Babélia 33

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FOTO DE TIAGO WEBER

NOVOS HÁBITOS PARA SE PROTEGER DO VÍRUS Medidas para reduzir circulação de pessoas e intensificar higienização de superfícies alteram rotina de quem trabalha em supermercados Página 12

PUBLICAÇÃO EXPERIMENTAL DO CURSO DE JORNALISMO UNISINOS SÃO LEOPOLDO/RS JULHO DE 2020 EDIÇÃO 33

FOTO DE DIVULGAÇÃO / ONG IGUALDADE

SAFRA DE VELHO ABRIGO GRÃOS SOFRE AGUARDA POR QUEDA EM 2020 SOCORRO

SENADO ADIA ELEIÇÕES MUNICIPAIS

OS DESAFIOS ADICIONAIS PARA ESTUDAR

Pouca chuva no verão prejudicou a produtividade em Santo Antônio da Patrulha, gerando prejuízo superior a 50 milhões de reais

Casa do Imigrante, construída em 1788, recebeu os primeiros colonos alemães em 1824, está fechada há seis anos e sofreu desabamento em 2019

Representantes políticos concordam com adiamento do pleito e consideram que o atual momento exige foco no combate à pandemia

Internet precária agrava necessidade de acesso em tempo de aulas remotas. Falta de transporte escolar e estradas irregulares pioram a situação

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Opinião

ALERTA PARA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA Isolamento pode intensificar agressões que afetam milhares de mulheres Página 33

ONG ENTREGA ALIMENTOS A PESSOAS TRANS NO VILA FLORES Ação no bairro Floresta, em Porto Alegre, atende comunidade LGBTQIA+, que além da pandemia, enfrenta preconceito Página 28


São Leopoldo (RS), xxxx de 2020

IMAGEM

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O isolamento social trouxe consigo a necessidade de adaptação e ressignificação dos espaços nos quais ficamos confinados. Por isso, fotografar dentro de

Por Kévin Sganzerla

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iante da pandemia do novo coronavírus, que fez sobressair o sentimento de angústia e medo, algo mais assustador veio à tona. A polarização presente na política, a histeria das redes sociais e a invasão das “Fake News” foram alguns dos motivos que tornaram enfraquecida a mediação com legitimação e confiabilidade por parte do jornalismo. Mas, neste momento, a preocupação global com a saúde evocou a importância de um jornalismo sério, profissional e que faz o seu dever de forma legítima para atender ao interesse público. O cenário atual demonstrou que as opiniões e os sentimentos são facilmente exaltados e se sobressaem em relação à realidade objetiva. Desta forma, brechas são abertas para invalidar a qualidade e a verdade das informações propagadas pelos meios de comunicação. Desta forma, ao atingir em contramão a opinião do leitor ou ou-

JORNAL PRODUZIDO SEMESTRALMENTE PELOS ALUNOS DO CURSO DE JORNALISMO DA UNISINOS - CAMPUS SÃO LEOPOLDO.

EDITORIAL

casa exigiu da aluna do curso de Fotografia Jéssica Brandelero um olhar com mais atenção para o lugar onde vive e para o que ele representa no contexto da pandemia. Essa série de fotos, um projeto pessoal, foi a expressão desses olhares e sentimentos: ver o copo meio cheio frente à sensação de estar fisicamente limitada.

O COMBATE À PANDEMIA DE DESINFORMAÇÃO

vinte, que prefere não se importar sobre o fato, mas sim opta por exclusivamente acreditar no que pensa sobre o determinado ocorrido, a liberdade de expressão e, ainda mais, o trabalho do profissional de jornalismo são comprometidos, chegando ao ponto de repórteres sofrerem riscos de ataques nas ruas, por exemplo. No entanto, por se tratar de um tema tão delicado, e que envolve a sobrevivência da população, o jornalismo profissional é exaltado como um meio sob o qual se pode confiar e se apoiar. A verdade é cada vez mais debatida nas redes

sociais, mas comprovada pelos meios de comunicação com informações minuciosas e de extrema relevância. A união de periódicos, ao utilizar uma mesma capa “Juntos vamos derrotar o vírus. Unidos pela informação e pela responsabilidade”, comprova o desejo único de tornar a população poderosa no combate à pandemia. A propagação da desinformação, que só um jornalismo sério poderá deter, revela-se tão nefasta quanto a de um vírus. Combatê-la, através das garantias constitucionais, institucionais e democráticas, transformou-se em prioridade.

TEXTOS E IMAGENS: alunos das disciplinas de Jornalismo Impresso e Notícia, Jornalismo Impresso e Reportagem, Jornalismo Impresso e Opinião e Redação para Relações Públicas II, sob orientação dos professores Luiz Antônio Nikão Duarte, Micael Vier Behs, Ronaldo Henn e Taís Seibt. COLABORAÇÃO: professora Marina Chiapinotto (Imagem/Página 2). PROJETO GRÁFICO: alunos da disciplina de Planejamento Gráfico (turma 2019/2) Ângelo Gabriel da Silva Santos e Mariana Carvalho Necchi, sob orientação do professor Everton Cardoso. DIAGRAMAÇÃO: Marcelo Garcia (Agência Experimental de Comunicação - Agexcom). IMPRESSÃO: Gráfica UMA.

A verdade está nas mãos dos meios de comunicação. Saber utilizá-la e mediá-la com qualidade torna a população mais propensa a enfrentar o mar de “Fake News” e aqueles que atentam contra a democracia, e observar a realidade como ela é. Desta forma, com a realidade diante dos olhos de todos, o desejo de combater o vírus se torna mais forte que qualquer outra disputa que, de fato, não convém no momento. Infelizmente, não é o que acontece, uma vez que a liberdade de imprensa e a própria democracia são muitas vezes ameaçadas. Portanto, atualmente, não é só a saúde dos cidadãos que está em jogo, na luta pela sobrevivência diante da pandemia. A liberdade de expressão também está sendo atingida, e esse fato não deve ser ignorado. No fim, todos os esforços do jornalismo vão ao encontro de seu próprio dever: atender ao interesse público e, sobretudo, defender a democracia. Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Campus São Leopoldo/RS. Reitor: Marcelo Aquino. Vice-reitor: Pedro Gilberto Gomes. Pró-Reitor Acadêmico e de Relações Internacionais: Alsones Balestrin. Pró-reitor de Administração: Luiz Felipe Jostmeier Vallandro. Diretor de Graduação: Sérgio Eduardo Mariucci. Gerente dos Cursos de Graduação: Paula Campagnolo. Coordenador do curso de Jornalismo: Micael Vier Behs.


Especial COVID-19

Comércio

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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MENOS MOVIMENTO E MAIS VENDA “FIADO”

No bairro Rio do Sinos, em São Leopoldo, pequenos empresários mantêm portas abertas, mesmo com menos gente nas ruas FOTO DE GOOGLE MAPS

Por Aline Grubert

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entro dos bairros e longe dos grandes centros, pequenos negócios lutam para sobreviver à crise que se estabeleceu com a pandemia da Covid-19. Com menos pessoas nas ruas, há menos clientes nos estabelecimentos. Enquanto uma solução não aparece, comerciantes tentam se adaptar às regras para continuar com seus negócios abertos. No bairro Rio dos Sinos, não foi diferente. Nos primeiros dias de distanciamento social, a prefeitura de São Leopoldo decretou regras rígidas para o funcionamento, o que trouxe tensão para os pequenos empresários. De acordo com dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), são cerca de 24 mil pequenos negócios na cidade. A loja de Leonila Rodrigues da Silva, 47 anos, permaneceu fechada durante 15 dias entre final do mês de março e início de abril. Cumprindo assim o primeiro decreto sobre a pandemia, assinado pelo prefeito leopoldense, Ary Vanazzi. Após essa quinzena, Leonila decidiu reabrir sua loja, mesmo com o prazo de isolamento sendo estendido, pois, segundo ela, as contas não pararam de chegar durante esse período. Atualmente, ocorreram mudanças e novas regras para a reabertura dos estabelecimentos comerciais, como o da pequena empresária. Na loja de Leonilda, logo na entrada, já se vê um cartaz avisando para o uso de máscaras de proteção e o máximo de dois clientes por vez dentro do local, a fim de evitar aglomerações. Apesar dos cuidados, ela diz não se sentir segura. “Sinto medo porque trabalho com atendimento a clientes e a gente não sabe da onde eles vêm”, conta. Até agora, Nila, como gosta de ser chamada, está levando bem a sua situação financeira, contudo, o movimento de sua loja diminuiu nesse período. Ela acha que as pessoas ainda sentem medo de sair para as ruas, mas aponta o fato de não precisar pagar aluguel e trabalhar sozinha como fator positivo para manter a estabilidade. “Eu consegui pagar tudo, mas ainda bem que não pago aluguel porque tem muita gente que não vai aguentar”, avalia. Outro pequeno negócio do bairro é a oficina de bicicletas de Luis Fernando Gonsalves, 58 anos. Com conserto e vendas de peças, ele tra-

ESTABELECIMENTOS FORA DAS ÁREAS CENTRAIS LUTAM PARA MANTER AS CONTAS EM DIA EM MEIO À PANDEMIA

balha sozinho e está conseguindo passar essa fase levando cada dia com os cuidados necessários. Luís não chegou a fechar seu estabelecimento por nenhum dia, já que oficinas não estavam inclusas no decreto como parte das lojas que deveriam fechar. De acordo com o governo federal, bicicletas são consideradas como o único meio de transporte de muitos brasileiros. Em São Leopoldo, não é diferente, como conta Michel Rodri-

Os que eu conheço faz tempo deixo pendurar a conta. Se podemos, temos que ajudar o pessoal Luís Fernando Gonsalves Comerciante

gues, 40 anos, cliente da oficina: “A empresa onde trabalho está parada, então uso minha bicicleta para ir atrás de uns bicos pela cidade, não posso ficar sem ela”. Na oficina, o mecânico usa máscara e álcool gel para atender os clientes, mas não exige de todos o mesmo. Ele alega que nem todos levam a sério e não pode se dar ao luxo de perder fregueses, mas não sente medo da doença, pois confia em Deus. Embora não tenha sentido queda no movimento, Luís diz que aumentaram os serviços “fiados” nesse período. “Os que eu conheço faz tempo deixo pendurar a conta, confio e acho que, se podemos, temos que ajudar o pessoal”, diz.

FISCALIZAÇÃO

Para manter as medidas de distanciamento social, a prefeitura de São Leopoldo tem equipes pela cidade fazendo fiscalizações para verificar se as regras de prevenção estão sendo cumpridas nos estabelecimentos. Em caso de recusa do cumprimento das determinações, fica autorizado,

segundo a norma, “adotar todas as medidas legais cabíveis”, como interdição parcial ou total dos estabelecimentos, multa ou pena educativa. No bairro Rio dos Sinos, o mecânico Luís diz não ter visto a fiscalização, só em grandes mercados. Leonila também não recebeu fiscais em sua loja, mas ficou sabendo da visita em alguns comércios por perto que foram multados por descumprirem as regras. Para o cliente Michel, as medidas são importantes para a segurança de todos e diz apoiar as decisões tomadas pelo prefeito. O bairro tinha somente cinco casos confirmados de coronavírus, de um total de 280 casos na cidade, até o fechamento da reportagem. Os pequenos empresários têm visões diferentes do futuro próximo. Luís acha que ainda temos um longo caminho: “Vai longe, até o fim do ano, não encerra, se o pessoal não se cuidar, ainda vai longe”. Enquanto Leonila tem fé em tudo passar logo: “Eu tenho muita esperança, tomara que melhore antes do inverno e nossa vida volte ao normal”.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Adaptação

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PEQUENOS NEGÓCIOS SE REINVENTAM NA INTERNET

Microempresários do Vale do Sinos enfrentaram quedas bruscas no faturamento e precisaram investir no digital para continuar no mercado

Por Rodrigo Brum Westphalen

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uando ouviu falar do coronavírus pela primeira vez, em dezembro do ano passado, Guilherme Dal Moro nem imaginava que três meses depois o faturamento da cooperativa de agricultura familiar que ele gerencia em Novo Hamburgo cairia para zero. A Cooperlomba, sediada no bairro Lomba Grande, atendia mais de 90 escolas da região e tinha vendas garantidas para o ano inteiro. “A gente nem imaginava que o coronavírus, lá de tão longe, ia chegar aqui e impactar tanto nossa rotina”, conta. No dia 16 de março de 2020, a prefeita, Fátima Daudt, anunciou a suspensão das aulas da rede municipal de ensino. A medida, que interrompeu o faturamento da cooperativa, veio em meio a uma série de decretos voltados a antecipar ações de controle da disseminação do novo coronavírus, que causara a primeira morte brasileira no dia anterior. Com estratégias diferentes de enfrentamento do vírus, os países que adotaram medidas rígidas de isolamento social, como China, Alemanha, Austrália e Nova Zelândia, conseguiram “achatar a curva” de contaminação em poucos dias. A reabertura parcial do comércio e da indústria foi, portanto, um movimento natural. A Austrália, por exemplo, teve o pico de novos casos em 28 de março, conforme o governo australiano. Um mês depois, o número já tinha caído para sete. Por outro lado, países como Brasil e Estados Unidos decidiram por medidas menos rígidas e mais tardias. Em maio, os EUA ocuparam o primeiro lugar mundial em número de casos, enquanto o Brasil estava em terceiro lugar, conforme dados do Instituto John Hopkins. Mesmo assim, diversos municípios brasileiros já começavam a retomada parcial das atividades comerciais. Novo Hamburgo, por exemplo, autorizara a reabertura dos comércios - mas não a retomada das aulas. O trabalho da cooperativa, portanto, não teria previsão de retorno e o faturamento continuaria no zero, se não fosse por uma coisa. Considerada como uma ação “quebra-galho”, a Cooperlomba anunciou cestas de alimentos nas redes sociais, compartilhando a história por trás da medida de emergência de vender e entregar direto para o consumidor final. “Como a gente trabalha com produtos perecíveis, assim que paralisou as escolas, a gente corria o

risco de perder a produção de todos os nossos associados. A solução foi trabalhar com o delivery”, diz Guilherme. Naquele sábado, realizaram entregas de três “kits”. Mas uma situação inesperada ocorreu. Na segunda-feira, descobriram que o anúncio havia “viralizado” nas redes sociais e no WhatsApp. A cooperativa recebeu naquela semana mais de 5 mil pedidos. “A gente não deu conta de atender a todo mundo”, lembra.

CASO DE EXCEÇÃO

Apesar do caso de sucesso, as estatísticas mostram que essa é a exceção. Segundo pesquisa do Sebrae, 58,9% das micro e pequenas empresas brasileiras interromperam o funcionamento temporariamente e 3,5% decidiram fechar de vez em março de 2020. Ainda, 87,5% apontaram queda no faturamento, contra apenas 2,4% de empresas com aumento. Em contraste aos comércios físicos, o e-commerce brasileiro teve aumento de 81% no faturamento em abril com relação ao mesmo período do ano passado, segundo pesquisa da Compre&Confie. Com valor bruto de R$ 9,4 bilhões, o total

de pedidos realizados no mês foi de 24,5 milhões, uma alta de 98%. Ainda assim, a alta das vendas online está concentrada em produtos de limpeza, higiene e alimentação. Aline Fenker, 32 anos, é proprietária da marca Nastra Shoes, de Novo Hamburgo. A marca produz calçados de forma artesanal e vende por meio de e-commerce. Em março, a empresária interrompeu a produção de novos modelos e decidiu continuar apenas com pedidos sob encomenda e com a venda do estoque que já estava pronto. Segundo ela, a queda no faturamento foi em torno de 40%. Apesar disso, o site da marca começou a ter um maior número

A gente nem imaginava que o coronavírus ia impactar tanto nossa rotina Guilherme Dal Moro Gerente da Cooperlomba

de acessos em abril e Aline notou uma maior aceitação das pessoas sobre o tempo de espera de 30 dias para a produção do calçado. “Como as pessoas estão em casa, elas não têm essa pressa inicial do sapato ficar pronto”, explica.

IMERSÃO DIGITAL

The Fools é uma empresa hamburguense que realiza mais de 100 imersões em língua inglesa por ano em um sítio em Lomba Grande. Todas as imersões foram canceladas no final de março. De acordo com Leonardo Alano, cofundador, todos os clientes aceitaram remarcar as imersões. O mais difícil é não ter uma previsão de quando será a retomada. Por isso, a equipe decidiu adiantar um projeto de comunidade online que estava previsto para começar em outubro. Com três novas atividades toda semana, a comunidade de imersão online atingiu o dobro da meta esperada para o primeiro mês, com mais de 200 inscritos. “É um projeto que a gente está levando com gosto e construindo junto com esses primeiros usuários, então a gente está bem feliz com isso”, comemora Alano. FOTO DE COOPERLOMBA / DIVULGAÇÃO

ENTREGA DE CESTAS COM ALIMENTOS FOI A SOLUÇÃO PARA COOPERATIVA QUE FORNECIA MERENDA ESCOLAR


Especial COVID-19

Prejuízos

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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RESTRIÇÕES NO COMÉRCIO DO VALE DO SINOS Comerciantes tentam driblar a queda nas vendas investindo em redes sociais, mas têm dificuldade para manter funcionários empregados

FOTO DE LAURA ROLIM

Por Laura Rolim

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uando ampliou a loja em Canoas, no dia 8 de março, Andrea Valéria Rodrigues, 52 anos, não contava que teria de fechar o estabelecimento 10 dias depois da inauguração. Por conta da pandemia, o município decretou o fechamento do comércio local. Andrea é proprietária do Atacado São Léo, estabelecimento que administra junto da família. Com grande demanda em São Leopoldo, resolveram expandir os negócios para a cidade vizinha. “Chegamos em Canoas em outubro e, em março, ampliamos a loja. Compramos muita coisa contando com a venda que haveria, mas no dia 18 de março, fechou tudo. Ficamos com todos os produtos para pagar e sem nenhuma renda”, conta a empresária. Para tentar reparar a perda e pagar as despesas, o atacado resolveu apostar nas vendas online. Com as duas unidades fechadas ao mesmo tempo, as redes sociais ajudaram a diminuir o prejuízo. “Não é a mesma coisa que a loja física, mas foi a forma que encontramos de continuar vendendo”, explica Andrea. Quando o comércio reabriu, algumas medidas de restrições foram necessárias. Na unidade de Canoas, o horário permitido é somente a partir das 10h. Além disso, pessoas acima dos 60 anos e bebês não são autorizados a entrar. “Não estamos abrindo no domingo e a venda de sábado caiu em média 50%. Isso porque, antes, todo mundo entrava junto, hoje em dia sempre tem fila. Muitos não gostam de esperar e acabam indo embora”, descreve.

LOJA FECHADA

Em São Leopoldo, o prefeito Ary Vanazzi decretou, no dia 20 de março, o fechamento por tempo indeterminado do comércio. Conforme o decreto, só poderiam permanecer abertos aqueles estabelecimentos que fossem essenciais, como supermercados, farmácias, ferragens e postos de combustíveis. Por conta do decreto, que persistiu por quase um mês, uma das três unidades da loja Katy Calçados, presente há 28 anos na cidade, teve que fechar. De acordo com o gerente, Max Anderson Muller, 51 anos, os aluguéis da rua Independência, onde as unidades estão localizadas, são caríssimos, e por isso tiveram de suspender o contrato com o proprietário do imóvel. “Desmontamos uma loja e ficamos somente

COM LOJAS EM TRÊS CIDADES, KATY CALÇADOS TEVE QUEDA NAS VENDAS E DEMITIU FUNCIONÁRIOS

com as outras duas unidades, assim diminuímos um aluguel. Na esquina, onde está localizada a outra loja, vendemos a linha de sapataria junto com a linha de esporte. E a linha infantil, que tínhamos nas duas, trouxemos para essa. Unimos o útil ao agradável”, explica Muller. Além das unidades em São Leopoldo, a Katy também está presente em outros municípios do Vale do Rio dos Sinos, como Novo Hamburgo e Campo Bom. Em Novo Hamburgo, a flexibilização da abertura do comércio foi autorizada mais cedo. A prefeita da cidade, Fátima Daudt, decretou o fechamento por três semanas e, após esse prazo, permitiu a abertura de alguns estabelecimentos. Segundo

Ficamos com todos os produtos para pagar e sem nenhuma renda Andrea Valéria Rodrigues Comerciante

Muller, a loja de Novo Hamburgo não foi tão afetada por conta dessa flexibilização. “A loja normalmente tem um faturamento abaixo do que as nossas unidades em São Leopoldo, mas nesse tempo em que ficamos fechados, a de Novo Hamburgo continuou faturando, enquanto a de São Leopoldo estava completamente parada”, conta. Mas não foi só o estabelecimento que sofreu com a queda das vendas, alguns funcionários foram dispensados. “Assim que saiu o decreto proibindo a abertura, a primeira providência que tomamos foi tirar todo mundo que estava no contrato de experiência. Infelizmente, oito pessoas e um estagiário acabaram perdendo seus empregos naquela sexta-feira”, lamenta o gerente. Além dessas pessoas demitidas no início do decreto, outras nove foram desligadas no dia 6 de abril. Ao total, 18 pessoas perderam seus empregos na rede, e o restante dos funcionários receberam férias ou suspensão.

SEM EMPREGO

Um levantamento feito pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) mostra que pelo o menos 600 mil micro e pequenas empresas fecharam as portas e 9 milhões de funcionários

foram demitidos em razão da crise econômica da pandemia do novo coronavírus. Renata Schweig de Moura, 23 anos, faz parte dessa estatística. Havia dois meses que ela estava trabalhando como auxiliar administrativa no comércio de papelaria em São Leopoldo, mas o estabelecimento fechou. “Na semana que iniciou a quarentena, o comércio foi parando e as vendas também. Meu chefe não queria demitir ninguém, mas foi afunilando demais, e como eu havia sido recontratada recentemente, já esperava pela demissão”, revela. Para conseguir pagar as contas, Renata fez do que era sua renda extra, a principal fonte de recursos, e precisou voltar a morar com a mãe, Raquel Schweig, 47 anos, para diminuir as despesas. “Eu me viro com artesanato. Os dias comemorativos estão rendendo bem, além disso, é uma terapia para não enlouquecer em casa”, diz. Com a ajuda das redes sociais, ela vende itens de decoração e artigos para presentes feitos à mão. De sorriso largo e confiante em um mundo pós pandemia, Renata espera ver empatia e amor ao próximo quando tudo passar. “Quero que isso tenha um fim logo, e que a vida volte a ter seu ciclo natural”, finaliza.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Turismo

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PEQUENOS E AUTÔNOMOS SÃO MAIS AFETADOS Com eventos suspensos na Região das Hortênsias, trabalhadores que dependem do turismo enfrentam dificuldades para se manter

FOTO DE CARLOS BORGES

Por Gabriela Medina

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a cidade de Gramado, na Serra Gaúcha, região em que o ramo de turismo e eventos é muito forte, a paralisação das atividades durante a pandemia teve grande impacto na vida de diversas famílias, principalmente pequenos empresários e trabalhadores autônomos. Com sua grande estrutura para receber visitantes, Gramado conta com uma diversidade de hotéis, pousadas e os conhecidos aluguéis por temporada. São casas e apartamentos equipados e que normalmente são reservados na alta temporada, quando a cidade sedia grandes eventos. Na última edição do Natal Luz, por exemplo, a cidade recebeu um público estimado em 2,3 milhões de visitantes. Diego Enzweiler é gerente administrativo de uma moto-peças e proprietário de duas casas que aluga por temporada. Ele conta que teve um impacto de 50% na sua renda no primeiro semestre de 2020 e que, no mesmo período de 2019, a ocupação foi de 60%. “É uma diferença enorme”, resume. Enzweiler está há dois anos coordenando o aluguel das casas e não recebe reservas desde fevereiro. “A cidade se movimenta em torno do turismo, pois a maior parte da renda vem dos eventos. Acredito que possa ter um impacto de 90% sobre o faturamento”, estima.

ESPERANÇA DE RETOMADA

Ainda que as expectativas de retorno das atividades sejam positivas, não há como encobrir impactos. Empresas realizando muitas demissões ou tendo de reduzir jornadas de trabalho e, consequentemente, os salários, trabalhadores autônomos dependendo do auxílio emergencial de R$ 600 do governo federal para sobreviver e sem ter a certeza de que no próximo mês terão o sustento garantido. Juniely Camila, sócia proprietária de uma loja de roupas na cidade, conta que o estabelecimento ficou fechado durante 30 dias, a partir da publicação do decreto municipal 070, de 17 de março de 2020, que suspendeu todas as atividades não essenciais por tempo indeterminado. “Nossos clientes são 99% turistas, dependemos desses atrativos na cidade para movimentar o nosso comércio”, diz a empreendedora. “Fomos pegos de surpresa, despreparados, pois contávamos com alguns eventos para ter boas vendas”, complementa. Juliano Soares, guia de turismo au-

EM GRAMADO, RUAS VAZIAS EM PLENO FERIADO DE PÁSCOA, CENA RARA NESSA ÉPOCA DO ANO

tônomo, atua no ramo há 11 anos, e está desde 16 de março sem trabalhar. Tendo como única fonte de renda os trabalhos na área de lazer e eventos, Soares fazia em média de quatro a seis eventos por mês. Atualmente, com três filhos, Juliano conta com o auxílio emergencial do governo federal para as despesas mensais. A esposa dele trabalha em um mercado, mas devido ao nascimento recente de um dos filhos está em casa, recebendo o auxílio maternidade. Ambos seguem na esperança da breve retomada das atividades, “A expectativa é para setembro, se não tiver mais nenhuma mudança no atual cenário”, projeta.

BUSCA DE ALTERNATIVAS

Para o presidente do Convention & Visitors Bureau da Região das Hortênsias, Eduardo Zorzanello, as medidas de isolamento e distanciamento social foram imprescindíveis para o controle da situação na região. O Convention trabalha com o intuito de fomentar o turismo de eventos na cidade. “Barrar todas as atividades em um primeiro momento e autorizar a reabertura das atividades essenciais foram decisões acertadas dos governos”, avalia Zorzanello. Com boa adesão ao isolamen-

to social e sem óbitos confirmados decorrentes da Covid-19, Gramado busca alternativas junto a empresas para continuar promovendo o destino. O Convention Bureau buscou realizar o reagendamento de atrações com os promotores de eventos, ação que surtiu efeito, segundo o presidente da entidade. “Nossa comunicação leva em consideração o fato de sermos um destino consolidado para o turismo de negócios, que possui o reconhecimento do mercado pela estrutura e serviços prestados”, considera Zorzanello. O setor está trabalhando em nível estadual na criação de um protocolo para eventos. “Buscamos também interlocução com o poder público municipal

É uma diferença enorme, a maior parte da renda vem dos eventos Diego Enzweiler Proprietário de casas de aluguel por temporada

para a criação de políticas de apoio aos eventos”, conclui. Em junho, novos decretos da prefeitura de Gramado permitiram a reabertura de parques e atrações turísticas, assim como o setor hoteleiro e também de aluguel por temporada. Em todos os casos, uma série de procedimentos sanitários devem ser respeitados. Nos parques, a limitação é de 50% da lotação, a venda de ingressos por meio eletrônico deve ser priorizada para reduzir filas e deve ser sinalizado o distanciamento de 1,5m entre um usuário e outro no acesso às atrações. No setor de hospedagem, é recomendada a utilização de produtos antissépticos, como álcool em gel 70%, e cuidados com a etiqueta respiratória, como cobrir boca e nariz, utilizar máscaras e evitar qualquer contato físico com os hóspedes. Alguns estabelecimentos aproveitaram a reabertura parcial para promover ações com clientes, como o Hotel Casa da Montanha, que publicou nas suas redes sociais um vídeo apresentando, de uma forma mais descontraída, os novos procedimentos adotados para receber os hóspedes com segurança. A própria prefeitura realizou ações de conscientização em mídias sociais, como a campanha #Gramadodemáscara.


