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Joaquim M. Palma
DOZE FRONTEIRAS A raia luso-espanhola percorrida em toda a sua extensĂŁo
D O C U M E N TA
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Carta Militar de Portugal, folha 348, edição do Instituto Geográfico do Exército, 1999.
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Índice
Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1. A fronteira de água mansa . . . . 2. A fronteira que alto se levanta . 3. A fronteira de um terceiro país 4. A fronteira dos três reinos . . . . 5. A fronteira do tratado . . . . . . . 6. A fronteira-desfiladeiro . . . . . . 7. A fronteira pétrea . . . . . . . . . . 8. A fronteira da ponte imperial. . 9. A fronteira de sangue . . . . . . . 10. A fronteira fora de lugar . . . . . 11. A fronteira mineral . . . . . . . . . 12. A fronteira solar . . . . . . . . . . .
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Descrição nominal e afectiva dos objectos… . . . . . . . . . . . . . . Lista dos lugares de registo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
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In t ro d u ç ã o
Impulso inicial Estando a génese deste livro enraizada na eterna circunstância de existirem fronteiras a separar os povos do mundo, é intenção do seu autor começar o respectivo prólogo colocando uma questão que desafia, não sem algum desassombro, a suposta irredutibilidade das barreiras e divisões levantadas pela mente humana: «Como é que um indivíduo do século XVII japonês pode ser “culpado” de uma acção que vai acontecer no século XXI, do outro lado do mundo, num processo que lembra o movimento circular ondulante gerado pela queda de um objecto na superfície de um lago imenso, com a primeira onda a chegar agora, três séculos depois, à margem ocidental, onde a espera uma criatura portuguesa que se interroga filosoficamente sobre a chegada desse sinal?» A resposta à pergunta pode, resumidamente, ser formulada do seguinte modo: o autor destas linhas, aquando da organização e tradução da obra completa de poesia haiku de Matsuo Bashô1, deparou com um conjunto de textos (em prosa e poesia) resultantes da viagem realizada pelo poeta japonês à região mais remota do Japão; esses textos, reunidos sob o título Oku no Hosomichi (O Caminho Estreito para o Longínquo Norte), constituem, no conjunto da bibliografia de Bashô, um corpo literário de elevadíssima qualidade, sendo considerado, por alguns especialistas, o ponto mais alto da sua criação poética. O tradutor luso lembra-se de, na altura, ter perguntado aos seus botões: «E se fosse em Portugal, até onde iria Bashô na busca desse mais longe geográfico?» A resposta mais provável talvez apontasse para uma viagem ao longo da fronteira terrestre. E como a raia fronteiriça é só uma, essa mesma resposta teria de englo————— 1 Matsuo Bashô, O Eremita Viajante [haikus – obra completa], Assírio & Alvim, 2016.
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bar também a faixa espanhola, uma vez que toda esta se situa a uma distância demasiado arredada do quilómetro zero de Madrid. E foi para lá que, no Outono de 2016, o presente cronista partiu. À sua espera tinha mais de mil e duzentos quilómetros de linha fronteiriça que, na prática, seriam ampliados para o triplo, pois a deambulação pelos dois lados da raia exigiria percursos em ziguezague. Dada a extensão da geografia a visitar, a viagem teria de ser feita por etapas. Por razões de algum modo fortuitas, o itinerário não começou num extremo e acabou no outro; a escolha dos troços foi acontecendo menos em obediência a qualquer plano prévio e mais ao sabor daquilo que no momento se achava ser o mais aconselhável, atendendo-se, entre outras condicionantes, às circunstâncias climatéricas, à disponibilidade de tempo, à receptividade psicológica para viajar. Depois, foi só o trabalho de encadear sucessivamente os capítulos, como num puzzle, seguindo a linha norte-sul da fronteira. No período prévio à primeira viagem, e com base no conhecimento empírico que geralmente todos temos das coisas antes de as conhecermos realmente, a ideia que pairava na cabeça do viajante era a de que a raia fronteiriça seria uma entidade biofísica transnacional sem grandes diferenças ao longo da sua extensão; quando muito, talvez se pudesse dividi-la, sem grandes hesitações, em quatro categorias distintas: Norte, Centro, Alentejo e Algarve. Mas a verdade é que, depois de realizada na íntegra, a viagem revelou nada mais nada menos do que doze fronteiras. E, apertando mais o zoom da diferenciação, talvez se pudesse ainda descobrir um punhado de pequenas bolsas caracterizadoras de fenómenos identitários muito localizados no interior de cada uma dessas raias fronteiriças. Numa ronda pelos dicionários, constata-se que vocábulos como «fronteira» e «raia» têm o mesmo significado, ou seja, referem-se ao «espaço humano e físico adjacente à linha política demarcada por marcos fronteiriços». E é em obediência a essa semântica igualitária que ambos os termos são utilizados ao longo de todas estas páginas. Por outro lado, quando se quer fazer referência ao limite político propriamente dito, utiliza-se a designação de «linha fronteiriça». Existem algumas obras literárias (nomeadamente em língua castelhana) que abordam, sob a forma de crónicas redigidas in loco, a multifacetada realidade fronteiriça, mas constata-se que, na maioria delas, a fidelidade ao espaço estritamente 8
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raiano não é obrigatória, levando à existência de textos que, por serem escritos a uma grande distância da linha de fronteira, pouco ou nada dizem sobre a verdade daquele território. Assim, para que o retrato da raia seja o mais autêntico possível, as crónicas que adiante se hão-de ler dizem respeito ao que foi observado e vivenciado no interior de uma faixa de dez quilómetros para cada lado da linha fronteiriça. Só em dois ou três casos se excedeu essa bitola quilométrica, por se verificar que eles tinham uma relação muito directa com o mundo raiano. Nas crónicas respeitantes a topónimos inseridos no antiga região de Olivença/Olivenza, e sendo esse território português de jure e espanhol de facto, optou-se por se grafar no início de cada texto, lado a lado, as iniciais «P» e «E» («Portugal» e «Espanha»). Mas no caso de determinado registo ter sido escrito sobre a própria linha fronteiriça, o que aconteceu em algumas das doze fronteiras, não é inserida nenhuma inicial indicadora de nacionalidade. Na posse de um bom mapa, foi desde sempre intenção do viajante luso encontrar-se com a fronteira sem levar imagens preexistentes na sua mente, de abrir a tudo um olhar fresco e descondicionado, de não perder tempo com grande preparação documental (muitas vezes, só depois de percorrer o lugar como se este fosse terra incógnita, é que iria à procura de alguma informação que lhe indicasse onde se situavam as singularidades do território a que tinha arribado). E nada de recorrer à tecnologia GPS — porque ele não se importa nada de se perder por caminhos inesperados; e de todas as vezes que isso aconteceu, só ficou a ganhar. Já depois de completada a primeira metade do percurso raiano, chegou-lhe às mãos um poema de José Tolentino Mendonça cujos primeiros versos sugeriam «Não ames viagens que reduzam a estranheza / nem te desloques a lugares / dos quais já existam registos», e, olhando para o caminho que ainda faltava fazer, o cronista fronteiriço sentiu que, com esse empurrão poético, um bom companheiro se lhe tinha juntado na sua demanda por espaços físicos e humanos à margem dos estereótipos contemporâneos. Também a questão das pernoitas e do sustento alimentar não lhe mereceu à partida grande preocupação. Como poderia ele antecipadamente saber onde estaria no fim de cada dia, com a jornada a trazer-lhe certamente momentos que, ou paravam, ou adiantavam o relógio do tempo? Afortunadamente, os turistas não procuram os territórios fronteiriços porque, pensam eles, «lá não há nada», 9
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pelo que o viajante nunca deparou com alojamentos esgotados; uns quilómetros mais acima ou mais abaixo do ponto onde se encontrava, encontraria sempre cama disponível e mesa com algum alimento.
