EXPEDIENTE Edição especial da Revista Sarau Subúrbio - ed. especial #01 - novembro de 2018
Revista Sarau Subúrbio na FliSamba 2018 Idioma: Português (Brasil) Editores: Marcelo Bizar e Marco Trindade Conselho editorial: Marcelo Bizar, Marco Trindade, Sônia Elã, Kátia Botelho Secretária-geral: Sônia Elã Revisão: a revisão dos textos é feita pelo próprio autor, não sofrendo alteração pela revista (a não ser tão-somente quanto à correção de erros materiais). Diagramação: Marcelo Bizar Capa: Marcelo Bizar Ilustrações: Marcelo Bizar
No t a s i m p o r t a n t e s : A Revista Sarau Subúrbio é uma publicação totalmente gratuita, sem fins lucrativos (assim como o são suas edições especiais). Não contamos com patrocínio de qualquer natureza. Nosso objetivo, em linhas gerais, é servir de instrumento para que os artistas que não possuem espaço de divulgação nas mídias tradicionais possam apresentar seus trabalhos, nas mais variadas formas, seja na literatura, na música, no cinema, no teatro ou quaisquer outras vertentes artísticas, sempre de forma livre e independente. Todos os direitos autorais estão reservados aos respectivos escritores que cederam seus textos apenas para divulgação através da Revista Sarau Subúrbio de forma gratuita, bem como a responsabilidade pelo conteúdo de cada texto é exclusiva de seus autores e tal conteúdo não reflete necessariamente a opinião da revista.
S U M ÁR I O Marco Trindade Poeta da Estação Primeira ........................................................ 04 O samba retrô .......................................................................... 06 Marcelo Bizar Os Sambistas ............................................................................ 08 É… quem é de samba não se cansa! ........................................ 09 Kaju Filho Aos novos e velhos compositores ............................................. 11 Juntos somos mais fortes .......................................................... 12 Rodolfo Caruso Sarau dos sambistas ............................................................... 14 Sengas ...................................................................................... 15 Júnior da Prata O samba! .................................................................................. 16 Em casa de bamba! .................................................................. 17 Danilo Firmino Chico doutor ............................................................................. 19 Márcia Lopes Beleza do sapateado ................................................................ 21 36 anos Agbara ........................................................................ 23 Onesio Meirelles Meu símbolo sagrado ............................................................... 24 Orl a n d o Ol i v e i ra Desagravo ................................................................................ 26 Lucaco Pra germinar o samba .............................................................. 27 Silvio Silva Fundamento ............................................................................ 29
Poeta da Estação Primeira Se eu fosse poeta, Seria o seu nome que eu Chamaria nos dias escuros. Se eu fosse poeta, A minha bandeira seria O seu passado e o seu presente de glórias. Se eu fosse poeta, O meu refúgio de paz Seria o seu barracão. Seu eu fosse poeta, A minha rotina de fé seria buscar O seu cruzeiro de oração. Se eu fosse poeta, Minha massa de criação Seriam seus corpos cheios de calor E seus becos repletos de vitalidade. Se eu fosse poeta, O meu coração eu deixaria descansando No colo de uma linda cabrocha, De tantas que enfeitam seu reino de bambas. Se eu fosse poeta, Eu queria ter a idade da sabedoria De uma velha guarda imortal.
Se eu fosse poeta, Das cinzas das quartas-feiras silenciosas, Eu faria renascer todos Os poetas que sua aldeia pariu, E que hoje estão encantados nas suas árvores, Nos tamborins, nos sorrisos mirins de esperança, Nos violões e cavaquinhos, Nas vozes e no canto, Nos pés descalços que pisam o terreiro, Nos negros abraços de afeto. Se eu fosse poeta, O meu sangue eu tingiria de verde e rosa, Num ritual de paixão. Se eu fosse poeta, Eu passaria meus últimos dias Sambando no meio do povo, Vivendo no seio da escola, Morando de braços dados com A dor e com a alegria... Eu morreria em Mangueira.
