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António Luís de Sousa Henriques Seco nasceu na Casa de Antuzede (arredores de Coimbra), em 22 de janeiro de 1822, e faleceu em Coimbra, em 4 de dezembro de 1892. Doutorado em Direito em 1843, só em 1855 foi despachado Lente substituto, alcançando em 1861 a cátedra de Direito Penal. De 1881 até à sua jubilação, em 1885, foi Diretor da Faculdade de Direito. Publicou diversas obras jurídicas, em especial no domínio do Direito Penal, mas também da História do Direito, Direito Romano e Administração Pública. Por escolha da Junta Governativa do Porto (1847), exerceu funções de Governador Civil de Coimbra, cargo que voltou a desempenhar, após a Regeneração, em 1851 e em 1853-1854. Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, em 1862-1863. Eleito diversas vezes Deputado às Cortes (1845, 1857, 1858, 1860), pelo Partido Histórico, com intervenções em defesa dos interesses da região de Coimbra, e como convicto defensor da abolição da pena de morte. Foi nomeado Par do Reino, em 1881. Ingressou na Maçonaria, em 1844, na loja Filadélfia, com o nome simbólico de Viriato, e na Carbonária Lusitana, em 1848, com o nome de Cicioso. Colaborou nos jornais A Oposição Nacional (em 1844), O Observador (de 1847 a 1854), O Conimbricense (em 1854 e 1855), A Época (em 1856), O Constitucional (em 1859), O Progressista (em 1871) e na Revista de Legislação e de Jurisprudência (de 1871 a 1876). Foi sócio do Instituto de Coimbra. Em 1880 e 1889 editou os dois volumes das suas Memórias do Tempo Passado e Presente para Lição dos Vindouros. Legou a sua valiosa biblioteca à Câmara Municipal de Coimbra, com o propósito de servir de fundamento à criação de uma Biblioteca Municipal.
António Luís de Sousa Henriques Seco, Presidente da Câmara Municipal de Coimbra (1863).
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Joaquim Martins de Carvalho
Os Assassinos da Beira
No bicentenário do nascimento de Joaquim Martins de Carvalho (Coimbra, 1822 - 1898), após a reedição dos seus Apontamentos para a História Contemporânea (1868) e, em anexo, de A Nossa Aliada! (1883), coloca-se ao dispor do público a sua última recolha de textos: Os Assassinos da Beira - Novos Apontamentos para a História Contemporânea (1890), retrato fiel da sua corajosa e pertinaz campanha na imprensa (O Observador e O Conimbricense) contra o banditismo que, após o termo da guerra civil, grassou na Beira, muitas vezes com o apoio das diversas forças políticas. Nessa campanha, o principal aliado de Joaquim Martins de Carvalho foi o Doutor António Luís de Sousa Henriques Seco (Antuzede, 1822 - Coimbra, 1892), também na imprensa, mas sobretudo como Governador Civil de Coimbra e Deputado às Cortes, do que deixou circunstanciado relato nos dois volumes das suas Memórias do Tempo Passado e Presente para Lição dos Vindouros (1880 e 1889), de que se reproduzem as passagens mais pertinentes.
Joaquim Martins de Carvalho
Os Assassinos da Beira Recolha de textos, introdução e notas por
Mário Araújo Torres
Joaquim Martins de Carvalho nasceu em Coimbra, em 19 de novembro de 1822, e aí faleceu em 18 de outubro de 1898. Órfão muito jovem, o regime de morgadio então vigente determinou que a parte substancial do património familiar fosse encabeçada no filho primogénito, Venceslau Martins de Carvalho. Como filho segundo, fora Joaquim Martins de Carvalho destinado à carreira eclesiástica, ao que ele resistiu. A sua única instrução formal consistiu na frequência, durante um ano, em 1833, da aula de Latim no Colégio das Artes, então dirigido pelos jesuítas. Deve-se ao seu abnegado esforço de autodidata, a aquisição de vastíssimos conhecimentos, sobretudo nas áreas da história e da bibliografia. Na sua juventude, exerceu as modestas profissões de empregado comercial e de latoeiro, que lhe valeu o epíteto de Doutor Latas ou Lord Latas. Convicto lutador liberal, esteve vários meses preso na cadeia do Limoeiro, em 1847, como membro do Partido popular (patuleio) contra o cabralismo. Depois de libertado, dedicou-se ao jornalismo, essencialmente no Observador (1847-1854), a que sucedeu, logo em janeiro de 1854, O Conimbricense, de que foi proprietário, diretor e principal redator, até à sua morte, em 1898. Liberal progressista, foi membro da Maçonaria e da Carbonária Lusitana. Foi promotor do associativismo, sobretudo no sentido do progresso económico da região de Coimbra e da defesa das classes laboriosas, nos domínios da instrução e do mutualismo. Foi membro de diversas instituições científicas, designadamente a Academia das Ciências de Lisboa e o Instituto de Coimbra. Em vida publicou dois livros, com seleção de artigos e estudos seus saídos em O Conimbricense: Apontamentos para a História Contemporânea e Os Assassinos da Beira.
