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Nasce um país

Desenho de H. Lewis que retrata um pouso de viajantes nas vizinhanças da Rocinha, hoje município de Vinhedo

Os sofrimentos e mesmo os fracassos por que passaram as “entradas” e “bandeiras” serviram, por um lado, para atiçar o espírito aventureiro dos paulistas e, por outro, para consolidar informações e conhecimentos sobre os caminhos inóspitos e os matos bravios do interior. Os primeiros bandeirantes abriram as trilhas para futuras e alvissareiras descobertas.

Nunca se saberá precisamente quem achou a primeira pepita de ouro nos aluviões da região que depois se denominou das Minas Gerais. A primazia do achado é atribuída ora aos bandeirantes Bartolomeu Bueno de Siqueira e Antônio Rodrigues Arzão, em 1693, e há quem sustente que a primeira bandeira a encontrar ouro foi a de Duarte Lopes, também em fi ns do século 17. Sabe-se, porém, que a primeira ocorrência signifi cativa de ouro deu-se às margens do Rio Tripuí (“água veloz”, em tupi), sob as vistas do pico do Itacolomi (“ita-curumi”, pedra com menino) que domina a paisagem da atual Ouro Preto. O primeiro ouro recolhido ali era coberto por uma camada de óxido de ferro – daí a aparência escura do metal, o que inspirou o nome da cidade hoje tombada como Patrimônio da Humanidade pela Unesco. Mas a corrida do ouro começou efetivamente com a descoberta das minas de Ouro Preto por Antônio Dias de Oliveira, em 1698.

Era metal em abundância nunca vista, a excitar a ambição dos aventureiros e o apetite da Corte parasitária de Lisboa. As antigas trilhas percorridas pelos bandeirantes paulistas ganharam um movimento inusitado. De pontos diversos da colônia acorreram pretendentes à fortuna fácil; do mesmo modo observouse uma forte imigração européia, sobretudo de portugueses, em busca das benesses embutidas nos sonhos de riqueza.

No pouso de Juqueri, visto nesse desenho de Hércules de Florence, viajantes encontravam base de apoio para o descanso de homens e animais

Na região das minas havia uma clara separação entre os paulistas – os pioneiros desbravadores – e os forasteiros, chamados debochadamente por aqueles de “emboabas” – em tupi, “pássaro de pés emplumados”, numa referência ao costume de os portugueses usarem botas, enquanto os paulistas andavam descalços.

O ex-bandeirante Manuel de Borba Gato liderava os paulistas, e os emboabas seguiam as ordens de Manuel Nunes Viana, um rico comerciante português. Não demorou muito para que a animosidade crescente entre os dois grupos descambasse no episódio conhecido como Guerra dos Emboabas, que conflagrou a região entre 1707 e 1709. O conflito se deu por motivo estritamente comercial, temperado pela antipatia mútua.

Como forma de combater o contrabando de ouro, que já então corria nas minas, a Coroa portuguesa proibiu o comércio entre a região das Minas Gerais e a Bahia, exceto as transações de gado. Borba Gato era guarda-mor das Minas, portanto responsável perante o poder real pela aplicação da ordem. Mas os comerciantes liderados por Nunes Viana resolveram não acatar a determinação e mantiveram suas práticas comerciais plenas. Borba Gato ordenou, então, a expulsão de Nunes Viana da região. Essa decisão também não foi acatada e sobreveio a guerra aberta. Como estavam em minoria, os paulistas foram derrotados num banho de sangue. Expulsos das Minas, partiram em busca de novas jazidas em Goiás e Mato Grosso, onde instalaram núcleos populacionais e, não raro, fizeram fortuna.

A ocupação territorial que se seguiu à saga dos bandeirantes começou a dar forma definitiva a um país chamado Brasil.

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