Encontro de Escritores Uma reunião inesquecível Francisco Gomes de Amorim e Henrique Salles da Fonseca
FICHA TÉCNICA
edição: edições Virgula ® (Chancela Sítio do Livro) título: Encontro de Escritores – Uma reunião inesquecível autores: Francisco Gomes de Amorim e Henrique Salles da Fonseca
revisão: Patrícia Espinha arranjo de capa: Ângela Espinha paginação: Alda Teixeira
1.ª Edição Lisboa, Setembro 2022
isbn: 978-989-8986-63-4 depósito legal: 503169/22
© Henrique Salles da Fonseca e Francisco Gomes de Amorim
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Esta é uma obra de ficção, pelo que, nomes, personagens, lugares ou situações constantes no seu conteúdo são ficcionados pelo seu/sua autor/a e qualquer eventual semelhança com, ou alusão a pessoas reais, vivas ou mortas, designações comerciais ou outras, bem como acontecimentos ou situações reais serão mera coincidência.
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Corria por Lisboa um amante da história e das letras, à procura de um restaurante suficientemente grande que, por uma noite, pudesse fechar as portas para receber um elevado e muito especial número de convivas. Fechar as portas em sentido literal.
Isto porque os convivas, sobretudo os mais antigos e de elevada estirpe, não gostariam de ser vistos pelo público, muito menos entrando em lugares normalmente reservados a “plebeus”.
Nada encontrou em Lisboa, no Porto, nem, correndo o país, em qualquer restaurante nem mesmo nos melhores hotéis, que lhe ser visse para os fins em vista. Lembrou-se de que um convento seria a melhor solução – lugares tranquilos, longe do mundo externo –, e acabou por se fixar no Mosteiro de Alcobaça.
Levou tempo a convencer o Dom Abade de que precisaria de uma sala, grande, fechada, onde ninguém pudesse entrar, nem por qualquer buraco espreitar. O refeitório do convento, espaçoso, seria o ideal.
Argumentou como pôde: só o utilizariam a partir das 20 horas, pagaria o que fosse necessário, mas impunha uma condição: ninguém poderia ver quem lá iria estar dentro.
Dom Abade não tem de se preocupar, são todos pessoas da maior respeitabilidade. Depois lhe venho contar quem aqui esteve.
As instruções foram precisas: nada de cozinhados. Nada. Eles, os convivas, talvez quarenta ou cinquenta, não vêm comer. Só Preview
encontrar-se e conversar. Mas quem sabe se lhes apetecerá beber qualquer coisa, de modo que se porá à sua disposição somente algo para quebrarem um pouco a sede e para alegrar o convívio, sobre tudo vinhos. Os melhores.
Continuando, foi dizendo que tudo isso correria por sua conta, o Mosteiro não gastaria um cêntimo, e, com a conveniente antecedência, traria as bebidas, variadas, vinhos branco e tinto, vinho do Porto, outros vinhos generosos, vinho verde, aguardente e água. Todas as garrafas estarão abertas. Não precisaremos nem de saca-rolhas. Copos, sim, de todos os feitios, e à descrição. Muitos copos. Se o mosteiro não tiver, também posso trazer umas dúzias de copos. Não precisa de ficar preocupado porque ninguém se vai embriagar e criar problemas. Não são necessárias cadeiras, só pequenas mesas espalhadas “aqui e além” onde os convivas pos sam depositar os copos vazios.
Como certamente vai sobrar muita bebida, desde já ela fica ofe recida ao Mosteiro, esperando que os monges dela possam fazer bom uso, assim como dos copos.
Pessoal para servir, nem um. Não há necessidade. E que nin guém, rigorosamente ninguém, ali entre ou vá espreitar. Será even tualmente necessário fechar alguma janela porque não se deverá poder ver quem lá estiver.
