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David da Silva M
viagem no tempo
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Após a publicação, em 2015, de “Murtosa - Pedaços de Vida”, David da Silva edita ‘Murtosa - Viagem no Tempo’, com o objetivo de continuar a dar a sua cota parte de colaboração para que não se percam fragmentos da memória coletiva e também muito do que conhece sobre a gente e terra que o viu nascer. O livro é uma coletânea de histórias de vida, curiosidades e costumes do povo da Murtosa, do distrito de Aveiro, e permite recuar no tempo, mais precisamente até aos primeiros anos do século XX.
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FICHA TÉCNICA
1.ª Edição Lisboa, janeiro 2022
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capa: Ângela Espinha paginação: Alda Teixeira foto de capa: Celestino da Silva
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edição: edições Ex-Libris ® (Chancela Sítio do Livro) título: Murtosa – Viagem no tempo autor: David da Silva
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isbn: 978-989-9028-43-2 depósito legal: 491851/21 © David da Silva
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Declinação de Responsabilidade: a titularidade plena dos Direitos Autorais desta obra pertence apenas ao(s) seu(s) autor(es), a quem incumbe exclusivamente toda a responsabilidade pelo seu conteúdo substantivo, textual ou gráfico, não podendo ser imputada, a qualquer título, ao Sítio do Livro, a sua autoria parcial ou total. Assim mesmo, quaisquer afirmações, declarações, conjeturas, relatos, eventuais inexatidões, conotações, interpretações, associações ou implicações constantes ou inerentes àquele conteúdo ou dele decorrentes são da exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) autor(es).
publicação e comercialização:
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DEDICATÓRIA
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Quero que este livro seja uma homenagem à memória do meu pai, David de Jesus da Silva, conhecido como David Timóteo ou David da loja, filho de Inácio António da Silva e Iria de Jesus Vicente, e também à memória da minha mãe, Maria do Carmo da Silva, conhecida por Maria do Carmo Bôrras ou Maria da loja, filha de Celestino Maria Marques e de Maria Piedade da Silva. O meu pai nasceu a 13 de Abril de 1922 no Outeiro da Maceda, na freguesia e concelho da Murtosa e faleceu a 22 de Setembro de 2015, em Toronto, Ontario, Canadá. Era um homem de fé, simples mas inteligente, respeitador, entusiasta, dedicado ao trabalho e sempre pronto para ajudar os outros. A minha mãe nasceu a 10 de Setembro de 1927, também no Outeiro da Maceda, e faleceu a 5 de Novembro de 2017, em Salreu, freguesia do concelho de Estarreja. Era uma mulher alegre, trabalhadora, autoconfiante e corajosa. Casaram e tiveram 12 filhos. Foram excelentes educadores. Muita da informação, que uso neste meu trabalho, veio através deles. Dedico-lhes o livro. Merecem esta homenagem.
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AGRADECIMENTOS
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Agradeço a colaboração das seguintes pessoas na recolha de várias informações que uso em ‘Murtosa – Viagem no tempo’:
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Abílio Fonseca, Adelaide Silva, Agostinho Abel Almeida, Albertina de Jesus, Alberto Sabino, Albino Branco, Alcina Timóteo da Silva, Alexandra Couras, Alexandra da Silva, Alexandre da Silva, Alexandrina Farinhas, Alzira Cruz, Alzira Santos, Alzira da Silva, Amália Dos Santos, Amélia Cirne, Amélia Pereira, Amélia Vaz, Américo Figueiredo, Américo Marques, Anabela Rodrigues, Ana Cascais Vieira Tavares, Ana Da Silva Valente, Ana de Oliveira, Ana e Domingos Silva, Ana Emília Silva, Ana Gonçalves, Ana de Jesus Coelho, Ana Lagoncha, Ana Maria Faustino, Ana Oliveira, Ana Rosa Silva, Ana Ruela, Ana Silva, Anita Cardoso, Angelina Barboa, Angelo Miguel UJ, António A. Branco, António Barroqueiro, António Branco, António Da Silva, António José Cravo, António Lopes, António Louvado dos Santos, António Morais Oliveira, António Pato da Silva, António Preta, António Rendeiro, António Santos, António Ventura Rebelo, António Vilar, Augusta de Matos, Áurea Campos, Avelino Silva, Blandina Elisa Fernandes, Blandina José Timóteo, Blandina Vieira, Bruno Fátima Pinho Silva, Cândida Rendeiro, Carla Matos, Carlos Faustino, Carlos Oliveira, Carmelinda Silva, Carminda da Silva Matos, Carol Pedroso, Carolina Coelho, Catarina Rebimbas, Celeste Almeida, Celeste Campos, Celeste da Silva, Celeste Paiva, Celestina Pereira, Celestino da Silva, Clara Amador, Dalila Cordeiro Letra, Daviana Rodrigues, Fabiana 7
