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selecção, tradução e apresentação de
Aníbal Fernandes
O acto de nos afastarmos é o mais corajoso e o mais belo…
Isabelle Eberhardt HISTÓRIAS DA AREIA
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© SISTEMA SOLAR, CRL RUA PASSOS MANUEL, 67B, 1150-258 LISBOA tradução © ANÍBAL FERNANDES NA CAPA: CREPÚSCULO EM MARRAQUEXE DE LUCIEN LÉVY-DHUMER (PORMENOR), 1932 1.ª EDIÇÃO, JUNHO 2013 ISBN 978-989-8566-29-4
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A naturalidade suíça de Isabelle Eberhardt sai de uma história russa, e bem poderia estar em Turgueniev; num romance que nos falasse de Pavel Karlovitch de Moerder, general e senador próximo do czar, e da luterana Natalia Nicolaevna Eberhardt (os dois com terminações germânicas no nome), a surpreenderem-nos nas agitadas voltas da sua intriga. Embora velho, Pavel dava provas de uma virilidade cumpridora. Nas festas da corte, junto de fontes de águas termais, em vilegiaturas elegantes, volta e meia Natalia obrigava-se a roupas que lhe disfarçassem o ventre cheio de esperanças. Em terras da Rússia, os seus filhos chegariam a quatro. Um abastado e respeitado pai russo desse tempo não educava os seus filhos numa escola pública. Para estas infâncias havia o estudo caseiro, a aula discreta defendida do convívio popular pela figura do preceptor. E foi com fidelidade a esta norma que o general Moerder fez a sua boa escolha: o ucraniano Alexandre Tropimovski, ex-pope ortodoxo, amigo de Bakunine e discípulo de Tolstoi, poliglota, erudito que a tudo respondia com rigores de uma boa enciclopédia; e, como se isto não bastasse, fisicamente belo. O casamento de Pavel e Natalia, que denunciava um leito fecundo, era no entanto incomodado por uma sombra semítica. Não convinha ao general russo uma mulher com sangue judaico; impureza tardiamente descoberta, que lançava as bases de uma desa-
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vença, de recriminações perturbadoras na vida do casal. Quando o seu filho Nicolas, o mais velho, teve dos melhores médicos conselho de mudança para um clima clemente, pareceu boa ocasião para a senhora Moerder deixar longe a desgraça do seu sangue e abandonar a Rússia com o pretexto de um local varrido por ar ameno. Natalia afastou-se; levou consigo o franzino Nicolas, Wladimir, as jovens Olga e Natalia, o Augustin que já se afirmava nas evidências de uma gravidez adiantada, e ainda o preceptor Tropomovski que em Kherson deixava mulher e quatro filhos para se encarregar em terra estrangeira de uma excelente educação russa. A previsível amenidade do clima eleito não foi porém da Grécia, da Itália ou da Espanha; a Natalia (e sobretudo a Tropomovski) pareceram amenos os Invernos extensos da Suíça, país que nesses finais do século XIX se animava como refúgio dos que queriam, apoiados por teorias socialistas ou anarquistas, consumar a derrocada das tiranias europeias. Natalia Moerder foi mal recebida pelos russos exilados nessa terra que fermentava revoluções. Era-lhes difícil aceitar a esposa de um general do czar, que deixava em Moscovo o marido e em Genebra passeava com os seus filhos e a meia-idade bem parecida de um homem talvez invejado por outras mulheres; que mais tarde dois anos ficou viúva e, depois de um luto de vestidos negros, surgia despudoradamente grávida e por obras — nenhuma dúvida parecia haver — do insinuante Tropomovski. Em 1877 Isabelle nasceu e não foi possível dar-lhe o Moerder de todos os seus irmãos. Alexandre Tropomovski também se recusou a reconhecê-la como filha; sentia-se pouco seguro da sua paternidade; talvez achasse que o leito de Natalia recebia outras visitas além da sua. (Sem nenhuma base credível, mas a confirmarem a versatilidade amorosa
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de Natalia, imaginações delirantes chegaram a dar-lhe como pai Arthur Rimbaud.) Natalia viu-se forçada a pôr na sua filha o nome alemão que em tudo isto sobrava; o que lhe vinha, também ela bastarda, da sua mãe. E assim foi que Isabelle, russa-suíça, futura singularidade e marginalidade na literatura em francês, entre quatro irmãos Moerder ficou com o solitário sobrenome Eberhardt. Seria Isabelle Eberhardt. * Nos arredores de Genebra, a casa Tropomovski transformou-se aos poucos num frenético convívio de expatriados revolucionários. Ele, preceptor promovido a pai numa família que à mulher somava seis jovens crianças e adolescentes, governou com mão de ferro uma amante dócil e cinco, entre aqueles filhos, que o odiavam. (Era excepção Isabelle, a desculpar-lhe