a água? Nesta edição vamos "acompanhar" o biólogo Diogo Sayanda num dos seus mergulhos e conhecer este ecossistema. No passado mês decorreu a Assembleia Geral da APAP, onde foram prestadas contas e discutidas as propostas para o corrente ano, bem como eleitos os novos órgãos sociais da Associação. Nesta sessão foi ainda aprovada por unanimidade a atribuição do título de Associado Honorário da APAP ao Doutor Nuno Gomes Oliveira, pelo mérito ao nível da conservação e divulgação da natureza. É uma honra termos o Doutor Nuno connosco, seja bem vindo! Pedro Martins Presidente da Assembleia Geral da APAP
ÍNDICE
saramela Revista da Associação Pé Ante Pé
4 Mensagem da Direcção 6 Cuco-canoro 1 2 Áreas estuarinas 26 A floresta nativa da Península Ibérica 32 Pedestrianismo - Açores 40 Referências Bibliográficas
Edição digital quadrimestral, gratuita Número 7 - Abril de 201 8
Nesta edição: Foto de Capa: Gastrópode Calliostoma zizyphinum © Diogo Sayanda
Textos: Conceição Pedro, David Santos, Diogo Sayanda, Pedro Andrade, Pedro Martins e Sidónio Silva
Fotos: Armindo Ferreira, Conceição Pedro, Diogo Sayanda,
Hugo Ribeiro::Maldatesta, José Alves, Pedro Martins e Sidónio Silva
Associem-se, participem, ajudem-nos a crescer! 2 | saramela
Contactos: saramela.apap@gmail.com apeantepe@gmail.com
Com uma perspectiva conservacionista, a saramela escreve-se em bom português, não seguindo o novo acordo ortográfico. Os artigos representam a opinião dos seus autores e não necessáriamente a da APAP / saramela.
Mesa da Assembleia Geral
Presidente - Pedro Martins Secretário - Pedro Andrade Vogal - João Azevedo Direcção
Presidente - Sidónio Silva Tesoureiro - Cristiana Carvalho Secretário - Cláudio Maia Conselho Fiscal
Presidente - Albano Martinho Secretário - Patrícia Martins Relator - David Santos
Galinha-d'água (Gallinula chloropus) | Foto: Pedro Martins
Órgãos Sociais da APAP para o mandato 2018/20
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Mensagem da Direcção
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Aspecto do viveiro da APAP nas instações do MADI em Azurara e plantio de bolotas com a colaboração dos utentes do MADI
Caros Associados e Amigos, No passado dia 1 6 de Março decorreu a Assembleia Geral da APAP, onde foram eleitos os novos órgãos sociais para o triénio 201 8/2020, cujas listas ainda que baseadas na continuidade com o anterior projecto, foram reforçadas por um novo conjunto de membros. Será com muita honra e empenho que trabalharemos em prol dos objectivos da APAP. Desta forma prevemos alcançar as actividades apresentadas no Programa e Orçamento de 201 8, com enfoque na observação mensal de aves no Estuário do Ave; na ciência do cidadão, nas acções de sensibilização ambiental, incluindo como já é habitual as escolas e centros de estudos, e alargando as mesmas ao nosso mais recente parceiro, o MADI de Vila do Conde. Na vertente do pedestrianismo serão realizadas várias caminhadas ao longo do ano. O projecto que estava em curso relativamente ao viveiro de plantas autóctones sofreu no início do ano um tremendo avanço através da assinatura de um protocolo de colaboração entre a APAP e o MADI, que gentilmente nos cedeu um espaço físico e todo o apoio para a sua manutenção. É nossa expectativa que no próximo Inverno consigamos promover algumas intervenções na Paisagem Protegida, onde num projecto piloto faremos erradicação de espécies exóticas e a sua substituição por espécies nativas crescidas no nosso viveiro. Deixando um especial agradecimento a todos os Associados e Amigos que nos acompanham, até breve! Sidónio Silva Presidente da Direcção da APAP saramela | 5
Cucocanoro O traje do charlatão De entre todas as espécies de aves que habitam o nosso país, poucas serão tão “trapaceiras” como o cuco (Cuculus canorus). O seu estilo de vida parasítico é bem conhecido. Em vez de fazerem os seus próprios ninhos e cuidarem das crias, a fêmea de cuco deposita um ovo no ninho de um casal de outra espécie de ave, que terá a árdua tarefa de alimentar a esfomeada e (geralmente maior) cria alheia. Ainda pior, a cria de cuco geralmente sacrifica os irmãos adoptivos, de forma a garantir que não terá que competir pelo alimento fornecido pelos pais. Para os leitores mais impressionáveis, recordamos que este é um comportamento instintivo desta espécie, pelo que não devemos atribuir juízos de valor moral às acções do cuco[ 6 | saramela
Mas não é só no comportamento que o cuco se revela uma ave enganadora. Os naturalistas mais atentos já terão notado que a plumagem do cuco tem um padrão de cores muito semelhante ao de uma ave de rapina, o gavião (Accipiter nisus), que também por coincidência (ou se calhar até não) tem um tamanho semelhante ao do cuco. No caso do gavião o padrão serve como forma de se confundir com as sombras da floresta e assim enganar as pequenas aves que são suas presas. O cuco por sua vez alimenta-se de insectos, por isso as suas cores não são camuflagem para se esconder das presas – a plumagem do cuco é uma forma de assustar as outras aves, fingindo-se de gavião para poder ter tempo de deixar o seu ovo no ninho alheio!