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R, David António Carinha, David de Jesus da Silva(pai), Delfim Oliveira, Deolinda Amador, Deolinda Lopes, Dina Oliveira, Domingos de Sousa, Domingas de Sousa, Domingos Santos, Domingos da Silva, Domingos da Banda Nova Força, Élio José Vieira, Emília Fidalgo, Elsa Cunha, Ermelinda Timóteo, Fabiana Rodrigues, Família Maio Rocha, Fátima Castro, Fátima Evangelho Santos, Fátima Martins, Fátima Marques, Fátima Marques(2), Fátima Oliveira, Fátima Pinho, Fátima Tavares, Felipe Paiva, Fernanda Barroso, Fernanda Tavares, Fernando Camões, Fernando da Silva, Fernando Marques, Filomena Marques, Florindo Rodrigues, Francisco Miranda, Francisco Padinha, Francisco de Oliveira, Generosa Barbosa, Gina Cruz, Glória Cascais, Glória dos Santos, Glória Oliveira, Glória Rebelo, Glória Rodrigues, Gracinda Pinho, Gracinda Rendeiro, Guilhermina Pita, Gus da Silva, Helena Branco Helena, Henrique Amador, Idalina David Rendeiro, Ilda Oliveira de Castro, Inácio Timóteo, Isabel Cirne, Isabel Cristina Silva Campos, Isabel Ferreira, Isabel Tavares, Jacintamanu da Silvasantos, Jaime Ruela, Jack Afonso. João Campos, João Carlos dos Santos, João Cirne, João E Maria Lanzeira, João Maria Galvão, João Marques, João Matos, João Oliveira, João Paulo Matos, João Pinho Matos, João Oliveira, João Rebelo, João Rocha, João Tavares, João Santos Chinelo, João Silva, João Vitor, Joaquim Maria Marques, Joaquim Neno, José Alda Da Silva, José Júlio, José Oliveira, José Rebelo Moliceiro, José Santos, José Vieira, Judite Timóteo, Júlia Antão da Cunha, Júlia Matos, Júlia Oliveira, Júlia Pinho, Julia Santos, Justino Amador, Laurinda Campos, Leandro Amador, Leonor Matos, Lídia Padinha, Leonor Matos, Li Na, Liliana Filipa Couras, Lourenço Gradim, Lúcia Marques, Lucília Tavares, Lucy Da Silva, Lucy Pinho, M Lúcia Rendeiro Silva, Madalena Rebelo, Mano Vieira, Manuel Amador, Manuel Antão, Manuel Barbosa, Manuel Coradinho, Manuel E Ana Matos, Manuel Fonseca, Marco Campos, Manuel Santos, Manuel Silva, Manuel da Silva, Manuel Vieira, Manuel Vitória Neno, Manuela Gradim Brandão, Márcio Nunes, Maria Adelaide, Maria Albertina da Silva, Maria Amador, Maria Barroqueiro, Maria 8
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Carinha, Maria Conde, Maria Conceição Gonçalves, Maria Da Anunciação Cirne, Maria da Cruz Pires, Maria da Silva, Maria do Carmo da Silva(mãe), Maria Dos Anjos Rodrigues, Maria Domingos Vigário, Maria dos Santos, Mariana Resende, Maria Emília Leite, Maria Emília M. Carabau, Maria Isilda Sequeira, Maria José Marques Marques, Maria Júlia B, Maria Júlia Barroqueiro, Maria Dasilva, Maria Júlia Castanheira, Maria Júlia Da Silva, Maria Júlia Silva, Maria Júlia Oliveira, Maria Lúcia Rendeiro Silva, Maria Maia, Maria Morgado, Maria Neno, Maria Padeiro, Maria Piedade da Silva, Maria Pinho, Maria Rebimbas, Maria Regateiro, Mariana Resende, Maria Ribeiro, Maria Santos, Maria Sebolão Oliveira, Maria Silva, Maria Silva (2), Maria T. Silva, Maria Tavares, Maria Teixeira, Maria Teresa Barbosa Marques, Maria Valente, Maria Vaz, Marisa Jorge Pires, Marlene Silva, Milú Loureiro, Mira Santos, Mónica André, Natália de Lurdes da Silva, Nat Fonseca, Natividade Amaro, Nazaré Oliveira, No Key, Nuno Costeira, Palmira Cunha de Matos, Paula Tavares, Paulo Horta Carinha, Rafael Matos Rosinda Soares, Romeu Emília Costeira, Rosa Barroso Moreira, Rosa Carinha, Rosa Couto, Rosa Cruz, Rosa Lopes, Rosalina Ramos, Rosalina Silva, Rosa Maganinho, Rosa Maria Rendeiro, Rosa Mendes, Rosa Pita, Rosa Santos, Rosário Tavares, Sabino Domingos, São Oliveira, Sérgio Oliveira, Silva Ana(2), Silvério Silva, Sra Benfica, Susana Oliveira, Susana Pires, Tânia Costeira Fernandes, Telma Oliveira, Teresa Vigário, Tiago Rodrigues, Tony Louvado, Vanessa Tiago, Vânia Timóteo, Venâncio Sobina, Vera Matos, Vitor Matos, Vitor Barbosa, Zeferino da Fonseca Lopes, Zeza Papagaia, Zulmira Barroqueiro.
