
4 minute read
to Ambrósio
levaram a seguir as pegadas paternas, foram as convicções internas e o confiante entusiasmo na perpetuidade da grandeza da potência romana que o levaram aos ofícios administrativos e governativos do Império.
Estas poucas considerações nos garantem que podemos confiar plenamente em Ambrósio quando fala do Estado, de suas atribuições e funções, porque pelo seu estudo e por sua experiência na carreira forense e na administração da justiça, conhecia plenamente sua natureza, sua finalidade e sua organização.14 Além do mais, sua profissão de advogado, de juiz e de governador, o obrigou a um aprimoramento no conhecimento das leis, do Ius honorium, do Senatus consultus, dos editos e mandatos, que eram indispensáveis para a reta e justa administração da Res publica e da justiça.
Advertisement
Finalmente, devemos observar que não se encontra nos escritos de Ambrósio nenhuma aversão ao Estado romano e às suas leis, como se verifica em outros escritores como Tertuliano15 e São Jerônimo,16 mas olha com simpatia, e até muitas vezes com orgulho, o Império Romano.
2 —Religião e Estado na doutrina e ação de Santo Ambrósio
O Estado, ou melhor, o imperador que encarna o Estado e lhe assume todos os poderes, é posto por Ambrósio defronte à Igreja e defronte a Deus. A Igreja não é uma sociedade humana ou uma civitas terrena, à qual se possa contrapor, no mesmo nível, a outra, o Estado.
14 Campenhausen. H. von. Ambrosius von Mailand als Kirchenpolitiker, p. 259: “Ambrosius ist von Haus aus Beamter und ein Mann des Staates”. 15 Tertuliano. Apolog., 21, 24. 16 Jerônimo. Epistola, 77.
Ambrósio destaca bem nos seus escritos e na sua ação política, a natureza da Igreja desde sua fundação até o seu momento de poder, sua ação sobrenatural e seu fim transcendental. Por isso, segundo seu pensamento, não é concebível uma justaposição ou uma contraposição entre Igreja e Estado, porque aquela está no plano sobrenatural e eterno, e este, no terreno e temporal. A Igreja encarna a verdadeira religião, representa Deus; o Estado é a sociedade terrena, é o imperador. Por conseguinte, a Igreja está acima do Estado e este é subordinado àquela. O Estado, por disposição divina, é ordenado a ser submisso e a colaborar nas tarefas espirituais e interesses eternos da Igreja.17
Bem diversa era a concepção e a posição da autoridade civil no paganismo, e a do imperador no direito romano. No conceito pagão e no direito romano, a religião era uma função do Estado e parte da administração civil. No direito de Roma, o sacerdócio dependia, ora mais ora menos conforme a época (régia, republicana, imperial), da autoridade política. Desde o tempo de Augusto, o imperador era, de direito, o Pontifex maximus.18 A religião, no Estado pagão, era instrumento de governo; por isso, não tinha um caráter finalístico em si mesma, mas era ordenada ao bem-estar, ao incremento e à estabilidade do Estado. As cerimônias religiosas, os ritos sagrados, os sacrifícios eram pedidos pela autoridade civil, em relação a acontecimentos que interessavam à vida do Estado e do próprio imperador.19 O Estado romano não só tolerou os
17 Ambrósio. Epistola, 17, 1. 18 Cf. Mommsen, Theodor. Disegno del diritto púbblico romano, Lib. II, C. II: Il Governo Sacro e Lib. IV, C. I: Negozi Sacri dei Magistrati. Traduzione di P. Bonfante, Milano, 1964. 19 Mommsen, T. Op. cit., p. 107: “Como o ordenamento, assim a execução dos atos sagrados do Estado não é um direito sacerdotal; pelo contrá-
vários cultos, inclusive os cultos estrangeiros importados –exceto o cristianismo –, mas até os reconheceu, encorajou e cumulou de favores, a ponto de erguer em Roma um templo a todos os deuses porque todos podiam servir e tornar-se úteis.20 Quando, porém, se apresentou a religião cristã, que não podia ser instrumento porque tinha um fim em si mesma, os imperadores não titubearam em persegui-la, tentando, até mesmo, eliminá-la. É inegável que alguns imperadores cristãos, especialmente os de tendência ariana, tenham procurado servir-se da Igreja e tenham favorecido ou imposto a unidade da fé, como fez Constâncio em 359, no Concílio de Rimini, para finalidades eminentemente políticas, fazendo, ou pelo menos tentando fazer, da Igreja instrumento de domínio e meio de fortalecer o poder imperial. Segundo Campenhausen,21 “a pouca clareza que Constantino Magno deixou nos limites entre a competência religiosa e política, tinha também a finalidade de dar a supremacia da direção eclesiástica ao imperador, e de assentar os alicerces da nova teocracia imperial no espírito do paganismo.” O mesmo autor acrescenta ainda que a tendência da política eclesiásticoestatal, desde Constantino até Teodósio, era a de dissolver e reprimir, na medida das possibilidades, as controvérsias que podiam pôr em perigo a unidade eclesiástica, visando reforçar o Império com a unidade da fé, assim como havia tentado, no seu tempo, Diocleciano, ensejando uma reforma religiosa que desse unidade ao Império com base na religião pagã.
rio, até para a execução, quando não é tomada outra disposição, é reservado o direito ao magistrado chamado a representar o Estado.” 20 Cf. Mommsen, Theodor. Disegno del diritto púbblico romano. p. 416. 21 Campenhausen, H. von. Op. cit., Introdução, p. 2.