LINDOS DIAS! 2023

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LINDOSDIAS!

(HAPPY DAYS DE SAMUEL BECKETT)

27 ABR - 7 MAI

ENCENAÇÃO SANDRA FALEIRO

INTERPRETAÇÃO CUCHA CARVALHEIRO

LUÍS MADUREIRA

© Estelle Valente

CUCHA CARVALHEIRO

2 à conversa com

Desafiou a Sandra Faleiro a encená-la neste texto. Porquê agora estes Lindos Dias, de Beckett?

Vejo este texto como uma reflexão sobre a vida. Por redução ao absurdo, convoca-nos a refletir sobre o que andamos aqui a fazer. Para mim, nesta altura da vida, é um confronto com o envelhecimento, com o que significa viver e envelhecer. Além disso, adoro Beckett e nunca tinha feito nenhum texto dele. Pensei: é agora ou nunca.

O que admira mais em Beckett?

Beckett é um génio, foi um dos maiores dramaturgos do século XX ou até mesmo da história do teatro. Todas as peças dele convocam uma reflexão profunda sobre a condição humana. E fá-lo escrevendo de uma maneira extremamente musical. Não é um teatro nada psicológico, confronta o ator com uma série de movimentos precisos indicados na dramaturgia. As didascálias têm tanto valor como o texto. Chegam a dizer quantos segundos tem de durar uma pausa. Uma vez falei sobre isto com o Mário Viegas, quando ele estava a fazer o Final, a partir do Fin de Partie/End Game, e ele disse-me: “Tentámos fazer diferente do que o Beckett indicava e não resulta!”.

Perante um texto destes, já tão trabalhado, o que ainda se pode acrescentar de novo?

Qualquer intérprete quer deixar a sua marca na encenação de um texto, quer diferenciar-se pela sua maneira de ser e interpretar. Acredito que isso marca sempre uma diferença qualquer, seja ela melhor ou pior. O nosso objetivo aqui foi trabalhar a farsa. Gostaríamos que o público se risse e que esse riso pontuasse a peça. Já vi espetáculos com este texto em que essa componente não estava marcada, eram espetáculos mais crepusculares, e não é isso que queremos. Gosto muito da ironia e a minha maneira de ser e de trabalhar poderá contribuir para que isso se sublinhe. Tanto eu como a Sandra já trabalhámos o clown e gostamos muito desse registo, por isso, também quisemos pegar nisso. Até porque acredito numa coisa muito simples que parece uma verdade de La Palisse: o homem é o único animal que ri e ri porque tem consciência da morte.

Revê-se

nesta protagonista?

Sim, a Winnie é um personagem que, apesar das circunstâncias limites em que está – é aí que Beckett gosta sempre de colocar os seus personagens, é uma otimista. Por muito que também

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se ironize em relação ao otimismo na peça. A Winnie está sempre a querer dar a volta à fatalidade e eu sou um bocadinho assim.

Onde é que ela vai buscar essa alegria? Onde é que a Cucha vai buscar essa alegria?

C.C: Lá está: vai-se buscar à inevitabilidade da morte. A Winnie vai buscá-la aí e eu, na minha vida, todos os dias, também tento dar sempre a volta perante as coisas mais difíceis que acontecem e encontrar um lado positivo. Este texto faz-nos pensar em todas as coisas que nos puxam para baixo e às quais temos de dar a volta se não queremos morrer mais cedo. A Winnie tem muito de criança, uma certa candura em relação às coisas, a descobrir tudo aqui e agora. Está sempre a dizer: “É isso que acho maravilhoso…”. Esse deslumbramento com as pequenas coisas que temos ao nosso alcance é maravilhoso. Embora o Beckett ironize… E isto, na minha cabeça, faz uma ligação a outro texto que já trabalhei, Cândido, ou o Otimismo, de Voltaire. É óbvio que também se ironiza sobre o otimismo aí, acredito que Beckett, homem culto, também lá tenha ido beber.

Tem feito boas descobertas no texto agora que começou a interpretá-lo?

C.C: Beckett é de uma cultura incrível, embora não seja uma cultura exibicionista. Nas suas peças vamos descobrindo que existem referências múltiplas a Dante, a Shakespeare, a Victor Hugo… Há vários estudiosos da sua obra e através deles descobri uma série de coisas menos evidentes.

No outro dia, por acaso, descobri mais uma: estava a repetir o texto em voz alta e a Cristina Carvalhal [produtora deste espetáculo, atriz e encenadora] estava a ouvir e reparou: “Eu já disse isso!”. E descobrimos que era uma referência às Ondas, de Virginia Woolf. Quando um texto é muito bom, todos os dias há uma ou várias descobertas, e isso é maravilhoso.

Uma das indicações dadas por Beckett nesta peça é que o cenário tenha um telão com um céu e uma paisagem vazios, mas não com a imagem de um teatro em ruínas como acontece aqui.