O tranquilo Dom Abade julgava estar perante um louco. Para quê se juntarem num refeitório se não iam comer? Só beber? Nunca tinha visto tal. O organizador do encontro limitou-se a responder perguntando quanto queria que lhe deixasse como pagamento ou contribuição para o acontecimento, o que o religioso deixou ao seu critério e, ainda cético, se ofereceu para colocar lá na sala alguns sumos das boas frutas da região, o que foi aceite com muito agrado. Foi-lhe então entregue um envelope com uma generosa quantia. Preview
Aqui tem o seu dinheiro, Dom Abade. No dia seguinte eu venho acertar eventuais contas do que for necessário. Amanhã, a partir das oito da noite, só poderão aqui entrar, além de mim estes poucos senhores cujos nomes estão nesta lista; eles sabem que ficarão numa sala separada, com porta aberta para o salão onde não poderão entrar. Serão os testemunhos da reunião. E que ninguém mais saiba disto. E o senhor, Dom Abade terá que manter todo este assunto em segredo de confissão.
Face ao entusiasmo do visitante e do dinheiro vivo, em notas, o Dom Abade, apesar de desconfiado, acedeu. Mais uma coisa só: onde tem aqui um altar dedicado a São Pedro?
Dom Abade levou-o a meio da nave central da bela igreja, e deixou-o ajoelhado, parecendo rezar com fervor.
Pouco demorou a tirar do bolso uma lista. Ajoelhado, humilde (pleonasmo: ajoelhar é já um ato de humildade!) em frente à ima gem do Santo, e sem muito mais rezas diz-lhe:
São Pedro, preciso de um grande favor. Tenho aqui uma lista de pessoas que gostaria que deixasse, amanhã, virem à Terra. Por pouco tempo. Só algumas horas.
Meu filho, aqui não há ontem nem amanhã, e muito menos horas. Aqui só há o momento presente. O que não importa, porque tudo pode ser controlado. Mas o que vão eles fazer aí na Terra, quando aqui estão gozando a suprema felicidade?
Será uma pequena reunião de escritores de língua portuguesa, incluindo até um que viveu antes de haver esta língua. Um encon tro a que poucos, muito poucos vão ter oportunidade de assistir, e onde imagino se vão trocar curiosas ideias do tempo de cada um. Já todos aí estão a descansar, mas nós, que os estimamos muito e estudamos, queremos ter o inestimável prazer de os poder ver.
Mas, querido São Pedro, tem de os deixar vir vestidos como andaram quando vivos, no seu tempo, pela Terra, independente de uns terem sido ricos e outros até pobres. Será uma ajuda para os podermos distinguir. Só os poucos vivos que assistirão ao encontro vão reparar nesses desprezíveis detalhes. Ah! Um outro detalhe: alguns eram judeus ou cristãos-novos.
Aqui não há judeus, nem há religiões. Há só Paz eterna para quem a mereceu quando peregrinou por essas bandas. Que bom, São Pedro. Mas estranho pedido esse, meu filho. Jamais alguém me apre sentou semelhante ideia! Dizem que eu tenho as chaves do céu, mas aqui eu não mando nada. Somos todos iguais. Não sei como satisfazer este pedido que, devo dizer, até ·me parece interessante. Espera um instante que vou falar ao Pai.
Como no céu também não há instantes, de seguida São Pedro continuou.
Vão poder ir sim. Não preciso da lista que trazes contigo, porque consigo ler o que te vai na alma. À hora combinada apa recerão, um de cada vez, sem ordem das hierarquias desse mundo. Vai em paz.
Já mais animado, o nosso promotor da festa guardou a lista para depois conferir se viriam todos. Não que desconfiasse da palavra do Santo, mas para que ele próprio se não perdesse, e até porque talvez algum não tivesse ganho ainda... os céus!
Os convidados, terráqueos, autorizados a assistir, foram os seguintes de que só se indicam as iniciais para não serem depois assediados por jornalistas e outros curiosos: CC, HS, AP, LS e MC.
Refeitório arrumado, mesas encostadas às paredes, abertas as garrafas com as bebidas, os copos ao lado, arrumados, aproximam -se as vinte horas, o nosso “inventor” do encontro, nervoso, olha para o relógio a intervalos de poucos segundos. O que se iria passar?