JOAQUIM MARTINS DE CARVALHO
OS ASSASSINOS DA BEIRA
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NOVOS APONTAMENTOS PARA A HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA seguido de extratos das
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MEMÓRIAS
DO TEMPO PASSADO E PRESENTE
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PARA LIÇÃO DOS VINDOUROS de
ANTÓNIO LUÍS DE SOUSA HENRIQUES SECO
título: O s Assassinos
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da Beira – Novos Apontamentos para a História Contemporânea seguido de extratos de Memórias do Tempo Passado e Presente para Lição dos Vindouros autores: J oaquim Martins de Carvalho (1822-1898) e António Luís de Sousa Henriques Seco (1822-1892) edição: Edições Ex-Libris® (Chancela Sítio do Livro) recolha dos textos, introdução e notas: Mário Araújo Torres J oaquim Martins de Carvalho (Fonte: Os Assassinos da Beira – Novos Apontamentos para a História Contemporânea, 2.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 1922) imagem de contracapa: António Luís de Sousa Henriques Seco, Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, em 1863 (Fonte: Paula Cristina Viana França, Documentos de Arquivos Privados no Espólio do Arquivo Histórico Municipal de Coimbra – Séculos XIV-XIX, Coimbra, AHMC, 2016) capa: Ângela Espinha paginação: Paulo Resende
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imagem de capa:
1.ª edição Lisboa, fevereiro 2022 isbn:
978‑989-9028-53-1 495458/22
depósito legal:
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Todos os direitos de propriedade reservados, em conformidade com a legislação vigente. A reprodução, a digitalização ou a divulgação, por qualquer meio, não autorizadas, de partes do conteúdo desta obra ou do seu todo constituem delito penal e estão sujeitas às sanções previstas na Lei. Declinação de Responsabilidade: a titularidade plena dos Direitos Autorais desta obra pertence apenas ao seu autor, a quem incumbe exclusivamente toda a responsabilidade pelo seu conteúdo substantivo, textual ou gráfico, não podendo ser imputada, a qualquer título, ao Sítio do Livro, a sua autoria parcial ou total. publicação e comercialização:
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OS ASSASSINOS DA BEIRA
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NOVOS APONTAMENTOS PARA A HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA seguido de extratos das
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MEMÓRIAS
DO TEMPO PASSADO E PRESENTE
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PARA LIÇÃO DOS VINDOUROS de
ANTÓNIO LUÍS DE SOUSA HENRIQUES SECO
Recolha de textos, introdução e notas por Mário Araújo Torres
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1. A Concessão de Évora-Monte (vulgarmente conhecida por Convenção de Évora-Monte), assinada em 26 de maio de 1834, pondo fim à guerra entre liberais e miguelistas, não significou o termo da violência no Reino. Da concessão de amnistia de todos os delitos políticos cometidos desde 31 de julho de 1828, de liberdade de circularem e saírem do País, de disposição dos bens e de conservação dos postos, asseguradas aos vencidos, em troca da entrega das armas e dissolução dos corpos auxiliares, não resultou a pacificação esperada, porque as armas não foram depostas nem os “corpos auxiliares” dissolvidos, transformando-se em bandos de guerrilheiros em diversas regiões, do Minho ao Algarve, e em especial na Beira. A denúncia da Convenção, feita pelo exilado D. Miguel, mal chegou ao Piemonte, convenceu os seus partidários de que a guerra não estava perdida. Outro fator de incremento da violência foi o chamado “imposto da guerra”, a cláusula que impunha aos miguelistas vencidos a obrigação de indemnizarem os prejuízos causados em propriedades de liberais, o que, num País com débil sistema judicial, determinou que os “credores” se arrogassem os direitos de fixarem o montante da “dívida” e de a cobrarem por si próprios. A formação de bandos armados não só opôs miguelistas a liberais, mas também, no campo destes, dividiu as diversas fações em confronto: vintistas, cartistas, setembristas, cabralistas, patuleios, e, mais tarde, regeneradores de várias obediências. E, com crescente frequência, esses grupos, por um lado, transformaram-se em formações de caciquismo eleitoral, e, por outro lado, em meros bandos de comuns assassinos e salteadores. A debilidade da estrutura judicial, militar e policial gerou uma impunibilidade que incrementou a violência. A segurança pública só começou a melhorar com a Regeneração, em 1851, mas, na leitura de Henriques Seco, sofreu nova quebra, na região da Beira, quando, em 10 de setembro de 1853, uma portaria assinada pelo Ministro da Guerra, Duque de
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Saldanha, e pelo Ministro do Reino, Rodrigo da Fonseca Magalhães, determinou aos Governadores Civis dessa região que colocassem as suas forças sob as ordens do cartista e anti-patuleio João Brandão (para uns, “o terror da Beira”; para outros, “o herói da Beira”; ainda para outros, “o desventurado de Midões”) 1, a quem fora confiado o “serviço nacional e real” de capturar os assassinos João Nunes, o Ferreiro da Várzea (apoiante da oposição a Rodrigo da Fonseca), e o major Cristiano António da Fonseca (patuleio, opositor de Saldanha).
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2. Nascidos ambos em 1822, a diversidade de origem social, fortuna e formação académica de Joaquim Martins de Carvalho e de António Luís de Sousa Henriques Seco não impediu que se viessem a unir, na imprensa e na atividade política, numa persistente luta contra o banditismo, muitas vezes aliado à corrupção eleitoral, que grassou na Beira nos meados do século XIX.
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2. 1. Joaquim Martins de Carvalho 2 nasceu em 19 de novembro de 1822, em Coimbra, no seio de uma modesta família de pequenos comerciantes e proprietários agrícolas. Filho segundo, órfão de pai aos 6 anos de idade e de mãe aos 11 anos, tendo o património familiar, de acordo com o regime do morgadio então vigente, sido transferido para o filho varão primogénito, Joaquim Martins da Carvalho estava destinado ao estado eclesiástico, o que ele recusou. Tal como recusou o apoio material que o irmão morgado, Venceslau Martins de Carvalho, se teria disposto a proporcionar-lhe. A sua única educação formal consistiu na frequência, no ano letivo de 1833/1834, da cadeira de Latim no Colégio das Artes, então dirigido pelos jesuítas. Espírito independente, optou Joaquim Martins de Carvalho por ganhar ele próprio o seu sustento, com empregos humildes, no comércio e como artífice latoeiro, que durante a sua vida lhe valeria o epíteto de Doutor das Latas ou Lord Latas, com que os seus futuros adversários políticos, supondo deprimi-lo ou minimizá-lo, irão lembrar-lhe a sua humildade profissional de origem, designação que ele próprio não repeliu e de que sempre se vangloriou.