C.C: Esta é uma peça que reflete também sobre o teatro, existem muitas referências a isso no texto, embora subtis. Resolvemos levar isso um bocadinho mais longe e pensamos que faz todo o sentido. Tem a paisagem que ele exige, só que quisemos sublinhar o facto de estarmos num teatro. Pareceu-nos que podíamos fazer essa leitura, porque, na verdade, a Winnie está num teatro. A certa altura, quando a sombrinha se incendeia, ela diz: “Amanhã a sombrinha vai estar aqui, outra vez, ao meu lado, intacta, para me ajudar a passar o dia.” Isto é a personagem/ atriz a dizer que “não aconteceu nada, amanhã repetimos…” Por outro lado, quisemos falar sobre o que se está a passar atualmente no teatro.

Está em ruínas?

C.C: Claro que o teatro nunca vai acabar… acho… porque já se fala em crise do teatro desde que o teatro começou... mas gostávamos de falar um bocadinho do estado em que estamos todos

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aqui e agora em Portugal e também no resto da Europa. Daí o cenário ter essa brincadeira… O teatro, tal como o conheci, está muito diferente. As carreiras das peças duram muito pouco, as companhias estão a desaparecer, já existem poucas que funcionem como uma família com um projeto próprio e peças em repertório que vai gerindo. Esta voragem dos mercados e da preocupação com as audiências e com o dinheiro mais do que com a cultura preocupam-nos.

E o que fazer? Espicaçar

o espectador para sair do seu monte de areia e se mexer?

C.C: Nunca gosto de passar mensagens, porque nem sequer sei se essa é a mensagem do espetáculo, acho que cada um vai interpretar esta metáfora

como lhe aprouver. Em Beckett é tudo muito concreto, quem quiser filosofar que filosofe. A Winnie diz: “Estamos sempre a adiar abrir a sombrinha. E a campainha toca para dormir e não se abriu um bocadinho que seja” ou “Não sei se já são horas de cantar a minha canção. Cantar cedo demais é perigoso, mas, atenção, não se pode deixar passar a hora, porque se não a campainha toca e ainda não se cantou”. Essa noção de que a campainha vai tocar um dia e o que se fez? O que se deixa aqui? E será isso importante? Não sei… E assim voltamos ao início da nossa conversa.

Entrevista realizada em março de 2018, antes da estreia em abril de Lindos Dias! (Happy Days, de Samuel Beckett), por Gabriela Lourenço/Teatro São Luiz

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Fotografias © Estelle Valente / Teatro São Luiz

LINDOS DIAS!

( HAPPY DAYS DE SAMUEL BECKETT)

ENCENAÇÃO SANDRA FALEIRO

Sala Mário Viegas

Quarta a sábado, 19h30; domingo, 16h

Duração: 1h30 (aprox.); M/12; €12 (com descontos)

7 maio, domingo, 16h

Texto: Samuel Beckett; Encenação: Sandra Faleiro; Tradução: João Paulo Esteves da Silva; Interpretação: Cucha Carvalheiro e Luís Madureira; Cenário e Figurinos: Maria João Castelo; Desenho de Luz: Cristina Piedade; Direção musical: Sérgio Delgado; Apoio vocal: Luís Madureira; Direção de Produção: Rita Faustino; Produção Executiva: Mariana Dixe

Coprodução: Causas Comuns e São Luiz Teatro Municipal

Causas Comuns é uma estrutura financiada pelo Governo de Portugal – Ministério da Cultura / Direção-Geral das Artes e é membro da Performart – Associação para as Artes Performativas em Portugal

Direção Artística Aida Tavares Direção Executiva Ana Rita Osório Assistente da Direção Artística Tiza Gonçalves Adjunta Direção Executiva Margarida Pacheco Secretária de Direção Soraia Amarelinho Direção de Comunicação Elsa Barão Comunicação Ana Ferreira, Gabriela Lourenço, Nuno Santos Mediação de Públicos Téo Pitella Direção de Produção Mafalda Santos Produção Executiva Catarina Ferreira, João Romãozinho, Marta Azenha Direção Técnica Hernâni Saúde Adjunto da Direção Técnica João Nunes Produção Técnica Margarida Sousa Dias Iluminação Carlos Tiago, Cláudio Marto, Ricardo Campos, Sérgio Joaquim Maquinaria António Palma, Miguel Rocha, Vasco Ferreira, Vítor Madeira Som João Caldeira, Gonçalo Sousa, Nuno Saias, Rui Lopes Operação Vídeo Filipe Silva Manutenção e Segurança Ricardo Joaquim Coordenação da Direção de Cena Marta Pedroso Direção de Cena Maria Tavora, Sara Garrinhas Assistente da Direção de Cena Ana Cristina Lucas Camareira Rita Talina Bilheteira Diana Bento, João Reis, Pedro Xavier

27 abril a 7 maio 2023 teatro
teatrosaoluiz.pt

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