tudo por considerá-lo seu pai.) Este lar tumultuoso, animado por agitações políticas e na sua estrutura alheio ao que a sociedade preconizava como modelo familiar, suscitava à tranquila normalidade suíça atitudes hostis e ditos cruéis que visavam sobretudo Natalia; o que talvez tenha ajudado à formação daquele bando de jovens Moerder rebeldes e conturbados. Porque Olga, a mais velha, casou-se voluntariosamente com um rapaz humilde, exterior a todas as características sociais e humanas aceites por Natalia e Tropomovski; porque Nicolas, com dezanove anos de idade se alistou na Legião Estrangeira, onde foi desertor antes de fugir para a Rússia; porque Natalia, a mais nova das duas raparigas, fugiu de casa com o seu amante; porque Wladimir, depois de uma vida sem brilho, viria em 1898 a sucidar-se; porque Augustin, que se alistou como o seu irmão na
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Legião Estrangeira, viria a ser recusado por fragilidade física, e em 1920 também se suicidou. Em 1899, Natalia e Isabelle já tinham sentido como nunca uma solidão sem remédio naquela Suíça que as apontava a dedo. Natalia continuava como imperdoável viúva de um general russo, que deixara longe o marido e viera com os seus filhos disfrutar noutro país a liberdade amorosa pedida pelas exigências da sua sensualidade. A jovem Isabelle, essa, vestia-se à marinheiro e com outros trajos masculinos, tinha comportamentos de uma desenvoltura imprópria numa rapariga decente. Perante os incómodos desta rejeição, uma e outra começaram a sonhar grandes distâncias fora do círculo da maledicência pequeno-burguesa de Genebra. Isabelle sentia uma sedução firme pelas terras quentes da Turquia e do Norte de África; alimentava correspondências (assinadas com nomes de homem) dirigidas a especialistas na história e na cultura dos povos que lá viviam; e era visitada por uma inquietação que talvez se acalmasse em terras exóticas como as que tinha lido literariamente enfeitadas por Pierre Loti. O irredutível individualismo que Tropomovski soubera incutir-lhe pedia este afastamento e a garantia de uma total liberdade. Por outro lado soavam-lhe bem as teorias do renascimento islâmico da Nahada, aquele que o pensador Djamal el Din Afghani nesses dias argumentava visando sobretudo a civilização ocidental. Foram ambas para a Argélia, colónia francesa com um leve cheiro a Europa, e instalaram-se em Bône. Bancos eficientes garantiam que o dinheiro do general russo chegava sem sobressaltos ao seu dia-a-dia. Isabelle esqueceu a sua masculinidade europeia e começou a vestir-se como um árabe. Uma e outra encantadas, decidiram apagar de vez a entediante cultura que as tinha formado e escolher aquela outra, com a consequência lógica de aderirem à
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religião muçulmana. Isabelle adoptou um nome do sexo que gostava de simular: Mahmud Saadi; Natalia manteve-se mulher e passou a chamar-se Fatma Mannubia. Saadi e Mannubia começaram a frequentar mesquitas; Mannubia obediente às prescrições que a feminilidade lhe impunha; Saadi em secreta transgressão quando se prosternava na área dos homens, com a cabeça a tocar no solo e o corpo voltado para Meca. Foi sob esta máscara que Isabelle ofereceu aos seus amantes árabes uma estranha emoção: a de levarem para o leito um jovem beduíno, transformado pouco depois em corpo feminino ardente, insaciável, e oferecido com equívoca masculinidade. Para a sua descrição há larga escolha de memórias. Dizem-na com humor instável e espectaculares crises de desespero, habituada a galopar no deserto, a fumar kif em cafés árabes; atacada pela malária, pela sífilis, por uma tuberculose que ela iria contrair nos regimes austeros das areias do Sara. «Bebia de mais», diz Robert Randau. «Era a única coisa que contrastava com a sua profunda aceitação da fé muçulmana. Sim, tinha a religiosidade intensa dos místicos e dos mártires. Vivia como um homem, como um rapaz, porque bem mais parecia rapaz do que rapariga. Mas era, com o seu ar de hermafrodita, apaixonada e sensual embora diferente de uma mulher. Ainda por cima com o peito completamente plano. Tinha pequenas vaidades, embora bem mais fossem as de um árabe elegante. Trazia as belas mãos sempre enfeitadas com henna, a roupa sempre imaculada, e quando tinha dinheiro punha desses perfumes muito intensos que os árabes adoram. «Houve uma época em que passava dias inteiros nos suks, e ao ver um homem que lhe acendia o desejo, engatava-o. Fazia-lhe um