Especial COVID-19

Música

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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SEM SHOWS, PRODUTORA APOSTA EM GRAVAÇÕES

Diante de restrições a aglomerações, produtora cultural de Sapucaia do Sul encontrou no estúdio uma alternativa para não fechar as portas

Por Babiton Leão

T

endo que trabalhar com restrições, sem poder abrir o pub ao público nem o estúdio para ensaios, a produtora Trilha Hub Cultural, de Sapucaia do Sul, tenta manter as portas abertas com a única renda que ainda entra no caixa: gravações promocionais. O estabelecimento ilustra a realidade do setor cultural em meio à pandemia, que vem encontrando inúmeras dificuldades para sobreviver, já que suas principais atividades pressupõem algum tipo de aglomeração. Para manter o negócio aberto, o dono da empresa, Rodrigo Rysdyk, teve a ideia de gravar uma coletânea com bandas autorais da região. Cada banda grava uma música com o preço promocional de 70% de desconto. O estúdio é reservado para um integrante por dia, tendo a sala de gravação higienizada após o uso. As coletâneas serão lançadas com 10 músicas cada. E é assim, com uso restrito do espaço e quase nenhuma margem de lucro, que ele mantém o negócio ativo. Antes da pandemia, a produtora gravava, em média, duas bandas por mês. Com o preço promocional para gravações, o número de bandas aumentou para 14 somente no mês de abril. Outro ponto positivo foi que alguns dos músicos que adquiriram o serviço já fizeram pacotes para produzirem um trabalho inteiro com a produtora Trilha. Com isso, Rysdyk e seu sócio Ricardo Varela estão conseguindo pagar as contas e manter o estabelecimento aberto. Depois da coletânea pronta, a ideia é fazer uma festa de lançamento com shows das bandas participantes do projeto. O acontecimento, no entanto, dependerá do cenário local perante o coronavírus.

além da sala de estúdio para ensaios de bandas e da produtora musical. Com o decreto da prefeitura de Sapucaia dos Sul, no dia 11 de abril, segundo o qual os estabelecimentos deveriam ficar fechados, o pub permaneceu ocluso, sem nenhuma fonte de renda. Após um período de 30 dias, alguns estabelecimentos tiveram a liberação para voltar a funcionar de forma moderada, seguindo os protocolos de saúde. Um mês sem poder abrir as portas causou um grande rombo no orçamento do

O Trilha Cultural sustentava três famílias Rodrigo Rysdyk Sócio do estúdio

negócio. A sala de estúdio mantinha uma média de três ensaios diários de segunda a sexta e seis ensaios diários entre sábado e domingo, faturamento que foi a zero, pois as salas não estão com uso permitido. Cada banda ou músico que alugava a sala de ensaio tinha ao lado a copa do pub, outra fonte de renda que deixou de trazer fluxo ao caixa do Trilha.

ARTE É FUNDAMENTAL

“Para manter um estúdio, é preciso utilizar o espaço de várias formas e tentar ganhar lucro de todas as maneiras possíveis, pois a manutenção é cara”, explica Rysdyk. É necessário ter uma boa aparelhagem de som para ensaios e outra para gravações, funcionários, aluguel, manutenção de equipamentos e um espaço bem distribuído. Mesmo que não fosse uma pandemia, que é uma situação atípica, o Trilha não tem condições de ter uma reserva para uma possível emergência, segundo o empresário.

“O Trilha sustentava três famílias, o Pedro Henrique, que tem um food truck, chamado Rock Food, que tinha como seu principal ponto de vendas o pub . O Ricardo Varela, meu sócio, e eu”, expressa Rodrigo. Hoje, o Trilha tenta sobreviver com as gravações, assim como Pedro, que está vendendo por delivery, mas o lucro não está nem perto do que era. Apesar das dificuldades, ele se mostra esperançoso e confiante, mas diz manter os pés no chão. “Será um período de muita luta, muita turbulência e acredito que a arte será muito importante neste momento que virá”, relata, demonstrando preocupação sobre como a sociedade pode sair desse mundo em transformação. Outro fato que o deixa muito confiante para o futuro é o cenário cultural atual, em que músicos vêm se tornando válvulas de escape das pessoas que estão em isolamento, levando alegria e cultura para dentro dos lares durante a quarentena. FOTO DE PIXABAY

FESTA SEM DATA

A ideia de fazer uma coletânea não foi a primeira alternativa imaginada por Rysdyk e Varela para contornar os prejuízos da pandemia. Eles chegaram a colocar à venda ingressos para uma festa sem data e sem atrações confirmadas. O evento foi chamado de “Show de Reabertura do Trilha”, e seria realizado quando acabasse a quarentena. Até que ajudou, mas o resultado não foi suficiente. O Trilha tira 70% de seu faturamento do pub, com festas e shows,

GRAVAÇÃO DE TRABALHOS AUTORAIS DE MÚSICOS LOCAIS GARANTE O MÍNIMO MOVIMENTO NO ESTÚDIO


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Economia

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SETOR CALÇADISTA DEMITE E DIMINUI JORNADAS

Segundo estado com mais demissões no setor, Rio Grande do Sul conta com 2,7 mil fábricas de calçados que geram mais de 96 mil empregos FOTO DE EDUARDO ROCHA

Por Carine Hoff

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crise econômica provocada pelo novo coronavírus gerou impactos no mercado de trabalho e na renda dos brasileiros. O setor calçadista foi um dos mais afetados pela crise. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), cerca de 35 mil funcionários foram demitidos no Brasil somente entre março e abril de 2020. O estado com mais demissões foi São Paulo, com 10,6 mil, seguido pelo Rio Grande do Sul, com 10,2 mil. Minas Gerais, em terceiro, contabilizou 5 mil demissões no setor calçadista. O Rio Grande do Sul é um dos maiores fabricantes de calçados do país, sendo o polo calçadista que mais exporta sua produção. Segundo a Abicalçados, existem 2,7 mil fábricas de calçados no estado que geram mais de 96 mil postos de trabalho. Desde que a crise começou, o setor vem reduzindo o quadro de funcionários, a jornada de trabalho e os salários. Na região do Vale dos Sinos foram anunciados números expressivos de demissões e encerramento de atividade. Segundo a secretária executiva

ATELIÊ DE IGREJINHA OPERA COM NÚMERO REDUZIDO DE FUNCIONÁRIOS

do Sindicato da Indústria de Igrejinha, Jaqueline De Assis Ramos, houve demissões e reduções de atividades tanto em fábricas como em ateliês. Na cidade de Igrejinha, entre as empresas associadas ao Sindicato da Indústria, mais de 1 mil funcionários foram demitidos. O impacto da crise calçadista provocou também o fechamento de inúmeras empresas e ateliês na cidade. “O sindicato

está auxiliando as empresas no que tange à área da economia, a empréstimos e redução de impostos e postergação de obrigações assessoriais, assim como auxiliando na implantação das MPs trabalhistas”, destacou Jaqueline. Sentindo os impactos econômicos no setor, empresas da cidade como Usaflex e Picadilly retomaram suas atividades em abril com redu-

ção na carga horária e no número de funcionários. As decisões tomadas pelas empresas foram acordadas em negociação com o Sindicato dos Sapateiros de Igrejinha. Segundo o vice-presidente do Sindicato, Dirceu Leodoro Alves, “medidas para evitar demissões foram negociadas, mas no cenário atual as rescisões se tornaram inevitáveis”. Segundo ele, o papel do sindicato foi auxiliar os funcionários com cestas básicas e agilizar a documentação para inscrições no auxílio emergencial do governo. Dispensado da empresa Picadilly, Carlos de Andrade sentiu os impactos econômicos da pandemia. “Quando a empresa voltou a trabalhar depois de um período de férias e anunciou as demissões eu já sabia que o meu cargo estava comprometido”. Porém, a preocupação dele vai além do período de crise. “Mesmo que a empresa volte com as atividades normais eu não acredito que terei o trabalho de volta. Vou solicitar o auxílio do governo. Vou ganhar três meses de cestas básicas e, provavelmente, irei fazer trabalhos eventuais. Terei dificuldade, mas vou conseguir passar por essa fase complicada”, analisa.

MÁSCARAS GARANTEM RENDA DE COSTUREIRAS Coloridas, estampadas, simples e necessárias. A fabricação de máscaras se tornou, nos últimos meses, a nova fonte de renda de costureiras microempreendedoras de Igrejinha, RS, devido às mudanças no consumo causadas pela pandemia do novo coronavírus. Ao longo de um mês, Jaque Jahnel, 38 anos, proprietária de um ateliê de costura da cidade, produziu cerca de 1,5 mil máscaras. Lúcia Lima, 57 anos, teve um resultado ainda maior, chegando a confeccionar 1,8 mil peças no mesmo período. Para as duas profissionais da área, a palavra da vez é adaptação. Desde que a pandemia tomou maiores proporções, a produção de seus estabe-

lecimentos foi diretamente impactada. “Sou especializada em trajes típicos, algo totalmente supérfluo, e se não tem baile de fandango, quem vai comprar”, questiona Jaque. Foi em meio a esse cenário de adversidades que a nova demanda chamou a atenção. A cidade, seguindo ordens do governo estadual, tornou obrigatório o uso de máscaras para a circulação de pessoas nas ruas. Todos precisavam de uma, e as duas costureiras entenderam o recado. A procura foi tanta que, em um único dia, Jaque produziu 300 peças. Ao preço de 4 reais a unidade, ela conseguiu tornar o produto acessível e, ainda, manter sua renda estável. Com Lúcia não foi dife-

FOTO DE LÚCIA LIMA

Por Gabriela Loro Marmitt

ATELIÊS CHEGAM A PRODUZIR 300 MÁSCARAS POR DIA

rente. “Mantive minha renda totalmente”. Através do Facebook e do WhatsApp, as duas compartilham seus produtos e atraem novos clientes. Além de moradores

da cidade, empresas locais de calçado também garantiram suas encomendas. A fabricação do “novo” produto, porém, exigiu muito esforço e aprendizado. “Pe-

guei um tutorial no YouTube”, afirma Jaque. Passados os primeiros dias de maior fluxo de compra, foi possível oferecer também modelos personalizados, como o que alia uma tiara à máscara, pelo preço de 10 reais. De acordo com Vítor Flesch, que já atuou como secretário municipal de finanças de Igrejinha, o tempo é de inovar. “O microempreendedor terá que se reinventar, pois muitos hábitos irão mudar. A relação de consumo se dará muito mais pela razão do que pela emoção”, enfatiza. Em meio à crise, Jaque e Lúcia mostram que, apostando no útil e necessário, estão no caminho certo para manter o nome no mercado e a estabilidade financeira dos seus negócios.


Especial COVID-19

Economia

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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CRISES OBRIGAM SETOR A SE REINVENTAR

Empresas e profissionais de eventos têm que buscar alternativas para os cortes das verbas, a falta de incentivos e o isolamento social FOTO DE ALEX BRACKEN / UNSPLASH

Por Vitória Arruda

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corte de verbas estatais para as áreas culturais, a falta de incentivo e a pandemia têm imposto ao setor de eventos o cancelamento em massa de atividades públicas e sociais, afetando, assim, a vida de milhares de pessoas, que ficam sem sua principal e, às vezes, única fonte de renda. As adversidades fazem com que profissionais como cerimonialistas, produtores, fotógrafos, videomakers, fornecedores de alimentos e bebidas e iluminadores, além dos próprios espaços que realizam festas, busquem se reinventar para sobreviver. A fotógrafa Claudine Reinehr, de Carazinho, diz que “para compensar ofereço ensaios fotográficos com cenários criativos, como uma minifesta intimista com bebê e pais”. Para ela, a partir de 2021 as pessoas darão mais importância a eventos pequenos, apenas com família e pessoas íntimas. Acredita, também, de uma forma otimista, que todos terão vontade de comemorar pequenas conquistas, realizando minifestas para celebrar com as pessoas que amam. Pesquisas realizadas pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro

CANCELAMENTOS CAUSAM PROBLEMAS PARA OS TRABALHADORES DA ÁREA

e Pequenas Empresas (SEBRAE) e pela plataforma global Eventbrite, de vendas de ingressos e tecnologias para realização de eventos, apontam que o mercado de eventos seja um dos últimos a se recuperar na era pós-pandemia. Por ser uma área sujeita à aglomeração, e pela per-

cepção das pessoas ter se alterado, ainda haverá muita negação para frequentar espaços com um fluxo grande de pessoas. Também fotógrafa, Gabriella Verfe observa que numa curva de retomada da economia, eventos e o turismo aparecem como os últimos a se re-

cuperarem. “Mas vejo também como excelente oportunidade de pararmos um pouco a avalanche diária que vivemos, ressignificar várias questões e colocar em prática projetos que sempre ficam para trás por falta de tempo”. Já o videomaker Charles Garcia diz que “com o cancelamento de eventos e o distanciamento social, estou reformulando algumas coisas que estavam erradas, meu site estava ‘jogado’ agora estou arrumando, fazendo canal no Youtube. Vou tentar fazer alguns trabalhos autorais, alguns ensaios no estilo que eu quero e tentar alcançar um outro tipo de cliente”. Para as empresas de produção de eventos, a crise vai um pouco mais longe. Léa Baltar, promotora e dona de uma empresa de assessoria e cerimonial, diz que “estamos tendo tempo de formular materiais para dar segmento à organização dos eventos com uma profundidade que é o que o cliente precisa”. Segundo ela, “neste momento deve-se lembrar da importância do cliente e da qualidade do serviço ofertado para que, após o caos, a sua empresa seja lembrada e procurada. É o tempo também de se reinventar, aprender coisas novas e criar novos processos de trabalho”.

FÓRUM GRAMADO DEBATERÁ RUMOS PARA O TURISMO Buscar recursos para a crise decorrente da pandemia do coronavírus é um dos objetivos da 3ª edição do Fórum Gramado de Estudos Turísticos, que tem sua nova data confirmada para os dias 19 a 21 de agosto, em Gramado, na Serra Gaúcha. Símbolo de roteiro de viagem preferido dos brasileiros, o município, assim como a região, sofre os efeitos do isolamento social a que o mundo inteiro recorreu. A terceira edição busca discutir, debater e procurar soluções a serem implementadas no turismo nacional e local. A conferência é uma oportunidade única para avaliar as inovações do mercado turístico, para apresentar ideias acadêmicas transfor-

madoras para a atividade e estar por dentro do que de mais bem sucedido tem acontecido no segmento ao redor do mundo. Segundo o presidente do Fórum, Luia Barbacovi, este será o primeiro palco para a retomada do turismo na cidade, e um novo marco do setor no Brasil e também em nível mundial. Entre os destaques desta edição, estarão os debates sobre o futuro da aviação comercial brasileira e a tendência do crescimento do turismo rodoviário no segundo semestre. Eduardo Zorzanello, empresário do setor de turismo da cidade e presidente executivo da Convention & Visitors Bureau Região das Hortênsias, entidade sem fins lucrativos que trabalha com captação

FOTO DE VICTÓRIA FEIJÓ

Por Victória Feijó

CIDADE SERRANA SEDIARÁ EVENTO QUE ACONTECERÁ EM AGOSTO

de eventos associativos, corporativos, sociais, esportivos e incentivos, diz que é necessária, neste momento e até o final deste ano, a aposta no turismo rodoviário, o que irá

aumentar ainda mais após a abertura das fronteiras Uruguai e Argentina. Para ele, “se o nosso destino está apresentando segurança sanitária, com certeza existirá um

público que não podemos perder”. E completa informando que a expectativa do retorno de eventos para Gramado é para agosto, e que todo o calendário está sendo trabalhado em parcerias com entidades da cidade. As novidades da terceira edição serão os painéis que propõem a necessidade de discutir novos protocolos depois que a pandemia do coronavírus passar. Os organizadores do Fórum trabalham na linha de que o consumidor ficará um pouco inseguro após a pandemia, e vai preferir visitar atrativos que estão mais próximos do lugar onde ele vive. Outra tendência é o crescimento do turismo de saúde e bem estar, que deverá ter um painel específico no Fórum Gramado.


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São Leopoldo (RS), Julho de 2020

OPINIÃO

O PROBLEMA DEVERIA ESTAR NO QUE É DITO

A INCOMPETÊNCIA É BEM MAIS PERIGOSA

Por Gustavo Gomes Machado

“O ex-presidente Lula causou espanto...” Espantou a quem a Mais triste que a declara- fala do ex-presidente? Por que ção “ainda bem que a natureza o espanto? Como é difícil para criou o coronavírus”, do ex-pre- veículos e para as pessoas se sidente Lula, é a postura como manifestarem de forma igual colegas jornalistas encararam quando o fanatismo político/ o fato. Isso não é uma defesa partidário parece superior. ao atual Presidente da RepúbliA fala de Lula é tão catasca Jair Bolsonaro, que quando trófica quanto a de Bolsonasoube que o Brasil ultrapassou ro, mencionada no início do a China em números de texto. E a conotação da mortos disparou um “e fala tem o mesmo signidaí?”. É um questionaficado daquele passeio mento. Quero, principalde jet-ski, dado por Bolmente dos meus colegas sonaro, e tantas outras Especial jornalistas, a mesma posatitudes deploráveis do COVID-19 tura para criticar e para Presidente, no sentido tecer opiniões de repúdio de demonstrar falta de ao ex-presidente. importância e de empatia para Do contrário, posso con- com as famílias dos falecidos cluir que o problema não é pela Covid-19. Embora seja de o que é dito, mas sim quem tamanha igualdade o significadiz. Lamentável, também, foi do de cada fato, uma parcela a maneira como a notícia foi cumpre o seu papel de repudiar apresentada pela âncora Maria um lado, mas descumpre ao Júlia Coutinho, a Maju, no dia passar panos quentes quando 20 de maio, no “Jornal Hoje”.: é a outra face da política.

Por Vinícius Emmanuelli Peres

O MUNDO GRITA: VIDAS NEGRAS IMPORTAM

O CONTRADITÓRIO PAPEL DE RELIGIÕES

Por Luana Ely Quintana

Há alguns dias o mundo inteiro foi tomado por protestos com os dizeres “Black Lives Matter” (“Vidas Negras Importam”). Desde que um homem negro, chamado George Floyd, pai, esposo, humano, foi assassinado por policiais brancos, em 25 de maio de 2020, o mundo sentiu que não deveria mais se calar sobre o racismo e se juntou a causa Black Lives Matter para ir às ruas e protestar. Os dizeres “I can’t breathe” (“não consigo respirar”, em tradução literal) foram as últimas palavras que o homem conseguiu pronunciar antes de morrer por asfixia. A frase usada por George, infelizmente já foi usada anteriormente quando, em 2014, outro homem negro, chamado Eric Garner, ficou “sem respirar” e perdeu

sua vida para policiais brancos também. Apesar de ambos os casos serem completamente grotescos e desumanos, eles não são os únicos que existem e existiram na história. O racismo acompanha a humanidade há muito tempo. Racismo é, nada mais nada menos, que um conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma hierarquia entre as raças e entre as etnias. Resumidamente, ampara-se na crença nefasta de que a cor de pele branca é superior a todas as outras, em uma paleta imensurável de cores e tonalidades. O movimento negro reconfigurou-se. Com esse triste acontecimento, o mundo acordou novamente, cansado que está de injustiças e preconceitos. “Meu pai mudou o mundo”, assegura Gianna, filha de apenas cinco anos de idade de Floyd, e ela está certa.

a liberdade individual garantida pela própria Constituição Federal O Brasil conseguiu uma faça- de 1988. Um gesto claro em se nha que é de se aplaudir de pé: aproveitar do estado de calacriou uma crise política, em meio midade para poder usufruir da a uma crise sanitária do nono máquina pública. coronavírus no qual já enfrenta E o povo como fica? Os extreuma crise econômica sem pre- mos lutando pelo seu interesse, cedências. O amadorismo dos enquanto 210 milhões de pessoas agentes políticos é de se assustar correndo risco de pegar o vírus quando comparamos ações dos e perder seus empregos pela inpaíses da Europa. capacidade de governança. Com uma facilidade tão Sinceramente, não tiro a grande em acompanhar razão do presidente Jair os acontecimentos, não Bolsonaro. Todos sabem conseguimos aprontar as do seu lado rude, mas no Especial ações necessárias ao enfundo está apontando o COVID-19 frentamento da COVID-19. perigo iminente da catásO tempo que nós tivemos, trofe que pode se instalar o a China e até mesmo os Estados nosso Brasil. “Mas Vinícius, você Unidos da América não tiveram. então se preocupa mais com a Subestimamos o vírus e estamos economia do que com as vidas?” pagando um preço altíssimo. A resposta é clara: NÃO! A moO presidente da República deração é um ótimo caminho no preocupado mais com a econo- cenário que vivemos, e quebrar mia. Governadores e prefeitos a economia hoje é não garantir extrapolando todos os limites um sistema de saúde bom para em seus decretos e ameaçando o nosso futuro.

Por Tainara Pietrobelli

“Política e religião não se misturam”, já dizia o ditado. Mas, pelo visto, a realidade tem sido bastante diferente do que se pensava sobre isso anteriormente. Existe uma questão bastante extensa sobre o respeito a todo o tipo de religião, e o verdadeiro papel que elas têm em sociedade. Mas, além do preconceito por religiões de matriz africana ser predominante no Brasil, existem muitas questões negativas ligadas a algumas doutrinas, principalmente aquelas que confundem seu papel com o de influenciadores políticos. Em tempos de pandemia, quanto o isolamento é a peça chave para a cura, me deparo com reivindicações de igrejas querendo abrir as portas, opondo-se a tudo que a ciência diz. Do mesmo modo, vejo esses mesmos espaços deferindo discursos

a favor de um governo político que pode ser qualquer coisa, menos cristão. Tudo vai contra ao ensinamento básico de qualquer religião - o amor e a bondade - e se concentra em uma organização de força política, capaz de manipular muitos fiéis. Nas redes sociais, o que mais se nota são comentários repletos de discriminação e preconceito, vindos daqueles que deveriam ser os primeiros a acolher e defender a vida, independente da condição. Não há lógica no fanatismo, apenas ações impensadas que corroem a argumentação. E as religiões de matriz africana são as mais afetadas pelo preconceito. Sem dúvidas, estamos passando por uma fase contraditória, onde aqueles que naturalmente deveriam espalhar o amor ao próximo, são os primeiros a jogar na fogueira aqueles que pensam diferente.


Especial COVID-19

Assistência

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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AUMENTA BUSCA POR ALIMENTOS PARA DOAÇÃO

Organizações que entregam comida a entidades carentes mudaram o processo de arrecadação de doações para poder alimentar mais famílias FOTO DE CLAUDIO FACHEL / PALÁCIO PIRATINI

Por Andressa Morais

E

m meio à pandemia do novo coronavírus, a demanda dos Bancos de Alimentos aumentou, pois familiares de crianças atendidas pelas instituições cadastradas passaram a ser contabilizados na partilha das doações. O isolamento social tem como uma das consequências a dificuldade das famílias em obter renda, pois muitos trabalham de modo informal. “Se a gente for considerar que cada criança atendida por uma instituição cadastrada tem uma família com cinco integrantes, é como se a gente multiplicasse por cinco a demanda de atendimento”, explica Carolina Lindenmeyer Prates, de 32 anos, nutricionista do Banco de Alimentos do Vale do Sinos. Antes de chegarem à mesa das famílias que precisam, os alimentos arrecadados passam pelos Bancos de Alimentos, que calculam a quantidade que vai para cada instituição cadastrada. Segundo Carolina, o cálculo dos alimentos é feito de acordo com a quantidade de crianças, adultos ou idosos em cada organização. Se a doação for feita por recursos financeiros, a Rede Gaúcha de Bancos de Alimentos repassa o valor e a organização compra cestas básicas para fazer a distribuição. No Banco de Alimentos do Vale dos Sinos desde 2012, Carolina começou como estagiária e depois de formada assumiu como nutricionista responsável técnica. Ela cuida de toda a parte de segurança alimentar e nutricional, que começa desde o recebimento dos alimentos, com controle de qualidade, cuidado das embalagens, data de vencimento, armazenamento e a distribuição adequada. A profissional da saúde também supervisionava as estagiárias, alunas de Nutrição da Unisinos, que iam até as instituições atendidas realizar trabalhos de educação alimentar e nutricional, ofi-

Buscamos as cestas de alimentos com nossos carros próprios, e ligamos para cada família retirar Fábio Bernardo da Silva Assistente social

BANCOS DE ALIMENTOS FAZEM A PONTE ENTRE QUEM NÃO TEM O QUE COMER E QUEM PODE AJUDAR

cina culinária, palestras e capacitações. Com o isolamento social, elas passaram a levar informações sobre como higienizar as compras do mercado, por exemplo, através da página do Instagram @bancodealimentosvs.

CESTAS BÁSICAS

Cerca de 5 mil pessoas são beneficiadas pelo Banco de Alimentos do Vale do Sinos. São 67 instituições cadastradas, atendendo os municípios de São Leopoldo, Portão, Esteio e Sapucaia do Sul. Das 67, no momento de pandemia, 37 são atendidas com doação de cestas básicas. As não atendidas são escolas, já que muitas delas receberam doações de alimentos através do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). “As cestas de alimentos não perecíveis que recebemos nós buscamos com nossos carros próprios, levamos para a instituição e ligamos para cada família buscar na própria instituição”, relata o assistente social Fábio Bernardo da Silva, 45 anos, um dos fundadores da Associação Meninos e Meninas de Progresso (AMMEP), instituição atendida pelo Banco de Alimentos do Vale do Sinos. Silva explica que a organização é responsável por 50% dos alimentos não perecíveis da associação. Os outros 50% vêm de convênios com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SDS) e Secretaria Municipal de Educação (SMED)

de São Leopoldo. Diante do contexto Solidário, ação em que voluntários vão atual, eles têm a meta de suprir a neces- até supermercados das regiões e fazem a sidade das 197 famílias que já atendiam, arrecadação. Mas essa ação está limitada mas novas famílias estão procurando o no momento. local em busca de comida, aumentando Em abril e maio, os voluntários coa demanda. locaram um carrinho com o banner do A cada quinzena, Banco de Alimentos nos eles oferecem um kit supermercados partide hortifrutigranjeiros cipantes da ação, mas e uma cesta básica de não obtiveram resultaalimentos não perecídos positivos de arreBanco de Alimentos veis às famílias. Além da cadação. Diante desse Região do Calçado alimentação, montaram, cenário, o Jornal NH Rua 5 de Abril, 29 em parceria com a Sefez uma campanha e a Rio Branco - Novo Hamburgo cretaria Municipal de comunidade colaborou Telefone: (51) 3527-0044 Saúde (SEMSAD), um com alimentos e quanBanco de Alimentos ponto descentralizado tias financeiras. “Em do Vale dos Sinos de vacinação. Também abril, nós tivemos uma Rua doutor Hillebrand, 595 oferecem o serviço de arrecadação de 30 toRio Dos Sinos - São Leopoldo prevenção nos casos neladas de alimentos”, Telefone: (51) 3588-1390 de mulheres, crianças informa Rodrigues, que e adolescentes que sotambém informa que frem violência. No caso das crianças, em mais pessoas buscaram pelo apoio no especial os casos de abuso sexual. período. Normalmente, são 8 mil pessoas atendidas, mas com a pandemia, AÇÕES LIMITADAS já atenderam de 12 a 13 mil pessoas. No Banco de Alimentos da Região do Apesar da situação de fome ter auCalçado, a demanda também aumentou, mentado, Rodrigues tem esperança, e segundo o presidente Ademir Rodrigues, acredita que a alta demanda não vai se de 69 anos, que trabalha como voluntá- estender depois do período de isolamenrio no local há seis anos. A organização to social: “Esse foi um momento muito atende, mensalmente, 54 entidades em difícil para todos, porque muita gente Novo Hamburgo, Campo Bom, Estância ficou desempregada. Mas desde que a Velha e Sapiranga. Em torno de 80% dos economia volte a se estabilizar, eu acrealimentos arrecadados vem do Sábado dito que as coisas vão voltar ao normal”.

