edição #4 - abril de 2018
A ESTRÉIA DE MUNDO DO OESTE
© SBE Editore Itália
l a i c e g p o e s lan d dy entrevistamos
tiziano Sclavi e gigi cavenago
GATILHO CONVERSAMOS COM PEDRO MAURO, DESENHISTA DA HQ
E AINDA: PORQUE UMA HQ CUSTA CARO? - SÉRIES ENCERRADAS DE TEX - LE STORIE - GAMES DE FAROESTE
EDITORIAL EXPEDIENTE Organizador: Thadeu Fayad Colaboradores: Joana Rosa Luiz Henrique Cecanecchia Consultoria: José Carlos Francisco Ricardo Elesbão Alves Wilson Vieira Diagramação: Thadeu Fayad
O objetivo de ter criado esta revista foi justamente dar voz aos personagens que gostamos mas que certa forma nunca tiveram o mesmo destaque que os super-heróis estadunidenses. E então tudo foi crescendo, naturalmente elevando a qualidade e também as exigências para que isso fosse alcançado. Hoje a maior fumetti já feita está sendo lançada. Ela tem mais que o dobro de páginas da primeira edição e aos poucos segue amadurecedendo como uma sólida publicação. Como revista digital podemos sempre brincar com a quantidade de páginas sem as amarrações financeiras que uma edição impressa ocasiona. Não que o número de páginas seja o item mais importante que teremos por aqui, acredito que mais relevante do que quantidade é a qualidade do que você vai ler em cada edição da revista. E nisso podemos garantir que nos esforçamos cada vez mais para trazer conteúdo qualificado para todos. Durante dois meses pesquisamos e conversamos com pessoas ligadas ao mercado editorial para tentar entender como funciona a formação de preço de uma HQ vendida no Brasil e como resultado entregamos mais um grande dossiê, que em conjunto com matérias de edições anteriores, fortalece nosso compromisso de lutar por qualidade, quadrinhos mais acessíveis e derrubar mitos que as editoras nos contam em relação a custos.
fumetti. é uma publicação digital, criada por Thadeu Fayad, com periodicidade mensal, totalmente gratuita, distribuída exclusivamente através do site da Confraria Bonelli. Venda proibida
Esse mês de abril, ainda haverá outra emoção, quando nossa primeira edição impressa será lançada. Programada para debutar na Feira Guia dos Quadrinhos é um novo desafio que conseguimos cumprir num curto espaço de tempo. Teremos agora não só uma como DUAS versões da fumetti, a impressa que será bimestral e vendida no modelo de assinaturas e a já tradicional edição digital que continua mensal e totalmente gratuita! Além disso estreamos nas redes sociais com perfis no facebook e twitter, para aumentar os canais de contato e feedback com nossos leitores, uma audiência que mês a mês vem crescendo cada vez mais. Junte-se a nós! Boa leitura!
Nesta edição 04
LE STORIE
06
ONDE OS FRACOS NÃO TEM VEZ - PARTE 2
08 OS CUSTOS DE PRODUÇÃO DE HQs NO BRASIL
/revistafumetti /revistafumetti
11
COLUNA DO LUIZ: O TERROR NAS HQs
12
ESPECIAL DO MÊS: DYLAN DOG
20
SUPER PÔSTER: GRINGO
22
O MUNDO DO OESTE
28
ENTREVISTA PEDRO MAURO
30
DÉCIO RAMÍRES - HQ DO MÊS
32
CRÍTICA TV: GODLESS
34
GAMES DE FAROESTE
36
REVIEW: DAMPYR
IMAGEM DA CAPA GENTILMENTE CEDIDA POR MARCO NIZZOLI http://marconizzoli.blogspot.com.br/
SÉRIES BONELLI QUE TALVEZ NUNCA VEJAMOS
Le Storie LANÇADA EM OUTUBRO DE 2012 ESSA QUE É PROVAVELMENTE A MELHOR REVISTA (OU LIVRO COMO CHAMAM LÁ FORA) DA BONELLI COMPLETARÁ 75 EDIÇÕES AO FINAL DE 2018. A SÉRIE SEGUE TODAS AS TRADIÇÕES BONELLIANAS E JÁ NASCEU SOB O SIGNO DA AVENTURA, COM A MAIÚSCULO!
É uma série sem um protagonista fixo, mas isso não significa que seja recheada de ação, aventuras, intrigas e reviravoltas. As vezes é fácil desvendar quem são os personagens principais e os desdobramentos que virão ao se ver a capa ou o título da aventura, outras vezes nem tanto. Mais do que a atração de um único herói, “Le Storie” é baseado no talento dos autores que se alternarão na realização das revistas e eles são alguns dos melhores roteiristas e desenhistas italianos, com carta branca (ou seja, liberdade total). Cada edição conta com uma aventura completa, sempre histórias fechadas, em 110 páginas preto e branco. Recentemente uma coleção especial em cores e com 128 páginas começou a ser publicada. O embrião desse trabalho surgiu lá em 1976, quando Sergio Bonelli apresentou o “carro-chefe” de sua já extensa produção, naquela época sob a marca de Edizioni Cepim. A série “Uomo un’Avventura” foi exatamente o ínicio da proposta de “Le Storie”: uma seleção cuidadosa do “melhor”, isto é, dos autores e desenhistas mais apreciados e inventivos, das situações mais exóticas, das soluções narrativas mais imaginativas. A semente estava firmemente plantada na terra das tradições bonellianas, mas o tempo que levaria para tudo gerar frutos... isso era imprevisível! Desde 1976 até seu lançamento, muitas coisas aconteceram, o mundo mudou, os gostos, as “tendências”, os personagens e a forma de contar história também. “Le Storie” ao mesmo tempo em que presta um tributo à antiga arte do Storytelling, bebe diretamente desta fonte! Que nada mais é do que a capacidade de contar histórias de maneira relevante, onde os recursos visuais são utilizados juntamente com as palavras, despertando emoções, compondo uma colcha de retalhos capaz de emocionar, entreter e persuadir o leitor.
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Em “Le Storie” a narrativa é tudo, e podemos ver presente nas edições três elementos fundamentais do storytelling para o sucesso da narrativa. O primeiro elemento que vemos nas edições é o conflito, pois cria tensão e isso mantém as pessoas engajadas com a história. O segundo elemento é a autenticidade. Mantenha-se fiel ao seu estilo e o leitor vai responder com entusiasmo e paixão. Isso nos leva ao terceiro e possivelmente mais importante elemento de qualquer história: o leitor. A série entrega o que o leitor quer, uma ótima aventura! Todos os meses um mergulho diferente, para explorar todas as nuances, mesmo as menos óbvias. Viajamos no espaço e no tempo, através dos “cenários” oferecidos pela História e ao longo dos caminhos da fantasia mais selvagem, nas selvas e desertos, mas também nos insondáveis meandros da psique, entre gênio e loucura, amor e sede de vingança... E assim por diante, ao longo de um caminho que serpenteia livremente através de todos os territórios - ou “gêneros”, se você preferir - que a imaginação do roteirista tenha sido capaz de projetar. Criando “espaços” para viagens sem limites, A única constante? A atenção profissional e a paixão criativa com que cada uma dessas pequenas obras são realizadas pelos principais autores do enorme universo de quadrinhos Italianos. Todos comprometidos com um objetivo único, dar vazão a arte do contador de histórias: envolvendo, comovendo e entretendo seu público.
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© SBE Editore Itália
Capa da edição escrita por Manfredi e desenhada pelo brasileiro Pedro Mauro, que entrevistamos para esta edição.
Para nós Brasileiros, res ta a torcida para que algum dia possamos ver essas grandes histórias em nossas bancas ou livrarias.
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Onde os fracos não tem vez Parte 2
A c o n t i n u a ç ã o d a h i s t ó r i a p o r t r á s d a s e d i ç õ e s j á c a n c e l a d a s d e Te x Por Joana Rosa Russo
Tex Grandes Clássicos Lançada de forma luxuosa (mesmo em formatinho), pela Editora Mythos, tinha capa cartonada e envernizada com o logo tex em metálico vermelho, belíssimo, por sinal. No entanto, apesar de sua beleza, a série trazia nada mais nada menos que as histórias já publicadas anteriormente em outras publicações. O fato de trazer o arco fechado, não deu grande motivação aos colecionadores e leitores que deixaram de adquirir a linha “Grandes Clássicos”. Especula-se que, embora fosse mais um repeteco, de fato a beleza desta coleção promovia sua venda, o resultou num longo tempo em banca, de 2006 a 2010.
adiantar grandes histórias que demorariam muito a sair nas séries regulares, ou publicar falha de edição de editoras anteriores. Então, publicou-se da seguinte maneira: a. O Retorno de Mefisto e O Veneno da Cobra, publicadas, respectivamente em 2004 e 2007, foram publicações especiais para adiantar histórias selecionadas que não sairiam nas séries regulares; b. Mercadores da Morte, publicada, também, em 2004, de fato foi uma história pulada pelas editoras anteriores. Daí, visando regularizar as histórias, ela integrou esse “sneak peek” seriado.
Merece ficar consignado que a série não seguia nenhuma ordem cronológica.
Ainda na mesma conversa, Julio adiantou que, por hora, não há nenhuma previsão de que saia outra história em minissérie.
No fundo, a existência de outra linha com histórias especiais acabou se perdendo, já que, em termos de mercado, acaba brigando com a Série Tex Ouro, que já cumpria, desde os idos de 1999 (como ainda cumpre), a proposta de trazer num arco fechado e encadernado especial as histórias escolhidas a dedo para republicação.
A criação deste especial foi excelente, já que possibilitou o complemento de edições não previstas em outras séries (ou que não se encaixariam por seu formato), não deixando os leitores brasileiros desabrigados. Portanto, temos uma “série” com fim específico que pode, eventualmente, caso necessário, ser “reativada”.
Tex Minisséries A Editora Mythos, sem dúvida, foi a casa editorial que mais inovou quando falamos em Bonelli Comics no Brasil. E por isso mesmo, em 2004, mais precisamente em abril, surgia a Tex Minissérie, uma pequena coleção de três edições fechadas com histórias inéditas. Segundos esclarecimentos prestados pelo Júlio Schneider, a Minisséries foi publicada com fim específico: ou
Tex e os Aventureiros Segunda tentativa vista no mercado para inserir personagens Bonelli... Será? Quando evidenciamos a existência da série Tex e o Aventureiros, relembramos de algo similar, ocorrido com a Editora Globo, quando da edição de “Fumetti – O melhor dos quadrinhos italianos” . Publicada pela Editora Mythos durante um ano (interregno de 2005 a 2006), a publicação em formato italiano chamava atenção e viabilizava um desejo de muitos leitores: a publicação de Tex em formato italiano.
