"Memphis" TAG Curadoria - Julho/2023

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JUL 2023 MEMPHIS

olá, tagger Olá, tagger

Nosso clube está completando nove anos! E foi com a missão de fazer jus a este momento tão especial que passamos longos meses pensando em um livro emocionante e memorável para ser enviado a você. Já é tradição, em julho, nós mesmos escolhermos um título à altura da nossa alegria por celebrar mais um ano de existência.

Qual não foi a nossa surpresa quando Memphis, romance de estreia da autora Tara M. Stringfellow, chegou às nossas mãos? Inédita no Brasil, a obra nos arrebatou por sua prosa delicada, pelo retrato que faz de mulheres de três gerações de uma família afro-americana, de 1930 ao início dos anos 2000. São, todas elas, personagens cujas trajetórias nos comovem e encantam. A seguir, você encontra textos complementares ao livro, incluindo reflexões sobre a obra e uma contextualização da cidade que lhe dá título. Há ainda um conteúdo especial sobre os nossos nove anos: conversamos com Gustavo Lembert, cofundador e CEO da TAG, que compartilha um balanço da trajetória e planos para o futuro do clube.

Boa leitura!

JUL

TAG Comércio de Livros S.A.

Tv. São José, 455 | Bairro Navegantes

Porto Alegre — RS | CEP: 90240-200

taglivros

contato@taglivros.com.br www.taglivros.com

QUEM FAZ

RAFAELA PECHANSKY Publisher

JÚLIA CORRÊA Editora

BRUNO MIGUELL Designer

LIZIANE KUGLAND Revisora

ANTÔNIO AUGUSTO Revisor

Impressão Ipsis

Capa Gabriela Heberle

Página da loja Gabriele Baptista

Preciso de ajuda, TAG! Olá, eu sou a Sofia, assistente virtual da TAG. Converse comigo pelo WhatsApp para rastrear a sua caixinha, confirmar pagamentos e muito mais!

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sumário posfácio 22 24 Recomendações Para ir além 28 Agenda prefácio 10 Contextualização 6 8 14 Por que ler o livro O livro do mês Especial Aniversário TAG 4 Experiência do mês 20 Ilustração do mês

VAMOS LER MEMPHIS

Criamos esta experiência para expandir a sua leitura. Entre no clima de Memphis colocando a playlist especial do mês para tocar. É só apontar a câmera do seu celular para o QR Code ao lado ou procurar por “taglivros” no Spotify. Não se esqueça de desbloquear o kit no aplicativo da TAG e aproveitar os conteúdos complementares!

Leia até a página 63

Agora já entendemos melhor o que estava por trás da decisão de Miriam de voltar a Memphis. As últimas cenas foram de cortar o coração, não é mesmo? O que você acha do modo como Jax tenta responsabilizá-la por tudo? Comente lá no app!

Leia até a página 111

Joan parece ter encontrado uma boa fonte de inspiração para seus desenhos. E que momento delicioso acabamos de testemunhar! August tem mesmo muito talento. Como você acha que seria sua vida se ela pudesse se dedicar à música?

Leia até a página 186

Chegamos ao fim da segunda parte do livro. Foram passagens devastadoras essas últimas centradas na trajetória de Hazel. Como não se indignar com tanto horror? Compartilhe no app suas impressões.

Leia até a página 255

Depois de cenas carregadas de tensão por causa de Jax, foi difícil não sorrir agora junto com Mya. Sua irmã tem razão: ela é mesmo encantadora.

Leia até a página 310

Cheio de afeto, o final da história nos dá boas provas do gosto pela liberdade. Um desfecho emocionante, à altura de personagens tão marcantes. Não deixe de avaliar o livro no app!

PLAYLIST
O APP 4 EXPERIÊNCIA DO MÊS
OUVIR
ACESSAR

projeto gráfico

O projeto deste mês foi desenvolvido pela designer Gabriela Heberle, parceira de longa data da TAG, responsável por projetos de livros como A ilha das árvores perdidas e Afirma Pereira. A arte produzida por ela busca ressaltar o protagonismo feminino negro no livro, com uma ilustração baseada na figura de August. Ao mesmo tempo, a capa faz referência aos desenhos que outra personagem, Joan, sobrinha de August, fazia das mulheres de Memphis, entre elas a sua própria tia. Complementando o conjunto, a luva faz referência ao papel de parede floral da casa em que vivem, e possui um recorte vazado que mostra a personagem retratada na capa.