Endereços para doação


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Essencial

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A ROTINA DE QUEM NÃO PODE PARAR

Trabalhadores que estão na linha de frente enfrentam medo do coronavírus e garantem o básico à população em tempos de distanciamento social

Por Amanda Bier

O

s clientes entram, fazem as compras, seguram as cestinhas e tocam nos produtos. Muitos parecem apressados e pegam apenas o essencial. Outros, não demonstram preocupação. Alguns, de vez em quando, tentam “burlar” as exigências sanitárias. Dentro do supermercado, durante a pandemia, qualquer um pode ser transmissor do novo coronavírus. O medo é constante, mas os funcionários, sem escolha, precisam seguir as rotinas enfrentando o risco da contaminação. Douglas Damasceno Rosa, 19 anos, operador de caixa no Mercado do Bosque, em São Leopoldo, disse estar tomando todos os cuidados. “Eu estava com receio logo no início, mas, com o tempo, ao ver que as medidas de higiene estavam sendo respeitadas, comecei a ficar mais calmo. Mesmo assim, procuro estar sempre atento com os clientes porque alguns ainda levam na brincadeira”, ressalta o jovem, que há quase um ano trabalha no local. Em contato direto com o público, e pegando a todo momento nas mercadorias, cartões e cédulas de dinheiro, o único jeito é se higienizar. Entre os cuidados, estão lavar bem as mãos e evitar ao máximo encostar no rosto, principalmente na região dos olhos, nariz e boca. As precauções não terminam depois do trabalho. Douglas mora com a namorada e com os pais dela, que são do grupo de risco. Por isso, ao chegar em casa, vai direto se limpar. “Na entrada, já tiro os sapatos, passo álcool em gel e vou tomar banho. Também separo minhas roupas usadas e esterilizo o celular, a chave e a carteira. Eu me cuido muito porque, nessa situação, o maior perigo é contaminar quem vive comigo”, frisa. Assim como Douglas, outros profissionais arriscam a vida diariamente para garantir o essencial à população em tempos de pandemia. Álcool em gel, desinfetantes e máscaras são os novos equipamentos de trabalho de quem precisa se proteger. Funcionária do setor da padaria há um ano, Juliana Catiane de Oliveira Pires, 28 anos, disse já ter se acostumado com todos os apetrechos. “Saio de casa e a primeira coisa que procuro é a máscara. Já virou um hábito”, conta. Em relação ao trabalho, Juliana segue sua rotina normalmente, diferentemente da vida particular, que precisou passar

por adaptações. “Tenho duas filhas, uma de 13 e uma de cinco anos, que agora estão morando com a minha mãe. No domingo, costumo passar a tarde com elas improvisando brincadeiras. O tédio é grande, mas, por enquanto, a realidade é essa, não tem o que fazer”, diz. A professora e decana da Escola de Saúde da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Rochele Rossi, 40 anos, que estava fazendo compras no local, elogiou as medidas de higiene do estabelecimento do bairro Cristo Rei. “Estou vendo que está tudo dentro das normas da vigilância sanitária. Isso me deixa mais tranquila”, afirma Rossi, ressaltando ainda a importância dos cuidados de prevenção: “O bairro con-

A qualquer momento podemos contrair o vírus Edir Moehlecke Dono do Mercado do Bosque

ta com muitas pessoas idosas, que são vulneráveis à Covid-19, então essas medidas, além de essenciais, mostram a real preocupação do mercado com as vidas da comunidade”.

NA VITRINE

Para proteger funcionários e clientes, o Mercado do Bosque adotou uma série de medidas de higiene. De acordo com o dono, Edir Moehlecke, 62 anos, as normas de prevenção contra a Covid-19 estão em vigência antes mesmo dos decretos municipais serem publicados e os 13 colaboradores foram orientados a seguir as recomendações. “Estamos higienizando os carrinhos e as cestas de compras, distribuindo álcool 70% na mão de todos e limitando o número de seis pessoas por vez”, detalha. O empresário explica ainda que, em horários de mais movimento, perto do meio-dia e das 16h até as 18h30, ele permite que mais clientes entrem, mas, em compensação, manda a maioria dos funcionários para os fundos da loja. “Como a casa é pequena, isso evita aglomeração. Precisamos nos cuidar muito porque estamos na vitrine. A qualquer momento podemos contrair o vírus”, frisa Moehlecke.

O cliente Celso José Farias Silveira, de 59 anos, diz que está respeitando a quarentena e só sai para buscar o essencial. “Sou aposentado e vivo com minha filha, mas minha mãe, de 91 anos, que é do grupo de risco, mora ao lado da minha casa. Por esse motivo, procuro vir no mercado em horários mais calmos, sempre de máscara e passando álcool em gel constantemente”, conta Silveira. Apesar das medidas de proteção recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e os incessantes pedidos para que as pessoas se protejam ao saírem na rua, muitos não respeitam as orientações. Enquanto Douglas atendia rapidamente a todos no caixa, um cliente chegou sem máscara querendo comprar duas carteiras cigarro. Imediatamente, Edir pediu para que o homem esperasse do lado de fora. “De vez em quando, temos problemas assim, mas ainda bem que são poucos. Semana passada também aconteceu de uma moça querer entrar sem máscara e eu a abordei. Ela ficou irritada, xingou todos nós. Como estamos agindo dentro da lei, eu não me estresso. Quem não quiser se adaptar, vai ter que ir embora. Por enquanto, a regra é essa”, conclui o dono do estabelecimento. FOTO DE TIAGO WEBER

NO BALCÃO DO MERCADO DO BOSQUE, DOUGLAS DAMASCENO ROSA NÃO PODE DISPENSAR O USO DE MÁSCARA E ÁLCOOL GEL


Especial COVID-19

Grupo de risco

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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A DISTÂNCIA QUE SALVA NOS LARES DE IDOSOS Para evitar contaminação, casas do Vale do Sinos tomam medidas mais rígidas, incluindo a suspensão de visitas

FOTO DE SABRINA NASCIMENTO

Por Lohana Souza

O

avanço do coronavírus por diferentes regiões do Estado já chega, em algumas cidades, a locais que abrigam o grupo mais vulnerável, os idosos. Para não correr risco de contaminação, os locais têm optado por medidas mais rigorosas de higienização que incluíram a suspensão de visitas, entradas laterais para os funcionários, limpeza de todas as doações de alimentos, roupas e utensílios domésticos. “Redobramos todos os cuidados, os funcionários não entram pelo portão principal, criamos uma nova entrada para a higienização de pés, direcionado a outro banheiro para a troca de roupa, higienização das mãos novamente antes de colocar as máscaras e luvas e de ter contato com os idosos”, conta a coordenadora do Lar São Francisco de Assis, de São Leopoldo, Lucélia Souza. No Lar São Vicente de Paula, em Novo Hamburgo, a presidente Pâmela Campos também redobrou os cuidados. “O local abriga 47 idosos e se mantém basicamente de doações e voluntariado, neste período todas as doações são recebidas em uma porta lateral para que os idosos não tenham qualquer contato com as pessoas ou os produtos. Nosso estoquista faz a higienização de todas as doações e depois faz o encaminhamento para cada setor”, descreve.

ROTINA ALTERADA

No Lar Harmonia, em São Leopoldo, a retomada das visitas ocorreu na última semana de maio. “Todas as visitas são marcadas com antecedência, permitindo somente um familiar por residente. Ao chegar, verificamos temperatura, orientamos a higienizar as mãos com álcool gel, mas a maioria dos familiares ainda opta por chamadas de vídeo, a qual realizamos diariamente”, afirma a sócia proprietária Suellen Antonetti. A psicóloga do Lar São Vicente de Paula, Pâmela Andrade, reconhece que o fato de os idosos não poderem receber visitas gera algum desconforto, por isso uma das alternativas encontradas foi fazer chamadas de vídeo. “Em função da pandemia, nossos idosos não estão recebendo visitas dentro do Lar. Eles podem ficar do lado de fora, cumprindo dois metros de distanciamento. Para amenizar um pouco as angústias, estamos realizando videochama-

FRANCISCO FERREIRA, 83 ANOS, PRODUZ OBRAS DE ARTE PARA PASSAR O TEMPO NO LAR SÃO FRANCISCO DE ASSIS

das para os familiares. Além disso, nossos funcionários estão se organizando para fazer algumas atividades, como dança, bingo, momentos religiosos”, relata. As várias chamadas de vídeo para as duas filhas entraram para a lista de atividades preferidas de Lilia Klein, junto com jogos e crochê. “Gosto muito de fazer roupas de crochê, as que mais gosto são roupas de bebê. Minha filha busca aqui, e realiza doações na igreja”, conta a moradora do Lar São Vicente. Já Maria Lori Dietrich, 76 anos, não casou, e nem teve filhos por opção. Buscou o lar São Vicente por se sentir sozinha, mora no local há cinco anos. “Minhas atividades pre-

Sinto um pouco de falta dos meus filhos, eles moram longe Aldo Luiz Soares Residente

feridas são ler e fazer crochê. Minha leitura atual é Volta ao Mundo em 80 dias, estou gostando bastante. É a melhor maneira de viajar no momento”, enfatiza. Pintura, artesanato e muita conversa. Essa é a rotina de Francisco Ferreira, 83 anos, no Lar São Francisco de Assis. Residente há oito anos, Ferreira chegou com a esposa, que faleceu cinco anos atrás. “Sempre vou lembrar da minha esposa, Conceição, ela tinha qualidades incríveis. Mas aqui eu também fiz vários amigos, e posso realizar artesanato com vários materiais também, coisas que eu faço desde guri. Sempre que eu posso, utilizo o tempo para fazer arte”, diz. Aldo Luiz Soares, 70 anos, ainda está em processo de adaptação. Morador há oito meses, ainda encontra um pouco de dificuldade de estar longe dos filhos, que moram fora da cidade, e ainda não conseguem realizar tantas chamadas de vídeos. “Sinto um pouco de falta dos meus filhos, eles moram longe, mas já tenho até bisneto. Aqui já fiz alguns amigos, gosto muito da comida, e das festas de aniversário”, conta. De acordo com a psicóloga Pâmela, as festas são organizadas internamente, pelos funcionários,

respeitando todas os cuidados. “Todos se mobilizam para poder fazer o melhor, e poder comemorar com esse novo jeito. O pessoal da cozinha junto com a nossa nutricionista faz as delícias que são servidas para os idosos. Uma das nossas moradoras Anita Kray Junbluth comemorou 100 anos no mês de maio”, lembra.

GRUPO DE RISCO

Um levantamento da GaúchaZH publicado em abril identificou cinco mortes por Covid-19 em lares de longa permanência de idosos ou casas geriátricas. Um asilo no município de Passo Fundo contabilizou 18 casos confirmados. No dia 23 de abril, a Organização Mundial da Saúde (OMS) disse que quase metade das mortes causadas pelo novo coronavírus na Europa foi registrada em asilos. A Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul publicou uma portaria que estabelece regras de prevenção em asilos do estado. De acordo com o governo, os lares são uma das prioridades no combate ao coronavírus, pois abrigam pessoas do grupo de risco e contam com muitos funcionários, o que aumenta a possibilidade de contágio.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Gestação

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OS DESAFIOS DO PARTO EM MEIO À PANDEMIA Maternidades dos hospitais do Vale do Sinos intensificam cuidados com gestantes e recém-nascidos

FOTO DE CYNTHIA GROTH / PIXABAY

Por Marília Port

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chegada de Aurora é esperada para o final de julho, dia 26. “Difícil colocar em palavras! É algo que eu e meu marido queríamos muito, e aconteceu, realmente é uma dádiva”, vibra a mãe, Talita. Ela conta que escolheu ter o bebê no Hospital Regina, em Novo Hamburgo, como muitas outras gestantes da região, atraídas pelas boas referências da Maternidade. “Ouvi muitos elogios, inclusive de outras mães que tiveram seus bebês lá”, conta. Andreia, mãe de Augusto, também optou pelos serviços do Hospital Regina, já desde o início. Fica perto de casa, atende pelo plano de saúde e possibilita manter as consultas com a doutora Simone, sua obstetra de confiança. “Ela avisou que várias coisas estavam proibidas, como visitas, e que seria autorizado apenas um acompanhante. Poderia trocar uma vez e nem olhar o bebê pelo vidro seria permitido”, relembra Andreia, conforme as orientações que recebeu da médica. Augusto nasceu em 6 de abril, quando a quarentena se tornava realidade e o Rio Grande do Sul contabilizava seus primeiros 63 casos confirmados de Covid-19. “No hospital, tinha receio ao fato das enfermeiras que te atendem, atendem vários outros pacientes em outros quartos. Como é por ala, fiquei na parte da maternidade, mas fiquei sabendo que uma outra grávida com suspeita da doença estava em outra ala”, relata Andreia, e pontua o medo de que alguma enfermeira sem máscara, que tivesse contato com um dos casos positivos internados no Regina, passasse o vírus para ela ou para o bebê. Mesmo assim, não poupa elogios ao hospital: “Apesar da preocupação, o atendimento foi muito bom. E de certa forma me sentia segura, as técnicas em enfermagem iam frequentemente olhar eu e meu bebê. Até mesmo o banho e as primeiras trocas foram elas que fizeram para mim”. Na expectativa pelo nascimento da filha, Talita vem reforçando as precauções com a saúde física e mental devido à pandemia. “O processo te deixa bem mais sensível e preocupada, mas tento sempre manter a calma, na medida do possível. Nesse período de pandemia, estou trabalhando em home office, então

SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA CRIOU UM MANUAL COM RECOMENDAÇÕES

consigo estar mais tranquila. Saída de casa somente se muito necessário e com cuidado redobrado”, conclui.

GRAVIDEZ NA PANDEMIA

Com quase quatro meses de diferença entre um parto e outro, as duas mães têm em comum a escolha pelo mesmo hospital e a gestação em meio à disseminação do novo coronavírus, impensável meses atrás, quando ambas engravidaram. Gestantes como a Andreia, que deu à luz nesse cenário, ou como a Talita, que soma mais de 30 semanas de gravidez, não teriam como imaginar

Saía de casa somente se muito necessário e com cuidado redobrado Andreia Mãe de Augusto

que as novas vidas, tão amadas já nos nove meses que antecedem o parto, chegariam aqui fora durante um contexto de pandemia histórica. As maternidades dos hospitais vêm adotando novos protocolos de cuidado e higienização, para garantir maior segurança às mães e recém-nascidos. A Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul (SPRS) pede que as famílias entendam e colaborem com as restrições impostas pelo atual cenário. “Cada hospital estabelece as suas regras de forma independente, mas de um modo geral temos rotinas e protocolos bem estabelecidos”, certifica a diretora da SPRS, Desiree de Freitas Valle Volkmer. Embora não existam até o momento da reportagem casos confirmados de transmissão da doença da mãe com sintomas de Covid-19 para o bebê ainda na barriga, já foram registrados casos de contaminação da criança após o parto. Em nota divulgada em março de 2020, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) promoveu orientações específicas a serem seguidas no atendimento a

gestantes e recém-nascidos durante a pandemia, no intuito de prevenir e também de tratar possíveis casos. No documento, a SBP lista as normas que devem ser adotadas no parto e pós-parto de grávidas assintomáticas e que neguem ter tido contato com casos positivos de Covid-19; além de estabelecer as medidas mais drásticas, que devem ser implementadas em caso de mãe com suspeita ou confirmação da doença. Se a gestante for saudável, visitas e acompanhantes – fora dos grupos de risco, sem sintomas ou histórico de contato com o vírus – são permitidos apenas em quartos individuais ou alojamentos conjuntos que garantam a distância mínima de dois metros entre os leitos. Às gestantes contaminadas pelo Coronavírus, critérios de isolamento são intensificados, a exemplo de quartos privativos com distanciamento mínimo de dois metros entre a cama da mãe e o berço do bebê. Nesses casos, segue garantido à mãe o direito à amamentação, mas sempre de máscara e com as mãos higienizadas.


Consciência

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

UBS USA ARTE PARA FALAR SOBRE PREVENÇÃO

Sarau literário organizado por funcionários do posto de saúde ajuda população da Chácara da Fumaça, em Porto Alegre, a compreender doenças

Por Matheus Ramos

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lguns temas continuam sendo tratados como tabu perante a sociedade, especialmente aqueles que têm forte relação com sexualidade. Com isso em mente, a Unidade Básica de Saúde Chácara da Fumaça, de Porto Alegre, realiza mensalmente uma programação em formato de sarau literário focada em uma doença diferente. A cada mês, como o Outubro Rosa, que é focado na prevenção ao câncer de mama, um funcionário especializado na temática abordada é selecionado para que ele participe do processo de conscientização, compartilhando seus conhecimentos no sarau. Essa atividade faz com que os membros da comunidade precária tenham a oportunidade de entrarem em contato com um tipo de conteúdo que dificilmente teriam acesso em outro lugar. Embora o evento seja fundamentado em conhecimento científico, ao mesmo tempo se procura usar uma linguagem que seja mais acessível para os moradores da região, com atividades de cunho mais lúdico, fazendo com que a atmosfera se torne mais descontraída. Para a enfermeira Adriana Spader, de 40 anos, uma das idealizadoras do projeto, a saúde não tem

o investimento necessário e contém diversos aspectos problemáticos no Brasil. Com essa realidade em mente, ela acredita que a divulgação de atividades como essa sejam relevantes, pois não apenas fazem com que as pessoas que já tenham um papel ativo no mundo passem a ter um ponto de vista mais consciente, como também desempenha um papel que poderá fazer com que as gerações futuras tenham menos dificuldades para lidarem com eventuais problemas, como a forte ocorrência de patologias psicológicas que estão se fazendo cada vez mais presentes.

PROGRAMA SUSPENSO

Mesmo após a divulgação de que as atividades do Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família (Imesf) seriam encerradas, a programação continuou ocorrendo normalmente, com os funcionários se comprometendo em entregar um serviço de qualidade para a população. A UBS se organizou em todas as edições para as reuniões expositivas, sem que houvesse nenhuma mudança no atendimento dos profissionais de saúde, independentemente da atividade desempenhada. Os estudantes da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) participaram dos

encontros explicativos que aconteceram desde então, dividindo seus conhecimentos sobre as doenças debatidas. “Conhecimento guardado apenas para si não tem utilidade, por isso ele deve ser compartilhado com os outros”, reflete o agente de combate a endemias Moacir Teixeira, de 57 anos, um dos principais responsáveis pelo projeto. Medidas de prevenção podem ser definidas como algo de grande importância, facilitando o processo de tratamento de algumas doenças e gerando uma qualidade de vida mais saudável, com as instruções oferecidas pelo posto servindo como um caminho para que esse objetivo seja alcançado através dessas orientações. “Os encontros didáticos realizados pela Chácara da Fumaça foram

Conhecimento guardado apenas para si não tem utilidade Moacir Teixeira Agente de saúde

muito produtivos, já que através deles os profissionais da saúde tiveram a oportunidade de compartilhar seus conhecimentos sobre diversas doenças que deveriam ser discutidas de forma mais consistente na sociedade, com a comunidade local tendo abraçado a proposta”, apontou o profissional, destacando que os moradores da região apoiaram a iniciativa. A execução dessa atividade também fez com que os funcionários da instituição fossem retirados de suas zonas de conforto, fazendo com que os seus repertórios acabassem sendo enriquecidos com essa troca de experiências. Por causa da desinformação, preconceitos continuam sendo perpetuados em sociedade, como a estigmatização de homossexuais como algumas das principais fontes das doenças sexualmente transmissíveis. A título de exemplo, somente após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 homens gays foram finalmente autorizados a realizarem doação de sangue. Elementos sociais como excesso de carência também podem ser definidos como uma armadilha, portanto, a saúde mental também não deve ser deixada em segundo plano. É através desse acúmulo de desinformação que o sarau obtém importância. FOTO DE MATHEUS RAMOS

CARTAZES EXPOSTOS NO POSTO DE SAÚDE AJUDAM A LEVAR INFORMAÇÃO SOBRE DOENÇAS


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Relato

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ENFERMEIRA BRASILEIRA CONTRA O VÍRUS NA SUÍÇA A gaúcha Dariane Testoni viveu o combate ao coronavírus como profissional e como paciente no país europeu

FOTO DE JOCHEN SAND / ISTOCK

Por José Hameyer

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oi trabalhando na linha de frente do combate à pandemia de Covid-19, em uma clínica hospitalar no sul da Suíça, que a enfermeira brasileira Marlen Dariane da Silva Testoni contraiu o novo coronavírus. Após apresentar alguns sintomas de contaminação, Marlen realizou um primeiro exame, com resultado negativo. Durante cinco dias, a brasileira ficou em isolamento domiciliar por recomendação médica, uma vez que poderia estar infectada e após esse período realizou um segundo exame, constatando que estava contaminada. Muitos problemas respiratórios foram agravados pela infecção, como a asma crônica, que acompanha a brasileira ao longo de sua vida. “Duas semanas bem difíceis”, é a descrição de Marlen para o período em que esteve em tratamento, principalmente após saber que seu filho, um jovem adolescente, também estava contaminado – provavelmente, contraiu o vírus a partir da mãe. Para o alento da brasileira, o menino foi um caso assintomático e não enfrentou maiores complicações de saúde. O estado do Ticino, no sul da Suíça, foi um dos primeiros a somar casos de coronavírus no país. Um dos números que mais assusta é o de óbitos na região: na clínica onde Marlen trabalha, houve um total de 60 pacientes internados com Covid-19. Desses, um terço veio a óbito. Segundo a brasileira, um dos maiores agravantes da contaminação foi a realização do carnaval na região, mesmo após o primeiro caso da cidade de Lugano – a maior do Estado – ter sido confirmado. Na primeira semana de março, contudo, foi decretado o fechamento de todo tipo de comércio – com exceção de

Fico pensando às vezes: o que seria de mim se estivesse morando no Brasil? Dariane Testoni Enfermeira

ESTRUTURAR O SISTEMA DE SAÚDE PARA ATENDER OS DOENTES É UM DOS DESAFIOS NA BATALHA CONTRA O CORONAVÍRUS

mercados e farmácias – e houve uma mobilização do poder público para combater a contaminação. Uma das ações governamentais foi a criação do plano chamado Unidade de Conduta, um grupo de realizações conjuntas entre Polícia, Corpo de Bombeiros e Exército para garantir o distanciamento social nas ruas. “Eu posso dizer que fui muito bem atendida. E isso me impressionou muito. Não só na clínica em que trabalho, mas em todos os hospitais que atendem pacientes com Covid-19, há um grupo de psicólogos que prestam apoio aos profissionais da saúde. Fico pensando às vezes: o que seria de mim se estivesse morando no Brasil?”, questiona.

Para a gaúcha Marlen, a experiência da contaminação serviu para enxergar as pessoas com maior igualdade. “Eu atendi pessoas importantes no meu trabalho, mães de políticos influentes e, para essas pessoas o vírus foi fatal.” No cantão suíço do Ticino, onde reside e trabalha a brasileira, o momento já pode ser considerado positivo, se comparado a outros pontos do país: embora fosse o Estado com maior número de mortos em decorrência da pandemia no mês de abril de 2020, também era o que possuía o maior número de pacientes recuperados. No Rio Grande do Sul, o número de casos confirmados passou de 8

mil, sendo mais de 200 mortes, no final de maio, enquanto na Suíça os casos confirmados já haviam passado de 30 mil e as mortes de 1,6 mil. Para fins de comparação, a população do país europeu, 8,5 milhões de habitantes, é inferior à do Estado brasileiro, onde vivem 11,3 milhões de pessoas. No âmbito nacional, o caso brasileiro é preocupante, com cerca de 500 mil casos contaminados e mais de 30 mil mortes, o que coloca o Brasil como o quarto país no mundo com maior número de mortes decorrentes da Covid-19 e o segundo com maior número de casos confirmados, atrás apenas dos Estados Unidos.


Especial COVID-19

Economia

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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SETOR DE EVENTOS ACUMULA PREJUÍZOS NA QUARENTENA Apesar das perdas financeiras, profissionais procuram se reinventar em meio à pandemia e acreditam na retomada do setor após o término das restrições FOTO DE ALAN NOBRE/DIVULGAÇÃO

Por Isadora Fróes

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omo forma de prevenção e controle à pandemia do novo coronavírus, eventos com aglomeração foram suspensos por tempo indeterminado no Rio Grande do Sul. Com isso, o setor que gera milhões de empregos por ano no Brasil está parado e passa por uma crise sem precedentes. Em abril, levantamento divulgado pelo Sebrae indicou que a pandemia afetou 98% do segmento de eventos. Empresários do ramo relatam que o momento é de dificuldades financeiras. “Deixamos de faturar 6 mil por mês”, declara a proprietária e cerimonialista da Cattani Eventos, Susana Cattani. Como solução para sobreviver a este momento, hoje a família conta com uma segunda fonte de renda, gerada pelo trabalho do marido, quem além de ser sócio de Susana e administrar os negócios, atua em outra empresa. Entre eventos cancelados e adiados, o fotógrafo profissional Alan Nobre calcula que sua empresa terá, em média, um prejuízo entre 100 mil e 150 mil neste ano. Alan realizava cerca de dois casamentos por mês, mas em meio à pandemia teve um

EM 2020, ALAN TEVE PRATICAMENTE TODOS OS SEUS EVENTOS REAGENDADOS

evento cancelado e todos os demais adiados, sem data prevista para reagendamento. Diante desse cenário, empresários aproveitam o tempo livre para se aperfeiçoar e realizar cursos online, pois segundo Susana, “as pessoas vão vir mais exigentes e sedentas por

confraternizações” após o término das restrições de isolamento social. De acordo com o fotógrafo Alan, em meio à pandemia e aos reflexos financeiros, é preciso se reinventar. Por isso, promoveu uma série de entrevistas nas redes sociais com profissionais do setor de eventos

para mostrar como estão lidando com esse momento e suas expectativas após o período de quarentena. “As lives são uma nova tendência e, então, resolvi entrar nessa com o intuito de indicar aos clientes que nos seguem que estamos prontos para realizar seus sonhos e mostrar as nossas dificuldades e nossos pensamentos”, relata. Além dos eventos sociais e corporativos, espetáculos, shows e festivais também foram cancelados. Como forma de entretenimento para quem está em casa enfrentando o isolamento social, cantores estão se mobilizando e transmitindo shows gratuitos, via streaming. Artistas como Marília Mendonça, Ivete Sangalo, Jorge e Matheus, Péricles, Luan Santana, Lulu Santos e Fábio Júnior já aderiram à ideia. De acordo com a Associação Brasileira de Empresas e Eventos (Abeoc), o setor gerou faturamento superior a 209 bilhões de reais em 2019 e promoveu cerca de 590 mil eventos no Brasil. Além disso, segundo dados levantados junto ao Sebrae, cerca de 95% do setor é composto por MEI, microempresas e empresas de pequeno porte, somando mais de 297 mil estabelecimentos.