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sinal, e saíam dali juntos. Nunca era hipócrita nem escondia as suas aventuras. Que razão teria para fazê-lo? Não passavam de uma das facetas da sua personagem. Creio que tinha profundos êxtases religiosos; a estes ocultava-os, porém. Era muito rigorosa na observação dos rituais: cinco orações diárias na mesquita, na rua ou no deserto. Estivesse onde estivesse, rezava.» Ainda mais livre depois da sua mãe morrer em Argel, Isabelle viveu em pleno a vida árabe. Com a cabeça rapada e roupa de beduíno, tinha na identidade variações caprichosas que passavam por Si Mahmud, Mahmud ben Abadlá, Saadi, Mahmud uld Al. «Uma vez mais a vida beduína fácil, livre, embaladora, tomou conta de mim para me inebriar e amolecer», escreveu no que hoje se conhece como Notes de Route. E, como se já não fosse uma furiosa individualista, acrescentou: «A bem-aventurada anulação do eu nesta vida contemplativa do deserto.» «Ir para o seio do grande oceano de mistério que é o Sara e fixar-me aí», escreveu em Mes Journaliers. «Criar aí uma alma, uma consciência, uma inteligência, uma vontade.» E em Heures de Tunis: «Um direito que bem poucos intelectuais fazem o esforço de reivindicar é o direito à vida errante, à vagabundagem. […] Para quem conhece o valor e também o deleitoso sabor da solitária liberdade (porque só somos livres quando estamos sós), o acto de nos afastarmos é o mais corajoso e o mais belo. […] Estarmos sós, sermos parcos no que necessitamos, sermos ignorados, estranhos na nossa casa e em todo o lado; e, solitários e grandes, andarmos à conquista do mundo.» Mas em contraste com esta verdade de si mesma na solidão, o desejo de se ocultar entre os homens: «Para a galeria ponho a emprestada máscara do cínico, do debochado e do que se está-nas-tintas. Até hoje ninguém conseguiu atravessar a máscara e vislumbrar a
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minha verdadeira alma sensível e pura que plana muito alto, acima das baixezas e dos aviltamentos onde é do meu agrado arrastar o meu ser físico, com desdém pelas convenções e também com uma estranha necessidade de sofrer.» Uma viagem à Europa, para desbloquear a herança russa da sua mãe, fez nesta vida árabe uma interrupção bastante menos apaixonada. Isabelle sentia-se indissoluvelmente ligada à Argélia: «Estou ligada a este país — que é, no entanto, um dos mais desolados e violentos que podem existir», escreveria um pouco mais tarde. «Se alguma vez eu tiver de deixar a cidade parda com um sem-número de abóbadas e cúpulas, perdida na imensidade cinzenta das dunas estéreis, para todo o lado levarei a intensa nostalgia do recanto de terra perdido onde tanto pensei e tanto sofri, e onde encontrei também o afecto simples, ingénuo e profundo, o único que nestes momentos ilumina como um raio de sol a minha triste vida.» No seu intermédio europeu encontrou, porém, um amante fogoso: Mohammed Rachid, com grande influência na sua atitude perante a colonização francesa da Argélia. Isabelle voltou mais politizada, ainda que tivesse grande interesse em passar por «indiferente à política», como se depreende de um dos seus textos no jornal La Dépèche Algérienne: «Não sou política nem agente de nenhum partido, pois acho que todos de igual forma se enganam. Sou apenas uma extravagante, uma sonhadora com o desejo de viver longe do mundo, de viver uma vida livre e nómada para contar o que vê e à frente do triste esplendor do Sara conhecer, talvez, o melancólico e enfeitiçado estremecimento.» Será no entanto em El Ued o mais importante encontro da sua vida; quando vê nos jardins de Bir R’arby o jovem Slimene
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Ehni, um sargento muçulmano argelino, mas de nacionalidade francesa, que passou do mais voluptuoso dos amantes a marido. «Tem um carácter doce e jovial», escreveu ela quando sentiu necessidade de explicar uma decisão que parecia desajustada à sua personalidade, «detesta sair de casa, frequentar cafés e ruídos; gosta do seu lar e é cioso a defender-se de toda a invasão exterior. Para mim, que estou fatigado, apesar de todas as relações que pude conservar [com frequência ela falou de si própria no masculino], e cansado e farto da desesperante solidão que me rodeia, Slimene é um marido ideal.» Nesta mesma época Isabelle Eberhardt entrou secretamente para a ordem Sufi dos Quadriya, que lhe concedeu o rosário dos iniciados. Foi diligente na aprendizagem das técnicas do êxtase místico, mas teve de enfrentar a equívoca aceitação de muitos membros da confraria. Em causa estavam as suas atitudes masculinas, o uso imoderado de bebidas alcoólicas, uma pobreza não