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D O C U M E N TA
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PEDRO VALDEZ CARDOSO Frutos e Ossos Fruits and Bones
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Frutos e Ossos, 2015 cimento e cola sobre diversos materiais | cement and glue on different materials
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Frutos e Ossos Katherine Sirois
A presente instalação consiste numa constelação de vários grupos de peças que representam formas orgânicas, naturais e de criação humana — frutos, legumes, vários objectos de uso quotidiano como garrafas, talheres e pratos, e também ossos humanos e de animais. A natureza familiar e muitas vezes botânica dos objectos que compõem a instalação insere-a na tradição pictórica de cenas de mercado e interiores de cozinha, especialmente populares nos Países Baixos durante o século XVII. Ecoando o carácter carnal e convidativo dos frutos terrenos, esses quadros muitas vezes incluíam uma voluptuosa «moça de cozinha», que fitava sugestivamente o espectador. Estas cenas, que geralmente procuravam representar riqueza e abundância ou os meses do ano e o ciclo das estações (e da vida), incorporavam igualmente sugestões eróticas, evocando a fertilidade e certas partes do corpo humano. Mais recentemente, em 1938, Frida Kahlo pintou as suas Pitahayas, aqueles gloriosos frutos que encantam a paisagem mexicana durante a Primavera, «cuja pele tem a cor e o enrolamento de pétalas de rosa, cuja polpa cinzenta sabe a um beijo de amor e desejo», como escreveu André Breton, após a sua estada com Frida e Diego Rivera nesse mesmo ano. Como a fertilidade é inseparável da morte, a pintura aponta explicitamente para o tema da mortalidade com a inclusão de um pequeno esqueleto sentado numa pedra de lava junto aos frutos, segurando uma gadanha, o que o identifica como a Morte, a calavera — um motivo recorrente da cultura mexicana e dos seus ritos, emblemática da celebração popular e dramática do Dia de los Muertos (Dia dos Mortos). A pintura lembra-nos de que a morte anda em constante movimento por todo o lado, mesmo em redor desses frutos suculentos e vibrantes, cheios de cores festivas e de sabores suaves. De facto, até a carne mais delicada, saudável e fértil inevitavelmente conhecerá a corrupção e a dissolução. Enquanto símbolo das delícias terrenas, das erupções de vitalidade, da profusão e da diversidade, a representação de frutos revela a dimensão do efémero e a natureza perecível de todas as formas de vida. É assim inseparável da tradição das naturezas-mortas e das Vanitas, com a sua injunção de memento mori. Mas os bens terrenos da instalação de Pedro Valdez Cardoso, que incluem uvas, peras, maçãs, laranjas, limões, pimentos, abóboras, pão e ovos, já não sugerem, como o fazem as Pitahayas de Frida, o sabor de «um beijo de amor e desejo», imbuído de uma voluptuosidade sensual e do sentido de uma fatalidade não dissimulada. Pousados directamente no chão ou pendurados nas paredes, transmitem aos espectadores uma impressão de tempo congelado, de cristalização e suspensão eterna que possui, a partir de agora, o sabor do pó e das cinzas, de lava vulcânica fria e de morte. A representação escultural dos frutos feita por Valdez Cardoso não possui a sensualidade voluptuosa das representações do passado. De facto, tanto o processo da corrupção como o potencial regenerativo que pairava por trás da ameaça da putrefacção desapareceram por completo. A disposição e arranjo de objectos em pequenos grupos, como o das garrafas, evoca o universo despojado, arquetípico e silencioso das naturezas-mortas de Giorgio Morandi. A paleta de cores está reduzida apenas a matizes de cinzentos e a calavera participa directamente nas composições de
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objectos e frutos, tomando a forma de vários tipos de ossos, desde tíbias a caixas torácicas. Nem os frutos nem os fragmentos corporais, que surgem num estado de emaciação e secura, são contaminados pela fealdade da liquefacção e putrefacção, pelo que não inspiram horror ou repulsa. Apesar da obliteração de tudo o que pudesse ser ligado à antiga estética da decomposição que atravessa a história da arte até aos nossos dias, uma certa impressão de inquietude, causada pela misteriosa combinação, não deixa de estar presente. Aqui, a morte parece ter-se limitado a gelar a vida e as coisas em cimento, este material de construção contemporâneo que, ao lado do seu correlativo, o betão, invade as nossas paisagens e vidas. A aparência fossilizada dos componentes da instalação — numa referência ao processo