PANDEMIA IMPULSIONA CRESCIMENTO DO E-COMMERCE A Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABCOMM) contabilizou mais de 45 mil pedidos encaminhados a lojas virtuais do país entre março e abril de 2020. Devido à pandemia empresas precisaram, temporariamente, fechar as portas das lojas físicas. Em meio ao novo cenário econômico, estabelecimentos buscam alternativas para manter o fluxo de vendas. A opção mais utilizada vem sendo a migração de operações para o ambiente virtual. Para a Head de negócios e de parcerias da empresa de tecnologia Dooca Commerce, de Novo Hamburgo, Scheila Sprenger, o crescimento de vendas de e-commerce nos últimos meses está re-

lacionado a uma questão de mercado. “Desde o início do isolamento social as empresas que ainda não estavam vendendo online precisaram correr para digitalizar as suas operações”, explica. Segundo Scheila, já na metade de março, o número de interessados na plataforma da Dooca aumentou consideravelmente, inclusive de empresas que estavam em dúvidas sobre possíveis investimentos em uma loja virtual. Pesquisa realizada pela empresa Nielsen de mensuração e análise de dados revelou que entre janeiro e março de 2020 houve um crescimento dos consumidores de e-commerce no Brasil. A pesquisa também indicou que 32% dos compradores realizaram a sua primeira

FOTO DE RUPIXEN

Por Vivian Maurelli

PANDEMIA IMPULSIONOU A COMPRA DE PRODUTOS VIA INTERNET

aquisição de produtos online durante o período da quarentena. A servidora pública Maria Regina Padilha realizou a sua primeira compra em uma loja

virtual durante o isolamento. Ela relata que, como o comércio sempre esteve aberto, não sentia a necessidade de comprar em sites antes da pandemia. “Dessa vez eu

precisava comprar uma roupa para uma ocasião e, como as lojas estavam fechadas e eu não estava segura em sair de casa para algo que não fosse necessário, optei por realizar a compra online”. Maria Regina indica, ainda, que poderá realizar outras compras online, mas que se tratando especificamente de roupas prefere a consulta a lojas físicas. Para Scheila, as marcas que estiverem preparadas para oferecer uma boa experiência de compra virtual aos clientes terão vantagens competitivas, especialmente neste momento. O período de isolamento está evidenciando um “novo normal em que as compras online e as entregas em casa ganharão cada vez mais relevância”, constata.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Economia

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TRADIÇÃO CERVEJEIRA ESTIMULA NEGÓCIO Chef empreende a partir das práticas iniciadas pelos imigrantes alemães na cidade de Feliz

FOTO DE JOSUÉ BRAUN

Por Mateus Braun

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título de Capital Estadual da Cerveja Artesanal, recebido em 2015, não chegou por acaso para a cidade de Feliz. A bebida sempre teve uma grande importância na cultura e na economia do pequeno município, distante 80 quilômetros de Porto Alegre. Foram os colonizadores alemães que trouxeram a tradição da fabricação da cerveja, a partir da metade do século XIX. Hoje, além das festas que celebram a bebida, como o Festival Nacional do Chopp, o costume segue vivo com os cerca de 130 cervejeiros caseiros do município. Além disso, novas formas de negócios surgem a partir daí, como os brewpubs , bares que fabricam e vendem sua cerveja no próprio local. Em alguns casos, a fabricação da cerveja passa de um simples hobby a um negócio rentável. Essa é a história do Lamb Brew Pub. Segundo o chef Thiago Graebin Lamb, um dos fundadores do local, “a ideia surgiu da vontade de beber

ALGUMAS DAS VARIEDADES DE CERVEJAS PRODUZIDAS PELO BREWPUB

a própria cerveja, sem pretensão alguma de seguir no negócio. A primeira brassagem, de apenas 60 litros, foi feita em junho de 2014.” Os amigos se interessaram pelo produto e a procura começou a ficar maior: “Vendo isso como uma chance de negócio, somando que eu atuava no ramo da gastrono-

EMPRESA SE ADAPTA PARA MANTER FATURAMENTO Por Torriê Aliê Breier

Fornecedora de matérias-primas para a indústria calçadista, a Fiber, de Campo Bom, integrante do Grupo Top Shoes Brasil, fez da fabricação de máscaras a solução para manter-se ativa, em plena crise setorial decorrente da pandemia. Para tanto, aproveitou materiais como o knit (malha que une técnicas de tricô a sistemas inteligentes) para desenvolver uma proteção com tecnologia idêntica à da máscara descartável cuja função é proteger a boca e o nariz do usuário, para que a saliva, a mucosa bucal e as secreções respiratórias não tenham contato com um ambiente contaminado por aerossóis, garantindo a segurança através de um filtro de ar que bloqueia pelo menos 95% das partículas em absorção e cuidado contra doenças por transmissão aérea,

mia, pensamos na possibilidade de abrir o brewpub (bar e cervejaria). A ideia logo chamou a atenção de um investidor, que se juntou a nós, e em dois árduos anos entre construção, regularização e toda parte burocrática, abrimos as portas ao público”, relata o chef. No último mês de maio, o Lamb

Brew Pub completou dois anos de abertura e conquista cada vez mais público. Hoje, o pub oferece uma carta de dez variedades de cerveja artesanal e um cardápio com pratos variados, com destaque para os hambúrgueres. Há, também, a ideia de iniciar a comercialização da cerveja na região. O contexto da pandemia acabou impactando no estabelecimento. “Por bom senso, decidimos não abrir o brewpub ao público, para evitar aglomerações e passar por isso o mais rápido possível. Estamos trabalhando com delivery e take away”. O caso do Lamb Brew Pub demonstra como novas formas de negócio podem surgir em um nicho com importância histórica, cultural e econômica. Thiago acredita que a população comprou a ideia de beber a cerveja local e, dessa forma, manter a tradição da cidade: “Vejo as cervejas artesanais locais sendo valorizadas pelo povo da região. Isso nos traz uma esperança de aumento no consumo das artesanais daqui pra frente, e é claro na economia da região”, relata.

ECONOMISTA PREVÊ APROFUNDAMENTO DA CRISE

neste caso, o Covid-19. Por Vitor Westhauser Segundo o diretor da Top Shoes Brasil, Gustavo Dal Pizzol, A difícil condição financeira do a ideia de desenvolver máscaRio Grande do Sul não é novidaras surgiu da necessidade de de, mas pode se agravar ainda mais dar andamento nos negócios devido à pandemia da Covid-19. O da empresa: “não poderíamos Estado já vem há alguns anos com ficar parados esperandificuldades em suas contas do o que aconteceria. públicas, e pode enfrentar Reunimos a equipe de desafios ainda maiores. É desenvolvimento e tio que prevê a professora vemos o entendimento de Economia da Unisinos, de idealizar as máscaras, Janaina Ruffoni Trez. observando a necessiDe acordo com a profesdade do consumidor e sora, há dois pontos imporEspecial buscamos uma melhoria tantes a destacar quando se COVID-19 do produto, tendo em trata da economia do Rio vista o que o mercado Grande do Sul: primeiro, já estava oferecendo à a dívida pública. Segundo população. Nossa maior preoponto, a desindustrialização do Estado. cupação foi com a proteção que Em relação à dívida, Janaina destaseria oferecida pelo produto.” ca que não é atual, “ela é histórica e se As máscaras de proteção intensifica” com a crise da decorrente reutilizável e o filtro podem ser da pandemia. Fator que, segundo adquiridos através do site masa professora, dificultará a retomada caraknit.com.br/products/maseconômica. Lembra que esse não é um cara-reutilizvel-knit. fator exclusivo do Rio Grande do Sul,

pois situações semelhantes ocorrem, como no estado do Rio de Janeiro. Devido à crise da Covid, os estados estão com uma menor atividade econômica, o que significa uma receita menor, enquanto as despesas continuam. Janaina enfatiza que “o governo vai precisar de apoio nacional. Provavelmente, apoio do governo federal”. O segundo ponto é o fato de o Rio Grande do Sul passar por uma desindustrialização precoce. De acordo com Janaina, “já vem acontecendo há alguns anos, antes da situação da Covid. Perdemos capacidade de geração de renda na atividade industrial, e isso não é substituído”. Segundo a economista, a crise da Covid-19 ampliou as dificuldades para a retomada da economia. Ela vê incerteza sobre o tempo necessário pra a recuperação, pois depende de fatores como retomada economia nacional e da internacional, como remédios para o vírus, “circunstâncias que ainda não sabemos quando vão acontecer”.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

OPINIÃO

RAIN ON ME: ESTÉTICA CAMP DAS PISTAS Após retornar ao cenário pop e adiar o lançamento de Chromatica, seu sexto álbum de estúdio, a cantora Lady Gaga lançou, em conjunto com Ariana Grande, sua mais nova música de trabalho, Rain on Me. Mesclando duas gerações de divas, a canção chegou ao topo da parada de canções mais vendidas do mercado fonográfico norte-americano e conquistou a legião de fãs das cantoras. Enquanto Stupid Love, carro chefe do álbum, contou com batidas eletrônicas, elementos do synthpop e reverenciou os grandes hits dançantes dos anos 1980, Rain on Me traz as referências do house e do dance, gêneros musicais famosos nos anos 1990, e atrai uma multidão de pessoas que careciam de música pop, seja para dançar, gritar ou apenas ficar com a letra grudada na cabeça. Mais sombrio, enigmático, futurista e tecnológico que o vídeo de Stupid Love, Rain on Me traz uma Lady Gaga “raiz”, mas com

FOTO DIVULGAÇÃO

Por Ângelo Gabriel

visuais não tão esquisitos e peculiares como estamos acostumados a assistir em clipes antigos, como Judas, Applause e Bad Romance. No entanto, o clipe mata a saudade de tempos mais simples, onde a música pop trazia, acima de tudo, melodias contagiosas, fortes e necessárias para as pistas de dança. Com uma chuva que causaria inveja em São Pedro, facas caindo

HUNTERS E A CULTURA NEFASTA DO NAZISMO Por Estephani Richter Gehrke

A Amazon lançou em fevereiro deste ano no Prime Vídeo, sua plataforma de streaming, a série Hunters. A Produção de Jordan Peele conta com a participação de grandes nomes de Hollywood, entre eles está Al Pacino, Logan Lerman e Josh Radnor. A série se passa na New York de 1977 e gira em torno de um grupo de pessoas que descobrem a presença de nazistas nos Estados Unidos e decidem iniciar uma caça aos nazis. Com uma trama envolvente, a série consegue cativar o espectador, deixando um gostinho de quero mais provocado pelo seu final inusitado. A história é inspirada em fatos reais e mistura drama, ação e uma espécie de humor com sarcasmo. Vários nazistas conseguiram se esconder nos Estados Unidos, com identidades falsas, através da ajuda do próprio

governo. Detentores de altos cargos, planejavam levantar em território norte-americano o Quarto Reich. A série se passa em meados dos anos 1970, época em que, aparentemente, haveria um sentimento antinazista nos Estados Unidos. Hoje em dia, infelizmente, volta e meia surgem posts nas redes com referências à suástica. Pergunto-me: o que leva alguém, em pleno século XXI, a defender movimento que provocou milhões de mortes? Travis Leich, interpretado por Greg Austin une-se aos nazistas e consegue e transforma-se em líder. Em um dos episódios é possível perceber que o personagem cresceu com uma família que lhe deu carinho. Finge arrependimento. Seria isso uma questão de psicopatia ou falta de caráter? Ou será que Rousseau estava certo: a sociedade é que corrompe o ser humano?

do céu e coreografia marcante, o segundo single do Chromatica traz uma visão mais detalhada e colorida do que Gaga planejava ilustrar. De primeira, o vídeo causa certa estranheza por conta dos visuais datados e amadores. Nos leva até a questionar como Lady Gaga, em mais um dos seus picos de carreira, teve a audácia de trazer um clipe

com gráficos desleixados e batidos. A resposta, na verdade, é bastante simples. Tanto a música, quanto o vídeo nada mais são do que a estética Camp apresentada pela cantora durante toda a sua carreira. Camp, que já foi até um dos temas do baile de gala do Metropolitan Museum of Art, em Nova York, pode ser explicado como um estilo artificial e exagerado, nada natural e completamente extravagante. Ou seja, Rain on Me é Lady Gaga em seu habitat natural de identidades transformadoras e únicas. Apesar de não questionar morais, chocar o mundo e possuir produções marcantes que se consagram como triunfais e importantes para a construção da persona de Gaga, a música é mais um capítulo da história da cantora. Ela pode não ter quebrado os parâmetros da música pop, como os trabalhos mais antigos, mas certamente se estabelece como um suspiro de novidade no novo pico da carreira de uma das mais grandiosas cantoras desse gênero da nossa geração.

O RELANÇAMENTO DO POP EM PLENA PANDEMIA Por Lisandra Steffen

A cantora norte americana, Katy Perry, lançou recentemente a música Daisies . Ela vem lançando alguns clipes após o encerramento do álbum Witness, mas este é o lead single do quinto CD de estúdio da cantora, com lançamento previsto para 14 de agosto. Grande parte dos lançamentos acontecem no período do verão estadunidense, mas, devido à pandemia, muitos artistas decidiram adiar os projetos. Na contramão, Katy Perry, tomando os cuidados necessários, continua com o calendário ativo. Em entrevista, relatou que o álbum estava previsto para junho, mas que foi adiado pela quarentena. “Nós adiamos, mas eu não quero adiar muito, porque vou ter um bebê em breve”, contou a artista que está grávida de oito meses. A escolha de Katy é bastante

interessante, já que as pessoas do mundo inteiro estão em isolamento e continuam consumindo produtos culturais. Ela continua se promovendo e alcançando pessoas do mundo todo, já que, para comemorar o lançamento da música, ela “invadiu” algumas reuniões no aplicativo Zoom para conversar com fãs. Além de continuar alimentando a indústria musical, a cantora também explora diversas ferramentas para o período da pandemia - mostrando que é uma pessoa como qualquer outra. Daisies - mais uma música que se assemelha a hits como Firework, I Kissed a Girl, Dark Horse e Hot n’ Cold - fala sobre correr atrás dos sonhos e não se importar tanto com críticas. O clipe foi gravado no quintal e nos arredores da casa da cantora. A artista está tendo que se reinventar para o trabalho, assim como muitos de nós.

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São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Formação

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CURSOS PROFISSIONALIZANTES APOSTAM NO MÉTODO EAD Adaptações exigidas agora podem transformar o ensino após a pandemia, segundo professores e alunos ouvidos pela reportagem

Por Thariany Mendelski

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esmo com a falta de acesso a recursos básicos de internet ou computadores para muitos alunos, o ensino à distância é uma tendência que tem tudo para permanecer depois da pandemia. Essa é a opinião de Adriana Zimmermann, 40 anos, professora e sócia da escola Capacite, que oferece cursos de qualificação administrativa, industrial, informática fundamental, cursos de idiomas e área da saúde. O novo coronavírus impactou negativamente em muitos setores e na educação não é diferente. As escolas profissionalizantes e os cursos de idiomas ouvidos pela reportagem não tiveram aumento de alunos durante esse período. Para as instituições que já possuem tecnologia e prática no EaD, este momento se revelou como uma oportunidade de trazer mais pessoas para conhecer o modelo de ensino. Já para os educadores, o desafio é ainda maior. Apesar de alguns já terem experiência com esse método, buscar novas metodologias e plataformas para garantir a formação adequada exige estudo e adaptações. Sandro Teixeira, formado em comércio exterior, tem pós graduação em controladoria e finanças e atualmente está cursando pós-graduação em educação EaD e curso superior, Sandro é professor há quase 20 anos. Ele afirma que a maior dificuldade na hora de adaptar os conteúdos é a não participação dos alunos, tirando dúvidas, questionando e trazendo exemplos. “Eu fiquei com dificuldade para fazer com que eles contribuíssem na aula com questionamentos, perguntas. Tem alguns alunos que não questionam e preferem não opinar. Em sala de aula, incentivaríamos esse aluno a falar, então isso é uma dificuldade à distância”, conta o professor. Seus métodos de ensino são aulas expositivas com vídeos, exemplos e discussões. Para Sandro, o professor tem o papel de explicar e dar um norte do conteúdo abordado, trazendo vídeos, artigos, textos e avaliações com base no conteúdo estudado. “Todo ser humano precisa ver um início, meio e fim nas coisas, o aluno quando vê isso faz com que ele fique mais engajado, mas para isso tem que ter disciplina”, salienta. Talita Feijó, 25 anos, professora de inglês da Wizard Gravataí, acredita

que esse é um momento de debate. “O ensino à distância faz com que seja necessário sairmos um pouco da nossa zona de conforto. No ensino de idiomas, por exemplo, a conversação se torna mais ainda o principal foco”, declara. Para ela, a educação deveria ser acessível a todos a qualquer momento. Se o aluno não vai até a escola, então a escola vai até o aluno. “Perder o contato com o assunto no qual se estuda pode ocasionar uma regressão no desenvolvimento, logo é nosso papel fazer com que a educação seja cada vez mais compartilhada”, explica.

O ensino à distância faz com que seja necessário sair da nossa zona de conforto Talita Feijó Professora de inglês

Talita afirma que esse é o momento dos professores mostrarem o seu melhor para que ninguém seja prejudicado no ensino. “Estarmos disponíveis para tirarmos dúvidas, dar voz a todos no momento da aula e, principalmente, entender que é uma pandemia, que talvez alguns não consigam participar de alguma aula ou realizar alguma tarefa solicitada por motivos de saúde mental ou falta de recursos ou de um ambiente saudável”, relata.

INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

A educação a distância é uma modalidade educacional que oferece um processo completo de aprendizado de maneira dinâmica e medida através da tecnologia. Antes da pandemia, o sistema de ensino a distância vinha crescendo no Brasil, sendo um dos mercados em ascensão no país. Segundo Jéssica Feijó, 28 anos, diretora da Wizard Gravataí, a adaptação dos cursos de idiomas para a modalidade EaD ocorreu de forma bem tranquila. A escola possui uma plataforma própria para aulas online ao vivo e também foi realizado treinamento com os professores

antes de disponibilizar aos alunos. Para Jéssica, a obrigação de migrar para o online tão repentinamente fez com que muitos professores vissem que há um mundo de aplicativos legais e que podem ser utilizados na sala de aula física após pandemia. Essas mudanças no método de ensino vieram para ficar, afinal o mundo está cada vez mais tecnológico.

VANTAGENS E DESAFIOS

Existem muitas vantagens em adotar o método EaD, além de poder estudar em horário flexível, o aluno normalmente paga mensalidades mais baratas, não perde tempo com deslocamento e tem à disposição um conteúdo mais dinâmico. Mas estudar à distância também exige mais do aluno. Luciano Paz, 20 anos, estudante do técnico em segurança do trabalho do Senac Gravataí afirma que a principal dificuldade enfrentada com o método EaD é a parte de tirar dúvidas, não ter a presença física de um professor para perguntar. Apesar disso, ele considerou a experiência surpreendente. “Tem certas dificuldades, mas é flexível”, resume. FOTO DE MAKIENI777 / PIXABAY

COM A PANDEMIA, ESTUDAR EM CASA VIROU NECESSIDADE, O QUE PODE AJUDAR A CONSOLIDAR A MODALIDADE


Especial COVID-19

Educação

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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NAS ESCOLAS PÚBLICAS, SÓ ATIVIDADES REMOTAS Adaptação do ensino durante a quarentena mudou a rotina de professores, pais e alunos no município de Parobé

FOTO ARQUIVO PESSOAL / JOCE HELENA HENCKEL

Por Michele Alves

R

otina corrida, noites mal dormidas, dores de cabeça e estresse frequente podem, em parte, definir a vida de um professor. O que diferencia os profissionais é a forma com que lidam com esses obstáculos. A professora Scheila Gnoatto Stumm é um exemplo de profissional que lida com esses males, mas teve de encontrar novos recursos para dar conta da rotina de atividades remotas durante a pandemia. Há 16 anos no ensino estadual, ela se divide entre duas escolas. Na parte da manhã, Scheila dá aula na escola municipal Teresinha Ivone Homem e na parte da tarde na Escola Estadual Engenheiro Parobé. É uma profissional que ama o que faz e aprecia compartilhar o dia a dia em sala de aula com seus alunos. Diante do cenário que afastou 1,4 milhão de profissionais de educação que atuam no ensino fundamental no Brasil, a professora busca alternativas para manter o padrão de ensino, mesmo à distância. Com apenas seis dias de aula presenciais na escola Engenheiro Parobé neste ano letivo, a maior dificuldade no planejamento das aulas foi pelo pouco tempo que teve para criar vínculos com seus alunos antes da suspensão. “Tive dificuldades para planejar atividades para serem realizadas de maneira remota, pois não havia experenciado esse formato de ensino, ainda mais no ensino fundamental”, ressalta. Para Elisandra Gabert de Moura, mãe da aluna Izadora, do quarto ano, da mesma escola onde Scheila leciona, admite que no início achou muito estranho a filha não estar indo para a aula, mas se considera sortuda por sua filha ser muito estudiosa e demonstrar interesse em realizar as atividades enviadas por sua professora via WhatsApp para o telefone de sua mãe. Esse também é o meio utilizado por Scheila para direcionar atividades. O papel de cada família nesse cenário é de suma importância para cobrar e auxiliar os pequenos nas atividades enviadas. Antes de mais nada, a professora precisou adotar a estratégia de acalmar os estudantes e seus familiares. Ademais, disponibilizou auxílio em tempo integral, pois observou que a maioria dos seus educandos precisavam esperar seus pais chegarem do serviço para terem acesso ao celular e realizarem os temas propostos. Joce Helena Henckel é mãe de dois alunos da mesma escola. Arthur estuda no oitavo ano e Mateus no quinto. O estudante do quinto ano faz parte da classe

MATEUS CONTA COM A AJUDA DA MÃE, JOCE, PARA REALIZAR TAREFAS EM CASA

da professora Scheila. Joce demonstra satisfação com os meios que a professora tem passado conteúdo. “Gostei muito do método utilizado pela escola e profissionais, porque assim o aprendizado dos meus filhos não fica estagnado”, analisa. A mãe diz que recebeu auxílio e suporte dos coordenadores e professores quando encontrava dificuldades para ajudar seus filhos nas tarefas. Assim como Scheila, o professor Jomar Faustino da Rocha, que leciona Geografia na escola estadual João Mosmann, precisou prestar assistência a seus alunos em horários diferenciados. Ele disse que alguns estudantes o

O problema é que eu não consigo ter o controle de quem precisa de ajuda em alguma atividade Jomar Faustino da Rocha Professor

procuraram através das redes sociais utilizando o bate-papo do Messenger para tirar dúvidas. “O problema é que eu não consigo ter o controle de quem está realizando os exercícios e nem quem precisa de ajuda ou esclarecimento de alguma atividade”, comenta.

