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Masculinidades

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A Última Fronteira

Da ficção pa ra a rea lidade: as vidas e avent uras dos ca ça-fantas mas bras ileiros

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Texto e Fotos: Giulia Secco giuliasecco@hotmail.com

Diagramação: Vinicius Rodrigues Dutra vini.rrosa@hotmail.com

É difícil não se sentir atraído por histórias de fantasmas, desde numa roda de contos na fogueira do acampamento até nos clássicos da literatura de terror, como Stephen King e Shirley Jackson. Algumas pessoas ao redor do mundo, no entanto, escolhem ir além. Os caça- -fantasmas não existem só na ficção e não têm só nomes estrangeiros, como os famosos Ed e Lorraine Warren, que inspiraram os filmes Invocação do Mal, Annabelle e Terror em Amityville. Os caça-fantasmas brasileiros estão aí para ajudar quem precisa.

Quem você vai chamar?

Rosa Maria Jaques, de 70 anos, afirma receber pedidos de ajuda de espíritos desde criança. De forma independente, a portoalegrense, que se define como vidente, sensitiva e telepata, frequenta lugares com ocorrências paranormais buscando auxiliar aqueles que já não sabem a quem recorrer. Rosa e o marido, o jornalista João Tocchetto, de 57 anos, encontraram no Youtube o espaço para mostrar o trabalho como caça-fantasmas.

O casal fez fama com o canal Visão Paranormal, criado há sete anos, mas hoje atualiza os fãs principalmente pelo canal Caça Fantasmas Brasil. Segundo João, houve bastante preconceito. “Vidente e charlatanismo eram quase sinônimos.” O casal buscou inspiração em programas norte-americanos de ghosthunters e em filmes de ficção sobre o tema para a construção do conceito do canal. A ideia era fugir do esoterismo e do misticismo para criar um novo espaço no Brasil, onde se pudesse ver os fenômenos paranormais sem vínculo religioso.

Rosa e João recebem chamados por e-mail e por todas as redes sociais. Somente durante a entrevista para a Sextante, transmitida ao vivo no canal dos caça-fantasmas, três pessoas pediram ajuda nos comentários do Youtube e outras contaram suas histórias ou sugeriram locais habitados por fantasmas. Segundo o casal, a busca por seus serviços, mesmo que simplesmente para perguntar se seu problema se trata de um fenômeno paranormal, é diária. Eles tentam equilibrar as visitas a casas de pessoas que os chamam com investigações próprias em locais conhecidos como mal-assombrados. “A gente está sempre em movimento”, afirma Rosa.

Eles não julgam as religiões, mas afirmam que cada religião faz uma leitura do paranormal que, por vezes, pode ser pesada para o indivíduo. “A pessoa quer entender o que está acontecendo”, explica João. “Muitas vezes, as religiões respondem perguntas e ajudam as pessoas, mas há questões que as religiões não conseguem responder.” Segundo o jornalista, isso ocorre porque algumas crenças não aceitam os fenômenos e porque eles acontecem, a maioria das vezes, quando a vida do indivíduo está desorganizada.

Para Rosa, é importante que não se confunda a sensibilidade para o paranormal com doenças psiquiátricas. Segundo a vidente, algumas pessoas têm uma maior sensibilidade para perceber fenômenos, mas é importante vivenciá-los para entendê-los e encará-

“Muitas vezes , as religiões resp ondem pe rguntas e aj udam as pess oas , mas HÁ quest ões que as religiões não conseg uem resp onder”

João Tocchetto Jornalista e caça-fantasmas

Rosa e João tentam ajudar em situações que parecem impossíveis

-los com calma. Quando eles recebem pedidos de ajuda, Rosa tenta avaliar se é realmente um caso de paranormalidade ou uma questão psicológica.

Entre os casos marcantes, o casal destaca a visita à boate Kiss, em Santa Maria; a um cemitério em Santana do Livramento em que uma energia teria se identificado como o Diabo e, mais recentemente, a gravação de uma voz durante auxílio prestado a uma família, presente no vídeo Sussurros do Inferno no canal do casal. Eles afirmam terem mais de mil vídeos com fantasmas, seja em sons ou imagens. Segundo João, se há a presença de um espírito, Rosa sabe. “Nós não temos dúvida”, diz o caça-fantasma.

Sem respostas prontas e perguntas proibidas

Para entrar em um cemitério, o autointitulado mago portoalegrense Antonio Augusto Fagundes Filho, de 57 anos, aguarda um sinal. Ele chega na forma da placa de um carro que dobra na esquina, “6646”. Pode passar. Ao lado das criptas, Fagundes realiza um ritual de proteção antes de contar sua história.

Autor de O Livro dos Demônios – Manual de Identificação de cada demônio e as defesas necessárias, Guia da Cultura Proibida e Das Profundezas da Noite, ele afirma que fantasmas existem porque não receberam amor o suficiente. Segundo Fagundes, a condição de virar um fantasma é completamente antinatural e rara. Isso ocorre em situações de mortes trágicas de humanos desafortunados que acabam por “fazer a passagem” antes da hora. Ele afirma ainda que há fantasmas “especializados”

em uma atividade ou outra, mas que basta ser tirado da vida abruptamente ou de forma cruel para que a pessoa se revolte e não consiga se desligar do plano terrestre.

