MÁQUINA KAFKA KAFKAMACHINE
MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE começa pelas notas escritas por Félix Guattari nos anos 70, e publicadas posteriormente com o nome “Projeto para um Filme de Kafka”. A idéia do projeto não realizado por Guattari era fazer um filme não sobre Kafka, mas “escrito por” Kafka. Guattari pensou que Kafka era nada menos do que: o futuro. Para ele, Kafka não era um escritor do século 19, prisioneiro em relações familiares sombrias, em culpa, na solidão, na submissão à lei, na angústia do homem moderno, mas um escritor do futuro que foi capaz de lidar com as sementes dos problemas e com aberturas que só hoje começam a nos dizer alguma coisa. MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE é um projeto que ocorre no meio das maravilhas da economia financeira e das crises da Europa, no momento em que a precariedade do trabalho imaterial define o nosso dia-a-dia, quando o semio-capitalismo exerce o seu poder arbitrário, e nos obriga a explorar continuamente a nós mesmos e aos nossos amigos, e enquanto o cinismo, a depressão e o desprendimento dos outros se tornaram importantes meios de sobrevivência. MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE trabalha talvez com o maior problema teatral, o problema de um movimento que toque diretamente na alma, e que seria o próprio movimento da alma. Ela procura as possibilidades de organização numa cooperação que está por vir. Procura por uma potencial cooperação, com a qual busca criar ligações através de sensibilidades engajadoras, e produzir novos afetos. Produzir devires que convoquem um povo com o qual a organização possa se conectar. MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE chama à cooperação! Chama por vós! Chama só hoje, só uma vez! Quem agora perder esta oportunidade, perde-a para sempre! Quem pensa no seu futuro é um dos nossos! Todos são bem-vindos! Quem quiser ser artista, que se apresente! Somos o teatro que pode empregar toda a gente, cada qual em seu lugar! Mas, apressem-se, para que possam entrar antes da meia-noite! À meia noite fecha tudo e nunca mais volta a abrir! Maldito seja aquele que não acredita em nós!
OS TRÊS GRUPOS DE TRABALHO DA MÁQUINA KAFKA SÃO:
Molecular.org
Molecular.org está baseado em Helsinque . Estuda o funcionamento do semio-capitalismo e desenvolve modos suaves de cooperação, ferramentas para construir as comunidades impossíveis do trabalho immaterial e abstracto, e daqueles que o executam. Nós operamos no ventre mole “il ventre molle” do poder arbitrário. Ou mais precisamente: nós somos o ventre mole do poder arbitrário. Molecular.org é um conjunto de pessoas molle, o futuro da cooperação. Pessoas molle: Heidi Fast, Ana Fradique, Luca Guzzetti, Klaus Harju, Karolina Kucia, Lennart Laberenz, Elina Latva, Tero Nauha, Pekka Piironen, Akseli Virtanen, Kari Yli-Annala
Cia Teatral Ueinzz
A Cia Teatral Ueinzz está baseada em São Paulo. Ueinzz é um território cênico para quem sente vacilar o mundo. Como em Kafka, faz do enjôo em terra firme matéria de transmutação poética e política. No conjunto, há mestres na arte da vidência, com notório saber em improviso e neologismos; especialistas em enciclopédias marítimas, trapezistas frustradas, caçadores de sonhos, atrizes interpretativas. Há também inventores da pomba-giria, incógnitas musicais, mestres cervejistas e seres nascentes. Vidas por um triz se experimentando em práticas estéticas e colaborações transatlânticas. Comunidade dos sem comunidade, para uma comunidade por vir. Ueinzz é composto pelas pessoas: Eduardo Lettiere, Adélia Faustino, Maria Yoshiko Nagahashi, Amélia Monteiro de Melo, Valéria Felippe Manzalli, Alexandre Bernardes Moreira Antunes, John Alfred Laudenberger III, Ana Carmen Martin Del Collado, Erika Alvarez Inforsato, Ana Goldenstein Carvalhaes, Paula Patricia Serra Nabas Francisquetti, Simone Da Silva Mina, Cássio Diniz Santiago, Elisa Band, Fabrício de Lima Pedroni, Leonardo Lui Cavalcanti, Onés Antonio Cervelin, Luís Guilherme Ribeiro Cunha, José Petronio Fantasia, Peter Pál Pelbart.