Rouxinol-pequeno-dos-caniรงos (Acrocephalus scirpaceus) a alimentar uma cria de Cuco-canoro (Cuculus canorus) | Foto: Armindo Ferreira
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Cuco-canoro (Cuculus canorus) Foto: Hugo Ribeiro::Maldatesta
Há já vários estudos que sugerem este cenário. Normalmente desenhase uma experiência na qual se regista a resposta de pequenas aves a maquetes de gavião, cuco e uma terceira espécie tida como “inofensiva” pelas pequenas aves. Na maior parte dos casos, as aves tendem a fugir quando expostas a maquetes de gavião e cuco, e a não reagir a maquetes de outras aves de porte semelhante, como a rola. 8 | saramela
Da perspectiva de um pisco, na dúvida mais vale fugir[ erro que pagará caro com a possível perda da ninhada. Algumas das espécies mais parasitadas, como o rouxinolpequeno-dos-caniços (Acrocephalus scirpaceus), aprenderam com o tempo a “afinar os olhos”, e apenas são enganados pelas cópias mais perfeitas, atacando os cucos que se desleixam no disfarce.
Texto - Pedro Andrade
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Gavião (Accipiter nisus) | Foto: José Alves
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DisponĂvel em apeantepe@gmail.com
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Áreas Estuarinas Por definição, uma zona húmida natural é um ecossistema complexo com uma dinâmica peculiar resultante da interação entre espécies típicas de meio aquático e terrestre. Estes ecótonos surgem da presença de um corpo de água parada, ou com fluxo lento, permanente ou temporário (como um charco, um paul, um lago, uma planície de aluvião, ou um estuário) e zonas terrestres naturais que se distribuem na sua envolvente. O corpo de água sustém espécies tipicamente aquáticas, ou as fases aquáticas de espécies anfíbias, ou terrestres e a área envolvente inclui espécies tipicamente terrestres que interagem com as espécies aquáticas num conjunto relações complexas e dinâmicas.
A navalheira (Necora puber) é um crustáceo típico de zonas rochosas muito comum em toda a nossa região costeira. Nos estuários está presente em recifes rochosos naturais ou artificiais com enclaves, ou fissuras onde os indivíduos se podem refugiar.
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A biodiversidade associada às zonas húmidas deve-se à combinação de variados fatores como o facto de incluírem um reservatório de água superficial que é utilizado como bebedouro por inúmeras espécies, mas sobretudo por serem alimentadas por escorrências de superfície, ricas em nutrientes orgânicos e inorgânicos, que permitem o estabelecimento de abundantes comunidades de plantas aquáticas, anfíbios, peixes e invertebrados aquáticos que, por sua vez, constituem a base da teia trófica destes sistemas e sustentam um grande número de outras espécies. Dentro dos diferentes tipos de zonas húmidas, os estuários são um dos sistemas mais produtivos existentes no planeta. Nestes sistemas ocorre o encontro de massas de água ricas em nutrientes e matéria orgânica provenientes de escorrências e, ou, ressurgências de origem terrestre, com massas de água provenientes de meio marinho. Deste encontro forma-se uma zona naturalmente eutrófica rica em fitoplâncton e onde ocorrem comunidades extremamente produtivas de plantas halófilas, como o sapal, de fanerogâmicas marinhas e de macroalgas. saramela | 13
A produtividade dos bancos de fanerogâmicas marinhas que ocorrem nas zonas estuarinas coloca estes ecossistemas nos lugares cimeiros da lista dos ecossistemas costeiros mais produtivos que se conhecem no planeta. A grande importância destas áreas estende-se muito para além dos locais onde ocorrem, sendo importantes zonas de maternidade, reprodução e alimentação para inúmeras espécies de fauna marinha e terrestre. A utilização dos bancos de fanerogâmicas marinhas como área de reprodução e maternidade beneficia da abundância de alimento que ocorre naturalmente nestas áreas e, no caso das espécies marinhas beneficia ainda de dois fatores: a abundância de abrigo, e o facto de o gradiente salino presente nos estuários limitar a incursão para montante de espécies potencialmente predadoras de juvenis e posturas. Para as aves, os bancos de sapal são importantes áreas de nidificação não só pelo tipo de vegetação, mas também por terem uma estrutura em mosaico, formando ilhas e portanto áreas naturalmente protegidas de predadores. Os estuários presentes em Portugal continental, pela sua latitude e posição privilegiada em relação ao Norte da Europa e Norte de África, têm uma enorme relevância para a conservação de aves migradoras que aproveitam o 14 | saramela
nosso clima mais ameno e abundância de alimento presente nos nossos estuários para aí passar o Inverno e, ou, para nidificar. Para os anfíbios, o limite montante dos sapais constitui um habitat ideal, já que existe grande disponibilidade de abrigo e abundância de alimento para adultos, juvenis e substrato para efetuarem as suas posturas. A comunidade de insetos também é extremamente abundante e rica nos estuários sendo portanto um foco de atração e concentração de outras espécies que se alimentam destes artrópodes, como aves, morcegos e micromamíferos. Para além dos morcegos e micromamíferos podem encontrar-se diversos carnívoros como lontras e raposas.