O forasteiro-cronista em movimento Quem até aqui chegou na leitura deste prólogo, já deve ter reparado que o discurso do narrador não está a utilizar a primeira pessoa. Acontece que à criatura humana que realizou a viagem, e nos dias que antecederam o primeiro passo, caiu-lhe em cima a dúvida gramatical sobre que pronome pessoal deveria ser usado na descrição das andanças fronteiriças. Experimentou, nos primeiros dias, aplicar à exposição escrita a marca da primeira pessoa, com o «eu» todo-poderoso a emitir e a absorver as sensações; o íman egocêntrico gerado por tal cedência começou a enfadar o escrevinhador e a interferir irritantemente na beleza da descoberta. Perante tanto desconforto, optou pela terceira pessoa do singular (sujeita a várias denominações: «viajante», «cronista», «forasteiro»), que é a que mais liberta o texto da forte e condicionadora presença dos padrões centralizadores impostos pelo «eu»; a magna intenção do indivíduo em viagem — com esta a ser suportada unicamente por imperativos literários e filosóficos — sempre foi a de olhar e sentir e descrever os encontros o mais longe possível da acção de filtros do ego passíveis de alterarem a percepção pura. O mais importante era a viagem, não quem a executava. Claro que a circunstância de grandes figuras das letras (José Saramago, Camilo José Cela) terem utilizado na escrita das suas viagens a «escapatória» da terceira pessoa, deixa o autor destas linhas um pouco mais tranquilo quanto à estranheza que tal recurso gramatical poderá eventualmente levantar na mente de alguns leitores. Obedecendo a obrigações interiores inalienáveis, o aqui presente cronista das fronteiras longínquas nunca levou para a expedição qualquer lista de tópicos a relatar ou a procurar, nem jamais teve intenção de seguir este ou aquele guião ou percurso famoso por qualquer razão. A existência de uma prévia e meticulosa lista de prioridades seria uma afronta ao seu modo de andar pelo mundo, que é o de manter os olhos físicos e os da mente bem abertos a tudo o que vai ficando, de um modo natural, dentro do alcance dos seus sentidos. Do diálogo entre estes e as 10
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circunstâncias raianas é que viria a definir-se o «retrato escrito» merecedor de integrar o caderno de registo. Não raras vezes, e em detrimento do convencionalmente aceite como preponderante, o monumental foi preterido em nome da singularidade do pequeno, do abandonado, do furtivo: a roupa a secar à janela de um casebre em vez da imponente mansão do antigo senhor da terra, a tosca cruz incrustada numa parede em ruínas em lugar do poderoso edifício da igreja barroca. Um claro e inabalável desígnio se impôs antecipadamente ao primeiro passo desta viagem: jamais ir à procura do comportamento típico (que se encena para o turista), da etnografia (que tudo padroniza), da história oficial (que tudo engrandece), da tradição (que nada questiona); claro que, se tais matérias se lhe atravessassem no caminho, sobre tal falaria, caso sentisse que valia a pena o esforço. O primeiro e último objectivo passaria sempre por tentar captar o momento, o espontâneo, o intemporal. Consciente de não possuir a arte poética de Bashô, este viajante que foi ao mais longe de Portugal socorreu-se do que cada circunstância e a corda do seu sentir lhe pediam quanto à forma que a expressão escrita deveria tomar para melhor dizer o que era preciso ser dito. Assim, os textos não obedecem a um único estilo literário; em consonância com a diversidade encontrada e com os distintos estados de espírito do cronista, também a escrita se foi concebendo segundo formas distintas: texto descritivo, poema, nota meditativa, prosa lírica, «janelas» por onde ia passando a luz clarificadora da geografia, da história, da filosofia, da arte, da linguística, da literatura, da música, do humor, com a possibilidade de, em alguns momentos, as barreiras entre as diversas formas estilísticas serem bastante fluídas ou até subvertidas. E porque é preciso estar-se atento à perspectiva transmitida por outros seres, o autor também trouxe para o presente destas páginas, por empréstimo e devida gratidão, as palavras de gente que sobre as fronteiras deixou algum legado escrito digno de ser citado. Foi difícil, mas tentou-se, recorrendo a alguma desajeitada arte mágica, integrar neste ou naquele texto o emudecimento da palavra e do pensamento, o assombro e o estremecimento perante o inaudito — «matérias» de uma volatilidade incontrolável, mas que o leitor mais atento decerto escutará no eco de algumas frases. Como a poesia é a água onde mais e melhor navega o autor, não será de 13
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estranhar que um fio de luz poética atravesse a qualquer momento a paisagem de uma ou outra crónica, umas vezes, mais intenso e abrasador, outras, semioculto num manto de discrição a pedir paz e silêncio. Alguns leitores dirão que falta nestas páginas muita coisa. O cronista sabe-o: falta aquilo que não o tocou, falta o que decidiu calar por não ter encontrado palavras para o expressar, falta o que não vivenciou, ou porque chegou tarde, ou porque partiu demasiado cedo, falta tudo o que aconteceu quando estava a olhar para o lado, falta o que estava a vibrar na outra rua ou na paisagem que o olhar não alcançava, falta aquilo que preenche os restantes trezentos e sessenta e quatro dias do ano em que o forasteiro português iria estar ausente. No fundo, e para isso não precisa de se justificar, acarinha com bastante contentamento os grãos de ouro ofertados pelos dias e noites raianos, que cabem na palma de uma mão, e presume, com algum desassombro, que o que registou são somente pequenas gotas de um mar maior e que, ao revelar a natureza dessas ínfimas gotinhas, talvez tenha feito com que a realidade singular desta nossa fronteira terrestre tenha avançado na direcção da corda sensível de alguns seres humanos. E isso lhe basta. Uma particularidade social há a sublinhar: excepto em um pueblo da província de Salamanca — por razões que, até hoje, continua a não descortinar, o que só comprova a existência da excepção à regra —, em toda a parte, o viajante foi bem recebido, demonstrando-se assim que, nas zonas mais longínquas, mais desoladas, mais esquecidas, a bondade ainda permanece bem viva nos corações das gentes anónimas que vivem no limiar de várias extinções. O livro que o leitor tem neste momento entre mãos não foi concebido para uso turístico. Não tem mapas com a indicação de pontos de interesse buscados pelas massas, nem de onde ficar ou comer, nem de contactos locais, nem é adornado com fotografias de postal ilustrado. Também não é nenhum estudo académico de natureza sociológica, etnográfica ou outra; por isso, no final, não está lá nenhuma secção de notas nem a clássica e habitualmente extensa lista bibliográfica. É, sim, a reprodução de um simples caderno de viagem redigido sem pretensões de convencer quem quer que seja e cujos conteúdos surgiram da interacção do olhar com o coração e da predisposição de um ser humano para ir à procura do genuíno, onde o belo (e o feio) têm sempre algo a dizer. Os registos, por 14
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separado e por junto, nada exigem e nada prometem; são a folha caída de uma árvore que não está perto e que o vento trouxe inesperadamente — uns dão por ela, pegam-lhe, olham-na com curiosidade, e vão à procura da árvore, outros não.