PORQUE FALAR DE SÉRIES JÁ ENCERRADAS Porque ex is te toda uma geração de leitores que não faz ideia do que ainda existe por aí.
A coleção, que foi composta por 5 edições, trouxe aventuras inéditas dos personagens Tex, Nathan Never, Mister No, Nick Raider, Zagor e Martin Mystère. Tex, como já se presume, abria a revista com uma história de 210 páginas. As outras 64 páginas eram dividas entre os demais, isso, no número 01. As outras quatro edições mantiveram a média de 250-260 páginas, exceto a última, que bateu 292 páginas de aventura.
Duas hipóteses são cogitadas para seu encerramento. Um é que realmente ela tinha prazo para acabar, já que sua função era a apresentação do novo material e de outros personagens, como foi até mesmo levantado no prefacio de Julio Schneider no primeiro volume. Outro, que se cogita, é que na verdade a série acabou sendo extinta por causa da falta de manejo e escolhas das histórias, que acabava por atingir, quase que em sua maioria, o público de Tex, que, pelo perfil conservador, acabaria adquirindo pelo fato do personagem vir publicado, mas sem segundas intenções. Independente do motivo, ao que parece, a série aparentava ter, também, início, meio e fim, já que não se tratava de uma tiragem seriada com publicações contínuas.
Tex Gigante (e suas reedições) A proposta iniciada pela Editora Globo no ano de 1988 era publicar o conteúdo do TEXONE Especial Italiano que saiu por ocasião dos 40 anos de Tex. Com formato um pouco menor que o irmão italiano, a Globo acabou mantendo o conteúdo original, inclusive com suas extensas matérias, o que perdura até hoje, nos já editados pela Editora Mythos. O que causou um certa “bagunça” na coleção é justamente por causa do primeiro hiato que acabou acontecendo na série. De acordo com os dados coletados no Tex Willer Blog, as edições saíram nos seguintes anos: 1 - Tex, O Grande! – 40 Anos (Set/88) 2 – A Marca da Serpente (Ago/93) 3 - O Grande Roubo (Jul/94) 4 - Arizona em Chamas (Jul/95) 5 - O Vale do Terror (Out/96) 6 - Tex, O Grande! – 50 Anos (Jul/98) 7 - A Marca da Serpente (Set/98) Ao contrário do que aconteceu na Itália, a série só voltou a ser publicada em 1993, ou seja, cinco anos depois do lançamento em terras brasileiras do especial. Não se sabe por conveniência ou clamor dos colecionadores, fato é que ela foi contínua até 1996, quando entrou novamente em hiato... E aí uma nova confusão: pelo fato das capas não serem numeradas, muitos colecionadores dão como certa a publicação de APENAS cinco números. Mas, em verdade, o total são sete, já que “Tex, O Grande” e “A Marca da Serpente” foram republicadas em 1998 a título de comemoração aos 50 anos de Tex. Logo depois, com a venda do direitos, a Mythos reassumiu a publicação e tratou de colocar em ordem a bagunça feita pela Editora Globo, dando sequencia na série P/B e corrigindo a falta deste início em sua carteira com a edição da Tex Gigante em Cores (edição de luxo). R E V I S T A
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Tex Gigante Colorido - Edição de Luxo
Iniciada em Julho de 2014, a aposta da edição luxuosa da Mythos era dar um novo ar ao TEXONES aqui publicados na série gigante. E claro, também complementar em sua grade a falta das primeiras edições que, querendo ou não, já haviam sido editadas pela Editora Globo quando assumiu a carteira do Tex. Então assim foi feito: em uma linda edição maior do que a Gigante convencional, toda em capa dura e em cores, as publicações seguiram de forma irregular: algumas edições saíram seguidamente mês a mês outras tiveram intervalos bimestrais. O fato é que por conta do preço elevado (R$79,90), e baixa aderência de mercado, infelizmente a publicação acabou por ser encerrada em 2016, sendo o número 12 da coleção, de setembro de 2016, o último, pelo menos, por hora. Parte se deve ao preço, outra a pilha dos leitores. Infelizmente esse, em se tratando de TEX, é o exemplo mais recente de que nem sempre se pode ouvir sua clientela. O mercado de quadrinhos no Brasil é ingrato e segue, infelizmente, uma tendência de queda mundial no consumo de mídias impressas. Mas, assim como lá fora a perda estimada é previsível, no Brasil ela é consideravelmente aumentada. Não só pela concorrência típica de mercado ou o segmento publicado, mas por conta de uma questão, também e principalmente, econômica, o que de fato, culminou no seu encerramento ou suspensão indefinida.
Tex Gold Sim, a fase de testes da Tex Gold também é considerada uma série encerrada. Justamente por ser uma versão “beta” e, consequentemente, que terá um fim, recai na categoria de série encerrada. Tanto assim o é, que há diferenças nas lombadas das quatro versões “betas” para as oficiais. Lançada de forma muito tímida e quase sem alardes em abril de 2017, deixou os colecionadores simplesmente surtados em busca dos tão desejados exemplares da Salvat. Recebida apenas em algumas capitais e sem distribuição nacional, os exemplares acabaram virando itens difíceis de serem adquiridos o que levou a inflacionar seus preços no mercado paralelo. Somente em setembro de 2017 a distribuição começou a ser nacional e agora, já com a versão oficial, que republicou os quatro primeiros números e seguiu adiante, já estando no volume 06, com muito sucesso, apesar do preço (R$39,90). Logo, a fase de teste tinha início, meio e fim.
CONTINUA NA PRÓXIMA EDIÇÃO!
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O custo de produção de HQs no Brasil FAZ ANOS QUE AS EDITORAS SOFREM COM O FORMATO DE VENDA DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NO BRASIL E NO MUNDO, POR ISSO DESCOBRIR QUANTO CUSTA UMA HQ PODE SE TORNAR UM CÁLCULO BEM COMPLICADO. FIZEMOS UM EXERCÍCIO DE IMAGINAÇÃO BASEADO EM FATOS REAIS.
Uma característica do nosso mercado é a formação do “mix” histórias, isto é aquela mistura de histórias que você compraria e outras 2 ou 3 histórias que isoladamente você não compraria. Essa prática foi criada pela Editora Abril quando ela começou a vender HQs de heróis ainda na década de 1980. No caso dos Universo Bonelli não aconteceu desta forma em praticamente nenhum de seus títulos. Durante sua passagem pela Editora Globo (também na década de 1980) houve apenas um especial publicado em formato de mix, praticamente encerrando as publicações da editora. Na editora Record não houve tal prática e na Mythos tivemos algumas tentativas. Tex e os Aventureiros era uma publicação de Mix, provavelmente fazendo os personagens menos vendidos pegarem carona no sucesso de Tex. Durou 6 edições. Outra tentativa da Mythos era a revista Cassidy & Damian, lançada como uma série em 18 edições e parou na edição 5. Acabou prevalecendo o modelo de cada personagem em sua própria revista. Não tem sido fácil para ninguém, financeiramente falando. O universo Bonelli existente hoje no Brasil praticamente se restringe a Tex e suas demais publicações (excluindo as séries especiais em capa dura ou Graphic Novels). Apesar da Mythos não informar tiragens nem volume de venda, podemos considerar que 50% do que é levado para as bancas encalha. Nos Estados Unidos e na Europa, uma HQ sai bem mais barata que no Brasil. A capa, o tamanho, o número de páginas, os quadrinhos, tudo é idêntico. Só o que muda é o idioma que vem dentro dos balões. Claro: os custos da tradução não explicam o aumento. É uma equação cada vez mais complicada, o custo da impressão varia muito de acordo com o fornecedor, qualidade do papel, a previsão de encalhe e até a distribuição pode dobrar valor de produção.
E quem é o vilão afinal? Na verdade temos 2 vilões em ação! A tiragem e o distribuidor. Enquanto outros países trabalham com tiragens médias de mais de 10.000 exemplares por edição, no Brasil esse número, em média, fica na casa dos 2.000. O mercado é pequeno, vende-se pouco, e elevar essa média é produzir encalhes. Supostamente a distribuição setorizada quando foi criada (também pela Editora Abril), era para tentar minimizar ou mitigar os custos de produção, redistribuindo o encalhe para outras praças. Só que, trabalhar com edições reduzidas, o custo por unidade sobe. O raciocínio é bem simples. Fora o papel, que varia segundo a quantidade de exemplares, toda edição tem um custo fixo, do qual não dá para fugir. Composição das páginas, máquinas, revisões, tudo isso independe da tiragem. E quando se divide o custo fixo pelo número de exemplares, tem-se o custo unitário. Como o mercado brasileiro se organizou com base nas pequenas tiragens, o preço final de um volume é sempre alto. Mesmo os quadrinhos mainstream, que vendem dezenas de milhares de cópias, custam caro, já que os editores fixam o preço com base em padrões (um certo “x” por página) estabelecidos a partir das baixas tiragens. A vantagem, dos editores, é que alguns títulos dão mais lucro. E quase sempre compensam o prejuízo dos títulos que acabam encalhando. Tiragens mínimas projetam o custo unitário lá para as alturas e o leitor é quem acaba pagando a conta. E por tabela acaba ouvindo a mesma desculpa de sempre, de que pedimos um título novo em bancas e acabamos por não comprar. Normalmente o consumidor é nomeado vilão de todo fracasso editorial, mesmo que a editora não tenha se esforçado minimamente para buscar outros recursos (como anunciantes) ou mesmo tenha se empenhado em investir em divulgação adequada de seu produto. Com base em algumas pesquisas que fizemos podemos estimar, em porcentagens, como é composto o preço de capa de uma HQ em banca:
Papel - Menos de 5% Às vezes é transformado no vilão da história. O custo subiu depois do Real, o preço da tonelada de papel aumentou cerca de 54%, mas não significa nem 5% do preço final de uma revista.
Papel 5% Royalties 15% Editor 37% Distribuidor 35%
Editor - Em torno de 37% O editor fica com algo em torno de 37% do preço de capa. Esse valor paga os custos de funcionamento da editora, a tradução, revisão, paginação e o lucro. Gráfica - Cerca de 8% O custo de impressão de uma revista, impressa em papel Pisa-brite 52g é da ordem de 8% do preço de capa, sem incluir o preço do papel.
Gráfica 8%
Distribuidor - Cerca de 35% O distribuidor atacadista fica com pelo menos 35%. Esse ponto você pode achar que ficamos loucos, mas o cálculo é feito com base nos preços de algumas revistas que estão em pré-venda no site da Editora Mythos, com desconto justamente de 35%. Aqui ainda não há encalhe, essa venda - onde você banca o frete - está sendo feita diretamente entre fornecedor e cliente (chamado de B2C), evitando o intermediário que é o distribuidor. Lembrando que a Editora Abril detém o monopólio absoluto na distribuição de revistas no Brasil, através da empresa Total. Royalties - 15% A editora que é “dona” dos personagens fica com 15% do preço de capa da HQ, em média.