O samba retrô Sonhei que o bonde Ipanema Trazia a morena da minha infância. Enxerguei no largo do Estácio Um velho Sinhô E de quebra um tal menestrel Chamado Ismael. Embarquei na ilusão e acreditei que A Vila Isabel ainda tinha o Noel. Já trocando as bolas me deparei Com um jovem Cartola me dando adeus. Meu peito ardia de saudade quando Ouvi bem baixinho o Nelson Cavaquinho Driblando a morte com seus versos vitais. Na Praça XI a tia Ciata acenava pra mim, Enquanto uma baiana me vendia um quindim E um capoeira mandava assim: “esquim dim dim”. E quando caminhei pra ver luz Acordei em Oswaldo Cruz. Com choro preso na goela, Eu vi Paulo da Portela e Manacéia Derramando lágrimas de melancolia. Eu morri de alegria quando na sombra De uma amendoeira, de chinelo charlote E chapéu Copanorte, o malandro nogueira, Me dizia do alto de sua sabedoria de poeta da rua “O sambista de verdade é o cronista da cidade, E do passado não pode fugir, Por isso pega essa viola, Rasga esse pudor, Que o samba retrô Não pode parar.”
Os S a m b i s ta s Os surdos e os tambores afinados mais do que conhecia a cultura humana que da monumental África Sub-saariana, por mares sangrados, aqui chegaram na terra-pau-brasil, além das americanas Em ritmos e compassos assimilados muito mais do que poderia ser dita profana entre gente preta, vermelha e branca edificaram a nação de caipirinhas, cajus e cachaças musicaram O compasso dois por quatro dominando em sincopados e batidas invertidas de harmonias refinadas de sangue-história trazidas os ritmos inusitados mestiçavam misturdados com as danças dos lusíadas na pajelança dos Tupis e Tupinambás (que aqui já batucavam) nasceu o samba o filho mais ilustre da terra de lundus, jongos, cateretês, maxixes, maculelês, cirndas, cocos e emboladas originado Os sambistas perseguidos não se entregaram e até hoje em dia são os guerreiros que não desistem de levarem a todo o mundo a cultura de seus sambas verdadeiros pois no sangue o batuque se instalou um novel DNA cromossomizou e a herança das terras quentes orientais ficou de uma marca a ferro-quente desenhada: a do nosso samba brasileiro revelada
É … q u e m é d e s a mb a n ã o s e c a n s a ! A luta do povo brasileiro Começa bem cedo o ano inteiro Suor com sorriso, visão mansa É… quem é de samba não se cansa! Mora num conjunto-pardieiro De aroma bem forte: catingueiro Dorme tendo ao lado sua lança É… quem é de samba não se cansa! No trem bem lotado, um negreiro Lembra quanto deve ao padeiro Pelo pão dormido em sua pança É… quem é de samba não se cansa! Pra vencer reza pro Carpinteiro Mas não deixa de ser macumbeiro Sabe que qualquer reza faz poupança É… quem é de samba não se cansa! Doente, procura um curandeiro Hospital, só quem tem o financeiro Sua cura chega de ter esperança É… quem é de samba não se cansa! Apesar de posar de roqueiro Cultua mesmo o samba brejeiro Na orelha o celular toca Andança É… quem é de samba não se cansa! Canta sem ter paradeiro Bebendo se arrisca em picadeiro Seus versos a rima sempre alcança É… quem é de samba não se cansa! Não passa de um cachaceiro? Um palhaço, grande embusteiro? Acham que lhe falta ganança? É… quem é de samba não se cansa!
Seu talento não é traiçoeiro Quando improvisa é certo o morteiro Faz rimas tecendo trança-a-trança É… quem é de samba não se cansa! Seu sonho é ser bom partideiro Talvez o seu destino derradeiro Poeta e sambista de sustança É… quem é de samba não se cansa S’onestidade é ser verdadeiro Carreg’um país no seu pandeiro Da paz quer viver uma aliança É… quem é de samba não se cansa!
Aos novos e velhos compositores
(Homenageados no Sarau dos sambistas) Há muito, vaticinou Nelson Sargento Num profético samba lamento: “Samba agoniza, mas não morre Pois alguém sempre lhe socorre”... E assim, enquanto houver autores, O samba irá com fidalguia sobreviver A acintosa sanha dos detratores Que vivem do seu valor desmerecer. Fortalecido pela poética transpiração, De velhos e novos compositores Bafejados pelo hálito da inspiração, Ele brilhará ainda por muitos alvores. Trazendo para seus adoradores alento Em todos e quaisquer momentos, Sejam eles de extrema alegria, Ou mesmo de profunda nostalgia. Pura energia de essência vivificante, O samba é um poderoso unguento. Para o corpo um elixir revigorante Para a alma reconfortante alimento.