justificada pelos meios materiais de que dispunha e cultivada com ostentação. Era o ódio ao pássaro europeu que pousava entre árabes de severa crença sem abdicar de impertinentes diferenças, ousadias e provocações, e causa directa de uma tentativa de assassínio; aquela, de 29 de Janeiro de 1901, com a violência de uma cutilada do «inspirado por Deus» Abdalá ben Ahmed, amortecida por uma corda de estender roupa, e que lhe deixou um braço ferido: «Um fanatismo contra tudo o que é cristão», escreveu ela num jornal, «apesar de eu não ser cristã, como todos os suafas sabem, incluindo Abdalá.» Aconselhada a esperar na França a abertura do processo judicial contra o seu agressor, Isabelle foi sete meses para Marselha onde trabalhou (com trajo masculino) nas descargas do porto. Re-
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gressou à Argélia para assistir ao julgamento que a tinha como vítima, e ficou a saber que Abdalá fizera um jejum de cinco dias, antes de a golpear a mando de Deus por ser causadora de desordem na religião muçulmana; desordem que estava no seu hábito de vestir roupas de homem e na suspeita de que fosse amante de um árabe chamado El Lachmi, preponderante na ordem dos Quadriya. Abdalá foi punido com trabalhos forçados até ao fim da sua vida, que durou mais vinte anos, e a Isabelle Eberhardt determinado que ficasse em exílio no Sul da Argélia, em território dificilmente alcançável pelo braço vingador da tribo de Abdalá. Isabelle voltou porém a Marselha para se casar pelo civil, e depois numa mesquita, com Slimene Ehni. Se havia neste casamento um acto de amor, outro o acompanhava de inegável estratégia. Porque a nacionalidade francesa de Ehni passaria a garantir-lhe na Argélia a protecção oficial que uma suíça vagamente russa nunca lograria obter; e porque a sua nova situação civil dispensá-la-ia do exílio decretado pelo tribunal. Esta liberdade de residência permitiu-lhes escolher Bône; e depois, com alguma discrição, a agitada e perversa Kasbá de Argel. Um pouco depois, com o sargento Ehni a cumprir serviço longe de Argel, nada impediu que Isabelle decidisse viajar sozinha. Fez, nesta nova conquista da sua querida liberdade, cavalgadas de rédea solta pelo deserto; e sabe-se que chegou longe, às distantes e tórridas areias de Bu Saâda e El Hamel como enviada especial do semanário Akhbar. Viu árabes do interior muito pobres, e sentiu-se como nunca em oposição ao poder francês. De novo em Argel, excedeu-se; fez críticas públicas, difíceis de tolerar por um regime colonialista, e começou a sentir-se no centro de uma feroz campanha da imprensa onde as calúnias andavam a par com verdades e
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com o veneno de muitas ironias. Valem a pena algumas frases de um longo artigo de L’Union Républicaine com a assinatura quase anónima A.B.: «Uma dama mascarada. […] Assina com os nomes de Madame Mahmud Saadi, rua de Orleans-Ville, Tanas, e como reforço acrescenta um “mademoiselle Eberhardt”. […] Que laço de parentesco liga madame Mahmud do Turco à mademoiselle Eberhardt do Dépèche? Será uma reedição da Santíssima Trindade? […] Nas instalações da imprensa Zamith encontrámos muitas vezes um jovem indígena imberbe, com um cigarro nos lábios e cabelo rapado, que trazia uma capa preta orgulhosamente aberta nos ombros e fazia soar umas excelentes botas vermelhas. “Chama-se Mahmud», disse-nos Mr Barrucand quando se inaugurou o Akhbar. “É meu criado.” Este criado será um colaborador, este rapaz será uma mulher, será uma senhorinha ou uma senhora, e esta senhora chama-se Madame Mahmud ou Madame Ehni? Vive em Orleans-Ville ou em Mustafá? Oh, que cruel enigma! 1» Para fugir do ambiente irrespirável que Argel construía à sua volta, Isabelle resolveu ir para Ain Sefra, no Sul, uma pequena cidade do Atlas não muito distante da fronteira entre a Argélia e Marrocos. E aconteceu qualquer coisa que diríamos imprevisível. É hoje bem conhecida a missão militar que o general Lyautey levou a cabo nesse princípio do século XX; como a França ficou a dever-lhe a mão firme que soube manter Marrocos sua colónia num estratégico Norte de África. A vigilância de Lyautey fazia-o 1 Victor Barrucand foi redactor principal do semanário franco-árabe Akhbar, fundador na Argélia da Liga dos Direitos do Homem, e apoiante incondicional de Isabelle Eberhardt. Foi seu primeiro biógrafo, suavizando os aspectos da biografada que menos convinham à pretendida imagem que ele se mostrava interessado em fazer passar. Foi editor dos seus textos, acusado de transcrições fantasistas dos originais.