que converte materiais orgânicos em substâncias minerais que têm a qualidade de captar e revelar, ao longo de milénios, um «instante» figural de formas de vida muito distantes no passado — não só inspira uma percepção peculiar do tempo, como também nos projecta num hipotético futuro pós-apocalíptico. Algo reminiscente dos alimentos (como frutos e pães), dos corpos e dos vários objectos encontrados em Pompeia e Herculano, «Frutos e Ossos» sugere uma escavação arqueológica do nosso presente vista a partir de um tempo distante. Quando o Monte Vesúvio entrou em erupção e soterrou as duas prósperas cidades-irmãs em 79 d.C., gerou um poderoso caudal de lava e detritos vulcânicos, matando e aprisionando na rocha todas as coisas e seres. Tal como o que aconteceu durante esta tragédia, dir-se-ia que, na instalação de Valdez Cardoso, o fluxo da vida foi subitamente gelado por um qualquer evento mortífero e enigmático, fazendo de nós os descobridores de alguns restos «ossificados» de uma bizarra Última Ceia. Metaforiza o fim do tempo ou o fim de uma era? Será uma metonímia do fim do mundo ou da fase final de um mundo? Seja qual for a resposta, a aparência quase vestigial dos objectos da instalação e a qualidade saturnina, fria e mortalmente imóvel do cimento usado para os representar evocam temáticas de desastre e colapso, devastação e morte. Todos estes são aspectos operativos centrais no trabalho diversificado do artista, que inclui vários tipos de intervenções, técnicas e materiais criativos e tradicionais, desde papéis rasgados, rasuras, graffiti, colagens e desenhos sobrepostos, fotografias, gravuras e bordados até esculturas e instalações. Em consonância com a abrangência dos seus interesses, com a sua abertura à experimentação livre e a sua vasta produção, as suas peças exploram todos os registos, com alusões que vão desde o foro íntimo às esferas sócio- e geopolíticas, do realismo à fantasia, do cómico ao trágico, do poético ao trivial e grotesco. Sempre algo inquietantes, tendem igualmente a conter uma certa dose de sarcasmo ou de humor negro. No que concerne aos objectos, as suas intervenções vão desde a produção de imitações de fragmentos esqueléticos, garrafas, louça e frutos ao uso, inclusão e transformação de todo o tipo de objectos existentes e encontrados. De alguma forma, a presença de uma grande variedade de objectos quotidianos nas instalações de Valdez Cardoso, acompanhada da sua dispersão pelo espaço das galerias, evoca as práticas provocativas de Marcel Duchamp, nomeadamente o uso e a «encenação» não-convencionais de uma panóplia de objectos industriais: sacos de carvão, jornais e cordas, como fez em 1938 para a «Exposition Internationale du Surréalisme», na Galerie des Beaux Arts, em Paris. Chegamos assim a outra dimensão subjacente a todo o seu trabalho: a colecção, com a sua tendência a proliferar. Não é por acaso que as acções de juntar, organizar, produzir e acumular um grande número de objectos de todas as origens e categorias evocam, de alguma forma, a extraordinária explosão de produtividade humana a que hoje, mais do que nunca, assistimos. Uma espécie de máquina gigantesca «abstracta e invisível» que continuamente vomita uma infinidade de objectos, engenhocas e brinquedos, artigos e dispositivos obsoletos, consumíveis e descartáveis, produtos e embalagens tóxicos de usar e deitar fora. Este frenesim de produção acelerada e ilimitada parece obedecer a leis de uma implacável lógica capitalista, técnica e tecnológica, a do «sempre mais». Esta lógica não parece apenas imparável; parece também ter uma natureza exponencial, que
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Este livro foi publicado por ocasião da exposição «Frutos e Ossos» realizada na Galeria águas livres 8, em Lisboa, de 11 de Abril a 11 de Maio de 2019
This book was published on the occasion of the ehxibition «Frutos e Ossos» held on the Gallery águas livres 8, in Lisbon, between April 11 to May 11, 2019
AGRADECIMENTOS | AKNOWLEDGEMENTS
Maria da Graça Carmona e Costa Fundação Carmona e Costa Patrícia Valdez Emílio Vilar Maria Torrada Cristina Robalo
© Pedro Valdez, 2019 © Sistema Solar Crl (chancela Documenta) Rua Passos Manuel 67 B, 1150-258 Lisboa Abril | April 2019 ISBN 978-989-8902-75-7 Texto | Text: Katherine Sirois Fotografias | Photographs: Nuno Moreira Inácio Tradução | Translation: José Gabriel Flores Revisão | Proofreading: José Gabriel Flores, Helena Roldão Depósito legal | Legal deposit : 455568/19 Pré-impressão, impressão e acabamento | Prepress, printing and binding : Gráfica Maiadouro SA Rua Padre Luís Campos, 586 e 686 (Vermoim), 4471-909 Maia