O Dondice banyulensis é um representante de um grupo de gastrópodes bastante peculiar, os nudibrânquios. Estes animais usualmente são pequenos 2-3cm, apresentam cores vivas e as suas brânquias localizam-se na zona dorsal perto da extremidade posterior do corpo. Esta espécie é muito comum nas nossas águas costeiras e estuarinas podendo ser encontrada até próximo dos 40 m de profundidade e, à semelhança de outros nudibrânquios, esta espécie alimenta-se de hidrozoários cujas toxinas acumula.
Ao contrário de muitas outras espécies de nudibrânquios, a Spurilla neapolitana não apresenta cores fortes. Aliás, o seu padrão de coloração conferelhe algum mimetismo no ambiente em que geralmente ocorre. No entanto, esta espécie alimenta-se de anémona verde (Amemonia viridis) e acumula as suas toxinas como forma de proteção contra predadores. A S. neopolitana é comum em toda a nossa área costeira a partir do limite inferior da maré.
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Como foi referido anteriormente, a base da grande riqueza presente nas regiões estuarinas, bancos de fanerogâmicas marinhas e sapais são as comunidades de macroinvertebrados. Estas são constituídas principalmente por três grandes grupos, os anelídeos, os artrópodes e os moluscos. Apesar de aparentemente simples e ”primitivos”, os anelídeos são um grupo extremamente evoluído e complexo sendo representado por algumas espécies altamente diferenciadas e especializadas, com cabeça bem desenvolvida, aparelho bucal, tentáculos, papilas sensoriais e olhos, têm pés adaptados a natação ou à deslocação livre no sedimento. A importância do tipo de estrutura utilizada para a locomoção e modo de vida dos anelídeos é tal que foram usada pelos taxonomistas para dividir o grupo em três classes: poliquetas, oligoquetas e hirudíneos (antigamente designados por aquetas). Os Poliquetas têm grande abundância de apêndices quitinosos que usam principalmente na sua locomoção, representam a maioria das espécies de anelídeos que se conhecem e são na sua grande maioria marinhos.
Os oligoquetas têm menor abundancia de apêndices quitinosos que usam na sua locomoção e a maioria das espécies ocorre em meio terrestre. Os hirudíneos não apresentam apêndices quitinosos especializados para a sua locomoção e são na sua maioria parasitas hematófagos (sanguessugas).
Os anelídeos, vulgarmente chamados "minhocas", apresentam o corpo segmentado em anéis que se prolongam para além da cabeça. A cabeça pode ser muito simples e quase indiferenciada ou apresentar elevada complexidade apresentando tentáculos quimiorrecetores, olhos primitivos e peças mandibulares de queratina rígidas. Internamente os anéis são muito simples e praticamente idênticos, ou seja, contêm exatamente os mesmos órgãos. A segmentação primitiva que se observa nos anelídeos é um dos primeiros passos evolutivos na direção da diferenciação da morfologia e fisiologia em partes distintas dos corpos dos organismos vivos. Se temos, mãos, pés braços, pernas, etc., é porque um antepassado nosso foi um organismo segmentado, cujos segmentos foram se especializando em funções diferentes ao longo da nossa história evolutiva. Os anelídeos, tal como, os restantes grupos mais primitivos são representantes atuais dos nossos antepassados mais longínquos. O género Eunice (representado na imagem) engloba espécies de grandes dimensões (2-3 m) que são detritívoros, ou predadores muito ativos e vorazes.
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A Zostera marina é uma das três espécies de fanerogâmicas presentes nos estuários de Portugal (Z. marina, Z. noltii e Cymodocea nodosa). Apesar de se assemelharem a gramíneas, como o escalracho comummente utilizado nos jardins, estas plantas pertencem ao grupo das plantas com flor, as angiospérmicas e a sua história evolutiva resultou de uma readaptação das plantas superiores ao ambiente aquático marinho.