Reflexões finais Que se espera encontrar de dissemelhante no espaço envolvente às fronteiras? Do que vai o viajante à procura? De uma tal expedição, o que se espera trazer, de original, na bagagem? As respostas não deverão ocupar muito a mente dos pesquisadores de fronteiras e afins. O que há a fazer é ir. Escrever ou não sobre a experiência, isso já depende do talento de cada um. É óbvio que não é obrigatório passar para a palavra escrita aquilo que vivenciou. Sobretudo, o que é preciso é navegar, já o sugeria Fernando Pessoa. Só quem possuir a alma curiosa do cientista ou da criança poderá empolgar-se com a(s) realidade(s) encontrada(s) nesses territórios-limite. Bem vistas as coisas, as raias fronteiriças são provavelmente o que há de mais parecido com as galáxias que se distanciam no cosmos; elas ainda conservam em si substratos sociais e culturais que já vão deixando de existir no centro que lhes deu origem. São a periferia que, à força de abandono, se vai desgastando nas suas matérias mais preciosas. «Mas já não existem fronteiras nesta Europa de Schengen», sustentam alguns. É verdade que os postos fronteiriços foram encerrados e estão por lá todos a apodrecer. Contudo, os marcos de pedra continuam alinhados ao longo de planícies, vales e cumes. Nenhuma borracha apagou as linhas que, no papel de todos os mapas, separam os povos. A verdade é que a fronteira, essa, ficou intocável; é algo que não vai apagar-se tão cedo, dando, desgraçadamente, razão e vida longa às acertadas palavras do escritor galego Ramón Pedrayo: «A fronteira histórica é unha cicatriz. Tocarlle fai doer». Embora se lamente o estado de deterioração dos edifícios fronteiriços (o seu vazio, ferozmente vandalizado, parece aguardar ainda o regresso controlador que existiu no passado), a verdade é que passamos ao lado desses «barcos naufragados em terra» com a sensação de que estamos a introduzir-nos num espaço que não nos 15
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pertence e onde somos olhados como «alguém de fora». Miguel Torga expressa bem esse sentimento ambivalente quando diz no seu Diário: «Hoje foi a minha vez de atravessar a fronteira sem cancelas de nenhuma ordem. Nem fiscais alfandegários, nem polícia a carimbar o passaporte. Apenas um painel de doze estrelas a mandar seguir. Mas nem por isso andei por Espanha dentro de coração solto». A «ferida» de que fala Pedrayo foi tão prolongada e dolorosa que agora a «cicatriz» não desaparece nem pára de doer. À luz da antropologia social, a linha fronteiriça, em qualquer parte do planeta, não passa de uma invenção posta em prática pelos antigos chefes tribais no sentido de os grupos se separarem uns dos outros e que responde tão eficazmente a sentimentos primários de posse territorial que ainda hoje se defende e preserva com inusitado fervor. Mas, curiosamente, essa separação (sempre decidida pelos poderes políticos situados bem longe do local) raramente foi factor que antagonizasse os seres que de repente viam uma barreira entre eles. No caso da raia luso-espanhola, a convivência e o comércio livre aconteceram em praticamente toda a sua extensão, com casamentos, festividades, negócios transfronteiriços, transmitindo a esse obstáculo um alto grau de porosidade que supostamente não deveria acontecer. E quando o Estado central, perante tanta desobediência civil, tentou muscular a vigilância (especialmente nos momentos de mais actividade contrabandística ou durante a Guerra Civil espanhola), a sua acção continuou a fracassar, pois os raianos, às vezes com o risco da própria vida, não deixaram de continuar a fazer o que sempre tinham feito. A raia comum que se formou ao longo dos séculos dos dois lados da fronteira luso-espanhola é de uma riqueza ímpar nos planos humano, cultural e paisagístico. Conhecê-la é das experiências mais fascinantes que hoje em dia ainda se podem realizar no que diz respeito à descoberta e ao prazer de viajar, neste nosso século de consumismos desenfreados e de omnipresentes e massificadoras tecnologias que acabarão, mais tarde ou mais cedo, por obliterar as frágeis periferias que formam o interior longínquo onde uma pedra é uma pedra e não uma imagem exposta num ecrã. E a incursão nesse espaço físico e humano impactante transformar-se-á em viagem por dentro do ser que a protagoniza; o transcendente visitará o viajante, questioná-lo-á, e ele não regressará igual a casa. 16
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Entre a Ponta do Cabedelo, no Minho, e a praia da Isla Canela, na foz do Guadiana, o viajante português passou por espaços idílicos e outros à beira do deserto geológico, por paragens que já foram autónomas (Couto Misto), por paisagens onde não vive ninguém, por «povos promíscuos» (atravessados a meio pela linha de fronteira), por zonas onde ainda estão bem vivos os dialectos do tempo da Reconquista, por povoados que se destruíram a si mesmos em guerras fratricidas, por uma fronteira que um lago faraónico afundou, por uma extensa raia (a sul) que não atraiu qualquer povoamento, por marcos fronteiriços arrancados… Cada uma das doze fronteiras dava, só por si, um extenso e magnífico livro. Quem o fará? A tristeza é que não resta já muito tempo para o fazer. É que uma imparável e ameaçadora realidade paira sobre a faixa transfronteiriça: o alto grau de envelhecimento da população residente. Não se avistam crianças na fronteira. As escolas estão fechadas. Os parques infantis são consumidos pela ferrugem e enchem-se de plantas invasoras. Muitas aldeias já estão a meio caminho do despovoamento total. Dentro de cem anos, apenas existirão os aglomerados urbanos situados nas duas ou três maiores passagens fronteiriças. O resto, que foi tanto, será uma desoladora mágoa ao longo de uma linha que, essa sim, não se extingue. Uma aldeia raiana que morre é um planeta Terra que se apaga. E porque hoje ainda lá está tudo, vale a pena ir de viagem até esse território em que a maior parte da sua riqueza milenar já está a ser atraída pela voragem de um buraco negro gerado pelos tempos contemporâneos. Em momento posterior, ou mesmo em simultâneo, e se a tal se quiserem arriscar, alguns poderão avançar (se é que não iniciaram já tal caminho) para a cultura humanista da não-fronteira, aquela de que fala o poeta sevilhano Antonio Machado e que transparece no poema que encerra literalmente esta viagem. Não será difícil para qualquer um desses verdadeiros aventureiros, temerários e revolucionários quanto aos padrões do pensamento, chegar à conclusão de que só vivenciando essa cultura, se deixará de riscar fronteiras sobre o martirizado corpo do mundo — de uma vez por todas. JMP Évora, Janeiro 2019
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1. A F RO N T E I R A D E Ă G UA M A N S A
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«A linha de separação entre a soberania do reino de Portugal e a do reino de Hespanha começará na foz do rio Minho […] e se dirigirá pela principal veia fluida do dito rio até à confluência do rio Barjas ou Trancoso.» Artigo 1.º do Tratado de Limites entre Portugal e Hespanha, 1864
«Serpenteando vai o Miño Fondo ás veces como o mare, pero sempre caladiño.» Rosalía de Castro, Poemas Sueltos
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ponta do cabedelo (p) Caminha o viajante pela orla portuguesa do estuário do rio Minho na direcção do Atlântico. Busca o ponto em que as águas já não são totalmente doces, mas também o sal ainda as não satura: local do reencontro entre o filho pródigo que tinha partido, na forma de nuvem, e o regaço materno todo ele mar imenso. Com a foz à vista, o rio torna-se côncavo para o lado português, formando uma extensa baía à beira da qual pontuam pequenos povoados e que é enquadrada por altos montes que nela se reflectem quando todo o cenário é contemplado da margem galega. Avistada, por fim, a zona osmótica entre os dois corpos líquidos, que borbulha como estando em ebulição, o forasteiro imobiliza-se, tomando consciência de que se encontra, naquele preciso momento, no quilómetro zero da sua aventura, que acabará quando atingir a confluência de um outro rio com este mesmo mar, mas mais a sul do hemisfério, lá onde já chega a maresia do Mediterrâneo. Com o sol a cair para o horizonte, uma névoa rasteira começa a subir pela embocadura do rio, terminando, repentinamente, o seu movimento em frente ao casario de Caminha. Para sul, e envolta em névoa cor de mel, a silhueta do forte da Ínsua é um penedo errante que, lembrando um navio fantasma, vai flutuando água abaixo em direcção à grande noite oceânica. camarido (p) Nas águas que banham os pilares de um velho passadiço, avistam-se vários cardumes deslizando em descansados movimentos; de vez em quando, alguns peixes, tomados de razões que só eles conhecem, viram para cima os seus ventres, que se tornam prateados quando a última claridade do dia lhes 23