Agradeço ao meu irmão, CELESTINO MANUEL DA SILVA, pela disponibilidade da foto que uso na Capa. Agradeço a ANTÓNIO MORAIS OLIVEIRA a nota de abertura deste livro.
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NOTA DE ABERTURA Por António Morais Oliveira
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Todos nós sonhamos com o encantamento de fazer o tempo voltar para trás. Todos nós já acalentámos essa esperança juvenil, depressa desfeita pela realidade crua dos nossos passos ao encontro do horizonte, mais ou menos longínquo do fim dos tempos. Não, o tempo não volta para trás! O tempo é uma linha contínua, uma autoestrada, finita, por vezes com curvas, sinuosas, mas sem escapatórias para retroceder. Mas se nós, massa orgânica, vemos frustrados os desejos de retorno, já a nossa memória pode ser prodigiosa, conseguir a vitória de viajar no espaço e voltar à idade da inocência, recuperar o calor dos afetos, ressuscitar os abraços dos amigos, os beijos da mãe e do pai, o folar dos padrinhos, reviver o linguajar, recriar as tradições, os usos e costumes dos antigos e, até, acariciar a enxerga empalhada, lá arremessada no sótão. Esta benção de uma memória prodigiosa não é graça concedida a todos nós. Conservar a memória e ganhar asas para voar no espaço intemporal, “viajar no tempo” como conseguiu o David da Silva neste seu livro de recordações, é um dom raro. Muito talvez pela herança genética, mas acima de tudo pela sua formação humanista, cristã, solidária, o David da Silva bebeu o cálice do 11
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sangue desta Murtosa que o viu partir para a terra prometida do Canadá já lá vão mais que trinta anos. Mas será que o David, de Alma e Coração, alguma vez partiu da Murtosa, da Rua D. Dinis, do cais do Chegado, da Rua, dos Namorados da Ria, do Grupo Etnográfico? Alguma vez o David deixou de mirar as velas ao vento dos Moliceiros? Alguma vez o David deixou de respirar o ar, agre e doce, da Maresia? Alguma vez o David deixou de se inebriar pelos olhos e pelos quadris das moçoilas varinas? O meu amigo David “viajou no tempo” como Garrett viajou na nossa terra, como Saramago viajou por Portugal, e sem nunca ter “saído” da sua Murtosa. A tal memória viva, saudosa, prodigiosa! O David da Silva, um dos filhos do “David da loja”, contrariando um cliché dos tempos modernos, quis “voltar” a um lugar onde foi FELIZ, e ajudou muita gente a ser. Bem-vindo. Foi um prazer imenso ter sido companheiro do David da Silva nesta sua “viagem no tempo” à Murtosa. Então o convite para me sentar a seu lado, da banda da janela, foi um privilégio que vou guardar no baú das gratidões. Obrigado, David. Mas, como no comboio do David há lugar para todos nós, grande família Murtoseira, entre, sente-se, abra os olhos e desperte os sentidos para uma viagem de afetos, memórias, carinhos, e uma Ria e um Mar de emoções. Boa viagem.