SEM CONEXÃO

Diferente cenário é para as famílias que não têm acesso à internet em casa, suporte ou instrumentos tecnológicos necessários, como a família de Nicoly e Lorenzo, que estudam no oitavo e quinto ano da escola João Mosmann. O celular foi o suporte encontrado para ter acesso à internet, poder realizar as atividades, pesquisas e tirar dúvidas com professores e colegas. A mãe deles, Lisete Nunes da Silva, ficou assustada quando soube da suspensão, pois teve receio de não conseguir auxiliar os filhos nas lições de casa. “Tenho dificuldade de fazer com que eles separem o tempo para brincar e o tempo de estudar estando em casa”, afirma. O coordenador pedagógico da segunda CRE, Clark Balbueno Sarmento, esclarece que a Secretaria Estadual de Educação, através das coordenadorias regionais, orientou às escolas sobre a nova metodologia de aulas programadas e as atividades que deveriam ser envia-

das. Ele afirmou que a rede estadual não utilizou o formato de ensino como aulas à distância. “O que foi utilizado não foram aulas EaD, e sim aulas programadas”, diferencia. Nesse caso, os profissionais fazem o planejamento de atividades uma vez por semana e enviam às famílias de maneira remota ou, em casos de falta de recursos tecnológicos, os responsáveis fazem a retirada do material de estudo na própria escola. O município de Parobé possui cinco escolas de rede estadual que atendem o total de 2043 alunos. As 28 escolas municipais da cidade deram seguimento ao ensino de maneira distinta à orientação do Estado. Aproximadamente 10 mil alunos matriculados na rede não haviam recebido nenhuma atividade desde a suspensão das aulas, ainda em março. Para Sheila, há pontos positivos e negativos nas orientações da escola estadual e municipal. “Há o lado bom dos alunos se manterem seguros nas suas casas e seguirem adquirindo e revisando conhecimentos. Entretanto, o modelo remoto não substitui a troca de experiências e o coleguismo em sala de aula”, avalia. Para ela, o ensino presencial, o olho no olho, a possibilidade de atender às diferenças e dificuldades dos alunos é o que mais faz falta nesse período de isolamento social.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Economia

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ESTIAGEM COMPROMETE A SAFRA EM SANTO ANTÔNIO A baixa ocorrência de chuvas no verão prejudicou a produtividade e o ganho dos agricultores, gerando prejuízo superior a 50 milhões de reais FOTO DE AMANDA BERNARDO

Por Amanda Bernardo

A

safra de grãos, em 2020, registrou queda de 28,7% em relação ao ano passado no Rio Grande do Sul. Em Santo Antônio da Patrulha, a perda foi avaliada em mais de 50 milhões de reais. Os dados são da Emater/RS e preocupam os especialistas em decorrência da estiagem que atingiu a região. A principal cultura afetada no estado foi a soja, com queda de 45,8% na produção. A estimativa de perda na produção do milho, em Santo Antônio, chegou a 50%, o que representa prejuízo de 3 milhões. Em seguida, vem a cana-de-açúcar, com 40%, o aipim, também com 40%, e a soja, com 30%. Financeiramente, o maior impacto ocorreu nas lavouras de aipim, com perdas estimadas em 12 milhões de reais. Na Granja Ribeiro, a produtividade atingiu o volume esperado, mas exigiu esforços redobrados. Alessandra Ribeiro, estudante de agronomia, conta que o plantio do arroz precisou de mais água e que o gado sofreu com o campo seco. Apesar disso, a procura aumentou nesse período de-

ÁREA DE PLANTIO DE AVEIA E CANA-DE-AÇÚCAR DO AGRICULTOR LONI JOÃO

vido à baixa produtividade de outros produtores da cidade. O agricultor Loni João, que produz para a subsistência da família, sofreu perdas na cultura do milho, feijão, cana-de-açúcar e aipim. Neste ano, não foi possível utilizar o milho para consumo humano, priorizando,

FARROUPILHA DECRETA SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA Por João Teixeira

Desde o início do ano, Farroupilha, na serra gaúcha, acompanha a estiagem na barragem do Burati, situação que levou o município a decretar situação de emergência. O gerente da Corsan, Elton Ernzen, explica que as chuvas que passaram pela cidade não foram suficientes e a barragem está cinco metros abaixo do nível ideal. A Corsan realizou campanha de sensibilização pelo uso consciente da água com o intuito de evitar o racionamento e a utilização da Barragem Julieta, também localizada em Farroupilha. Embora o volume de água ainda seja considerado grande na Barragem do Burati, Ernzen ressalta a necessidade de uma obra de alteamento como forma de prevenção em períodos de seca. “Com essa medida vamos armazenar mais água para eventos de estiagem acentuada, pois aumentando a altura da barragem

estaremos também ampliando a nossa autonomia futura”, explica. A prefeitura de Farroupilha publicou decreto que proíbe a lavagem de veículos automotores de qualquer espécie, de telhados, paredes, calçadas e pátios das residências, além da irrigação de jardins e hortas. Outro item também veda a utilização de água em qualquer atividade que possa caracterizar desperdício. Para a indústria, comércio e residências há restrição do uso de água ao mínimo possível. Pessoas flagradas desperdiçando água serão notificadas e, em caso de reincidência, serão aplicadas as sanções cabíveis. O morador próximo da barragem, Maurício Piccoli, relata que nunca viu ninguém dando a devida importância para a situação. “Não desperdice água. Lave menos carros e calçadas, não polua e preserve o que é nosso. Salve o nível de água da barragem”, conclama.

assim, a alimentação do gado. A seca impediu o crescimento da planta, resultando em poucas espigas com poucos grãos. Na plantação de feijão, apenas 50% dos grãos puderem ser aproveitados e, na de aipim, de 20% a 30%. Para o gado, os impactos foram

diversos e severos. Além da pastagem comprometida, a água também se tornou escassa. Na chácara de Loni, a vertente que levava água ao gado secou, sendo necessário utilizar o poço artesiano. A Corsan não atende a região da Lomba Vermelha, onde está situada a sua moradia, e desde meados de 2013 a comunidade é atendida por uma vertente comunitária. A cana, utilizada para a alimentação do gado, rendeu nessa safra cerca de 40% do rendimento em comparação ao ano anterior na área de Loni. Em 2019, duas moitas de cana formavam um feixe com, aproximadamente, 25 canas. Nesse ano, contudo, foram necessárias cinco moitas para formar o mesmo feixe. Para auxiliar os produtores rurais, a Emater elaborou laudos técnicos com os resultados da safra. Os documentos foram entregues às instituições financeiras, permitindo que os agricultores consigam prorrogações dos prazos de pagamento. A empresa elabora, também, laudos para que a prefeitura municipal realize a limpeza e a abertura de reservatórios de água na cidade.

PLATAFORMA COLABORATIVA DIVULGA NEGÓCIOS DO LITORAL Por Mayana Serafini

Com o intuito de auxiliar pequenos negócios do litoral norte gaúcho no enfrentamento da atual crise econômica, Filipe Souza e Kássio Fraga criaram a plataforma digital “Vê Pra Mim”. Através de perfil criado na rede social Instagram eles realizam contatos com os comerciantes da região, oportunizando a estes que apresentem seu portfólio de produtos e seus contatos junto ao site e às redes sociais do projeto. Juniara Rocha foi uma das participantes da ação, que hoje conta com mais de 50 empreendedores beneficiados. Sua empresa, a Formiga Pimenta, surgiu inicialmente como uma forma temporária de gerar renda, mas acabou se tornando o seu projeto de vida. A empresária relata que, com a chegada do coronavírus, foi necessário adaptar o fluxo de vendas e que, através do projeto “Vê Pra

Mim”, encontrou alternativas para divulgar o seu negócio. A plataforma possibilitou que Juniara anunciasse que suas entregas, antes realizadas semanalmente nos comércios de Santo Antônio da Patrulha, agora ganharam a opção de telentrega também para as demais cidades da região litorânea. Mesmo após o fim da pandemia e o retorno das atividades regulares, Filipe e Kássio pretendem manter a plataforma ativa. Os jovens empreendedores querem seguir fomentando o comércio no litoral gaúcho através da inserção dos pequenos negócios no mundo digital. O “Vê Pra Mim” proporciona a criação de uma rede de pessoas, estimulando o giro da economia em contextos locais. Do mesmo modo, promove a colaboração em um momento de crise, permitindo que comerciantes expandam a visibilidade de seus negócios para além de suas estruturas físicas.


Geral

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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PROJETO AUXILIA MULHERES NA LUTA PELA AUTOESTIMA Iniciativa reuniu participantes de diferentes idades, via Instagram, com o objetivo de promover momentos de reflexão e autocuidado FOTO DE MARIANA ROSA

Por Júlia Möller

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o pesquisar pelo termo “autoestima” no Google inúmeras páginas sugerem conteúdos relacionados ao assunto. O que muitas vezes não se percebe é que na maioria delas os protagonistas são mulheres. O tema da autoestima sempre foi abordado no Instagram da influencer Mariana Rosa, 24 anos, que no mês de maio lançou o projeto intitulado “10 dias de autoestima”. Com o intuito de ajudar mulheres, a estudante de Jornalismo se valeu de sua experiência e autoconhecimento para criar desafios simples, permitindo às participantes momentos de reflexão e cuidados consigo. A influencer conta que, além de considerar que toda mulher precisa de autoestima, ela acredita que essa avaliação subjetiva de si também pode salvar vidas. Cerca de 100 mulheres aderiram ao projeto lançado por Mariana, que teve início na primeira semana de maio. Todas foram adicionadas a um grupo do WhatsApp para auxiliar no recebimento dos desafios lançados

IDEALIZADORA DO PROJETO ORGANIZOU OS DESAFIOS DE CASA

diariamente. No Instagram foi utilizada a hashtag #EuVouComAutoestima para o compartilhamento dos desafios. A maioria das participantes tinha menos de 30 anos, mas o que

CTGS MIGRAM ATIVIDADES PARA O AMBIENTE VIRTUAL Por Rafaella Schardosim

Com o aumento de casos do novo coronavírus, Centros de Tradições Gaúchas de todo o país foram obrigados a cancelar as suas atividades presenciais. O CTG Aldeia dos Anjos, de Gravataí, buscou alternativas para contornar essa situação e passou a promover ensaios nas plataformas digitais, contando com o auxílio dos instrutores e com a colaboração dos alunos. Os encontros da categoria mirim do CTG passaram a ocorrer no aplicativo ZOOM, às segundas-feiras, divididos entre meninos e meninas, com duração média de uma hora e trinta minutos. Para participar é exigido que peões e prendas estejam vestidos a caráter. “Os locais para ensaio agora são o quarto, a sala, o corredor ou, até mesmo, a garagem”, afirma Alexandre Gonçalves, 43, instrutor da categoria mirim. Segundo ele, a adaptação ao ambiente virtual ocorreu de forma tran-

surpreendeu Mariana foi identificar a adesão de uma senhora de mais de 60 anos ao projeto. Para Juliana Tarachuck, 23 anos, consultora e merchandising de ven-

das, o que a levou a participar da iniciativa foi identificar suas constantes recaídas em relação à autoestima. “Muitas vezes me acho incapaz e me sinto insegura”, confessa. Em relação ao projeto, ela destaca que considerou particularmente interessante o desafio de redigir uma carta para si mesma no passado. Para a profissional de relações públicas Amanda Soares, 24 anos, inserir-se no projeto foi instigante na medida em que permitiu que parasse um pouco para refletir e olhar para dentro de si. O segundo desafio foi o que mais a sensibilizou, considerando que as participantes foram chamadas a conversar com amigos para entender como as suas relações de amizade foram sendo construídas e consolidadas ao longo dos anos. O projeto, que se estendeu até o dia 13 de maio, terá uma segunda edição, mas Mariana salienta que mudará o formato para que possa ter mais controle em relação ao cumprimento dos desafios. Ela está empolgada e considera que novas ideias para projetos ainda mais desafiadores irão surgir.

MAIS DE 40 ESCOLAS DE DANÇA PROMOVEM FESTIVAL ONLINE

quila. O instrutor reconhece, porém, Por Vitória de Souza Drehmer que os encontros presenciais oferecem uma interação maior, permitinCom o objetivo de estimular baido que ele corrija pequenas falhas e larinos e professores, pessoas de acerte cada detalhe das coreografias. todo Brasil se reuniram para proProfessor há 21 anos, Alexandre afirma duzir o Festival Todos Pela Danque, em meio à pandemia, os ensaios ça. O evento, realizado de forma no ambiente digital repretotalmente online, contou sentam uma alternativa para com a participação de 50 que os alunos mantenham escolas e foi dividido em seus compromissos com oito modalidades: Balé o CTG e não permaneçam Clássico, Dança Contemacomodados em casa. porânea, Jazz, Sapateado, A participante da cateDanças Urbanas, Estilo Livre goria mirim, Méllany Borba, e a Dança do Ventre. Especial 12, conta que sente saudade Aluna do Studio Greyce COVID-19 dos encontros presenciais. Gross, de Sapucaia do Sul, “Espero que isso passe logo Raissa Zaions ressalta as dipara poder sentir aquela ferenças do festival online. emoção de pisar em um tablado, de “O processo em si não é tão difetorcer e de chorar após uma apresenrente, mas foi muito mais cansativo tação bem feita. Quero ver os amigos e estressante. Toda a preparação da de outros CTGs e poder ouvir nosso gravação leva muito mais tempo nome em cada resultado”, afirma. A do que estamos acostumados nos aluna lembra que a experiência virtual festivais presenciais”, enfatiza. é diferente, mas se faz necessária neste Para participar, cada aluno preciperíodo de isolamento. sou gravar um vídeo de casa, apre-

sentando uma coreografia escolhida pelo professor ou por si próprio. As avaliações das apresentações e das edições dos vídeos foram feitas por uma banca de jurados e contaram com a interação do público, que conseguiu votar através das redes sociais. “Participar do festival foi uma experiência incrível. Nós tivemos algumas dificuldades nas edições dos vídeos, mas tudo se encaminhou. Algumas de nossas bailarinas já foram destaque na competição”, salienta Pamela Klock, proprietária da Pamela Klock Escola de Dança, também de Sapucaia do Sul. A programação do festival foi dividida por categorias em finais de semana diferentes. As classes Baby e Infantil foram as primeiras a se apresentar, de 29 a 31 de maio. A Infanto Juvenil fez sua participação de 5 a 7 de junho. A Juvenil se apresentou de 12 a 13 de junho. Já as divisões Avançado e Master fecharam a programação nos dias 19 a 21 de junho.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Geral

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CASA DO IMIGRANTE BUSCA RECURSOS PARA REABRIR Local que abrigou os primeiros alemães a chegarem ao Brasil em 1824 está fechado há seis anos e sofreu desabamento em 2019 FOTO DE MARIANE DINECK

Por Mariane Dineck

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Casa do Imigrante, em São Leopoldo, que abrigou as primeiras famílias alemãs chegadas no Brasil em 1824, sofreu com um desabamento em março de 2019. Quinze meses depois, o espaço ainda não foi coberto e se mantém através de doações de pessoas físicas e jurídicas. Projetos para o restauro do local estão em andamento e contando com a participação da Prefeitura e da Unisinos. O local, administrado pelo Museu Histórico Visconde de São Leopoldo, está fechado para visitação desde o ano de 2014. A casa foi construída em 1788, onde funcionava a Real Feitoria do Linho Cânhamo e abrigava escravos que produziam matéria prima para os navios. Anterior ao desabamento, o projeto Março Zero já existia e previa as benfeitorias no local e a construção de um parque. Cássio Tagliari, presidente do Museu Visconde, comenta a expectativa para iniciar as atividades e as dificuldades que enfrenta no meio político para iniciar os projetos. Juntamente com outros voluntários, Cássio busca apoio financeiro para recuperação da parte do museu que

ESPAÇO HISTÓRICO-CULTURAL ESTÁ FECHADO HÁ MAIS DE SEIS ANOS

desabou. A prefeitura da cidade encaminhou projetos ao Ministério da Justiça, buscando recursos federais, mas não obteve sucesso. Um termo de cooperação técnica será assinado entre a Prefeitura, a Unisinos e o Museu Visconde.

Segundo Cristina Seibert, professora da Unisinos, existem três grandes conjuntos de projetos para o restauro acontecer: O primeiro é o levantamento cadastral, que consiste em medir, fotografar e analisar como a edificação está atualmente. O segun-

do é o diagnóstico, para identificação de todas as patologias e problemas estruturais que a edificação possui. Esses dois primeiros projetos serão realizados pelos cursos da Universidade, entre eles, Arquitetura, Engenharia, Biologia e História, que irão estudar a edificação para dar início ao terceiro projeto. O terceiro projeto é o restauro em si, que será realizado em outro formato e precisará de auxílio financeiro e a liberação para realização de campanhas. Para arrecadar fundos, os voluntários estão em busca de recursos do governo e de empresas privadas. “O termo de Cooperação Técnica já passou pelo Jurídico e está finalizado, mas como as atividades não estão acontecendo presencialmente, os projetos estão parados”, diz Cristina. Com as atividades presenciais suspensas na Universidade, devido à pandemia do Covid-19, o termo ainda não foi assinado. A expectativa é de que assim que as aulas retornarem os projetos se iniciem junto à edificação e que os alunos consigam fazer a análise do local. Após, são esperados recursos, por meio de leis de incentivo à cultura, para iniciar o restauro e que em 2024, pelo menos, a Casa esteja reaberta.

COMUNIDADE APÓIA RECUPERAÇÃO DE IGREJA EM PORTÃO Após 15 anos, a Igreja Católica São José, que fica no bairro Estação Portão, passou por uma reforma, que iniciou no dia 20 de fevereiro e se encerraram em maio. Segundo o pároco de Portão, padre Eduardo Botega, a revitalização inclui a substituição de vidros quebrados, reparo nas infiltrações e uma pintura na área externa. Segundo o padre, foram investidos cerca de R$ 70 mil na revitalização do templo, que devia ter ocorrido ano passado, porém o projeto não foi tocado em frente. “Usamos a renda da festa ao Padroeiro São José, do ano passado. Usaríamos a deste ano, porém o evento foi cancelado devido à pandemia”, salienta Botega. Como

alternativa, os fieis contribuíram financeiramente com a quantia que puderam para a realização da obra. A arquiteta responsável pelo projeto, Gisele Lermen, conta que foi feito um estudo cromático específico para a São José, com uma simulação por computador para aplicar as cores e obter uma prévia do visual final. “ Quando é feito um planejamento para uma igreja, deve-se levar em conta que é para um bem comum. Ele não pertence a uma pessoa só, e sim a uma comunidade”, pontua a profissional. Inicialmente, Gisele apresentou três propostas de estudos. Após reunir-se com o padre Eduardo e membros da comunidade, a cor adamascado-claro foi escolhida como tom predominan-

FOTO DE GUSTAVO MACHADO

Por Victorio Araújo

OBRAS PARA A REFORMA DO TEMPLO CUSTARAM R$ 70 MIL

te. Ainda houve um teste de aplicação das tintas na fachada da capela, para que as cores fossem finalmente validadas. Somente após esta etapa foi iniciada a pintura. O pároco e membros da comunidade São José

também querem iluminar a igreja pelo lado externo e programar uma solenidade de reinauguração. Contudo, isso ocorrerá somente após o declínio da pandemia do coronavírus. Presença constante nos

eventos e missas na capela, o estudante de Jornalismo pela Unisinos, Gustavo Machado, relata que o novo visual do espaço está maravilhoso e não vê a hora de voltar a frequentar o lugar. “Costumava ir lá em quase todos os finais de semana. É uma pena que não tenha nenhuma festa para reinaugurar a Igreja em função da pandemia, pois ela merece”, salienta o jovem de 21 anos. Para Gustavo, embora o local não passasse por reformas há mais de uma década, estava em bom estado. “Ela está bem bonita e colorida, mas não chegava a estar feia antes”, diz o rapaz, que frequentava a capela com a família. “Esperamos que essa situação se amenize logo para que possamos voltar a frequentá-la”, finaliza.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

OPINIÃO

VIDA ILUSÓRIA, LIKES E MUITAS FRUSTRAÇÕES

ATITUDES QUE MUDAM NOSSA QUARENTENA

Por Daniela K. Gonzatto

e ser menos”. Segundo uma pesquisa realizada pela instituição de Você acorda, pega o celular e saúde pública britânica, a Royal começa a navegar pela internet. Society for Public Health, em parLogo, percebe que uma compara- ceria com o Movimento de Saúde ção ou outra surge em sua mente Jovem, as mídias sociais afetam e a tristeza não tarda a apare- tanto a vida das pessoas, que cer. Acredito que, para alguém chegam a ser “mais viciantes que que não possui contas em redes cigarros e álcool”. Plataformas sociais, essa situação pareça até de imagens, ainda, são piores e um pouco banal. Contudo, isso é trazem grandes malefícios para bastante corriqueiro e afeta a saúde mental. muitas pessoas. Mostrar uma nova conSempre pensei que o quista ou um dia feliz não uso de redes online deveentra no debate – postar ria ser mais unificador que algo relacionado a isso Especial qualquer outra coisa. Afinal, cumpre com a finalidade COVID-19 não estamos ali para ver e dos aplicativos e sites. O contatar amigos, família ou problema em questão é a famosos que consideramos como criação de uma alternativa falinspiração? Olhando assim, parece sa a fim de se sentir superior. surreal imaginar que tanta nega- Ninguém tem uma vida perfeita. tividade role em nosso feed. O Por último, entendo que ainda é mundo moderno gira em torno de preciso frisar que retoques nas likes e parece haver certo charme imagens e montagens não ofeem ostentar algo que não se tem. recem muita coisa, apenas uma Sinto como se embarcássemos satisfação momentânea que logo na necessidade de “mostrar mais é esquecida.

Por Sara Nedel Paz

ABRA NOVAS JANELAS DO SOFÁ DE SUA SALA

O ANSEIO PELA ESCUTA ATRAVÉS DA PICHAÇÃO

diferente. Algo tão simples quanto um celular pode transmitir vídeos À medida que o isolamento através de aplicativos diversos. foi sendo instaurando nos países, Contudo, até quando é saudáo número de consumo de entre- vel nos aventurarmos somente tenimento aumentou. O tempo, no mundo do divertimento? Com que antes era usufruído na com- certeza é um passatempo divertido panhia de amigos e familiares em passar algumas horas acompadiferentes lugares da cidade, como nhando as histórias fantásticas. bares, shoppings, cinemas, Mesmo em casa, podemos parques e festas, agora é tentar outras atividades que gasto dentro de quatro patambém podem ser confiredes, geralmente em cima guradas como culturais. do sofá. A dica é se desafiar. MuiEspecial Estamos passando mais tas pessoas estão desafianCOVID-19 tempo consumindo entretedo a si mesmas aumentando nimento, que vem de várias o seu consumo de leitura. formas: redes sociais, YouTube, Quem antes não tinha tempo para filmes, séries. A mídia online tem ler, devido a correria do dia a dia, tido protagonismo. Segundo da- hoje está lendo 2, 3 livros mensaldos da Kantar IBOPE Media, de 24 mente. O mesmo serve para cursos de março a 5 de abril, os canais online. Agora é a hora. Já pensou pagos da TV registraram cerca de em voltar da quarentena sabendo 20% de aumento de audiência e uma nova língua, por exemplo? os canais de filmes, 60%. Seja ousado nas suas escolhas, viva Hoje, não precisamos esperar o intensamente, mesmo que seja do final da novela para ver um filme seu sofá da sala.

Por Guilherme Santos

Por Vanessa Fontoura

que está intimamente ligada à sensibilidade. Durante o isolamento social, o A fotografia do cotidiano pode que seria melhor do que um bom ser utilizada para se compreender café e um pijama super confortável? como anda diversos fatores de um E se víssemos um registro disso? determinado lugar. Mas de que Sim, a gente sabe que atualmente as forma deveríamos representar o pessoas tem sofrido com a solidão nosso dia a dia em fotografias? e com escassez de ofertas den- Para mim, os ensaios caseiros, tro das inúmeras profissões. Mas mostram como podemos trazer também temos plena consciência um pouco de paz para um moque, mesmo à distância, a mento tão difícil como esse. vida não parou. E precisamos E a beleza está em pequeaprender a se adaptar. nos atos ou até mesmo em É nesse ponto que encostumes. Então, por que tram os fotógrafos! Alnão começarmos a prestar Especial guns profissionais dessa mais atenção nesses segunCOVID-19 área acabaram sendo bem dinhos que iniciam nossas afetados com os cancelamanhãs? mentos repentinos, mas a publiAcho linda a atitude desses cidade não para. Por isso, eles fotógrafos que estão ensinando começaram uma onda de ensaios como podemos ver a beleza na especiais em todos os sentidos. simplicidade. Agora é hora de Esse movimento reforça o poder pensar em o que vamos notar notório da fotografia como tera- no nosso dia de hoje e como pia. Participar deste momento é podemos passar esse momenter um privilégio de conhecer a to adiante. Afinal, juntos somos arte que perpassa os tempos e mais fortes.

Nos grandes centros das capitais brasileiras, há uma enorme concentração de pichações. Escritos por cima de propriedades privadas ou públicas, que clamam serem ouvidas. No Brasil, a pichação surge como um ato político a partir do golpe militar de 1964, muito inspirado no movimento de maio de 1968 na França, que eternizou slogan “é proibido proibir”. Sempre com letras legíveis para que a mensagem seja compreendida. Mensagens como “Abaixo a Ditadura” e “Ditadura nunca mais” estampavam os muros e prédios das capitais. Após esse período, surgiram as pichações de poesia, com frases predominantemente de amor. Depois aparece a pichação como conhecemos hoje: a manifestação da assinatura e escrita do pichador, que transforma seu

spray em microfone e escreve para que todos o escutem, mesmo que quem lê não entenda. A escrita das pichações é inspirada nas capas de discos de bandas dos 80, como Iron Maiden e Metallica. Já a grafia dessas bandas é inspirada em runas anglo saxônicas, que são como o primeiro alfabeto europeu. A escrita foi ressignificada e hoje ocupa todos os maiores centros brasileiros. Pichação é o ato de rabiscar ou escrever sobre a fachada de edifícios, muros, asfalto de ruas e monumentos, usando tinta em spray, estêncil ou rolo de tinta. Pichações manifestam um anseio contra a desigualdade social. São uma forma de dar voz a quem não é ouvido. E instaura debate público naquilo que é considerado vandalismo ou arte. Contudo, é uma busca por reconhecimento social, lazer e adrenalina como formas de protesto.

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Especial COVID-19

Companhia

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PETS AMENIZAM SOLIDÃO EM TEMPOS DE ISOLAMENTO

Estudos indicam que ter um animal pode reduzir depressão e ansiedade. Em organizações da Encosta da Serra, busca por adoção aumentou na quarentena FOTO DE LEILA DONHAUSER

Por Leila Donhauser

A

pós perceber que os moradores do lar geriátrico que administra em Nova Petrópolis estavam se sentindo sozinhos, a empresária Fabiola Gabriela Lied teve a ideia de consultar os residentes sobre a adoção de um animal para alegrar a casa. Quem vê o Bob hoje, não imagina por tudo o que ele já passou. Bob vivia com uma família que foi embora com a promessa de voltar e levá-lo junto, mas isso não aconteceu. Foi quando Fabiola entrou na vida do cão. “O Bob ficava dentro de um sofá e foi muito difícil tirar ele de lá”, conta a empresária. Primeiro, Fabiola levou o cão para a casa dela, para ver como seria a adaptação do animal. Ela diz que o pet não se adaptou com a presença de outros cachorros e que até se questionou se era mesmo uma boa ideia levá-lo ao lar geriátrico. Mas hoje é visível que ele retribui todo o amor que recebe dos avós, que antes apresentavam até mesmo sintomas de depressão. Estudos científicos comprovam que a presença de um pet traz benefícios à saúde. Muitas pessoas solteiras e idosos estão recorrendo à prática da adoção de animais, pois o vínculo com um bichinho de estimação é terapêutico - ainda mais em momentos de isolamento social compulsório, como o que estamos passando devido à pandemia.

TRANSTORNOS

Uma pesquisa realizada pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) comprovou que o número de casos de ansiedade e depressão aumentaram no período da pandemia. O precursor do estudo é o professor Alberto Filgueiras, do Instituto de Psicologia da UERJ, e ele chegou à conclusão de que o número de casos de estresse e ansiedade tiveram um aumento de 80% entre os entrevistados. A psicoterapeuta Ana Cristina Schmitt conta que uma paciente sua já apresentava sintomas de depressão e, após muita insistência, ela aceitou a adoção de um animal. Hoje, ela não consegue mais viver mais sem seu cachorro. “A depressão é um transtorno causado por diversos fatores, mas principalmente pelo fator sentimental. Quando saímos para pegar um sol, ou temos interações com outras pessoas, produzimos

BOB NO COLO DE MARIA ILDA TODDESCATT, RETRIBUINDO TODO O AMOR QUE RECEBE

hormônios positivos”, explica a terapeuta. “Se ficarmos presos dentro de um quarto escuro, produzimos hormônios negativos, o que pode resultar no sentimento de solidão”. Já a ansiedade é um distúrbio onde desejamos algo antes do seu tempo. “Quando a pessoa fica com aquele pensamento que tem que acontecer, ela acelera os batimentos cardíacos, altera a respiração e isso resulta nas crises de ansiedade, ou até mesmo, num estágio mais avançado, um ataque de pânico”, descreve.

ADOÇÃO AUMENTOU

Quem realiza o intermédio entre quem busca companhia e quem precisa de adoção são ONGs como a Focinho Amigo, localizada em Nova Petrópolis, que conta com voluntários que dedicam seu tempo para ajudar os pets que estão em situação de abandono. Kassandra Bertóglio Dorneles, 36 anos, voluntária da ONG, afirma que a função desse projeto é difundir a posse consciente de animais, promover a conscientização sobre a importância da castração de cães e gatos, denunciar abandonos e maus-tratos, lutar pela elaboração e cumprimento das leis que protegem os animais.