O caso Mythos
minimamente possível.
Um outro cálculo que gosto de fazer, mais como comparação do que como ciência, é pegar o valor de capa da HQ e dividir pelo número de páginas que ela tem. É algo bem simples para se avaliar o custo, independente da qualidade.
Claro que a cotação do Euro, considerando que a Mythos trabalhe negociando os royalties dos títulos Bonelli nesta moeda, também afeta o preço final de uma HQ na banca de jornal, mas nada justifica valores cada vez maiores em um
Nesta análise bem simples vemos que os títulos com maior apelo comercial são mais baratos quando comparamos o valor por página. Muito provavelmente nestes casos o lucro da Mythos venha com a quantidade.
mercado que só comercializa e não produz nada.
Por sua vez a editora Mythos não tem o custo de criação de uma HQ, não há investimento em autores nacionais, pesquisas ou criação de um personagem. Tudo chega pronto, é só traduzir e fazer letreiramento. E na era digital é ainda mais fácil. Não existe nem muito trabalho artístico envolvido, como redesenho, ou arremates para compor melhor a capa. Nem informações como nomes de empresas ou outros termos são traduzidos, tudo para mexer o
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Existe alguma alternativa? Ao se adquirir um quadrinho, seja ele qual for, logo vê que existem páginas sobrando, onde é feita alguma matéria, ou até chamada para outro título. As vezes vemos uma capa alternativa ou um rascunho do artista, na última capa também. Isto evidência a falta de anunciantes.
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O CUSTO DE PRODUÇÃO DE HQs NO BRASIL - CONTINUAÇÃO
A publicidade é uma parte importante para baratear custos em qualquer segmento no Brasil e as editoras falham vergonhosamente neste ponto. Na década de 1980, 1990 tínhamos propagandas nas revistas, desde brinquedos, cursos por correspondência, achocolatados, canetas, marcas de roupas e etc. Tudo era anunciado em revistas em quadrinhos. A falta de anunciantes e a provável fragilidade da área comercial de qualquer editora irá afetar diretamente o custo final de uma HQ.
bro de uma gigante procurando novos nichos de mercado editorial ou adotando alguns talentos nacionais para tentar licenciar e produzir material por aqui mesmo. Nossos desenhistas nacionais que tanto reverenciamos trabalham para as editoras lá de fora.
A Mythos traduz e imprime apenas, não produz os quadrinhos que vende, então porquê preços tão altos?
Quadrinho digital é alternativa? As vantagens dos quadrinhos digitais são boas em relação ao tradicional, não há o custo da impressão, pode-se eliminar a empresa de distribuição e basicamente precisaria apenas ser traduzido. Reduzindo drasticamente os encalhes, podemos até dizer que eles seriam extintos, uma vez que é tudo feito de forma digital até o momento de imprimir. Não haveria mais distribuição setorizada. O grande empecilho é que uma HQ digital não é tangível, não pode ser manuseada e não pega poeira na prateleira. E isto é realmente bem triste.
A dura realidade Toda e qualquer empresa quer apenas uma coisa: lucro! Adotar novos processos e tecnologias que poderiam baratearam os custos é algo que empresa brasileira nenhuma procura, consideram gastos desnecessários. Costumamos buscar esses recursos só quando se tornam obsoletos no restante do mundo e podem ser comprados mais baratos. Só que certamente seria vendido como novidade, repassado ao leitor que ficaria “empolgado” com a novidade, pagando mais caro e otimizando o lucro.
Honestamente desde a iniciativa da Editora Abril (de novo nas décadas de 1980 e 1990) onde criava revistas dos mais variados personagens famosos, desde apresentadores de TV e até material autoral eu não me lem-
© DC comics - Alex Ross
Não haverá debate enquanto a Mythos monopolizar a licença de publicação Bonelli no Brasil, mas quando outras tentaram, mostrando que a situação poderia ser diferente, a Mythos retomou os direitos e encerrou tais tentativas. Se houvesse uma real concorrência até os artistas nacionais teriam uma melhor visualização de seu trabalho e nesse ponto a internet tem ajudado bastante, com campanhas de apoio para lançamentos de suas obras independentes de forma tradicional e não como revistas digitais.
Terror nas HQs Por Luiz Henrique Cecanecchia
Os quadrinhos de terror ocupam um nicho especial, especialmente dentro do mercado brasileiro que sempre se mostrou aberto e lucrativo ao gênero. O retorno recente de obras como Mágico Vento, Dylan Dog e Martin Mystère reforçam isso. Mas o que faz uma história que trata justamente de elementos que nos causam Repulsa e Pavor ser algo atraente para a maioria das pessoas? Stephen King deliberou profundamente sobre o tema em seu livro” Dança Macabra”, onde relata como as boas histórias são aquelas que trazem a tona os medos e traumas do cotidiano para que o leitor os vivencie de uma distância segura, permitindo observar uma questão comum de ângulos diferentes e adquirir coragem para lidar com seus temores diários King divide em 4 os modelos usados nas histórias para transformar o medo em entretenimento, com os bons escritores sabendo aprofunda-los e mescla-los. Junto de cada trarei o exemplo de um fumetto que trate bem do tema. Primeiro o modelo do vampiro, o arquétipo do morto vivo, seja em suas hordas sem mente ou refinados como Drácula. O monstro que transcende a morte, controla sua mente e devora um elemento específico do seu corpo. Os mortos vivos são a base desse modelo, com destaque para Drácula e Múmia. Minha indicação é a história Mater Morbi de Dylan Dog (Edição #3 Ed. Lorentz), onde o medo do hospital moderno é mesclado a uma entidade demoníaca. O próximo modelo é do lado maligno oculto, o homem bom que luta para lutar contra seus instintos, com destaque para o lobisomem e o Mr. Hide, basicamente todas as histórias de mutação, inclusive encontrando um espelho interno muitas vezes na adolescência, nossa maior fase de transformação. Aconselho a leitura de “Gar-
ras” de Mágico Vento (Edição deluxe #1 – Ed. Mythos), onde é explorado o ângulo bestial do ser humano. Quase terminando destacamos o monstro ruim por fora, bom por dentro, Frankenstein, onde o verdadeiro horror é a humanidade que persegue a criatura. Aqui o destaque vai para a história dupla “ ATAQUE ALIENÍGENA / ASSASSINOS ESPACIAIS” de Zagor (#175 Ed Mythos) onde alienígenas vem para a terra caçar humanos por esportes. Por fim temos o lugar mal-assombrado. O local/objeto amaldiçoado. Não é necessário ter um fantasma, mas o local/coisa distorce a realidade, como um castelo assombrado, um tesouro amaldiçoado, o ninho de uma criatura maligna. Minha indicação é da história de “ A Besta” de Mágico Vento (Edição deluxe #2 – Ed. Mythos), tratando de um campo de exploração de petróleo amaldiçoado. Reforçando que esses modelos são continuamente aprofundados, desconstruídos e mesclados pelos bons artistas para criar novas aventuras.
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ESPECIAL DO MÊS
Dylan Dog Especial
Falamos com o criador do personagem e com seu novo desenhista, além de explicamos as mudanças que fizeram o investigador do pesadelo voltar ao sucesso!
Como tudo começou Dylan Dog foi criado em outubro de 1986 pelo brilhante roteirista Tiziano Sclavi. É a primeira série de terror de Sergio Bonelli Editore, na ocasião, sua criação representou uma aposta arriscada da editora, que ainda não se tinha aventurado nesse tipo de narrativas; no entanto, mostrou-se também uma iniciativa bem-sucedida alcançando o público e a crítica de forma surpreendente, atingindo mais de 1 milhão de cópias por mês na época. Garantindo-lhe um sucesso quase instantâneo e levando-o, em pouco tempo, ao topo da lista de mais vendidos na Itália. Dylan foi criado graficamente pelo desenhista Angelo Stano com as características do ator inglês Rupert Everett. Ele é um ex-policial e um ex-alcoólatra, que decidiu começar seu próprio negócio e investigar casos que invadam o sobrenatural e o horror, sendo, inclusive, conhecido como o Investigador do Pesadelo. Suas histórias não se destacam apenas pelo inusitado de suas temáticas. Pelo contrário. Mais do que o representante de um gênero, esse herói reúne uma gama de elementos bizarros que o colocam em uma posição privilegiada em relação a outras obras dos quadrinhos, Dylan já lutou contra vampiros, lobisomens, fantasmas e alienígenas, mas também monstros muito mais perigosos e traiçoeiros como a violência doméstica, o racismo, a indiferença, a sede de poder e até o tédio. Alguns de seus episódios estão marcados na memória dos leitores e são mencionados entre as melhores histórias em quadrinhos já escritas na Itália. Ah! Não podemos esquecer que entre seus “poderes” está o de ser um Don Juan incorrigível. Muito do sucesso talvez venha graças ao formato característico de publicação dos quadrinhos Bonelli, em que a utilização do preto e branco reforça uma atmosfera soturna e um pouco opressiva, à qual são familiares os elementos incomuns e finais que, propositadamente, nem sempre amarram todas as pontas das tramas, deixando aos leitores a obrigação de complementá-las em sua imaginação. Sua base de operações e local de residência é a cidade de Londres, um dos locais mais apropriados para isso, pois a terra da rainha é famosa por suas lendas, seus fantasmas, crimes não desvendados e criaturas misteriosas, que se mesclam ao fog londrino e desaparecem nas charnecas inglesas. É principalmente nesse ambiente que Dylan desenvolve suas investigações.
E até o número #336 da série regular publicado na Itália, seus assistentes, amigos seguiram sendo o Groucho, seu faz-tudo, um homenzinho estranho com o rosto de Groucho Marx, que abre a porta para os clientes e os entope com piadas sem sentido. Para alguns leitores Groucho garante uma dose substancial de humor e é um aliado insubstituível para Dylan. Depois, há o comissário Bloch, chefe sênior da Scotland Yard, a um passo da aposentadoria; ex-superior de Dylan quando este estava na ativa, gosta muito dele e mais de uma vez o tirou de encrenca e de ser preso. Dylan não tem muitos inimigos recorrentes, onde quer que haja um horror sobrenatural para derrotar, ele estará lá, tenha certeza. Pode-se dizer que a maioria dos inimigos em suas histórias encontram um final violento ou inusitado ao término da narrativa. Poucos são os que retornaram ou que mantiveram com o protagonista um embate constante. No entanto, lembre-se, pelo menos, da esquelética figura encapuzada da Morte e do Dr. Xabaras, cientista louco e que Dylan Dog descobriu, na realidade, ser seu pai. A partir da edição #337 da série regular sofreu uma mudança de rumos, um recomeço sem grandes alterações de características. Falaremos disso mais pra frente.