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PREFÅCIO
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Cinco horas da tarde. Estou no computador! É Quarta-feira, já caíram farrapos de neve, está um dia frio aqui na região de Maple, da cidade de Vaughan, no Canadá. Não se vê quase ninguém nas ruas. A propagação célere e feroz do coronavírus, agora numa terceira onda, está a deixar meio mundo ainda mais perplexo e assustado. A grande maioria das pessoas recolhe-se em casa e só de lá sai quando necessário. Há uma preocupação grande em evitar o contágio desta doença infeciosa, quer lavando várias vezes as mãos e desinfetando-as, quer usando luvas e máscara, ou respeitando o distanciamento físico. Isto não está bom, mas a vacinação contra a Covid-19 despertou alguma esperança de melhoria. Acredito que vamos vencer. Emigrei para este país em 1987, vim para Toronto. Gosto de Toronto, gosto também de Maple onde ainda resido, mas “minha terra, minha terrinha”, assim diz o nosso povo e é verdade. Trouxe para o Canadá muito do que vivi na Murtosa, mas só em memória, não é a mesma coisa. Tenho uma necessidade grande de escrever, adoro escrever sobre o local em que nasci, sobre os meus conterrâneos, suas caraterísticas e valores. Sinto-me identificado. O livro 13
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‘Murtosa, viagem no tempo’ foi um mergulho nas origens e uma descoberta de mim mesmo. Escrever tem sido mais necessidade do que opção. Fiz planos para publicar o livro no fim de Outubro de 2020, e de tal modo que o leitor o pudesse obter a partir do mês de Novembro ou Dezembro desse ano. Puro engano! A pandemia de coronavírus parou mais uma vez o mundo e os meus planos ficaram adiados! O que pretendo com este livro? Boa pergunta. Não fujo à resposta. O objetivo é continuar a dar a minha cota parte de colaboração para que não se percam fragmentos de memória coletiva e também alguns conhecimentos sobre o nosso povo e o local que habita. O livro é uma coletânea de histórias de vida, curiosidades e costumes da gente da Murtosa, do distrito de Aveiro, e permite-nos recuar no tempo, mais precisamente até aos primeiros anos do século XX. “Murtosa, viagem no tempo” é a continuação do meu primeiro livro, “Pedaços de Vida”. Retifica alguns pormenores, apresenta novidades, curiosidades, e histórias reais que o leitor pode apreciar, pelo menos assim espero. A linguagem usada é simples, cheia de termos e expressões do povo de que faço parte e estimo. Fiz questão de ser muito realista no que escrevi. Devia ter respeitado também o aspeto formal da escrita de então mas, porque se trata de uma descrição de vivências dessa época feita nos dias de hoje e também porque assim não ficará estranho para a geração atual, resolvi obedecer ao ‘Acordo Ortográfico de 1990’. Espero que o leitor me compreenda. E me perdoe se a opção não foi a melhor. E pronto, fico-me por aqui. Vou fechar o computador, acho que escrevi o suficiente para um Prefácio. Já são 7 da tarde deste dia, 21 de Abril de 2021. Boa tarde então, para alguns já é boa noite e, para outros, bom dia. 14
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I Canto onde nasci
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Vou recuar no tempo. Posso fazê-lo, não posso? Que Deus me preserve a memória. Estou no Outeiro da Maceda, na Freguesia da Murtosa, Canto de moliceiros e pescadores. Acontece o ano de 66. É Sábado, dia 13 de Agosto. Gozo as férias de Verão. No próximo mês já recomeça a escola, vou frequentar o quarto ano do Seminário de Santa Joana Princesa, em Aveiro. O Seminário é uma das escolas dos pobres. Sorte a minha! Os meus amigos também são pobres e não têm igual sorte, a alguns nem a quarta classe deixaram fazer! Andam ao rio, na vida do moliço, que a necessidade lá de casa não é justificação mas obriga-os ao duro. Crianças sem tempo para o ser! Não sinto as dores do joelho esquerdo, isso é coisa do meu futuro. O meu cabelo não está grisalho, mas preto. Uso-o curtinho como manda a tradição. Adio assim no tempo a próxima ida ao barbeiro. O Ti António Zera é o barbeiro do Canto. É um homem alto, forte, nada simpático à primeira impressão, mas com o convívio damos conta que é um homem divertido. Gosta de falar e gesticula com a mão direita a marcar o ritmo das palavras que lhe saem fluentemente. A relação de alguns miúdos com 15