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bate — intermitentes pedacinhos de céu submersos. Dois pescadores de cana-e-linha arrumam, com um certo ar de desalento, os seus apetrechos, mas em nenhum dos seus baldes se vê qualquer animal marinho capturado. — Que peixes são aqueles em tão grande quantidade? — quis saber o viajante. — São tainhas — respondeu um dos homens. — Mas os senhores não conseguiram apanhar nenhuma delas? — As tainhas não prestam — explicou um deles. — E é preciso um isco especial — acrescentou o outro. O viajante segue caminho levando consigo algumas dúvidas sobre o que acabara de ver e ouvir. Não pára de lhe vir à memória a fábula da raposa e as uvas — «são verdes, não prestam». Mas como não é especialista na insigne e engenhosa arte das pescarias, acaba por interiorizar que a verdade há-de apontar, em grande percentagem e sobretudo por uma questão de experiência feita, para os dois pescadores minhotos que naquele dia, com o rio cheio de peixes, não conseguem (ou não querem) levar nenhum deles para casa. caminha (p) [Sete horas da manhã. O sol no cume da serra da Arga. Os primeiros vagidos do dia que é dado à luz.] a neblina aquece-se no primeiro raio solar e retorna ao silêncio da embocadura do rio as águas correntes lavam-se a si mesmas e já no mar vão à procura da nascente as montanhas baixam um milímetro no cume e oferecem mais terra aos vales e ao novo dia os homens acordam a pensar em possuir coisas não dão cama às palavras nem partem em busca das fontes nem inventam raízes para o húmus herdado 24
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a neblina mais as águas do rio mais as montanhas em peregrinação por dentro do coração da luz não esperam pelo homo sapiens e salvam o mundo (uma vez mais) * Durante a Idade Média era costume alargado e reiterado que o topónimo onde alguém fosse dado à luz fizesse parte da sua identificação pessoal, ocupando o lugar do apelido. Por isso, e não se sabendo documentalmente onde e quando nasceu Pero Vaz de Caminha, nome que desde os bancos da escola primária todos os portugueses aprendem a memorizar como sendo o cronista do achamento do Brasil, ocorrido em 1500, o viajante toma a liberdade de lhe dar origem e baptismo nesta ribeirinha vila do Alto Minho (e talvez não esteja muito longe da verdade, já que os seus ascendentes andaram efectivamente por este território em serviços vários). Existindo, ainda hoje, entre o burgo de Caminha e a foz do rio Minho, a Mata de Camarido, mandada plantar pelo medievo e ilustrado rei D. Dinis, não é difícil imaginar o pequeno Pero Vaz brincando por entre o frondoso arvoredo com os seus companheiros de infância, ou que dessa pequena floresta de coníferas que se estende ao longo do caminho, que o viajante está a percorrer, terão saído algumas tábuas que fizeram parte da caravela que levou o cronista real por mares desconhecidos até às terras a que na sua carta de achamento chamou de Vera Cruz. Nesta oportuna e conveniente efabulação, escrita meio milénio depois, imagina-se o escrivão de Pedro Álvares Cabral, não lhe chegando a bagagem da memória, a não prescindir de levar consigo algo tangível aos sentidos e que tenha feito parte das suas vivências minhotas. A terem acontecido realmente tais possibilidades, elas não serão coisas que causem estranheza, pois a verdade é que transportamos 25
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sempre connosco, bem dentro do ser, o lugar onde viemos ao mundo. E se pudermos levar também, nas nossas migrações, um ou outro objecto material ligado às raízes, tanto melhor. Afortunadamente, o bosque real continua, setecentos anos depois, com todo o seu corpo inteiro e sem sinais de violentação. E o viajante só deseja que por entre as árvores se movimentem duendes ferozmente vigilantes ou se manifestem, no momento certo, sopros eólicos protectores com poderes para apagarem as chamas que um qualquer furtivo incendiário queira acender para compensar os horrores que povoam o seu espírito envolto nas trevas da ignorância. A nobre vila de Caminha, que no Renascimento terá sido um lugar habitado quase perfeito, é hoje uma povoação à espera de que alguém se encante com o seu encanto, lhe devolva o harmonioso corpo que foi usurpado por séculos de incúria e o leve de braço dado até à beirinha das águas do rio, das quais está separado por uma estrada enxameada de veículos motorizados. O viajante quis levá-lo, e quase foi atropelado. monte de santa tegra (e) Nesta expedição pela linha riscada entre os dois países ibéricos, o viajante português atravessa pela primeira vez o rio Minho para, citando Miguel Torga, «olhar, com um movimento de humana e natural curiosidade, o que acontece do outro lado do muro». E o «muro», aqui, é uma massa de água espelhenta que se estende por quase oitenta quilómetros e que só um pouco além de Melgaço é que deixa de ser uma marca política separadora de gentes que há mil anos se saudavam, na mesma língua, como «vizinhos da outra margem». Nos mapas portugueses e castelhanos, esta elevação, a que nada falta para ser um cone perfeito, aparece sob a designação de Santa Tecla, mas nesta crónica vai ficar gravada com o seu nome galego — Santa Tegra —, pois aqui é Galiza, e não Castela ou Portugal. Santa Tegra foi lugar sagrado desde os tempos pré-históricos até ao século XX, e hoje tem de tudo: castros, ermida quinhentista com decoração moderna, casa-solar abandonada, eucaliptos (que afugentaram quase todos 26
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incluem alguns que, com ligeiras modificações, fazem ainda parte da lista descrita no parágrafo anterior. É que o desamor não dá sinais de abrandar. Para esvaziar o espírito da carga de tanta crueldade, ali tão desassombradamente exposta, o viajante sai para a luz do dia, que neste sul é acariciadora de todos os volumes que sob ela caibam, e sobe às ameias do castelo. Pretende ler a topografia do lugar, e constata que o burgo de Castro Marim (que já foi porto fluvial, presentemente assoreado), está agora comprimido entre dois cerros amuralhados; vítima de tão grande compressão, não tem alternativa senão derramar-se todo ele para poente, pois não o pode fazer para os restantes pontos cardeais, todos eles transformados em sapais que não suportam mais do que o peso dos ninhos das aves marinhas. vila real de santo antónio (p) A «Villareal» ouvida na mítica canção de Carlos Cano (com um excerto lírico inscrito como epígrafe no início deste capítulo) é Vila Real de Santo António, onde agora chega o viajante. A canção fala de um romance clandestino entre um contrabandista e uma portuguesa (que afinal era espanhola de nascimento), cujos protagonistas tiveram existência real. «María la portuguesa» existiu mesmo e nasceu em Ayamonte, em 1923; a mãe morreu durante o parto, o pai era incógnito, tendo sido criada por um casal de vizinhos. Foi baptizada com o nome de María de los Ángeles. Os pais adoptivos mudaram-se, durante a Guerra Civil, para Vila Real de Santo António, onde foi registada como Aurora Murta Gonzaga. O contrabandista, morto pela polícia portuguesa, era Juan Flores, de trinta e cinco anos. Durante o velório, em território português, e depois no funeral, em Ayamonte, esteve sempre presente uma mulher misteriosa, toda vestida de negro, que à pergunta «Quem é a senhora?», respondia simplesmente «Maria». Morreu com oitenta e oito anos e está sepultada no cemitério da localidade portuguesa onde viveu desde os seus treze anos. Esta povoação tem um percurso ainda curto no que ao correr do tempo histórico diz respeito. Em tempos anteriores ao século XVII, existia aqui uma aldeia de pescadores, Santo António de Arenilha, que foi engolida pelo mar e pelas areias. 305