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obcecar-se por uma inspecção militar minuciosa que entrava por vezes na Argélia. E fascinou-se, aí, pela rebelde androginia de Isabelle Eberhadt. Tinham discursos opostos ou mesmo inimigos, mas era dentro de uma encantadora amenidade verbal que as feições duras do militar encontravam a surpresa daquele ser ambíguo, daquele meio-termo onde as argumentações emocionadas não alteravam um rosto suave e com uma frescura ingénua de vinte e tal anos. Ficou-nos esta memória: «Ela era o que no mundo maior atracção exerce sobre mim: uma rebelde. Mas que encanto, encontrarmos alguém que é de facto ele próprio, sem nenhum preconceito, nenhuma concessão, nenhuma ideia feita, e a passar pela vida tão liberto de tudo como um pássaro no espaço! Gostava dela por aquilo que era e não era. Eu amava o seu prodigioso temperamento de artista, e tudo o que tinha para escandalizar os defensores da lei, os importantes, os mandarins de todas as espécies. Pobre Mahmud!» O «pobre Mahmud» estava a viver com inocência os últimos dias da sua vida. Há nesses climas pouco domesticados vírus estranhos, não reconhecidos pelo compêndio das medicinas europeias e com uma teimosia que não enfrentava, nesses tempos, a contrariedade dos antibióticos. Isabelle adoeceu gravemente; e o hospital de Ain Sefra defendeu-a da morte mas obrigando-a a uma convalescença que ela escolheu enfrentar numa casa de tub, a argila vermelha dessas habitações que ainda hoje seduzem o olhar dos turistas e só contam para a sua resistência com um tempo seco ou, pelo menos, não castigado por nenhuma violência de águas. Ora, Isabelle foi apanhada por uma implacável cheia de rio que a história de Ain Sefra até àqueles dias desconhecia. Foi em 21 de Outubro de 1904 que a onda gigantesca correu enlouquecida para varrer sem piedade a zona marginal da cidade. E Isabelle ficou soterrada nos escombros da sua formosa casa.
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A admiração de Lyautey levou-o a apoderar-se de todos os manuscritos que lá existiam e a depositá-los nos Arquivos do Governo Geral da Argélia. Eram muitos. Naquela vida agitada existia um escritor incansável, espalhado por diários, por impressões de viagem, pensamentos e histórias. «Escrevo porque gosto de progredir na caminhada da criação literária», deixou registado num dos seus papéis; «escrevo como amo, porque talvez seja este o meu destino. É o meu único e verdadeiro consolo.» Uma pequena parte deste destino tinha aparecido em jornais. E decifrar o que ultrapassava essa fracção de obra já posta em limpa letra de imprensa, a que fora deixada em papéis lavados por uma água de cheia, manchados pela sua lama, não foi tarefa fácil. As primeiras edições da sua obra foram imprecisas, inventivas e traidoras. Mas houve mais tarde a leitura conscienciosa dos seus manuscritos. E hoje lê-se Isabelle Eberhadt preservada na sua autenticidade, sem tentações dos excessos que tinham antes soprado sobre seu natural talento de escritor. Nas suas histórias reconhecem-se as toadas do contador árabe, mas com mulheres diferentes das que essa tradição nos deixou. As mulheres de Isabelle Eberhardt sofrem com um desejo de liberdade no amor que a cultura islâmica proíbe, vivem amores nómadas dramáticos quando não transcendidos pela fé; os seus homens europeus sofrem o feitiço oculto no infinito das dunas e na solidão reveladora do «outro», místico e esotérico, transcendido com o esplendor magnífico dos elementos, vivem embriagados por um amor que opõe o Oriente e o Ocidente, e por ambos reprovado. Muitos traços destas personagens masculinas e femininas podem ser-lhe atribuídos, podem ser consideradas habitantes dos painéis de uma fragmentada e romanceada autobiografia raras vezes decidida a assumir-se com um explícito «eu».
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Isabelle Eberhardt, com uma prosa generosamente adjectivada que o calor do seu olhar exige, apaixonada por ruídos, cheiros, cores, sabores, ainda assim não deixa de fazer pesar nesta festa e nesta imemorial beleza uma presença de morte. Da morte que nunca a assustou, a benfazeja, a que inspira aos muçulmanos esta saudação: «Faça-te Deus morrer jovem.» Ela própria reconhece-o nesta frase: «A morte sempre me surgiu com a forma atraente da sua imensa melancolia.» Mas a sua morte não aconteceu como a desejada numa frase de Mes Journaliers e que não escolhe aquela Ain Sefra dos desertos do Sul. Pode parecer estranho que a obcecada pela solidão das dunas quisesse a urbana Argel como cenário de um derradeiro olhar. Mas a pouco mais de um ano antes do seu fim, a 9 de Janeiro de 1903, tinha escrito: «Seria bom eu morrer em Argel; além, na colina de Mustafá e voltado para o grande panorama ao mesmo tempo voluptuoso e melancólico, voltado para o grande golfo harmonioso com um eterno ruído de suspiros, voltado para os rendilhados distantes dos montes de Kabília.» O seu túmulo em Ain Sefra é muçulmano mas com uma lápide escrita por Lyautey. O abaulado monte de terra, orientado para Meca, delimita a medida da sua dimensão terrestre e anuncia: El Sayyed Mahmud (em escrita árabe) Isabelle Eberhardt Esposa de Ehni Slimene Morta aos vinte e sete anos Catástrofe Ain Sefra 21 de Outubro de 1904. A.F.