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ele não é a melhor! Será pelo facto de ser o Ti António Zera quem lhes corta o cabelo? Sei que alguns não gostam nada de o cortar! Atiram-lhe pedras ao portão da casa e escondem-se mais à frente para lhe verem na cara uma pontinha de raiva por não ter tido hipótese de saber quem fez tal serviço! “Garotada dum raio”, diz para si mesmo. Abana a cabeça e volta para despachar a clientela na barbearia que também é o seu local de costura dos fatos por medida. Além de barbeiro, ele é um alfaiate reconhecido no Canto e não só. O Ti António Zera corta o cabelo ao pessoal macho da nossa casa e a barba a quem a tem; por força da tradição, as minhas irmãs ainda não estão autorizadas a cortar o cabelo! Ele faz também os fatos do meu pai e do meu irmão mais velho. Tive direito a um fato quando entrei no Seminário, foi ele também quem o fez. Era cinzento escuro, ao gosto do povo que usa cores escuras. Fizeram-me crer que essa cor do meu fato era a mais apropriada à condição da Casa para onde fui com dez aninhos. Eu acreditava em tudo. Não gosto nada de usar fato, deixa-me diferente dos outros meninos! Adoro vestir-me de maneira simples, camisola de mangas curtas e calças de pano não muito justas ao corpo. Ainda não tenho casaca para os dias mais frios, embora me dê conta, pela pouca televisão que vejo, que há já bastante gente a usar a de cabedal nesses dias! É um sonho usar casaca de cabedal! Estamos no tempo do Rock’n’Roll e fascina-nos a maneira de vestir de Elvis Presley. Mas, o atraso em que habitualmente chegam as coisas novas ao nosso Canto e uma certa apatia à novidade, que a condição de seminarista dá, levam a que o meu sonho de ter casaca de cabedal só se realize por 73! O mesmo com o cabelo, só por essa altura é que o deixarei crescer, embora os Beatles tenham dado um contributo relevante 16
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à moda ainda no ano 60. Também só pelo ano 75 é que hei-de usar as calças ‘jeans’ na cor azul que Levi Strauss tinha proposto na última década do século XIX, em S. Francisco, Califórnia. O estilista Calvin Klein é quem há-de divulgar esse tipo de calças no princípio de 70. Mas, essas coisas dizem respeito a daqui a uns aninhos. Agora estamos no ano 66. Tenho três pares de calças de pano, nunca fui muito de usar calções! Rompi um par delas quando jogava à bola na Feira dos Cinco. Além da reprimenda da minha mãe por causa das calças que rompi, dei mais trabalho à costureira. A Maria Timóteo é uma das costureiras do Canto. Acreditais que ela precisa de uma semana para dar a volta à nossa roupa? É verdade. Somos dez, seis rapazes e quatro raparigas, além dos nossos pais. Seríamos onze, mas um faleceu. A fábrica ainda não fechou e pode vir mais gente. O futuro confirmou que nasceu mais um rapaz, no ano de 69. E por aí ficou. Com tanta gente a usar roupinha que, com o tempo, deve ser consertada, a costureira tem mesmo que ficar na nossa casa por dias. Também acontece o mesmo noutras casas, que aqui no Outeiro da Maceda há várias famílias com muitos filhos. Na família da Maria Bancaneza são quatorze os filhos vivos! Acabou de lhe nascer uma menina no passado mês de Maio deste ano de 66. Lá mais para a frente, haverá quem justifique as famílias numerosas com o facto de não se ver ainda por cá muita televisão! Brincadeira. Não é só por isso. Há apenas dois aparelhos de televisão no Canto, acreditem. Num deles eu vi, a preto e branco, alguns jogos do Campeonato do Mundo de Futebol que terminou no passado mês de Julho e que a Inglaterra venceu ao bater a Alemanha Ocidental por 4-2 na final. Não me lembro como se chamava a senhora que nos deixou 17
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ver os jogos na sua casa! Ela vivia na entrada do caminho que, da Rua D. Dinis, vai dar ao Cemitério e mesmo em frente à casa da Ti Clemência. Esperai, vai aqui a passar alguém que sabe... “Era a Ti Domingas Labareda, também conhecida por Domingas Manca”. Obrigado pela informação, Soledade. Claro que era. Essa santa da Ti Domingas permitiu-me que eu pudesse ver os jogos de Portugal. Estavam também mais pessoas a ver, mas já não recordo quem eram! Não se fala doutra coisa senão da injustiça de Portugal não ter estado na final deste Campeonato do Mundo realizado em Inglaterra. Merecia. São 5 horas da manhã deste Sábado! A previsão do tempo, feita ontem na loja dos meus pais por um moliceiro, é de que vai ser um dia de sol! Dizia o homem moliceiro que o céu estava rosado ao pôr do sol o que é sinal de bom tempo. Eu acredito nesta previsão, a gente de andar ao rio nunca se engana, quase nunca! O galo ainda não cantou