Um terror do ponto de vista comercial Dylan está longe de ser um super-heróis. Pelo contrário, apresenta diversas limitações bem comuns a todos nós: sofre de vertigem e de claustrofobia, não viaja de avião e só consegue acertar uma bala em algum bandido se seu auxiliar lhe jogar o revólver, pois ele raramente anda armado. Sob certos aspectos, é um ingênuo; sob outros, um romântico, um sonhador, um idealista. E talvez também esteja nessas características humanas muito da razão de seu sucesso junto aos leitores. No Brasil, a trajetória de Dylan Dog, infelizmente, não apresenta o mesmo sucesso que faz na Itália. Ele surgiu no país pelas mãos da Editora Record, durante a curta passagem da editora pelo universo das histórias em quadrinhos, acompanhando outras personagens Bonelli Comics. No entanto, essa primeira investida brasileira de Dylan Dog durou apenas onze números (de setembro de 1991 a agosto de 1992, trazendo as onze primeiras edições italianas), além do encontro com Martin Mystère em uma edição especial (publicada em janeiro de 1992).
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Felizmente, essa aposta não representou o fim da carreira do Investigador do Pesadelo. Alguns meses depois, a Editora Mythos, resolveu ampliar seu portfólio de heróis Bonelli e iniciou a publicação das histórias de Dylan Dog em uma HQ mensal própria. Após alguma turbulência em seu início, em que teve que ser publicada de forma bimestral (de janeiro a julho de 2003), a revista ganhou alguma estabilidade em bancas, voltando a ser mensal. Essa foi a mais longeva publicação do herói em terras brasileiras, encerrando-se na edição #40, de fevereiro de 2006. Um novo hiato, desta vez até maior do que o anterior, impediu novas edições do herói. Essa espera acabou pelas mãos da Editora Lorentz, que em 2017 trouxe 3 edições para comemorar (mesmo que com atraso) os 30 anos de criação de Dylan Dog. Após o encerramento da publicação, de uma forma um tanto quanto obscura, a Editora Mythos retomou a licença sobre o personagem e programou 4 edições (erroneamente chamando de minissérie) para este ano. A leitura das aventuras de do Investigador do Pesadelo despertam sensações bem diferentes, opostas ao extremo, do assombro a fascinação, satisfazendo os leitores mais exigentes. Dylan Dog é, com certeza, um dos melhores títulos publicado pela Bonelli. Esperemos que ele tenha vida longa novamente.
Um terror no cinema Adaptação indefensável deturpa a obra de Tiziano Sclavieza, que tem material de alta qualidade e renderia um excelente suspense sobrenatural, mas os roteiristas Thomas Dean Donnelly e Joshua Oppenheimer (Sahara) optaram pela abordagem “anos 80/90” para criar o filme. Assim, Dylan Dog e as Criaturas da Noite (Dylan Dog: Dead of Night, 2010) ignora a base estabelecida de fãs e recria o personagem usando apenas seus traços mais característicos, pasteurizando sua essência.
Uma série de TV? Em 2017 circulou pela internet a notícia de uma série de TV inspirada em Dylan Dog estaria sendo produzida. O diretor de terror australiano Kevin Kopacka estaria em estágios finais da produção, que se chamaria somente Dylan, por questões de direitos autorais, já que não seria uma produção oficialmente autorizada pela Sergio Bonelli Editore. Kopacka diz que a ideia era misturar a atmosfera dos quadrinhos, mais os clássicos do terror italiano, como A Noite do Terror (1981), de Andrea Bianchi, e Zumbi 2 – A Volta dos Mortos (1979), de Lucio Fulci. Tudo isso mantendo alguns elementos de comédia. E por mais improvável que fosse, um teaser foi liberado em maio de 2017 com o que seria o primeiro episódio da série. Kevin Kopacka filmou partir de um roteiro co-escrito com Alex Bakshaev. O diretor também pediu ajuda aos fãs através do site oficial da produção, para que pudesse realizar a série. Porém desde o meio do ano passado o site não recebe atualizações ou divulga algo relacionado. O episódio piloto pode ser assistido na íntegra, basta clicar no link abaixo. Ah! E é legendado em portugês! https://youtu.be/wI94lz66Jgw
Dylan Mouse O investigador do pesadelo também já foi homenageado pelos quadrinhos Disney na Itália, inclusive com a edição já tendo sido publicada aqui no Brasil em 2015, na edição #835 de Mickey (Ed. Abril).
Se você realmente se esforçar para lembrar,terá uma vaga lembrança de Brandon Routh (de Superman Returns), Como Dylan Dog. O filme tinha pouco ou nenhum marketing e críticas horríveis. Teve um desempenho tão ruim que enterrou uma possível e promissora franquia, juntamente com a carreira de Routh por algum tempo (você pode vê-lo na série de TV da DC Comics, Legends of Tomorrow, exibido aqui no Brasil pelo canal a cabo Warner).
© Ed. Abril
Dylan Dog e as Criaturas da Noite é indefensável.
© SBE Editore Itália
Entrevista: Tiziano Sclavi Entrevista concedida ao portal Lo Spazio Bianco e que obtivemos autorização exclusiva para publicação Quais pontos centrais podemos destacar na criação do personagem Dylan Dog? O mais óbvio é o horror, claramente. O menos óbvio e mais ambicioso era criar uma nova linguagem, toda minha (eu já havia feito tais experiências, em parte, em Mister No). A linguagem é tudo: para citar apenas um exemplo “caseiro”, Gian Luigi Bonelli criou uma inconfundível linguagem para Tex e, na minha opinião, foi um dos elementos por trás do seu sucesso.
to restrito no início), não por acaso uma das colunas foi intitulada Dylan Dog Horror Club. Claro que não esperava os dois, três sacos de correspondência por dia que viriam mais tarde (e você sabe o quão grande pode ser uma sacola de correspondências? Muito grande!). No entanto, sempre li e respondi a todos. E muitas cartas foram publicadas na página de cartas da revista.
Dylan Dog passou de quase um título de nicho (mesmo sendo um Bonelli) Para um fenômeno de publicação, invadindo a imaginação popular, além dos leitores de quadrinhos. O que mudou em sua abordagem para escrever as histórias? Você sente mais responsabilidade? A responsabilidade aumenta certamente, mas não muito. Eu praticamente continuei a fazer o que fiz antes, tentando me divertir para manter os leitores entretidos.
Quando Dylan Dog foi lançado, os quadrinhos ainda lutavam para serem plenamente reconhecidos no ambiente cultural italiano. Acima de tudo, houve clara divisão entre o quadrinho “autoral” e o “popular”. Quadrinhos como Ken Parker antes e depois Dylan Dog eram importantes para questionar e quebrar essas crenças. Você sentiu o peso dessa distinção inútil? Muito, achava um absurdo. Outra ambição minha (mas não pensei que conseguiria) foi derrubá-la para sempre. E bem, hoje não existe mais.
Ainda longe das redes sociais, do contato direto entre autores e leitores, Dylan Dog conseguiu criar uma base de fãs graças a uma linguagem muito jovem e alegre e a inclusão de citações, referências, homenagens ao cinema e literatura que serviram de cola para criar um grupo, para que os leitores se sintam de alguma forma próximos uns dos outros. Quão importante era para você ter esses contatos com os leitores, para senti-los de alguma forma próximos? F o i m u i to bom se sentir parte de um clube (mui-
Você acredita que em algum momento algo se quebrou em seu relacionamento com Dylan Dog? Como você se coloca frente a sua criação hoje? Nada se quebrou. Adoro meu personagem, eu sempre o amei. Mesmo depois de trinta anos ainda o amo. E eu sou grato a ele, que me deu muito, talvez mais do que eu lhe dei. Quão importante foi a presença de sua esposa Cristina durante a criação de Dylan Dog e a seguinte transformação em um ícone que lhe trouxe um sucesso incrível, mas que em nível pessoal talvez você tenha tido dificuldade em gerenciar? Nenhum. Simplesmente porque Cristina não estava lá nos primeiros anos. Eu a conheci em 1993, em 1994 nós começamos a viver juntos e nos casamos em 1996. Então, foi bastante tempo após a criação que ela se tornou importante em minha vida pessoal. Na verdade, indispensável. O que o convenceu a voltar a escrever Dylan Dog, depois de dizer repetidamente que tudo o que você tinha a dizer sobre o personagem foi dito? Foi a amável insistência de meu
amigo Roberto Recchioni e o fato de ter uma pequena idéia (nada extraordinário ou particularmente novo, pelo amor de Deus). Eu escrevi duas histórias. Então comecei uma terceira, mas fiquei preso novamente, depois de algumas trabalhos, e não escrevi mais, comecei a me aposentar. E de qualquer forma, as duas histórias pareciam feias, eu as teria jogado no fogo, como tudo o que escrevi, quadrinhos ou não. Mas não podia ser feito, já tinham saído. (depois de 9 anos Sclavi voltou a escrever uma história de Dylan Dog em 2016, no número #363 da série italiana. Antes disso sua última edição havia sido a #250 de junho de 2007). Você é o pai criativo de um dos personagens de quadrinhos mais importantes nascidos na Itália. O que você acha do seu filho e como você vê seu futuro? Já disse que adoro minha criatura. Quanto ao futuro dele, se houver jovens autores que possam reinterpretá-lo e atualizá-lo, vejo-o bem, sempre dentro dos limites de uma recessão editorial, especialmente impressa, que já dura muito tempo e acredito que vai durar indefinidamente. Depois de todos esses anos, há algo que você mudaria nele? Nele como personagem (eu ia dizer uma pessoa) talvez não, mas na realidade a série já está mudando! E isso graças à gestão de Roberto, com quem eu concordo totalmente e que também agradeço publicamente toda vez que tenho a chance. Você sempre teve controle total e poder de decisão sobre as histórias de Dylan Dog ou, em alguns casos, você teve que fazer concessões? Eu tive controle total nos primeiros anos, quando também era curador, e sempre fiz ou produzi as histórias que queria, em total liberdade, de acordo com Sergio Bonelli e o então diretor Decio Canzio (e desde então Estou com vontade de agradecer, um grande obrigado para Bonelli, a melhor das editoras possíveis). Se eu retornasse hoje, acho que estaria tudo bem novamente.
A Revista fumetti agradece especialmente a Ettori Gabrielli e ao site Lo Spazio Bianco por gentilmente autorizarem a publicação desta entrevista.
