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Ele era um grande contraste, tímido e fechado em si mesmo, era um homem de meia idade que não gargalhava, econômico no sorriso, limitado nos abraços, econômico nos cumprimentos sempre a esboçar um ar de expectativa. A pesar do sorriso contido, eu sentia que ele trazia no peito a necessidade de expandir uma alegria que não conseguia transformar em gestos e palavras
As crianças não se acercavam dele, quiçá por seu semblante fechado, ou por aquelas roupas estranhas e fora de moda com que ele cobria o corpo. Retornava todos os dias às dezesseis horas e impreterivelmente saia pela manhã as seis, sempre com um cachecol envolto no pescoço quase a cobrir-lhe o queixo, fizesse frio ou calor. Ninguém sabia sua profissão de onde vinha, nem para onde ia. Não tinha família, alguns raros amigos e nenhum amor. Vivia só.
A vizinhança o tinha como “aquele esquisito do terceiro andar”.
Mas essa figura estoica era um folião inveterado que se preparava com antecedência para a grande folia de Momo. Já no mês de outubro/novembro começava a armazenar tecidos, fitas, plumas, lantejoulas, e pacotes de serpentinas, confetes e caixas de lança perfume.
Da minha janela eu avistava seu apartamento e o via abrindo tais pacotes, ficando horas pensativo admirando todos aqueles produtos como que imaginando o que faria com eles. Também nos finais de semana ele ficava debruçado numa antiga máquina de costura a lidar com os tecidos coloridos, alguns com muito brilho numa concentração que o impedia de constatar a minha intromissão.
Talvez não fosse correta essa
minha invasão na casa alheia, mas era impossível resistir pois sua janela nunca se fechava e aquela figura sempre ensimesmada, me encafifava.
Sobre a pequena mesa de madeira ele selecionava algumas plumas, também coloridas, e recortava delicados losangos e os colocava na primeira prateleira da estante que mantinha ao lado de um espelho, onde refletia uma antiga eletrola e uma pilha de discos.
E nesse afã ele edificava sua fantasia e eu, da minha janela imaginava que ele deveria estar sonhando com o tríduo da alegria, e tentava adivinhar quais seriam as musicas que ele estava ouvindo, numa associação com a tarefa que ele executava.
Com certeza na hora em que desamarrava o barbante e abria os embrulhos de toda parafernália carnavalesca adquirida, ele deveria cantarolar “Ô abre alas que eu quero passar....”, porque esse primeiro acorde da lendária marchinha de Chiquinha Gonzaga, é um pede passagem à folia e deve tê-lo feito sentir a fragrância da lança perfume do carnaval de outrora.
Num jogo de cara e coroa eu tentava adivinhar qual seria sua fantasia. Um lindo pirata? Um cigano? Um pássaro estilizado? Não sei. Mas no dia seguinte, enquanto ele fixava os losangos coloridos na já concluída blusa de mangas bufantes, sua expressão era de êxtase e eu pude observar que seu rosto se iluminava a cada peça fixada. Ah... com certeza nesse momento ele assobiava “Um pierrô apaixonado que vivia só cantando...” e ia planejando como remeter as serpentinas para laçar sua colombina e se enredar em seus braços, numa aproximação permissiva que as partes desejam e o carnaval facilita.
O tempo foi passando e o “esquisito do terceiro andar” terminou sua linda fantasia e a colocou num cabide pendurado no lustre. Que lugar mais estranho de pendurar uma roupa, enfim... acredito que era para melhor visualizá-la, imaginando o momento de vesti-la e realizar seu sonho de alegria. Com certeza era isso mesmo que ele pensava porque a observava de todos os ângulos sempre em círculos,
balançando a cabeça afirmativamente, como que inspecionando sua perfeição. O artista admirava sua obra!
A ansiedade me dominava. Mal podia esperar o sábado de carnaval para vê-lo envergar seu lindo pierrô e quiçá ver em seu rosto um largo sorriso, quando finalmente, ele pudesse se admirar no espelho fixado ao lado da estante. Da minha janela eu, eufórica, o aplaudiria efusivamente e passaria imediatamente para a outra janela que me dá visão da rua, por onde ele seguiria a passos largos cantarolando “mamãe eu quero... mamãe eu quero... mamãe eu quero mamar”.
Acordei no sábado de carnaval e corri para a janela. Lá estava a fantasia pendurada no lustre, mas não avistei meu vizinho. O dia custou a passar e eu aguardei o anoitecer para que a luz do terceiro andar se ascendesse e assim eu pudesse acompanhar a metamorfose do “esquisito do terceiro andar” num lindo pierrô apaixonado.