Para a maioria de nós “minhoca” é um nome que associamos a um animal com capacidade limitada de se deslocar que vive enterrada na terra ou na areia. Contudo, o grupo dos poliquetas, que inclui a maioria das espécies, tem representantes com capacidade natatória, que se se deslocam a grande velocidade desafiando os predadores mais rápidos e vorazes. Na imagem pode ver-se um poliqueta nadador no momento em que passou em frente à boca de um caboz-da-areia (Pomatoschistus minutus).
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O camarão Periclimenes sagittifer é uma espécie muito comum nas nossas regiões costeiras e estuarinas. Surge geralmente associado à anémona-verde (Anemonia viridis) numa relação que se pensa ser comensal, ou simbiótica. O camarão beneficia da proteção dos tentáculos da anémona, pode eventualmente alimentar-se de restos das suas refeições. Por sua vez, a anémona, ou não é positivamente nem negativamente afetada pela presença do camarão (comensalismo), ou então pode beneficiar do “serviço de limpeza” prestado pelo camarão (simbiose).
O caranguejo-ermita da espécie Pagurus prideaux é relativamente comum nas regiões estuarinas e bancos de fanerogâmicas marinhas. O padrão amarelo com manchas rosa-choque que se observa pertence a uma anémona da espécie Adamsia palliata que envolve totalmente a concha ocupada pelo caranguejo-ermita. Os novelos de fios rosa que se vêem são segregados pela anémona e têm células urticantes que protegem o caranguejo de predadores. Em contrapartida, a anémona tem acesso aos restos das refeições do caranguejo.
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O camarão-comum (Palaemon elegans) é um crustáceo muito abundante nas nossas águas costeiras e estuarinas. Ocorre desde o limite inferior da maré-baixa até cerca de 40 m de profundidade. À semelhança de muitos outros crustáceos, os camarões-comuns incluem na sua dieta restos de matéria orgânica e animais mortos, contribuindo ativamente para a "limpeza" e manutenção dos fundos marinhos.
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O Caboz-da-areia (Pomatoschistus pictus) é um pequeno peixe (cerca de 6 cm) muito comum em zonas estuarinas. Apesar do seu tamanho, este pequeno peixe é um predador ativo de larvas e pequenos invertebrados. À semelhança de outros peixes presentes nas regiões arenosas, onde a disponibilidade de abrigo é reduzida, a camuflagem resultante do seu padrão de coloração é a sua principal defesa contra predadores.
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A cenoura-do-mar (Veretillum cynomorium) é muito comum nas regiões estuarinas. Este cnidário é comum em locais com fundos arenosos, onde permanece recolhido durante a maior parte do período diurno. Quando a luz ambiente é suficientemente baixa, distende o seu corpo, que frequentemente ultrapassa os 50 cm de comprimento, e pólipos absorvendo água do mar. Deste modo, esta espécie permanece protegida de potenciais predadores durante o período em que a maioria das espécies permanece mais ativa e aproveita os ciclos de migração noturna de plâncton, que durante a noite se emergem de águas mais profundas, para se alimentar. A cenoura-do-mar é mais um dos "corais moles" que ocorrem nas nossas águas costeiras.
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Entre os artrópodes presentes nas áreas estuarinas contam-se inúmeras espécies de decápodes (camarões e caranguejos) muito diversas e altamente especializadas em função do tipo de habitat onde ocorrem e alimento preferencial. A grande maioria das espécies de moluscos que integram a comunidade de macroinvertebrados dos sistemas estuarinos são gastrópodes com concha. Ocorrem também outras espécies, como os opistobrânquios e os bivalves, por vezes em grande número, entre as quais se encontram algumas com elevado valor económico como a ostra, a lambujinha, o berbigão, a conquilha e a ameijoa. As áreas estuarinas são alvo de elevada pressão antropogénica pelas seguintes razões: • Os estuários são portos naturais por estarem protegidos da ondulação marinha e portanto foram desde os primórdios da civilização, áreas ideais para o estabelecimento de centros populacionais. Assim, é comum verificar-se que grande parte das margens dos estuários foram regularizadas, drenadas e transformadas em zonas urbanas; • Poluição doméstica e, posteriormente, industrial; • Dragagem do leito estuarino para permitir a circulação de grandes navios de carga e extração de inertes resultou na alteração da hidrologia dos 22 | saramela
estuários e consequente perda de grande parte dos bancos de fanerogâmicas marinhas com consequências muito negativas para as comunidades estuarinas e regiões costeiras adjacentes aos estuários; • Apanha e extração de bivalves recorrendo a artes de pesca extremamente abrasivas, como a ganchorra, que em conjunto com a criação e aprofundamento dos canais de navegação resultaram no quase desaparecimento dos bancos de fanerogâmicas marinhas em praticamente todo o mundo; • Utilização de tributil-estanhos como anti-vegetativos nos anos 70 e 80 nos cascos dos navios resultou na mortalidade de populações de invertebrados e elevada contaminação do leito estuarino e teia trófica com metais pesados até aos dias de hoje; • O aumento da navegação transcontinental e transferência de águas de lastro dos navios provenientes de locais geograficamente afastados contribuiu para a introdução de espécies exóticas e agentes patogénicos nas regiões estuarinas, resultando no desaparecimento de populações de espécies autóctones. A orelha-do-mar (Haliotis tuberculata) é um gastrópode presente nas nossas águas costeiras e estuarinas a partir do limite da maré-baixa até aos 5-1 0 m de profundidade sendo mais comum nas regiões costeiras da Europa do Norte. A maioria de nós apenas as conhece pelas suas conchas em espiral que se assemelham a uma orelha. Apesar da simplicidade da sua concha, a orelha-do-mar é um animal bastante complexo, apresenta cabeça bem definida, com olhos bem desenvolvidos um par de tentáculos, um pé, e o limite do seu corpo apresenta uma textura enrugada com tentáculos menores, onde se encontram células sensíveis ao tato e vibrações. Esta espécie é herbívora alimentando-se principalmente de algas verdes. Tal como muitas outras espécies marinhas a orelha-do-mar ocorre em zonas costeiras pouco profundas e estuários e salientando a importância da preservação e boa gestão dos ecossistemas presentes nas áreas costeiras.