e já por aqui estão três peixeiras de canastra vazia! Vestem de preto, de cima a baixo, em luto pelos maridos que Deus já lá tem e que hão-de respeitar usando o preto no resto das suas vidas! Apertam os rins com cinta também preta. Por cima do lenço, que lhes esconde a cabeleira de toda uma vida, usam chapéu de aba baixa. O chapéu, com a rodilha em cima, faz a base certa para apoio da canastra. Junta-se a elas uma outra peixeira, vinda da Rua da Saudade. Veste da mesma maneira mas com cores alegres, pois o seu Manel está vivo e rijo, benza-o Deus. Esta peixeira parece que vem a rezar, eu a vi fazer o sinal da cruz antes de chegar perto das colegas! A nossa gente tem uma oração para cada momento. A minha avó Piedade também era varina e, quando saía a porta de casa para a venda do peixe, rezava assim: 18
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“Da minha casa vou sair A minha vida vou governar, Tantos Anjos me acompanhem Como passos eu vou dar Deus comigo e eu com Deus Deus adiante e eu atrás Que Nossa Senhora me defenda Das tentações de Santanás”
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Sei que as quatro peixeiras vão à Praça de Pardelhas mercar o peixinho da nossa ria e do mar que também é nosso. É sempre assim todos os dias, menos no Dia do Senhor, o Domingo. Os comerciantes do ramo esperam pelas varinas com as caixas de peixe à mercê de elas escolherem o que querem levar. As varinas carregam depois na cabeça as canastras cheias de peixe e vão vendê-lo para Angeja, Canelas ou até mais longe! Vencem a pé descalço os quilómetros de ida e volta. Regressam no início da tarde, trazendo nas canastras frutinha dada por boas freguesas. O peixe foi todo vendido! Na algibeira veio a notinha da venda. Pela hora que as peixeiras vão ao seu destino, já as lojas têm a porta entreaberta para os homens entrarem e matarem o bicho antes de irem para a safra do moliço ou para a pesca. Há quem beba, num abrir e fechar de olhos, dois a três bagaços estremes ou misturados com aniz, genebra ou ginja, antes de debandar para a lida! Garantem que lhes dá outro espírito! Algumas mulheres também entram nesta hora na loja para se aviarem do necessário para fazer os farnéis para os familiares que vão moer os ossos, como se costuma dizer. Com um bocado bom de broa, um quarto de azeitonas, duas chouriças pretas, um naco de carne branca da última 19
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matança, e dois a três litros de tinto, hão-de preparar num instante farnel para cada um dos trabalhadores da casa. Benza-as Deus! Quereis saber quem são os donos das lojas? Pois bem, aí vão os nomes: Manuel Bergada (Vergada), Teresa Bôrras (minha tia), Alberto Pita, José Pita, David da Silva (meu pai), Ana e Celeste Iria (minha tia e minha prima respetivamente), José Chota, Maria Parceira e Maria Viola. Estas pessoas tinham loja na Rua D. Dinis. Na Rua da Saudade era o Delfim que tinha a loja. Os donos das lojas são pessoas de bem, conselheiras de muita da gente do Canto, porto de abrigo nas horas de aflição quando as famílias não têm dinheiro para comer (fiam até à altura de o haver). São ainda ajuda preciosa na leitura das cartas que muitos recebem no correio e que não as sabem ler por não terem sido dados à escola. No futuro, lá pelo ano 70, hei-de criar no Canto uma escolinha para ajudar algumas pessoas que não foram dadas às letras. Não haverá subsídio de nenhuma entidade. Ainda mais para a frente no tempo, não falta quem peça subsídios... As lojas do Outeiro da Maceda são como pequenos centros comunitários; aí se juntam os amigos em convívio à volta do balcão onde não falta que beber e petiscar, contam as peripécias da semana de trabalho, ajustam as marés do moliço ao preço mais conveniente, divertem-se a jogar as cartas ao cavalo ou à sueca, cantam à desgarrada, ouvem pela rádio como vão as pescas dos seus familiares embarcados no alto mar, escutam os relatos dos jogos de futebol do Benfica, Sporting, Porto, Belenenses... Falando em futebol, deixai que vos diga que o Sporting foi campeão nesta época de 1965/66 com um ponto de diferença do Benfica e nove do Porto. O Eusébio foi o melhor marcador com 25 golos. Abençoado. O povo interessa-se por ser informado como vai tudo por esse mundo de Deus, embora torça o nariz a algumas coisas novas que 20