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De sólidas convicções liberais progressistas, Joaquim Martins de Carvalho inicia a sua atividade política no período de forte contestação ao governo despótico de Costa Cabral (1842), onde se encontra com António Luís de Sousa Henriques Seco, um dos fundadores do jornal A Oposição Nacional (1844), ligado à loja maçónica Filadélfia. No período da Revolta da Maria da Fonte (1846), seguida pela Guerra da Patuleia (1846-1847), a militância de Joaquim Martins de Carvalho no Partido popular conduz à sua prisão, em Coimbra, em 4 de fevereiro de 1847, e transferência para a Cadeia do Limoeiro, em Lisboa, donde só será solto em julho de 1847. Regressa então a Coimbra, onde em breve iniciará a sua carreira de jornalista, a que se dedicará até à sua morte. Para reagir contra as quotidianas violências dos cabralistas, um grupo de membros do Partido progressista, entre eles António Luís de Sousa Henriques Seco, decidiram fundar um jornal, com o título O Observador, saindo o primeiro número em 16 de novembro de 1847. Lê-se no editorial desse número inaugural: “A segurança pública tem sido uma mentira, as vinganças particulares apareceram com todos os horrores desde que houve certeza da impunidade, os espancamentos e assassinatos a título de opiniões políticas têm sido presenciados por toda a parte; enfim, e para em tudo se faltar ao programa pomposo, cuja execução se nos afiançara, deu-se-nos há pouco o espetáculo da mais completa prostituição da urna que pode imaginar-se.” É este o primeiro jornal em que Joaquim Martins de Carvalho participa, primeiro como revisor; depois, como colaborador; mais tarde, como comproprietário; e, finalmente, como substituto efetivo do editor titular, José de Morais Pinto de Almeida, nos períodos de ausência deste em Lisboa, como Deputado. Nos finais de 1853, O Observador publica diversa correspondência de Lavos, denunciando os crimes da responsabilidade do Administrador desse concelho, Joaquim Gonçalves Curado, mais conhecido por Joaquim da Marinha, que tinha um grande protetor no seu compadre Frutuoso José da Silva, abastado proprietário de Coimbra e amigo íntimo de José de Morais Pinto de Almeida, que
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oficialmente era o editor do Observador, mas que estava ausente em Lisboa, como Deputado, sendo Joaquim Martins de Carvalho o responsável efetivo pela edição do jornal. Em meados de janeiro de 1854, José de Morais Pinto de Almeida escreve para Coimbra, ameaçando interromper a publicação do Observador se prosseguissem os ataques ao criminoso de Lavos. Indignado, Joaquim Martins de Carvalho procura o então Governador civil de Coimbra, António Luís de Sousa Henriques Seco, e juntos decidem mudar o nome do periódico para O Conimbricense e passando Joaquim Martins de Carvalho a ser o editor responsável dele. No sábado, 21 de janeiro de 1854, saiu o último número (n.º 681) de O Observador, e na 3.ª-feira, 24 de janeiro de 1854, apareceu o n.º 1 de O Conimbricense, com Joaquim Martins de Carvalho como responsável. No editorial desse número inaugural, lê-se: “Um princípio de justiça, um ponto de honra, uma causa de pundonor para a sua redação dão hoje começo a este jornal, cuja origem já se vê que é nobre e se deve esperar que a sua vida o seja igualmente. Adotamos este título porque o nosso jornal, não aspirando à vanglória de representante principal da política liberal progressista, contenta-se apenas com o modesto título que mais quadra à posição que pretende ocupar na imprensa, a saber: a defesa dos interesses de Coimbra e do seu distrito, e, se tanto for mister, também da província da Beira. Além de que não devíamos agora denegar-lhe o nome que já quisemos por no jornal que em 1845 pretendemos publicar nesta cidade e que, a despeito dos nossos esforços, nunca conseguimos que prosseguisse, graças ao arbítrio desregrado dos mandões dessa época, os quais, mancomunados, estabeleceram entre si um conflito de jurisdição negativa, para que nos não tomassem conta da habilitação 3. Vê-se, pois, ainda que o nome do Conimbricense é também um protesto contra o despotismo. E, por último, tomará a peito, muito principalmente, a causa da ordem e segurança pública; e para este fim defenderá sempre o fraco contra o forte, e pedirá a aplicação das penas convenientes contra os criminosos, aos quais não dará tréguas, porque não tem, e mesmo rejeita, com eles e os seus
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protetores, quaisquer que eles sejam, obscuros ou poderosos, todos os compromissos.” A partir daí, a vida de Joaquim Martins de Carvalho confundiu-se com a do Conimbricense: “edita-o, e por ele se responsabiliza; escreve-o todo ‒ folhetim, artigo de fundo, escavações históricas, noticiário; administra-o; cinta-o até!” 4. Joaquim Martins de Carvalho dirigiu O Conimbricense até morrer, em 1898, sendo desde o seu falecimento substituído na direção por seu filho, Francisco Augusto Martins de Carvalho, que continuou nessa direção até que o periódico terminou com o n.º 6230, de 31 de agosto de 1907. No ano seguinte, ainda o General Martins de Carvalho fez sair um número único, em 11 de julho de 1908, para celebrar o centenário do primeiro periódico de Coimbra ‒ Minerva Lusitana, cujo primeiro número saíra em 11 de julho de 1808. Sob a sua direção, O Conimbricense foi um combatente corajoso e pertinaz contra o banditismo que grassava na província da Beira, com a complacência ou a proteção das autoridades políticas e administrativas, que encontravam nos chefes dos guerrilheiros preciosos instrumentos de caciquismo eleitoral. Essa luta colocou pelo menos por duas vezes Joaquim Martins de Carvalho na mira dos assassinos: em 28 de junho de 1854, véspera da festividade de S. Pedro, andou João Brandão, “o terror da Beira”, trajado de estudante, a percorrer a cidade para o liquidar, e a 1 de maio de 1856, dia de Ascensão, chegou a Coimbra o António Rodrigues, o Boa Tarde, que, com apenas 26 anos, já tinha praticado seis assassinatos, e a quem a morte de Joaquim Martins de Carvalho havia sido encomendada pelo vigário de Antuzede, Francisco José Pereira de Figueiredo, e por João Lúcio de Figueiredo Lima, o Lima Valentão, cujos crimes haviam sido denunciados no Conimbricense. A par da parte noticiosa da atualidade política internacional, nacional e local, inteiramente a seu cargo, Joaquim Martins de Carvalho reproduziu no seu Conimbricense preciosos documentos descobertos nas suas incessantes investigações bibliográficas e estudos de fundo em forma de folhetins, de que se destacam as
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séries dedicadas à História dos hospitais de Coimbra, à História da Irmandade da Venerável Ordem Terceira da Piedade de Coimbra, e aos Apontamentos para a história da tipografia em Coimbra, além de inúmeras biografias. Sendo naturalmente O Conimbricense o centro principal da produção jornalística de Joaquim Martins de Carvalho, ele não deixou de colaborar noutras publicações periódicas, como O Liberal do Mondego, O Observador, ou o Jornal dos Artistas (1878-1879), semanário democrático que tinha por fim defender os interesses da classe operária. Pertenceu à Carbonária Lusitana, de Coimbra, entre 1848 e 1850, tendo desempenhado os cargos de 1.º Secretário da barraca Igualdade, e de Orador da choça 16 de Maio (nome adotado para comemorar a vitória da revolução popular contra o cabralismo em Coimbra, em 16 de maio de 1847); esta choça depois reorganizou-se sob o nome de choça Segredo, de que Joaquim Martins de Carvalho foi presidente, usando sempre o nome simbólico de Ledru Rollin 5. Foi iniciado na Maçonaria, com o nome simbólico de Lamartine, em 1852, na loja Pátria e Caridade. A promoção do associativismo das classes operárias, com fins instrutivos e mutualistas, foi também uma preocupação constante de Joaquim Martins de Carvalho, sendo o primeiro presidente da Sociedade de Instrução dos Operários, organizada em outubro de 1851, ano em que também fundou o Montepio Conimbricense, a que posteriormente (1882) viria a ser dado o nome de Associação de Socorros Mútuos Montepio Conimbricense Martins de Carvalho, visando proteger os operários e suas famílias em situações de infortúnio (desemprego, doença, velhice, morte, orfandade, viuvez). Outra das suas preocupações foi o desenvolvimento e promoção das atividades económicas de Coimbra e sua região, tendo sido presidente da Associação Comercial de Coimbra e tido papel relevante na organização da Exposição Distrital de Indústria, Agrícola e Fabril e de Arqueologia (Coimbra, 1869) e da Exposição Distrital de Manufaturas (Coimbra, 1884), de cuja Comissão Executiva foi presidente.
