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Locadora com clientes

recusa fechar A VIDEOLOCADORA QUE SE Com a ascensão do serviço de streaming, lojas como a

“E o vídeo Á lvaro Bertani, que é proprietário e balconista da Segundo Milton, foram os vídeos levou” videolocadora E o Vídeo Levou, lembra dos anos 2000, época em que a sua locadora estava lotada pirata que impulsionaram o cinema no Brasil. Pois, na década de 90 houprecisaram de pessoas para locar DVDs e VHS: “Formavam filas no caixa, um caos total. Nós não ficávamos um minuto pave uma operação da Polícia Federal e cerca de 80% de cópias piratas foram se reinventar rados, inclusive, o atendimento era das 10h às 22h. Eu ainda quero ver este local como antigamente, quando retiradas do mercado. “Após a operação as pessoas começaram a gostar para se chegamos a alugar 18 mil títulos de diversos DVDs”, re lembra. Hoje, a média é de 3,5 mil títulos por mês. mais de filmes e foram procurar muito mais os cinemas”, comenta. manter com Porto Alegre, 03 de setembro de 1999. Uma tarde de sexta-feira chuvosa que caia sobre a cidade. O Nessa mesma década, chega o terceiro momento de falência os seus dia que foi inesquecível para muitas pessoas, não por causa do dia gelado. Mas, para os fãs do filme das videolocadoras. “A chegada da maior rede de videolocadoclientes ativos Titanic que o aguardavam ansiosamente em uma fila de dobrar o quarteirão – cerca de 30 pessoas – a ra do mundo, a norte-americana Blockbuster, que inclusive, cheabertura da videolocadora. Na data anterior, havia gou ter suas ações avaliadas em Texto Alexsander Machado chegado a remessa de DVDs do filme e, na loja, havia um caderno de fila de espera. Desde então, os dias cerca de US$ 8 bilhões na década de 1990”, comenta Milton. foram ficando mais corridos para a locadora, poO quarto momento de velório rém, em alguns anos a locadora quase fechou. das videolocadoras foi nos anos Conforme o Milton do Prado Neto, Coordenador 2006 e 2009, por conta da volta da de Curso de Realização Audiovisual da Unisinos, as pirataria e os downloads ilegais videolocadoras passaram por cinco momentos que de filmes pela internet. Sites clanforam causando o fechamento das lojas. “O primeidestinos ofereciam aos usuários a ro round, que era final do século XX. O mercado se ferramenta para baixar o arquivo viu ameaçado pela popularização dos DVDs piratas, do filme. A qualidade não era em que são as cópias feitas sem autorização dos produHD, pois muitos eram gravados ditores dos conteúdos. O preço de um DVD desses era reto da tela de cinema. Com toda mais barato do que alugar uma cópia na videolocaessa concorrência, as videolocadora, ou seja, a metade do preço”, comenta. doras começaram a sumir. Em 1990, as videolocadoras de “garagem” O quinto round e a gota d’água começaram a fechar as portas, a partir do surpara várias videolocadoras fechagimento da TV a cabo. As pessoas tinham a rem as suas portas foi a chegada do comodidade de assistir filmes em casa, sem streaming. São locadoras on-line, precisar se deslocar. Escolhiam o filme com a vaou seja, é um site que disponibiliriedade de canais que estava disponível. Esse foi o za centenas de filmes para assissegundo soco que derrubou as videolocadoras. tir. O usuário tem todos os acessos

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Fotos Arquivo Pessoal / Álvaro Bertani

a qualquer filme, e paga somente uma taxa mensal. Poderia se pensar: é o fim das videolocadoras.

Milton acredita que as lojas físicas ainda possam voltar, pois as plataformas on-line não possuem atendimento diretamente ao cliente e não tem o “namoro” da pessoa com o filme que irá escolher. “Hoje em dia está muito bizarro, eles (sites de streaming) oferecem muito pouca coisa, ou seja, esses sites têm dinâmica algorítmica. Eles escolhem o filme para você e, por isso, acredito ainda na volta em massa das videolocadoras. Na volta de ter o prazer de levar para casa 3 a 4 filmes”, comenta.

O começo de tudo

Bertani estava com 22 anos quando cursava faculdade de Ar

quitetura e fazia estágio em Álvaro tem a uma empresa de fachadas videolocadora há e letreiros e começou a desenvolver outro olhar para mais de 30 anos. Nas prateleiras, os DVDs estão posicionados em o mundo dos filmes. Desde uma forma estratégica então, ele e sua irmã alugapara que o cliente vam filmes para assistir em possa ver a capa casa. Alguns eram de faroeste, como Os Pistoleiros do Oeste (1989). Suas atenções eram fixadas em filmes com ação. Com isso, buscava o corredor na sessão que ele desejava. As prateleiras de madeira com centenas de filmes em VHS diversificavam a locadora. Álvaro saía da faculdade e seu destino era a loja. Inclusive, já no ônibus, pensava em qual seria o próximo filme para alugar. Chegando no local, se sentia como uma criança em um parque de diversões, pois queria todos os que ali estavam.

“Neste mesmo ano, eu e minha irmã tivemos a ideia de abrir uma videolocadora, pois víamos que o mercado de VHS estava no seu auge. Era a grande oportunidade da minha vida de fazer o que eu mais amava”, comenta Álvaro.

A seguir, conseguiram alugar um espaço de 30m2, que era suficiente para começar o negócio que tanto desejavam. Mas, havia dois problemas para ter tempo de trabalhar na loja: o primeiro era a faculdade no turno da manhã; o segundo era o estágio que fazia a tarde. Foi então que convidou a sua irmã para dividir o turno no balcão da videolocadora.