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vão acontecendo! No passado mês de Fevereiro, quando o aparelho de rádio da loja dos meus pais anunciava que a sonda soviética Lunik 9 tinha poisado na superfície lunar, os fregueses presentes naquela altura ficaram de boca aberta! O comentário de um deles mereceu a concordância de todos os presentes: “o fim do mundo está próximo, muita coisa no fim do mundo se há-de ver e já está a ver-se. Parece que o homem quer ser como Deus”, disse. Lá virá o tempo em que o nosso povo será mais recetivo à evolução. Também houve muita admiração por cá quando o povo viu nos jornais algumas fotos da Ponte sobre o Tejo, a Ponte Salazar! Ela foi inaugurada a semana passada, a 6 de Agosto. A Ponte liga Lisboa a Almada. Depois do 25 de Abril de 1974, a Ponte há-de ficar conhecida como Ponte 25 de Abril. Já são 9 horas da manhã. Não há-de demorar muito que passe por aqui a Aurora Catôa! Distribui a pé o pãozinho de trigo e sempre a correr. Hoje, Sábado, vai acabar mais tarde. É o dia de receber o dinheiro do pão da semana e por isso vai haver demora. Lá vem ela! Traz a pressa toda! Dá o bom dia a toda a gente por quem passa. Aqui no Outeiro da Maceda todos se saúdam! Não quero mentir, um ou outro não, o que acaba por ser normal, penso. Vejo agora garotos a correr na direção da Cova do Chegado, que fica no lado oeste do Chegado. Logo atrás, vão mulheres, umas com gigos de roupa à cabeça e outras levando a roupa também à cabeça mas em alguidares grandes de plástico! Não esqueceram a meia barra de sabão que há-de dar para lavar toda a roupinha! Duas ou três horas depois do meio-dia, recolhem a roupa de cima das tramagueiras onde esteve a secar, dobram tudo muito bem dobradinho e colocam nos gigos e bacias de plástico. Regressam a casa contentes e cantarolando o malhão, malhão, ou o mar enrola 21
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na areia... Durante a semana, ocupam-se da lida da casa antes de irem para a venda do peixe, para o arroz, ou para sachar milho... Vejo também vários homens a caminhar até ao Chegado! Quero ver o que vão fazer e vou atrás deles. Julgo que vão ajudar a virar algum barco moliceiro para a amanhação! E é mesmo, o barco A456, do Manel Ferão, vai ser virado! Não demora muito e todos se dão ao trabalho. É lindo de se ver! O barco é trazido da borda do rio para terra. Aí, uns puxam pelas cordas amarradas ao bordo do lado do rio, outros ajudam com as mãos nesse bordo. O barco vai à posição vertical e, no momento em que se inclina para o lado desejado, é escorado pela toste que um homem lhe aponta ao mesmo tempo que diz “deixem vir, que este é meu”! E pronto, está feito. O pessoal dirige-se então à taberna que lhe foi indicada, come umas azeitonas e uns tremoços e bebe uma boa pinga de tintol. Tudo será pago pelo dono do barco que deixou ordens na loja para que não faltem os comes e bebes para toda a gente que se deu ao trabalho de ajudar! Os barcos moliceiros são virados nos meses quentes de Julho, Agosto ou Setembro e a amanhação faz-se todos os anos. Os barcos moliceiros são calafetados com corda de estopa. Na amanhação do barco, usa-se o betume quando é necessário tapar algum rombo que a embarcação tenha sofrido! Vários barcos moliceiros estão aqui no Chegado e cada um amarrado ao seu mourão pelo lado da proa! A maioria dos homens moliceiros não foi hoje ao rio! Por isso foram muitos os que estiveram a ajudar a virar o barco do Manel Ferão. Mesmo assim, alguns foram. Eu consigo ver mais que um barco moliceiro no Laranjo e dizem-me que num deles moirejam o António Soares e a esposa Belmira Angélica, o povo chama-lhe Belmira Injalca! Ela trabalha ao moliço ao lado do marido! Mulher guerreira. Há outras. A 22
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Domingas Benta é mais uma que, de vez em quando, vai ajudar o seu Zé a fazer a maré do moliço. Lá mais para a frente nos anos, hão-de passear turista em barco moliceiro a motor! Um pouco estranho, não é? Vou agora passar de novo pela Cova do Chegado. Ainda cá está o grupo das mulheres a lavar a roupa. A canalha anda no banho! Dá para ver mercantéis vindos do lado da Pousada da Ria (foi inaugurada em 1960). Vêm da apanha da amêijoa, do mexilhão ou transportam junco ou sal. Uma das pessoas, do grupo que por ali está, garante-me que o mercantel da frente vai ficar no Bico e traz sal que há-de ser descarregado com a ajuda de mulheres também! Na direção contrária aos mercantéis, vão bateiras à procura do peixe branco, das enguias. Há muita enguia e por isso ela é quase a preço dado. Mas, no Canto onde nasci, no Outeiro da Maceda, que alguns (depreciativamente?!) chamam de Gafanha Baixa ou Cortina de Ferro, um homem