De repente, surge o primeiro, logo o mais fácil de identificar, zarolho (sem aquela ridícula coroa de louros na cabeça), calça a meio da coxa e uma capa pelas costas só podia ser o Luís Vaz de Camões! Olhou em volta, parece não ter visto o anfitrião, nem podia porque o anfitrião era um ser vivo e os convidados figu ras etéreas (mas que iam beber vinho!), e com dois passos estava diante das garrafas. Olhou para todas, escolheu como bom conhe cedor, encheu um copo de vinho verde e derramou-o num só trago! Aaah! Que saudades!
Entretanto, chega Brás de Albuquerque, só reconhecido porque Camões ao vê-lo exclamou, alegre:
Brás, aliás Afonso, vamos falar um pouco das nossas aventu ras, ou desventuras, na Índia! Tu não estiveste por lá, mas sabes de muita coisa. Vem beber à saúde daqueles tempos. Vinho verde da minha região ou da tua quinta?
Num instante, aparecem mais três, quatro; cinco, e o anfitrião começa a ficar baralhado sem saber quem era quem. Reconhece Alexandre Herculano, impossível não ser reconhecido, vê-o diri gir-se a um personagem, de roupa vistosa, longa barba branca, ar altivo apesar de se ver já de idade avançada; e muito respeitosa mente se dirige a ele:
D. Alfonsi a Domino, quod est honor.
Afonso X respondeu-lhe em castelhano, língua que ele havia introduzido oficialmente em Castela e Leão em substituição do latim. Entretanto, de garganta seca, pediu que lhe servissem um copo de vinho generoso.
Dom Afonso, este é um vinho das encostas do rio Douro. Duero para usted. É ouro líquido para se beber! ·
Logo ao lado deles estava outra figura ímpar, que fez questão de beijar a mão de seu avô. Herculano logo o reconheceu também e não conseguiu calar o que sentia:
Senhor Dom Dinis, o maior rei que Portugal teve!
Dom Dinis, em grande respeito por seu avô: Tanto e tão bem fizeste, meu Senhor e Rei, que eu seguindo vosso exemplo aboli também o latim em Portugal. Instituí não o castelhano, mas o que mais se fala no meu reino: o galaico-português!
E vinham-se juntando mais, encantados pela presença de tão destacadas figuras. Um deles, magrinho, nariz proeminente, bigode bem aparado, óculos pince nez, ajoelha-se em frente de Dom Dinis, olha-o bem nos olhos e diz-lhe: Meu querido e maior rei, o plantador de naus a haver! – e deixa correr, de emoção duas lágrimas.
Já corre para se juntar ao poeta, roupa simples, humilde, o sapa teiro de Trancoso, Bandarra, que Pessoa apresenta ao Rei: Senhor, aqui está o homem que previu o grande futuro de Por tugal no Mundo, tudo iniciado pela gestão do vosso reinado!
António Vieira esticava a cabeça para ouvir o que diziam do futuro. Dom Dinis, que o viu, mandou-o aproximar-se mais para o abraçar. Sabia da sua história, e no seu íntimo agradecia-lhe a expan são do nome de Portugal. Neste pequeno grupo, Agostinho da Silva tinha que estar. Encantava-se na presença do grande soberano, mas sobretudo bendizia a herança da Santa Rainha, ausente, mas muito estimada, e queria apresentar ao rei a também sua visão Império do Menino, a que se juntou, para aplaudir, Ariano Suassuna.
Ao grupo inicial, ia-se juntando um sem número dos muitos poe tas coevos porque ali se encontrava o Mestre Bernardim Ribeiro, a quem Camões perguntou pela “Menina e Moça e seu roussinol”, um canto triste de quem cantou a dor da Menina. Sá de Miranda com sua longa barba, que depois de abraçar efusivamente o seu amigo Bernardim, brincou com Camões dizendo-lhe:
Sabes bem, grande mestre, que se te salvaste do naufrágio, não te salvas que se tenha espalhado por toda a parte o teu intenso Preview
engenho e arte! Aprendeste que o Amor é fogo que arde sem se ver, mas logo é cego mínimo e a Fortuna é cega mulher!