No mês de aniversário da TAG, o mimo surge como um lembrete de que ler também é um ritual com seus próprios encantos. Concebemos velas em três aromas diferentes, enviadas de forma sortida, e cada uma delas tem sua conexão com o momento da leitura. Com aroma de alecrim, a shhh… estou lendo é perfeita para quando você quer se esquecer do mundo e não largar o livro até chegar à última página; com aroma de romã, a leitura a sós foi pensada para a melhor combinação possível: só você e um bom livro; por fim, a cheirinho de plot twist, com notas de limão, jasmim e tangerina, vai cativar você até a última chama (ou página).

Memphis pode ter terminado, mas a experiência não!

Aponte a câmera do seu celular para o QR Code ao lado e escute o episódio de nosso podcast dedicado ao livro do mês. No aplicativo, confira também a nossa agenda de bate-papos.

mimo 2023 jul fev ago mar set abr out mai nov jun dez jan
OUVIR PODCAST 5 EXPERIÊNCIA DO MÊS

The New York Times Book Review

“Eu

“Um hino rapsódico às mulheres negras.”
me encantei com a família [do romance], do coração feroz de Joan à determinada resiliência de sua avó Hazel. Tara Stringfellow é uma autora a se ficar de olho nos próximos anos.”
6 POR QUE LER O LIVRO
Jacqueline Woodson, autora de Em carne viva

Por que ler o livro

Impressionante livro de estreia de Tara M. Stringfellow, Memphis propõe uma delicada imersão na vida de mulheres negras pertencentes a três gerações de uma mesma família. Com passagens marcadas por lirismo, que refletem a experiência da autora como poeta, a narrativa alterna-se entre os pontos de vista dessas personagens, revelando a força da união feminina em um contexto de brutalidade e racismo. O livro foi indicado a prêmios como o Women's Prize for Fiction 2023 e o Goodreads Choice Award 2022, nas categorias de melhor ficção histórica e melhor estreia.

7 POR QUE LER O LIVRO

Entre a dor e a esperança

JÚLIA CORRÊA

Primeiro romance de Tara M. Stringfellow, Memphis mostra trajetórias femininas impactadas, ao longo de décadas, pela segregação racial

Éem uma estrutura não linear que Tara M. Stringfellow constrói o seu primeiro romance, Memphis, publicado originalmente no ano passado, quando se tornou um best-seller imediato nos Estados Unidos, país natal da autora, e figurou em diversas listas de melhores livros de 2022.

O título remete à cidade em que estão fincadas as raízes familiares de Stringfellow. Localizada na região sul dos EUA, no Tennessee, Memphis foi palco de momentos determinantes da luta pelos direitos civis no país (leia mais na página 10). E é lá onde se cruzam as trajetórias das personagens desse romance que leva o seu nome.

A estrutura não linear da narrativa, que vai e volta entre os anos 1930 e 2000, parece emular, de algum modo, as próprias trajetórias retratadas por Stringfellow. Acompanhamos as histórias de mulheres de três gerações de uma mesma família, tendo como ponto de partida o retorno da personagem Miriam, pertencente à segunda geração, para Memphis. Junto de suas duas filhas, Joan e Mya, ela volta para a casa que fora de seus pais, na qual vivem agora sua irmã, August, e seu sobrinho, Derek.

É a partir, portanto, desse reencontro familiar — tão afetuoso quanto perturbado, marcado por silêncios doloridos — que diversos fios vão sendo costurados e descosturados, com a alternância das histórias e pontos de vista de Hazel — a já falecida matriarca da família —, de Miriam, August e Joan. Com seu olhar ingênuo, Mya, a filha caçula de Miriam, testemunha boa parte dessas histórias, mas não ganha o mesmo protagonismo.

O LIVRO DO MÊS 8

Se a estrutura do livro emula a configuração dessas trajetórias, é porque cada uma das personagens, ao tentar levar sua vida adiante, seguindo os seus próprios planos e sonhos, precisa lidar com uma série de intercorrências. São dificuldades que envolvem, em grande medida, o plano pessoal, as relações íntimas, os traumas do passado, mas que refletem continuamente tensões sociais e raciais ao redor daquelas mulheres, que, por sua vez, não cessam de buscar o seu lugar no mundo.