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AMARA O FORÇADO
Um pouco por necessidade, um pouco por gosto, eu nessa altura estudava os costumes das populações marítimas dos portos do Midi e da Argélia. Um dia embarquei no Félix Touache, que partia para Philippeville. Modesto passageiro do convés, vestido de pano azul e com um barrete na cabeça, eu não chamava a atenção de ninguém. Sem desconfiarem, os meus companheiros de viagem nada modificavam ao seu habitual comportamento. Mas é realmente um erro grave acreditarmos que podem fazer-se estudos de costumes populares sem nos misturarmos com o meio que estudamos, sem vivermos a sua vida… Era uma tarde clara de Maio, a desta partida para mim divertida como todas as partidas para a terra amada de África. O carregamento do Touache estava a terminar, e eu assistia uma vez mais ao intenso vaivém das horas de embarque. No convés já alguns passageiros aguardavam a partida; aqueles que não tinham, como eu, um adeus a fazer, nenhum parente a beijar… Vários soldados em grupos indiferentes… Um jovem cabo de zuavos morto de bêbado tinha embarcado, mas pouco depois caído ao comprido nas tábuas húmidas; e ali continuava sem se mexer, como se não estivesse vivo…
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Isabelle Eberhardt
Reparei que um rapaz muito novo, sentado longe dos outros sobre cordas, chamava a minha atenção pela singularidade de toda a sua pessoa. Muito magro, com o rosto imberbe bronzeado, feições angulosas, vestia calças de pano muito curtas, calçava alpercatas, tinha uma espécie de colete de caça às riscas que se abria no peito de ossos marcados, e um chapéu de má qualidade. Tinha olhos cavados e com uma expressão estranha, de um tom fulvo que a luz modificava: lia-se neles uma mistura de temor e desconfiança bravia. Quando o homem do chapéu de palha me ouviu falar árabe com um alquilador de Bône, depois de longas hesitações veio sentar-se ao meu lado. — De onde vens? — perguntou com um sotaque que nenhuma dúvida deixou sobre as suas origens. Contei-lhe uma história banal, dizendo-lhe que tinha acabado de trabalhar em França. — Louva a Deus se trabalhaste em liberdade, e não na prisão — disse ele. — E tu, saíste da prisão? — Saí. Passei oito anos em Chiavari, na Córsega. — O que tinhas feito? — Matei um tipo entre Setif e Bu Arreridj. — Mas afinal que idade tens? — Vinte e seis anos… Estou com uma liberdade condicional de três meses… É muito, três meses. Durante o resto da travessia tivemos, o forçado de Chiavari e eu, mais ocasiões para falar.
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Histórias da Areia
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O mar encapelado acalmara-se um pouco. A noite descia, e ao aproximarmo-nos da costa de África o ar ficava mais suave… Uma tepidez embriagadora flutuava na penumbra do crepúsculo. No horizonte meridional uma faixa um pouco mais escura e um mundo de vapores turvos denunciavam a terra. Pouco depois, quando já havia uma verdadeira noite as luzes de Stora surgiram. Apoiado contra o filerete, o forçado olhava fixamente para essas luzes ainda longínquas, e as suas mãos crispavam-se na madeira escorregadia. — Aquilo, acolá, é mesmo Philippeville? — perguntou-me repetidas vezes com a voz a tremer de emoção… No porto deserto, perto do cais onde alguns carregadores dormiam nas lajes depois do desembarque, o próprio Félix Touache imóvel também parecia adormecido com a luz vagamente rosada da lua em quarto minguante. Havia um ar morno. Chegava da terra um indefinível perfume inebriante. Oh! Essas horas felizes, essas horas embriagadoras dos regressos a África depois dos longínquos e melancólicos exílios! Eu tinha resolvido esperar a bordo o nascer do dia, para prosseguir a minha viagem até Constantine onde devia assistir, pró-forma, ao julgamento do homem que tinha seis meses antes tendado assassinar-me além, no distante Suf. Eu estendera a bombordo as minhas mantas no convés, do lado em que a água mal se ouvia. Estava deitado, com um bem-estar profundo, quase voluptuoso. Mas o sono não chegava. O condicionalmente libertado, que também passava a noite a bordo, veio ter comigo. Sentou-se perto de mim.