Presque Ruines
Presque Ruines é um grupo baseado em Paris. Nasceu dos escombros de um colapso interno que na verdade não aconteceu, mas que, por uma questão de conveniência, assumimos já ter ocorrido. Se já completamente em ruínas ou ainda não, não podemos dizer, apesar de nossas atividades poderem tender tanto para formar quanto para o informe. Os nossos territórios existenciais assentam nas fendas entre o quase nada e o não muito, um vago terreno onde buscamos realizar uma falência da vida precária. As atividades de Presque Ruines focam-se nos efeitos e afetos mentais e corporais e de precarização e exaustão, no contexto do capitalismo cognitivo e do poder arbitrário. Presque Ruines são Violeta Coral Salvatierra García de Quirós, Carla Bottiglieri, Thomas Josef Greil, Sílvia Maglioni, Graeme Thomson, Olivier Apprill e Brent Alton Waterhouse
A TRAVESSIA ATÉ A AMÉRICA LISBOA – SÃO PAULO, 25.11 – 9.12.2011 MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE viaja para a América num navio transatlântico, de Lisboa, Portugal, até Santos, no Brasil Há 50 anos Michel Foucault publicava na França “História da Loucura”. A partir daí, nunca mais se conseguiu olhar do mesmo modo para a exclusão e internação dos ditos loucos. O manicômio e a psiquiatria foram postos em xeque, e assistiu-se a uma reviravolta no estatuto, cultural e clínico, da loucura. Pois Foucault mostrou como o trancafiamento dos loucos foi resultado de um processo histórico que teve um início abrupto no século XVII, com o Grande Internamento. Dois séculos antes, eles já foram sendo retirados do convívio social, confiados aos marinheiros, isolados em embarcações, e enviados à deriva dos mares. É a Nau dos Insensatos, ou Stultifera Navis, como o mostra o quadro de Bosch. Ora, retomar essa imagem um pouco onírica, mas também histórica, ali onde começa uma divisão, e lançá-la num outro contexto inteiramente distinto, pode provocar uma inflexão interessante: em MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE não é mais a cidade que envia os loucos para o alto mar, é um grupo de “insensatos” que decide embarcar, não numa Nau de Loucos, mas num Cruzeiro pós-moderno, um cruzeiro da vida, onde se tenta desesperadamente fugir do tédio.
Temos dificuldades em acreditar no que nos está a acontecer, porque nada parece acontecer. Estamos cansados de sermos nós mesmos, pois as nossas próprias evidências e os obstáculos da nossa vida não funcionam mais. Nós sabemos que não funcionam, ainda que finjamos que sim. Precisamos nos reinventar, mas não temos força nem estímulo para isso. É por isso que todos soamos a um déjà vu, é por isso que já estivemos lá, que já vimos aquilo, já o fizemos. A instância do possível à nossa disposição está exausta, como se tudo tivesse já sido tentado, como se tivessemos esgotado as nossas possibilidades. Como é que tu inventas uma saída, se não há saída? MÁQUINA KAFKA/KAFKAMACHINE, ao ativar um âmbito teatral-musical-cinematográficoperformático, testa igualmente um dispositivo, uma rede de afetações, um modo de conjugar singularidades, de atravessar um “mar de sensações” em conjunto, de contagiar um meio em princípio indiferente (ou atritar-se com ele), de imaginar outras possibilidades de linguagem, de inserção/deserção, de conexão/desconexão. Assim, esse experimento de “cooperação” e de “organização” pode criar aberturas processuais que devolvam a crença na “possibilidade” (que é o que nos foi sequestrado ultimamente, “nada” é mais possível), abrindo outros sentidos de futuro, de construção de afetação, de “sensibilidade”, também sequestradas pelo próprio entorpecimento do entretenimento, e pelo excesso de informação do semio-capitalismo. Não se trata, pois, apenas de juntar pessoas excêntricas mas construir um “agenciamento”, onde as sensibilidades se vejam engajadas, e forçosamente sejam desterritorializadas de seus hábitos e lugares, cartografando assim a si mesma, a suas produções, os poderes que a entravam, os acontecimentos que engendram.