Sem por isso amenizar a brutalidade daquele contexto, Stringfellow constrói essas tramas e subtramas com uma prosa sensível, em tom muitas vezes lírico, que se explica por sua atividade prévia como poeta. É um estilo que casa muito bem com a atmosfera arejada e vívida que, em tantos momentos, também se impõe, como quando August, que trabalha como cabeleireira, entoa uma música em seu salão (não faltam, aliás, referências a artistas como Al Green e Aretha Franklin), ou quando Joan, inspirada pelas mulheres do bairro, deixa aflorar o seu talento como desenhista. É, afinal, um livro que fala de dor, mas que também fala de beleza e esperança.

O LIVRO DO MÊS
Tara M. Stringfellow, autora de Memphis.
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Crédito: Headshot Zara Visuals

Palco de lutas

EDUARDO PALMA

Obra de Stringfellow perpassa gerações de famílias negras em Memphis, uma das principais cidades do sul dos EUA e marco do movimento pelos direitos civis

“M emphis é um poema de amor para minha cidade e para as mulheres negras que vivem aqui.” Assim a escritora Tara M. Stringfellow descreve Memphis, que se passa na cidade de mesmo nome e narra as experiências de três gerações de uma família negra. Centrada na vida delas, a história começa por volta dos anos 1930 e vai até o início dos anos 2000. Mas não é exagero dizer que a própria cidade é uma personagem da obra.

Memphis está localizada no Tennessee, às margens do rio Mississippi, o que impulsionou seu desenvolvimento econômico e a tornou um dos principais centros urbanos do sul dos EUA, com 630 mil habitantes e uma região metropolitana de quase 1,5 milhão. No passado, Memphis foi uma das maiores produtoras de algodão do mundo.

A partir dos anos 1950, Memphis se tornou o centro urbano do centro-sul americano com a maior população negra. Foi palco de movimentos históricos em favor dos direitos civis, com a marcante presença da National Association for the Advancement of Colored People (NAACP). Memphis teve ainda a maior igreja evangélica negra do país e muitas organizações cívicas. Por isso a cidade abriga hoje o Museu Nacional dos Direitos Civis, no local onde Martin Luther King foi assassinado, em 1968, quando participava de ações na cidade.

CONTEXTUALIZAÇÃO 10

Crédito:

CULTURA

Memphis teve um efervescente ambiente musical e cultural, com destaque para o blues e o rock’n'roll. Músicos de todos os EUA buscavam a região para fazer suas apresentações. A rua Beale — que, por sinal, aparece no título de um famoso livro de James Baldwin — é um dos símbolos da cultura negra, e um dos ícones dessa era é o Sun Studio, que lançou álbuns de artistas como B. B. King, Johnny Cash, Elvis Presley e Roy Orbison.

MATERIAL LITERÁRIO

O romance contempla diversos aspectos da trajetória familiar de Stringfellow na cidade. Seu avô, por exemplo, foi o primeiro detetive negro de Memphis, fato que ressoa no personagem que representa o patriarca da família. Por meio das dificuldades que enfrenta na corporação, percebe-se como as relações raciais não eram nada pacíficas. Para a autora, o livro é “um monumento” que seu avô nunca teve.

CONTEXTUALIZAÇÃO
Rua Beale, famoso ponto da cidade, em 1939. Marion
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Post Wolcott

Já sua avó materna foi uma das primeiras enfermeiras negras de um importante hospital da cidade. Também foi ativista e marchou ao lado de Martin Luther King, que participou de várias ações na cidade. Apesar de Stringfellow ter vivido em países como Itália, Cuba e Japão, foi em Memphis que decidiu lançar raízes e abandonar a carreira de advogada para se tornar professora e escritora.

“O livro é minha prova de que um grande povo reside no sul. Que as mulheres de Memphis podem limpar peixes, fritar tomates, liderar revoluções, colocar as crianças para dormir à noite e cantar o tempo todo”, declarou ela à Melan Magazine. “Memphis é minha prova de que nossas vidas — nossas lindas, ricas e plenas vidas negras — importam tanto.”

LUTAS SOCIAIS

O livro An Unseen Light: Black Struggles for Freedom in Memphis, Tennessee , de Aram Goudsouzian e Charles McKinney, mostra como a desigualdade de oportunidades entre brancos e negros e a segregação permearam a história de Memphis.