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O elevado estado de degradação dos sistemas estuarinos europeus e norte americanos é reportado desde a década de 1 970, a sua importância como “hot spots” de biodiversidade e reconhecimento da sua elevadíssima produtividade e valor económico deveriam estar na base do desenvolvimento de medidas de gestão adequadas que reanimassem estes sistemas e recuperassem a sua saúde, beneficiando também as comunidades selvagens que deles dependem de forma direta e indireta. A enorme capacidade de recuperação das áreas costeiras, como a que se verificou no Parque Marinho Luiz Saldanha, na Arrábida, é um importante facto que comprova como a implementação de algumas limitações, no que concerne ao tipo de artes de pesca e atividades profissionais e recreativas numa área costeira, podem ser acompanhadas de uma resposta quase imediata por parte da recuperação dos ecossistemas marinhos valorizando a área protegida e sua envolvente, beneficiando significativamente o setor da pesca profissional, restauração e turismo da natureza. Tendo em consideração a dinâmica e elevada produtividade dos sistemas estuarinos antevê-se que a aplicação de medidas restritivas e ações de beneficiação dos ecossistemas, à semelhança das aplicadas no Parque 24 | saramela
Marinho Luiz Saldanha, teria resultados ainda mais surpreendentes contribuindo muito significativamente para a sua valorização e para a recuperação da saúde das comunidades permitindo também reanimação e modernização de setores económicos que dela dependem.
Nephila senegalensis
Foto: Pedro Andrade
Os bancos de fanerogâmicas marinhas são uma importante área de reprodução de inúmeras espécies de invertebrados e peixes marinhos, que efetuam as suas posturas na superfície das folhas destas plantas marinhas. A beneficiação e preservação dos bancos de plantas marinhas apresenta elevado valor estratégico que resulta no aumento substancial da biomassa e riqueza de espécies marinas nos estuários e zonas costeiras adjacentes. Nesta imagem pode-se ver um ovo de choco com o seu conteúdo momentos antes da eclosão. Texto e Fotos - Diogo Sayanda
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A floresta nativa da Península Ibérica Um retrato histórico A floresta natural predominante do nosso território será o resultado de todas as florestas do passado. Na Península Ibérica já se desenvolveram florestas tropicais arcaicas, mangais com palmeiras, junto com plantas da família das sequoias, abetos, cedros (coníferas). Floresta de tipo subtropical sempreverde e vegetação subtropical que suporta regime de secura sazonal; floresta subtropical aberta com o desenvolvimento de comunidades de leguminosas, bem como florestas do tipo temperado, e estepes; bem como a Laurissilva. Sendo que esta última teve duas formas de desenvolvimento uma até aos 400 m de altitude e outra de altitude e húmida com influência marítima, como a que é possível observar na Ilha da Madeira e nas ilhas dos Açores. Portugal está dividido em termos de meteorologia em duas zonas. Segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) uma de clima temperado com Inverno chuvoso e Verão quente e seco e outra de clima temperado com Inverno chuvoso e Verão seco e pouco quente (classificação de 26 | saramela