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— Deus te guarde e proteja da prisão, a ti e a todos os muçulmanos — disse depois de um longo silêncio. — Conta-me a tua história. — Deus seja louvado, porque pensei que ia morrer lá… Existe um cemitério onde põem os nossos; e morreram vários chegados lá depois de mim… Nem sequer têm um túmulo em terra muçulmana. — Mas como pudeste, assim tão novo, matar? E porquê? — Escuta — disse ele. — Foste criado em cidades e não sabes… Mas eu sou do duar* dos Uled Ali, que dependem de Setif. Todos os nossos são pastores. Temos muitas manadas e também cavalos. Além disto temos campos que semeamos com cevada e trigo. «O meu pai é velho e sou filho único. Na nossa manada havia uma bonita jumenta parda que ainda não tinha os dentes dos quatro anos. O meu pai dizia-me sempre: “Amara, esta jumenta é para ti.” Eu chamava-lhe Mabruka e com frequência montava-a. Era rápida como o vento e má como uma pantera. Quando a montava dava saltos e relinchos, arrastando atrás todos os garanhões lá do sítio. Um dia a minha jumenta desapareceu. Durante uma semana procurei-a, e acabei por saber que um pastor dos Uled Hassene, nossos vizinhos do norte, tinha ficado com ela. Queixei-me ao nosso cheikh, e como oferta levei-lhe um mezuid de manteiga para ele fazer justiça. «Esse Ahmed ladrão, ao saber que a gente do makhzen ia procurar a jumenta, e que não poderia vendê-la porque era co* No final do volume pode ser consultado um léxico com a tradução portuguesa da maior parte das palavras árabes existentes no texto. (N. do T.)
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nhecida, levou-a para uma ravina onde lhe cortou a cabeça. Quando eu soube da morte da minha jumenta, chorei. E depois fiz a jura de vingar-me. «Numa noite escura saí furtivamente do nosso duar e fui até aos Uled Hassene. O gurbi do Ahmed, meu inimigo, era um pouco isolado e em redor tinha um pequeno tapume de espinheiros. Esperei que a lua nascesse, e depois avancei. Para acalmar os cães eu tinha levado comigo as entranhas de um carneiro morto naquele dia. Vi ao luar o Ahmed deitado à frente do gurbi, para guardar os seus carneiros. Tinha a espingarda debaixo da cabeça. E um sono profundo. Com o lenço apertei a gandura contra o meu corpo, para não ficar presa a nada. Entrei no recinto. Senti as pernas fraquejar e um calor terrível queimar-me o corpo. Hesitei, por pensar no perigo que aquilo era. Mas estava escrito: os cães já saciados iam rosnar. Foi quando me apoderei da espingarda do Ahmed; puxei-a com força tirando-a de sob a sua cabeça, e à queima-roupa descarreguei-a no seu peito. Depois fugi. Os homens e os cães do duar foram atrás de mim, mas não conseguiram agarrar-me. Nesta altura cometi um erro: ninguém me tinha visto, e eu devia ter ido para a casa do meu pai. Mas o medo da justiça dos cristãos levou-me a fugir para o mato, para as ravinas. Durante três dias e três noites estive lá escondido, a alimentar-me com figos-da-barbária. Sentia medo. À noite não me atrevia a dormir. Ao menor ruído, ao sopro do vento nas moitas, punha-me a tremer. No terceiro dia os polícias prenderam-me. A história da jumenta e a minha fuga tinham revelado tudo; e apesar de eu nunca ter confessado, condenaram-me.
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«Os juízes pouparam-me a vida porque eu era jovem. Durante três meses estive em prisões de Setif, Constantine, e aqui, em Philippeville. Depois embarcaram-me num navio e levaram-me para a Córsega. Na penitenciária, onde éramos quase todos muçulmanos, com a ajuda de Deus e de nos portarmos bem não nos sentimos muito infelizes. Mas continua a ser a prisão longe da família e em país infiel. Graças a Deus, libertaram-me. «É muito, três meses!» — Agora lamentas ter morto aquele homem? — Porquê? Eu estava no meu direito, uma vez que ele tinha morto a jumenta que era minha, e eu nunca lhe tinha feito mal! O que não devia, era ter fugido. — Amara, o teu coração não se arrepende do que fizeste? — Se o matasse sem razão, seria um grande pecado.
Apesar de todos os sofrimentos que até ali aquele beduíno tinha suportado, era francamente visível que não concebia o seu acto como um crime. — E agora o que vais fazer? — Vou ficar na casa do meu pai, e trabalhar. Vou levar à pastagem a nossa manada. Mas se uma noite encontrar no mato um dos Uled Ali que fizeram com que eu fosse preso, mato-o. A todas as minhas argumentações Amara respondia: — Eu não era inimigo deles. Eles é que semearam a inimizade. Quem semeia espinheiros, na sua ceifa não pode colher trigo.