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Mas era preciso controlar o tráfego mercantil na foz do rio Guadiana e fazer progredir a indústria pesqueira dos mares do sotavento algarvio. Aproveitando a experiência reconstrutora da baixa lisboeta, o marquês de Pombal, primeiro-ministro do rei D. José, manda desenhar a régua e esquadro uma cidade de corpo inteiro para ser levantada no lugar da desaparecida Arenilha. No prazo de um ano, a nova cidade já estava praticamente toda erguida. Sem curvas, esquinas só em ângulo recto, obedecendo à disposição de um quadriculado perfeito, com quarteirões destinados a actividades específicas, todo o conjunto era a imagem de uma cidade do Iluminismo. Mas os decisores políticos, salvo raríssimos exemplos, sempre tiveram comportamentos obscenamente ligados à sobranceria, ao auto-elogio, à vaidade, à falsa modéstia e à exibição de poder, como acontece no caso presente. Depois da obra feita, mandou-se instalar, em 1775, um obelisco, bem no centro da praça principal, onde, sob o nome do monarca, foi inscrita a seguinte memória sobre os atributos reais, para conhecimento das gerações futuras: «augusto invicto pio», «restaurador das armas, das letras, do commércio, da agricultura», «reparador da glória e felicidade pública», «clementíssimo pay de seus vassalos», «protector da innocência», «vingador supremo da oppressão», «conservador da paz pública», «inimigo da discórdia». Mas o marquês de Pombal, o verdadeiro cérebro do empreendimento, deve estar a dar voltas na tumba. Isto porque na linha de prédios virada para o rio demoliram o edifício original e construíram aquele híbrido Hotel Guadiana, de fachada decorada com elementos próprios da Arte Nova e com dois pisos acima das construções pombalinas circundantes, assumindo-se como imagem a três dimensões de uma evidente aberração urbanística. É, simultaneamente, uma demonstração de total ignorância e mau gosto de uma autarquia que tão levianamente autorizou a obra lá pelos anos vinte do século passado. Uma cirúrgica demolição e a reinstalação da lógica urbana setecentista seriam uma operação que a todos contentaria, excepto àqueles que muito pomposamente hoje andam por todos os cantos a anunciar que finalmente a cidade vai ter um hotel de charme com cinco estrelas. 306
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Tal acto corrector não seria nada de insólito; é que uma rectificação desta natureza já uma vez aconteceu neste burgo algarvio. Passou-se com o edifício da Câmara Municipal, situado na praça principal; também ele em tempos tinha sido alterado às cegas, mas um incêndio posterior acabou por ser o pretexto para nele se voltar a repor a verdade original do século XVIII. Aqui ou em qualquer outro lugar do planeta, não deveriam ser precisas chispas, fortuitas ou intencionais, para que a harmonia e o equilíbrio, que de repente deixaram de o ser, viessem a ser finalmente restabelecidos. * em viagem para o país da outra margem a menina entra no velho barco fronteiriço que já foi pesqueiro e o seu rosto volta-se todo para tudo como um ágil radar sorridente e tu queres entrar nos seus olhos para veres o que eles vêem e quando a pequena criatura diz adeus ao ferryboat que desliza em sentido contrário tu fazes o mesmo mas sem o braço a acenar pois o tempo crescido adormeceu-te o tempo do brincar e sabes logo que a tua migração para dentro do céu da infância levou com ela o teu incompleto mundo de hoje escutarás então nas ondulações de um rumor trazido pelas asas da ternura o recado sem palavras de que a menina só está ali só está ali para dar seiva nova por ti a tudo o que já não sabes fazer a tudo o que o tempo te roubou
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monte gordo (p) O viajante ainda pensou em não vir a Monte Gordo. Sabia que a euforia urbanística baseada no obsessivo conceito turístico «sol-e-praia» tinha atingido, por estas bandas, padrões pouco aconselháveis a olhares mais sensíveis. Mas acabou por deslocar-se, com algumas cautelas, até aqui, pois o topónimo fica ainda dentro do limite dos dez quilómetros que o viajante tinha determinado como raia a percorrer. E queria ver se existiam alguns restos de beleza que tivessem sobrevivido à hecatombe. No fim da visita, o que de valioso importa reter tem, na totalidade, que ver só com o que está à esquerda da avenida marginal (para quem venha de Vila Real de Santo António): um areal a perder de vista com a sua areia superfina, dezenas de barcos de pesca que, por não terem porto de abrigo, fazem de um sector da praia o seu varadouro, e o mar, o grande mar, que hoje, devido ao sol baixo de Outono, quase todo ele é um espelho reverberante de prata. E nada mais há a relatar. ponta da areia (p) A ponta já não é de areia. Puseram-lhe em cima um espigão de enormes pedras que avança pelo Atlântico como um gigantesco objecto perfurante, encaminhando as águas do Guadiana quase até ao alto-mar. No início dessa barreira, um dinamarquês vive há quatro meses numa furgoneta VW, modelo anos sessenta, acompanhado de cão mastim inglês, animal de uma corpulência capaz de escorraçar eficazmente qualquer hipotético assaltante de turistas. À volta do veículo, vêem-se alguns gatos que vivem nos arbustos das dunas e que aparecem todos os dias, pois o estrangeiro dá-lhes alimento e água. Canídeo e felídeos convivem em perfeita harmonia («No problem among them»), tornando a velha Volkswagen uma casa de paz interespécies. O viajante chega ao fim da raia portuguesa e vai agora atravessar o rio para ver como acaba a do lado andaluz, e será lá que colocará um ponto final a esta sua aventura por territórios ao longo de um limite político-tribal onde começam, perduram e acabam muitos fenómenos que não têm necessariamente 308
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só origem nos pensamentos e actos dos homens, apesar de, em muitos casos, estes lhes servirem de veículo, para o bem e para o mal. ayamonte (e) Quer ser uma pequena Sevilha, e consegue-o. Ali estão as laranjeiras ao longo de ruas apertadas e praças do centro histórico, os azulejos de inspiração árabe nas paredes das casas, os gradeamentos de ferro forjado a cobrirem portas e janelas. Rio tem, só lhe falta uma catedral, que teria de ser concebida e executada de acordo com o tamanho do pueblo, assim como a de Coria, na Alta Extremadura. Mas os visitantes que se preparem para ser atacados pelos movimentos opostos da ambivalência provocados por um lugar de culto: a Igreja de Nuestra Señora de las Angustias choca e, ao mesmo tempo, contenta. É anormalmente espaçosa em largura e altura (em consonância com os padrões renascentistas); possui um deslumbrante tecto artesonado mudéjar do século XVI. Até aqui, o forasteiro sorri de satisfação e busca mais motivos de surpresa encantada que porventura estejam espalhados pelo interior do templo. Durante essa procura, surge o choque, que tem origem naquelas escuras capelas laterais, cheias de imagens em tamanho natural; estas podem lançar sobre os mais fracos grandes doses de angústia. Há ainda no altar-mor a imagem da santa, com o rosto coberto de grossas lágrimas — toda ela espalhando angústia em todas as direcções. Mas, para além destes pormenores sempre presentes no espaço interior, naquele dia havia um outro meramente circunstancial: o sacristão, homem já idoso e de forças débeis, tentava estender nos degraus do altar um rígido tapete (talvez tivesse sido lavado); as tentativas, repetidamente frustradas, aliadas aos movimentos impacientes do homem e mais os seus ares de que rejeitaria qualquer ajuda dos presentes, formavam um quadro de desesperada angústia, que teve como efeito a saída apressada do viajante. Tanta angústia dentro daquela igreja (presidida pela Señora de las Angustias) era excessiva para um simples humano mesmo sendo não crente. Mas meia humanidade é devedora a esta terra por um pormenor que tem que ver com fumo e prazer. Rodrigo de Xerez, natural de Ayamonte, acom309