Köppen-Geiger). No mapa bioclimático estão presentes as áreas de influência de dois bioclimas predominantes e ainda um terceiro bioclima de altitude nos maciços da Serra da Estrela, da Peneda-Gerês, Larouco, Montesinho, Açor, Marão e Montemuro. A floresta nativa do território que é hoje Portugal será a evolução da floresta que sobreviveu às glaciações, sendo que a última terá ocorrido há cerca de 1 3.000 anos. A floresta com a predominância do género Quercus, que é o género dos carvalhos, azinheiras e sobreiros terá ocorrido pela primeira vez há cerca de 1 2 milhões de anos. Os bosques de tipo temperado com a predominância da tribo dos carvalhos Querceae: carvalhoalvarinho (Quercus robur) na região Norte vertentes atlânticas, locais húmidos e solos profundos; carvalho-negral (Quercus pyrenaica) nas vertentes continentais. O carvalho-cerquinho (Quercus faginea), levanta algumas considerações devido há existência de três subespécies uma a Q. faginea faginea mais abundante no Nordeste do território onde é
Montado de sobro em Barrancos | Foto: Pedro Martins
Florestas e vegetação há 5 Milhões de anos adaptado de J.S. Carrión et al in “ The historical origins of aridity and vegetation degradation in southeastern Spain”
é dominante em bosques entre os 250 m e 850 m de altitude, a Q. faginea broteroi mais abundante no Centro e Serras Algarvias a altitudes abaixo dos 250 m e a Q. faginea alpestris específico da Serra do Caldeirão à roda dos 350 m de altitude, onde pode ou não ser dominante; a azinheira (Quercus rotundifolia) – essencialmente na metade interior do território; de
sobreiro (Quercus suber) – ocupando a área de influência atlântica. Embora não seja consensual se a presença de sobreiro na metade Norte do território tenha ocorrido de forma natural ou pela acção do Homem. Existindo ainda da mesma família a carvalhiça (Quercus lusitanica) – de porte arbustivo e ocorrente na metade litoral do país. saramela | 27
Adaptado de IPMA
Na zona de clima com Verões pouco quentes, os bosques têm também a presença de: castanheiros (Castanea sativa) em souto (para exploração do fruto) ou em castinçais (para exploração da madeira) e, embora seja autóctone, os indivíduos da actualidade são o resultado da acção do Homem; o 28 | saramela
resultado da acção do Homem; o azevinho (Ilex aquifolium); a aveleira (Corylus avellana); os bordos ou áceres (plátanos-bravos e zelha) (Acer pseudoplatanus, A. monspessulanum); o medronheiro (Arbutus unedo), ainda que presente em todo o território; a cerejeira-brava (Prunus avium); pereiras-bravas (Pyrus cordata) ou (Pyrus pyraster) ainda que com reservas sobre a separação destas espécies; o pilriteiro (Crataegus monogyna), o lentisco (Phyllirea angustifolia) ainda que presente em todo o território; e com elementos da Laurissilva como o azereiro (Prunus lusitanica) e o loureiro (Laurus nobilis) este último mais abundante a nesta região. Na zona de clima com Verões quentes, os bosques têm a presença da: pereira-brava ou catapereiro (Pyrus bourgaeana); zambujeiro ou oliveira-brava (Olea europaea var sylvestris) ainda que exista a variedade europea como planta cultivada para produção de azeite; alfarrobeiras (Ceratonia síliqua) que pelo facto de ser também cultivada levanta questões sobre o seu estatuto de pureza genética; murta ou murteira (Myrtus communis) frequente em linhas de água temporárias; e com o elemento da Laurissilva, o samouco (Myrica faya) que deverá ser resultado de uma reintrodução.
Galeria ripícola com Freixo, Amieiro e Carvalho-alvarinho em Terras de Bouro | Foto: Pedro Martins
Nas zonas mais húmidas, ao longo dos cursos de água surgiram florestas ripícolas, com espécies como o freixo (Fraxinus angustifolia), o amieiro (Alnus glutinosa), os salgueiros (Salix atrocinerea, Salix salvifolia), o choupo-negro (Populus nigra) e o choupo-branco (Populus alba), o loendro (Nerium oleander). Nas zonas mais montanhosas temos também a presença de tramazeira (Sorbus aucuparia) e o mostajeiro (Sorbus torminalis). Os pinhais actuais sejam eles de pinheiro-bravo (Pinus pinaster), pinheiro-manso (Pinus pinea) ou pinheiro-de-casquinha (Pinus sylvestris) levantam dúvidas sobre a sua origem.