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Em 1895 e 1896, respetivamente, foi Joaquim Martins de Carvalho eleito como sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa e como sócio efetivo do Instituto de Coimbra. Joaquim Martins de Carvalho faleceu em Coimbra em 18 de outubro de 1898, constituindo o seu funeral uma impressionante manifestação de pesar de toda a cidade, com repercussão na imprensa de todo o país.
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2.2. António Luís de Sousa Henriques Seco nasceu na casa da sua família em Antuzede (arredores de Coimbra), a 22 de janeiro de 1822, sendo filho de José Henriques Seco de Albuquerque e de D. Antónia Luísa de Sousa Reis e Maia 6. Depois de frequentar Preparatórios no Colégio das Artes, matriculou-se no 1.º ano jurídico da Universidade a 3 de outubro de 1836, aí se bacharelou a 2 de junho de 1840, se licenciou em 21 de maio de 1841 e se doutorou no dia 29 de janeiro de 1843. Em 9 de novembro do mesmo ano de 1843, foi eleito Juiz Ordinário, sendo nomeado Juiz de Direito Substituto nos anos de 1844 e 1850. Foi nomeado pela Câmara Municipal de Coimbra vogal do Tribunal de Polícia Correcional. Tomou parte ativa nas lutas contra o Governo cabralista, iniciadas em Coimbra com a Revolução popular, em 8 de março de 1844. Depois do malogro desta Revolução, o Partido progressista julgou necessária a criação de um jornal para se opor às prepotências das autoridades. No dia 9 de julho de 1844, com a colaboração de Henriques Seco, saiu à luz o primeiro número do periódico, a que foi posto o nome de A Oposição Nacional, cuja direção provinha da loja maçónica Filadélfia. Foi Secretário da Comissão Eleitoral da Oposição Popular, por ocasião das eleições de 3 de agosto de 1845. Tentou então, coadjuvado por alguns amigos, publicar um periódico intitulado O Conimbricense, mas as autoridades impediram arbitrariamente essa publicação. Na qualidade de doutor adido, Henriques Seco publica, em 1848, pela Imprensa da Universidade, a sua primeira obra:
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Manual Histórico de Direito Romano, distribuído em três partes, e seguido de um capítulo adicional acerca do seu destino entre nós (X+146+76 páginas). Numa época em que raros eram os professores que cumpriam a obrigação estatutária de fazer imprimir as suas lições (para pôr cobro à praga das sebentas, lições litografadas redigidas pelos alunos), Henriques Seco anuncia no prólogo dessa obra: “Ousamos traçar algumas linhas sobre a História do Direito Romano; ousámos mais: submetêmo-las à ação benéfica da imprensa civilizadora!”. E, mais adiante: “Quanto ao nosso Manual, procuramos ser suficientes nos factos, claros na expressão e também precisos na exposição. Isto, como escritor; porém, como português, foi nossa intenção prestar algum serviço à ciência. Se outros países já possuem em linguagem a História do Direito Romano, porque não a teremos nós também? Não nos vangloriamos, todavia, de ter preenchido o nosso duplicado propósito; mas, se assim não sucedeu, é que o mais excedia o cabedal dos nossos conhecimentos. Que os sábios decidam, se falhamos na intenção ou no modo, se em ambas as coisas.” Henriques Seco elaborou, em 1850, a obra que viria a publicar, seis anos depois, com o título Novos elogios dos reis de Portugal, ou princípios de história portuguesa para uso das escolas (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1856, X+188 páginas). A carreira universitária, após ter regido, no ano letivo de 18481849, a cadeira de Direito Natural e das Gentes, é interrompida pelo exercício, na primeira metade da década de 1850, de funções político-administrativas. Em 1851, com a Regeneração, foi incumbido da Secretaria-geral do Governo Civil de Santarém, donde foi transferido, em 9 de junho desse ano, para idêntico cargo no de Coimbra, sendo Governador Civil João Maria de Abreu Castelo Branco. Quando este, em fevereiro de 1852, cessou funções, sem ter sido substituído, Henriques Seco assumiu a chefia efetiva deste Distrito, confirmada com a sua nomeação como Governador Civil, em 28 de abril de 1853. Cessou essas funções em 21 de março de 1854, na sequência do seu pedido de exoneração, formalizado em 16
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desse mês, motivado pelos acontecimentos de fevereiro desse ano (Entrudada académica). Tal como ocorreu com Joaquim Martins de Carvalho, o determinado combate ao banditismo empreendido por Henriques Seco, como Governador Civil 7, colocou por duas vezes a sua vida em perigo: em setembro de 1854, quatro assassinos, a mando do Joaquim da Marinha, metidos numa pequena bateira, esperaram-no no sítio do Penedo de Lares, prontos a assaltar o batel em que costumava seguir de Montemor-o-Velho até à Figueira, onde habitualmente gozava uns dias de férias, o que só não concretizaram por, nesse dia, Henriques Seco ter optado por não seguir a via fluvial; uns anos depois, os assassinos de Midões, postados num declive sobranceiro à casa da quinta de sua mãe, em Antuzede, tiveram na mira das suas clavinas as janelas do seu quarto de cama e do seu escritório. Das visitas que fez aos diversos concelhos do Distrito resultou a publicação da Memória histórica e corográfica dos diversos concelhos do distrito administrativo de Coimbra (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1853, XVI+143 páginas), complementada pelo Mapa do distrito administrativo de Coimbra, designando segundo a ordem alfabética dos concelhos, todas as freguesias de que estes se compõem, pela mesma ordem; os oragos das mesmas freguesias; as distâncias de cada uma destas à cabeça do concelho; todas as povoações, casas e quintas que lhes pertencem, etc. (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1854, 118 páginas). Com a primeira obra pretendeu dar “uma notícia breve do Distrito Administrativo de Coimbra, isto é, da situação e descrição das suas principais povoações, e uma relação resumida dos factos históricos, que lhe dizem respeito”, tendo cedido o proveito da edição em benefício dos Hospitais da Cidade. Ligada à sua atividade como Chefe do Distrito está a publicação de As eleições municipais em Coimbra para o biénio de 1854 a 1855 (Coimbra, Imprensa de Elvira Trovão, 1856, 23 páginas), em que se defende de acusações dos seus adversários políticos de abusiva interferência nessas eleições.