Alguns anos atrás os dados sobre as vendas de Dylan Dog em bancas anunciavam uma queda acentuada e mesmo que a editora não considerasse que havia uma crise no título, mudanças seriam necessárias. E a primeira delas foi a troca do editor chefe, Giovanni Gualdoni foi substituído por Roberto Recchioni, o homem em quem Bonelli acreditava ser capaz de reverter toda a situação que se aproximava. Recchioni identificou juntamente com Tiziano Sclavi - O criador de Dylan Dog, uma série de elementos onde eles poderiam fazer alterações que seriam fundamentais para revigorar o personagem e ao mesmo tempo não ferir com o que havia sido estabelecido até então. Dylan Dog caminhava para seu aniversário de 30 anos de lançamento e o momento parecia bastante oportuno para tal empreitada. Do ponto de vista narrativo, as intenções de Recchioni eram tentar reviver Dylan primeiramente criando histórias que o trouxessem de volta às suas raízes, quando ele soube se impor como um ícone da cultura pop italiana através de suas características de herói atormentado e problemático e mudar suas peculiaridades exageradas, que muitas vezes traziam um Dylan nos limites do caricatural. Portanto, através de alguns expedientes narrativos, os autores teriam que direcionar as histórias para um desenvolvimento desvinculado daqueles que se tornaram clichês quase intransponíveis.
© SBE Editore Itália
Dylan Dog: Um novo rumo
Graficamente, a renovação começaria ao se repensar a forma de fazer as capas e, depois, pela introdução de novos artistas nos lápis para revitalizar e estabelecer um novo padrão visual para Dylan Dog. O primeiro elemento em que podemos ver os resultados da mudança foi a capa. Paolo Campana trabalhou para simplificar o logotipo histórico criado por Luigi Corteggi em 1986, mas foi acima de tudo o novo conceito no design das capas para entregar um Dylan Dog nitidamente melhorado. O próprio Stano, que também parecia mais inspirado por esse novo processo criativo, reconhece pelo menos metade da paternidade das novas capas a Recchioni, para as quais o ponto de virada claramente deu certo. Em segundo lugar, os escritores teriam que ousar mais com as histórias e colocar Dylan na frente de sua notória idiossincrasia de tecnologia, de modo a trazer o “peso” protagonista para a sociedade demasiadamente ligada à alta tecnologia de hoje em dia. A longo prazo, daria para as histórias uma continuidade, não muito explícita, mas ainda assim perceptível. Desta forma não iria comprometer a publicação no estilo do edição único, bem comum a tradição Bonelli, mas contemplando arcos narrativos inteiros, unidos por temas particulares, de certa maneira bem parecido com algumas séries de televisão ou como as publicações dos heróis estadunidenses. Quanto aos personagens, a aposentadoria de Bloch e sua substituição por alguém cujo Dylan não se deu muito bem foi para tentar tornar as histórias menos óbvias. Essa situação certamente evitou que os roteiristas recorressem ao que acabou sendo um clichê narrativo para as histórias do investigador do pesadelo, permitindo que ele se envolvesse ou continuasse investigando e explorando sua amizade com o inspetor. De fato, o novo Bloch representa um personagem cheio de potencial, inserido como está nesse novo formato, mas agora livre das limitações de se trabalhar para a Scotland Yard. O mesmo potencial que, ainda que parcialmente, podemos ver em Groucho, que antes era apenas um alívio cômico, um personagem raso e muitas vezes chato (outra tradição Bonelliana, os ajudantes). Mas agora com uma personalidade mais multifacetada do que no passado.
informações particulares de velhos conhecidos ou de sua biblioteca e pode continuar a fazê-lo com tranquilidade. John Ghost, seu novo antagonista, um hype interessante foi criado. O novo vilão foi introduzido em um número dedicado no qual a nova continuidade é baseada. É um personagem fascinante, um clássico com maneiras refinadas, mas, graças ao design do personagens feito por Angelo Stano, consegue provocar imediatamente sentimentos contrastantes de atração e repulsa. Com a aparição na edição de trinta anos, Recchioni deu-lhe uma dimensão mais convincente, explicando seu envolvimento em eventos recentes e ligando-o ao passado, bem como ao futuro de Dylan; mas, por outro lado, Ghost possui modos excessivamente pomposos e muitas vezes didáticos, quase como se Recchioni quisesse lembrar-se constantemente de sua natureza ruim. E por fim reorganizar, também, as diversas publicações paralelas, não só em relação a periodicidade, formatos, estilos, direcionamentos editoriais. Uma revigorada geral em todos os títulos. Então a operação de relançamento foi bem sucedida? A resposta pode ser afirmativa em grande parte. É verdade que muitas das inovações introduzidas não foram exploradas devidamente, assim como nem todas as páginas publicadas nesta iniciativa foram qualitativamente iguais. No entanto, devemos considerar que muitas edições têm sido uma ocasião para reflexão, sobre como foi necessário fazer essa renovação, e que se colocarmos na balança, os pontos positivos superam os negativos. Os resultados nem sempre foram positivos e, de fato, o desafio é precisamente o de elevar e manter o padrão de qualidade das histórias em comparação ao que foi feito até então, mantendo o Investigador do Pesadelo o ícone pop que se tornou desde sua criação na década de 1980.
O relacionamento de Dylan com a tecnologia também não foi resolvido. Dylan Dog é, em primeiro lugar, um investigador, ele sempre encontrou certas
Capa da edição onde o inspetor Bloch se aposentou , claramente inspirada no clássico de John Romita para o Homem-aranha
Entrevista: Gigi Cavenago
Falamos exclusivamente com um dos desenhistas mais promissores da nova geração de Dylan Dog. Por Thadeu Fayad
Apesar da sua idade jovem, você trabalha neste ambiente como profissional há mais de 10 anos. Como você conheceu Dylan Dog, leitor ou autor? Conheci Dylan como leitor, era 1993, eu tinha 11 anos e um amigo meu me deu o número do mês, era a edição 82. chamado “lonano dalla luce”. Ao ler, percebi que não era um quadrinho “adequado” para minha idade, e li com todo o interesse e a emoção de ter em minhas mãos algo “proibido”. Havia cenas muito cruéis e assassinatos violentos, eu nunca tinha visto nada parecido. Mas só fui ter pesadelos depois uma semana, quem sabe por quê. Qual história você se lembra de uma maneira especial e por quê? Além do n. 82, estou ligado a muitos outros livros. Os que eu prefiro ler são os mais bem-humorados como “Grand Guignol” ou “Tre por zero””. Eu gosto da ironia que Sclavi sabe combinar com o horror, sempre sai uma mistura verdadeiramente única que ninguém realmente conseguiu imitar. Há também números muito poéticos como “Johnny Freak” ou “o il volo dello struzzo” que pode trazer algumas lágrimas! Como definir Dylan Dog? Eu sempre o defini como um “despreparado”. Antes de ler Dylan, eu estava convencido de que um investigador de pesadelo tinha à sua disposição toda uma série de instrumentos, amuletos e livros ocultos para enfrentar os monstros. Dylan, em vez disso, se joga no desconhecido e horror sem a menor proteção, a única arma que ele tem à sua disposição, o bodeo, que na maioria das vezes ele esquece em casa. Quando eu era criança, isso era difícil de entender, mas logo percebi que os monstros que aparecem nas histórias não são reais, mas pretextos para dizer outra coisa, mostrar um horror que não pode ser derrubado por uma arma. Recentemente, tivemos um filme de Dylan Dog, que apesar de ser inspirado pelo personagem estava longe do que temos nas HQs. Você viu o filme? O que você achou dele? Eu o vi no cinema, mas eu já sabia o que eu ia encontrar. Um filme pobre nascido com premissas erradas. Com qual personagem, assunto, atmosfera, você se sente mais à vontade e gosta de desenhar? Devo dizer que fiquei imediatamente à vontade com Dylan. Gosto de desenhar ambientes interessan-
tes e misteriosos, enquanto que como leitor prefiro ler as histórias mais irônicas, como desenhista prefiro os que tem atmosfera mais rica, locais deslumbrantes e na medida do possível, longe da realidade.
pequenos esboços, então eu começo a configurar a mesa e depois trabalho quadro por quadro. A beleza do digital é que você pode cometer erros umas mil vezes e o desenho só vai ganhando em qualidade.
Como você busca inspiração para desenhar uma cena? Tem algum ritual que costuma fazer? Eu busco muitas referências na internet. Se tiver que desenhar um conjunto de cenários, por exemplo, em um necrotério, vejo dezenas de fotos com diferentes tipos de pessoas, da década de 20 aos dias de hoje, tentando armazenar o máximo de informações possível. Para a recriação dos personagens, se não há indicações específicas de um desenhista, eu gosto de imaginar gestos expressivos ou enquadramentos efetivos e começo a partir daí. Às vezes peço a amigos e amigos para recriar a cena, como se estivéssemos no teatro, para ter novas idéias e evitar repetir os mesmos gestos.
Aqui no Brasil, Mater Morbi é uma das histórias mais reverenciadas de Dylan Dog e Mater Dolorosa é considerada sua continuação. Como nasceu esse convite? Você esperava isso? E como foi trabalhar na edição? Sim, Mater Dolorosa nasceu há alguns anos como uma sequência “simples” de Mater Morbi. Roberto Recchioni, me convidou depois fiz uma seqüência de Orfani coloridos de forma pitoresca. Já vinhamos trabalhando em Orfani há um ano. O ano seguinte começou a trabalhar nesta história de Dylan que, a principio seria apenas uma sequência e se tornou um número de comemoração do trigésimo aniversário, onde Xabaras, Morgana, John Ghost foram inseridos no passado de Dylan Dog. Tudo isso me criou uma responsabilidade ainda maior sendo o meu número de estréia na série, um número que eu tive que colorir tudo (o que eu nunca tinha feito antes). Como se isso não bastasse, ele teve que estar no estilo pitoresco e seguir os passos de um gigante como Massimo Carnevale ...