A obra contesta a visão de que a cidade tenha sido menos opressiva do que outros locais e mostra o papel da elite política em frear avanços, diminuir os espaços para os negros e calar o ativismo. Os autores usam no título o termo “luz invisível” porque muitas atividades e lutas da comunidade negra foram silenciadas.

“Em 1968, a cidade se encontrava no epicentro do movimento pelos direitos civis quando Martin Luther King foi assassinado. No entanto, apesar dos eventos significativos que ocorreram na cidade e das contribuições de seus cidadãos para a luta pela liberdade negra, Memphis foi negligenciada pelos historiadores do movimento pelos direitos civis”, avalia a historiadora Keisha Blain em artigo publicado na Sociedade da História Intelectual Afro-Americana (AAIHS). Agora, Stringfellow ajuda a colocar os holofotes na cidade sulista.

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Martin Luther King esteve em eventos históricos na cidade. Crédito: The University of Tennessee, Knoxville Primeiros oficiais negros admitidos na Polícia de Memphis, em 1948.
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Crédito: Memphis Police Department

MOMENTOS DO MOVIMENTO NEGRO EM MEMPHIS

1948 — Rádio WDIA de Memphis contrata o primeiro DJ negro. Um ano depois, passa a ser a primeira do país com todos os DJs negros.

1948 — Departamento de Polícia de Memphis contrata os primeiros oficiais negros.

1955 — Corpo de Bombeiros de Memphis contrata os primeiros funcionários negros.

1959 — Primeiros estudantes negros ingressam na Universidade de Memphis.

1960 — Fim da segregação no transporte público de Memphis.

1960 — Fim da segregação em bibliotecas públicas.

1961 — Primeiros estudantes negros ingressam em escolas antes abertas somente para brancos.

1962 — Restaurantes em Memphis passam a anunciar que vão acabar com a segregação.

1963 — Fim da segregação nos parques de Memphis. Fevereiro 1968 — Grande greve de trabalhadores por mais segurança e melhores condições de trabalho, com mais de mil participantes.

Março de 1968 — Luther King vai a Memphis apoiar uma marcha pelos direitos da população negra. Algumas janelas de comércios são quebradas. A polícia reage com brutalidade, deixando 62 feridos e 300 prisões. King promete voltar.

Abril de 1968 — King volta para organizar movimentos pacíficos na cidade em apoio à greve dos funcionários da área de saneamento. Em um templo, faz o que seria seu último discurso: “Cheguei ao topo da montanha”.

4 de abril de 1968 — Martin Luther King é assassinado em um hotel em Memphis.

18 de abril de 1968 — A greve acaba, a cidade reconhece a importância do movimento e concede aumentos salariais.

(Fonte: Knight Lab. Acesse a linha do tempo completa em www.shre.ink/Q9UF.)

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Em 1959, Universidade de Memphis recebe estudantes negros.
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Crédito: University of Memphis

Completamos nove anos e temos muito o que comemorar! É sempre bom relembrar os nossos passos até aqui, e, claro, queremos dividir essas memórias com você, que é parte fundamental dessa história.

Por isso, conversamos com o Gustavo Lembert, cofundador e CEO da TAG, para compartilhar um balanço desses nossos nove anos e falar de planos para o futuro do clube.

Nestes nove anos de TAG, se for possível resumir, qual balanço você faz, pensando em toda a trajetória do clube até aqui? Quando começamos, era uma fase de desconfiança, pois muitos leitores não conheciam o modelo de clube e não confiavam na ideia de assinar um livro surpresa. Também havia esse sentimento por parte das editoras, que acreditavam que era um modelo ultrapassado. Precisamos vencer isso para desenvolver projetos mais especiais e mostrar o que queríamos fazer. Por isso nosso sonho era trabalhar com edições exclusivas — queríamos ocupar o espaço da Cosac Naify, não só pensando no livro como arte, mas como experiência, garantindo que cada livro tivesse sua individualidade e sua própria história. Quando começamos a trabalhar com edições exclusivas, não havia tanta edição de luxo assim no mercado. As próprias editoras comentam

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Ao longo desses anos, percebemos que nosso objetivo é ajudar as pessoas a lerem mais”