Nos estudos de polén do passado da Península Ibérica indicam que o género Pinus dominou os Pirenéus há cerca de 40 milhões de anos. Os pinhais litorais de pinheiro-bravo aparecem bem documentados nos estudos do século XII. As características de espécie pioneira e adaptável a solos pobres permite uma difusão extensa e possivelmente o acelerar da sua zona de distribuição natural no passado, uma vez que o Homem desde há 7.000 anos que altera a floresta natural e o que conhecemos na actualidade é também resultado de uma intensa reflorestação no século XIX. saramela | 29
Os pinhais de pinheiro-manso (Pinus pinea) ocupariam largas extensões a sul do Rio Tejo pela mesma época e é possível que sejam resultado de germinação espontânea, uma vez que estudos de pólenes na bacia de Santo André apontam para que o género Pinus fosse abundante nessa área desde há 1 0.000 anos. Os pinhais de pinheiro-de-casquinha terão origem natural na zona do Parque Nacional Peneda-Gerês ainda que mesmo nessa zona tenha existido replantação de árvores dessa espécie. A sua presença no resto do território deve-se à acção do Homem, embora sendo uma espécie de altitude e por isso está restrito às zonas mais montanhosas. 30 | saramela
Bosque misto de Carvalho-alvarinho e Pinheiro-de-casquinha em Paredes de Coura | Foto: Pedro Martins
Não se pretendia ser exaustivo neste breve esboço sobre as espécies nativas ou mesmo sobre todas os habitats florestais do território Continental. Ficaram de fora os zimbrais, urzais, giestais, tojais, matagais, prados, charnecas, pauis só para citar alguns. O conceito de floresta pristina, intocada pela acção do Homem, não existe em Portugal. Desde há 7.000 anos que se promove desflorestação na Peninsula Ibérica O registro palinológico mostra aumento na área de herbáceas associada ao desmatamento nas montanhas da Sierra de Queixa – Ourense, assim por volta de 2.700 anos atrás, uma floresta carvalhos e bétulas de montanha foi destruída nessa área e o impacto humano atingiu o máximo nos últimos 1 .000 anos. O reconhecido botânico Prof. Jorge Paiva afirmava em 2006 que: “Por destruição dessas florestas, particularmente com a construção das naus (três a quatro mil carvalhos por nau) durante os Descobrimentos (cerca de duas mil naus num século) e da cobertura do país com vias férreas (travessas de madeira de negral ou de cerquinho para assentar os carris), as nossas montanhas passaram a estar predominantemente cobertas por matos de urzes ou torgas, giestas, tojos e carqueja.” Texto - David Santos
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Montanha do Pico (2351 m) na Ilha do Pico
Pedestrianismo A "trilhar" pelo Faial, São Jorge e Pico
Quando me foi proposto partilhar uma experiência relacionada com Caminhadas, atividade que pratico há alguns anos, senti que devia falar sobre aquela que me veio à mente no momento - o "Triângulo" dos Açores. Longe de ser perita na matéria, até porque ainda só lá fui uma vez e aquele arquipélago tem tanto para nos oferecer, os dias vividos nas ilhas do Faial, São Jorge e Pico foram, sem dúvida, memoráveis. 32 | saramela
Se juntarmos à beleza natural, cinco excelentes companheiros com o mesmo interesse por caminhar e gosto pela natureza e a simpatia das gentes daquelas ilhas, reuniram-se os ingredientes para uma experiência inesquecível. Apesar de termos viajado no mês de Julho, as condições meteorológicas nos Açores são instáveis e dado o mau tempo que se fazia sentir nas ilhas o voo atrasou-se e a bagagem teve que ficar retida no aeroporto de Lisboa para viabilizar maior carregamento de combustível. De facto, em vez de aterrarmos no Faial como estava previsto, aterramos na ilha do Pico, onde, apesar da chuva e nevoeiro, as condições eram um pouco melhores.
Serviu a experiência para me ensinar que o mau tempo é efémero nos Açores. Tal como chovia aquando da nossa chegada, ainda nessa manhã, quando fizemos a travessia de barco para o Faial, já o sol dava o ar da sua graça e manteve-se. Estas três ilhas são conhecidas como as "ilhas do triângulo" pelo facto da sua localização se assemelhar geometricamente a um triângulo no meio do oceano. Juntamente com a Graciosa e a Terceira constituem o Grupo Central do arquipélago dos Açores, tão próximas, mas tão particulares e diferentes entre si.
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Faial
Chegados ao Faial (cidade da Horta), após a ligação de barco do Pico (Madalena), com duração de cerca de 30 minutos, atrasados por relação ao programa delineado e sem bagagem, tínhamos alguns motivos para o desânimo. Em vez disso, partimos motivados em busca do trilho da Caldeira do Cabeço Gordo (ponto mais alto da ilha a 1 043 m), que faz depois a ligação ao vulcão dos Capelinhos, através de um trilho de 21 km, passando por 1 0 vulcões. A caldeira do Faial é magnífica, desde logo avistada do miradouro. Mas contorna-la, percorrendo os seus 7 km, é bem mais gratificante. E que belas vistas se tem para a vizinha montanha do Pico. 34 | saramela
Um final de tarde e noite mais citadino passando pela bela Marina da Horta, pela bonita praia de Porto Pim e terminar com um Gin Tónico no Peter SportCafé quando as ruas de uma cidade, aparentemente tão calma, se enchem de gente a festejar a vitória de Portugal na final do Campeonato Europeu de Futebol, foi a cereja no topo do bolo.