Por razões diversas, afirma, os lugares ficam carregados negativamente e, à medida que as pessoas vão ficando com mais medo, projetam mais energia ainda. Por isso, Fagundes diz que há fantasmas que assustam e fantasmas que não assustam. “Os que assustam são mais safados e querem se alimentar dessa energia do medo que eles provocam.” Para o mago, o ser humano emite energia constantemente, pois é um ser espiritual tendo uma experiência material e não um ser material tendo uma experiência espiritual. Já outros espíritos ficam no plano terrestre apenas para resolver algo antes de seguir em frente, como o caso do fantasma que volta para apontar onde está seu corpo ou um tesouro escondido.

De acordo com Fagundes, o motivo pelo qual ele consegue perceber as realidades espirituais seriam as suas experiências de quase-morte. A primeira ocorreu quando foi diagnosticado com um caso grave de meningite aos três meses. Ele conta que, após a doença, e desde que começou a falar, manifestava ver coisas que as outras pessoas não viam, como os mortos da família. “É difícil falar em sobrenatural, porque para mim tudo é natural, é o nosso desconhecimento referente à natureza que faz a gente usar esse termo.” Ter convivido desde sempre com o que ele chama de outra dimensão moldou a sua vida, e ele afirma se sentir honrado por ter esse privilégio.

Antropologia da Paranormalidade

A mestranda em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Gabrielle Cabral focou seus estudos na Antropologia da Religião e, atualmente, dedica-se a pesquisar espiritualidade e tecnologias.

De acordo com ela, “sobrenatural” é um termo usado por teólogos da Idade Média que designa a ação direta de Deus. Já o termo “paranormal” surgiu no século XX, com os pesquisadores da Society for Psychical Research, com o intuito de substituir o termo “sobrenatural”. Enquanto paranormal designa o que está “além do escopo da ciência”, sobrenatural quer dizer “além das leis da natureza”. “Ao caracterizar os fenômenos anômalos como paranormais, os investigadores psíquicos queriam sinalizar que tais ocorrências fazem parte do mundo natural e, portanto, podem ser apreendidas por meio da investigação científica, apagando as filiações religiosas carregada pelo termo sobrenatural.”

Segundo Gabrielle, a vontade de se comunicar com espíritos está muito presente, porque não queremos acreditar que a vida termina com coisas inacabadas, ainda mais quando é uma pessoa jovem que faleceu. A Antropologia geralmente interpreta os espíritos, as crenças do outro, como uma metáfora para outra coisa, como forma de coesão social ou como algo com uma função dentro da sociedade.

Há poucos estudos sobre a realidade ontológica do espírito e do paranormal, e há também poucos dados sobre a quantidade de pessoas trabalhando na linha tênue entre vida e morte. Segundo a ParanormalSocieties.com, que afirmava ter a maior lista de sociedades e grupos de paranormais do mundo, apenas nos Estados Unidos havia cerca de 3,6 mil integrantes registrados até 2016. O site parou de ser atualizado há três anos sem explicações e, desde então, não surgiu uma nova plataforma para colher esses dados. O que sempre permanece dos caça-fantasmas são os relatos e as histórias, sejam narrados de boca em boca, sejam em livros, filmes ou em vídeos do Youtube.

Fagundes se considera um mago e escreve sobre o paranormal

REVI STA EXPERIM ENTAL DO CUR SO DE JOR NALI SMO DA FACULD ADE DE BIBLIO TECONOMI A E COMU NICAÇÃO (FABI CO) DA UNIV ERSID ADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL (UFR GS)

Disciplina de Jornalismo Impresso

Direção da Fabico

Karla Maria Müller

Chefia do Departamento de Comunicação Maria Berenice da Costa Machado

Professora-editora

Thaís Furtado

Orientação Gráfica

Ana Gruszynski e Graziele Borguetto

Monitor

Juan Ortiz

Estagiária

Júlia Fernanda Costa dos Santos

Participação: Turma de Fotojornalismo II sob orientação da professora Ana Taís Martins Portanova Barros e da estagiária docente Camila Freitas Siqueira

Agradecimentos: Janaína Kalsing e Luís Eduardo Gomes

Impressão: Gráfica da UFRGS Comissão editorial: Andielli Silveira, Bárbara Lima, Deborah Mabilde, Elias Santos, Filipe Batista, Giulia Reis, Vinicius Rodrigues Dutra e Yuri Correa Comissão de fotografia: Andielli Silveira, Deborah Mabilde, Diego Rodrigues, Elias Santos, Luciana Forgiarini e Paola Pavezi Comissão online: Gabriela Garcia, Giulia Secco, Sthefania Castillo e Yuri Correa

Comissão de distribuição e lançamento: Ana Carolina Parise, Elivelto Corrêa, Giulia Reis, Luciana Forgiarini, Sthefania Castillo e Thayse Ribeiro

Projeto Gráfico: Amanda Hamermüller, Felipe Goldenberg e Glauber Machado Capa: intervenção de Filipe Batista em ilustração de Breno Dias Ilustrações páginas 2, 3 e 79: Breno Dias Diagramação: Ana Carolina Parise, Caroline Silveira, Diego Rodrigues, Filipe Batista e Vinicius Rodrigues Dutra Revisão: Juan Ortiz, Júlia Fernanda Costa dos Santos e Luciana Forgiarini

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