Desde o início da pandemia, cerca de 20 animais foram adotados, número que deve ser comemorado, segundo Kassandra. Ela conta que a forma de adoção foi adaptada, para evitar que se tenha contato. Os voluntários realizam os protocolos por meio de fotografias, vídeos, e no momento em que vão entregar o animal o fazem de luvas e máscaras. “Buscamos lares que representem mais que água e comida, mas, também, amor e dignidade”, afirma Kassandra. Na Associação Amigos dos Animais de Dois Irmãos, o número de animais adotados também aumentou nos últimos meses. “Teve muitas adoções, inclusive um animal para-

Buscamos lares que representem mais que água e comida

Kassandra Bertóglio Dorneles Voluntária da ONG Focinho Amigo

plégico, cães que estavam há quatro, cinco anos no abrigo”, conta a presidente da ONG, Sara Capeletti Braun. Tanto a ONG Focinho Amigo, quanto a Associação Amigos dos Animais de Dois Irmãos, possuem um acompanhamento, onde, de tempos em tempos, são solicitadas imagens e vídeos dos animais, se eles estão sendo bem tratados, e se não estão passando por situações de abandono. Segundo as ativistas, a adoção de um animal deve ser algo consciente, saber que esse bichinho pode crescer e futuramente precisar de cuidados. “Animais adotados, especialmente aqueles que já passaram por grandes traumas, deixam clara a gratidão”, afirma Kassandra. Foi assim com a adoção de Xiru, que foi resgatado após ter caçado um ouriço, e precisou de cuidados por estar cheio de espinhos. “Ele deitava nos pés do Rogério agradecendo”, conta a técnica de enfermagem Carine Eibel, lembrando que o marido dormiu ao lado do cão por duas noites seguidas quando ele chegou à residência do casal. “Buscamos lares que representem mais do que água e comida, mas, também, amor e dignidade”, conclui Kassandra.


Especial COVID-19

Proteção

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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EXÉRCITO DE QUATRO PATAS CONTRA O ABANDONO Sem feiras de adoção, entidades protetoras dos animais enfrentam dificuldades para manter o trabalho

FOTO DE RODRIGO JANKOSKI

Por Rodrigo Jankoski

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crise instaurada pela pandemia do Covid-19 mudou a maneira de pensar, de agir e de ser. Das grandes empresas aos pequenos empresários, todos precisaram se reinventar. Com os militantes da causa animal não foi diferente. Em Esteio, na Região Metropolitana de Porto Alegre, o trabalho realizado pela ONG Grupo Esteiense de Proteção aos Animais de Rua (Gepar) precisou passar por uma atualização imediata para garantir a continuidade dos trabalhos e o bem estar dos animais de rua. Um “exército de quatro patas” foi montado para combater a pandemia e os efeitos que ela trouxe para o trabalho de ONGs que dependiam de feiras para encontrar novos lares a animais abandonados. Foi através do grupo de WhatsApp batizado com esse nome que Dina Vicente, 48 anos, presidenta e fundadora da ONG Gepar, capitaneou e organizou um time de colaboradores em Esteio. Ela mapeou os protetores da cidade e reuniu no grupo do aplicativo de mensagens. O grupo, segundo Dina, durante a crise pandêmica, já salvou cerca de 65 animais de rua vítimas de violência. “São tantos os casos de violência que chegam ao longo do dia, que sou incapaz de dizer qual me choca mais. Facada, violência sexual, pauladas, entre outras. Na verdade, eu sei o que me choca, a maldade humana me choca”, diz Dina, visivelmente emocionada. Após a edição dos decretos que proibiram a realização de eventos e reuniões públicas, as tradicionais feiras de adoção de animais, realizadas no centro da cidade, foram imediatamente suspensas. “Precisei pensar em mim, que sou grupo de risco, e na minha equipe. Estávamos apavorados, não sabíamos o que iria acontecer daquela data em diante”, afirma Dina.

CAUSA SE REINVENTA

Os dias se passaram, a crise de saúde pública só aumentou, o isolamento social foi imposto, as doações que outrora eram volumosas, chegaram à casa da nulidade. Com isso, o grupo precisou se reinventar. Usando as redes sociais e grupos no WhatsApp, a equipe deu prosseguimento aos trabalhos. Marilene Zonta, voluntária da ONG Grupo de Amigos e Tratadores de

COORDENADORAS DE ONGS MANTÊM POSTOS DE ADOÇÃO, APESAR DAS MEDIDAS DE ISOLAMENTO

Animais (GATA), fiel escudeira e braço direito de Dina, comenta sobre a assistência que as ONGs estão dando à população em geral, via WhatsApp. “Estamos usando todas as formas digitais para ajudar as pessoas, que

buscam orientações, normalmente, sobre castrações, atendimento veterinário, doações, principalmente de filhotes, pedido de ração e medicações prescritas por veterinária, entre outros”, enumera Marilene.

CASAS DE PASSAGEM

São tantos os casos de violência que sou incapaz de dizer qual me choca mais

Dina Vicente Presidenta e fundadora da ONG Gepar

O abandono diminuiu durante o isolamento social, porém ele ainda existe, e casas de passagem têm sido a alternativa para garantir a sobrevivência dos animais que são retirados das ruas de Esteio. Surgiram diversas ações sociais promovidas por clubes, partidos políticos, pessoas físicas, entre outros, mas todas as ações visam apenas atender às pessoas em geral, muito poucas ou quase nenhuma ação pensou nos animais. A entidade presidida

por Dina recebe apoio estrutural e logístico para a realização das feiras de adoção, e também apoio veterinário do setor de Bem-Estar Animal da Prefeitura de Esteio, para atendimento dos casos de violência aos cães de rua, mas Dina se preocupa com as contas, que estão acumulando em meio à pandemia. “Nossas dívidas nas agropecuárias estão crescendo diariamente, com a quedas das doações de ração, precisamos de alguma forma manter a alimentação dos animais atendidos”, diz. Para ajudar o grupo neste momento difícil, interessados podem procurar a Agropecuária Comércio de Rações Esteiense (Avenida Dom Pedro, 683, centro de Esteio) e deixar pago qualquer valor que pode ser amortizado da dívida das protetoras.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Diversidade

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ONG LEVA ALIMENTO E AFETO A PESSOAS TRANS

Ação solidária distribui cestas básicas a pessoas LGBTQ+, que relatam ainda mais dificuldades para encontrar trabalho durante a pandemia FOTO DIVULGAÇÃO / ONG IGUALDADE

Por Mariana Necchi

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sorridente Raycka Diandra, 38 anos, é a primeira da fila para receber a doação da cesta básica. Natural de Cuiabá, capital de Mato Grosso, ela se mudou para Porto Alegre há um pouco mais de um ano. “Vim em busca de melhores oportunidades de trabalho, ouvi falar que aqui é uma cidade inclusiva para pessoas como eu”, diz a recepcionista de restaurante. Porém, com a crise econômica impulsionada pelo coronavírus, ela se viu desempregada. “Está difícil, mas estou sendo bem acolhida. A ONG Igualdade vem ajudando muito, essa é a forma que eu tenho para garantir alimentação”, declara. A conversa toma uma direção mais nostálgica e confidencial ao relembrar o processo até se descobrir transexual e como ficou a relação familiar: “Eu me descobri aos oito anos de idade. Meus pais são pastores de igreja, então, para eles, é um espírito do mal. Eles acham que existe uma cura”, diz. “Mas, como filha, eles me tratam muito bem. Meu pai e minha mãe são meus alicerces”, conclui. Malu Valatains, 51 anos, é uma das mais preocupadas em manter o recomendado distanciamento social de dois metros na fila de espera. Tímida, ela conta como a sua renda está sendo afetada: “Trabalho com faxinas e perdi quase todas. Estou desesperada”. Para conseguir se manter, ela admite que recorre ao trabalho sexual. “Não gosto, faço por necessidade. Queria mesmo era um trabalho formal, de carteira assinada”, lamenta. A situação da Malu é apenas mais um número para transexuais e travestis do Brasil. Segundo dados apresentados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), 90% dessa população se sustenta com a prostituição. Para Simone Ávila, 55 anos, voluntária na ação, o problema é estrutural. “É o reflexo do preconceito, da transfobia estruturada e naturalizada socialmente”, salienta. Para tentar minimizar as diversas dificuldades e prover um apoio, a ONG Igualdade – Associação de Travestis e Transexuais do Rio Grande do Sul vem exercendo um importante trabalho na luta pelos direitos de transexuais e travestis da capital e região metropolitana. Liderada e presidida por Marcelly Malta, 70 anos, a ONG existe desde 1999. “Inicialmente, era um Grupo de Apoio à Prevenção da Aids (GAPA). As coisas foram se transformando e a Igualdade surgiu porque queríamos um lugar

EQUIPE ONG IGUALDADE DISTRIBUI RANCHOS TODAS AS QUARTAS-FEIRAS NO VILA FLORES

seguro para falar com propriedade sobre nós mesmas, sobre nossas lutas e nossas sobrevivências”, finaliza. Marcelly é reconhecida por seu envolvimento na criação da “terceira do H” em 2012, uma ala do Presídio Central de Porto Alegre exclusiva para travestis e gays, que acabou se tornando modelo para outras prisões no país. Ela também é presidente do Conselho LGBT do Rio Grande do Sul, vice-presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos e vice-presidente da Rede Trans Brasil. No ano passado, a Assembleia Legislativa do Estado a presenteou com uma medalha, dada

Só vamos ter um mundo melhor quando aprendermos a aceitar a diversidade Madalena Leite Psicóloga

pela atual deputada estadual Luciana Genro (PSOL), como agradecimento pela luta e dedicação na defesa dos direitos da população LGBTQ+. Em meio à pandemia do coronavírus, a ideia de distribuir cestas básicas começou a partir das centenas de pedidos de ajuda que recebia através de mensagens no celular. “Tem uma parcela significativa que está passando fome. São pedidos básicos, de arroz e feijão”, afirma. Para ela, o motivo de tanta vulnerabilidade é a marginalização. “A maioria da nossa população trabalha na informalidade, na prostituição. Estamos sempre na linha da frente”, explica. A equipe responsável pela entrega das cestas básicas é formada por cinco pessoas e as doações acontecem todas as quartas-feiras no complexo Vila Flores, localizado próximo ao centro da capital.

LUTA PELA VIDA

Segundo dados levantados pela Antra em 2017, o tempo médio de vida de uma pessoa transgênero no Brasil é de apenas 35 anos. Isso é menos da metade da média nacional, de 76 anos, de acordo com dados divulgados em 2018 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Além disso, o Brasil é o país com o maior registro de homicídios de transexuais no mundo. Estudo feito pela Transgender Europe (TGEu), em 2019, aponta que 40% das mortes acontecem em território nacional. A instituição nacional Rede Trans Brasil divulgou que, apenas no período de janeiro a abril de 2020, foram registrados 64 assassinatos no país. Em comparação com o mesmo período do ano passado, é um aumento de 30% de casos. Para a psicóloga especializada em diversidade sexual e gênero, Madalena Leite, os números negativamente expressivos são causados pela dificuldade em reconhecer o que vai além do binarismo definido pelo masculino e pelo feminino. “A transfobia envolve a sensação de dissonância cognitiva. Uma pessoa trans ou travesti desafia uma lógica estereotipada que a nossa sociedade tem como regra, esse tipo de preconceito tem relação com a necessidade automática de categorizar as pessoas e, consequentemente, invalidar e apagar o que foge disso”, esclarece. “Eu acredito que só vamos ter um mundo melhor quando aprendermos a aceitar a diversidade, que é inerente à experiência de ser humano”, complementa.


Especial COVID-19

Solidariedade

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

TEMPO LIVRE PARA DESENVOLVER A EMPATIA

Mesmo enfrentando o desemprego durante uma recessão econômica, Jaiane e Almerinda encontram maneiras de ajudar os mais necessitados

Por Vitória Pimentel

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olidariedade: sentimento que leva alguém a tentar ajudar outro. A palavra, mais do que uma definição no dicionário, tomou forma no cotidiano dos brasileiros afetados pela pandemia do novo coronavírus. Demitida no final do mês de abril, Jaiane Pinheiro da Silva, 29 anos, usou o tempo livre para ajudar com doações. As 60 máscaras de pano, costuradas junto com sua mãe, foram doadas à Assistência Social do município de Osório, onde reside, e outras 20 foram entregues a ambulantes e vendedores de rua. A atividade, que começou como uma forma de proteger a família, tornou-se um ato de empatia. A ideia inicial era vender as máscaras, conforme pedidos de amigos nas redes sociais. “A cada máscara vendida, eu doaria uma. Mas, na realidade, acabamos doando muito mais. Precisamos olhar para o próximo com mais carinho e atenção”, afirma. O tempo livre, entretanto, veio como consequência do afastamento do cargo de auxiliar administrativa no Centro Universitário Cenecista (UniCNEC), em Osório. Ela trabalhava lá há cinco anos quando entrou para a lista dos cerca de 40 funcionários demitidos no polo de educação desde o início da pandemia. Compreensiva com as dificuldades enfrentadas pela instituição, já esperava pela demissão quando recebeu o telefonema da empresa, no dia 28 de abril. No último mês, todos os funcionários da empresa receberam valores abaixo de seu salário usual. “Apesar das reclamações dos alunos pelo valor da mensalidade não baixar, tem muita gente que não está conseguindo quitar seus débitos com a universidade desde o início da pandemia. O índice de inadimplência aumentou 40%. Isso afeta diretamente os empregados”, explica. Jaiane divide a casa que mora com a mãe, duas irmãs e um tio, todos do grupo de risco. Com o dever de fazer as compras da casa, faz uma lista dos lugares em que precisa ir para evitar sair mais do que o necessário. Desde março trabalhando em casa, ela atendia as demandas dos professores da UniCNEC, que seguem lecionando de forma remota. As dificuldades financeiras enfrentadas pela UniCNEC também afetaram a jornalista Rita de Cassia Rodrigues, 31 anos. Há quatro anos atuando como coordenadora no setor de Comuni-

cação e Marketing, Rita também foi demitida no dia 28. A notícia não foi surpresa: “Desde o ano passado muitos funcionários foram demitidos. Em 2019, foram cerca de 70 e, em fevereiro deste ano, mais 30”, relata. Buscando a qualificação profissional para voltar ao mercado de trabalho logo, ela investe em cursos online de inglês e Marketing Digital. O alto número de demissões não é representativo apenas de Osório. O Rio Grande do Sul ocupa o quarto lugar no ranking de estados que mais solicitaram o seguro-desemprego em abril de 2020, ficando atrás de São Paulo (217,2 mil), Minas Gerais (85,9 mil) e Rio de Janeiro (58,9 mil). Foram 53 mil pedidos de seguro-desempre-

Precisamos olhar para o próximo com mais carinho e atenção Jaiane Pinheiro da Silva Voluntária

go - quase 40% a mais do em 2019, se comparado com o mesmo mês do ano anterior. A reitoria da UniCNEC, via assessoria de imprensa, reitera que “num processo de reabertura, atendendo aos cuidados de protocolos, de acordo com o decreto estadual e municipal, a instituição tem sim o interesse de recontratar estes colaboradores”. A instituição afirma também que as demissões ocorridas em 2019 e em fevereiro de 2020 tratam-se de reestruturações da gestão passada, que não afetaram em nenhum momento o atendimento e as demandas acadêmicas.

ALENTO NAS DIFICULDADES

A falta de renda não é impeditivo para ajudar o próximo. Seja repartindo o almoço da família ou doando R$ 10 para causas sociais, Almerinda de Fátima Pimentel encontra na empatia uma maneira de lidar com o isolamento social. Para ajudar, produziu 30 máscaras de pano que foram doadas para os moradores da Vila Cruzeiro, em Esteio. “Nós entregamos em algumas casas. A sensação de poder ajudar é muito boa, como se fosse um presente”, conta. Aos 62 anos, ela é a responsável pela casa que divide com o marido,

os quatro filhos e o neto de três anos. Enfrentando problemas de saúde e sem conseguir se aposentar, a renda da família vem da pensão por invalidez do companheiro, Hilson Fagundes dos Santos (69), e do salário do filho Hilson Fagundes dos Santos Júnior (22). Seus outros três filhos, Eloisa, Gabriela e Wilson fazem parte dos mais de 12 milhões de desempregados no Brasil, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi na comida, simbólica por unir os parentes, que a mudança foi mais sentida. Neste mês, as refeições vieram de outra fonte: a Rede de Solidariedade Covid-19. A iniciativa visa entregar cestas básicas a cerca de 3 mil famílias das comunidades de Esteio. A rede é formada pelo Lions Clube Esteio Centro e Rotary Club de Esteio, em parceria com a prefeitura do município. Além da ajuda municipal, a família conta com os R$ 600 do auxílio emergencial disponibilizados pelo governo federal. Seja em maior ou menor quantidade de recursos, a disposição de ajudar segue a mesma. “Se eu não tenho nada no armário para ajudar quem está precisando, divido um pouco do arroz, feijão e galinha que tenho na mesa”, conta Fátima. FOTO DE WILLFRIED WENDE / PIXABAY

APÓS SER DEMITIDA, JAIANE COMEÇOU A PRODUZIR MÁSCARAS PARA DOAÇÃO, COM AJUDA DA MÃE


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Especial COVID-19

Vida digital

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VOCÊ ACEITA OS TERMOS E CONDIÇÕES? Conexão forçada na pandemia aumenta a preocupação com a privacidade e com os dados pessoais na internet

Por Tynan Barcelos

“P

reocupem-se”. O ano era 2018 e o alerta a respeito da privacidade e dos dados pessoais partia do CEO da Apple, Tim Cook, em uma conferência em Bruxelas, na Bélgica. O recado dado pelo líder de uma das maiores empresas de tecnologia ilustra o cenário em que nos encontramos. Com a hiperconexão da internet, nos últimos anos, os serviços que, inicialmente, eram gratuitos, passaram a ter um custo importante: a autonomia digital. Por consequência do novo coronavírus, o assunto - privacidade - voltou a ganhar relevância devido ao rastreamento de usuários para monitorar o distanciamento social. Alguns casos, ocorridos no período da quarentena, acenderam o alerta vermelho e geraram polêmica. Um exemplo foram as falhas encontradas, em abril de 2020, na política de privacidade da empresa estadunidense focada em conferências remotas, a Zoom. Já aqui no Brasil, o governo de São Paulo decidiu pagar as merendas escolares através do aplicativo PicPay. Ou seja, pessoas quase sem informação sobre as plataformas, devido à desigualdade existente no país, enviaram seus dados pessoais para uma empresa privada para poder receber o dinheiro de um benefício do governo. Além dos problemas pontuais, devido à pandemia, problemas com privacidade e uso de dados têm sido recorrentes nos últimos anos. O panorama atual não é muito animador. Se, antes, a ideia de que a nossa privacidade estava ameaçada já era preocupante, hoje, a realidade é que ela já está comprometida. O programador e apresentador do podcast Tecnocracia, Guilherme Felitti, é bem direto quanto à situação em que estamos: “A pergunta parte da premissa errada de que ainda existe alguma privacidade online. Não há”. O programador ainda complementa citando o título utilizado em um dos seus episódios do Tecnocracia, como argumento para ilustrar a nossa situação atual: se a vigilância é o novo normal, a gente precisa ter controle dos nosso dados.

REGULAMENTAÇÃO

Cada vez mais populares, as redes sociais já protagonizaram alguns casos envolvendo o comprometimento da privacidade e dos dados

pessoais de seus usuários, como escândalo entre Cambridge Analytica e Facebook, em 2018. O modelo de negócio dessas empresas, baseado na publicidade digital e segmentada e em anúncios, segundo alguns especialistas, é fator determinante para entender como os nossos dados estão sendo processados. Segundo o jornalista fundador do site Manual do Usuário, Rodrigo Ghedin, essas práticas das grandes empresas de tecnologia corroem a nossa privacidade. “Você acaba sendo vigiado, monitorado, a todo tempo, enquanto você usa esses aplicativos e dispositi-

Se você quer preservar sua identidade, pare de produzir dados novos para as empresas Guilherme Felitti, Programador

vos, esses sistemas”, enfatiza Rodrigo. Aprovada em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) estava com início previsto para 2020, porém foi adiada para 2021. É a segunda vez que a lei é prorrogada. O principal objetivo da lei é garantir o direito à privacidade e à proteção de dados pessoais dos usuários, por meio de normas transparentes e seguras. O advogado, professor e fundador do Data Privacy Brasil, Bruno Bioni, entende que a LGPD é uma repactuação do nosso contrato social a respeito da cidadania e autonomia. Ele reforça que a lei é um pilar de fixação de direitos e de deveres. Da mesma forma, Guilherme Felitti, reforça a importância da lei. “Numa era em que nossos dados estão nas mãos de milhares de empresas, a maioria das quais a gente não sabe como obteve, o mínimo que devemos ter é controle sobre quem tem o que. É preciso que você e eu tenhamos controle sobre quem pode acessar, armazenar e trabalhar com nossos dados”, comenta. Conforme o programador, hoje, o assunto pode ser comparado a um lago com águas turvas. É preciso deixá-las cristalinas. Guilherme reitera ainda que práticas podem ajudar a diminuir a exposi-

ção na Internet, como, por exemplo, mudar hábitos. Diminuir o uso de aplicativos pode reduzir o problema.

DIREITOS BÁSICOS

A respeito dos direitos básicos, que todo cidadão brasileiro tem, é preciso ampliar a ideia de que o cidadão é o único titular dos seus dados. Por mais óbvia que pareça essa premissa, não é um conceito simples de ser passado ao cidadão, como reforça Bruno Bioni: “Eles (os dados pessoais) sendo de titularidade das pessoas, elas têm o direito de saber o que é feito com seus dados, de poder ter um mínimo controle. É o direito de transparência de saber o que é feito com as suas informações”. O advogado explica ainda que, caso haja um problema, é importante sempre avaliar a “natureza do problema”, para entender se será necessário uma resposta com maior ou menor intensidade. Procurar uma comunicação direta com a empresa ou aplicação envolvida pode ser um primeiro passo, mas, caso seja necessário, o usuário comum pode procurar auxílio no Grupo Executivo de Proteção ao Consumidor (Procon), ou ainda partir para as esferas judiciais. ARTE DE GERD ALTMANN / PIXABAY


Especial COVID-19

Violência doméstica

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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O INIMIGO DENTRO E FORA DE CASA

Isolamento social dificulta que mulheres vítimas de abusos rompam com o ciclo de violência e até mesmo denunciem seus agressores FOTO DE CLAUDIO FACHEL / PALÁCIO PIRATINI

Por Laura Santos

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nquanto lutamos contra um vírus desconhecido pelo mundo inteiro, muitas mulheres encontram seu maior inimigo dentro de suas casas. Em diversos países, os registros de violência contra a mulher estão maiores em comparação ao ano passado, ou contabilizam números mais expressivos de casos graves, como estupro, e até mesmo a consumação do feminicídio. Em muitos lugares do Brasil não está sendo diferente. Desde o início do distanciamento social, por conta da Covid-19, só no Estado de São Paulo, houve um aumento de 44% nas denúncias de violência contra a mulher. No Rio Grande do Sul, de acordo com os dados divulgados pela Secretaria Estadual de Segurança Pública, houve um crescimento de 66,7% de assassinatos de mulheres por questão de gênero, em relação a abril do ano passado. De janeiro a abril, o Rio Grande do Sul, apresentou, ainda, um aumento de 76% nos casos de feminicídios consumados comparados ao mesmo período em 2019. Em São Leopoldo, cidade do Vale do Sinos, a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), que atua desde dezembro de 2019, registrou uma redução de, aproximadamente, 40% nas ocorrências de violência contra a mulher em março, na comparação com janeiro e fevereiro. De acordo com a delegada titular da Deam São Leopoldo, Michele Arigony, apesar de as denúncias terem diminuído, não é possível dizer o mesmo da violência. “Muitas mulheres não conseguiam romper o ciclo da violência antes do isolamento social, agora, por diversos fatores, acaba sendo muito

A violência continua existindo, porém as mulheres não estão procurando os meios para fazer as denúncias Ana Cláudia Pinheiro Coordenadora do Centro Jacobina

SÃO LEOPOLDO PASSOU A CONTAR COM UMA DELEGACIA ESPECIALIZADA NO ATENDIMENTO À MULHER EM DEZEMBRO DE 2019

mais difícil. Ainda assim, alguns casos estão sendo encaminhados para a Deam através do 180 e através do WhatsApp da Polícia Civil”, relata. A delegacia integra a Rede de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, junto à Brigada Militar, Polícia Civil, Ministério Público e entidades envolvidas com a causa.

CENTRO DE REFERÊNCIA

Além dos canais de denúncia que a Deam, a Brigada e a Polícia Civil disponibilizam, o município conta com o Centro de Referência no atendimento às mulheres, mulheres trans e travestis em situação de violência de gênero, o Centro Jacobina. O local é responsável por realizar atendimentos psicossociais às vítimas de violência, como explica a coordenadora do Centro, Ana Cláudia Pinheiro. “Nós disponibilizamos assistência psicológica, social e até mesmo jurídica para as mulheres que atendemos”, diz Ana Cláudia. Um dos primeiros Centros de Referência do Estado, o Jacobina foi criado assim que sancionada a Lei Maria da Penha, há 13 anos. Um dos principais objetivos do atendimento é quebrar com o ciclo de violência. “Entendemos que a violência é cíclica, começa com as discussões e chega na agressão, caso haja o perdão, na maioria dos casos, a violência retor-

na. Nosso principal foco é fazer com que as vítimas entendam e queiram realizar esse rompimento”, explica Ana Cláudia. “Procuramos entender toda a história da mulher, ver se possui um suporte e um núcleo de apoio para a quebra desse ciclo, além de dar um assessoramento jurídico para que as mulheres busquem a Deam”. Com o início do distanciamento social, muitos dos atendimentos tiveram de ser modificados, principalmente os presenciais e em grupos. “Hoje, estamos prestando orientação através do telefone todos os dias das 8h às 17h. Também buscamos mulheres que estão passando por dificuldades financeiras e encaminhamos soluções para elas”, diz a coordenadora. Em três anos à frente do Centro, Ana Cláudia conta que os últimos quatro meses, diferentemente de outros anos, apresentaram casos mais graves de violência. “Apesar de ter tido diminuição nos registros, sabemos que a violência continua existindo nas casas, porém as mulheres não estão procurando os meios para fazer as denúncias. Sabemos que um dos principais catalisadores da violência é a questão econômica, então precisamos discutir se a mulher com maior vulnerabilidade econômica tem acesso aos canais de denúncia e sabe da existência deles”, afirma.