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Em 1854, ano em que regressa à docência universitária, coube-lhe proferir, em latim, a Oração de Sapiência na abertura solene das aulas: Oratio quam pro annua studiorum instaurationem idibus Octobris anni MDCCCLIV in Conimbricensi Academia ... habuit Antonius Ludovicus de Sousa Henriques Secco (Conimbricae, Typis Academicis, 1856, 10 páginas) 8. Foi nomeado lente substituto extraordinário em 24 de janeiro de 1855 e substituto ordinário em 22 de agosto do mesmo ano. Assegurou a regência das cadeiras de História Geral da Jurisprudência (1855-1858), Instituições de Direito Eclesiástico (1855-1857), Enciclopédia Jurídica (1857-1858) e Direito Romano (1858-1860). Por Decreto de 23 de janeiro de 1861, foi promovido a lente catedrático e encarregado da regência da cadeira de Direito Criminal, inclusive a parte militar, a qual ficara vaga pela jubilação de Basílio Alberto de Sousa Pinto, e de que seria titular até se jubilar em 12 de Fevereiro de 1885. Perante este novo desafio, pois, como refere, no prólogo do I volume das Memórias do tempo passado e presente para lição dos vindouros (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1880), de Direito Criminal só sabia a lição, que, no ano letivo de 1839 a 1840, havia recebido do Doutor António Ribeiro de Liz Teixeira, e nem este nem Sousa Pinto, que lhe sucedera, publicaram lições, continuando o compêndio adotado a ser as Institutiones Juris Criminalis Lusitani Liber Singularis, de Pascoal José de Melo Freire dos Reis, de 1794, muito anteriores ao Código Penal de 1852, decidiu Henriques Seco começar a redigir um Compêndio de Direito Criminal Português, dedicando um primeiro volume aos delitos e um segundo às penas, a que acresceria um terceiro “reservado principalmente a assuntos extravagantes de direito criminal, e secundariamente a outros objetos de diversa índole”. Esse projeto não chegou a concretizar-se, apesar de ter publicado diversos capítulos na Revista de Legislação e de Jurisprudência 9 e de ter utilizado diversas notas na edição do Código Penal Português, precedido pelo Decreto com força de lei de 10 de dezembro de 1852, seguido de um Apêndice anotado por
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António Luís de Sousa Henriques Seco, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1881, 340 páginas. Só o planeado terceiro volume viria a ser publicado, com o título de Memórias do tempo passado e presente para lição dos vindouros (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1880, VIII+806 páginas), a que seguiria um 2.º volume destas Memórias (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1890, VIII+804 páginas), “não nutrindo por agora grandes esperanças de preencher as lacunas dos volumes que deveriam ser o primeiro e segundo” do anunciado Compêndio de Direito Criminal. Exerceu os cargos de Fiscal (1859/1860) e Diretor da Faculdade de Direito, desde 16 de dezembro de 1880 até à jubilação, em 12 de fevereiro de 1885. Nos dois tomos das Memórias trata Henriques Seco diversos assuntos, com relevância para a pena de morte, por cuja abolição convictamente lutou, descrevendo grande número de factos, sentenças a pena última, execuções, comutações, etc. Insere ainda capítulos sobre episódios da Inquisição (processos e prisões, sentenças contra Frei Diogo da Assunção e o Doutor António Homem, o Praeceptor infelix), da Guerra Peninsular, da Revolta da Maria da Fonte, da Guerra da Patuleia e da Regeneração, os acontecimentos em Coimbra no Carnaval de 1854, o banditismo na Beira (especialmente Midões e Lavos), reforma da legislação académica sobre concursos, o inédito Projeto de Código Criminal elaborado pela Comissão criada em Coimbra pela Ordem das Cortes de 23 de novembro de 1821, projetos de obras públicas (estrada de Alva 10), etc.. Reproduz ainda as orações por ele proferidas, na Sala dos Capelos, nas cerimónias de imposição de insígnias doutorais aos Doutores José Frederico Laranjo (em 15 de julho de 1877) e António Cândido Ribeiro da Costa (em 21 de julho de 1878). Em 1846, integrou, com o posto de Tenente, a 2.ª Companhia do Batalhão da Guarda Municipal, e, por escolha da Junta Governativa do Porto, assumiu interinamente o Governo Civil de Coimbra, em 1847.