João de Barros aguardava a troca das amabilidades poéticas para se voltar para a Índia! Camões, Afonso de Albuquerque, Diogo do Couto, Garcia de Orta e até Duarte Nunes de Leão, que reclamava por não encontrar à disposição entre as preciosidades etílicas nem que fosse uma só garrafa da sua terra, o clássico Pêra Manca, um vinho da minha terra que se cultiva há milhares de anos e que os romanos vinham aqui buscar para se deliciarem em Roma! –André de Resende coadjuvou:
Tens razão, Duarte Nunes.
Todos riram e Afonso de Albuquerque correu para lhe oferecer um copo do que de melhor a Quinta da Bacalhôa produzia!
Disse Duarte Nunes:
Obrigado. É bom, mas não se aproxima do Pêra Manca, amigo Brás.
E eu que o diga! – confirmou Bernardim, orgulhoso do seu Torrão!
Não seria tão bom, mas Brás foi notando que só à conta dele uma garrafa inteira já se tinha evaporado!
Bocage, magro, de olhos azuis, carão moreno, bem servido de pés, meão na altura, triste de facha, o mesmo de figura, nariz alto no meio e não pequeno, irreverente, atento à troca de ideias não se conteve. Sadino, sai em defesa dos moscatéis de Setúbal que costumava beber em níveas mãos, por taça escura, e com seu jeito descontraído fez com que todos provassem o cantado néctar, apro vado por unanimidade.
Os que andaram pelas Índias cutucaram Camões:
Mestre Luiz, nunca revelaste onde era a Ilha dos Amores, mas eu que por lá andei recordo bem uma das que mais prenderam o meu coração: a Ilha de Mussa Ben-Bique! Não andavam as belas
deusas pela floresta, que não havia, mas vi-as tocar o alaúde e a qunan, a que nós chamamos harpa, e o nosso desejo se acendia mesmo que as carnes não fossem tão alvas!
Tens razão, Garcia, eu que por lá passei e vi muitas daquelas deusas de ébano, não as esqueci nunca. Como poderia? Depois de meses de mar...
Gaspar Correia, com um suspiro acrescentou:
Ah! A ilha dos sonhos e dos amores era essa mesma, Diogo do Couto. Passei a minha vida, quase toda na Índia e lembro do grande Vice-Rei Afonso de Albuquerque que volta e meia me falava das “deusas daquela ilha”!
Segui a conversa sobre a Índia, mas havia que escutar outros grupos. Camões vê entre os de outras gerações alguém que queria muito cumprimentar. Ali estava outro poeta, elegantíssimo, casada verde-bronze com botões de amarelo-dourado, colete branco de grandes bandas, calça cor de flor de alecrim, gravata de cores lúbri cas e luvas cor de palha!
João Batista! Que ideia ter escrito aquele belo poema, Camões! Muito me sensibilizou e fez até nascer almas poéticas em jovens simples!
Luiz Vaz, devias ter visto a magnífica peça de teatro que fez em meu nome! Foi um imenso sucesso!
E conseguiu um efeito especial do Castelo da Almada a arder dentro do teatro!
Exclamou Manuel de Sousa Coutinho.
Sabem onde me inspirei? Numa barraca de marionetes na Póvoa de Varzim! E que bela obra também a tua «Frei Luís de Sousa», sobre o grande arcebispo Dom Frei Bartolomeu!
A reunião estava animada, a noite virava e ainda duraria muitas horas.
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Continuava animada a conversa naquele inusitado encontro em Alcobaça.
Rodeavam agora Dom Dinis todos aqueles que haviam passado pela sua Universidade, lembrando que fora este grande rei que, em 1290, instituíra o Estudo Geral Português, com a assinatura do documento «Scientiae thesaurus mirabilis». Parecia, e era (e conti nua a ser!) a maior figura da história de Portugal.
Propunham até os antigos alunos ali fazerem uma serenata ao grande Rei, e o lembraram, meio em segredo, para não melindra rem a memória de Dom Afonso IV, de seu filho Pedro Afonso que tanta obra deixou. Ainda ensaiaram uma pequena trova de D. Dinis, mas em voz baixa já que os outros convivas estavam também em animada conversa: “Ai flores, ai flores do verde pino, se sabedes novas do meu amigo! ai Deus, e u é?”