Crédito:

como, de certa forma, nós lançamos uma tendência, o que fez com que elas mesmas precisassem se adaptar para fazer um novo estilo de projeto gráfico, não apenas em termos de acabamento, com uma capa dura, mas com uma outra forma de pensar os materiais complementares. Como desde o início assumimos a responsabilidade de escolher os livros para as pessoas, precisávamos garantir que a experiência estivesse encantando, tornando mágica a relação de cada um com o livro do mês, e acho que o foco em encantar foi o que fez a TAG ser o que ela é hoje. Mesmo com tantos desafios e obstáculos no último ano, são muitas conquistas: tivemos um livro escrito para a TAG de contos clássicos e contemporâneos; o romance que o José Luís Peixoto escreveu pensando nos leitores da TAG e que só depois lançou em Portugal; a publicação do livro do Gurnah, um Nobel de Literatura, com capa do Kobra, um artista urbano; o prêmio de inovação em Londres… Eu diria que, ao longo desses anos, nós percebemos que nosso objetivo é ajudar as pessoas a lerem mais, sejam os leitores vorazes que vão acabar descobrindo títulos diferentes, sejam aqueles que ainda não têm o hábito da leitura tão enraizado. Mas também sabemos das nossas dificuldades: tivemos momentos

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Gustavo Lembert, cofundador e CEO da TAG.
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TAG

muito difíceis desde meados de 2021, com uma pressão forte nos custos e impacto na qualidade de serviço. Não falta empenho, no entanto, para contornarmos essas adversidades.

Em que medida você acredita que a TAG alcançou o propósito de tornar a literatura papo de bar? O caminho é muito longo. E é por isso que não consideramos a ideia de tornar a literatura papo de bar uma visão, mas sim uma utopia, porque a gente sabe que talvez seja um ponto de chegada não muito claro e nem tão atingível no curto prazo. Mesmo assim, é isso que nos move desde o início. E, claro, pelos inúmeros relatos de associados, não só vemos o quanto as próprias pessoas da base estão lendo mais, mas também o quanto o livro está mais presente na vida delas. Desse modo, elas fazem amizades com outros associados, marcam de sair com o pessoal, fazem encontros do livro todo mês… Nesse sentido, tanto o aplicativo do clube quanto o Cabeceira tornam o livro mais próximo do dia a dia, pois estão a um clique de distância. E era este, em grande parte, o nosso objetivo: fazer com que o livro esteja mais presente, pois, assim, ele naturalmente vai ser uma pauta mais comum em papo de bar. Então, sim, acredito que contribuímos, que os livros estão mais nos bares, mas ainda temos um caminho muito, muito longo a percorrer.

Há algum momento em especial da história da TAG do qual você se lembre com carinho e que gostaria de compartilhar com os nossos associados?

Já que falamos antes em conversa de bar, um momento muito especial para mim foi quando organizamos uma casa na FLIP, marcamos um happy hour e, de repente, chegaram a Conceição Evaristo e a Djamila Ribeiro. Elas tinham ido para o happy hour mesmo, não foram palestrar, não estavam no evento, elas estavam lá porque gostaram da maneira como foram recebidas pela TAG e, principalmente, do contato com os nossos leitores. Ficaram lá conversando não apenas entre elas, mas com os associados, e isso simbolizou muito a nossa ideia de tornar a literatura papo de bar (embora, claro, em um evento como a FLIP, o público já seja enviesado para isso). Mas o principal é o quanto a gente conseguiu aproximar leitores dos autores de uma maneira leve e divertida.

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O que você diria que espera para os próximos nove anos de TAG? Quais são as principais expectativas? Como disse antes, temos cada vez mais nos entendido como uma empresa para fazer as pessoas lerem mais, então certamente os nossos próximos nove anos serão pautados por isso. Mas, falando de maneira mais específica, tenho uma expectativa muito grande com o Cabeceira, porque, com a presença cada vez maior do celular na vida das pessoas, elas podem usá-lo não necessariamente para ler no aparelho, mas para que ele as auxilie na leitura de um livro, como um assistente pessoal. Temos muitos outros sonhos, e um deles é o nosso projeto de criar um clube de literatura infantil. Temos muito carinho por esse tipo de literatura, vemos que a formação dos leitores acontece mesmo na infância. E, assim, teríamos um produto para toda a família. Aliás, dá até para imaginar uma pessoa entrando no clube infantil que fosse crescendo com a TAG e ficasse associada pela vida inteira. Naturalmente, pensamos em muitas outras coisas. Iniciativas com audiolivro, por exemplo, também nos motivam.