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De manhã, no comboio de Constantine. Com as pupilas dilatadas pela alegria e uma espécie de espanto, Amara contemplava o país a desfilar lentamente aos nossos olhos. — Vê — disse-me de repente — vê: é trigo… E além é um campo de cevada… Oh! Vê, irmão, as mulheres muçulmanas a apanharem as pedras desse campo! Era presa de uma emoção intensa. Os seus membros tremiam, e à vista daqueles cereais tão amados, tão venerados pelo beduíno e pelas mulheres da sua raça, Amara começou a chorar como uma criança. — Vive em paz com os teus antepassados — disse-lhe eu. — E haverá paz no teu coração. Deixa as vinganças a Deus. — Se não pudermos vingar-nos, sufocamos, sofremos. Tenho de vingar-me dos que tanto mal me fizeram! Na estação de caminho-de-ferro de Constantine separámo-nos como irmãos. Amara tomou o caminho de Setif para voltar ao seu duar. Nunca mais voltei a vê-lo.
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Alá iarhemu: Deus lhe conceda a sua misericórdia. Beylik: senhor. Bordj: herdade fortificada. Burnus: grande manto de lã com capuz (deu origem à palavra portuguesa albornoz). Caid: chefe de tribo nomeado pela França. Cheikh: chefe de confraria, professor, director espiritual, homem velho. Chott: lago salgado. Deira: guarda municipal. Djebel: montanha. Djemaá: assembleia, mesquita. Djerid: folhas de palmeira. Djich: pilhadores armados. Djuak: flauta de caniço. Duar: grupo de tendas, aldeia. Erg: região de dunas. Felá: camponês. Gandura: túnica comprida de tecido leve. Gume: contingente militar composto por nómades e dirigido pelo caid. Gumieres: soldados árabes ou berberes reunidos num gume. Genur: turbante de homem. Gurbi: casa de má qualidade. Hakem (plural hokame): administrador. Hamada: deserto de pedras. Harki: bando armado. Imane: leitor do Corão na mesquita. Kasbá: cidade árabe. Kefer: não crente. Khammes: rendeiro Kubba: santuário consagrado a um marabu.
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L é x i c o d e Pa l av r a s Á r a b e s
Ksar: aldeia do Sara. Makame: sepultura de santo. Makhzen: corpo de polícias argelinos. Mektub: o Destino, a vontade de Deus. Mlahfa: veste das mulheres do Sul. Mokhazni: cavaleiro do makhzen. Mueddhen: o que faz o apelo à prece. Mukeres: mulheres da África do Norte. Nefra: combate. Papudj: babuchas. Redir: charco de água. Rhaita: uma espécie de clarinete (deu origem, em português, a gaita). Rumi: franceses ou europeus. Sebkha: lago salgado, em geral seco. Seguia: canal de irrigação a céu aberto. Sit ech char: casa da luz. Slughi: raça de cães do deserto. Spahi: corpo de cavalaria, numa grande parte composto por indígenas armados. Sufia: mulher do Suf. Surdis: moedas. Taâme: comida. Taleb (plural tolba): estudante ou muçulmano letrado. Tellis: grande saco que as mulas e os camelos transportam com mercadorias. Tub: argila seca. Ued: curso de água. Ukil: administrador encarregado de problemas financeiros. Zaúia: escola, sede de uma confraria. Ziara: peregrinação a um túmulo de marabu.
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Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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Amara o forçado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Zaúia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Taalith . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Legionário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Luto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O vagabundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O paraíso das águas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A mão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Ume Zahar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tessaadith . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O amigo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . M’turni . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O anarquista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Meddah . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
21 29 34 39 56 64 69 76 79 91 111 124 131 143
Léxico de palavras árabes. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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livros publicados
Os génios, seguido de Exemplos, Victor Hugo O senhor de Bougrelon, Jean Lorrain No sentido da noite, Jean Genet Com os loucos, Albert Londres Os manuscritos de Aspern (versão de 1888), Henry James O romance de Tristão e Isolda, Joseph Bédier A freira no subterrâneo, tradução de Camilo Castelo Branco Paul Cézanne, Élie Faure, seguido de O que ele me disse…, Joachim Gasquet David Golder, Irene Nemirowsky As lágrimas de Eros, George Bataille As lojas de canela, Bruno Schulz O mentiroso, Henry James As mamas de Tirésias — drama surrealista em dois actos e um prólogo, Guillaume Apollinaire Amor de perdição, Camilo Castelo Branco Judeus errantes, Joseph Roth A Mulher que Fugiu a Cavalo, D.H. Lawrence Porgy e Bess, DuBose Heyward Charles-Louis Philippe, Bubu de Montparnasse Henry James, O Aperto do Parafuso Georges Rodenbach, Bruges-a-morta — romance
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REVISÃO: ANTÓNIO LAMPREIA
DEPÓSITO LEGAL 000000/13 IMPRESSÃO E ACABAMENTO DE GUIDE – ARTES GRÁFICAS, LDA RUA HERÓIS DE CHAIMITE, 14 2675-374 ODIVELAS
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K_Isabelle Eberhart_Histórias da Areia.qxp:lombada8 18/11/13 09:03 Page 1
selecção, tradução e apresentação de
Aníbal Fernandes
O acto de nos afastarmos é o mais corajoso e o mais belo…
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