J u n t o s s o m o s m a i s fo r t e s
(Homenageado no Sarau dos sambistas)
O samba na fonte É um movimento de compositores, De aclamado destaque na fronte, Nas trincheiras de melódicos criadores. Um exemplo de luta e resistência Digno de maiores e melhores créditos Por sua incansável persistência Através das rodas de sambas inéditos. Onde certeiros petardos musicais São disparados por seus compositores Que, guerreiros, se fazem cantores Com trinados de afinados vocais. E contam com auxílios luxuosos De músicos hábeis e competentes, Que munidos de acordes melodiosos Reagem com acompanhamentos eficientes. Esta heroica linha de frente, Que solidária luta, tem um porém: “Não queremos ganhar de ninguém, Só não vamos perder pra gente”.
S a r a u d o s s a m b i s ta s tem que respeitar cartola, nelson cavaquinho, jajá, preto rico e padeirinho a batida viril do surdo um na apoteose somos um por todos tum tum tum nossa raiz traz as cores da roseira e também do jamelão nosso palácio é pintado em verde rosa quando olho no espelho, vejo , confirmo quem sou ! sou aquela moça que passa toda prosa mesmo com chuva, raio e vento nessa hora eu me invento envergo feito o poeta Nelson Sargento me aninho no colo de oyá para depois levantar e dizer: yes, nós temos fartura. herança pura, semeadura da roça de mestre xangô.
S en g a s Línguas Bantas são faladas pelos povos Bantos Vou falando Abecado abecar beca já ouviu alguma dessas? Abecado é abotoado Abecar é segurar alguém fortemente pela gola Beca hoje chamamos a quem está bem arrumado Mas no passado nos suburbios era fazer uma vaquinha Língua de Angola, lá longe, de varias regiões Banzé bamba beléleu Vou repetir bamba banzé e beléleu Adivinha então Quando acontece um rolo, confusão , é um tremendo banzé Ih Foi tudo pro beléleu, se finosse né? Sucumbiu. Bamba é Mestre; e quando mais ainda; vira bambambã. Quantas de nossas palavras vieram do Quimbundo? Um dos povos Bantos. Babá, dengo, farofa, fofoca, minhoca Chega já Vou parar, Vou só deixar a palavra cachimbo Pra mode ôces pisquizar.
( para Ney Lopes em 01 05 2017 inspirado no novo Dicionário Banto do Brasil )
O s a mb a ! Quando escuto a viola tocar Quando escuto o pandeiro chamar Vou pro Samba sem demora Vou sorrir e sambar. O surdo marca meus passos O cavaco me ajuda a chegar Nem preciso saber o que faço Sei que o Samba está lá. Minha voz vai seguindo o compasso Então jogo fora a tristeza Acredito que tudo é beleza E me ponho a cantar, a cantar. Reco-reco, repique de mão Tamborim, agogô, afoxé É o Samba da palma da mão E da sola do pé. É o Samba trazendo a união Do João, da Maria e do Zé Porque o Samba vem do coração Pois o Samba assim é...
E m c a s a d e b a mb a ! Em casa de Bamba A gente nunca está só Um sorriso, um abraço Um refrão em dó maior Quando amigos se reúnem Uma frase vira um Samba Um laiá, um bate palmas É feliz casa de Bamba Tristeza e melancolia Existem em qualquer lugar Mas no fim, acaba em Samba E histórias prá contar Sardinha frita e cerveja Em casa de Bamba sempre tem Mulher parceira sorrindo Com ou sem nenhum vintém Minha casa é de Bamba Mas nem todo mundo bebe Porém, todo mundo Samba Como a natureza pede Meu Pai me mostrou o Samba Minha Mãe me ensinou a sambar E hoje eu faço o refrão Que é prá minha família cantar...