Para o final da viagem, imaginamos uma espécie de “síntese não conclusiva” da experiência, onde alguns dos participantes, na forma kafkiana de Relato para uma Academia (onde um símio conta como virou homem), dão conta daquilo que lhes suscitou essa travessia, das ferramentas que foram elaboradas conjuntamente, daquilo que essa “confrontação” com o navio pós-moderno pôde revelar. Como se alguns cientistas, ao saírem de um laboratório (e que outra coisa é um cruzeiro, senão um laboratório da atualidade?), compartilham com seus colegas suas parcas conclusões, ou hesitações, ou novas perguntas que surgem, ou idéias de novos experimentos necessários. O desembarque desta vez não clandestino da loucura, como na Nau dos Insensatos de Foucault, mas desembarque apregoado da loucura, da desrazão, das sensibilidades extremas e ainda resistentes, verdadeiras, sobreviventes. Desembarque do sonho, do fragmento, das possibilidades de futuro de outros agenciamentos, cooperações por vir. A passagem transatlântica da MÁQUINA KAFKA/ KAFKAMACHINE para a América começa com um evento de recrutamento em Lisboa, a 24 de Novembro de 2011, no qual todos foram contratados para o Grande Teatro de Oklahoma, seguindo de perto esta cena da obra de Kafka, “America”, publicada originalmente com o título “O desaparecido.” Pensar sobre a obra de Kafka, seus processos, seus devires animais, devires americanos, sobre a loucura, sobre informes à Academia gerou e ainda está gerando uma série de rascunhos, rabiscos (como Kafka entendia sua obra, somente rabiscos e rascunhos) que também estão acoplados como engrenagens a esta máquina kafka colocada para funcionar em um terminal de desembarque, real ou imaginário. Imagens em movimento, textos, objetos, móveis, utensílios, agregados a este espaço criam fendas e aberturas para o conhecimento de todas as muitas séries compostas antes e durante a travessia. Na ação de desembarque MÁQUINA KAFKA/ KAFKAMACHINE uma instalação áudio visual efêmera - somente no dia do desembarque – que exibe o material bruto das filmagens documentadas durante a travessia oceânica e as realizadas durante o ano que a precedeu.
13 DE DEZEMBRO - SÃO PAULO ESPAÇO 4º SUBSOLO - SESC PINHEIROS RUA PAES LEME, 195 18h às 19h30 Lançamento do livro MÁQUINA KAFKA | KAFKAMACHINE de Felix Guattari n-1 edições (Brasil) + Future Art Base (Finlândia) 19h30 “COMUNICAÇÃO A UMA ACADEMIA” espetáculo teatral com Juliana Galdino direção Roberto Alvim 21h “AMÉRIKA OU O DESAPARECIDO” espetáculo com a Cia. Teatral Ueinzz
UM PROJETO DE: FUTURE ART BASE AALTO UNIVERSITY | ROBIN HOOD INVESTMENT FUND OF THE PRECARIAT: MINOR ASSET MANAGEMENT | FRAME, FINNISH FUND FOR ART EXHANGE | KATAJA, THE FINNISH DOCTORAL PROGRAM IN BUSINESS STUDIES | THE ART COUNCIL OF FINLAND | AMIGOS DA FILOSOFIA E DA ARTE EM SÃO PAULO APOIO: n-1 EDIÇÕES | PROD.ART.BR | CENTRO CULTURAL B_ARCO | NÚCLEO DE ESTUDOS DA SUBJETIVIDADE DO PEPGPC - PUC-SP | LABORATÓRIO PACTO-FMUSP
cais de ovelhas