João Rodrigues, depois Amato Lusitano, lamentava ter ido estu dar em Salamanca por ser considerado na altura de sangue sujo. Brilhou pela Europa, assim como Abraão Zacuto Lusitanum de quem Dom João III se serviu, mas não impediu que fosse igualmente expulso de Portugal. António Vieira conversava com eles que sabiam que ele também havia sofrido semelhante perseguição, bem como outro brilhante conviva, Garcia de Orta.
Até o grande mestre Damião de Gois, de família nobre, por melhor e mais profundamente pensar foi perseguido pelo mesquiPreview
nho clero e acabou, ao que dizem, assassinado! E espero que nin guém se esqueça do que sofreu o também grande Diogo do Couto. Lamentavam todos os presentes que os sefarditas tivessem sido expulsos de um país que eles tanto amavam e continuaram a respeitar mesmo longe. E pior, expulsos por quem deles se serviu, D. João III, esmagado sob o peso da beatice dominicana. Herculano ouviu falar neste rei e não se conteve, com o seu ar austero: Era um homem medíocre, inábil, fanático, inábil para gover nar por si próprio.
António Vieira, mais cordato:
Aproveitemos este encontro, este convívio e procuremos esquecer as nossas desventuras. Vamos beber um bom vinho das terras de Garcia de Orta, não direi à nossa saúde porque..., mas ao nosso encontro.
Muitos mais grupos se formavam sem que alguém fosse impe dido de circular.
Já Dom João, o primeiro, beijara a mão de seu bisavô, e presen ciando o respeito de que ficou sempre merecedor, num instante se viu rodeado pelos amigos, entre eles Dom João de Ornelas, cujo semblante não negava o prazer de estar no “seu” antigo mosteiro! E pelos cronistas! Fernão Lopes, que elogiava o trabalho de Duarte Nunes ao refundir as crónicas dos reis da primeira dinastia, e a dos três primeiros reis da dinastia de Avis, na Segunda Parte das mesmas crónicas, o que foi apoiado por Gomes Enes, de Zurara, e Herculano que ainda acrescentou:
Na opinião do 1.º Marquês de Alegrete, foi Duarte Nunes de Leão quem abriu caminho à crítica da História em Portugal, escrevendo com juízo e madureza, certamente enquanto apreciava o seu tão famoso e elogiado vinho! Preview
O que ele também fez. Herculano estava eufórico. Ele, sempre com aquela cara fechada, enigmático, exultava com os personagens que tão bem conhecera no Tombo.
E chegados estavam agora os filhos Dom Duarte e Dom Pedro. Bonito esse vosso livro, meu filho, o Leal Conselheiro. Exem plo de um homem honrado que bebeu, sobretudo, de sua mãe, a delicadeza e o comportamento exemplar. Pena que meu neto Afonso tenha sido tão ingrato com seu tio Pedro, que foi o melhor conselheiro que poderia ter encontrado.
Dom Pedro, que foi Duque de Coimbra, Duque de Treviso, Cavaleiro da Ordem da Jarreteira, ar triste, no íntimo o filho pre ferido de seu pai, que sempre amou seu irmão e seu sobrinho, per doava, mas não podia esquecer o que lhe fizeram.
São águas passadas. Penso em meu irmão Henrique e o quanto ele teria gostado de ler a carta de Pero Vaz de Caminha. Aproxima-te, Pero Vaz, para te abraçar em nome de meu irmão Henrique.
E tu também, Pero de Magalhães, o homem que veio de Gand para nos dar a primeira descrição, em história, das Terras de Vera-Cruz! E pensar que tudo isto devemos ao grande rei, nosso ante passado, com a sua grande visão.
Poucas eram as figuras femininas, entradas no Mosteiro sem o conhecimento do Dom Abade, mas ali estava Florbela Espanca, por especial deferência de São Pedro, que advogara em sua defesa a escrita libertina, os vários casamentos que não deram certo e as tentativas de suicídio, porque sabia o quanto ela havia sofrido.
Florbela? Aqui? Acabo de sair de um outro encontro feminino porque não gostei do que disse a Soror Mariana, a fazer-se de vítima, arrependida, quando já se sabe que não foi ele que escreveu as cartas ao francês! Mas eu…