C h i c o d o u to r Chico, menino poeta que ousou amar Não sabia que de tanto balançar na boleia também poderia enjoar Chico garoto de olhos de peixe que vivia longe do mar Menino sonhador que o mundo não lhe permite viajar Voa menino, voa garoto e comece a passarinhar Anda no Serrado, fica zangado que as vezes o amor é de amargar Chico garoto, menino pensador, sonha com rei, pensa que é imperador Garoto apaixonado por Ana Paula se encantou Chico menino que cansou de ser o filho, e logo cedo virou pai Garoto pensador, com óculos de lupa outro mundo enxergou Chico menino que virou professor Não tinha escola, não tinha médico, Chico já virou doutor Menino Chico, garoto que se revoltou Não quis saber de matemática, sua ciência é o amor Chico, poeta, menino com Ana Paula se desencantou Poeta esquecido, Chico se entregou...
Be l e z a d o s a p a t e a d o Samba no sapateado Sapateado no Samba É uma grande referência sempre com estes Mestres Bambas Donga,João da Baiana Forte representação No Samba tem Sapateado Seu Aloisio que emoção Samba no sapateado Sapateado no Samba É uma grande referência Sempre com estes Mestres Bambas Sapateia Seu Domingos, Bira e Ubirany Resistência na Familia Força pro Samba existir Samba no sapateado Sapateado no Samba É uma grande referência Sempre com estes mestres Bambas Ginga de sapateado Indumentária diferente Um sapato bem bolado Energia comovente Sapateia na minha alma Também no meu coração Samba no Sapateado é tremenda emoção Samba no sapateado Sapateado no Samba É uma grande referência Sempre com estes mestres bambas
Esta vai para Munique danรงarina envolvente Sapateado dolente mostra todo o seu Amor Mulher Bamba que domina Mostra todo seu valor... Samba no Sapateado....36 Anos Agbara Autora: Marcia Lopes Este samba surgiu depois de um evento realizado na Casa Porto no dia 28 de Maio de 2018 Memรณrias do Sapateado do Samba.
3 6 a n o s Ag b a r a Agbara Dudu 36 anos ponto de Cultura Na Sociedade Negros e Negras cantam em louvor Os tambores anunciam O Agbara chegou Com força, energia e Poder Mulher Preta Vem Canta para reviver Beleza negra é todo dia Vamos ensinar Tudo isto vem de longe Vem de nossos Ancestrais Muito Axé, esperança, amor E paz É na essência de um mito Que embalo meu cantar Seu balé é poderoso Chega para dominar Seu perfume enebria Na Guerra guerreia A essência do Agbara encandeia
M e u s í mb o l o s a g ra d o Minha bandeira, meu pavilhão Te amo Mangueira do meu coração Meu Pavilhão, minha bandeira. O teu verde e rosa me leva a emoção Minha bandeira, meu Pavilhão Teu nome jamais irei manchar Se sou fruto da raiz Eu tenho mais é que preservar Nada quero de ti. A não ser ver suas glórias Estampadas em seu pano Ramo de Café, vitórias Meu Pavilhão,amado e querido Curvo-me a ti com todo ardor Estação Primeira de Mangueira Nada quero tirar de ti, mas te dar amor
De s a g r a v o Sempre soube sambas A poesia dos bambas Brincadeira de palavras Resistência vadia Lembrança de amores Ou então de nossas dores Nesse duro dia a dia Embala nossa mente Na madrugada mais fria Ou no verão mais quente Uma festa que me soa Como um doce desagravo Esse canto que ecoa Da boca de tantos escravos
Pra germinar o samba Não é só cantar que o Samba não pode morrer Se o seu egoísmo só faz pensar em você Discursos e preces sem ter uma fé Não movem montanhas Somente palavras não nos mantém de pé Falta ação, mas sem união é um sopro no vento não é furacão Que seja um grão de areia no deserto Uma gota no oceano Você pode estar certo Que mesmo pequeno pode engrandecer Essa luta O Samba é mais uma semente atirada no chão Mas pra geminar precisa de muitas mãos
Fundamento Tambor bateu lá na senzala ê Disse o preto velho de bengala Que a liberdade vem com a luta E quem procura faz por merecer Em cada canto da cidade Em cada árvore da floresta Onde se busca a igualdade Também se quer felicidade E vem do samba a irmandade Eterna fonte de saudade Caminho longo pra verdade Pra quem chega e pra quem parte É o passado quem doa O respeito a tradição Mas, é o presente quem ecoa O que fortalece a nação É o tesouro de um povo Que não se pega com as mãos Vem com a criança que nasce Vem na batida do coração