QUEBRAR O CICLO

Ter um núcleo de apoio para o rompimento de um ciclo de violências é fundamental, mas em muitos casos, quando não há a ajuda do Estado, a mulher continua vivendo aquela situação por muitos anos. Como é caso da Joana*, que permaneceu mais de quatro anos – do final dos anos 90 até o início dos anos 2000 - vivenciando a hostilidade dentro de casa. “As primeiras lembranças que tenho das agressões do meu ex-marido são muito sutis. Começaram com xingamentos e ofensas leves, de repente tudo foi aumentando”, diz. “Logo ele já começou a me agredir fisicamente com empurrões e socos, mas a gota d’água foi quando ele me bateu e me atingiu no rosto. Recorri aos meus pais para romper com aquele ciclo de violências, mas como ele nunca aceitou o término, tive que prestar queixa”. Ela lembra que, na época, a denúncia não teve muito efeito. “Chegou um momento que eu já tinha registrado sete ocorrências contra ele, mas ele não comparecia às audiências e o Estado não prestou assistência, nem tentou intervir”, lembra. Quem a ajudou foi a família. “Naquele tempo, não havia muitos recursos públicos, mas sei que hoje as mulheres estão mais assistidas”, avalia. (*) O nome foi modificado para preservar a identidade da fonte


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São Leopoldo (RS), Julho de 2020

OPINIÃO

OPÇÃO DE DIVERSÃO FRENTE AO ISOLAMENTO

A BOLA É APOLÍTICA... AQUELE QUE CHUTA, NÃO

Por Cesar Weiler

cos Paulo (Fluminense), Marcelo Benevenuto (Botafogo), Osvaldo Em meio a pandemia de coro- (Fortaleza) e Juninho (Bahia). navírus, algumas alternativas de Neto, depois do último e decidiversão foram testadas. Uma de- sivo confronto, fez menção ao que las foi a Copa EI Games, organiza- acredito ser a principal mensagem da pelos canais Turner. A empresa desta copa organizada pelo Esamericana, que no Brasil detém porte Interativo: “fique em casa”. os direitos do Esporte Interativo, Sabe-se que os atletas estão, aos buscou atletas profissionais para poucos, voltando as suas ativireplicar as emoções do futebol dades, mas grandes nomes do real, jogando videogame esporte profissional brasitransmitido pelo YouTube. leiro, disputando partidas A grande decisão foi em casa e se “dedicando” entre o zagueiro Ricardo aos games, deixa claro, na Graça, do Vasco da Gama e minha visão, a intenção da Especial o meia Valdívia, do Avaí. O Turner com a atração. COVID-19 vascaíno ficou com o títuAcerta os canais. Acerlo. O vídeo de transmissão tam os jogadores. Acerta da final já ultrapassou as 70 mil o Brasil, por se focar no isolavisualizações no canal oficial da mento e em dar capacidade de emissora, o Ei Games. A narração atendimento aos infectados pelo foi de Octávio Neto com comen- Covid-19. Sem esquecer, é claro, tários de Casimiro Miguel. que o entretenimento faz parte da Participaram desta edição de vida de todos e o distanciamento pandemia da Copa, além dos fina- social não impede a diversão dos listas: Matheus Henrique (Grêmio), brasileiros, como provou a Copa Marcos Guilherme (Inter), Mar- EI Games.

Por Emerson dos Santos

A PROBLEMÁTICA VOLTA DO NOSSO FUTEBOL

AS IRRESPONSABILIDADES DA DUPLA GRENAL

exames disponíveis. A meu ver, soa egoísta da nossa parte, não Encontramo-nos em meio a encarar essa situação como uma uma pandemia mundial, que afeta injustiça. É verdade que os clubes diretamente nosso país. No mes- precisam da verba dos jogos e da mo dia em que o futebol esteve TV, caso contrário irão à falência. de volta, na Alemanha, o Brasil Mesmo assim, acredito que ainda ultrapassava a marca de mais de não é o momento ideal. Nosso 15 mil mortes pelo novo coro- período para as doenças respiranavírus. Nesse período, a tórias estarem em evidência Federação Gaúcha de Futeé exatamente no Inverno. E bol (FGF), juntamente com já estamos sentido os efeios clubes do nosso Estado, tos disso. Valerá a pena os se reuniram e decidiram times gaúchos terem voltaEspecial pela volta do Campeodo aos treinos, mesmo sem COVID-19 nato Gaúcho na segunda jogos acontecendo? quinzena de julho. A dupla Acredito fielmente que Gre-Nal voltou aos treinos. Mas a nosso futebol não deve voltar pergunta é: não estamos sendo antes de setembro, e torço para egoístas em considerar o fute- que nossas instituições pensem bol importante em meio a uma o mesmo. O momento é de salpandemia? Grêmio e Internacio- var vidas, de usar as máscaras nal anunciaram que compraram protetoras, de ficar em casa, de testes, para jogadores, comissão cumprir o isolamento social. Só técnica e familiares, enquanto dessa forma, podemos aproveitar algumas pessoas doentes vão nosso futebol mais adiante, se aos hospitais e não encontram todos colaborarem.

Por Karolina Bley

Por Isabelle de Castro

as “Diretas Já!” (1983-1984), que lutava pela redemocratização Raí, dirigente e ex-jogador do Brasil. Sócrates foi fundado São Paulo, criticou a postura mental na conquista do direito do presidente Jair Bolsonaro no à liberdade de pensamento e de combate à pandemia de Covid-19 expressão no país. em entrevista ao globoesporte. No Egito, os líderes das macom. Já o também ex-jogador do nifestações pró-democracia da São Paulo e, hoje, comentarista praça Tharir, em 2011, eram esportivo Caio Ribeiro criticou os ultras dos rivais históricos Raí. Durante programa do Spor- Al-Ahly e Zamalek. O Dérbi do TV, disse que não gostou Cairo, que seguidamente do discurso do ex-colega é jogado com portões fe“porque falou muito pouco chados, viu suas torcidas de esporte e muito sobre organizadas se unirem política”, defendendo que contra a ditadura de Hosni Especial ele deveria falar somente Mubarak. COVID-19 sobre futebol. Mas, afinal, Nunca será só futebol. futebol e política não estão Você já deve ter ouvido relacionados? essa máxima. Pois, é verdade. Primeiramente, você sabe Não é só futebol. É política. É quem foi o irmão de Raí? Foi religião - vide a rivalidade entre Doutor Sócrates (1954-2011), Celtic e Rangers, na Escócia. É um dos idealizadores da Demo- identidade. Está intrinsecamente cracia Corintiana que, no início relacionado às causas sociais e da década de 1980, instaurou o à democracia. Então, sim, Raí voto dentro do clube. O movi- deveria falar muito mais do que mento sabidamente influenciou somente sobre futebol.

do Gauchão para meados de julho. Outro ponto preocupante foi O quanto a questão financeira a demissão de mais de 40 funé mais importante para um clube cionários de folha salarial baixa de futebol do que proteger a vida no Internacional. Eu, como sócia de seus jogadores e funcionários? colorada, desprezo a total falta Inter e Grêmio mostraram que de consideração com funcionáo financeiro tem muita impor- rios que num momento como tância. Para agradar seus patro- esse necessitavam de seu salácinadores e fornecedores, rio. Enquanto isso, esses os dois maiores clubes do salários milionários dos Rio Grande do Sul, que dejogadores foram reduziveriam dar exemplo, condos em 25% apenas uma seguiram a liberação para semana depois das misteEspecial treinar em plena pandemia riosas demissões. COVID-19 de coronavírus. A dupla GreNal preMesmo com todos os cisa se conscientizar do equipamentos de segurança e momento que vivemos e saber higiene sendo disponibilizados, e da importância que eles têm na até mesmo com a distância entre hora de influenciar milhares de os jogadores sendo respeitada, torcedores. No Brasil, o número devemos nos perguntar: qual a de mortos pelo coronavírus não necessidade? A CBF não prevê para de subir, e uma das últimas nenhuma data para a volta dos preocupações que deveríamos campeonatos nacionais e a Fede- ter no momento é com a volta ração Gaúcha de Futebol irá tentar do futebol, mesmo que eu como (ressalto a palavra tentar) o reinício torcedora queira muito isso.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

OPINIÃO

ALERTA PARA A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA O coronavírus a cada dia nos traz mais notícias devastadoras. Paralelo à crise sanitária, enfrentamos uma crise política e econômica. Agora, imagine a vida de uma mulher que sofre diversos tipos de violência, isolada dentro de casa com seu companheiro - e agressor. Imagine que ela pode ter sido atingida em cheio pela crise e estar desempregada, especialmente as autônomas - lembrando que, pelo menos, 71% das empregadas domésticas não têm carteira assinada, ficando à mercê nesse momento de calamidade. Vem a dependência financeira. O distanciamento social afasta quem pode ajudar. Em tempos de Covid-19, há um sinal de alerta sob os casos de violência doméstica. Estejamos atentos e sejamos solidários! O problema não surgiu com a pandemia. Há anos enfrentamos uma enxurrada de casos Brasil afora, podendo resultar em feminicídios - quando a mulher é assassinada. O certo é que o isola-

FOTO DE DRAGANA_GORDIC / FREEPIK

Por Letícia Guintani da Costa

mento social tornou-se um mo mês no ano passado. fator agravante para essa Foram seis vítimas em 2020, Especial COVID-19 situação que, assim como a contra 11 em 2019. Mesmo quarentena, está longe de assim, no acumulado, o Rio terminar. No Rio de Janeiro, por Grande do Sul supera os casos de exemplo, só nos primeiros dias de feminicídios comparado a 2019. confinamento, houve um aumento O momento conta com inide 50% no número de casos. ciativas importantes, sinalizando No mês de maio, os casos de que as mulheres nunca vão estar feminicídio tiveram redução de sozinhas. No Rio Grande do Sul, 45% em comparação com o mes- Universidades oferecem auxílio

para as vítimas. A Unisinos, por exemplo, possui o Programa de Práticas Sociojurídicas (Prasjur), com atendimento online e por telefone. Além do Disque 180, o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos também conta com um aplicativo para receber denúncias de violência doméstica. O Judiciário, a Defensoria e diversas ONGs que atuam na causa também reforçam o atendimento remoto, com o intuito de diminuir as subnotificações dos casos de violência - outro problema presente muito antes da pandemia. Mais do que divulgar canais de denúncias, precisamos ajudar as mulheres. Meta a colher.. Mesmo que em isolamento social, a causa pede que estejamos todas unidas pela preservação da vida. Denuncie casos de violência doméstica, disque 180 procure a Defensoria, registre um boletim na Delegacia Online. A Prasjur atende em (51) 359-8425 / 3590-8797 e em prasjur@unisinos.br.

SAÚDE MENTAL NO ISOLAMENTO SOCIAL

DOR SILENCIOSA QUE ATINGE MUITA GENTE

situação como fazer pausas e descansar entre os turnos de trabalho. Em meio à pandemia, os cui- Dieta saudável, exercícios físicos e dados com a saúde precisam ser contatos remotos com familiares redobrados. Toda a situação que es- e amigos. tamos vivendo pode afetar a saúde Quando a pessoa não está bem mental das pessoas, aumentando a precisa conversar sobre o que está ansiedade, insegurança, tristeza e acontecendo e não deixar que a outros sentimentos diante do isola- depressão se aprofunde. O maior mento social e das incertezas. obstáculo é o preconceito Para quem está com e a falta de informação. Hamedo de sair de casa e já tiverá problemas decorrennha atendimento psicológico tes das perdas econômicas, devia usufruir dos serviços profissionais e afetivas. Que Especial online, pois eles apresentam liguemos, então, este alerta COVID-19 vantagens para a oferta de público para superarmos suporte psicossocial. Dessa momento tão delicado. forma, é possível evitar a circulação Vamos perder na economia, mas desnecessária e, ao mesmo tempo, podemos ganhar muito em humagarantir suporte de qualidade. A nidade. É um momento sem precemigração para o formato remoto dentes para se combater o egoísmo exige adequações da prática do e o imediatismo. É a primeira vez psicólogo para que a terapia siga que teremos de agir como nação, e o código de ética das categorias renunciar às recompensas imediatas profissionais. para lucrarmos no futuro. O país Devemos nos cuidar. Tentar não vai ser o mesmo depois desta utilizar métodos para lidar com a pandemia.

Por Juliana Henzel Peruchini

Por Ketlin da Fonseca de Siqueira

A escoliose é um problema de saúde que ocorre uma curvatura na coluna vertebral em formato de “S” ou “C”, pode ser chamada de hiperescoliose. A Organização Mundial da Saúde já alertou que entre 2% a 4% dos jovens são atingidos. O principal alvo são mulheres ou crianças. A escoliose não tem idade e nem cura. Atualmente há exames como raio-x, tomografias computadorizadas e ressonâncias para se ter uma maior noção do grau da escoliose, se é necessário cirurgia ou não. É preciso uma consulta médica para se ter mais informações. Em alguns casos o paciente nem sente dores, mas a curva está presente. Os tratamentos para aliviar as dores em pacientes com escoliose são vários: pilates, fisioterapia, uso de cintas, mas-

sagem terapêuticas com ajuda de ventosas ou não, quiropraxia. Os médicos, na sempre necessária conversa junto ao paciente, podem dar melhores orientações para os que precisam de cirurgias ou apenas se manter exercitando adequadamente. Isso não quer dizer que, mesmo com a cirurgia, as atividades físicas ficam descartadas. Pessoas que sofrem com essas dores raramente usufruem de uma boa qualidade de vida. Tem momentos em que se transformam em crises tão fortes, que chegam a desestabilizar os pacientes, levando à depressão, ansiedade, crises de pânico e níveis altos de insônia. As dores tendem aumentar em momentos difíceis, em que os nervos se encontram a flor da pele. Massagens massoterapêuticas pode ajudar a aliviar os sintomas, ajudam o corpo e a mente relaxar.

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São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Cultura

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ALUNA DE PUBLICIDADE CRIA REDE DE MULHERES ARTISTAS

Criado no Instagram pela estudante Isadora Salines, o Parto Artístico já conta com mais de 4 mil seguidores e com o apoio de outras colegas do curso FOTO REPRODUÇÃO INSTAGRAM

Por Daniela Corrêa Silva

E

mpoderar e dar visibilidade às mulheres criativas. Este é o objetivo do Parto Artístico - projeto desenvolvido pela aluna do curso de Publicidade e Propaganda da Unisinos, Isadora Salines. O Parto Artístico existe há pouco mais de um ano e já possui mais de 4 mil seguidores no Instagram. Lá são publicados, diariamente, trabalhos produzidos por mulheres, além de uma série de ações e conteúdos colaborativos de empoderamento feminino, apoio e inspiração. Futura publicitária, Isadora conta que sempre se incomodou com o machismo no mercado da comunicação, além de ter poucas referências de mulheres comunicadoras. “O machismo dentro do mercado da comunicação é rotineiro e, contra isso, eu já me posicionava de alguma forma. Porém, comecei a analisar quem eram

PROJETO OFERECE VISIBILIDADE A MULHERES ARTISTAS

minhas referências e percebi que lembrava bem mais de nomes masculinos do que de nomes femininos. Isso me incomodou por dias e, então, decidi que deveria fazer algo a respeito”, relata. Após seis meses de um trabalho mais individualizado, Isadora percebeu que seria agregador convidar mais mulheres para a curadoria do projeto. Hoje, as estudantes Maria Clara Goldani e Carolina Oliveira também administram e criam conteúdos para o Parto Artístico. “É engraçado porque não foi tão planejado, sabe? Eu simplesmente percebi que a Maria e a Carol estavam super engajadas e que trocavam muitas ideias comigo sobre o projeto e quis convidá-las. É libertador e muito motivador ter gente que acredita nessa ideia. Sinto-me completamente à vontade com elas. Temos muitos planos pela frente”, conta Isadora.

Artista do Tocantins, Bruna Moreira teve seu trabalho divulgado no Instagram do projeto. Segundo ela, esse movimento foi importante para que a sua produção artística ganhasse visibilidade nacional. “Como eu estava iniciando minha jornada como artista, para mim foi muito legal conseguir alcançar pessoas de outras cidades de uma forma que antes não conseguiria. Aproximei-me de um networking que eu não tinha através do Parto Artístico. É muito legal participar desta rede”, comemora. Para Isadora, o norte do projeto é trabalhar na proximidade. “A gente tenta ao máximo enxergar todos os tipos de mulheres e suas dores, porque queremos que elas se identifiquem e sejam vistas. Seja na arte ou na vida. A nossa criação é baseada em identificação, empatia e proximidade, e isso fez a gente crescer muito, tanto como projeto, quanto como indivíduos”, finaliza.

APAE DE SAPUCAIA SUSPENDE ATIVIDADES ESCOLARES

HÁBITO DA LEITURA GANHA IMPULSO NA QUARENTENA

PARCERIA OFERECE SERVIÇO PSICOLÓGICO GRATUITO EM ESTÂNCIA VELHA

Por Rafaeli Hendler

Por Milena Silocchi

Por Bruna Haupenthal

A Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais Mesmo com as livrarias fechadas, a quarente(APAE) do município de Sapucaia do Sul está com na representa uma oportunidade para que leitores as atividades escolares suspensas desde o início possam se reconectar com os livros. A estudante de março, conforme indicações do Ministério da de enologia, Camila Angela Mugnol, 19, conta que Saúde. A instituição mantém apenas os a literatura representa uma pausa e um serviços de saúde - fisioterapia, fonoaumomento de reflexão sobre o mundo e diologia e atendimento psicológico - e sobre si mesma. “Os últimos livros que li assistência social para as famílias e alunos. me trouxeram alento em relação a tudo o “Os atendimentos são feitos com hora que está acontecendo”, relata. marcada, não ultrapassando o número Alana Zimmermann Machado, 24, faz inmáximo de 25 alunos por turno”, explica tercâmbio na Irlanda e é uma leitora assídua. o gestor da APAE, Douglas Homrich. De Através dos ebooks ela adquire novos coEspecial acordo com Douglas, a instituição segue nhecimentos, além de viajar para diferentes COVID-19 as orientações de saúde, desde o uso países, universos e mundos revelados pela obrigatório de máscara nas dependênimaginação. Na sua avaliação, contudo, o cias da entidade até a distribuição de Brasil é um país que não estimula o hábito equipamentos de proteção para os colaboradores. da leitura. “Os países que estão priorizando a cultura A instituição também iniciou, no mês de na quarentena são os mesmos que já faziam isso maio, o projeto intitulado “Educação Domiciliar”. antes mesmo da pandemia”, afirma. A iniciativa consiste em apresentar aos pais Jornalista e proprietário da Editoria Vírtua, em Caxias e responsáveis atividades educacionais para do Sul, Rafael Augusto Machado, 40, recebe relatos serem feitas em casa. Desse modo, os alunos de leitores se referindo aos livros como um conforto serão beneficiados pelo aprendizado escolar psicológico neste período. Diante deste cenário, exoferecido pela entidade. plica, os títulos mais procurados são os de autoajuda.

A Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Estância Velha (APAE), em parceria com a prefeitura da cidade, lançou projeto de Atendimento Psicológico Online em função da Covid- 19. O serviço, que conta com o apoio de psicólogos voluntários, atende médicos, enfermeiros, bombeiros, guardas municipais, policiais, integrantes da Defesa Civil e profissionais que atuam na linha de frente da pandemia nas áreas de limpeza e alimentação. O serviço também é disponibilizado à população em geral e os interessados podem agendar as consultas online via WhatsApp através do telefone (51) 9782-5754. Segundo a Coordenadora Clínica e Psicóloga Institucional da APAE, Júlia dos Anjos, a iniciativa oferece um sentimento de “acolhida” a essas pessoas, oportunizando um canal de diálogo em meio ao isolamento social. Os atendimentos remotos estão sendo realizados, preferencialmente, por vídeos chamadas. Profissionais que atuam na linha de frente da pandemia podem marcar três encontros com duração de 30 minutos e, sendo necessário, novos agendamentos podem ser combinados.


Especial COVID-19

Política

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SENADO APROVA ADIAMENTO DAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS Representantes políticos concordam com o adiamento do pleito e consideram que o momento atual exige esforços concentrados no combate à pandemia FOTO DE REPRODUÇÃO / AGÊNCIA SENADO

Por Anderson Seifert

P

ara que a realização das eleições municipais não ofereça riscos à saúde pública, o Senado Federal aprovou, no dia 23 de junho, a proposta de emenda à constituição (PEC) que adia o pleito para os dias 15 e 29 de novembro. O texto, construído com o aval do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), seguirá, agora, para análise da Câmara dos Deputados. Em maio, ao tomar posse na presidência do TSE, o ministro Luís Roberto Barroso, do Superior Tribunal Federal (STF), garantiu a realização das eleições ainda em 2020. Entretanto, Barroso não descartou a possibilidade de prorrogação do calendário eleitoral devido às medidas restritivas impostas para conter o contágio da Covid-19. De acordo com o magistrado, há consenso entre os poderes para que, mesmo em caso de adiamento do pleito, não seja necessária a prorrogação dos mandatos dos políticos. Na região do Vale dos Sinos, o prefeito de Ivoti, Martin Kalkmann, considera que, dado o cenário atual,

SENADO ANALISA A PEC 18/2020, QUE ADIA AS ELEIÇÕES MUNICIPAIS

não é possível se pensar em eleição. Para o chefe do executivo, o adiamento do pleito municipal não geraria instabilidade, visto que a maioria dos servidores são concursados e não teriam suas atividades prejudicadas. “Enquanto o princípio for os desejos da comunidade, creio que a transi-

ção entre os poderes será tranquila independente do período em que ela será feita”, declara. Para a prefeita de Novo Hamburgo, Fátima Daudt, o foco da administração municipal deve ser a coordenação das ações de enfrentamento à pandemia. A prefeita considera que

“não é momento para se pensar em campanha eleitoral e possíveis transições de poderes”. Para ela, “a concentração de energia dos governos municipais, estaduais e federal deve estar focada no combate à Covid-19, já que os números de casos e vítimas cresce a cada dia. Apenas a partir do controle da pandemia, entendo que devemos abrir as reflexões sobre o tema”, ressalta. Em São Leopoldo, o estudante e ativista da causa LGBTQ+, Daniel Passaglia, considera que este é um momento fundamental para o cuidado com as pessoas e para que se garanta o distanciamento social. Para ele, “pensar em campanha se torna secundário diante deste panorama”. Passaglia, que é pré-candidato à vereador pelo município, defende que as eleições aconteçam em outro momento. “Acredito que adiar as eleições de outubro para dezembro pode funcionar, se o cenário for de estabilidade. Caso não seja, precisaremos pensar em novas datas e formas de se fazer esta transição, visando a garantia do processo democrático”, enfatiza.

CABINE DE SANITIZAÇÃO AJUDA NO COMBATE AO VÍRUS

MÃE E FILHA LIDAM COM A DISTÂNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA

DIANTE DA QUEDA DE PÚBLICO, BAR APOSTA NO SERVIÇO DE DELIVERY

Por Luciana Abdur

Por Thomás Domanski

Por Amanda Wolff

No Município de Esteio, na Região Metropolitana Da noite para o dia, a Covid-19 alterou a rede Porto Alegre, uma cabine de sanitização de roupas alidade das pessoas ao redor do mundo e, para e acessórios foi instalada, no último 25 de maio, na Jéssica Corrêa, estudante de Psicologia na University Estação Esteio da Trensurb. O compartimento permite College, em Dublin, os planos de visitar a família que, em dez segundos, usuários higienizem no Brasil ficaram para trás. Longe de casa roupas e acessórios, eliminando microrgahá dois anos, a brasileira busca conforto nismos nocivos à saúde. através de chamadas de vídeo com a mãe. Há seis anos trabalhando na Trensurb, o Gláucia Corrêa, mãe de Jéssica, conagente metroviário Giovane Rodrigues, 36, ta que a angústia de ter a filha longe é contou que a maioria das pessoas ainda está incomparável. “Quando fiquei sabendo aprendendo a usar o equipamento. “Semda gravidade da situação quis que ela pre que um trem desembarca passageiros, voltasse, mas ela me acalmou”, relembra. Especial devemos atentar-nos ao fluxo da cabine, Agora que a Irlanda está com a situação COVID-19 pois muitas pessoas têm dificuldades para mais controlada, a preocupação mudou entender o funcionamento”, explica. Além de lado. Diante dos números sobre a disso, trabalhamos muito com a inclusão realidade do Brasil, a estudante gostaria social, e passageiros deficientes visuais precisam de levar a mãe para Dublin. de atenção redobrada quando solicitam o uso da “No início levamos o isolamento a sério e máquina”, completa. já me sinto mais segura, mas fico preocupada Lisiana Fontoura, 43, não parou de trabalhar desde com a situação dos meus pais no Brasil”, conta o início da pandemia e, diariamente, embarca na EsJéssica. Nos momentos difíceis ela relata que tação Esteio e segue viagem até o Mercado Público. sentiu vontade de voltar para a casa por se sentir “Estamos propensos a nos contaminar, mas com a sozinha e desamparada, mas agora já se adaptou estação de higiene me sinto mais segura”, enfatiza. à nova realidade.

Localizado na rua mais famosa de São Leopoldo, a Independência, os proprietários do Guapo Bar lutam para manter o pagamento dos funcionários em dia, sem redução de salários, em tempos de isolamento social e consequente redução de movimento nas ruas da cidade. Os donos estão cientes de que haverá uma queda no movimento noturno em cerca de 60% a partir do momento em que o bar for reaberto. Como alternativa, eles alimentam as mídias sociais na expectativa de impulsionar as vendas via delivery. Mesmo com as novas regras impostas pela Prefeitura, ainda acreditam que poderão reabrir o estabelecimento ao público no mês de setembro. Um dos donos do estabelecimento, Carlos Sampaio, 40, explica que durante os meses de janeiro e fevereiro o movimento foi satisfatório. Contudo, a partir das regras de isolamento impostas pela pandemia o número de clientes diminuiu dia a dia. Diante da quebra de movimento, os donos do bar optaram por doar as mercadorias perecíveis para amigos e funcionários e, atualmente, ainda não conseguem pagar os funcionários normalmente.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Geral

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Especial COVID-19

BUSCA PELO FUTURO ENFRENTA DESAFIOS

Sem transporte escolar, estudantes têm de acordar até duas horas mais cedo para garantir condução na ida para as escolas FOTO DIVULGAÇÃO

Por Sandrine Liége

E

studantes do município de Glorinha, que já enfrentavam diversos desafios para estudar, tiveram a situação agravada pela pandemia. A maior parte dos 7,6 mil habitantes da cidade, localizada a 54 quilômetros de Porto Alegre, reside em divisas com outros municípios ou na área rural, que possui limitações, como o transporte dos alunos, que é de linha, utilizado por toda a população. Por isso, os jovens necessitam acordar até duas horas mais cedo para se deslocar às aulas. “As janelas dos ônibus não fecham e as estradas ficam alagadas, o que dificulta a passagem do ônibus”, diz Alana Modinger, do terceiro ano do ensino médio. “Já sofri um acidente de ônibus por causa da má qualidade das estradas. Graças à experiência do motorista não foi nada grave”, completa sua colega Alessandra Silva. De acordo com a professora e ex-orientadora Claudia Yoshida, do Colégio Estadual Deoclécio Ferrugem, único de ensino médio no município, “é um desafio também para a equipe

COLÉGIO ESTADUAL DEOCLÉCIO FERRUGEM, LOCALIZADO EM GLORINHA

organizar as atividades da escola, levando em conta essas condições dos estudantes”. A internet é outro obstáculo. Com as aulas realizadas remotamente, devido à pandemia, nem todos os alunos dispõem de acesso de quali-

CANOENSE DE 11 ANOS VENCE COMPETIÇÃO NACIONAL Por Tamires Nunes

Victor Gabriel Pitrosky Agostini, de 11 anos, morador de Canoas, venceu a competição nacional Super GameJAM, promovida pela escola de programação e robótica SuperGeeks, desenvolvendo jogo com tema de combate ao Covid-19. Em sua terceira edição, o concurso para crianças e adolescentes de todo país desafiou os alunos com o tema “Combate ao Coronavírus”. Os competidores tiveram que desenvolver em 12 horas ou até alguns dias, um jogo que atendesse ao tema. Em 2020, a competição deu-se totalmente online, devido à pandemia. “É a segunda vez que a unidade de Canoas ganha a competição nacional. Nossos alunos se destacaram nas Olimpíadas de Informática e os de Canoas ficaram em primeiro lugar em 2019, no concurso nacional de bolsas, com mais de 800 inscrições”, conta Etienne Aguiar, diretora da uni-

dade da SuperGeeks em Canoas. O game vencedor do concurso nacional deste ano, realizado por Victor Gabriel, estudante há apenas um ano de programação level 1, tem como objetivo curar pessoas contaminadas pela COVID-19, promovendo a conscientização e a prevenção da doença. “Aprendi a criar games mais bem feitos e elaborados, pois fiquei horas estudando, assim como melhorei a minha concentração e fui disciplinado. O fato da competição ter sido online também foi bom, pois eu pude escolher o melhor horário e me dedicar bastante”, relata. O menino pretende trabalhar na área de criação de jogos, e conta que seus pais o apoiam e incentivam a fazer o que gosta. “Se ele continuar com o mesmo pensamento, vai, sim, ser um programador de games e terá nosso total apoio”, diz a mãe, a dona de casa Juliana Pitrosky Agostini, de 43 anos.

dade à rede. Para a professora Cláudia Yoshida, “os alunos têm um papel muito importante nessa etapa, com uns colaborando e ajudando os que não possuem acesso à qualidade, passando as atividades para seus colegas. Cada turma fez um grupo

no WhatsApp com os professores e orientadora do turno, e assim estão sendo passadas as atividades”. Apesar de todas as dificuldades que os alunos enfrentam nada tira a capacidade de sonhar. Alana e Alessandra contam que pensam em cursar uma faculdade, passar no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio). Procuram oportunidades profissionais e que possam ajudar outras pessoas com a profissão que escolherem. A professora Cláudia Yoshida prevê um futuro melhor, não apenas para seus alunos, mas também para a escola e como a educação é vista. “Nós temos que tirar uma coisa boa de toda essa pandemia, que é assustadora e está gerando muitas coisas ruins. Em relação às escolas, eu penso que desacomodou muitas pessoas, que eram resistentes às questões digitais, que mantinham as rotinas tradicionais e não aceitavam se atualizar, para mudar. Estão pensando em mais acesso à internet para aquelas pessoas que não têm condições. Acredito que isso será algo bom em meio de tanto coisa ruim”.