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Serviu na Mesa da Misericórdia de Coimbra (1846-1847) e na Ordem Terceira. Foi membro da Maçonaria, na loja Filadélfia (1844), com o nome simbólico de Viriato, e da Carbonária Lusitana (1848), com o nome de Cicioso. Colaborou nos jornais A Oposição Nacional (em 1844), O Observador (de 1847 a 1854), O Conimbricense (em 1854 e 1855), A Época (em 1856), Constitucional (em 1859), O Progressista (em 1871), e na Revista de Legislação e de Jurisprudência (de 1871 a 1876). Renunciou à Comenda da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, com que o Ministro do Reino, Rodrigo da Fonseca Magalhães, o quis agraciar na sequência dos acontecimentos da Entrudada académica de 1854. Igualmente recusou aceitar o foro de Fidalgo da Casa Real. Membro do Conselho do Distrito (1846, 1854 e 1864), da Junta Administrativa dos Campos do Mondego (1856), foi Presidente da Câmara Municipal de Coimbra em 1862 e 1863 e da Junta Geral do Distrito, em 1863. Por Decreto de 10 de fevereiro de 1852, D. Fernando II nomeou-o membro do seu Conselho. Afeto ao Partido Histórico, foi eleito Deputado às Cortes em 1854, 1857, 1858 e 1860. Nas suas intervenções parlamentares 11, destacam-se chamadas de atenção para a situação em que se encontravam as crianças expostos na roda no Distrito de Coimbra (sessões de 16 de fevereiro e de 15 de maio de 1855), atribuição de prémios pecuniários aos que contribuíssem para a captura de assassinos que se tivessem evadido à ação da justiça (sessão de 12 de março de 1855), revisão do regime dos morgadios (sessão de 3 de abril de 1855), fiscalização da cobrança de impostos (sessão de 20 de janeiro de 1858), ensino liceal (sessão de 24 de março de 1858), aforamento e arroteação dos baldios dos concelhos (sessão de 25 de fevereiro de 1858), restabelecimento do concelho de Ançã (sessão de 22 de novembro de 1858), reparação da ponte da Cidreira (sessões de 14 de janeiro de 1859 e 29 de janeiro de 1861), inelegibilidade para Deputado dos funcionários
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demitidos (sessão de 28 de abril de 1859), segurança pública na Beira e repressão da criminalidade nessa província (sessão de 20 de maio de 1859), estradas de Coimbra ao rio Alva e à Figueira da Foz (sessão de 21 de maio de 1859) e ao resto da Beira pela margem direita do Mondego e ponte de Mucela (sessão de 23 de novembro de 1859), estrada entre Lavos e Marinha Pequena (sessão de 15 de fevereiro de 1860), melhoramento do rio Mondego e campos adjacentes (sessões de 3 de abril e de 26 de junho de 1860), etc. Em 28 de janeiro de 1874, foi eleito sócio efetivo do Instituto de Coimbra. Foi nomeado Conselheiro de Estado e Par do Reino vitalício em 7 de janeiro de 1881. Faleceu em Coimbra, na freguesia de Santa Cruz, a 4 de dezembro de 1892, aos 70 anos de idade. Esteve depositado na igreja daquela freguesia de 5 a 9 daquele mês, após o que seguiu para o cemitério de Antuzede, de onde era natural. No seu testamento, deixou a quase totalidade da sua livraria à Câmara Municipal de Coimbra, para com ela se criar uma Biblioteca Pública 12. Ao noticiar o seu falecimento, O Defensor do Povo (Coimbra, ano I, n.º 41, de 8 de dezembro de 1892) salienta que António Luís de Sousa Henriques Seco “foi um cidadão honesto, um português de lei, revolucionário nos seus tempos, todo liberal, lutando com encarniçamento durante a época cabralina”; “homem de bom coração, esmoler”, “serviu o seu País, com dedicação, sem egoísmos nem vaidades”. E, no Conimbricense, n.º 4722, de 6 de dezembro de 1892, o seu companheiro de lutas, Joaquim Martins de Carvalho, recorda-o: “Durante o tempo que foi Secretário-geral deste Distrito e Governador Civil, prestou relevantíssimos serviços a favor da segurança pública, contra os assassinos e ladrões desta província. A guerra que o sr. Henriques Seco fez aos assassinos de Lavos, Midões e de outras localidades desta província, quer como autoridade administrativa, quer como jornalista, quer como Deputado, foi extraordinária e de um valor incalculável.”
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3. Na presente edição, reproduz-se, com atualização de grafia, a segunda e última obra impressa de Joaquim Martins de Carvalho, Os Assassinos da Beira ‒ Novos Apontamentos para a História Contemporânea (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1890), seguida de transcrição dos capítulos dos dois volumes das Memórias do Tempo Passado e Presente para Lição dos Vindouros (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1880 e 1889), de António Luís de Sousa Henriques Seco, relacionados com a mesma temática.
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João Vítor da Silva Brandão (Casal da Senhora / Midões, 1825 Bié / Angola, 1880) fazia parte dos Midões do Casal (Manuel Rodrigues Brandão, pai, e filhos Manuel, Roque, João e António), politicamente cartistas, enquanto os Brandões de Midões, seu tio e primos (José Joaquim Brandão e filhos José, Joaquim, António e Francisco, casado com uma irmã de Rodrigo da Fonseca Magalhães) eram politicamente setembristas. Sobre João Brandão: Apontamentos da vida de João Brandão, por ele escritos nas prisões do Limoeiro, envolvendo a história da Beira desde 1834, Lisboa, J. G. de Sousa Neves, 1870 [a reedição desta obra, Editora Vega, Lisboa, 1990, insere o estudo de José Manuel Sobral, “Banditismo e política ‒ João Brandão no seu contexto político e social”]; António A. Teixeira de Vasconcelos, O julgamento de João Brandão (de Midões) no Tribunal da Comarca de Tábua, Lisboa, Tipografia Universal, 1869; Agostinho Veloso da Silva, Verdadeira história da vida e crimes do célebre salteador de Midões, João Brandão, Porto, Litografia Portuguesa, 1904; José Maria Dias Ferrão, João Brandão, Porto, Litografia Nacional, 1928; César Santos, O desventurado de Midões: João Brandão (em África) 1880-1950, Coimbra, Coimbra Editora, 1950; César Santos, Posfácio: O desventurado de Midões: ataques e pontos falsos (o macabro desaparecimento da cabeça degolada de João Brandão), Seia, Tipografia Montes Hermínios, 1951; José Manuel de Castro Pinto, João Brandão, «O Terror da Beira», Lisboa, Plátano Editora, 2004; José Barra da Costa, Os Crimes de João Brandão (Das Beiras ao degredo), Ponta Delgada, Macaronésia, 2017.