O que significa para você desenhar Dylan Dog? Um grande marco. Anos atrás, pensei que o ponto máxima da minha aspiração era me tornar um desenhista “regular” da série. Nunca imaginei me tornar o capista. Para a SBE você trabalhou primeiro com Orfani e depois com Dylan Dog sempre em cores. Gostaria de mais cedo ou mais tarde trabalhar com preto e branco, talvez apenas para o Investigador do Pesadelo? Sim, tenho um pouco de nostalgia por preto e branco. A cor é muito eficaz e impactante, e pode dizer muito bem algumas coisas que talvez não funcionassem em preto e branco . No entanto, às vezes eu gostaria de deixar os desenhos sem cores, porque eles têm um charme especial. Mas sempre depende da história: um volume como Mater Dolorosa seria muito diferente se não tivesse tido todo aquele sangue vermelho! Você tem desenhado digitalmente há alguns anos. Como você se prepara para um trabalho depois de ler um roteiro? Exatamente como fazia com o papel antes de passar para o digital: faço uma série de
2018 é o ano da Copa do Mundo e os italianos são grandes fãs de futebol como nós brasileiros. Acompanha o futebol? Qual foi sua reação ao ver a Itália fora da competição? você vai torcer para qualquer seleção? [Muitos risos] Infelizmente, eu não acompanho o futebol, eu sou um dos poucos talvez, mas é assim. Estou torcendo apenas para os quadrinhos! seus planos para o futuro: você pode nos revelar algo? Tiziano Sclavi está escrevendo uma série paralela ao Dylan Dog, será chamado de “Tales of Tomorrow” e eu estou trabalhando no número um. Será uma série muito interessante, mas ainda não consigo revelar nada sobre isso. Depois, devemos pensar no número 400 de Dylan Dog. Roberto já está trabalhando nela e o título provisório é “Mater Triumphans”
© SBE Editore Itália
Parte integrante da revista fumetti #5 abril 2018 - não pode ser vendido ou repruduzido sem autorização - arte de Marcos Martins
DIRETAMENTE DAS PÁGINAS DA
EXCLUSIVIDADE NO BRASIL
Mundo do Oeste EM MAIS UMA PARCERIA EXCLUSIVA, DESTA VEZ COM O SITE DIME WEB, UM DOS MAIS RESPEITADOS PORTAIS SOBRE QUADRINHOS ITALIANOS DO MUNDO.
Publicado no Portal Dime Web mensalmente, La Storia del West (que aqui chamaremos de Mundo do Oeste) é uma série de ensaios sobre o velho oeste, escritos por Wilson Vieira - único brasileiro a desenhar Il Picollo Ranger (aqui no Brasil chamado de O Pequeno Ranger), nosso consultor - e que rapidamente se tornou um grande sucesso na Europa. Traremos com exclusividade esses artigos, verdadeiras preciosidades que nos mostrarão um mundo inesperado - longe da retórica propagandística das estrelas e faixas e falsos ecos de Hollywood - povoados por personagens surpreendentemente próximos da ética e do modo samurai no Japão antigo.
Além dos artigos escritos pelo Wilson, traremos uma rigorosa seleção de imagens Bonellianas correlacionando nossos personagens preferidos com o texto feita por um dos curadores do Dime Web, Francesco Manetti e cards exclusivos irão ilustrar e completar cada tema aqui apresentados. Um grande presente aos amantes do Velho Oeste, aos que ainda não conhecem sobre sua realidade, seus costumes, que traremos em um grande trabalho editorial, nunca antes realizado por nenhuma publicação no Brasil.
COWBOYS TEXTO: WILSON VIEIRA - IMAGENS: FRANCESCO MANETTI TRADUÇÃO: THADEU FAYAD
A palavra apareceu pela primeira vez após o ano 1000 d.C., em fazendas na Irlanda e chegou em torno de 1604 - com prisioneiros de guerra irlandeses deportados por Oliver Cromwell (1599 - 1658) - na Nova Inglaterra, onde pastores vestidos de jaquetas e Casacos de couro, que levaram um rebanho de Springfield para Boston em 1655, já eram chamados de cowboys. A partir de 1770, esta palavra é usada para cuidadores de rebanhos de gado na Virgínia, Carolina e Geórgia. Mas somente nos anos turbulentos que precederam a fundação e a Guerra da Independência da República Texana (1830 - 1863) são os pastores especializados de acordo com o modelo Cowboy mexicano. Cowboy vem da palavra espanhola vaca, que significa “bovino”. Foi, no México, o antecessor e modelo do Cowboy americano. Os primeiros Cowboys eram pecuaristas indígenas das missões espanholas. Eles seguiram a “meia-raça espanhola-indiana” como um cavaleiro ao serviço dos latifundiários mexicanos, ou fazendero (“proprietários de terras”), hacendados (“proprietários de gado”) e ranchero (“criadores”).
A palavra Cowboy foi usada pela primeira vez nos Estados Unidos para designar homens do Estado de Nova York que trocaram gado roubado durante a Revolução Americana (1775-1783). Então, quando o Texas se separou do México, até os texanos que contrabandeavam gado de terra além do Rio Grande eram chamados de Cowboys. Mas levou muitos anos antes que a palavra se tornasse o termo que verdadeiramente descrevia “o cavaleiro das pradarias”.
dos nas ricas terras de pastagem ao redor do rio Neuces, encontraram tanto gado que nem sequer se preocupam em marcar os bezerros recém-nascidos. Mas, em relação à quantidade de novilhos existentes, a demanda era muito baixa. Um pequeno comércio de couros, sebo, cascos e chifres foi então formado ao longo da costa do Golfo; os novilhos do Texas produziram peles, velas e cola para o resto dos Estados Unidos.
Entre 1840 e 1860, milhares de vagões cobertos atravessaram as Grandes Pradarias, indo para o oeste. Para aqueles homens e mulheres acostumados a colinas amigáveis, árvores e prados verdes, embarcar na aventura nas encostas ocidentais deve ter sido parecido com sair de um porto abrigado para o mar aberto. A grama inundada pelo sol do verão esticou-se infinitamente a cada lado da trilha do vagão estreito; não havia nada familiar na monotonia das pradarias ou entre os picos batidos pelos ventos. Não é de admirar que eles considerassem a terra como um deserto e estavam ansiosos para pegar a primeira mão amiga estendida ao longo da trilha. Os pioneiros trouxeram cavalos e gado com eles para povoar as fazendas que ocupariam uma vez que cruzavam as montanhas. Mas quando os vagões chegaram ao rio North Platte, os animais agora estavam saturados e cansados e muitas vezes as reservas eram bem escassas. Quando a caravana parou diante de uma posição comercial, as vacas leiteiras fracas do vale do Missouri foram facilmente cedidas em troca de um punhado de dólares ou alguns sacos de farinha. Pouco a pouco, ao longo da trilha, surgiram inúmeras fazendas, onde os comerciantes libertaram o gado pioneiros e exausto e trabalharam duro para engordá-lo nos vales prósperos. Mais tarde, o mesmo gado teria sido revendido, naturalmente com lucro, para o próximo comboio de viajantes que queriam que os animais mais vigorosos terminassem a jornada. Foi assim, de uma maneira muito simples, que os criadores desmentiram o mito do grande deserto americano, mostrando que os rebanhos, como o bisonte, poderiam prosperar nas planícies. Enquanto isso, ocorreu uma grande mudança na parte sudoeste do país. Os mexicanos, que colonizaram com sucesso a Califórnia e a Terra dos Tejas, perderam grandes quantidades de bens em uma breve guerra com os Estados Unidos (1846-1848). Os rebanhos de gado, que custaram tantas dificuldades às missões espanholas antes e aos ranchos mexicanos mais tarde, foram deixados livres pelo Cowboy em retirada.
Então, enquanto os texanos procuravam desesperadamente novos mercados para sua riqueza de quatro patas, a Guerra Civil Americana estourou (1861 - 1865). Os Cowboys se aliaram à Confederação Sulista, e durante quatro longos anos lutaram uma guerra desesperada contra o Norte. Várias tentativas foram feitas para fornecer carne ao Exército dos combatentes levando os rebanhos para Nova Orleans e as cidades do Mississippi. Quando a Guerra Civil explodiu, grande parte da América ficou devastada pela luta. Fazendas e ranchos foram queimados, os animais libertados, ou confiscados para alimentar os exércitos rivais. Mas assim que os soldados do Norte conseguiram abrir uma estrada ao longo do vale do rio para o mar, o Texas permaneceu isolado do resto dos Estados do Sul. Os animais de chifres longos vagaram pelos vales floridos e, quando os Cowboys do Texas voltaram da guerra para casa em uma nação arruinada, perceberam que havia mais de 5.000.000, todos animais saudáveis e robustos. No Norte, faltava a carne, uma situação que iniciou os grandes transportes de gado. O boi Texan de chifres longos era descendente direto do animal espanhol robusto, fino e de chifres longos originalmente criado em grandes rebanhos de mouros nas planícies da Andaluzia. Os vastos rebanhos de longhorns selvagens foram declarados oficialmente pelo governo texano
como propriedade pública; no entanto, não havia pessoas interessadas neles, já que a necessidade de carne era baixa. Havia apenas um pequeno mercado de peles, chifres, ferraduras, ossos para fazer cola e sebo de gado para fazer velas, e também crina para almofadas. A localização original para o comércio de couro e sebo era a Califórnia; por esta razão, a pele do gado foi chamada de “nota californiana”.
Os conquistadores agressivos do Texas, instalaR E V I S T A
F U M E T T I .
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souri. Os ladrões de gado tornam impossível que os cowboys busquem novas rotas e novos estabelecimentos no Wyoming, Illinois e Iowa.
MUNDO DO OESTE - COWBOYS Os tempos heroicos do Cowboy americano começaram no final da Guerra da Secessão, porque depois das devastações da guerra a necessidade de carne e pele cresceu enormemente. Aqui, o Cowboy americano tornou-se a figura mais emblemática dos mitos nacionais. Em 1865 no Texas literalmente invadido por rebanhos de gado - cada item vale 5 dólares, enquanto nos mercados Norte e Leste é pago até 50 dólares. Assim, começa outro capítulo fascinante da história americana, o da grande migração de gado. As aventuras dos Cowboys do Texas serviram para empurrar a fronteira dos fazendeiros cada vez mais a fundo nas Great Grasslands. A essa altura, ninguém pensava na terra que se estendia entre as Montanhas Rochosas e o Mississipi como um “deserto”. O mito do despoblado - como o território tinha sido batizado pelos espanhóis - começou a desaparecer quando os primeiros Cowboys dirigiram a primeira coluna de boi com longos chifres no mar da grama. Diante de longas jornadas e superando as dificuldades de todos os tipos, os Cowboys dirigem os rebanhos enormes para as estações ferroviárias, de onde o gado é direcionado para as reservas indianas e as cidades do Oriente. A rivalidade entre as várias empresas ferroviárias, que competiram para ser a primeira a atravessar o continente, levou cada ano mais ao oeste a parada final. Havia uma dúzia de empresas: Union Pacific, Kansas Pacific, Atchison, Topeka e Santa Fé, Burlington, Texas Pacific e outros. As cidades da pradaria apareceram; os índios se retiraram, os bisões foram mortos e todo o país se transformou. Então a primeira onda de excitação para o dinheiro acabou e o Texas começou a se recuperar dos efeitos da Guerra Civil. Aqui está o número de gado em 1860 nos vários estados: Kansas, 93.455; Nebraska, 37,197; zero em Colorado, Wyoming, Montana e Dakota. Em 1880, os números são enormemente maiores: Kansas, 1.533.133; Nebraska, 1113.247; Colorado, 791,492); Wyoming, 521,213; Montana, 428.279; Dakota, 140.815. Em 1866, 260 mil chefes passam pelo Rio Vermelho e, através do Arkansas e do sul do Kansas, chegam a Sedalia, Mis-
Abilene em Kansas é o primeiro centro de classificação de gado organizado. Nos terminais ferroviários, como Abilene, os rebanhos foram mantidos em grandes gabinetes até serem carregados em trens especiais. Entre os estalar dos chicotes, os Cowboys empurraram o gado para os carros. De 1866 a 1880, mais de 4.000.000 de cabeças fizeram viagens de cerca de 300 quilômetros para chegar ao seu destino. Houve também outros problemas: as companhias ferroviárias, depois de construir as linhas, exigiram uma taxa por cada dia em que os trens estavam servindo, e não apenas quando o longo transporte chegava ao seu destino. E assim, para encorajar os agricultores a construir fazendas perto de vias férreas, as empresas ofereceram terras a preços muito baixos. Logo aconteceu que, como os agricultores em torno de Baxter Springs, nos primeiros dias do transporte de gado, os fazendeiros de pradarias temiam que o gado do Texas destruísse suas colheitas e trouxesse a febre do Texas para a área. Na verdade, na pele dura do boi de chifres longos vivia um parasita portador de uma doença, e embora o boi do Texas fosse imune, o parasita poderia abandonar o animal e atacar a primeira vaca que passasse por perto. Isso poderia muito bem ser um animal das novas fazendas, não tão resiliente quanto a raça do Texas; por esta razão, novas leis foram passadas na quarentena que proibiu o boi com longos chifres de entrarem nos novos assentamentos. Os índios, em cujo território os rebanhos passam, recorrem ao governo para solicitar uma taxa de 10 centavos por cada cabeça. Isso causa confrontos sangrentos entre cowboys e índios tentando defender o que é justo e de direito. Continua...