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panhou Cristóvão Colombo até à América logo na primeira viagem, e trouxe de lá uma planta que tinha visto ser fumada pelos nativos com grande agrado. E foi assim que a Europa mergulhou nas delícias traiçoeiras da nicotina, induzidas pela absorção bucal do fumo resultante da queima de um vegetal chamado «tabaco». Mas, pouco depois da chegada a Espanha, Rodrigo acabou por sofrer na pele as consequências de ter trazido o vício originado por aquela novidade tropical. Foi encerrado nos calabouços da Inquisição por andar a deitar fumo da boca e do nariz, o que terá levado os desconfiados inquisidores a pensar que o marinheiro estava possuído por forças satânicas, pois «sólo el diablo podía dar a un hombre el poder de sacar humo por la boca». Foi libertado sete anos depois, quando o uso de fumar tabaco já se tinha generalizado por todas as classes sociais. Hoje, cada cigarro a arder nos lábios de um qualquer habitante do Velho Mundo tem uma raiz invisível enterrada nesta periférica terra andaluza. * O forasteiro, em segunda visita a Ayamonte, é atraído por sons de cerimónia especial vindos da sua já conhecida Igreja de Nuestra Señora de las Angustias. Repara também que a porta principal está aberta de par em par (na primeira visita, apenas a do lado sul dava passagem). Entra. Um casamento. Atmosfera de festa. Sorrisos em todas as faces. Flores. Roupagens que se vestem uma vez na vida. Meninos de fatinho completo. Meninas de vestidinhos de fada. Um padre comunica com a assistência dizendo graçolas. Os noivos muito compenetrados e cientes de estarem a ser os protagonistas. O padre fala no «pão do amor» e na «alegria partilhada». Segue-se o momento do «sim» (e porque foi agora o visitante lembrar-se de que em Espanha a violência doméstica é um cancro social de progressão galopante?). Uma guitarra e o respectivo acompanhamento vocal irrompem pelas altas e belas abóbadas artesonadas. A angústia do cenário católico parece ter fugido pelas altas portas. A cerimónia acaba quando a marcha nupcial, tocada em órgão, ocupa o 310
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lugar da música flamenca. Os noivos (Óscar e Rocío) saem da igreja para um mundo que, hoje, é luminoso, demasiado luminoso; amanhã, será aquilo que eles quiserem ou souberem ou não quiserem ou não souberem. O arroz que lhes é atirado, para além dos habituais votos de comida na mesa, oxalá queira também dizer fartura de felicidade entre dois corações. O sacristão começa a fechar as portas e o visitante, lembrando-se do que lhe acontecera na igreja de San Felices de los Gallegos, corre para a última porta ainda aberta e pergunta ao homem se a igreja vai fechar, ao que ele responde, com alguma rispidez: «Tengo que cerrar la iglesia porque voy para casa a comer como todas las personas, ¿no?» É uma pessoa que assusta. Não deve ser sacristão, mas apenas um simples porteiro amargurado já contaminado pelo conteúdo imagístico da Igreja de Nuestra Señora de las Angustias. O casamento, hoje, transformou um templo mortificador num lugar de alegria e música. O mesmo acontecerá durante os baptismos e comunhões. Mas depois das portas fechadas, não é difícil adivinhar a qualidade do silêncio que se restabelece debaixo daquele tecto belíssimo. A pressa no encerramento da igreja fez com que o forasteiro luso se esquecesse do chapéu no banco onde estivera sentado durante a cerimónia nupcial. Em San Felices, foi o corpo «encarcerado», em Ayamonte, foi o sombrero que ficou a fazer companhia aos santos. Face a estes descuidos, o viajante tem de ter muito cuidado para que aquilo que o liga ao milagre do mundo (e a que alguns chamam «alma») não fique fechado dentro de alguma igreja — previsível e voraz mastigadora de tal «substância» — que por certo ainda irá visitar no futuro; por isso, grava bem fundo na consciência a promessa de nunca largar a mão dessa luz durante o espaço de tempo que vai do entrar ao sair de tão encantatórios lugares, abertos as mais das vezes para céus tenebrosos. isla canela (e) Com o sol em movimento lento e baixo sobre o horizonte que esconde, não muito longe, a costa africana de Marrocos, o viajante termina, neste ponto, a sua viagem pela raia luso-espanhola, começada num tempo e geografias já distantes, numa outra foz, a do setentrional rio Minho. 311
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Nesta praia mais a oeste da ilha Canela, frente a um banco de areia que a maré baixa pôs à vista, coberto de toda a espécie de aves marinhas, o rio Guadiana entrega finalmente as suas águas ao grande oceano. E a raia fronteiriça, por falta de solo e pessoas, extingue-se toda ela em luz cintilante por sobre as águas. O viajante atravessou fronteiras culturais, sociais, linguísticas e políticas. Com todas elas tentou relacionar-se como forasteiro movido por uma inofensiva curiosidade e um inabalável respeito pela diferença. A linha separativa política, de todas a mais artificial, foi a que mais trabalho deu aos seus neurónios responsáveis pela compreensão dos actos humanos. É certo que andou por territórios que estão a dizer adeus a muitas coisas e a dar as boas-vindas a outras que não se sabe o que irão ser quando desabrocharem. De uma coisa não tem dúvidas: o ser que partiu da foz do rio Minho não é o mesmo que chegou a este areal da Isla Canela — o seu universo interior ganhou novas galáxias, que estão agora espalhadas, e mais ou menos visíveis, ao longo das páginas deste livro. De rosto virado para a luz do sul, o viajante recorda a céltica vara-da-justiça, de Rio de Onor, e também o livro oferecido, no interior de uma igreja românica zamorana, por uma mulher poeta; dois objectos que simbolizam na perfeição o que se passa num território tão longe desta nossa contemporaneidade terrivelmente niveladora das diferenças: a memória de culturas sábias já desaparecidas e a presença, repentina, da poesia, que é uma estranha luz que teima em não se apagar mesmo nos lugares onde os mapas acabam. Antes de voltar costas à luz atlântico-mediterrânica que desaba sobre o céu e a terra, e assim iniciar o regresso a casa, o viajante deixa aqui, como que escrito na areia da praia, para eventual encanto dos cidadãos do mundo e reflexão dos entusiastas das fronteiras inventadas pelos homens do poder, este pequeno e pouco conhecido poema do sevilhano Antonio Machado: «Nunca traces tu frontera, ni cuides de tu perfil; todo eso es cosa de fuera.» 312
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DESCRIÇÃO NOMINAL E AFECTIVA DOS OBJECTOS SEMPRE PRESENTES AO ALCANCE DAS MÃOS E DOS OLHOS EM TODO O PERCURSO FRONTEIRIÇO
Mapa das Estradas do ACP – Automóvel Club de Portugal, 99.ª edição. Fiável e fiel indicador do caminho a seguir; mil vezes dobrado e duas mil desdobrado; diligente guia conduzindo o viajante até à fronteira espanhola, indo depois recolhê-lo para mais uma nova incursão pela faixa raiana portuguesa, largando-o, no fim de algum tempo de ausência, à porta de sua casa. Mapa Oficial de Carreteras de España, Ministério de Fomento (edições 2016, 2017 e 2018). A melhor cartografia que há para quem pretenda deslocar-se por terras do vizinho reino de Espanha. A escala, 1:300 000, não deixa nada de fora, pondo na boca de desvios e atalhos um chamamento irresistível. Inexcedível nível de pormenor e precisão ao longo de toda a raia espanhola. Carta Militar de Portugal, edição do Instituto Geográfico do Exército. Em todos os troços fronteiriços há pormenores que só estão registados em algumas das mais de sessenta folhas raianas desta fabulosa cartografia. A escala 1:25 000 consegue empurrar os mais renitentes sedentários para estradas, caminhos e veredas. Finis Portugalliae: Nos Confins de Portugal, de Maria Helena Dias. Notável documento sobre a formação ao longo dos séculos da fronteira luso-espanhola. Obra enriquecida com cartografia, plantas e fotografias em abundância; cada página está enquadrada pelo articulado do Tratado dos Limites, de 1864. Pode consultar-se na íntegra no sítio https://www.igeoe. pt/downloads/file143_pt.pdf Viagem a Portugal, de José Saramago. A frescura literária de um registo de viagem que, nos pontos em que toca a geografia da fronteira, é uma fonte inspiradora e encorajadora da descoberta do genuíno, o qual, em algum momento, súbita e inevitavelmente, abençoará os sentidos do forasteiro. La Luz que Asoma Donde Muere el Día, de Jesús Maqueda. Este livro em castelhano é o irmão gémeo daquele que o leitor tem neste momento nas mãos. O seu conteúdo resulta de uma viagem por toda a raia/raya que o autor espanhol empreendeu há uns anos. Em alguns momentos, esta belíssima obra foi, no caminho do viajante português, uma seta indicadora de realidades raianas difíceis de descobrir. Guia Arqueológico da Península Ibérica, de Luis del Rey. No longínquo da geografia está muito do longínquo no tempo. E é preciso saber onde se localizam os sinais arruinados da meninice humana.