Eu queria ver a transformação daquele homem tímido e fechado, econômico no sorriso e que não gargalhava, num homem feliz, aberto à tudo o que vida poderia lhe proporcionar de alegria e aventura naquela noite de carnaval.
Esperei... esperei..., mas o terceiro andar permaneceu as escuras por toda a noite. No dia seguinte, a janela emoldurava a mesma sala, a mesma fantasia pendurada no mesmo lustre, e assim foi até a manhã da quartafeira de cinzas, quando a janela do terceiro andar finalmente amanheceu aberta. Da outra minha janela, aquela que me dá visão para a rua, vinha um grande burburinho de vozes e uma sirene tocava alto ininterruptamente; corri para lá e além da garoa fina que cobria aquela manhã avistei um esquife que era introduzida num carro funerário.
qUal a dIfeRença entRe “GUaRda COMPaRtIlhada e GUaRda alteRnada???”
dRa. GISele lUCCaS
A guarda pode ser entendida como a responsabilização dos pais pelos filhos, de forma que aqueles têm o direito de manter os menores em sua companhia, para que cumpram o dever de proteger e cuidar da prole.
No momento em que um casal decide fixar a guarda dos filhos, muitas dúvidas paíram a respeito do que seja Guarda Compartilha e Alternada. Passamos à análise com o intuito deobservarmos algumas diferenças importantes entre as referidas modalidades.
A GUARDA ALTERNADA caracteriza-se pela distribuição de tempo em que a guarda deve ficar com um e com outro genitor. O filho fica, por exemplo, uma semana residindo com a genitora e outra semana com o genitor. Durante os períodos determinados, ocorre a transferência total da responsabilidade em relação à prole. Tomando por base o exemplo citado acima,
tem-se que a mãe seria a guardiã e responsável durante uma semana e o pai seria o guardião e responsável na semana seguinte.
Para alguns doutrinadores, a guarda alternada não é a mais recomendada, tendo em vista que a criança pode perder o referencial de família, em razão das diversas mudanças em seu cotidiano e da necessária estabilidade para seu completo desenvolvimento. Entendem, ainda, que quando os filhos têm pouca idade, isso gera uma dificuldade de adaptação, e, quando atingem uma idade na qual se possui maior capacidade de discernimento, os filhos jovens acabam aproveitando as trocas de residência para fugir de possíveis situações de conflito, quando não conseguem que o pai (ou a mãe) faça aquilo que desejam.
Na GUARDA COMPARTILHADA, por sua vez, o que se compartilha são as responsabilidades relativas ao filho, independentemente de quanto tempo aquele passa na casa de cada um dos genitores. Assim, o que se busca é a maior participação dos pais na rotina das crianças e adolescentes, não havendo necessidade, contudo, de se dividir o tempo da criança ou do adolescente em mais de uma residência.
O objetivo deste modelo é que os pais obtenham o exercício comum da guarda, sendo perfeitamente possível que a criança possua uma residência fixa, enquanto na guarda alternada ela faz um revezamento entre as residências dos pais.
A residência única mantém o referencial de lar existente antes da ruptura dos pais, e é isso que se procura manter na guarda compartilhada, já que o que se busca é o menor número possível de mudanças na rotina da prole. O que ocorre é que o filho deve passar um período de tempo com cada um dos genitores, sem que isso seja previamente fixado e, mesmo assim, a residência de referência continua sendo uma só.
É claro que em vários momentos será essencial o
diálogo entre os genitores, para decidir questões referentes à prole, já que ambos estarão exercendo a guarda em igualdade.
Contudo, assuntos difíceis referentes aos filhos não podem ser resolvidos com a imposição de comportamentos, sendo apenas razoável a interferência do Poder Judiciário até que os pais entrem em consenso, o que deve ser buscado o mais rápido possível.
Cabe acrescentar, ainda, que a Lei 11.698/2008, em seu artigo 1º, parágrafo 5º possibilita o deferimento judicial da guarda para terceira pessoa quando o juiz verificar que o filho não deve permanecer com o pai ou com a mãe. Nesse caso, o juiz atribuirá a guarda preferencialmente, à pessoa que tiver grau de parentesco, relações de afinidade e afetividade com a criança ou adolescente, muito comum nos casos de Alienação Parental.
Entre “qualquer modalidade de fixação de guarda”, vise sempre... dar AMOR!!!
dRa. GISele lUCCaS
É Advogada, Especialista em Direito Médico, Pós Graduada em Perícia Criminal e Ciências Forenses, Capacitação em Psicopatologia Forense, Mediadora Judicial e Privada cadastrada no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Palestrante, Colunista, Mestranda em Psicologia Criminal / Especialização Psicologia Forense (Universidad Europeia Del Atlântico - Espanha).