O próximo passo era encontrar um nome para a empresa. Álvaro gosta de palavras com duplo sentido ou que tenham algum significado. Por isso, o nome é um jogo de palavras com o clássico norte-americano E o Vento Levou , lançado em 1939. Porém, para escolher contou com ajuda de seus colegas universitários: “Nós começamos a brincar com nomes de filmes, fizemos uma votação com meus colegas e esse ganhou. A única coisa que eu não queria é que fosse um nome em inglês. Mas esse eu gostei”, lembra.

Após alguns meses nessa corrida diária, decidiu que precisava ter prioridades na sua vida. Foi então que optou por trancar a faculdade e deixar o estágio na empresa de produção de fachadas. “Era necessário focar em meu negócio. Além disso, a venda de VHS estava em alta na década de 90”, comenta Bertani.

Durante as décadas de 1980 e 1990, as videolocadoras eram sucesso de público. Muitas crianças tiveram o seu primeiro contato com um VHS por meio desses estabelecimentos.

Nessa época muito distante, quando a internet praticamente não existia, as videolocadoras reinavam no Brasil e no mundo. “As locadoras chamavam a atenção dos clientes, não só com os filmes, mas também, com marketings criativos que chamavam a atenção, pois as capas de plástico dos VHS eram como se fosse um desenho em 3D”, comenta Milton.

Fatores econômicos, culturais e tecnológicos vêm mudando o modo de consumir filmes e séries e, assim, o negócio de videolocadoras

A loja sempre localizada no bairro Jardim Botânico, em um prédio com dois andares preenchidos por 32 mil DVDs e Blu-rays de filmes, séries e shows distribuídos em diferentes categorias como gêneros, diretores, países e escolas cinematográficas.

A fachada da locadora chama muita atenção de quem passa no local. As cores deslumbrantes de um cinza escuro, as vidraças com um design retangular e as colunas gregas.” A ideia sempre foi dar um conceito de cinema, que chamasse a atenção de qualquer pessoa. Além disso, vale salien

tar que o interior da loja foi desenhado para que o cliente não precisasse caminhar muito, ou seja, os filmes estavam de fácil acesso para os clientes encontrar o que deseja”, comenta Álvaro.

Fidelidade

Ao entrar na locadora, o cliente se depara com uma fileira de diversos filmes DVDs em cima do balcão. Atrás da mesa, o proprietário está usando uma calça jeans, camisa casual e uma máscara protegendo o rosto e tapando a barba branca, já que não possui uniforme. Ele alerta: “Hoje, claro, nosso fluxo maior é a venda no site, por telefone e WhatsApp. Inclusive, a nossa venda de títulos, que é para o Brasil inteiro, representa 40% da receita da locadora”, comenta.

O que fez se manter essa ‘’clientela’’ é o perfil da empresa: a ideia sempre foi vender e alugar obras que as pessoas têm dificuldades de encontrar em qualquer lugar, ou seja, o foco não é a venda de lançamentos de filmes logo após saírem dos cinemas.

É o caso do Felipe Ewald, de 39 anos, que é um cliente assíduo há quatro anos da videolocadora, desde que a Espaço Vídeo fechou as portas. Desde então, aluga diversos filmes por mês. O último a alugar foi na primeira semana de junho: seu filho queria assistir à franquia Esqueceram de mim 2 (1992). “Ele viu o trailer desse filme, acho que em um canal fechado, e queria ver o filme. Por isso, fomos à locadora procurar. Lá a gente encontra todos os filmes antigos etc”, comenta.

Disposto a se atualizar sobre as novas formas de consumo, Felipe também costuma dar uma “espiadinha” na Netflix, porém não abandona o seu velho jeito de escolher filmes. ”Não gosto do streaming, apesar de eu ver alguns na plataforma, mas não é a minha preferência. Gosto do material físico. Eu quero escolher com meus olhos e ficar mais de 40 minutos passeando pelos corredores, lendo as capas dos filmes e pensando em quais vou levar. Não gosto que escolham por mim (referindo ao streaming)”, comenta Ewald.

E o Vídeo Levou, tem cerca de 34 mil pessoas cadastradas no sistema, porém cerca de 2.300 clientes ativos, ou seja, aqueles que continuam adquirindo alugando ou comprando filmes. Com a queda das vendas, foi necessário dispensar alguns funcionários. Bertani ainda lembra que, um certo momento, os funcionários chegavam a se esbarrar um no outro atrás do balcão, pois era tanta gente para atender. A loja já chegou a alugar 18 mil títulos por mês e para conter essa demanda, era necessário ter 15 funcionários para atender o cliente. Atualmente a loja conta com três atendentes, sendo que um deles é o próprio Álvaro e um motoboy para entrega dos filmes. Agora, a loja aluga em média cerca de 3,5 mil títulos.

OLHAR DO REPÓRTER

Escrever uma matéria sobre videolocadora em meio a uma pandemia foi um grande desafio para mim. Tudo foi a distância, as entrevistas via celular, as fotos enviadas pela fonte e as conversas com o professor e editor. Porém, consegui usufruir e aprender diversas coisas sobre como fazer jornalismo totalmente on-line. Obrigado, tecnologia! Eu nunca havia realizado uma matéria sem ter ido ao local, sem conversar olho a olho com a fonte, fotografar o ambiente. Com isso, eu vejo como progresso, pois se um jornalista precisa escrever a sua matéria longe dos entrevistados, precisa ainda assim saber colocar no papel. Como exemplo: ao entrevistar, eu precisava ir ouvindo e digitando no meu notebook e claro, imaginando a cena que ele mesmo relatava. Foi muito interessante contar as estratégias utilizadas por Bertani, pois foram diversas situações de mercado.

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