Pico, visto da Caldeira do Cabeรงo Gordo
Caldeira do Cabeรงo Gordo
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São Jorge
Ao contrário das minhas expectativas, a ilha de São Jorge foi a que mais me surpreendeu. Tratase de uma ilha comprida e estreita, com uma cordilheira no centro e com inúmeras Fajãs, que são pequenas planícies resultantes do abatimento de falésia, que se prolongam pelo mar. Acessível apenas através de trilho pedestre, a Fajã da Caldeira de Santo Cristo foi a que mais me marcou pela sua beleza e tranquilidade. Composta por pequenas casas dispersas, com uma igreja que sobressai pela sua simplicidade e localização, sem eletricidade, apenas com recurso a geradores, com ruas de terra batida, salpicada de flores de várias cores e diferentes tonalidades de verde da imponente encosta, é sem dúvida uma maravilha da natureza. De salientar também a sua bela lagoa, onde demos um mergulho refrescante e onde são recolhidas as famosas ameijoas, que conferem uma maior singularidade a esta fajã.
Seguindo caminho por um magnífico trilho junto ao mar, fomos até à Fajã dos Cubres onde tivemos oportunidade de saborear o doce tradicional e mais emblemático de São Jorge – as Espécies. O recheio é feito com recurso a especiarias, característica que deu origem ao nome. Junto à Fajã do Ouvidor descobrimos um paraíso escondido por grandes rochedos vulcânicos, a Poça Simão Dias, imperdível para quem aprecia um belo banho de mar em águas profundas e cristalinas. Não posso deixar de falar de São Jorge sem fazer uma breve alusão às lapas grelhadas e ao seu queijo, confecionado a partir do coalho de leite de vaca inteiro e cru, com um peso que pode atingir os 1 2 kg e àquele que nos deu a provar estas iguarias. Um simpático e prestável motorista de táxi, que tivemos a sorte de contratar na chegada à ilha e que passou a transportar-nos desde então nos diferentes percursos. Bem haja Sr. José. saramela | 37
Pico
E eis que chega o dia mais aguardado, o trilho da Montanha do Pico, ponto mais alto de Portugal, com 2351 m de altitude, numa ilha com apenas 40 km de comprimento. O trilho inicia na Casa da Montanha, a 1 230 m de altitude, de passagem obrigatória, onde é apresentado um vídeo de segurança, são solicitados os dados de todos que pretendem subir a montanha e para os que se propõem faze-lo sem guia, como foi o nosso caso, é fornecido um GPS localizador, com botões de alerta em caso de necessidade. Apesar de não ser um trilho muito extenso, tendo cerca de 7 km (3,8 km de extensão), a sua inclinação é bastante acentuada, com um desnível de 11 50 m. Está sinalizado com marcos de madeira, pintados a florescente, numerados até ao 47 (o último situado na caldeira), que em condições climatéricas normais são visíveis de um número para o outro. O percurso inicial tem bastante vegetação, que vai escasseando e tornando-se de dimensões mais 38 | saramela
reduzidas à medida que se progride na subida. São visíveis diferentes tonalidades e efeitos da lava, cenários magníficos que ficarão gravados para sempre na memória. Mais uma vez, as condições climatéricas inconstantes fizeram-se sentir. À chegada à casa da montanha chuviscava, entretanto, o tempo sofreu uma melhoria e iniciamos o trilho com sol, que se manteve até atingirmos o poste de sinalização 20. A partir daí apanhamos vento forte, frio e nevoeiro cerrado, que nos fez perder a visão de um poste para o seguinte, obrigando-nos a uma maior cautela e trabalho em equipa. Mas, apesar das contrariedades, sentia uma motivação tão forte, que associada ao espírito de sacrifício, necessário neste tipo de actividades, tive a sensação de ter feito todo o percurso a sorrir.
Chegados à cratera, o mau tempo esbateu-se e conseguimos visualizar o nosso objectivo final – o Piquinho, pequena montanha ali situada, que obrigou a uma escalada mais curta, mas mais íngreme do que até ali e a fazer uso das mãos na rocha. O tempo estava bom no topo, com algum vento, mas muito sol que nos reconfortou após o esforço e enquanto almoçamos. Em nosso redor um mar de nuvens, que inviabilizou avistarmos o oceano e as outras ilhas do grupo central, mas presenteou-nos com um cenário celestial. Dei comigo a pensar: sem dúvida terei que voltar para assistir ao outro espetáculo... Entretanto, o mau tempo estava novamente a ameaçar, por isso o regresso urgia. Descemos novamente com nevoeiro cerrado, mas desta feita também com chuva.
Mais do que “a terra das vacas felizes”, os Açores são a terra das gentes felizes e, sem dúvida, dos visitantes felizes. Há locais realmente mágicos. Há pessoas que fazem magia nas nossas vidas, quer sejam companheiros de caminhada ou um simpático motorista de táxi. Há saudades que se têm que matar com o regresso...
Texto e Fotos - Conceição Pedro
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Referências Bibliográficas
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