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BARRAS


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O geógrafo Assis Carvalho lembra que o pai envolvia toda a família na busca de melhorar a genética do caju e foi dele a ideia de padronizar tampas e garrafas
CAJUÍNA COM GOSTO DE HISTÓRIA E TRADIÇÃO No nordeste do Brasil há uma máxima que diz que traduz a importância do boi na cultura e economia da região: desse animal só não se aproveita do berro. Há algumas décadas, a hegemonia dos bovídeos tem sido ameaçada por uma fruta cujo consumo traz múltiplos e grandes benefícios à saúde: o caju.
A fruta é a segunda mais plantada no Brasil; a primeira é a laranja. É também responsável por eternizar o Piauí e Teresina quando a cajuína, bebida doce derivada do suco clarificado da polpa do caju, foi cantada por Caetano Veloso. Devido à importância cultural e econômica, o caju passou a ser objeto de pesquisa científica.
Há cerca de 40 anos, o barrense Francisco de Assis e a esposa Miriam Carvalho iniciaram uma série de testes para aperfeiçoar sabor, cor e cristalinidade da bebida. Nascia então a Cajuína Buritizinho feita na fazenda de mesmo nome e onde, diz a tradição, nasceu a cidade de Barras no século XVIII.
O geógrafo Assis Carvalho, filho de Francisco e Miriam, é quem toca o negócio herdado dos antepassados na atualidade. "Meus avós maternos já faziam cajuína. Naquela época ainda usavam açúcar. Minha mãe herdou o dom (de produzir a bebida) e se dedicou a fazer. Com o tempo, meu pai já pensava em formas de melhorar a produção”, lembra.
Negócio de família: Assis também guarda na memória que o pai envolvia a família toda no processo de melhorar a genética do caju. “Ele juntou os cinco filhos e fomos plantar pés de caju selecionados. Foi ele quem buscou garrafas e tampas padronizadas... As janelas no local de produção eram tampadas para evitar a entrada de abelhas e insetos e os funcionários usavam uniformes... Tudo dele era muito bem pensado", rememora o filho.
O resultado de tanto empenho resultou na fama da cajuína produzida nas terras do Coronel Miguel Carvalho de Aguiar, ancestral de Assis Carvalho. A excelência da bebida atraiu pesquisadores da Universidade Federal do Piauí e técnicos do Sebrae-PI, além de prefeitos de cidades vizinhas, curiosos e animados com o processo de melhoramento da bebida fina, doce e feita de caju. "Viramos o alvo de todos que queriam melhorar sua produção. Meu pai tinha gosto em receber esse povo todo. Dava consultorias, mostrava as instalações, oferecia brindes. Era um empreendedor nato. Fez aqui que nem no Rio Grande do Sul: as pessoas vinham, degustavam, conheciam à fábrica e compravam nossos produtos. Naquela época fazíamos também cachaça, vinho de jamelão, queijos e doces", conta orgulhoso.
Glória e ocaso: Na fase áurea da fazenda, Francisco de Assis e família empregavam cerca de 50 funcionários. Todos tiravam da fábrica o sustento de suas famílias. Segundo o herdeiro da marca, a bebida produzida por sua família foi escolhida duas vezes a melhor cajuína do Piauí, tendo até sido elogiada pelo ex-presidente Lula e o ator Paulo Autran em outra ocasião.
A trajetória de expansão da Fazenda Buritizinho sofreu uma ruptura em 2009 quando o patriarca da família Carvalho já morava em Teresina. "Um incêndio devastou tudo. Logo em seguida aconteceu o falecimento do meu pai. Desde então, devido às dificuldades burocráticas, impostos e falta de incentivo, resolvemos fechar a fábrica e atender apenas a uma seleta quantidade de clientes fiéis. Hoje produzo artesanalmente e em bem menor escala, mas faço questão de manter o padrão de qualidade desenvolvido por meus pais, já que minha mãe sempre foi muito presente e muito importante para chegar no nível que chegamos”, reflete Assis Carvalho numa fala embargada de nostalgia e tristeza.
Pelo fato de podermos trilhar a história da Cajuína Buritizinho até sua origem e a originalidade na especialização de sua produção sublinha a marca na lista de fabricantes da bebida que é patrimônio cultural brasileiro.