Pensando no curto prazo, o que os associados podem esperar? Há novidades que já podem ser anunciadas? Pode dar mais detalhes, por exemplo, das edições que temos produzido em casa? Sim, no início do ano publicamos Mama, enviado na TAG Curadoria, nosso primeiro livro feito em casa, o que nos deu muito orgulho por ser uma obra fundamental e que já entrou no rol de preferidos dos associados. Nos sentimos estimulados a continuar publicando “em casa”: para o segundo semestre, temos dois livros contratados que serão enviados na TAG Inéditos (um suspense incrível para quem amou Corra! e um romance histórico para quem ainda não superou Herdeiras do mar). Para 2024, temos o plano de continuar publicando livros pelo selo da TAG, podendo ter um contato mais direto com autores e agentes e deixando os livros ainda mais com a nossa cara.

Poderia nos contar qual é o seu título favorito entre os mais recentes enviados pela TAG? Além dos livros do clube, o que você tem lido? Tem alguma recomendação para o pessoal? Um livro que me tocou muito foi K., do Bernardo Kucinski. Além de ser uma leitura fluida e envolvente, obra de um autor nacional, é um livro que nos permite conhecer mais a história do Brasil, para não apagarmos da memória o horror de eventos nem tão distantes do presente. Fora da TAG, um dos últimos livros de ficção que li e do qual gostei muito foi Tempos ásperos, do Mario Vargas Llosa, que já foi nosso curador. É um tipo de romance que me agrada muito, em que o autor lança sua imaginação ímpar para personagens e eventos reais, tornando a leitura tanto divertida quanto elucidativa sobre um período histórico de um país que eu conhecia muito pouco, a Guatemala. No campo da não ficção, acabei há pouco Pense de novo, do Adam Grant, enviado pela Grow, e o tenho recomendado para todo mundo. É um incentivo a abraçar o erro, a valorizar mais o aprendizado do que o acerto.

E você? Tem alguma lembrança especial desses nove anos de TAG? Compartilhe sua história no app!

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Ilustração do mês

Gabriel Renner é ilustrador freelancer e designer. Passou pelas redações de Zero Hora, Diário Gaúcho, Notícias do Dia e Grupo Editorial Sinos, além de ter ilustrado para as revistas Superinteressante, Mundo Estranho e Sexy. @rennergabriel

A pedido da TAG, o artista interpretou uma passagem do livro do mês: “August começou a cantarolar, de modo lento e profundo, combinando com o tom de risada que ainda ecoava em seus ouvidos. Sua voz ficou mais alta, sílabas formando palavras. Uma música tão familiar para as mulheres no salão quanto as filhas são para as mães, irmãs para irmãs. Mya, sem que ninguém lhe pedisse, pausou a música que vinha da jukebox. A Srta. Jade também começou a cantar. Mya também. A Srta. Dawn. Joan. Todas as mulheres do salão. August sentiu que conhecia as palavras melhor do que ela mesma, na maioria das vezes. E quando ela atingiu aquela nota alta — aquele dó agudo —, até Mika acenou com a cabeça adornada com bobes e cantou junto”.

20 ILUSTRAÇÃO DO MÊS

POSFÁCIO

Se você ainda não leu o livro, feche a Revista nesta página. A seguir, você confere conteúdos indicados para depois da leitura da obra.

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Experiências compartilhadas

No embalo de Memphis, confira uma seleção com outras obras para ampliar a experiência de leitura do romance de Tara M. Stringfellow

CARTA A MINHA FILHA, de Maya Angelou

Autora também de Eu sei por que o pássaro canta na gaiola, livro já enviado pela TAG, Maya Angelou une o tom lírico e o confessional para apresentar, em capítulos curtos, uma série de conselhos baseados em sua própria trajetória de vida, incluindo aspectos de sua luta pelos direitos civis e por sua autonomia como mulher.

SE A RUA BEALE FALASSE, de James Baldwin

A famosa rua da cidade de Memphis compõe o título do quinto romance de Baldwin, lançado em 1974. O enredo gira em torno de Tish, uma jovem grávida que luta para provar a inocência de seu noivo, Fonny, acusado injustamente de ter estuprado uma jovem porto-riquenha. Ambientado na década de 1970, o livro revela as tensões raciais da época. A obra foi adaptada para o cinema por Barry Jenkins.