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Mais indicações em João Macdonald, “À procura da outra história – A bibliografia clássica para João Brandão”, Arganilia – Revista cultural da Beira Serra, Coja, n.º 25, dezembro 2012, págs. 120-173; na Internet está disponível uma versão revista em 2020, com o título “João Brandão – Um estabelecimento das fontes essenciais”. 2 Para mais completos dados biobliográficos sobre Joaquim Martins de Carvalho, cf. a nossa introdução aos seus Apontamentos para a História Contemporânea seguido de A Nossa Aliada! (Recolha de textos, introdução e notas por Mário Araújo Torres), Lisboa, Edições Ex-Libris, Lisboa, 2021, págs. 9-46. 3 Referência à tentativa feita por Henriques Seco, em 1845, de fundar um jornal com o título O Conimbricense, não tendo conseguido a habilitação “porque a autoridade judicial a esse tempo indeferia a julgar por sentença a idoneidade do editor e fiador enquanto na repartição competente se não tomassem os respetivos termos, e o Governador civil (...) indeferia a tomar os termos enquanto não estivesse julgada a idoneidade!” 4 Eduardo Mendes Simões de Castro, “Joaquim Martins de Carvalho”, Diário Ilustrado, 13.º ano, n.º 3923, de 4 de abril de 1884, pág. 1. 5 Em homenagem a Alexandre-Auguste Ledru-Rollin (1807 1874), advogado e político francês, que participou na Revolução de 1848 e na II República, sendo Ministro do Interior do Governo então instituído. 6 Os pais casaram na Capela da Senhora da Piedade, de Antuzede, a 15 de novembro de 1813. O seu irmão, Francisco Henriques de Sousa Seco, nasceu em Antuzede, em 21 de Maio de 1823, e aí faleceu em 27 de dezembro de 1906. Depois de frequentar Preparatórios no Colégio das Artes, matriculou-se em 1839 na Faculdade de Direito, onde se formou em 1844. Tomou parte ativa nas lutas contra o governo cabralista, iniciadas em Coimbra em 8 de março de 1844. Foi membro da loja maçónica Filadélfia (1844) e, depois, da Carbonária Lusitana (1848 e 1849), com o nome simbólico Álvaro Pais. Foi um dos pronunciados, em 21 de julho de 1845, pelo juiz José Ricardo Pereira de Figueiredo, no processo pela publicação do folheto Duas palavras aos governados por ocasião das eleições, tendo-se voluntariamente apresentado na cadeia de Ançã, ficando preso até, em outubro desse ano, vir a ser despronunciado. Participou na Revolução popular de 1846, tendo sido nomeado, pela Junta Governativa de Coimbra, Administrador do Concelho. Participou na Guerra da Patuleia, comandando o 2.º Batalhão Móvel de Coimbra, que
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marchou, por Góis, Covilhã, Guarda e Foz Coa, até ao Porto. Participou na fundação de O Observador (1847). Seguiu a carreira da magistratura, tendo sido Delegado do Procurador Régio em Tábua e Juiz de Direito em Cantanhede (1863) e Tomar (1873), jubilando-se em 1876. Cavaleiro da Ordem de Nossa Senhora da Conceição. Publicou, além de peças forenses, Manual de Orfanologia Prática (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1854) e Manual de Orfanologia Prática para uso dos principiantes (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1864); e ainda Quem é vítima? Carta de justificação de Francisco Henriques de Sousa Seco a seu irmão, António Luís de Sousa Henriques Seco (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1886), relativa a um litígio que opôs os dois irmãos quanto a uma servidão de passagem para prédios confinantes. Ver: “Dr. Francisco Henriques de Sousa Seco”, em O Conimbricense, 1906, n.ºs 6163 e 6164. Sobre a genealogia de Henriques Seco, cfr. os estudos de Pedro da França Machado: sobre a linha materna, “Os Maias Sousas, de Coimbra: seu percurso social alargado”, Munda, Coimbra, n.º 40, novembro de 2000, págs. 57-65, e sobre a linha paterna, “Os Henriques de Vila Nova de Poiares e Farinha Podre”, Munda, Coimbra, n.º 44, novembro de 2002, págs. 17-32. Na sua Memória histórico-corográfica dos diversos concelhos do distrito administrativo de Coimbra (Coimbra, Imprensa da Universidade, 1853, págs. 43-44), alude Henriques Seco a três seus antepassados: Manuel dos Reis e Sousa, Luís de Sousa dos Reis e António Luís de Sousa Reis e Maia, Sargento-mor, com exercício de Capitão-mor, na Comarca de Coimbra, “um verdadeiro defensor das regalias populares”. Sobre Manuel dos Reis e Sousa (Coimbra, 1680-1753), Lente de Medicina e autor de diversas obras dessa especialidade, ver Diogo Barbosa Machado, Biblioteca Lusitana, 2.ª edição, Tomo IV, Lisboa, 1935, pág. 224; e Manuel Augusto Rodrigues (direção), Memoria Professorum Universitatis Conimbrigensis, 1290-1772, Coimbra, Arquivo da Universidade de Coimbra, 2003, pág. 170. Luís de Sousa dos Reis (Coimbra, 1707-1783), sobrinho do anterior e bisavô de Henriques Seco, foi Doutor e Opositor na Faculdade de Leis, Vereador do Senado de Coimbra e Irmão da Misericórdia desta cidade. Ver: Barbosa Machado, Biblioteca Lusitana, citada, Tomo III, Lisboa, 1933, pág. 152; Aires de Campos, Catálogo dos objetos existentes no Museu de Arqueologia do Instituto de Coimbra (1873-1877), Coimbra, Imprensa da Universidade, 1877, págs.
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49-50, nota II; e Memoria Professorum, citada, pág. 135. Segundo Brito Aranha (Dicionário Bibliográfico Português ‒ Estudos de Inocêncio Francisco da Silva, continuados e ampliados por Brito Aranha, Tomo XVI, Lisboa, Imprensa Nacional, 1893, págs. 74-75), este “laborioso investigador das coisas de Coimbra, sua pátria, e em especial das do Mosteiro de Santa Cruz, da mesma cidade, ao qual não era afeiçoado” (Aires de Campos, local citado), deixou manuscritas diversas obras, em poder do seu bisneto, designadamente: Raio da luz católica, que ilustra os fiéis de Coimbra, vibrado por Leandro de S. Fulgêncio, filósofo e jurista conimbricense, contra os malditos frades jacobeus de Santa Cruz (com 64 folhas, concluído em 24 de abril de 1763); Apêndice e notas à obra precedente (com 227 folhas, contendo notícias até 5 de março de 1783); Dos escritores naturais de Coimbra (30 folhas); Catálogo dos varões ilustres da cidade de Coimbra (10 folhas; referida por Barbosa Machado, no local citado, com o título História Breve dos Varões e Mulheres de Coimbra, ilustres em santidade e virtude, dignidades eclesiásticas, letras e armas, com um discurso sobre a antiguidade da capela e milagrosa imagem da Senhora da Piedade de Antuzede e da capela da Rainha Santa Isabel do Espinhal); Catálogo dos portugueses doutos que foram lentes nas Universidades estrangeiras (com 23 folhas, foi publicado em O Conimbricense, n.ºs 810 e 816, de outubro e novembro de 1861); Discurso histórico da fundação e antiguidade da Igreja e Colegiada de S. Tiago da real cidade de Coimbra (com 9 folhas, foi publicado em A Época, Coimbra, n.ºs 19 a 23, de outubro e novembro de 1856); Defesa católica moral e jurídica contra os erros e falsas doutrinas que ensina e persuade aos seus fregueses o reverendo Padre Manuel Carvalho Curado, prior de Tamengos (9 folhas); Carta que um amigo escreveu a outro sobre um livro de indulgências apócrifas que publicaram os padres de Santa Cruz (13 folhas); Voto sobre se os enjeitados ou expostos podem ser Irmãos da Ordem Terceira; Voto sobre a posse de bens de raiz pelas Igrejas e Mosteiros; Voto sobre uma questão sucessória; Biblioteca dos escritores portugueses que escreveram livros ex professo sobre o Quinto Império de Portugal (26 folhas). Sendo Irmão da Misericórdia de Coimbra, coligiu e mandou encadernar em 25 grossos volumes muitos documentos antigos, manuscritos e impressos, da mesma corporação, elaborando os respetivos índices; estes volumes estavam conservados na Secretaria da dita Misericórdia, segundo informam Aires de Campos e Brito Aranha (locais citados).