TAMPINHAS PLÁSTICAS AUXILIAM TRATAMENTO DE CÂNCER Por Aidê Moser

Tampinhas plásticas têm auxiliado a Associação de Assistência em Oncopediatria (AMO Criança), de Novo Hamburgo, e a Liga Feminina de Combate ao Câncer (LFCC), de São Leopoldo, na oferta de tratamento de qualidade para seus pacientes. A AMO Criança faz desde 2015 a campanha independente “Eu AMO Tampinhas”, que no último ano arrecadou 19 toneladas do material. Já a Liga participa desde 2018 do projeto Tampinha Legal, criado em 2016 pelo Instituto SustenPlást. O movimento de arrecadação é muito natural para a Liga, segundo a assistente social Rosângela Bueno Leal. Na AMO Criança, informa a gerente administrativa Carla Rosana da Silva, “temos campanhas de arrecadação e conscientização, como é o caso do projeto Sinais e Sintomas do Câncer Infantil”, que vai até escolas, postos de saúde e empresas divulgar os sinais e sin-

tomas câncer infantil. As tampinhas arrecadadas pela AMO Criança são vendidas para uma empresa que as utiliza como matéria-prima para o produto final. As recolhidas pela Liga são repassadas ao projeto Tampinha Legal. Os valores arrecadados são integralmente revertidos para as instituições. A Liga faz a compra de medicamentos, fornecidos para os pacientes em atendimento. E a AMO Criança aplica os recursos no tratamento do câncer infantil, na compra de medicamentos, no auxílio às famílias ou na folha de pagamento de técnicos, nutricionistas, fisioterapeutas, músico terapeuta, terapeuta, assistente social e pedagoga. As doações podem ser feitas nas instituições, em locais de coleta como as estações da Trensurb, onde todas contam com um coletor do Tampinha Legal, e no Santuário das Mães, de Novo Hamburgo, com um ponto do Eu AMO Tampinhas.


Cultura

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GUEPPARDO ENGAJADA NA RESISTÊNCIA DO ROCK

Banda gaúcha criada em 2007 grava seu terceiro álbum no gênero musical que já foi o mais popular do mundo, mas é pouco apoiado no Brasil FOTO DE LUCHO OLIVEIRA

Por Gabriel Domingues

A

banda Gueppardo iniciou a gravação do seu terceiro álbum de estúdio em janeiro de 2020 no estúdio Hurricane, em Porto Alegre. O grupo de heavy metal foi fundado em 2007 pelo guitarrista Pery Rodriguez, que diz que essa é a sua realização pessoal e vem trilhando esse caminho com várias formações diferentes de forma independente. Nesse novo álbum, as músicas serão cantadas em inglês, na maioria, tendo apenas uma em português e outra em espanhol. Essa mudança no som do grupo, que sempre cantou em português, acontece visando ao mercado externo, pois, como eles mesmos comprovaram, é difícil uma banda que canta em português conseguir se apresentar nos Estados Unidos ou Europa. O mercado da música mudou muito no Brasil e no mundo inteiro. O rock deixou de ser o gênero mais popular do mundo há tempo e as bandas iniciantes enfrentam muitas dificuldades. Para a Gueppardo, uma delas é a falta de apoio da mídia; outra, a falta de mídia especializada. “As massas desconhecem o heavy metal e o rock em geral, então, se

A BANDA, DURANTE APRESENTAÇÃO NO BAR OPINIÃO, EM PORTO ALEGRE

conhecessem, talvez muitas pessoas gostassem. As pessoas que controlam a mídia não acham interessante apoiar grupos do estilo de uma banda como a minha, isso dificulta”, diz Rodriguez. Também é difícil conseguir vender seu produto e entender o cenário do mercado digital para se inserir. “Nós temos a sorte de fazer muitos shows. Vejo muita banda que aposta tudo

na internet, acho que isso é um erro, porque se perde aquela experiência do contato físico com o artista. Não existe nada mais emocionante do que ver um show ao vivo”. Rodriguez também conta que, nos primeiros anos da Gueppardo, viram muita falta de respeito com as bandas por parte de donos de bares e produtores. Era um cenário em que não queriam estar, mas eram obrigados.

A Gueppardo é uma de muitas bandas que surgem no Rio Grande do Sul e no país inteiro em meio a um cenário desfavorável, por iniciativa própria, pelo amor ao rock’n’roll e à vontade de estar no palco. Na estrada, se passa por muita desilusão e tristeza, mas, por outro lado, acontecem muitas amizades verdadeiras, lugares novos são conhecidos e a realização de todos os esforços: o show. “Eu acho que é um estilo que vai demorar a ser extinto. O rock, na sua raiz, mexe com a nossa rebeldia, uma vontade de não ficar quieto. Desde que eu conheci esse rock mais pesado, nunca deixei de gostar, tu te apaixonas. Tu adotas aquilo e passa a fazer parte de ti. Viciante é a palavra, rock’n’roll vicia”. A Gueppardo excursiona por várias cidades do Rio Grande do Sul. Em seus 13 anos de história também já tocou em Santa Catarina, Paraná, São Paulo, por duas vezes na Argentina e uma vez no Uruguai. A banda também é conhecida no México, na Inglaterra e em países da América Latina como Peru - onde Rodriguez passou uma semana promovendo a banda - e Chile. Tocar em países da Europa e Estados Unidos é um plano que se desenha aos poucos.

LADY GAGA LEVA PARA O PLANETA CHROMATICA Após um período longe da música, Lady Gaga retorna com o seu novo álbum, Chromatica. O trabalho foi lançado no dia 29 de maio e é marcado pelo retorno da cantora ao pop dançante, que a tornou conhecida. Gaga transitou por vários estilos musicais durante seus 12 anos de carreira, mas o último álbum feito para as pistas foi o Artpop, de 2013. No entanto, a espera só aumentou as expectativas pelo álbum, que conseguiu a primeira posição no ranking de álbuns nos Estados Unidos. A cantora é conhecida por construir universos para suas músicas. Com o Chromatica não foi diferente. Segundo Gaga, Chromatica é um mundo livre de preconcei-

tos, onde todos são diferentes, mas fazem parte de um mesmo grupo. “É sobre olhar ao redor e tentar trazer união em meio às diferenças, e de que forma eu, Gaga, posso fazer isso”, declarou a cantora. A produção do álbum teve momentos difíceis, devido à fibromialgia, doença que a cantora descobriu em 2017 e que causa desconforto por todo o corpo. Mesmo convivendo com as dores, Gaga diz que a produção do álbum era uma válvula de escape. “Em muitos dias, eu não conseguia sair do sofá”, contou em entrevista para a Paper. “Eu começava o dia mal, mas até o fim dele estava dançando. Todo dia foi uma experiência iluminadora”. Com o novo álbum, Gaga

FOTO DIVULGAÇÃO

Por Fabricio Pereira

CAPA DO RECENTE LANÇAMENTO FOI DIVULGADA EM ABRIL

quer fazer as pessoas dançarem e se alegrarem: “Estou dançando até a dor passar. Eu farei tudo o que puder para colocar o mundo para

dançar. Se você está escutando essas músicas e está com dor, saiba que eu sei como é isso. E eu sei como fazer para não deixar a dor

acabar com a sua vida”. O álbum é marcado pelas parcerias e conta com Ariana Grande na dançante Rain On Me, o girlgroup Blackpink em Sour Candy e o cantor Elton John em Sine From Above. Sucedendo o single Stupid Love, Rain On Me foi o segundo single do Chromatica, sendo lançado dias antes do álbum. Devido à visibilidade do Blackpink na Ásia, Sour Candy alcançou altas posições nas plataformas de streaming. Embora tenha sido surpresa para os fãs, a parceria com Elton John agradou pela boa produção e é uma das melhores faixas do álbum. Chromatica é uma ótima opção para quem gosta das pistas de danças e está disponível em todas as plataformas de streaming.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Eleições

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NOVA LEI VISA INCENTIVAR CANDIDATURAS FEMININAS Eleições municipais de 2020 marcam mudança na regra: agora cada partido deve ter cota de 30% para mulheres, não a coligação FOTO DE ELZA FIÚZA/ABR

Por Douglas Glier Schütz

G

arantido na Constituição Federal há menos de 90 anos, o voto da mulher brasileira, hoje, é maioria. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o eleitorado feminino era de 52,5% nas eleições federais de 2018, ultrapassando os 75 milhões. Mesmo assim, elas ainda possuem uma baixa expressividade política. Os dados do TSE mostram que são 9.256 mulheres ocupando cargos políticos, contra 59.695 homens. Desde 2009, as coligações são obrigadas a garantir “o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”, de acordo com a Lei nº 12.034. Na teoria, a decisão previa o aumento da participação de mulheres na política, o que não ocorreu. Após as eleições municipais de 2016, o TSE liberou uma pesquisa apontando que 89,37% das mulheres que concorreram não obtiveram nenhum voto. Desde então, o órgão vem apurando candidaturas laranja, aquelas realizadas apenas para preencher os 30% previstos em lei. O resultado da pesquisa também levanta outro ponto de discussão quando “mulher” e “política” são colocadas lado a lado. O aspecto cultural. Selma Fraga, que foi candidata a vereadora em 2016 e possui uma cadeira de suplência na Câmara de Vereadores de Gravataí, mostra que a sociedade ainda enxerga a política como algo masculino. “Nós fomos criadas achando que isso é coisa para homem. Eu mesma fui piada quando decidi que iria concorrer, de que eu não faria 200 votos”, lembra. Nas eleições de 2016, Selma não foi eleita em decorrência das coligações. Com 1.090 votos, a então candidata fez mais votos que dois candidatos homens, que foram escolhidos por 995 e 864 eleitores.

EMENDA CONSTITUCIONAL

Sancionada no dia 4 de outubro de 2017, a emenda constitucional 97 prevê o fim das “coligações partidárias nas eleições proporcionais”. A notícia trouxe uma nova possibilidade de as mulheres terem visibilidade no campo político. Como anteriormente cada coligação deveria ter 30% das suas vagas preenchidas por mulheres, o número de candidatas era baixo. Com a modificação, cada partido deverá ter 30% de participação feminina. A mudança começa a valer nas

NAS SEIS CIDADES COM MAIOR ELEITORADO NO RS, SOMENTE 20 MULHERES FORAM ELEITAS EM 2016

eleições municipais de 2020. Para Selma Fraga, a mulher que entrar nessa caminhada precisará ser alfabetizada politicamente. “Nós temos que entender o cenário onde estamos inseridas. Na cidade, a nível de estado, nacional e de mundo. Contextualizar sobre questões de economia e educação”, pontua. Para a candidata, as eleições de 2020 são

Quando tivermos mais mulheres participando é que nós poderemos transformar a política Selma Fraga Pré-candidata à vereadora

uma chance de aumentar a representatividade feminina nas cidades. “Estou bem esperançosa. Não podemos ter um município do tamanho de Gravataí, com praticamente 190 mil eleitores, e não termos pelo menos 20 ou 30% do Legislativo composto por mulheres”, frisa.

CENÁRIO GAÚCHO

As eleições municipais de 2016 mostram que a política gaúcha ainda é majoritariamente masculina, assim como o quadro nacional. Os dados das seis cidades com maior números de eleitores do Estado, Porto Alegre (1.098.515), Caxias do Sul (293.417), Canoas (247.770), Pelotas (228.634), Santa Maria (203.043) e Gravataí (186.699), apontam para uma grande diferença de eleitos entre o público masculino e feminino. Ao todo, foram 135 homens vencedores na corrida eleitoral e apenas 20 mulheres. A maior diferença foi na cidade de Gravataí, onde, dos 23 eleitos, há somente uma mulher.

A presidente do MDB Mulher RS e terceira vice-presidente do MDB Mulher Nacional, Patrícia Bazotti Alba, explica que o partido está adotando medidas para incentivar a participação da mulher na política. “O primeiro passo é sempre mostrar o que é fazer política. Nós procuramos levar informações para as mulheres do tipo ‘A escola do teu filho tem um professor bom? Tem aula nos dois turnos?’. Tudo isso são decisões políticas. Toda a vida, presente ou futura, depende de decisões políticas”, exemplifica. Patrícia também reforça a necessidade de uma política representativa para a defesa dos direitos das mulheres: “Se nós somos uma população de praticamente metade homens e metade mulheres, a gente tem que ter uma representação nessa mesma proporção. Se não, só uma parte da população está representada. E aí, não por mal, mas os homens acabam fazendo ações e medidas que são muito mais direcionadas para eles”. De acordo com a presidente do partido, apenas com mulheres na política será possível promover a discussão de pautas que sejam de interesse da população feminina. “O homem nunca vai saber como é engravidar, como é amamentar um filho, falta representação das mulheres para poder fazer com que a gente tenha políticas públicas melhores para nós”, conclui.

PERSISTÊNCIA

Usadas como laranja ou apenas para preencher uma vaga necessária, as mulheres já entenderam seu papel na política e querem se empoderar desse espaço, deixando de ser apenas 30%. Selma Fraga lembra que a caminhada feminina está no início, mas desistir não é uma opção. “Tem que pensar assim: bom, eu entrei, eu sei que as minhas condições são frágeis, são sensíveis, porque eu tenho que concorrer com tantos homens. Eles têm experiência, pois a política está no DNA do homem, mas devemos seguir. Só quando nós tivermos mais mulheres participando ativamente discutindo as demandas é que nós podemos transformar a política”, diz. Para aquelas que estão pensando em fazer parte desse mundo, Patrícia lembrou que isso envolve muitas questões, inclusive a família. “Nós temos que fazer a nossa parte. Então é preciso que as mulheres venham participar, continuem vencendo os obstáculos que a gente sabe que existem e não são poucos”, finaliza.


Segurança

São Leopoldo (RS), Julho de 2020

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CONHEÇA A EQUIPE DE CÃES DA POLÍCIA CIVIL DE SAPIRANGA Seis cachorros treinados na delegacia distrital da cidade do Vale do Sinos atuam em missões policiais para farejar drogas e buscar pessoas

FOTOS DE LEONARDO OBERHERR

Por Leonardo Oberherr

“J

amais encontraríamos a droga naquela área do pátio sem o Dylan”, relembra o inspetor-chefe da Seção de Investigação da Polícia Civil de Sapiranga, Carlos Medeiros, ao mencionar a ação de um dos cachorros do Projeto K-9 em operação realizada na cidade do Vale do Rio dos Sinos em junho de 2019. Segundo ele, Dylan foi decisivo porque, com ajuda do cão, a equipe da Infernal (apelido da Seção de Investigação) conseguiu encontrar maconha, cocaína e crack em três locais diferentes do pátio de uma residência, resultando na prisão de dois suspeitos. O trabalho de adestramento canino feito em Sapiranga é pioneiro entre as delegacias distritais, de acordo com o delegado Fernando Pires Branco. Na unidade, ocorrem treinamentos diversificados para seis cães, entre eles Hades, Darkness e Lúcifer. Os nomes são pouco usuais em animais de estimação, mas fazem todo o sentido por serem cachorros da força policial. Atualmente, a maioria dos cachorros é usada no farejamento de entorpecentes, mas alguns já estão sendo treinados para outras especialidades, inclusive para busca e captura de seres humanos. Diariamente, os animais passam por treinamentos para identificar qual sua melhor aptidão, mas também podem ser usados em mais de uma tarefa, segundo o adestrador da Unidade K-9, Luciano dos Santos. “A escolha da função do animal se dá desde o início de seu treinamento, quando conhecemos mais sobre ele, sobre seu instinto. Se ele gosta mais de morder, vamos utilizá-lo com essa finalidade”, exemplifica. A ação passa também pela responsabilidade de ter bons condutores, por isso, há uma proximidade e muita confiança entre eles. O caso do policial civil Leonardo Marmentini não é diferente. Ele vem há um ano estudando as técnicas de condução de cães e relembra que, logo ao chegar à delegacia de Sapiranga, foi apresentado ao projeto e iniciou o treinamento para ser condutor. Outro exemplo dessa aproximação foi a experiência do chefe da unidade, Carlos Medeiros, em um treinamento de elite na Base Aérea de Santa Maria, na Região Central do Estado. No início de 2020, ele e seu cão, Lúcifer, ficaram aquartelados por 15 dias nesse treinamento, que ocorre anualmente e é específico para a condução de cães de polícia ou de guerra. Nessa edição,

CÃES E POLICIAIS DESENVOLVEM RELAÇÃO DE CONFIANÇA NO TREINAMENTO

foram selecionados 30 agentes de segurança de todo o Estado, sendo a maioria militares, mas também agentes penitenciários e policiais. “Tivemos a chance de levar o nosso ‘adulto-filhotão’ Lúcifer, que é um animal jovem, e já apresenta ótimos resultados. Foi muito bom pra ele também”, lembra o condutor.

OLFATO APURADO

Os cachorros são animais reconhecidamente confiáveis para ações de segurança, e o motivo é muito simples.

A utilização de cães como ferramenta de auxílio nas investigações é consagrada mundialmente Fernando Pires Branco Delegado

O olfato do cão possui cerca de 300 milhões de células olfativas, enquanto os humanos têm aproximadamente 5 milhões. Com isso, ele tem capacidade de distinguir diversos cheiros. “Gosto de usar o exemplo da feijoada para explicar isso. Quando nós, humanos, chegamos em casa e tem alguém cozinhando feijão, nós sentimos o cheiro, certo? Então, nós sentimos apenas o cheiro do alimento como um todo, já o cachorro consegue sentir o cheiro do alho, da cebola, da linguicinha, da salsa, do louro, do feijão e tudo isso, da esquina de casa”, compara Medeiros. No caso das operações policiais, o cachorro não sabe o que é cheiro de maconha, cocaína e sim das coisas que são adicionadas nessas drogas. E tem ainda o impacto visual da presença do cão em uma abordagem policial. Medeiros relata que, em diversas operações, o suspeito já aponta os esconderijos só pela presença do animal na operação.

AJUDA COMUNITÁRIA

O planejamento da Unidade K-9 em Sapiranga começou em 2018, e atualmente conta com uma estrutura física para os cães ficarem durante o dia, além de um campo ao qual são

submetidos aos treinamentos sob supervisão do adestrador e dos condutores. “A comunidade nos ajuda bastante a manter o projeto. A prefeitura cede o adestrador, a Monello realiza doações mensais de 150 quilos de ração, mas ainda precisamos de apoio para os tratamentos veterinários, que, muitas vezes, nós pagamos do nosso próprio bolso, porque amamos os cachorros”, comenta Medeiros. Mesmo com uma boa estrutura, outras melhorias estão no horizonte do projeto. Além do avanço técnico de cachorros e condutores, melhorias na estrutura física do canil também estão sendo planejadas. A principal delas é a manutenção de um canil com estrutura para todos os cães em todos os turnos na Delegacia de Sapiranga, já que atualmente os animais passam as noites com seus condutores e o adestrador. O delegado Fernando Pires Branco avalia positivamente o progresso do projeto até aqui e aposta nessa estrutura como uma ferramenta de alta utilidade para o futuro as operações na região. “A utilização de cães como ferramenta de auxílio nas investigações policiais é uma técnica consagrada mundialmente, essa prática pode ajudar a qualificar nosso serviço”, destaca Branco.


São Leopoldo (RS), Julho de 2020

Litoral

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BOTOS E PESCADORES JUNTOS NA PESCA DA TAINHA

Pouco conhecida pela comunidade local, cooperação ecológica que só acontece no sul do Brasil desperta interesse de pesquisadores de biologia marinha em Imbé FOTO DE PROJETO BOTOS DA BARRA - CECLIMAR / IB / UFRGS

Por Henrique Abrahão

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esquisadores e pescadores dão sua presença como certa nesta época do ano. Batizada como Geraldona, o Boto da Barra de 37 anos é um dos personagens principais de uma parceria singular. Durante a Corrida da Tainha, as tainhas nadam até o mar aberto para se reproduzir. No caminho, botos e pescadores vão até a Barra do Rio Tramandaí e aguardam a chegada do cardume. Nesse momento, as duas espécies realizam um trabalho conjunto de captura do peixe, conhecido como pesca cooperativa. No momento em que as tainhas chegam, os pescadores se posicionam na beira da Barra, segurando a rede (tarrafa). O boto, por sua vez, vai em direção ao cardume, obrigando os peixes a irem cada vez mais perto da beira. No momento certo, o boto faz um sinal para o pescador jogar a tarrafa. Ao jogar, eles assustam o cardume, que, então, precisa fugir da rede. Na ação, alguns peixes acabam sendo capturados pelos pescadores, os que conseguem fugir, são pegos pelo boto, que aguarda o peixe ir em sua direção. Essa relação ecológica é exclusiva do sul do Brasil, sendo estudada e vista com frequência entre os municípios de Tramandaí e Imbé, no Litoral Norte gaúcho, e em Laguna, no estado de Santa Catarina. Não se sabe exatamente quando essa “parceria” surgiu. Segundo o livro “Interação entre pescadores, botos e tainhas”, produzido por professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 2018, o costume é de origem indígena e foi aperfeiçoada com a chegada dos europeus (açorianos) à região. O projeto “Botos da Barra” analisa a alimentação, reprodução e as “aulas” que acontecem na região. Eles afirmam que botos e pescadores são favorecidos pela parceria e que não teriam o mesmo resultado caso decidissem agir sozinhos. Sabendo disso, os botos passam a técnica para as próximas gerações. Geraldona, por exemplo, ensinou a tática para seus filhos: Rubinha, Chiquinho, Flechinha, Ligeirinho e Escurinho, como são chamados.

FENÔMENO DESCONHECIDO

Segundo um questionário feito pelo projeto e respondido por 209 moradores locais, 51% do público não sabe da existência da pesca cooperativa. Nesse sentido, biólogos e es-

SEGUNDO PESQUISADORES, COSTUME É DE ORIGEM INDÍGENA E FOI APERFEIÇOADO COM A CHEGADA DE AÇORIANOS

tudantes da área, fazem um trabalho de monitoramento, fortalecimento da pesca e educação ambiental, incentivando o diálogo entre as cidades de Imbé e Tramandaí. O biólogo e coordenador do projeto, Ignácio Benites Monteiro, reafirma a forte relação entre pescadores e botos durante suas aulas. Os biólogos registram os animais a partir de sua barbatana dorsal, que é única em cada indivíduo e o nome é dado pelos próprios pescadores. Eles reconhecem o boto não só pela característica física, mas também pelo comportamento, podendo identificá-los até à noite. Além de Geraldona e seus filhotes,

O futuro da pesca dependerá das alianças formadas com o poder público Ivan Ramos Vasconcellos Ex-pescador

os pescadores são amigos de Catatau, Bagrinho, Rubinho e Coquinho, que é filho do Galhamol. A cooperação já foi suficiente para garantir a renda do mês para muitos pescadores, mas com a poluição causada por esgotos e pessoas que praticam a pesca sem conhecer o trabalho de cooperação a população de tainhas vem diminuindo, dando prejuízo ao profissional e, futuramente, poderá significar o fim da pesca cooperativa.

PATRIMÔNIO AMEAÇADO

Em 1990, a Prefeitura de Imbé, através do decreto nº 049, declarou os Botos da Barra do Rio Tramandaí como patrimônio do município. Além disso, a lei nº129/2015 de Tramandaí determinou a área da Barra como exclusiva para a pesca, não podendo ser utilizada para prática de moto aquática, kitesurfe e lancha. Há outro projeto na Assembleia Legislativa que busca definir a pesca cooperativa como patrimônio imaterial do Rio Grande do Sul. Se, por um lado, há leis e decretos que servem para preservar a prática da pesca e a biodiversidade, por outro, há projetos em andamento que vão contra o ideal de desenvol-

vimento sustentável. Como exemplo, vale citar a construção de uma nova ponte que ligará os dois municípios, a instalação de molhes na Barra do Rio Tramandaí e o plano diretor que permite a construção de edifícios de até 15 andares em Imbé. O ex-pescador e presidente da Federação dos Sindicatos de Pescadores Profissionais Artesanais do Rio Grande do Sul e do Sindicato dos Pescadores Artesanais de Tramandaí, Ivan Ramos Vasconcellos, espera estreitar a parceria entre o pescador e o Estado. O chamado “sistema cooperativado” pode ser explicado através da lei estadual nº 15223/2018 que assegura uma política de desenvolvimento sustentável da pesca e a reconhece como fonte de sustento, cultura e lazer. “A pesca do mês de maio começou bem porque, desde 2018, aprovamos uma lei que proíbe a pesca do arrasto nas 12 milhas na costa marítima”, declara o ex-pescador. Para ele, o futuro da pesca, no geral, dependerá das alianças formadas com o poder público. Dos 600 pescadores cadastrados no Sindicato da região, 40 são instruídos e aptos a praticar a pesca cooperativa, segundo o presidente da entidade.


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