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Entrevista: Pedro Mauro
Falamos exclusivamente com o desenhista e co-autor da HQ Gatilho, um grande sucesso nacional dos quadrinhos de faroeste Por thadeu Fayad
“Um caçador de recompensas chega numa cidade abandonada em busca de justiça. Mas, para conseguir o que quer, ele precisará enfrentar muito mais do que o homem que procura… Terá que exorcizar fantasmas do passado.” A sinopse de Gatilho pode nos dar a impressão de que já vivenciamos uma situação assim porém é uma visão diferente do que vemos em histórias de faroeste. a HQ se destaca, também, pela forte inspiração nas obras do cineasta italiano Sergio Leone. O grande responsável por tornar conhecido mundialmente o género do western spaghetti nos cinemas. Leone foi o autor de filmes consagrados como Era uma vez no oeste e Três homens em conflito. Gatilho tem um roteiro não linear que aos poucos vai ligando os acontecimentos do passado com os do presente, ambos sempre envoltos numa atmosfera de suspense e muita tensão. O emocional do personagem, explora suas angústias e medos, ainda dá um tom psicológico à trama. Carlos Estefan, roteirista da Mauricio de Sousa Produções, desenvolve uma história consistente e
bem elaborada, contando com um final bem criativo para a história. Pedro Mauro já é um nome consagrado, e em 2014 passou a trabalhar para a Sergio Bonelli Editore, trabalhando em edições de Le Storie e também do tradicional Ranger e carro chefe da editora, Tex. As artes de Gatilho são um espetáculo de luzes e sombras. Muito fiel às HQs tradicionais do gênero, Pedro usa e abusa dos alto contrastes, criando um desenho “sujo” mas que funciona perfeitamente para a trama. A diagramação das páginas valoriza ainda mais a arte com quadros grandes e páginas duplas. Com suas duas tiragens esgotadas, tanto na plataforma de financiamento coletivo, quanto na loja virtual, Gatilho é uma obra significativa entre os quadrinhos de faroeste, não deixando nada a dever para outros trabalhos e possivelmente figurando entre os melhores quadrinhos já feitos no Brasil!
Como surgiu a oportunidade para trabalhar com a SBE? Quais trabalhos já fez por lá? E como surgiu a chance de trabalhar numa história de Gianfranco Manfredi? Na minha volta para os quadrinhos, eu estava focando o mercado americano, e a oportunidade com a SBE veio pelo Facebook. Eu pensava em voltar para os quadrinhos, então comecei a desenhar paginas e ilustrações voltadas para esse mercado, e publicar na minha pagina do Facebook e Instagram. Um dia recebi uma mensagem inbox de Gianfranco me convidando para desenhar Adam Wild. Eu ja era fã de Magico Vento, e conhecia o trabalho dele, então topei na hora.
Pedro, não tem como fugir da tradicional pergunta inicial, conta para a gente como tudo isso começou? Seu primeiro contato com os quadrinhos e um pouco da sua trajetória. Sei que trabalhou com publicidade, isto foi antes, ou durante os trabalhos com as HQs? Eu comecei desenhar ajudando o quadrinista Ignacio Justo, quem também foi meu mestre, nas suas estórias de Combate. Isso foi em 1969, e em 1970 eu desenhei minha primeira estória solo de Western para a extinta Editora Taika, em Sao Paulo. Desenhei uma revista por mes, durante dois anos. Depois disso, eu entrei em publicidade desenhando storyboards para comerciais e também ilustrações para revistas como Quatro Rodas e Playboy. Qual o seu trabalho de estreia? Seu primeiro trabalho já foi na Itália ou França? Em quadrinhos no Brasil, foi o Western Pancho, em 1970. Na volta, em 2014 para as HQs, foi para a SBE. Em 2015 fiz um álbum sobre piratas para Glenat,
Acima à esquerda a capa da HQ Gatilho, acima um dos trabalhos de Pedro Mauro a SBE, com Adam Wild e abaixo outra página da HQ Gatilho.
Meus trabalhos para a Bonelli foram dois episódios para Adam Wild, um álbum para LeStorie Mugiko, todos com Gianfranco, e estou agora trabalhando em uma nova serie ainda inédita, também com ele. E como é o processo para fazer uma história deles (deles SBE)? Como funciona essa escalação. O processo de trabalho e muito bom, primeiro porque eles planejam muito bem os prazos e lançamentos. Cada álbum de 110 paginas eu tinha uma ano de prazo pra entregar finalizado, agora a escalação depende do roteirista e editor. O Gianfranco indica o desenhista para os editores. Não sei dizer sobre outros autores, porque ate agora eu so tenho trabalhado com ele. Você tem material guardado e que nunca publicou? Você pensa em publicá-los? E por que você opta por histórias mais de época e não atuais? Não, não tenho material inédito guardado. Eu sempre gostei de filmes e historias de época, e aventura. Acho que me sinto realizado de ter desenhado ate agora o que mais gostava quando moleque...western, aventura, espionagem e piratas. So falta uma de ficção pra completar.
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O enredo das histórias de faroeste e o estilo do desenho não apresentaram grandes mudanças ao longo dos anos. Como é possível se reinventar, mantendo um padrão e ao mesmo tempo não sendo igual aos outros? Eu tentei, agora voltar com um estilo que mais retratasse os empoeirados e sujos faroestes italianos, mudei um pouco meu estilo atual para fazer Gatilho. Mas eu acho que o roteirista, Carlos, se reinventou com o roteiro que escreveu para o projeto. A maneira que ele contou a historia, me pegou de surpresa, sinceramente. Na hora de desenhar os quadrinhos, é mais importante retratar a fidelidade histórica ou se preocupar com o entretenimento? Pra mim, as duas coisas são importantes. Voce tem prender o leitor com a narrativa e também entregar para ele detalhes de época, armas, indumentárias, etc...o mais próximo possível da realidade. Eu pesquiso muito esse aspecto. Gatilho presta homenagem aos filmes e quadrinhos de faroeste das décadas de 1960 e 1970, como surgiu esse projeto? Me bateu aquela nostalgia de desenhar um faroeste e voltar nos meus anos 70. Mas queria um roteiro com uma pegada diferente, mas uma homenagem ao faroeste italiano de Sergio Leoni e os de Clint Eastwood.
Ao lado um esboço de uma das páginas de Mugiko, publicada pela SBE em Le Storie e mais abaixo um sketch da capa de Gatilho.
Conversando com meu amigo roteirista Carlos Estefan, que também adora o tema, ele me propôs escrever o roteiro. Quando ele me falou sobre a ideia da historia, eu ja tive vontade de desenhar. O roteiro foi aberto, sem pagina por pagina, quadro por quadro, foi nascendo nas conversas, nos sketches, nos cafés. Gatilho não apresenta um herói como sendo o legítimo “mocinho”, o que exatamente o perfil de Tex, e sim um caçador de recompensas que precisa, antes de sua vingança, se livrar de fantasmas do passado. O público atual prefere esse tipo de enredo ao invés do clássico herói moralmente implacável? Eu sempre acho uma historia legal quando tem um final feliz, tipo, o mocinho vencer o bandido, e o bem sempre prevalecer e o herói cavalgar para o horizonte na ultima cena. Em gatilho, mostramos algo mais próximo do que era a realidade na época, rude, crua e violenta, e os personagens lidando com escolhas que poderiam mudar suas vidas para sempre. São maneiras diferentes de retratar um tema, e acho que Gatilho entrou nesse vácuo que existe nas historias de faroeste, e pegou um publico que gosta tanto de Tex como do Pistoleiro sem nome.
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Godless UMA DAS MELHORES PRODUÇÕES TELEVISIVAS DO ANO, A SÉRIE APOSTA EM UMA MUDANÇA TOTAL NO GÊNERO DO FAROESTE. A SÉRIE DA NETFLIX, LANÇADA EM NOVEMBRO DE 2017, É UM FILMAÇO DE 7 HORAS E MEIA, COM GRANDES ATUAÇÕES E UMA HISTÓRIA MATADORA.