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Dicionário de Português-Espanhol-Português. O autor destas viagens há mais de sessenta anos que está em contacto com o idioma de Cervantes. Porém, basta um deslocado grãozinho gramatical para emperrar toda uma comunicação verbal ou a leitura de algo que promete ser interessante. Este dicionário destinou-se a soprar um ou outro desses grânulos para que os «bois» pudessem ser chamados pelo nome verdadeiro. Máquina fotográfica. Oh, como este cronista lamenta não dominar a suprema arte do desenho, pois de muitas coisas entradas pelos olhos faria, com as mãos, sentido retrato no caderno de bolso! Mas não, a vida, ou a escola, ou a sua genética, não lhe ofertaram essa fascinante ferramenta geradora de harmonia no traço e nas cores que saem dos dedos. Daí a existência desta máquina de fazer fotografias, pequena, de meter no bolso — sempre à vista é um objecto que separa observador e observado. Binóculos. Para trazer para perto o que longe estava (e tantos, tantos longes estão todos os dias a nascer nos territórios remotos…). Caderno de registos. Esta seria uma viagem daquelas que só se realizam uma vez na vida. Por isso, era quase um crime que não se fizesse um registo escrito dela. Para tal, meteu-se na mochila um robusto caderno e com bastantes páginas para nelas caberem os conteúdos de mais de mil quilómetros de fronteira. No fim de contas, o que nele ficou escrito talvez seja a voz e o silêncio da fronteira na segunda década do século XXI — para memória futura, se futuro houver. Ramo de oliveira. Por sobre o tablier do automóvel esteve sempre presente um pequeno ramo retirado, pelo viajante, de uma das oliveiras plantadas há mais de vinte anos no lugar onde vive. Para lembrar e não esquecer que as coisas mais preciosas da nossa vida vão connosco para todo o lado e que o corpo, mesmo indo longe, mais tarde ou mais cedo vai ter de regressar a casa. E também para mostrar, a quem tivesse dúvidas sobre as intenções do forasteiro, que este só transportava consigo paz, paz e só paz.
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LISTA DOS LUGARES DE REGISTO
A Guarda (E), 27 A Gudiña (E), 95 A Pubiña (E), 51 A Xironda (E), 79 Adrão (P), 58 Álamo (P), 296 Alares (P), 209 Alcañices (E), 116 Alcántara (E), 206 Alcobaça (P), 52 Alcoutim (P), 292 Aldea del Obispo (E), 174 Aldeadávila (E), 144 Aldeia do Bispo (P), 185 Aldeia do Bispo (P), 197 Aldeia Nova/Aldi Nuoba (P), 127 Alegrete (P), 231 Alfaiates (P), 181 Algosinho (P), 142 Almada de Ouro (P), 302 Almeida (P), 172 Alto da Sapinha (P), 161 Alto de São Mamede (P), 229 Amareleja (P), 261 Aranhas (P), 197 Aroche (E), 272 Arronches (P), 235 As Neves (E), 39 Avelanoso (P), 116 Ayamonte (E), 309 Azinhal (P), 303
Baltar (E), 78 Barca d’Alva (P), 162 Barragem de Vilarinho das Furnas (P), 62 Barrancos (P), 268 Barxa (E), 95 Batocas (P), 178 Beirã (P), 225 Bemposta (P), 140 Bolideira (P), 86
Babe (P), 107 Badajoz (E), 238 Badilla (E), 132
Dehesa La Solana (E), 223 Duas Igrejas/Dues Eigreijas (P), 132
Calabor (E), 100 Caldas do Gerês (P), 64 Calvos (E), 74 Camarido (P), 23 Caminha (P), 24 Campo Maior (P), 237 Carbajo (E), 208 Casas de la Duda (E), 229 Casiñas (E), 228 Castelo Rodrigo (P), 168 Castelo Velho (P), 291 Castro de Alcañices (E), 120 Castro Laboreiro (P), 54 Castro Marim (P), 304 Cedillo (E), 219 Cevide (P), 50 Chaves (P), 82 Cheles (E), 254 Colmeal (P), 170 Constantim/Constantin (P), 119 Cova da Lua (P), 98
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Eira da Lapela (E), 52 El Granado (E), 287 El Marco (E), 233 El Picón de Felipe (E), 143 Eljas/As Ellas (E), 192 Elvas (P), 240 Encinasola (E), 269 Entrimo (E), 58 Ermida de Nuestra Señora de Piedras Albas (E), 279 Ermida de Santa Cruz (E), 277 Escalhão (P), 165 Escarigo (P), 168 Esperança (P), 234 Estação de Bruçó (P), 145 Estação de la Fregeneda (E), 164 Estrada BA-143 (E), 259 Estrada CC-112 (E), 230 Estrada EX-107, km 10 (E), 241 Estrada EX-107, km 50 (E), 255 Estrada EX-108, km 125 (E), 199 Estrada EX-117, km 15 (E), 207 Estrada EX-374 (E), 224 Estrada HU-4401 (E), 291 Estrada HU-4402 (E), 288 Estrada HU-7401 (E), 274 Estrada HU-8100 (E), 271 Estrada M525 (P), 222 Estrada N218-2 (P), 115 Estrada N221 (P), 153 Estrada N256 (P), 256 Estrada N308-4 (P), 65 Estrada N332 (P), 177 Estrada N353 (P), 203 Estrada N359-4 (P), 223 Estrada N385 (P), 260 Estrada OU-1110 (E), 77 Estrada OU-310 (E), 86 Estrada OU-312 (E), 63 Estrada ZA-925 (E), 100 Estrada ZA-L-2435 (E), 117 Fadagosa (P), 224 Fariza (E), 133 Feces de Cima/Feces de Abaixo (E), 83 Fermoselle (E), 137