não pode viver só da pesca ou do moliço, da amêijoa, do mexilhão, do berbigão, do burrié, do sal e junco, tem de semear umas hortaliças, criar umas galinhas e uns porquitos e contar com a ajuda da mulher que, além do trato da casa e da canalha, vai para o arroz, anda nas terras a sachar, faz cobertas e tapetes no tear, vende peixe a quilómetros de distância, ou vai ao moliço e pesca também. E tem de contar ainda com a ajuda dos filhos machos que, deixando a escola para trás, andam tão novinhos na lida do moliço, e também da ajuda das filhas que vão servir na cidade aos dez ou onze aninhos que “a escola não é para as meninas”, dizem alguns! Com o decorrer do tempo, o povo vai ficando mais sensível à inconveniência do trabalho infantil e há-de evitá-lo, assim como há-de reconhecer a necessidade de escola. Abençoado 23
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povo! “Com um tanto daqui e um tantinho dali lá se vai vivendo à maneira do pobre”, diz-se também por aqui. Mas há quem não se conforme e, com a esperança de melhorar, procurará trabalho em outras zonas do nosso país, ou embarcará em navio de pesca do bacalhau, ou emigrará para o Brasil, França, Alemanha, Estados Unidos e Canadá, enquanto a esposa fica no Canto; um dia virá buscá-la a ela e aos filhos, mas há-de haver daqueles que vão e não regressam mais, fazendo com que as suas mulheres se tornem “viúvas de homem vivo” e que os filhos fiquem “órfãos do progenitor que vive”! São alguns os casos conhecidos na emigração para o Brasil. Onze da manhã! Vou agora até ao Maninho, largo que se encontra no cruzamento da Rua D. Dinis com a Rua da Saudade. Será erguido por aqui, em 1982, o Monumento à Senhora dos Navegantes, obra do artista escultor José João Brito; ali juntinho ao Monumento da Senhor dos Navegantes, será inaugurado (em 2002) um painel de azulejos da autoria do Mestre José Oliveira a lembrar-nos as atividades económicas das nossas gentes a partir da Ria. O mestre José Oliveira vai continuar a ser muito apreciado na sua arte e vai ser muito solicitado para a pintura dos barcos moliceiros. Benza-o Deus, que é mesmo um grande artista. Em 1984, exatamente no mês de Agosto, o Grupo Etnográfico da Murtosa (será criado em 1981) há-de promover no Maninho a primeira Festa à Senhora dos Navegantes. O programa da festa será aliciante: noitada de Sábado com a atuação de uma Orquestra Típica vinda de Coimbra e ainda a atuação do Grupo Etnográfico da Murtosa. Haverá descarga de fogo a terminar a noite. No Domingo, será celebrada missa campal pelo pároco Padre Manuel Margarido. A parte da tarde desse dia vai ser dedicada 24
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ao segundo festival de folclore do Grupo Etnográfico da Murtosa. Nele hão-de participar sete ranchos folclóricos além do Etnográfico. Virão do Bunheiro, Ovar, Angeja, Albergaria-à-Velha, Vila Nova de Gaia, Vila Verde e Santarém! Curiosa vai ser a deslocação dos grupos folclóricos do Bico ao Chegado em barcos moliceiros. No final do festival haverá nova descarga de fogo. Em 1988 será criada a Escolinha na zona do Maninho. Começará a funcionar na garagem e anexos da casa da Iria Timóteo! A Educadora será a Ana Maria e a Sílvia Silva será a Auxiliar da Educadora. No ano de 2017 há-de ser inaugurado um parque infantil nesta zona. O nosso Canto irá merecer ainda mais atenção da parte dos homens do poder. Já não será sem tempo! Continuo a minha caminhada pelo Outeiro da Maceda. Antes de chegar ao pequeno largo chamado de Coval, deparo com o João Evangelista sentadinho num banco de madeira na valeta do lado direito de quem caminha para norte. Está meio pensativo, parece deslocado! Ainda é nas águas do rio que ele se sente à vontade e bem! Desde os 9 anos que anda na pesca e também já trabalhou ao moliço. Mesmo por terra, respira a vida da pesca. Entretém-se a fazer galrichos, aquele que tem entre mãos já vai a meio. Também se ajeita a fazer rede e passa muito do seu tempo livre a reparar as redes com as quais trabalha. Lá pelo ano de 80 será um dos artesãos que integrará a representação da Murtosa na Feira de Artesanato de Aveiro. Aí vai ter a oportunidade de mostrar a sua habilidade a fazer rede. O João Evangelista é casado com a Maria dos Anjos Silva, um casamento que irá durar cerca de 18 anos até ao falecimento da Maria. Voltará a casar e com a Gracinda Benta. Será ela que lhe há-de depois vender o peixe à vizinhança e também na Praça de Pardelhas, mas mui25
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