Antes de contarmos a história da série é preciso pontuar que a fórmula do faroeste que vemos no cinema (e também na TV) é um clássico relativamente imutável, o gênero explora sempre o século 19, envolvendo nativos americanos e os imigrantes europeus através de conflitos diversos e duelos por terras, respeito, dinheiro, entre outros bens. Por mais que já tenham tentado mudar esse cenário, os produtores dificilmente mudam a fórmula. E é aqui que a nova série da Netflix faz diferença, ela mexe em um dos principais pontos do faroeste tradicional, a grande maioria, pra não dizer sua totalidade, são protagonizada por homens, deixando sempre as mulheres como donzelas em perigo ou de pouca moralidade. Godless nos leva para um Velho Oeste de paisagens áridas, dos saloons e das diligências. A produção mergulha em todos os chavões do bangue-bangue. Mas, ao mesmo tempo, nos apresenta a um ambiente de fábula, inventado. Naquele mundo de bravos, fica La Belle, uma cidade cuja população é basicamente de mulheres. Praticamente todos os moradores homens morreram em uma explosão na mina local, sobrando, além das mulheres já citadas, crianças e idosos. Homens, em La Belle, há o xerife cada vez mais míope e desacreditado e seu assistente, um garoto magrinho avesso ao banho e que adora rodar os revólveres nos dedos. Por mais que esse seja um fato bem peculiar sobre a série, não é o foco principal da produção. Godless acompanha, assim como a maioria dos faroestes, o embate entre dois homens: o criminoso Frank Griffin e o companheiro que o traiu Roy Goode. O imoral e vingativo Griffin, um psicopata com estranhos pensamentos religiosos que lidera um bando de criminosos (todos da pior espécie). Frank considera Roy seu filho, junto a seu bando vêm cavalgando pelo território à sua procura de um foragifo Roy como uma praga bíblica, assassinando cidades inteiras – mulheres, crianças,
bebês, sem exceções – simplesmente por terem dado uma noite de pouso ou uma refeição a Roy. E acontece de Roy encontrar refúgio exatamente na aparentemente indefesa La Belle. Godless ousa ao introduzir uma dúzia de fortes personagens femininas como a ex-prostituta que virou professora Callie Dunn, a dona do próprio rancho Alice Fletcher, até a sensacional viúva do prefeito que passa a tomar conta ela mesma da cidade. Cada uma das mulheres de La Belle toma para si os trabalhos que eram de seus maridos e mantém todas as responsabilidades que já tinham. Ainda assim, para todos que olham de fora, a cidade está despreparada e desprotegida para receber e enfrentar alguém como Frank Griffin e sua gangue. Tudo parece conspirar contra essas mulheres. O visual também é algo que a série leva muito a sério. Com uma fotografia apurada, criando um belo contraste de cores para separar presente, passado ou lembrança. Abusando tons amarelados do deserto de Santa Fé nas cenas do presente, tirando quase toda a cor quando viaja ao passado em um flashback, é um ponto mais do que positivo do diretor da série. As belas cenas em P&B explicam até pouco da história de alguns personagens, mas dão o contexto necessário para entendermos bem quem são aquelas pessoas. E consolidando ainda mais a fotografia temos que destacar não só a trilha sonora como a escolha das locações no Novo México, um embasbacante cenário às vezes de deserto e mesas rochosas esculpidas pela erosão, outras vezes de pradarias e montanhas nevadas, que não é só um simples cenário mas um complemento indispensável do que está sendo contado. Com personagens bem construídos e carismáticos, uma trama bem amarrada e um visual de tirar o fôlego, Godless é uma série que atualiza o faroeste sem mexer nos elementos indissolúveis do bangue-bangue e caminha para se tornar um clássico do gênero!
SESSÃO GAME OVER
Seja um cowboy Todo mundo sabe que o faroeste é um fenômeno marcante, do cinema aos quadrinhos e a maioria dos amantes do gênero já quis ser um cowboy, pistoleiro, ranger ou xerife de alguma cidadezinha do Velho Oeste. Existem algumas formas para satisfazer o desejo de encarnarmos nossos personagens preferidos, uma delas é o cosplay, mas não é possível sair atirando nos vilões como seu herói... Outra alternativa para solucionar essa desejo politicamente incorreto são os videogames, e para ajudar mostramos quatro exemplos de jogos que todo fã de faroeste deveria conhecer. Lembrando que a ordem em que foram listados é aleatória e não representa melhor ou pior jogo. Então, prepare suas esporas, pendure a corda na cintura e não esqueça do revólver, porque vamos partir para o mundo do ‘bangue-bangue’.
Red Dead Redemption A história do ex-integrante de uma gangue de bandidos do Velho Oeste, John Marston, é contada em formato mundo aberto e com combates à base de tiro em terceira pessoa. Sua habilidade específica é chamada “Dead-Eye” e se caracteriza por uma redução na velocidade do tempo, o que permite que Marston acerte os alvos com precisão, inclusive em múlti-
plos inimigos. A trama de Red Dead Redemption conta que o governo sequestra a esposa e filho do pistoleiro, a fim de suborná-lo para aceitar a missão de caçar seus antigos companheiros de crime e entregá-los à polícia. Sua trajetória para cumprir com esse trabalho forçado é longa, mas em momento algum traz a sensação de tédio, revelando inclusive momentos muito comoventes. Disponível para PlayStation 3, Xbox One (através da retrocompatibilidade) e Xbox 360. E está chegando sua aguardada continuação...
Call of Juarez Mudando um pouco o ângulo em que enxergamos o Velho Oeste, a série Call Of Juarez mostra o deserto das fronteiras com o México na perspectiva FPS. As mecânicas são bem simplistas, o que é ótimo para quem não gosta de perder tempo com jogos difíceis de dominar. É possível controlar dois protagonistas: Billy “Candle” ou Reverendo Ray McCall, sendo o primeiro focado em combates stealth e o segundo um atirador que encara o inimigo de frente. O restante das ações vão envolver tudo que é esperado no gênero: assaltos, passeios à cavalo, índios e duelos de pistoleiros. Outros títulos Call Of Juarez foram lançados posteriormente, no entanto, apenas Bound in Blood tem alguma relação com o enredo do jogo inicial, funcionando como uma prequel. Quem gostar da sensação de viver a cultura do faroeste no formato de tiro em primeira pessoa, vai conseguir aproveitar os jogos subsequentes como uma extensão da experiência. Mas é importante destacar que The Cartel e Gunslinger, o terceiro e quarto lançamentos da franquia, não são sequências e ainda possuem histórias totalmente diferentes. Nenhum dos títulos Call Of Juarez tem protagonistas repetidos. A série pode ser jogada em PC, Xbox 360 e Playstation 3, exceto o game de estreia, que não está disponível no console da Sony.
Sunset Riders Apesar de ter versões para Mega Drive e Super Nintendo, Sunset Riders se destacou mesmo foi dentro das plataformas Arcade, onde contava com cinemáticas melhores e gráficos mais coloridos. Com direito a multiplayer para 4 pessoas, os jogadores assumem o papel de xerifes que vasculham o Velho Oeste a fim de caçar bandidos. Além do estilo próprio de cada cowboy, basicamente é só o tipo de arma/pistola que diferencia os personagens. A jogabilidade é simples, basicamente “beat ‘em up” em formato de plataforma. Por isso, também cabe a você e os outros jogadores evitar armadilhas e não ficar no alcance dos tiros disparados por multidões de capangas. Cada fase habilita a possibilidade de entrar em casas que oferecem mais pontuação aos personagens e poderes extras, como o de usar duas armas ao mesmo tempo. Ao fim de cada fase, um chefão é enfrentado e representa, justamente, o objetivo principal de Sunset Riders: a captura de um criminoso cuja cabeça vale muitas peças de ouro.
Desperados: Wanted Dead Or Alive Ao contrário dos jogos em que sair atirando em tudo que se vê pela frente é a principal ação, Desperados: Wanted Dead Or Alive requer que os jogadores pensem bem antes de disparar a primeira bala. Aqui, a característica fundamental é cumprir as missões definidas para o protagonista principal, o caçador de recompensas John Cooper. Com isso, é fundamental levar em consideração todo o cenário ao redor, o que cada ação sua poderá acarretar e, com isso, planejar a melhor estratégia para cumprir as etapsa que levarão a desvendar o objetivo central do game: quem é a gangue que vem atacando as linhas férreas para assaltar trens recheados de ouro. Ao longo da história, você poderá controlar um total de 6 personagens, cada um com habilidades particulares, que de acordo com suas capacidade de pensar em combinações, podem ficar cada vez mais úteis para solucionar os desafios apresentados ao longo do jogo. O gráfico apresenta perspectiva isométrica e com visual até que bem bonito para época em que foi lançado, em 2001. Está disponível unicamente para PC e, até os dias de hoje, pode ser adquirido através da Steam.
R E V I S T A
F U M E T T I .
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REVIEW - DAMPYR
Dampyr #4 - Editora 85
Depois de um longo hiato (13 anos de sua última publicação), Harlan Draka retorna em edição caprichada pela Editora 85
Em formato italiano (16 x 21 cm), papel offset, 384 páginas, capa cartonada por R$ 39,90), com histórias escritas por Mauro Boselli e desenhadas por Stefano Andreucci, Stefano Casini e Maurizio Dotti marca a volta do herói, depois de um longo hiato (13 anos de sua última publicação). A última vez havia sido pela Mythos Editora entre 2004 e 2005 (foram 12 edições). Dampyr é uma série que mistura horror, suspense e aventura policial. A trama explora o mundo dos Mestres da Noite, superpredadores que se alimentam de seres humanos. Porém, o nascimento de Harlan Draka, filho de uma humana com uma dessas criaturas, gera o único inimigo natural de tais ameaças: um Dampyr. A edição foi viabilizada numa campanha de financiamento coletivo pelo Catarse, e agora está à venda, também, pela Amazon Brasil - Só clicar nesse link (ou copiar e colar no seu navegador): https://goo.gl/q76dgz Cabe um esclarecimento sobre a série, ela começa no número 4 porque a Editora 85 pretende relançar as edições que já foram publicadas pela Mythos em outros 3 volumes compilando, assim, as 12 edições que já saíram no Brasil. Logo depois dar seguimento com outros volumes, trazendo novas e inéditas aventuras. Vale ressaltar que mesmo quem não conhece o personagem pode adquirir a revista e ler as histórias sem nenhum problema. A edição é muito bem produzida, conta com um texto de Júlio Schneider, tradutor e grande articulista do universo Bonelli no Brasil. O papel escolhido é o offset, mas em nada diminuiria o trabalho se o papel fosse o pisa-brite caso isso pudesse favorecer um preço menor, a impressão é de ótima qualidade e a ausência de uma capa dura para engrandecer o produto é o único ponto negativo, mas que novamente, não diminui em nada o trabalho realizado.
É uma atitude de muita coragem uma editora que não possui o tamanho das tradicionais fazer uma aposta como essa e para nós leitores é importante prestigiar e comprar, garantindo que mais e mais atitudes como essa sejam realizadas. É impressionante como o preço é acessível, são quase 400 páginas de histórias de alto nível por R$ 39,90. Tem muita edição com tiragem 5 ou 6 vezes maiores, com menos quantidade de páginas, com qualidade inferior (tanto na seleção de histórias quanto na parte impressa) e com preços bem superiores. Se você não conhece o personagem é uma chance de ouro e se já conhece e curte os heróis Bonelli, não pode deixar de ter e principalmente de prestigiar a atitude da Editora 85! Vida longa a Dampyr!