MAUD MARTHA, de Gwendolyn Brooks

Elogiado por nomes como Bernardine Evaristo, é um livro que acaba de ser lançado de forma inédita no Brasil pela Companhia das Letras, sendo apresentado como “uma joia redescoberta da literatura norte-americana”. Escrita pela primeira autora negra a ganhar o prêmio Pulitzer, trata-se da história de uma menina negra de Chicago que vai atrás dos seus sonhos e precisa de resiliência para lidar com as adversidades no caminho de sua busca por liberdade.

RECOMENDAÇÕES
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VIDAS REBELDES, BELOS EXPERIMENTOS: HISTÓRIAS ÍNTIMAS DE MENINAS NEGRAS DESORDEIRAS, MULHERES ENCRENQUEIRAS E QUEERS RADICAIS, de Saidiya Hartman

Professora da Universidade Columbia, Hartman propõe um estudo sobre a população dos cinturões negros da Filadélfia e de Nova York, sobretudo de jovens negras.

A FONTE DA AUTOESTIMA: ENSAIOS, DISCURSOS E REFLEXÕES, de Toni Morrison

Em textos de não ficção, a reverenciada autora de Sula, Amada e O olho mais azul ressalta personalidades como Martin Luther King Jr. e James Baldwin, além de abordar eventos históricos e temas relativos à mulher e aos corpos negros.

MAMA, de Terry McMillan

Livro de janeiro da TAG Curadoria, o romance é ambientado em Michigan a partir dos anos 1960. O enredo gira em torno de Mildred, personagem que se livra de um marido violento e tem de criar sozinha os seus cinco filhos — a primogênita, Freda, que carrega uma série de traumas intergeracionais, também ganha protagonismo e, no decorrer da história, buscará romper com as limitações de seu meio social.

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Kit de janeiro da TAG Curadoria.

Sobre pensar com o coração

Confira uma reflexão, a partir da trajetória de Joan, sobre a arte como possibilidade de existência para mulheres negras

Em “A poesia não é um luxo”, um dos ensaios presentes no livro Irmã outsider (Editora Autêntica, 2019), Audre Lorde diz que, ao olharmos “a vida ao modo europeu, como apenas um problema a ser resolvido, confiamos exclusivamente em nossas ideias para nos libertar, pois elas, segundo nos disseram os patriarcas brancos, são o que temos de valioso”.

Gostaria de reforçar que foram os “patriarcas brancos”, vulgo colonizadores, que nos disseram aquilo que devemos valorizar. Ora, não foram também eles que, ao invadir a África e as Américas, achando feio tudo aquilo que não era espelho, nos definiram como sub ou super-humanos ao animalizar nossos traços ou hipersexualizar nossos corpos? Não foram eles que inventaram a categoria raça, criaram um conceito de humanidade, rotularam e escravizaram tudo aquilo que não estava à sua imagem e semelhança?

Professora, escritora e ativista, é idealizadora do projeto Encruzilinhas, voltado ao debate de textos sobre negritude, gênero e feminismos.

Memphis, de Tara M. Stringfellow, narra as desventuras de três gerações de mulheres nos segregados Estados Unidos. Logo no primeiro contato que tive com o romance, outras mulheres vieram ao meu encontro mediar minha leitura. Com seu texto incluso na coletânea Pensamento feminista hoje: perspectivas decoloniais (Bazar do Tempo, 2020), María Lugones me fez pensar na colonialidade de gênero e em como essa narrativa privilegia homens

MARIA CAROLINA CASATI*
PARA IR ALÉM
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(ainda que negros) em detrimento de negras (ainda que mulheres). D. Conceição Evaristo — salve, rainha! — lembrou-me de que, quando nós nos escrevemos, nos “inscrevemos na História”, construímos tradições outras, nos definimos nós mesmas. Mas foi com Audre Lorde que tive a conversa mais potente sobre as vidas de duas das nossas protagonistas, Joan e Miriam, mãe e filha.

Miriam mostra-se totalmente conformada com as atribuições que a sociedade lhe impôs. De fato, acredito que até mesmo seus desejos estão dentro da moldura que a branquitude lhe ofereceu. É interessante notar como a autora nos apresenta essa personalidade “na forma”, “dentro do limite”, marginada. E a árvore genealógica da família, presente nas primeiras páginas do romance, parece nos dizer: é isso, vocês serão sempre assim, não há escapatória.