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Henriques Seco tentou várias vezes fazer uma edição integral do manuscrito do seu avô materno, Raio da luz católica, de que tinham sido publicado alguns excertos no Conimbricense em 1861 e no final do primeiro volume das suas Memórias do Tempo Passado e Presente para Lição dos Vindouros. Nas suas disposições testamentárias (sumariadas em O Conimbricense, n.º 4722, de 6 de dezembro de 1892), determinou aos testamenteiros que, se Augusto Mendes Simões de Castro se quisesse encarregar da publicação do Raio da luz católica, lhe deviam ser facultados os necessários fundos, o que não se concretizou. 7 A documentação do arquivo do Governo Civil de Coimbra, após o incêndio, em novembro de 1943, que afetou a sua sede, no antigo Colégio de S. João Evangelista (Colégio dos Loios), ao Largo da Feira, foi transferida para o Arquivo da Universidade de Coimbra, tendo os dois maços de documentos com o título Assassinos da Beira e os constantes dos copiadores da correspondência entre 1841 e 1871, relacionada com a matéria, sido reproduzidos ou desenvolvidamente sumariados por Lígia Cruz, nos 3 volumes dos Documentos para o estudo da criminalidade da Beira em meados do século XIX, Coimbra, Publicações do Arquivo da Universidade de Coimbra, 1982 (volume I ‒ documentos de 1841 a 1855), 1983 (volume II ‒ documentos de 1856 a 1858) e 1984 (volume III ‒ documentos de 1859 a 1871). O conteúdo dos dois primeiros volumes foi também publicado no Boletim do Arquivo da Universidade de Coimbra, volumes V (1983), págs. 109-265, e VI (1984), págs. 1-267. Como se salienta na nota introdutória do primeiro volume, “foi o corajoso jornalista Joaquim Martins de Carvalho que, no seu jornal O Conimbricense, levantou acesa campanha contra os crimes que estavam a ser cometidos na Beira com a maior impunidade, não sendo possível estudar honestamente esse período da história sem compulsar o jornal”. No acervo documental assim facultado, onde se insere a correspondência de e para Henriques Seco no período em que chefiou o Distrito (18521854), encontrarão os investigadores elementos de fundamental significado para o estudo sereno e objetivo desse conturbado período. 8 Reproduzida em Maria João Padez de Castro e Rui de Figueiredo Marcos (coord.), Orações de Sapiência da Faculdade de Direito, Coimbra, Imprensa da Universidade de Coimbra, 2007, págs. 7-13, com tradução portuguesa a págs. 15-22. 9 Sobre a colaboração de Henriques Seco nessa Revista, informa Guilherme Braga da Cruz (A Revista de Legislação e de Jurisprudência
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‒ Esboço da sua história, volume I, Coimbra, Coimbra Editora, 1975, págs. 57-59 e 125) que, sendo Henriques Seco “dos poucos professores (...) que tinham gosto em escrever e publicar”, nela colaborou ao longo dos anos 4.º (1871-1872), 5.º (1872-1873), 8.º (1875-1876) e 9.º (1876-1877). No ano 4.º, com um extenso artigo, “cheio de interesse”, intitulado “Da história do direito criminal português desde os mais remotos tempos”, que se estendeu por sete números, do n.º 185 (13/1/1872) ao n.º 194 (20/4/1872). No ano 5.º, além de um artigo “que não vem assinado, mas que deve ser da sua autoria” ‒ “Do direito criminal na escola” ‒, publicado nos n.ºs 210 e 211 (4 e 11/5/1872), começou a publicar alguns capítulos do seu Compêndio de direito criminal português, “em antecipação de uma edição que nunca chegou a fazer”, tendo o primeiro desses capítulos, sob a epígrafe de “Elementos de Direito Criminal”, saído a lume nos n.ºs 222 (17/8/1872), 223 e 228. A publicação é retomada nos anos 8.º e 9.º, sob a epígrafe comum de “Elementos de Direito Criminal”, em que sucessivamente se trata da “Teoria da coação”, nos n.ºs 394 (29/1/1876), 396, 397 e 398; “Teoria do sexo”, no n.º 399 (18/3/1876); “Teoria da cumplicidade”, nos n.ºs 400 (25/3/1876), 401 e 402, continuado, já no ano 9.º, nos n.ºs 417 (29/4/1876), 418 e 419; “Teoria da acumulação ou pluralidade de delitos”, nos n.ºs 420 (20/5/1876), 421 e 422; “Teoria da conexão dos crimes”, nos n.ºs 423 (17/6/1876) e 424; “Teoria da ebriedade e afeções similares”, nos n.ºs 425 (1/7/1876) e 426; e “Teoria da reincidência”, nos n,ºs 427 (22/7/1876), 428, 429 e 430; e, finalmente, “História geral da Idade Média”, nos n.ºs 431 (19/8/1876), 432 e 433. De registar ainda a “Bibliografia do Direito Criminal Português”, no ano 5.º (1871), págs. 146-150. 10 Documentação relativa à polémica sobre o traçado da “estrada do Alva” (como era designada a via que, partindo de Coimbra, atravessados ou costeados os rios Mondego, Ceira e Alva, ia encontrar-se em Celorico com a que para aí partia da Mealhada, pela serra do Buçaco, prolongando-se depois para a Guarda, até à raia). Como Presidente da Câmara Municipal de Coimbra (1862-1863), Henriques Seco opôs-se ao projeto governamental, que apontava para a construção da estrada pela margem esquerda do Mondego (Ponte de Santa Clara, Vale do Inferno, Copeira, Quinta de S. Jorge e foz do rio Ceira), pugnando pela opção pela margem direita (Portagem, Arregaça, Portela até à Ponte de Mucela, na foz do Alva), que acabou por se impor. Henriques Seco, além das representações da Câmara Municipal, escreveu alguns artigos