Figueira de Castelo Rodrigo (P), 168 Fóios (P), 186 Forcalhos (P), 182 Forte de la Concepción (E), 174 Foz de Odeleite (P), 301 Foz do rio Chanza (E), 278 Foz do rio Sever (P), 219 Fraga do Puio/Peinha de l Puio (P), 135 França (P), 101 Freixo de Espada à Cinta (P), 150 Fronteira Badajoz-Campo Maior, 238 Fronteira da Ameijoeira, 56 Fronteira de Caia/Caya, 239 Fronteira de São Gregório, 50 Fronteira de São Leonardo, 258 Fronteira de San Martín del Pedroso, 113 Fronteira de Valencia del Mombuey, 261 Fuentes de Oñoro (E), 176 Galegos (P), 227 Granja (P), 259 Guadramil (P), 103 Guerreiros do Rio (P), 294 Herrera de Alcántara (E), 213 Hinojosa de Duero (E), 155 Ifanes/Infainç (P), 119 Isla Canela (E), 311 Juromenha (P), 251 La Alamedilla (E), 179 La Alberguería de Argañán (E), 181 La Codosera (E), 232 La Fontañera (E), 227 La Fregeneda (E), 163 La Jola (E), 230 Lageosa (P), 183 Lagoaça (P), 145 Lamas de Mouro (P), 53 Las Herrerías (E), 277 Lindoso (P), 59 Lobios (E), 61 Lumbrales (E), 166
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Mairos (P), 85 Malhada Sorda (P), 178 Malpartida (P), 172 Malpica do Tejo (P), 213 Mámoles (E), 133 Mandelos (E), 43 Manzalvos (E), 96 Marco (P), 233 Marco fronteiriço n.º 1 (P), 49 Marvão (P), 226 Mata da Albergaria (P), 63 Mata de Lobos (P), 167 Mazouco (P), 147 Melgaço (P), 40 Mesquita (P), 285 Mieza (E), 146 Mina do Bugalho (P), 251 Mina de São Domingos (P), 277 Miradouro de São João das Arribas (P), 128 Miralina (E), 129 Miranda do Douro/Miranda d l Douro (P), 130 Moimenta (P), 98 Moldones (E), 105 Monção (P), 35 Monsaraz (P), 256 Montalegre (P), 78 Montalvão (P), 220 Monte de Santa Tegra (E), 26 Monte Francisco (P), 304 Monte Gordo (P), 308 Monte Vascão (P), 289 Montejuntos (P), 254 Montesinho (P), 99 Montinho das Laranjeiras (P), 293 Mosteiro de Ganfei (P), 33 Mosteiro de Sanfins (P), 33 Mosteiros (P), 231 Mourão (P), 257 Mourilhe (P), 71 Moveros (E), 118
Odeleite (P), 301 Oimbra (E), 81 Oliva de la Frontera (E), 267 Olivença/Olivenza (P) (E), 249 Ouguela (P), 236 Outeiro (P), 115 Outeiro (P), 255
Nave de Haver (P), 178 Naves Frías (E), 184 Noudar (P), 267 Nuez (E), 108
Rabaças (P), 230 Randín (E), 74 Ribeira de Tourões, 175 Rio Chança (P), 275
Paderne (P), 41 Palácio da Brejoeira (P), 37 Palazuelo de Sayago (E), 134 Paradela/Paradela (P), 121 Paymogo (E), 276 Penamacor (P), 195 Penedo dos Três Reinos, 96 Penedo Durão (P), 152 Penha Garcia (P), 198 Pereña de la Ribera (E), 141 Picoitos (P), 278 Piedras Albas (E), 203 Pinheiro Novo (P), 94 Pitões das Júnias (P), 72 Pomarão (P), 279 Ponta da Areia (P), 308 Ponta do Cabedelo (P), 23 Ponte da Ajuda (P) (E), 247 Ponte da Misarela (P), 64 Ponte de Alcántara (E), 205 Ponte de San Lorenzo (E), 139 Ponte do Mouro (P), 39 Porcadela (E), 30 Portela do Homem (P), 63 Póvoa e Meadas (P), 222 Puebla de Azaba (E), 179 Puente Ayuda (P) (E), 248 Puerto de la Laja (E), 286 Puerto Viejo (E), 191 Quinta da Batoca (P), 154 Quintanilha (P), 113
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Rio Chanza (E), 276 Rio de Onor (P), 102 Riohonor (E), 103 Riomanzanas (E), 104 Rosal de la Frontera (E), 273 Rosário (P), 252 Rosmaninhal (P), 204 Rubiás (E), 75
Siega Verde (E), 173 Soajo (P), 60 Soalheiras (P), 208 Sobradillo (E), 166 Sobral da Adiça (P), 272 Soutelinho da Raia (P), 80
Salto de Castro (E), 121 Salto de Saucelle (E), 152 Salvaterra de Miño (E), 36 Salvaterra do Extremo (P), 202 San Benito de la Contienda (P) (E), 250 San Felices de los Gallegos (E), 169 San Francisco de Olivenza (P) (E), 247 San Martín de Trevejo/San Martín de Trevellu (E), 193 San Martín del Pedroso (E), 114 San Pedro de los Majarretes (E), 228 San Silvestre de Guzmán (E), 295 Sanlúcar de Guadiana (E), 293 Santa Bárbara de Casa (E), 274 Santa Comba (E), 57 Santa Marta (P), 288 Santana de Cambas (P), 278 Santiago de Alcántara (E), 211 Santiago de Rubiás (E), 75 Santo Aleixo da Restauração (P), 270 Santo António das Areias (P), 225 Santuário da Boa Nova (P), 253 Santuário da Peneda (P), 56 Santuário da Virgem de Carrión (E), 232 Santuário de Bótoa (E), 237 Santuário de Nossa Senhora da Enxara (P), 235 Santuário de Nossa Senhora da Luz (P), 118 São Julião (P), 107 São Pedro de Rio Seco (P), 176 Saucelle (E), 151 Sedas (P), 286 Segura (P), 203 Sendim/Sendin (P), 135 Serra de las Contiendas (E), 269 Sezelhe (P), 71
Tabagón (E), 28 Termas de Monfortinho (P), 198 Tó (P), 141 Torre de Lapela (P), 34 Torregamones (E), 131 Tourém (P), 73 Trabanca (E), 139 Tui (E), 30 Valença (P), 32 Valencia de Alcántara (E), 226 Valencia del Mombuey (E), 260 Vales Mortos (P), 275 Valverde del Fresno/Valverdi du Fresnu (E), 191 Varziela (P), 55 Venade (P), 27 Vide (E), 40 Vila Nova de Cerveira (P), 29 Vila Real de Santo António (P), 305 Vila Verde de Ficalho (P), 273 Vilar de Cervos (E), 83 Vilar de Mouros (P), 28 Vilar de Perdizes (P), 79 Vilar Formoso (P), 177 Vilarello (E), 84 Vilarinho da Lomba (P), 93 Vilarinho dos Galegos (P), 142 Villablanca (E), 303 Villadepera (E), 127 Villanueva del Fresno (E), 258 Villar del Ciervo (E), 172 Villardiegua (E), 129 Villarino de Manzanas (E), 105 Villarreal (P) (E), 250 Vilvestre (E), 149 Zarza la Mayor (E), 201
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© SISTEMA SOLAR, CRL (DOCUMENTA) RUA PASSOS MANUEL, 67 B, 1150-258 LISBOA © JOAQUIM M. PALMA, 2020 1.ª EDIÇÃO, OUTUBRO DE 2020 ISBN 978-989-9006-46-1 FOTOGRAFIAS E MAPAS DO AUTOR NA CAPA: FOTOGRAFIA DE MANUELA GALANTE REVISÃO: LUÍS GUERRA DEPÓSITO LEGAL 000000/20 ESTE LIVRO FOI IMPRESSO NA EUROPRESS RUA JOÃO SARAIVA, 10 A 1700-249 LISBOA PORTUGAL