A mãe de Joan, Hazel, trabalha como enfermeira e defende que não há outra possibilidade de profissão para mulheres negras que não aquelas que são pautadas no cuidado. #estamosaquiparaservir. Até mesmo sua irmã, August, que questiona o que já ganhou “daquele homem branco [Deus]”, renunciou à promissora carreira como cantora para trabalhar como cabeleireira. A família North não encontra rumo fora das fronteiras do ofício protocolar.

PARA IR ALÉM
Audre Lorde.
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Crédito: Robert Alexander

Mas, graças à Deusa, nem todas conseguem permanecer na moldura. Joan desmarginiza-se e deseja ter sucesso como artista plástica. O pensamento limitante-colonizador não basta para Joan. É preciso mais para viver, é preciso muito mais para se inventar uma existência, não é mesmo, Toni Morrison?

E é nessa sanha, nesse misto de raiva e rebeldia no qual as margens da obra se fundem aos limites de Joan, que Audre Lorde também grita: a poesia não é um luxo! Tomando de empréstimo sua máxima e pedindo licença, poeta, ouso dizer que (a relação com) a arte não pode ser um luxo. Ainda mais para mulheres negras.

Como a autora ressalta no mesmo ensaio, [a poesia] “é uma necessidade vital de nossa existência. Ela cria o tipo de luz sob a qual baseamos nossas esperanças e nossos sonhos de sobrevivência e mudança. [...] Os horizontes mais longínquos das nossas esperanças e dos nossos medos são pavimentados pelos nossos poemas, esculpidos nas rochas que são nossas experiências diárias”.

Para Joan, que carregava tantos medos e traumas, marcada pela violência sofrida na infância, a arte parecia representar, ainda mais, uma forma de expandir seus horizontes, de conquistar a sua liberdade — cujo gosto, ao finalmente experimentá-la, aproxima-se do da delícia das “tortas de amora quentes” da mãe.

“Talvez eu soubesse o tempo todo. Talvez isso fosse algo que sempre esteve em nós: esse dom. Talvez cada uma de nós o carregasse, sem saber, como uma moeda perdida em um bolso fundo. Minhas mãos provavelmente sabiam o que fazer, as instruções dentro de mim de alguma forma, colocadas lá eras atrás”, pondera Joan ao final.

Audre Lorde bem reforça que “as dores emergem dos nossos sonhos, e são os nossos sonhos que apontam o caminho para a liberdade”. Assim sendo, Joan, viva sua arte e cure dores por meio dela; as suas, mas também as de Miriam, August, Tara, Audre, Toni, Conceição, Maria Carolina. Será por meio dos seus-nossos poemas-esculturas que conseguiremos escrever novos finais a todas!

PARA IR ALÉM 26

encontros TAG:

Guia de perguntas sobre Memphis

1. Qual a sua visão sobre a construção das protagonistas da história? Quais efeitos a alternância de suas trajetórias produz ao longo da leitura?

2. O livro mostra eventos ligados aos direitos civis nos EUA. O que você achou da forma como a autora trouxe à tona esses acontecimentos históricos?

vem aí agosto

Prepare-se para se aventurar em um livro de origem haitiana! Indicada pelo escritor Allan da Rosa, a obra que você recebe em agosto gira em torno de um homem que retorna ao seu país natal depois de 20 anos de exílio e recebe um convite bastante inusitado.

Para quem gosta de: literatura haitiana, literatura caribenha, autoficção

3. Como você enxerga a relação das personagens com a arte? Leia o texto da página 24 da revista e discuta as dificuldades enfrentadas por Joan e August para seguir a carreira artística.

4. O que você achou da visita feita por Joan a Derek? O que pensa do modo como ela lidou com o seu trauma envolvendo o próprio primo?

5. Você gostou do desfecho do livro? Como avalia a relação de Miriam com Joan nessa parte da história?

Ficção nacional inédita na área! Escrito por uma das principais autoras da literatura contemporânea brasileira, o livro de setembro, indicado pela escritora e jornalista Pilar del Río, traz uma instigante narrativa que une as histórias do Brasil e de Portugal.

Para quem gosta de: literatura brasileira, ficção contemporânea, realismo mágico

AGENDA
setembro
28
“Você tem de seguir o caminho indicado pelas batidas de seu coração. Se você não viver a única vida que tem, não viverá outra vida, não viverá vida alguma.”
– JAMES BALDWIN

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